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RENASCIMENTO ⤑ Renascimento, ou Renascimento Cultural, é o período da História europeia em que houve a retomada de temas, ideais e técnicas utilizadas durante a Antiguidade greco-romana, nos campos da arte, da ciência e da filosofia. Esse movimento cultural ocorreu entre os séculos XIV e XVI, principalmente em algumas cidades italianas, e se contrapunha aos valores católicos cultivados durante a Idade Média. A diferença era marcada principalmente pelo humanismo e pelo racionalismo adotado pelos renascentistas. O humanismo se expressava principalmente através do antropocentrismo, buscando colocar o homem como centro do universo e medida de todas as coisas. Dessa forma, opunha-se ao caráter religioso das concepções filosóficas medievais, que tinha Deus como centro do universo. O racionalismo do Renascimento estava ligado à utilização da observação empírica e da utilização de conhecimentos matemáticos, principalmente, para a produção artística e do conhecimento humano sobre o mundo. A perspectiva renascentista afastava-se dos dogmas católicos, mas não excluía totalmente os temas religiosos. O que os artistas do Renascimento fizeram foi dar um caráter humano à representação das histórias religiosas, principalmente no campo das artes. Nas ciências, a oposição foi mais acentuada, com os cientistas passando a questionar teorias milenares, como a substituição do geocentrismo ptolomaico (a Terra como centro do universo) pelo heliocentrismo (o sol como centro do universo). A emergência do Renascimento esteve ligada ao novo processo de urbanização de algumas regiões europeias e à reabertura de rotas comerciais, principalmente no Mediterrâneo. Essas mudanças proporcionaram o enriquecimento e o fortalecimento da burguesia nascente, que pôde financiar a produção de inúmeros artistas, principalmente através dos mecenas. (indivíduo rico que protege artistas, homens de letras ou de ciências, proporcionando recursos financeiros, ou que patrocina, de modo geral, um campo do saber ou das artes). As trocas comerciais em diversos pontos do Mediterrâneo possibilitaram o contato dos europeus com os bizantinos e os árabes, que haviam conservado as obras e os conhecimentos da Antiguidade greco-romana. Dessa forma, o Renascimento foi a primeira manifestação ideológica da burguesia europeia, que pretendia com valores como o individualismo, o naturalismo e o hedonismo se diferenciar da produção cultural medieval. Dividiu-se em três fases: Trecento (século XIV ou os anos trezentos); o Quattrocento (século XV ou anos quatrocentos); e Cinquecento (século XVI ou anos quinhentos). Porém, não foi apenas nas cidades italianas que houve produções artísticas renascentistas. Na Inglaterra, nos Países Baixos, na Espanha, Portugal, Alemanha e França também houve artistas ligados ao Renascimento CARACTERISTICAS ⤑ A razão, de acordo com o pensamento da Renascença, era uma manifestação do espírito humano que colocava o indivíduo mais próximo de Deus. Ao exercer sua capacidade de questionar o mundo, o homem simplesmente dava vazão a um dom concedido por Deus (neoplatonismo). Outro aspecto fundamental das obras renascentistas era o privilégio dado às ações humanas, ou humanismo. Tal característica representava-se na reprodução de situações do cotidiano e na rigorosa reprodução dos traços e formas humanas (naturalismo). Esse aspecto humanista inspirava- se em outro ponto-chave do Renascimento: o elogio às concepções artísticas da Antiguidade Clássica ou Classicismo. Relação com a burguesia e o individualismo. A valorização das ações humanas abriu um diálogo com a burguesia, que floresceu desde a Baixa Idade Média. Suas ações pelo mundo, a circulação por diferentes espaços e seu ímpeto individualista ganharam atenção dos homens que viveram todo esse processo de transformação privilegiado pelo Renascimento. Ainda