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Capítulo 12 I Regulação da Expressão Gênica em Eucariotos 365 As proteínas ativadoras transcricionais ligam-se a elementos UAS em levedura Gal4 Cro li 5' ~ GAL10 1 GA:1 1 3' Cro XII 5' GAL2 3' UAS UAS UAS Figura 12.6 A proteína Gal4 ativa genes-alvo pelos elementos da sequência de ativação antecedente (UAS). A proteína Ga14 tem dois domínios funcionais: um de l igação ao DNA (quadrados rosados) e um de ativação (formas ovais em cor laranja). A proteína liga-se a sequências específicas antecedentes dos promotores dos genes da via Gal. Alguns dos genes GAL são adjacentes (CAL 1, GAL 10), enquanto outros estão em cromossomos diferentes. O elemento UAS CAL 1 contém quatro sítios de ligação Gal4. trutas de gene repórter, ele é ligado a sequências reguladoras que determinam a expressão do gene que está sendo inves- tigado. A expressão do gene repórter reflete a atividade do elemento regulador que está sendo investigado. Em geral, o gene repórter é o lacZ de E. coli, um gene repórter efetivo porque os produtos de sua atividade são facilmente medidos. Outro gene repórter comum é o que codifica a proteína fluo- rescente verde (GFP) da água-viva. Como seu nome sugere, a concentração da proteína repórter é facilmente medida pela luz que ela emite. Para investigar o controle da expressão do gene GAL, a região codificadora de um gene repórter e um promotor são colocados posteriores a um elemento UAS do gene GAL. A expressão do repórter é, então, lida a partir da atividade da Gal4 nas células. Vamos ver o que acontece quando uma forma da proteína Gal4 sem o domínio de ativação é expressa em leveduras. Nesse caso, os sítios de ligação do elemento UAS são ocupa- dos, mas nenhuma transcrição é estimulada (Figura 12.7b). O mesmo ocorre quando outras proteínas reguladoras sem domínios de ativação, como o repressor bacteriano LexA, são expressas nas células que apresentam genes repórter com seus respectivos sítios de ligação. O resultado mais interes- sante é obtido quando uma forma da proteína Gal4 sem o domínio de ligação ao DNA é inserida no domínio de ligação ao DNA LexA; a proteína hi'brida ativa a transcrição dos sítios de ligação de LexA (Figura 12. 7). Experimentos posteriores de "troca de domínio" revelaram que a função de ativação transcricional da proteína Gal4 reside em duas pequenas regiões com cerca de 50 a 100 aminoácidos de tamanho. Essas duas regiões formam um domínio de ativação separável que ajuda a recrutar a maquinaria transcricional para o promotor, como veremos adiante nesta seção. Esse arranjo altamente modular de domínios de regulação de atividade é encontrado em muitos fatores de transcrição. Mensagem. Muitas proteínas eucarióticas reguladoras de transcri- ção são proteínas modulares, com domínios separáveis de ligação ao DNA, ativação ou repressão e interação com outras proteínas. As proteínas ativadoras transcricionais são modulares {a) O dímero Gal4 completo Gal4 Domínio -- de ativação Domínio de ligação ao DNA- Sítio Gal4 {b) Gal4 sem o domínio de ativação Sítio Ga14 {e) LexA sem domínio de ativação Domínio de ligação ao DNA~,,.-v-..._,.-v-.,. Sítio LexA {d) Híbrido Gal4-LexA Domínio de ativação Gal4 ---- ,--....,--.... Domínio de ligação ao DNA LexA ~,,.-v-..._,.-v-.,. Sítio LexA lacZ L----- LIGADO lacZ ..___ .... DESLIGADO lacZ __ .... DESLIGADO lacZ __ .... LIGADO Figura 12.7 As proteínas ativadoras transcric ionais têm vários domínios separáveis. (a) A proteína Gal4 tem dois domínios e forma um dímero. (b) A remoção experimental do domínio de ativação mostra que a ligação ao DNA não é suficiente para a ativação gêni- ca. (c) Similarmente, a proteína LexA bacteriana não pode ativar a transcrição por si, mas, quando fundida ao domínio de ativação Gal4 (d), pode ativar a transcrição pela 1 igação com os sítios de 1 igação LexA. (Oe }. Watson et ai., Molecular Biology of the Gene, Sth ed., © 2004, Benjamin Cummings.] 366 Introdução à Genética A atividade da Gal4 é regulada fisiologicamente Como a Gal4 torna-se ativa na presença de galactose? Indí- cios importantes vieram das análises de mutações nos genes GAL80 e GAL3. Nos mutantes GAL80, os genes estruturais GAL são ativos mesmo na ausência de galactose. Esse resul- tado sugere que a função normal da proteína Gal80 é, de algum modo, inibir a expressão do gene GAL. Já nos mutantes GAL3, os genes estruturais GAL não são ativos na presença de galactose, o que sugere que Gal3 promove normalmente a expressão dos genes GAL. Amplas análises bioquímicas revelaram que a proteína Gal80 liga-se à proteína Gal4 com alta afinidade e inibe dire- tamente a atividade de Gal4. Em termos específicos, a Gal80 liga-se a uma região em um dos domínios de ativação de Gal4, bloqueando sua capacidade de promover a transcrição dos genes-alvo. A proteína Gal80 é expressa continuamente, de modo que sempre age reprimindo a transcrição dos genes estruturais GAL, a menos que seja interrompida. O papel da proteína Gal3 é liberar os genes estruturais GAL da repressão pela Gal80 na presença de galactose. A Gal3 é um sensor e indutor. Quando ela se liga à galac- tose e ao ATP, sofre uma mudança alostérica que promove a ligação à Gal80, o que, por sua vez, faz com que a Gal80 libere Gal4, e esta é, então, capaz de ativar a transcrição de seus genes-alvo. Assim, Gal3, Gal80 e Gal4 são todas parte de uma mudança cujo estado é determinado pela presença ou ausência de galactose (Figura 12.8). Nessa mudança, a As proteínas ativadoras transcricionais podem ser ativadas por um indutor Gal4 inativa +Galactose + Gal3 Gal4 ativa UAS UAS ~Gal80 GAL1 DESLIGADO (GAr1 LIGADO Figura 12.8 A atividade da Gal4 é regulada pela proteína Gal80. (Em cima) Na ausência de galactose, a proteína Gal4 é inativa, mui- to embora possa ligar-se a sítios antecedentes ao gene-alvo CAL 1. A atividade de Gal4 é suprimida pela ligação da proteína Gal80. (Embaixo) Na presença de galactose e proteína Gal3, a Gal80 sofre uma mudança conformacional e l ibera o domínio de ativação de Gal4, permitindo a transcrição do gene-alvo. ligação ao DNA pelo regulador transcricional não é a etapa regulada fisiologicamente (como é o caso no óperon lac e no bacteriófago 1); em vez disso, a atividade do domínio de ativação é regulada. Mensagem. A atividade das proteínas reguladoras transcric io- nais eucarióticas é frequentemente controlada pelas interações , com outras proternas. Funções da Gal4 na maioria dos eucariotos Além de sua ação nas células de leveduras, demonstrou-se que a Gal4 é capaz de ativar a transcrição em células de insetos, humanas e de muitas outras espécies eucarióticas. Essa versatilidade sugere que a maquinaria bioquímica e os mecanismos de ativação gênica são comuns a uma ampla gama de eucariotos, e que as características reveladas em leveduras estão geralmente presentes em outros eucariotos, e vice-versa. Além disso, devido à sua versatilidade, a Gal4 e seus elementos UAS tornaram-se as ferramentas favoritas na análise genética para manipular a expressão e a função gênicas em uma grande variedade de sistemas que servem como modelos. Mensagem. A capacidade da Gal4, assim como de outros regu ladores eucarióticos, de funcionar em vários eucariotos indi- ca que eles em geral têm a maquinaria regu ladora transcricional e os mecanismos em comum. Agora veremos como os ativadores e outras proteínas reguladoras interagem com a maquinaria transcricional para controlar a expressão gênica. Ativadores recrutam a maquinaria transcricional Nas bactérias, os ativadores costumam estimular a trans- crição interagindo diretamente com o DNA e com a RNA polimerase. Em eucariotos, os ativadores em geral trabalham indiretamente para recrutar a RNA polimerase II para pro- motores gênicos por meio de dois mecanismos importantes. Primeiro, os ativadores interagem com subunidades dos com- plexos proteicos e atuam no inícioda transcrição. Segundo, os ativadores recrutam proteínas que modificam a estrutura da cromatina, permitindo que a RNA polimerase II e outras proteínas tenham acesso ao DNA. Muitos ativadores, incluin- do Gal4, têm ambas as atividades. Examinaremos primeiro o recrutamento de partes do complexo de iniciação trans- cricional. Lembre, do Capítulo 8, que a maquinaria transcricional eucariótica contém muitas proteínas que fazem parte de vários subcomplexos no aparato transcricional montado nos promotores gênicos. Um subcomplexo, o fator de transcrição IID (TFIID), liga-se ao TATA boxe dos promotores eucarió- ticos pela proteína de ligação a TATA (TBP; veja a Figu- ra 8.12). Uma das maneiras pelas quais a Gal4 atua para ativar a expressão gênica é ligando-se à TBP em um sítio de seu domínio de ativação. Mediante essa interação, recruta Capítulo 12 I Regulação da Expressão Gênica em Eucariotos 367 As proteínas ativadoras transcricionais recr m a maquinaria transcricional UAS Gal4 -- ~-..' / ' / ' / ' / ' I \ I -'4 I I J I f ,,--..TF li D / TBP TATA Genes GAL Figura 12.9 Gal4 recruta a maquinaria transcricional. A proteína Gal4, bem como muitos outros ativadores transcricionais, liga-se a múltiplos complexos proteicos, incluindo TFllD e complexos media- dores, que recrutam a RNA polimerase li para promotores gênicos. As interações facilitam a ativação gênica pelos sítios de ligação que estão distantes dos promotores gênicos. [Oe}. Watson et ai., Molecular Biology of the Gene, Sth ed., © 2004, Benjamin Cummings.] o complexo TFIID e, por sua vez, a RNA polimerase II ao promotor (Figura 12.9). A força dessa interação entre Gal4 e TBP correlaciona-se bem com a potência de Gal4 como ativador. Uma segunda maneira pela qual a Gal4 atua para ativar a expressão gênica é interagindo com o complexo mediador, um grande complexo de várias proteínas que, por sua vez, interage diretamente com a RNA polimerase II para recrutá- la para os promotores gênicos. O complexo mediador é um exemplo de coativador, termo aplicado a uma proteína ou complexo proteico que facilita a ativação gênica por um fator de transcrição, mas que, em si, não é parte da maquinaria de transcrição nem é uma proteína de ligação ao DNA. A capacidade dos fatores de transcrição de se ligarem a sequências antecedentes de DNA e interagir com proteínas que se ligam direta ou indiretamente a promotores aju- da a explicar como a transcrição pode ser estimulada por sequências reguladoras mais distantes (veja a Figura 12.9). Mensagem. Os ativadores transcricionais eucarióticos frequen- temente recrutam partes da maquinaria transcricional para pro- A • motores gen1cos. Controle do tipo reprodutivo de levedura: interações combinatórias Até agora, o foco deste capítulo foi a regulação de genes iso- lados ou de alguns genes em uma via. Nos organismos mul- ticelulares, tipos distintos de células diferem na expressão de centenas de genes. Portanto, a expressão ou a repressão de grupos de genes precisa ser coordenada na elaboração de tipos celulares específicos. Um dos exemplos mais bem enten- <lidos de regulação do tipo celular em eucariotos é a regulação do tipo reprodutivo em leveduras. Tal sistema regulador foi detalhado por uma combinação elegante de genética, biolo- gia molecular e bioquímica. O tipo reprodutivo serve como um modelo excelente para o entendimento da lógica da regu- lação gênica em animais multicelulares. A levedura Saccharomyces cerevisiae pode existir em qual- quer um de três tipos celulares diferentes, conhecidos como a, a e a/a (veja o Capítulo 2). Os dois tipos celulares a e a são haploides e contêm apenas uma cópia de cada cromossomo. A célula a/a é diploide e contém duas cópias de cada cromos- somo. Embora os dois tipos celulares haploides não possam ser distinguidos por seu aspecto ao microscópio, podem ser diferenciados por algumas características celulares específi- cas, principalmente seu tipo reprodutivo (veja o boxe inti- tulado Organismo-modelo Levedura, antes neste capítulo). Uma célula a cruza apenas com uma célula a e uma célula a cruza apenas com uma a . Uma célula a secreta umferomô- nio oligopeptídico, ou hormônio sexual, denominado fator a, que detém as células a no ciclo celular. De maneira similar, uma célula a secreta um feromônio, denominado fator a, que detém as células a. A parada celular de ambos os participan- tes é necessária para o sucesso reprodutivo. A célula diploide a/ a não se reproduz; ela é maior do que as células a e a e não responde aos hormônios reprodutivos. A análise genética de mutantes defeituosos na reprodução mostrou que o tipo celular é controlado por um único locus genético, o locus do tipo reprodutivo, MAT. Há dois alelos do locus MAT: as células haploides a têm o alelo MATa e as células haploides a têm o alelo MATa.. A célula eucariótica diploide a/ a tem ambos os alelos. Embora o tipo reproduti- vo esteja sob controle genético, certas linhagens mudam seu tipo reprodutivo, às vezes tão frequentemente como a cada divisão celular. Vamos examinar a base da mudança mais adiante neste capítulo, mas primeiro veremos como cada tipo celular expressa o conjunto certo de genes. Veremos que com- binações diferentes de proteínas de ligação ao DNA regulam a expressão de conjuntos de genes específicos de diferentes tipos celulares. Como o locus MAT controla o tipo celular? A análise gené- tica de mutantes que não podem reproduzir-se identificou vários genes estruturais que estão separados do locus MAT, mas cujos produtos proteicos são necessários para a repro- dução. Um grupo de genes estruturais é expresso apenas no tipo celular a (genes a-específicos) e outro grupo é expresso apenas no tipo celular a (genes a-específicos). O locus MAT controla qual desses grupos de genes estruturais é expresso em cada tipo celular. O alelo MATa faz com que os genes estruturais do tipo celular a sejam expressos, enquanto o alelo MATa. faz com que os genes estruturais do tipo celular a sejam expressos. Esses dois alelos ativam conjuntos diferen- tes de genes, porque codificam proteínas reguladoras dife- rentes. Além disso, uma proteína reguladora não codificada pelo locus MAT, denominada MCM1, é fundamental no tipo de célula regulada. O caso mais simples é o tipo celular a (Figura 12.10a). O locus MATa codifica uma única proteína reguladora, a1. 368 Introdução à Genética No entanto, essa proteína reguladora não influencia as células haploides, apenas as diploides. Em uma célula haploide a, a proteína reguladora MCM1 liga a expressão dos genes estrutu- rais necessários para uma célula a, conectando-se a sequências reguladoras em promotores gênicos a-específicos. Em uma célula a, os genes estruturais a-específicos preci- sam ser transcritos, mas, além disso, a proteína MCM1 deve ser impedida de ativar os genes a-específicos. A sequência de DNA do alelo MATa codifica duas proteínas, a 1 e a2, que são produzidas por unidades de transcrição separadas. Essas duas proteínas têm papéis reguladores diferentes na célula, como se pode demonstrar analisando suas propriedades de ligação ao DNA in vitro (Figura 12.10b). A proteína a1 é um ativador de expressão gênica a-específica. Ela liga-se em combinação com a proteína MCM1 a uma sequência discreta de DNA que controla vários genes a-específicos. A proteína a2 reprime a transcrição de genes a-específicos. Ela liga-se como um dímero, com MCM1, a sítios nas sequências de DNA localizadas a 5' de um grupo de genes a-específicos e age como um repressor. Em uma célula diploide de levedura, as proteínas regu- ladoras codificadas por cada locus MAT são expressas (Figu- ra 12.10c). Qual é o resultado? Todos os genes estruturais envolvidos na reprodução celular são desligados, pois são um conjunto separado de genes, denominados haploides específi- cos, que se expressam em células haploides, mas não em célu- las diploides. Como isso acontece?A proteína a1 codificada por MATa tem um papel a desempenhar finalmente. Ela pode ligar-se à proteína a2 presente e alterar sua especificidade de ligação de tal maneira que o complexo a1-a2 não se ligue a genes a-específicos. Em vez disso, o complexo a1-a2 liga-se a uma sequência diferente, antecedente aos genes haploides específicos. Em células diploides, então, a2 existe em duas formas: (1) como um complexo a2-MCM1 que reprime genes a-específicos e (2) em um complexo com a1 que reprime genes haploides específicos. Além disso, o complexo a1-a2 também reprime a expressão de a1, que portanto não está mais presente para ligar genes a-específicos. Os diferentes parceiros de ligação determinam quais sequências específicas de DNA são ligadas e quais genes são regulados por cada com- plexo que contém a2. A regulação de conjuntos diferentes de genes-alvo pela associação do mesmo fator de transcrição a parceiros diferentes de ligação desempenha um papel prin- cipal na geração de padrões distintos de expressão gênica em tipos celulares diferentes nos eucariotos multicelulares. Mensagem. Em leveduras e eucariotos multicelulares, padrões de expressão gênica específicos do tipo celular são determinados por combinações de fatores de transcrição que interagem. 12.3 Cromatina dinâmica Um segundo mecanismo que influencia a transcrição gênica em eucariotos modifica a estrutura local da cromatina ao redor de sequências gênicas reguladoras. Para compreender totalmente como funciona esse mecanismo, precisamos pri- Combinações de proteínas reguladoras controlam os tipos celulares Locus MAT Proteínas reguladoras expressas genes a-específicos genes a-específicos Genes haploides específicos a1 (]) MCM1 MCM1 ----~----..... DESLIGADO ______ e: LIGADO {a) célula a a2 a1 ((\\ @) \JU C\ MCM1 V - -- DESLIGADO MCM1 r-v---..~ a1 e: LIGADO MCM1 ~-----e LIGADO {b) célula a a1 a2 a1 MCM1 a2 ' a2 - -- DESLIGADO MCM1 ~-------.._- DESLIGADO ~ a1 a2 ' . -- DESLIGADO {c) célula a/a Figura 12.1 O Controle da expressão gênica específica de tipo celular em levedura. Os três tipos celulares de 5. cerevisiae são determi- nados pelas proteínas reguladoras a1, a1 e a2, que regulam subgrupos diferentes de genes-alvo. A proteína MCM1 atua em todos os três tipos celulares e interage com a1 e a2. Capítulo 12 I Regulação da Expressão Gênica em Eucariotos 369 meiro rever a estrutura da cromatina e, então, considerar como é que ela consegue mudar e como suas mudanças afe-- ,.. . tam a expressao genica. O recrutamento da maquinaria transcricional por ativa- dores pode parecer um tanto similar em eucariotos e bacté- rias, sendo a principal diferença o número de proteínas que interagem na maquinaria transcricional. De fato, há pouco mais de uma década, muitos biólogos interpretavam a regu- lação eucariótica simplesmente como uma versão bioquimi- camente mais complicada do que havia sido descoberto em bactérias. Entretanto, essa visão mudou acentuadamente à medida que os biólogos consideraram o efeito da organização do DNA genômico nos eucariotos. Comparado com o DNA eucariótico, o DNA bacteriano é relativamente "nu", tornando-se prontamente acessível à RNA polimerase. Em contraste, os cromossomos eucarióticos são compactados em cromatina, que é composta por DNA e proteínas (principalmente histonas). Como mencionado resu- midamente no Capítulo 1, a unidade básica da cromatina é o nucleossomo, que contém cerca de 150 pb de DNA envolto apro- ximadamente 1,8 vez ao redor de um cerne de oito histonas denominado octâmero de histonas (Figura 12.11). O cerne de histonas é composto por duas subunidades de cada uma das quatro histonas: 2A, 2B, 3 e 4 (Figura 12.12). Em torno do cer- ne do nucleossomo existe uma histona ligadora, H1, que pode compactar os nucleossomos em estruturas de ordem superior que condensam mais o DNA. O acondicionamento do DNA eucariótico em cromatina significa que grande parte do DNA não está prontamente acessível a proteínas reguladoras e ao aparato de transcrição. Assim, enquanto os genes procarióticos estão geralmente acessíveis e "ligados", a menos que reprimidos, os genes eucarióticos estão inacessíveis e "desligados", a menos que ativados. Portanto, a modificação da estrutura da cromatina é uma característica distinta da regulação gênica eucariótica. Agora, há um aspecto sobre a estrutura da cromatina que é importante não esquecer - ela pode ser herdada. Esse modo Estrutura da cromatina (a) Região curta da dupla hélice de DNA Nucleossomos: a unidade básica da cromatina E e: Fibra de cromatina de o cromossomos M compactados (e) Cerne do octâmero de histonas 2nm t t ~~_.11.!..