é interessante ressaltar que muitos burgueses, ao entusiasmarem-se com as temáticas do Renascimento, financiavam muitos artistas e cientistas surgidos entre os séculos XIV e XVI. Além disso, podemos ainda destacar a busca por prazeres (hedonismo) como outro aspecto fundamental que colocava o individualismo da modernidade em voga. IMPACTOS ⤑ Ao abrir o mundo à intervenção do homem, o Renascimento sugeriu uma mudança da posição a ser ocupada pelo homem no mundo. Ao longo dos séculos posteriores ao Renascimento, os valores por ele empreendidos vigoraram ainda por diversos campos da arte, da cultura e da ciência. Graças a essa preocupação em revelar o mundo, o Renascimento suscitou valores e questões que se fizeram presentes em outros movimentos concebidos ao longo da história ocidental. Trata-se de um período muito rico, mas que pode ser introduzido a partir de três problemas filosóficos que povoaram inúmeros dos pensadores renascentistas: 1- A imagem renovada dos indivíduos descolada da tradição católica. 2 2- As questões de participação política que surgiram em um contexto de valorização dos indivíduos. 3- As reflexões sobre a forma de ação política dessas novas figuras políticas que foram as cidades-Estados e que prefiguraram os Estados Modernos em alguns sentidos. MICHEL DE MONTAIGNE ⤑ Um dos principais filósofos do Renascimento, tanto pelas ideias que elaborou em suas obras quanto pelas inovações literárias. Seus ensaios costumam ser textos que misturam anedotas autobiográficas, citações de autores da Antiguidade Clássica e reflexões aguçadas sobre os mais variados temas, dos mais clássicos (como ensaios sobre a natureza do conhecimento ou sobre a amizade) aos mais mundanos (sobre o sono ou sobre estar bêbado). Apesar dessa variedade – ou justamente por ela –, a Filosofia elaborada por Montaigne acabou atravessando toda a sua obra. Seu pensamento pode ser compreendido, portanto, a partir de dois pontos centrais: seu ceticismo e seu ensaísmo literário. Montaigne herdou de Pirro e dos céticos a desconfiança do que sentimos. O que Montaigne fez com essa suspensão foi tomar o mundo como espaço de constante reavaliação, uma vez que, diante da impossibilidade de ter certeza sobre o que vemos e o que experimentamos, restaria à Filosofia tomar como compromisso não se prender a nenhuma posição e sempre estar aberta às transformações, em nós e no mundo, que demandam mudar de posição Diante das questões postas por seu ceticismo, Montaigne tornou tudo no mundo objeto de avaliação e reflexão, permitindo que comentasse seu cálculo renal e a história romana sem que um tópico fosse de antemão superior ao outro. Em Montaigne, vemos, portanto, uma ideia de humano que acaba concentrando boa parte do que foi pensado no contexto renascentista. ÉTIENNE DE LA BOÉTIE ⤑ Formulação de um dos maiores enigmas da vida política: o problema da servidão voluntária. Esse problema é tratado na obra Discurso sobre a servidão voluntária. La Boétie (2020) tenta entender a relação de subordinação entre um soberano e seus súditos em um contexto de ditadura, sobretudo quando se considera que o ditador é apenas um, e o povo é numericamente superior. O que se esperaria, ao menos em termos lógicos, é que, se um ditador está no poder e age para prejudicar o povo, esse povo se apoiaria em sua superioridade numérica para retirá-lo do poder. Mas isso não parece ser o caso! O que parece acontecer – e é esta a questão que La Boétie põe – é que o ditador só pode se manter no poder, nessas condições, caso o próprio povo abdique de seu poder e de sua liberdade. Vemos aqui que a subordinação é um problema na medida em que fere o indivíduo em sua singularidade. É com isso em mente que podemos enxergar que a formulação do problema da servidão voluntária só faz sentido a partir de um contexto do Humanismo renascentista. Afinal, se o que se está tentando defender