--,,,,-, 11 nm _y_~---_j_ 1 30 nm 10 nm ,........._._ _l (b) /DNA ---- ""-Histona H1 Octâmero de histonas "----v---' Nucleossomo DNA Histona H1 30 nm Figura 12.11 (a) O nucleossomo na cromatina não condensada e na condensada. (b) Vista final da cadeia enrolada de nucleossomos. (c) A estrutura da cromatina varia ao longo do comprimento de um cromossomo. A cromatina menos condensada (eucromatina) é mostrada em amarelo, as regiões de condensação intermediária estão em laranja e azul, e a heterocromatina revestida com proteínas específicas (roxas) está em vermelho. [(e) De P. J. Horn e C. L. Peterson, "Chromatin Higher Order Folding: Wrapping Up Transcription'; Science 297, 2002, 1827, Fig. 3. Copyright 2002, AAAS.] 370 Introdução à Genética Um nucleossomo é composto de DNA enrolado em tomo de oito histonas DNA H1 Histona "-\ Figura 12.12 (a) Os componentes de uma unidade de nucleos- somo mostrando o cerne de histonas (H2A, H2B, H3, H4), o DNA circundante e a histona H1 ligadora. de herança recebe uma denominação - herança epigenética - e é definida em termos operacionais como a herança de estados da cromatina de uma geração celular para a seguinte. O que essa herança significa é que, na replicação do DNA, tanto a sequência do DNA como a estrutura da cromatina são transmitidas fielmente para a próxima geração celular. No entanto, ao contrário da sequência do DNA, a estrutura da cromatina muda no decorrer do ciclo celular. Um meio de alterar a estrutura da cromatina poderia ser simplesmente movendo o octâmero de histonas ao longo do DNA. Na década de 1980, foram desenvolvidas técnicas bioquímicas que permitiram aos pesquisadores determinar a posição dos nucleossomos em genes específicos e ao redor deles. Nesses estudos, a cromatina foi isolada de tecidos ou células em que um gene estava ligado e comparada com a cromatina do tecido em que o mesmo gene estava desligado. O resultado da maioria dos genes analisados foi que as posi- ções dos nucleossomos mudaram, especialmente nas regiões reguladoras dos genes. Assim, as regiões do DNA que estavam enroladas em nucleossomos podiam mudar, e as posições dos nucleossomos podiam mudar no DNA de célula a célula e durante o ciclo de vida de um organismo. A transcrição é reprimida quando o promotor e as sequências flanqueadoras estão enrolados em um nucleossomo, o que impede o início da transcrição pela RNA polimerase II. A ativação da trans- crição iria, portanto, exigir o deslocamento dos nucleossomos para longe do promotor. Por outro lado, quando a repres- são gênica é necessária, os nucleossomos mudam para uma posição que evita a transcrição. A mudança da posição dos nucleossomos é chamada de remodelagem da cromatina, processo sabidamente essencial à expressão gênica eucarió- tica, e grandes avanços estão sendo feitos na determinação dos mecanismos subjacentes e das proteínas reguladoras que nele tomam parte. Aqui, novamente, os estudos genéticos em leveduras foram fundamentais. Proteínas remodeladoras da cromatina e ativação gênica Duas triagens genéticas em leveduras a procura de mutantes em processos aparentemente não relacionados levaram à des- coberta do mesmo gene cujo produtoé essencial à remodela- gem da cromatina. Em ambos os casos, as células de leveduras foram tratadas com agentes que causariam mutações. Em uma triagem, essas células de leveduras mutagenizadas foram sub- metidas a uma triagem em busca daquelas que não cresciam bem em sacarose (mutantes não fermentadores de açúcar, snj). Na outra triagem, as células de levedura mutagenizadas foram triadas à procura de mutantes defeituosos em relação a mudar seu tipo reprodutivo (mutantes de mudança, swi; veja a Seção 12.5). Muitos mutantes para loci diferentes foram recuperados em cada triagem, mas viu-se um gene mutante que causava ambos os fenótipos. Os mutantes no chamado locus swi2/snj2 ("switch-sniff') não podiam usar efetivamente a sacarose nem mudar o tipo reprodutivo. Qual a ligação entre a capacidade de usar açúcar e a de mudar os tipos reprodutivos? A proteína Snf2-Swi2 foi puri- ficada e descobriu-se que fazia parte de um grande complexo multissubunitário, chamado complexo SWI-SNF, que pode reposicionar os nucleossomos em uma análise de tubo de ensaio se o ATP for fornecido como fonte de energia (Figu- ra 12.13). Em algumas situações, o complexo multissubuni- tário SWI-SNF ativa a transcrição movendo os nucleossomos que estão cobrindo as sequências TATA e, desse modo, faci- lita a ligação da RNA polimerase II. O complexo SWI-SNF é, portanto, um coativador. A Gal4 também se liga ao complexo SWI-SNF da remode- lagem da cromatina e o recruta para promotores ativados. A remodelagem da cromatina expõe sequências reguladoras Remodelagem do nucleossomo Figura 12.13 O octâmero de histonas desliza em resposta à ativi- dade de remodelagem da cromatina (tal como o complexo SWl-SNF), nesse caso expondo o DNA marcado em vermelho. (Veja detalhes na Figura 12.19 sobre como o SWl-SNF é recrutado para uma região específica do DNA.) [Oe}. Watson et ai., Molecular Biology of the Gene, Sth ed., © 2004, Benjamin Cummings.] Capítulo 12 I Regulação da Expressão Gênica em Eucariotos 371 As linhagens de leveduras que contêm um complexo defei- tuoso SWI-SNF mostram um nível reduzido de atividade de Gal4. Por que um ativador pode usar múltiplos mecanismos de ativação? Existem pelo menos dois motivos compreen- didos no momento. O primeiro é que os promotores-alvo ficam menos acessíveis em certos estágios do ciclo celular ou em certos tipos celulares (em eucariotos multicelulares). Por exemplo, os genes são menos acessíveis durante a mitose, quando a cromatina está mais condensada. Nesse estágio, a Gal4 tem de recrutar o complexo de remodelagem da croma-. - . ,,. tJ.na, enquanto, em outros momentos, nao seria necessar10 usar o complexo. Um segundo motivo é que muitos fatores de transcrição atuam em combinações para controlar a expressão gênica de maneira sinérgica. Veremos resumidamente que essa sinergia combinatória resulta do fato de que os complexos de remodelagem da cromatina e a maquinaria transcricional são recrutados mais eficientemente quando múltiplos fatores de transcrição atuam juntos. Mensagem. A cromatina pode ser dinâmica; os nucleossomos não estão em posições necessariamente fixas no cromossomo. A remodelagem da cromatina muda a densidade do nucleossomo ou a posição, e é parte integrante da regulação gênica eucarió- tica. Histonas e remodelagem da cromatina Vamos observar mais atentamente o nucleossomo para ver se alguma parte dessa estrutura poderia carrear a informação necessária para influenciar a sua posição e/ ou a sua densi- dade. Modificações das histonas. Como já foi visto, a maioria dos nucleossomos é composta por um octâmero constituído por duas cópias de cada uma das quatro histonas. As histonas são conhecidas como as proteínas mais conservadas na natureza; isto é, as histonas são quase idênticas em todos os organismos eucarióticos, de leveduras a plantas e animais. Essa conserva- ção contribuiu para uma visão de que as histonas não podem participar de algo mais complicado que a compactação do DNA para caber no núcleo. Entretanto, lembremos que o DNA, com suas quatro bases, também foi considerado uma molécula muito "simples" para ser o mapa de todos os orga- nismos do nosso planeta. A Figura 12.14 mostra um modelo da estrutura do nucle- ossomo que representa as contribuições de muitos estudos. Devemos notar que as proteínas histonas estão organizadas no cerne do octâmero com suas pontas aminoterminais fazendo contatos eletrostáticos com o esqueleto de fosfa- to do DNA circundante. Essas pontas que se projetam são chamadas de caudas de histonas. Desde o início da déca- da de 1960, sabe-se que resíduos de aminoácidos básicos específicos (lisina e arginina) nas caudas de histonas podem se modificar covalentemente pela ligação de grupos acetil e metil. Essas reações ocorrem após a proteína histona ter sido traduzida e mesmo após a histona ter sido incorporada ao nucleossomo. Existem hoje pelo menos 150 modificações diferentes de histonas que exigem uma ampla variedade de moléculas, além dos grupos acetil e metil já mencionados. O papel da acetilação de histonas na expressão gênica é descrito a seguir. Mais adian- te neste capítulo, vamos abordar o envolvimento da metilação de histonas na atividade e na repressão gênica. Acetilação, desacetilação de histonas e expressão gênica. A reação de acetilação é uma das modificações das histonas mais bem caracterizadas: o li +CoA e Grupo amino no final da cadeia lateral de lisina "s' "cH Acetil CoA 3 o li Grupo acetil / e" - N CH3 H Note que a reação é reversível, o que significa que os grupos acetil podem ser adicionados e removidos da mesma histona específica. Há 44 resíduos de lisina na histona dispo- níveis para aceitar os grupos acetil, de modo que a presença ou ausência desses grupos pode carrear muita informação. Modificações das caudas de histonas resultam na remodelagem da cromatina (a) Cromatina condensada Acetilação Meti lação H1 H1 (b) Cromatina aberta • H1 Figura 12.14 A remoção e o acréscimo de grupos acetil e meti! a caudas de histonas fazem com que os nucleossomos deslizem, afastando-se e expondo o DNA à atividade das proteínas que regulam a transcrição. 372 Introdução à Genética Por esse motivo, a modificação covalente das caudas de histo- nas é chamada de código de histonas. Os cientistas criaram essa expressão porque a modificação covalente das caudas de histonas é remanescente do código genético. Para o códi- go de histonas, a informação é armazenada nos padrões de modificação de histonas, e não na sequência de nucleotídios. Com mais de 150 modificações de histonas conhecidas, há um imenso número de padrões possíveis, e os cientistas estão apenas começando a decifrar seus efeitos na estrutura da cromatina e na regulação transcricional. Para aumentar essa complexidade, o código provavelmente não é interpretado de modo preciso em todos os organismos. No momento, vamos ver como a acetilação de aminoácidos de histonas influencia a estrutura e a expressão do gene. Durante anos, acumularam-se evidências de que as histonas associadas aos nucleossomos de genes ativos são ricas em gru- pos acetil (ditas hiperacetiladas), enquanto genes inativos são subacetiladas (hipoacetiladas). Demonstrou-se que a enzima responsável pela adição de grupos acetil, histona acetiltransfe- rase (HAT), é muito difícil de isolar. Quando finalmente ela foi isolada e deduzida a sua sequência proteica, descobriu-se que ela é um ortólogo de um ativador transcricional de levedura chamado GCN5 (significando que ela é codificada pelo mesmo gene em um organismo diferente). Assim, a conclusão foi de que GCN5 é uma histona acetiltransferase. Ela se liga ao DNA nas regiões reguladoras de alguns genes e ativa a transcrição acetilando histonas vizinhas. Considera-se, hoje, que vários complexos proteicos recrutados por ativadores transcricionais têm atividade da HAT. Como a acetilação das histonas facilita mudanças na expressãogênica? Parece haver pelo menos três mecanismos para fazer isso. Primeiro, a adição de grupos acetil a histonas específicas altera a interação em um nucleossomo entre o DNA e um octâmero de histonas, de modo que o octâmero mais provavelmente desliza ao longo do DNA para uma nova posição. Segundo, o acréscimo de grupos acetil altera a inte- ração entre nucleossomos adjacentes, resultando em uma cromatina mais aberta (Figura 12.14). Terceiro, a acetilação de histonas, em conjunto com outras modificações de histo- nas, influencia a ligação de proteínas reguladoras ao DNA. A proteína reguladora ligada participaria de várias funções que, direta ou indiretamente, aumentam a frequência de início da transcrição. Como outras modificações de histonas, a acetilação é reversível, e também foram identificadas histonas desace- tilases (HDAC). Tais proteínas são importantes na repres- são gênica. Por exemplo, na presença de galactose ou glicose, a ativação de genes GAL é evitada pela proteína Migl, um repressor de ligação a sequências específicas de DNA que se liga a um sítio entre o elemento UAS e o promotor do gene GAL1 (Figura 12.15). Mig1 recruta um complexo proteico chamado Tup1, que contém uma histona desacetilase e repri- me a transcrição gênica. O complexo Tupl é um exemplo de correpressor, que facilita a expressão gênica, mas, em si, não é um repressor de ligação ao DNA. O complexo Tup1 também é recrutado por outros repressores de leveduras, como MATa.2 (veja adiante), e contrapartes desse complexo são encontradas em todos os eucariotos. A desacetilação da histona pode desligar a transcrição gênica Gal4 ... ... ... -. , , ' 1 J 1 1 I 1 I X ' ' UAS Tup1~ ,...---... Mig1~ Sítio Mig1 GAL1 DESLIGADA Figura 12.15 O recrutamento de um complexo de repressão leva à repressão da transcrição. Na presença de glicose, a transcrição de GAL 1 é reprimida pela proteína Mig1, que se liga a um sítio entre UAS e o promotor do gene CAL 1. Mig1 recruta o complexo de repressão Tup1, o qual recruta uma histona desacetilase, desligando a trans- crição gênica. [Oe}. Watson et ai., Molecular Biology of the Gene, Sth ed., © 2004, Benjamin Cummings. ] Mensagem. Na maioria dos casos examinados, a acetilação e a desacetilação de histonas promovem e reprimem a transcri- ção gênica, respectivamente. Essas atividades são recrutadas para genes por ativadores específicos de sequência e repressores. Herança das modificações de histonas e estrutura da cromatina Conforme mencionado no Capítulo 7, o replissomo não ape- nas copia os filamentos parentais, mas também desmonta os nucleossomos nesses filamentos e os remonta tanto nos filamentos parentais como nos filamentos-filhos (veja a Figu- ra 7.23). Durante esse processo, as histonas antigas dos nucle- ossomos existentes distribuem-se de maneira aleatória para os filamentos-filhos e novas histonas são liberadas para o replissomo. Desse modo, as histonas antigas, com suas caudas modificadas, e as novas histonas, com caudas não modifi- cadas, são montadas nos nucleossomos que se associam a ambos os filamentos-filhos (Figura 12.16). As modificações realizadas pelas histonas antigas são responsáveis, em parte, pela herança epigenética. Como tais, essas modificações anti- gas denominam-se marcas epigenéticas, porque orientam a modificação das novas histonas. Meti lação do D NA: outra marca hereditária que influencia a estrutura da cromatina Há outra marca epigenética importante na maioria dos eucario- tos (mas não em todos), que não é uma modificação de histona, e sim o acréscimo de grupos metil aos resíduos de DNA após a replicação. Em geral, uma enzima liga esses grupos metil à posição do carbono 5 de um resíduo específico de citosina. NH2 1 e N-::7 4 ""'-e l 3 5 li _M_e_tilt_ra_ns_fe_ra_se_ -::7C~ 1 )C O N Citosina ( Grupo metil NH2 1 -::7C""'- / CH3 N3 4 sC 1 li -::7C~ 1 )C O N Capítulo 12 I Regulação da Expressão Gênica em Eucariotos 373 Herança dos estados da cromatina ,~~/ Nucleossomo Replicação ) Histonas recém-sintetizadas, sem código de histonas ....---... \_.,,._____, ) Histonas com código Figura 12.16 Na replicação, as histonas velhas (em roxo), com seus códigos de histonas, são dis_tribuídas de maneira aleatória para os fila- mentos-filhos, nos quais direcionam a codificação de histonas adjacentes recém-montadas (em laranja), para formar nucleossomos completos. Nos mamíferos, o grupo metil em geral é acrescentado à citosina em um dinucleotídio CG. O padrão de metilação é denominado metilação simétrica porque os grupos metil são encontrados em ambos os filamentos no mesmo contexto: C* G GC* Um número notável de resíduos C é metilado em mamí- feros: 70 a 80o/o de todos os dinucleotídios CG são metilados , no genoma como um todo. E interessante o fato de que a maioria dos dinucleotídios CG não metilados é encontrada em aglomerados perto dos promotores gênicos. Tais regiões denominam-se ilhas CpG, em que o "p" representa a ligação fosfodiéster. Dada essa distribuição, você acha que a meti- lação de C estaria associada a regiões ativas ou inativas do genoma? Se disse inativas, acertou. Como as modificações nas histonas, as marcas da metila- ção do DNA podem ser herdadas de maneira estável de uma geração celular para a seguinte. A herança da metilação do DNA é mais bem entendida que a herança das modificações de histonas. A replicação semiconservativa gera hélices-filhas que são metiladas em um de seus dois filamentos (o filamen- to parental). As moléculas de DNA metiladas em apenas um filamento denominam-se hemimetiladas. Grupos metil são acrescentados a filamentos não metilados pelas DNA metil- transferases, que têm alta afinidade por esses substratos hemimetilados. Tais enzimas são orientadas pelo padrão de metilação no filamento parental (Figura 12.17). Conforme veremos mais à frente neste capítulo, como a metilação do DNA é mais estável que as modificações de histonas, em geral está associada a regiões do genoma que são mantidas em um estado inativo por toda a vida de um organismo. Tais regiões serão discutidas em breve neste capítulo. Mensagem. A estrutura da cromatina é herdada de uma gera- ção celular para outra porque há mecanismos para replicar o DNA juntamente com as marcas epigenéticas associadas. Dessa maneira, a informação inerente nas modificações das histonas e os padrões de metilação do DNA existentes servem para recons- tituir a estrutura da cromatina local que havia antes da síntese do DNA e da mitose. 12.4 Ativação a curto prazo de genes em um ambiente de cromatina Como já vimos neste capítulo, a transcrição de genes eucarió- ticos liga e desliga durante a vida de um organismo. Para enten- der como os eucariotos regulam os genes durante a vida, é necessário ver como a cromatina muda durante a ativação transcricional. Além disso, o desenvolvimento de um organis- mo complexo exige que os níveis de transcrição sejam regula- dos em uma ampla gama. Pense no mecanismo de regulação como mais semelhante a um reostato que a um interruptor: em vez de um gene produzir muitas proteínas ou nenhuma, ele pode produzir um número qualquer intermediário, de- pendendo do nível de transcrição. Nos eucariotos, os níveis de transcrição são finamente ajustáveis em um ambiente de cromatina agrupando-se os sítios de ligação em acentuadores. Vários fatores de transcrição diferentes ou várias moléculas do mesmo fator de transcrição podem se ligar a sítios adjacentes. A ligação desses fatores a sítios que estão separados pela dis- tância correta leva a um efeito amplificado, ou superaditivo, no sentido de ativar a transcrição. Quando um efeito é maior do que o aditivo, é chamado de sinérgico. A ligação de várias proteínas reguladoras a múltiplos sítios de ligação em um acentuador pode catalisar a formação de um acentuassomo (enhanceosome), um grande complexo Um modelo de herança da metilação do DNA Metilado ReplicaçãodoDNA MCpG GpCM DNA metiltransferase MCpG ------ MCpG GpC )>- GpCM Figura 12 .17 Após a repl icação, os resíduos de di nucleotídios CG hemimetilados (mostrados como CpG) são completamente meti lados. Os filamentos parentais estão em preto e o fi lamento-fi lho em ver- melho. A letra "M" representa o grupo metil no nucleotídio C. [Oe Y. H. Jiang,]. Bressler e A. L. Beaudet, "Epigenetics and Human Disease'; Annu. Rev. Genomics Hum. Genet. 