é a liberdade inata ao indivíduo singular, então esse valor só pode ser preservado se estamos inseridos em uma cultura que celebra adignidade da vida humana. Esse é um dos pilares do pensamento elaborado no Renascimento. NICOLAU MAQUIAVEL ⤑ Nascido no conturbado fim do Quattrocento (XV), o florentino Nicolau Maquiavel teve, assim como os outros renascentistas, uma formação humanista. Formado na Universidade de Florença, ele atuou como uma espécie de diplomata de sua cidade: foi a diversas cortes estabelecer tratados, alianças e relatórios, conhecendo o contexto de cada país e, como ótimo observador, enxergando defeitos e qualidades nas artes de governar. Preso e torturado sob a acusação de conspiração, Maquiavel viveu em reclusão, o que trouxe à mente do diplomata um agudo senso de realismo, e uma obsessão pela garantia da estabilidade dos Estados. Em reclusão, visando a retornar à administração do principado florentino, Maquiavel escreveu um livro a Lourenço de Médici intitulado O Príncipe. Assim, o principado de Médici concedeu o perdão a Maquiavel, dando a ele o título de historiador. Em 21 de junho de 1527, Maquiavel morre, doente. “Os meios serão sempre julgados honrosos e por todos louvados, porque o vulgo sempre se deixa levar pelas aparências e pelos resultados, e no mundo não existe senão o vulgo; os poucos não podem existir quando os muitos têm onde se apoiar.” A FILOSOFIA DE MAQUIAVEL O termo “maquiavélico” sempre esteve associado à astúcia, falsidade e má-fé. Foi empregado, por exemplo, para caracterizar governos despóticos e políticos corruptos. Os dicionários apontam esse termo como “astuto”, “ardiloso”. De facto, o nome de Maquiavel foi considerado uma ameaça às bases morais da vida política. Mas isso, de maneira alguma, expressa o pensamento desse humanista: Maquiavel nunca foi maquiavélico. A principal característica das reflexões de Nicolau Maquiavel sobre o exercício do poder é a ruptura com a visão dos autores da Idade Média e do Renascimento de que haveria uma relação direta entre a bondade do governante e a legitimidade de seu poder. 3 À recomendação de que os governantes deveriam se comportar conforme um padrão de bondade e de ética para manter um reinado longo e pacífico, Maquiavel responde que a bondade não assegura o poder ou a capacidade de ser obedecido. A única preocupação do governante é, nas palavras de Maquiavel, a manutenção do Estado. O que a experiência havia ensinado a Maquiavel é que bondade e retidão não são suficientes para manter o poder político. Pelo contrário, é o uso adequado do poder que fará com que os indivíduos obedeçam e com que o governante mantenha seu Estado. Maquiavel defendia que o fundamento da autoridade de um governante é a própria posse do poder, isto é, a autoridade de um governante não está separada do poder de impor essa autoridade. O PRINCIPE ⤑ Foi em meio a uma Itália fragmentada, permeada por guerras e jogos de poder, que Maquiavel escreveu sua mais famosa obra: O Príncipe. A questão central do livro são o papel da ética e sua relação com a política. Em O Príncipe, pela primeira vez na história do pensamento político, a ação política despiu-se de preceitos morais cristãos, ou, como diria Benedetto Croce, percebeu-se que “a política não se faz com água-benta”. Maquiavel mostrou existirem duas éticas distintas: uma ética cristã, útil para salvar a alma (ser bom sempre, nunca mentir, não usar máscaras), e uma ética política, útil para salvar o Estado (ser mau quando necessário, mentir quando a situação exigir, parecer bom e piedoso). Em Maquiavel, a ética política é utilitária, ou seja, são morais todos os atos úteis à comunidade, ao passo que são imorais os atos que tiverem em vista a satisfação de interesses egoístas, que entrem em conflito com os interesses da coletividade. Rompeu-se, aqui, com a ideia dominante de que o príncipe deve ser sempre