5, 2004, 479-5 7 O.] 374 Introdução à Genética Os acentuassomos ajudam a recrutar a maquinaria transcricional Proteínas de dobramento do DNA CBP RNA pol 11 Figura 12.18 O acentuassomo 13-interferon. Nesse caso, os fato- res de transcrição recrutam um coativador (CBP), que se liga tanto aos fatores de transcrição quanto à RNA polimerase li, iniciando a transcrição. [Oe A. }. Courey, "Cooperativity in Transcriptional Control'~ Curr. Biol. 7, 2001, R250-R253, Fig. 7. ] de proteínas que pode agir de maneira sinérgica para ativar a transcrição. Na Figura 12.18, pode-se ver como proteínas arquitetônicas dobram o DNA para promover interações cooperativas entre outras proteínas de ligação ao DNA. Nesse modo de ação do acentuassomo, a transcrição é ativada em níveis muito altos apenas quando todas as proteínas estão presentes e mantendo contato do modo certo. Para compreendermos melhor o que um acentuassomo é e como ele atua sinergicamente, vejamos um exemplo espe- cífico. Acentuassomo (l-i nterferon O gene humano de 13-interferon, que codifica a proteína anti- vira! interferon, é um dos genes mais bem caracterizados em eucariotos. Ele normalmente está desligado, mas é ativa- do em níveis muito altos de transcrição na infecção viral. A chave para a ativação desse gene é a montagem de fatores de transcrição em um acentuassomo a cerca de 100 pb ante- cedente ao TATA boxe e ao sítio de início da transcrição. As proteínas reguladoras do acentuassomo 13-interferon ligam- se à mesma face da dupla hélice de DNA. Ligadas ao outro lado da hélice estão várias proteínas estruturais que dobram o DNA e permitem que proteínas reguladoras diferentes se toquem e formem um complexo ativado. Quando todas as proteínas reguladoras estão ligadas e interagindo correta- mente, elas formam uma "plataforma'', um sítio de ligação de alta afinidade para a proteína CBP, uma proteína coativadora que também recruta a maquinaria de transcrição. A gran- de proteína CBP também contém uma atividade intrínseca de histona acetilase que modifica os nucleossomos e facilita altos níveis de transcrição. Embora o promotor do 13-interferon seja mostrado sem os nucleossomos na Figura 12.18, o acentuassomo é circun- dado por dois nucleossomos, chamados nuc 1 e nuc 2 na Figura 12.19. Um deles, o nuc 2, está estrategicamente posi- Os acentuassomos recru remodeladores nuc 1 GCN5 GCN5 + CBP de cromatina Acentuassomo nuc 2 O acentuassomo forma um "" sítio de ligação de GCN5, que '\ se liga e adiciona grupos acetil a nuc 1, 2. Complexo GCN5 Liga-se o coativador CBP, recrutando a RNA pol 11. SWl-SNF desloca nuc 2. RNA pol 11 A proteína de ligação a TATA (TBP) liga-se ao TATA boxe recém-exposto, permitindo que a transcrição comece. RNApol 11 Figura 12.19 O acentuassomo 13-interferon atua para mover os nucleossomos recrutando o complexo SWl-SNF. Capítulo 12 I Regulação da Expressão Gênica em Eucariotos 375 cionado no TATA boxe e no sítio de início da transcrição. Entretanto, considera-se agora que a ligação de GCN5, outro coativador, precede a ligação de CBP. GCN5 acetila os dois nucleossomos. Após a acetilação, os fatores ativadores de transcrição recrutam o coativador CBP, a holoenzima RNA pol II e o complexo de remodelagem da cromatina SWI-SNF, o último então posicionado para afastar o nucleossomo 37 pb do TATA boxe, tornando este boxe acessível à proteína de ligação TATA e permitindo que a transcrição seja iniciada. As interações cooperativas ajudam a explicar várias obser- vações curiosas sobre os acentuadores. Por exemplo, expli- cam por que, mudando qualquer fator de transcrição ou sítio de ligação, a atividade do acentuador é acentuadamente reduzida. Elas também explicam por que a distância entre os sítios de ligação dentro do acentuador é uma característica tão crítica. Além disso, os acentuadores não precisam estar perto do sítio de início da transcrição, como no exemplo mos- trado na Figura 12.19. Uma característica dos acentuadores é que conseguem ativar a transcrição quando estão situados a grandes distâncias do promotor (mais de 50 kb ), sejam antecedentes ou posteriores a um gene ou mesmo em um íntron. Isoladores de bloqueio de acentuador Um elemento regulador, como um acentuador, que conse- gue agir em dezenas de milhares de pares de bases, pode- ria interferir na regulação de genes vizinhos. Para evitar tal ativação promíscua, desenvolveram-se elementos regulado- res chamados de isoladores de bloqueio de acentuador. Quando posicionados entre um acentuador e um promotor, os isoladores de bloqueio de acentuador impedem que o acentuador ative a transcrição desse promotor. Tais isola- dores não têm efeito na ativação de outros promotores que não estejam separados de seus acentuadores pelo isolador (Figura 12.20). Vários modelos foram propostos para expli- car como um isolador poderia bloquear a atividade de um acentuador apenas quando colocado entre um acentuador e um promotor. Muitos dos modelos, como o mostrado na Figura 12.21, propõem que o DNA é organizado em alças que contêm genes ativos. De acordo com esse modelo, os Os isoladores de bloqueio de acentuador impedem a ativação de acentuador LIGADO Promotor 2 Acentuador Isolador de bloqueio de acentuador Promotor 1 r-~ 1 DESLIGADO Figura 12.20 Os isoladores de bloqueio de acentuador impedem a ativação gênica quando colocados entre um acentuador e um pro- motor. [Oe M. Gaszner e G. Felsenfe/d, "lnsulators Exploiting Transcriptional and Epigenetic Mechanisms'~ Nat. Rev. Genet. 7, 2006, 703- 7 7 3.] Modelo de como os isoladores de bloqueio de acentuador podem funcionar Promotor 2 ~ 1 1 ,_ _ - Acentuador Isolador de bloqueio de acentuador DESLIGADO Figura 12.21 Uma proposta é que os isoladores de bloqueio de acentuador (EB) criam novas alças que separam fisicamente um pro- motor de seu acentuador. [Oe M . Gaszner e G. Fe/senfe/d, "fnsu/ators: Exploiting Transcriptional and Epigenetic Mechanisms'~ Nat. Rev. Genet. 7, 2006, 703- 7 7 3.] 376 Introdução à Genética isoladores movem um promotor para uma nova alça, onde ele é protegido do acentuador. Como veremos adiante neste capítulo, os isoladores de bloqueio de acentuador são um componente fundamental de um fenômeno chamado de imprinting genômico. Mensagem. Os acentuadores eucarióticos conseguem agir a grandes distâncias para modular a atividade do aparelho de transcrição. Os acentuadores contêm sítios de ligação para muitos fatores de transcrição, que se ligam e interagem de maneira coo- perativa. Essas interações resultam em várias respostas, incluin- do o recrutamento de outros coativadores e a remodelagem da cromatina. 12.5 1 nativação a longo prazo de genes em um ambiente de cromatina Até agora, vimos como os genes são ativados em um ambiente de cromatina. No entanto, como visto no início deste capítulo, a maioria dos genes em genomas eucarióticos está desligada quase todo o tempo. Um dos achados mais surpreendentes da era genômica é o de que muitos genes eucarióticos são inativos por toda a vida do organismo, o que leva a duas perguntas que serão respondidas nesta seção. Primeiro, por que os organismos têm genes que estão sempre inativos? Segundo, como os organismos mantêm genes em um estado inativo por toda a vida? Um dos modelos mais úteis para entendermos os meca- nismos que mantêm a inatividade a longo prazo de genes diz respeito ao controle da mudança do tipo reprodutivo em leveduras. Os componentesdo Zoeus do tipo reprodu- tivo de leveduras foram abordados no fim da Seção 12.2. Aqui, enfocaremos o mecanismo de mudança do tipo reprodutivo, que exige que cada célula de levedura man- tenha cópias inativas dos genes a e a em algum lugar do seu genoma. Mudança do tipo reprodutivo e silenciamento gênico As células haploides de leveduras são capazes de mudar seu tipo reprodutivo, às vezes com tanta frequência como a cada ciclo celular. Dessa maneira, uma célula haploide de levedu- ra de um tipo reprodutivo (digamos a) forma uma colônia tanto de células a como de células a, que podem reproduzir- se para formar células diploides (a/a). Durante períodos de crise como os de escassez de nutrientes, cada célula diploide pode sofrer meiose e produzir quatro esporos haploides. Esse processo é vantajoso para a sobrevivência da espécie, por- que os esporos conseguem sobreviver melhor em condições ambientais adversas do que as células haploides. A análise genética de certos mutantes que não conseguem mudar seu tipo reprodutivo ou não conseguem reproduzir-se (eram estéreis) resultou em descobertas importantes sobre a mudança de tipo reprodutivo. Entre os mutantes de mudan- ça, havia vários Zoei mutantes, inclusive o gene HO e os genes HMRa e HLMa. Outro estudo revelou que o gene HO codifica uma endonuclease, enzima que cliva o DNA (veja o Capí- tulo 10), necessária para o início da mudança. Também se descobriu que os Zoei HMRa e HMLa, que estão no mesmo cromossomo que o Zoeus MAT, contêm "cassetes" dos alelos MATa e MATa, respectivamente, que não se expressam. Os Zoei HMR e HML são, portanto, "cassetes" silenciosos. Lem- bre, do Capítulo 8, que ocorre um tipo de silenciamento gênico quando o dsRNA interage com o complexo RISC para destruir o RNA complementar. Esse é um exemplo de silen- ciamento gênico pós-transcricional. Em contraste, HMRa e HMLa não podem ser transcritos e, como tais, são exemplos de silenciamento gênico transcricional. Dois aspectos da mudança do tipo reprodutivo são do interesse dos geneticistas: como as células mudam seu tipo reprodutivo e por que o HMRa e o HMLa são silenciosos em termos de transcrição? A chave para a mudança é a endonuclease HO, que inicia a mudança do tipo reproduti- vo inserindo uma quebra no filamento duplo no Zocus MAT. A interconversão do tipo reprodutivo, então, ocorre por um tipo de recombinação entre o segmento de DNA (um cassete) de um dos dois Zoei não expressos e o Zoeus MAT. O resultado é a substituição do cassete antigo no Zocus MAT por um novo cassete de HMRa ou HMLa. O tipo reprodutivo resultante é MATa ou MATa, dependendo de qual gene esteja no Zoeus MAT (Figura 12.22). O cassete inserido, na verdade, é copia- do do Zocus HML ou do HMR. Dessa maneira, a mudança é reversível porque a informação para os cassetes a e a está sempre presente nos Zoei HMR e HML, nunca sendo perdi- da. Portanto, a mudança de tipo reprodutivo é um exemplo de genes que precisam ser silenciados por toda a vida de um organismo. Como veremos mais tarde neste capítulo, o silenciamento de genes por toda a vida também ocorre em seres humanos e todos os outros mamíferos. O segundo aspecto de mudança do tipo reprodutivo que interessa aos geneticistas é o mecanismo subjacente de silen- ciamento gênico. Por que os genes nos cassetes HMR e HML não se expressam? Normalmente, esses cassetes são "silen- ciosos". Contudo, em mutantes SIR (reguladores silenciosos de informação), o silenciamento é comprometido, de modo que ambas as informações, a e a, são expressas. Os mutan- tes resultantes são estéreis. Isso significa que, em leveduras normais, não mutantes, genes nos cassetes HMR e HML são capazes de se expressar, mas não pela ação das proteínas Sir. As proteínas Sir2, Sir3 e Sir4 formam um complexo que é fundamental no silenciamento gênico. Sir2 é uma histona desacetilase que facilita a condensação da cromatina e ajuda a manter HMR e HML em domínios da cromatina onde a transcrição não pode ser iniciada. O silenciamento gênico é um processo muito diferente da repressão gênica: é um efeito de posição que depende da vizinhança na qual a informação genética está localizada. Por exemplo, um gene normalmente ativo inserido nos Zoei HMR ou HML seria silenciado. Vamos aprender mais sobre os efei- tos de posição depois, na seção sobre variegação por efeito de posição na mosca-das-frutas DrosophiZa meZanogaster. Capítulo 12 I Regulação da Expressão Gênica em Eucariotos 377 A mudança de tipo reprodutivo é controlada pela recombinação de cassetes de DNA (a) HMLa MATa HMRa Silencioso Silencioso Ativo Tipo reprodutivo a (b) HMLa é copiado para o /ocus MAT HMLa MATa HMRa Silencioso Tipo reprodutivo a (e) HMRa é copiado para o locus MAT HMLa Silencioso MATa HMRa Tipo reprodutivo a Figura 12.22 O cromossomo Ili de S. cerevisiae codifica três toei de t ipos reprodutivos, mas apenas os genes no locus MAT são expressos. HML codifica um cassete silencioso de genes a, e HMR codifica um cassete silencioso de genes a. A cópia de um cassete silencioso e a inserção por recombinação do locus MAT mudam o tipo reprodutivo. Comparação entre heterocromatina e • eu cromatina Vamos examinar por que o silenciamento gênico a longo pra- zo, do tipo que silencia HMR e HML, é um processo diferente da repressão gênica. Para tanto, é importante notar que a cromatina não é uniforme em todos os cromossomos: certas regiões cromossômicas têm a cromatina altamente conden- sada, denominada heterocromatina. Outros domínios são acondicionados em cromatina menos condensada, chamada eucromatina (veja a Figura 12.11b). A condensação da cro- matina muda no decorrer do ciclo celular. A cromatina das células que entram em mitose torna-se altamente condensa- da à medida que os cromossomos se alinham em preparação para a divisão celular. Após a divisão celular, as regiões que formam heterocromatina permanecem condensadas, espe- cialmente em torno dos centrômeros e telômeros ( denomi- nada heterocromatina constitutiva), enquanto as regiões que formam eucromatina ficam menos condensadas. Como vimos no exemplo do 13-interferon (veja a Figura 12.19), a cro- matina de genes ativos pode mudar em resposta ao estágio do desenvolvimento ou a condições ambientais, por exemplo. A principal distinção entre heterocromatina e eucromatina é que a primeira contém poucos genes, enquanto a segunda é rica em genes. Mas o que é heterocromatina, se não genes? A maioria do genoma eucariótico é composta por sequências repetitivas que não codificam proteína nem RNA estrutural - às vezes denominadas DNA lixo (veja o Capítulo 4). Assim, diz-se que os nucleossomos da heterocromatina densamente compactados (organizados em fibras de cromatina de 30 nm; veja a Figura 12.11a) formam uma estrutura "fechada" prati- camente inacessível às proteínas reguladoras e inapropriada para a atividade gênica. Em contraste, a eucromatina, com seus nucleossomos mais espaçados (organizados em fibras de 10 nm; veja a Figura 12.11a), adota uma estrutura "aberta" que permite a transcrição. Mensagem. A cromatina dos eucariotos não é uniforme. Regiões heterocromáticas altamente condensadas têm menos genes e frequências de recombinação menores do que as regiões eucromáticas menos condensadas. A variegação por efeito de posição em Drosophila revela vizinhanças genômicas Muito antes da descrição dos Zoei de reprodução silenciosa de leveduras, o geneticista Hermann Muller descobriu um fenômeno genético interessante ao estudar a Drosophila: existem vizinhanças cromossômicas que conseguem silenciar genes que são experimentalmente "relocados" para regiões adjacentes do cromossomo. Nesses experimentos, as moscas recebiam radiação X para induzir mutações em suas células germinativas. Na progênie das moscas irradiadas, fez-se uma triagem para detectar fenótipos incomuns. Uma mutação no gene white, perto da extremidade do cromossomo X, resulta 378 Introduçãoà Genética em uma progênie com olhos brancos, em vez dos olhos ver- melhos do tipo selvagem. Parte da progênie tinha olhos mui- to incomuns, com manchas brancas e vermelhas. O exame citológico revelou um rearranjo cromossômico nas moscas mutantes: no cromossomo X havia inversão de um pedaço do cromossomo que tinha o gene white (Figura 12.23). Inversões e outros rearranjos cromossômicos serão discutidos no Capí- tulo 17. Nesse rearranjo, o gene white, normalmente localiza- do em uma região eucromática do cromossomo X, agora está perto do centrômero heterocromático. Em algumas células, a heterocromatina consegue "espalhar-se" para a eucromatina adjacente e silenciar o gene white. Manchas de tecido branco no olho são derivadas dos descendentes de uma única célula na qual o gene white foi silenciado e assim permanece duran- te as futuras divisões celulares. Em contraste, as manchas vermelhas surgem das células em que a heterocromatina não se espalhou para o gene white, de maneira que esse gene permanece ativo em todos os descendentes. A existência de manchas vermelhas e brancas de células no olho de um único organismo ilustra de maneira indiscutível dois aspectos do silenciamento epigênico. Primeiro, a expressão de um gene pode ser reprimida em virtude de sua posição no cromos- somo, e não por uma mutação em sua sequência de DNA. Segundo, o silenciamento epigenético pode ser herdado de uma geração celular para a seguinte. Achados de estudos subsequentes em Drosophila e leve- duras demonstraram que muitos genes ativos são silencia- dos nessa maneira de mosaico quando são relocados para regiões adjacentes (perto de centrômeros ou telômeros) heterocromáticas. Portanto, a capacidade da heterocroma- tina de espalhar-se para a eucromatina e silenciar genes é um aspecto comum a muitos organismos. Esse fenômeno foi , denominado variegação por efeito de posição (PEV). E uma evidência forte de que a estrutura da cromatina é capaz de regular a expressão de genes - nesse caso, determinar se genes com sequência de DNA idêntica serão ativos ou silenciados. Mensagem. Genes ativos que são relocados para adjacências genômicas heterocromáticas podem ser silenciados se a hetero- cromatina espalhar-se para os genes. O silenciamento gênico é causado pela expansão da heterocromatina Cromossomo White+ G- -- _J -- -- Telômero A inversão coloca white+ perto da heterocromatina White+ Centrômero .. ---4 .. ~ Faceta '-=~4-:.>....L...-=----==-=-__.::::.....:::;:..--==-'---"--'.......;....--+-~--+-__,.__,~,...L....