bondoso (no sentido cristão da palavra). Haveria, portanto, uma ragione di stato (razão de estado) Isso não significa que Maquiavel era um defensor da maldade e da corrupção – sua filosofia tem uma profundidade muito maior que essa –, mas defende a ideia de que o príncipe deve saber “não ser bom”, existindo, portanto, “crueldades mal-usadas ou bem usadas” É nesse sentido que Maquiavel diz: “Se bem considerar tudo, encontrar-se-á alguma coisa que parecerá virtude, e segui-la seria a ruína, e alguma coisa que parecerá vício, e seguindo-a obtém a segurança e o bem-estar. Isso não significa que Maquiavel era um defensor da maldade e da corrupção – sua filosofia tem uma profundidade muito maior que essa –, mas defende a ideia de que o príncipe deve saber “não ser bom”, existindo, portanto, “crueldades mal usadas ou bem usadas” É nesse sentido que Maquiavel diz: “Se bem considerar tudo, encontrar-se-á alguma coisa que parecerá virtude, e segui-la seria a ruína, e alguma coisa que parecerá vício, e seguindo-a obtém a segurança e o bem-estar. THOMAS HOBBES ⤑ Para o filósofo, o homem não é um animal político ou social, como dizia Aristóteles, mas um lobo egoísta e interesseiro, que sempre quer saciar seu apetite. Nasceu na aldeia de Westport, na Inglaterra, em 1588. Em 1608, já formado em arte, passou a trabalhar como preceptor na poderosa família Cavendish, um importante lorde inglês, o que lhe permitiu fazer viagens de aprimoramento cultural. Visitou a França e a Itália em 1610 e estudou literatura e filosofia. Entre 1621 e 1626, trabalhou como secretário de Francis Bacon, para quem traduziu algumas obras. É um dos mais importantes pensadores da política moderna. Seu pensamento se enquadra no grupo dos pensadores contratualistas, grupo constituído por Hobbes, Locke e Rousseau, em que o objetivo era responder duas questões: Como as sociedades foram formadas e como devem ser governadas (qual é o fundamento do poder?). Vivenciou grande parte do longo processo da Revolução Inglesa (1640-1689), quando o povo inglês lutou contra o absolutismo da dinastia Stuart. Fervoroso defensor da Monarquia, escreveu seu primeiro tratado sobre o regime, Elementos da Lei Natural, em 1640, e foi obrigado a se refugiar em Paris. Retornou à Inglaterra pouco tempo depois, mas voltou a se refugiar na França, por causa dos ideais absolutistas expostos em Leviatã, em 1651. Um ano depois, voltou à Inglaterra, então governada por Oliver Cromwell. Morreu em Hardwick, em 1679. "LEVIATÃ" DE HOBBES: o rei absoluto com uma armadura formada pelos seus súditos, causando temor pela espada e dominando toda a paisagem. Detalhe do texto escrito em latim: "Non est potestas super terram quae comparetur ei", que pode ser traduzido livremente "Não há poder na Terra que se compare a ele".(foto: Gravura de Abraham Bosse (1651)) Retirado na mitologia fenícia, o Leviatã, figura que também é relatada no antigo testamento, no livro de Jó, é um monstro gigantesco, uma espécie de crocodilo, que vivia em um lago e tinha como missão defender os peixes mais fracos dos peixes mais fortes. Dessa mesma forma age o Estado hobbesiano: defende a vida de todos, não permitindo que uns atentem contra a vida dos outros. Mas para garantir o respeito ao pactuado, o Estado deve impor, pelo medo, tal obediência. Por isso ele deve ser FORTE, CRUEL E VIOLENTO. O poder do Estado Leviatã, a quem Hobbes chama de “deus mortal”, deveria ser exercido por um rei com poderes absolutos que, pelo medo, governaria a vida de todos. Seria o soberano e os homens os súditos. Estaria acima das leis, sem limites para suas 4 ações, desde que agisse no cumprimento de sua parte no contrato: garantir a vida, a prosperidade e a paz. Os homens abdicam de sua liberdade, pois sabem que, se não houver este poder soberano, a vida estaria constantemente ameaçada, pois onde não há lei, não há limites. A visão pessimista