--'---',. verme 1 h a White+ 1 ~- fgg:-- -rxxfêxxxxx2~ .. Faceta branca A heterocromatina se espalha Gene white+ expresso Gene white+ expresso Gene white+ silenciado Olho do tipo selvagem O olho é uma mistura de facetas vermelhas e brancas. Figura 12.23 O rearranjo cromossômico produz variegação por efeito de posição. A inversão cromossômica coloca o alelo white do tipo selvagem perto da heterocromatina. A dispersão da heterocromatina silencia o alelo. As facetas do olho são brancas, em vez do vermelho do tipo selvagem onde o alelo foi silenciado. [Oe}. C. Eissenberg e 5. Elgin, Encyclopedia of Life Sciences. Nature Publishing Group, 2001, p. 3, Fig. 1.] Capítulo 12 I Regulação da Expressão Gênica em Eucariotos 379 0 QUE OS GENETICISTAS ESTÃO FAZENDO HOJE A análise genética de PEV revela proteínas necessárias para a formação de heterocromatina Os geneticistas deduziram que a PEV poderia ser explo- rada para identificar as proteínas necessárias para formar heterocromatina. Com essa finalidade, isolaram mutações em um segundo locus cromossômico que suprimia ou acen- tuava o padrão variegado (Figura 12.24). Os supressores da variegação [denominados Su(var)] são genes que, quando mutados, reduzem a dispersão da heterocromatina, o que significa que os produtos do tipo selvagem desses genes são necessários para a dispersão. De fato, os alelos Su(var) se mostraram valiosos para os cientistas interessados nas proteínas necessárias para estabelecer e manter o estado Li sina Monometil lisina heterocromático inativo. Entre mais de 50 produtos gêni- cos de Drosophila identificados por essas triagens estava a proteína-1 de heterocromatina (HP-1), que antes tinha sido encontrada associada a telômeros e centrômeros hete- rocromáticos. Portanto, faz sentido que uma mutação no gene que codifica HP-1 mostre-se como um alelo Su(var), porque de algum modo a proteína é necessária para gerar a estrutura da cromatina de ordem superior associada à heterocromatina. Mas por que HP-1 liga-se a algumas regiões do DNA e não a outras? A resposta veio com a descoberta de que outro gene Su(var) codifica uma metiltransferase que acrescenta grupos metil a um resíduo de aminoácido específico (lisina 9) na cauda da histona H3 (denominada histona H3 metiltransfe- rase ou HMTase). Uma das reações catalisadas pela HMTase é mostrada aqui: Dimetil lisina Trimeti! lisina Alguns genes acentuam ou suprimem a dispersão da heterocromatina Olho de Drosophila (white+ translocado) Mutações em segundo sít io que afetam a dispersão da heterocromatina E(var) Su(var) Dispersão acentuada. Mais white+ são silenciados. Dispersão suprimida. Menos white+ são silenciados. Figura 12.24 Mutações foram usa- das para identificar genes que suprimem, Su(var), ou acentuam, E(var), a variegação por efeito de posição. [Oe}. C. Eissenberg e 5. Elgin, Encyclopedia of Life Sciences. Nature Pub/ishing Group, 2001, p. 3, Fig. 1.] 380 Introdução à Genética O aminoácido lisina é abreviado como "K", e essas mar- cas epigenéticas são conhecidas como H3K.9me1, H3K.9me2 e H3K.9me3, respectivamente. A cromatina modificada dessa maneira liga-se a proteínas HP-1, que então associam-se para formar heterocromatina. Foram isoladas proteínas semelhan- tes à HP-1 e à HMTase em diversos grupos taxonômicos, o que sugere a conservação de uma função eucariótica importante. Vimos que regiões transcritas ativamente estão associadas a nucleossomos cujas caudas de histonas estão hiperacetiladas e que ativadores de transcrição como GCN5 codificam uma ativi- dade de histona acetiltransferase. Conforme já foi comentado, as marcas de acetil também podem ser removidas das histonas pelas histonas desacetilases. De maneira similar, a cromatina feita de nucleossomos que são metilados em H3K.9me e ligados com a proteína HP-1 contém marcas epigenéticas associadas à heterocromatina. Os cientistas agora conseguem separar a heterocromatina da eucromatina e analisar diferenças nas modificações das histonas e proteínas ligadas. O procedimen- to usado, imunoprecipitação da cromatina (ChIP, chromatin immunoprecipitation), é descrito no Capítulo 14. A Figura 12.25 ilustra que, na ausência de barreiras, a heterocromatina poderia espalhar-se para regiões adjacentes e inativar genes em algumas células, mas não em outras. Pode ser o que acontece com o gene white de Drosophila quando é translocado para perto do domínio de heterocromatina asso- ciado às extremidades dos cromossomos. Mas a dispersão da heterocromatina pode ser interrompida? Pode-se imaginar que a dispersão da heterocromatina para regiões gênicas ati- vas seria desastrosa para um organismo porque genes ativos seriam silenciados à medida que fossem convertidos em hete- rocromatina. Para impedir esse desastre potencial, o genoma contém elementos de DNA denominados isoladores de bar- reira (barrier insulators) que impedem a dispersão da hete- rocromatina, criando um ambiente local que não é favorável para a formação de heterocromatina. Por exemplo, um isolador de barreira poderia ligar HAT e, ao fazer isso, garantir que as histonas adjacentes fossem hiperacetiladas. Um modelo sobre como um isolador de barreira poderia atuar para "proteger" uma região de eucromatina de ser convertida em heterocro- matina é mostrado na Figura 12.26. Mensagem. O isolamento de proteínas críticas necessárias paraa formação de heterocromatina, inclusive HP-1 e HMTase, tornou-se possível pelo isolamento de linhagens mutantes de Dro- sophila que suprimiam ou acentuavam PEV. ,- - - _.,.. DESLIGADO 1 ,- - - _.,.. DESLIGADO 1 ,- - - _.,.. DESLIGADO 1 .--........ LIGADO ,- - - _.,.. DESLIGADO 1 ,- - - _.,.. DESLIGADO 1 ,- - - _.,.. DESLIGADO 1 .--........ LIGADO Figura 12.25 A dispersão da heterocromatina na eucromatina adjacente é variável. Em quatro células diploides geneticamente idên- t icas, a heterocromatina espalha-se o suficiente para desligar um gene em alguns cromossomos, mas não em outros. A heterocromatina e a eucromatina são representadas por esferas nas cores laranja e verde, respectivamente. [De M. Caszner e G. Felsenfeld, "lnsulators: Exploiting Transcriptional and Epigenetic Mechanisms'~ Nat. Rev. Cenet. 7, 2006, 703- 713. J 12.6 Silenciamento gênero-específico de genes e cromossomos inteiros Até o momento, discutimos domínios cromossômicos que estão abertos ou condensados em todos os membros de uma espécie. Nesta seção, vamos considerar dois fenôme- nos genéticos disseminados em mamíferos que dependem do sexo do indivíduo. Em tais casos, genes específicos ou mesmo um cromossomo inteiro são silenciados por toda a vida de um organismo. No entanto, ao contrário de outros exemplos, esses genes ou cromossomos são silenciados em um ou outro sexo, mas não em ambos. Os isoladores de barreira interrompem a dispersão da heterocromatina HP-1 ~ HMTase \ Heterocromatina Isolador de barreira Eucromatina Ac Figura 12.26 Nesse modelo, os isoladores de barreira recrutam atividades enzimáticas, como histona aceti ltransferase (HAT), que promovem a formação de eucromatina. "M" representa metilação e "Ac", acetilação. [De M . Caszner e G. Felsenfeld. " lnsulators: Exploiting Transcriptional and Epigenetic Mechanisms'~ Nat. Rev. Cenet. 7, 2006, 703- 713. J Capítulo 12 I Regulação da Expressão Gênica em Eucariotos 381 O imprinting genômico explica alguns padrões incomuns de herança O fenômeno de imprinting genômico foi descoberto há cerca de 20 anos em mamíferos. No imprinting genômico, alguns genes autossômicos têm padrões incomuns de heran- ça. Por exemplo, um alelo igf2 é expresso em um camun- dongo apenas se for herdado do pai do camundongo, um exemplo de imprinting materno, porque a cópia do gene derivada da mãe é inativa. Já um alelo H19 de camundongo só é expresso se for herdado da mãe. O H19 é um exemplo de imprinting paterno porque a cópia paterna é inativa. A consequência do imprinting parental é que os genes imprin- tados são expressos como se fossem a única cópia do gene ; presente na célula, muito embora existam duas. E importante lembrar que nenhuma mudança é observada nas sequências de DNA de genes imprintados, isto é, o gene idêntico pode ser ativo ou inativo na prole, conforme tenha sido herdado da mãe ou do pai. Se a sequência de DNA do gene não está correlacionada com a atividade, o que ocorre? A resposta é que, durante o desenvolvimento dos gametas, grupos metil são acrescenta- dos ao DNA nas regiões reguladoras de genes imprintados em apenas um dos sexos. Vimos anteriormente que o DNA de genes que estão desligados a vida inteira são em geral altamente metilados. No entanto, é importante notar que a metilação do DNA é uma das diversas marcas epigenéticas associadas à inativação a longo prazo de genes. Outras marcas incluem a metilação de aminoácidos de histonas específicos, incluindo H3K27me1. Voltemos novamente aos genes igf2 e H19 de camundon- go, para ver como funciona o imprinting no nível molecu- lar. Esses dois genes estão situados em um grupo de genes imprintados no cromossomo 7 de camundongo. Estima-se que haja 100 genes imprintados no camundongo, a maio- ria encontrada em grupos que compreendem 3 a 11 genes imprintados. (Os humanos têm a maioria dos mesmos genes imprintados que os camundongos.) Em todos os casos exa- minados, há um padrão específico de metilação de DNA para cada cópia de um gene imprintado. No caso do grupo igf2-H19, uma região específica do DNA que fica entre os dois genes (Figura 12.27) é metilada nas células germina- tivas masculinas e não metilada nas células germinativas femininas. Essa região é chamada de região de controle de imprinting (ICR). Portanto, a metilação da ICR faz com que igf2 seja ativo e H19 fique inativo, enquanto a ausência de metilação tem o efeito oposto. Como a metilação controla qual dos dois genes é ativo? A metilação age como um bloqueio à ligação de proteínas necessárias para a transcrição. Apenas a ICR não metilada (feminina) consegue ligar-se a uma proteína reguladora cha- mada CTCF. Quando ligada, CTCF atua como um isolador de bloqueio de acentuador que impede a ativação do acentuador da transcrição de Igf2. Entretanto, o acentuador nas fêmeas ainda pode ativar a transcrição de H19. Nos machos, CTFC não pode ligar-se à ICR, e o acentuador pode ativar a trans- crição de Igf2 (lembremos que os acentuadores podem agir a grandes distâncias). O acentuador, entretanto, não consegue O imprinting genômico demanda isoladores S? Alelo materno ---------------, l /gf2 1 li DESLIGADO >50 kb ô Alelo paterno e lgf2 li LIGADO >50 kb --- - --- ------ ---- LL - - ~ (.) e H19 ICR LIGADO ~~~ j H19 1 -' ' -' ' ' ' ' ' ' Acentuador ICR DESLIGADO Acentuador Figura 12.27 lmprinting genômico no camundongo. A região de controle do imprinting (ICR) não está metilada nos gametas fem ini- nos e pode ligar-se a um dímero CTCF, formando um isolador que bloqueia a ativação do acentuador de Jgf2. A metilação (M) de ICR nas célu las germinativas masculinas impede a ligação da CTCF, mas também impede a ligação de outras proteínas ao promotor H19. ativar H19, pois a região metilada estende-se para o promotor H19. O promotor metilado não se liga às proteínas necessárias para a transcrição de H19. Assim, vemos como um isolador de bloqueio de acen- tuador (nesse caso, CTCF ligada a parte de ICR) impe- de o acentuador de ativar um gene distante (nesse caso, Igf2). Além disso, vemos que o sítio de ligação de CTCF é metilado apenas nos cromossomos derivados do genitor masculino. A metilação do sítio de ligação de CTCF impede a ligação de CTCF nos machos e permite que o acentuador ative Igf2. Note que o imprinting parental pode afetar muito a análise de heredogramas. Como o alelo herdado de um genitor é ina- tivo, uma mutação no alelo herdado do outro genitor parece- rá ser dominante, quando, de fato, o alelo é expresso porque apenas um dos dois homólogos é ativo para esse gene. A Figu- ra 12.28 mostra como uma mutação em um gene imprintado pode ter resultados diferentes no fenótipo do organismo se herdado do genitor masculino ou do feminino. Muitas etapas são necessárias para o imprinting (Figu- ra 12.29). Logo após a fertilização, os mamíferos separam células que irão tornar-se suas células germinativas. Os imprints são apagados antes que as células germinativas se formem. Sem sua marca distinta de metilação do DNA, esses ' genes agora são ditos epigeneticamente equivalentes. A medida que essas células germinativas primordiais se tornam game- tas totalmente formados, os genes recessivos imprintados recebem a marca específica do sexo que determina se o gene será ativo ou silencioso após a fertilização. 382 Introdução à Genética Herança incomum de genes imprintados Sem mutações 1 A 17 f B ICR Mutação em gene imprintado ô 1 ~ B ICR DESFECHO NÃO AFETADO 1 A 17 j, r B ICR DESFECHO AFETADO 1 Figura 12.28 Uma mutação (representada pela estrela laranja) no gene A não terá efeito se herdada do macho. Abreviações: M, metilação; ICR, região de controle do imprinting. [De 5. T. da Rocha e A . C. Ferguson-Smith, "Genomic lmprinting'~ Curr. Biai. 14, 2004, R646-R649. ] Mas e quanto a Dolly e outros mamíferos clonados? Muitos pensavam que o imprinting genômicoimpunha a par- ticipação das células germinativas masculina e feminina no desenvolvimento de embriões de mamíferos. Isto é, os game- tas masculino e feminino contêm subgrupos diferentes de genes imprintados, de modo que as células germinativas de ambos os sexos precisam participar para que o embrião tenha um complemento completo de genes ativos imprintados. Por que, então, mamíferos como Dolly e, mais recentemente, porcos, gatos, cães e vacas que foram derivados de núcleos somáticos são capazes de sobreviver e desenvolver-se? Depois de tudo, como já foi mencionado, a mutação mesmo de um único gene imprintado pode ser letal ou levar a uma doença grave. No momento, os cientistas não compreendem por que a clonagem de muitas espécies de mamíferos é bem-sucedida. Entretanto, apesar desses sucessos, a clonagem é extrema- mente ineficiente em todas as espécies testadas. Na maioria dos experimentos, um clone bem-sucedido é um evento ex- tremamente raro, que demanda centenas, ou mesmo milha- res, de tentativas. Podemos pensar que a falha da maioria dos embriões clonados em se desenvolver em organismos viáveis é um atestado da importância dos mecanismos epigenéticos Etapas necessárias ao imprinting Macho Fêmea Dois genes ligados: Cromossomos homólogos um ativo, um silencioso lgf2 H19 Células germinativas primordiais - Células germinativas primordiais Gametas ! ! Espermatozoides Fertilização e desenvolvimento 1 lmprints apagados 2 lmprints iniciados 3 Propagação dos imprints lgf2 H19 - 1 ...... 1-- - 1 1- Ovócito 1 Alelo silenciado 1 Alelo ativo Figura 12.29 Como lgf2 e H19 são imprintados diferencialmente em machos e fêmeas. de regulação gênica nos eucariotos. Assim, isso ilustra como o conhecimento da sequência completa do DNA de todos . "" . . os genes em um organismo e apenas uma pr1me1ra etapa na compreensão da maneira pela qual os genes eucarióticos são regulados. Silenciamento de um cromossomo inteiro: inativação do cromossomo X Um fenômeno epigenético chamado de inativação do cro- mossomo X intriga os cientistas há décadas. No Capítulo 17, vamos aprender sobre os efeitos do número de cópias gênicas no fenótipo de um organismo. Por enquanto, é suficiente saber que o número de transcritos produzidos por um gene geralmente é proporcional ao número de cópias desse gene em uma célula. Os mamíferos, por exemplo, são diploides e têm duas cópias de cada gene situadas em seus autosso- mos. Para a grande maioria dos genes, ambos os alelos são expressos. Portanto, todos os indivíduos produzem o mes- mo número de transcritos desses genes, proporcional a duas cópias do gene. No entanto, há uma exceção a essa generalização. Os indi- víduos não produziriam o mesmo número de transcritos de Capítulo 12 I Regulação da Expressão Gênica em Eucariotos 383 genes localizados nos cromossomos sexuais se ambos os cro- mossomos X forem expressados nas fêmeas. Como discutido no Capítulo 2, o número de cromossomos X e Y difere entre os sexos, tendo as fêmeas de mamíferos dois cromossomos X e os machos apenas um. Considera-se que o cromossomo X de mamíferos contém cerca de 1.000 genes. As fêmeas têm o dobro de cópias dos genes ligados ao X com relação aos machos e expressariam duas vezes mais transcritos desses genes que os machos se não houvesse um mecanismo para corrigir esse desequilfbrio. (A ausência de um cromossomo Y não é um problema para as fêmeas, porque pouquíssi-- , . mos genes nesse cromossomo sao necessar1os apenas para o desenvolvimento dos machos.) Dizemos que as fêmeas pro- duzem duas doses de transcritos para cada dose produzida pelos machos. Esse desequilfbrio de dosagem é corrigido por um proces- so chamado de compensação de dose, que torna a quan- tidade da maioria dos produtos gênicos das duas cópias do cromossomo X nas fêmeas equivalente à dose única de cro- mossomo X nos machos. Em mamíferos, essa equivalência é obtida pela inativação aleatória de um dos dois cromossomos X em cada célula, em um estágio inicial no desenvolvimento. Esse estado inativo é, então, propagado para todas as células da prole. (Na linhagem germinativa, o segundo cromosso- mo X é reativado na ovogênese.) O cromossomo inativado, chamado de corpúsculo de Barr, pode ser visto no núcleo como uma estrutura heterocromática fortemente corada e altamente condensada. A inativação do cromossomo X é um exemplo de herança epigenética. Primeiro, a maioria dos genes no cromossomo X inativado (denominado Xi) é silenciada, e o cromossomo tem marcas epigenéticas associadas à heterocromatina, incluin- do H3K9me, hipoacetilação de histonas e hipermetilação de seu DNA. Segundo, a maioria dos genes, mas nem todos, no cromossomo inativo permanece inativa em todas as descen- dentes dessas células, embora a própria sequência do DNA fique inalterada. No momento, o mecanismo que converte um cromossomo X completamente funcional em heterocromatina é motivo de investigações. O processo é bem caracterizado no camundon- go, organismo em que a inativação do cromossomo X com- partilha muitos aspectos com a inativação do cromossomo X nas células somáticas humanas femininas. Ambos têm um locus no cromossomo X, denominado centro de inativação X (abreviado Xic), que produz um RNA de 17 kb que não codi- fica proteína (ncRNA; veja o Capítulo 8), denominado Xist. Acredita-se que o Xist seja transcrito de apenas um cromos- somo no início do desenvolvimento dos embriões de fêmeas de camundongo. O cromossomo que produz Xist é inativado porque o Xist cobre especificamente a região central desse cromossomo, levando à formação de heterocromatina. Não se sabe como o Xist é localizado em um cromossomo nem como dispara a conversão para heterocromatina. Um modelo interessante da maneira pela qual a transcrição de um ncRNA poderia influenciar a estrutura da cromatina no Xi é mostrado na Figura 12.30. De acordo com esse mode- lo, à medida que um ncRNA é transcrito pela RNA polimera- Modelo para inativação do cromossomo X Xi ANA pol 11 • • O Proteína que cobre Xi Xist O final de Xist é transcrito e liga-se à proteína que cobre Xi. A ANA polimerase li prende o ANA Xist a Xi. A proteína é transferida para a cromatina. O ANAXist é degradado para evitar difusão. -····· Figura 12.30 Modelo que mostra como o RNA Xist poderia agir em eis para ligar proteínas que inativam um cromossomo X ao formar heterocromati na. se II, proteínas ligam-se especificamente a suas sequências e catalisam as modificações de histonas que iniciam a forma- ção de heterocromatina. Desse modo, os ncRNA agem como amarras para recrutar proteínas modificadoras da cromatina para o cromossomo X do qual ele é transcrito. Mensagem. Na maioria dos organismos diploides, ambos os alelos de um gene são expressos independentemente. O imprin- ting genômico e a inativação do X são exemplos de expressão monoalélica. Nesses casos, mecanismos epigenéticos silenciam um único locus cromossômico ou uma cópia de um cromossomo inteiro, respectivamente. 12.7 Repressão gên ica pós-transcricional pelos miRNA O Xist é um exemplo da crescente classe de RNA funcionais (veja o Capítulo 8). Os RNAfuncionais não codificam proteínas; em vez disso, executam uma variedade de tarefas que exploram a complementariedade do RNA-RNA e do RNA-DNA. Os RNA funcionais discutidos aqui contêm sequências específicas que 384 Introdução à Genética direcionam proteínas ou complexos proteicos para locais na célula onde seus serviços são necessários. Por exemplo, o Xist age direcionando proteínas envolvidas na formação de hetero- cromatina para um dos dois cromossomos X. No Capítulo 8, mencionamos a título de introdução dois tipos de pequenos RNA funcionais: os siRNA e os miRNA. Nesta seção, vamos explorar como os miRNA ajudam na regulação da expressão gênica eucariótica. A função dos siRNA será considerada depois, no Capítulo 15. Lembre, do Capítulo 8, que os miRNA são
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