de Hobbes acerca a natureza do homem, pode ser explicada pelo período vivido por ele, marcado por inúmeros conflitos na Inglaterra e na Europa. Também, há de se levar em conta que toda a sua filosofia tem comoobjetivo legitimar o absolutismo na Inglaterra. Contudo, a história demonstrou que o uso da força, do autoritarismo e da repressão, gera sociedades em que prevalece a desigualdade, a instabilidade e o esvaziamento da discussão política. Um Estado soberano, com poderes absolutos, leva à revoltas, que são frutos da injustiça social. A FILOSOFIA DE HOBBES ⤑ Em sua obra Leviatã (Leviatã é um bíblico monstro gigantesco que representa o Estado), Hobbes inaugurou um novo modo de pensar a política, refletindo não apenas sobre os paradigmas já existentes, mas questionando-se sobre a origem do Estado, sua função etc. Se, em Maquiavel, o problema era a conservação do poder, em Hobbes, o problema é a conservação do homem. A obra é escrita no bojo da Revolução Puritana Inglesa e sua guerra civil: o texto é uma defesa do absolutismo, justamente, quando ele vivia uma profunda decadência na Inglaterra. O ponto de partida de Hobbes é a construção de um hipotético estado de natureza. O estado de natureza é um estado de violência, de guerra: Bellum omnium contra omnes (a guerra de todos contra todos). Assim, para Hobbes, o homem é, desde a mais tenra infância, egoísta, parcial, competitivo, orgulhoso, vingativo, vaidoso e ambicioso: homo homini lupus (o homem é o lobo do homem). O homem não é um animal político ou social, como dizia Aristóteles, mas um lobo egoísta e interesseiro, que sempre quer saciar seu apetite. O desejo de se preservar é a fonte mais abundante dessa guerra, que nos instiga a ver o próximo como um inimigo. Para alcançar nosso insaciável desejo de poder, estaríamos sempre matando, subjugando e repelindo o próximo. Afinal, o homem só encontra a felicidade por comparação com os outros homens, ou seja, sua felicidade depende da miséria do próximo: “Todo o prazer intelectual e toda a felicidade se baseiam no fato de ter uma pessoa com quem se comparar e em relação a quem se sentir superior”. Portanto, a vida anterior ao Estado e à sociedade – no hipotético estado de natureza – seria brutal, violenta, miserável, infeliz e solitária, a guerra de todos contra todos, marcada pelo mais intenso sentimento do homem: o medo da morte. Dessa forma, qual seria a maneira de conter essa natureza humana e solucionar o problema do medo e da guerra de todos contra todos? Por meio de um contrato, de um pacto, as pessoas atribuem ao Estado poderes absolutos. O ser humano, calculista e que teme a morte, aceita sacrificar sua liberdade em nome de sua segurança. O Estado e a sociedade teriam nascido juntos, representando o fim do estado de natureza, quando o homem renunciou todos os direitos e as liberdades individuais para um soberano, que, em troca, governando com poderes absolutos, conteria o lobo do homem, ou seja, protegeria o homem dos seus semelhantes, evitando o medo e a guerra entre os homens. O medo da morte, característica humana, é utilizado aqui em favor da paz. O Estado absoluto é a melhor maneira de garantir a liberdade individual. Enquanto os republicanos diziam que o homem só é livre se viver num Estado livre, Hobbes lembra que, ao abdicarmos de nossa liberdade de fazer leis ou escolher representantes periodicamente, ganhamos inúmeras outras liberdades, como a tranquilidade, a busca por enriquecimento sem incômodos, o exercício dos nossos talentos, o aprimoramento individual, a busca da felicidade, entre outros. Hobbes legitima o Estado a partir da função que ele tem de proteger seus súditos; por isso, a maioria dos defensores do absolutismo, na época de Hobbes, não o apoiou, pois, para eles, o soberano legitimava-se pelas Escrituras ou pela Tradição. BARUCH SPINOZA ⤑ Baruch ou Benedictus de Spinoza nasceu no dia 24 de novembro de 1632, na cidade de Amsterdã, na Holanda. Ele foi gerado no âmbito de uma família de judeus, de origem portuguesa. Seus familiares vinham há algum tempo fugindo das garras da Inquisição. Ele era filho de um rico comerciante. Posteriormente viria a se tornar um dos maiores pensadores racionalistas do século XVII, no interior da Filosofia Moderna. Em sua obra Ética , Espinosa deteve-se, sobretudo, no caráter afetivo e racional dos seres humanos. Para ele, a vida afetiva significa que os desejos dos seres humanos são sua essência . Isso quer dizer que a singularidade de um indivíduo qualquer está atrelada não ao que ele quer de maneira abstrata, mas ao que ele quer na medida em que se engajar nesse movimento. E o que os indivíduos querem, em última instância, é perseverar em seu ser (o que Espinosa chama de conatus dos seres), independentemente do que seja esse perseverar. 5 Além disso, esse “perseverar” tem de lidar com objetos no mundo que dificultam ou impedem a realização desse desejo É nesse ponto que Espinosa fornece sua teoria dos afetos. Para ele, os seres humanos são, ao mesmo tempo, seres que procuram realizar seus desejos (suas finalidades), mas também são seres inicialmente ignorantes das causas que os movem. Isso significa que os indivíduos conseguem entender o que querem , mas não conseguem saber por que querem. A partir de certos encontros positivos com algo que faz bem a nós mesmos, é possível desenvolver um pensamento racional sobre as coisas, isto é, experimentá-las para além de seus efeitos em nós. Podemos compreender as coisas a partir de como elas combinam conosco. O pensamento racional seria, portanto, não algo que se opõe aos afetos, mas algo que emerge e é elaborado a partir das coisas que afetam positivamente o humano. Isso tem efeitos importantes para a Filosofia política de Espinosa e em sua visão sobre a sociedade em geral. Parte de pontos bem semelhantes aos de Hobbes para pensar no contrato social. Ele também pensa que, sem qualquer intervenção externa, os seres humanos inevitavelmente entram em disputas intermináveis, uma vez que cada um simplesmente buscaria realizar seus desejos. Também como Hobbes, ele acredita que algum tipo de autoridade política externa é necessário para frear certos impulsos e produzir alguma estabilidade política. Sendo semelhantes, é inevitável que os seres humanos acabem disputando os mesmos recursos, isto é, coisas que permitem que perseverem. Por outro lado, como são semelhantes, certos encontros podem fazer com que percebam suas semelhanças e comecem a trabalhar em conjunto. Esse trabalho em conjunto pode, inclusive, implicar a criação de estruturas entre os indivíduos que transferem o poder de seus membros para o corpo social, que é o Estado. O Estado é, portanto, um corpo composto a partir (mas não é redutível a ) dos indivíduos que participam dele. A organização de seres humanos entre si não é algo que emerge apenas a partir de uma tentativa de afastar a disputa que há entre eles. A organização pode surgir, também, quando se dão conta dos benefícios mútuos. O direito natural na Filosofia política espinosana é que um indivíduo pode fazer aquilo que ele tem capacidade de fazer. Assim, não haveria nenhuma limitação moral inata que poderia ser descoberta e utilizada para forçar a renúncia da capacidade dos indivíduos. Um caso contemporâneo que pode ser lido na chave espinosana da “aplicação a uma estrutura burocrática” é a participação política da população no processo político por meio das eleições – como se dirigíssemos nosso desejo e nossa capacidade para esses momentos de participação política. Contudo, como se trata apenas de um direcionamento das forças do indivíduo, ele também pode, caso a situação necessite, caso haja algum abuso de poder, rebelar-se, deixar de fortalecer o Estado.
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