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Evolução histórica do direito comercial APRESENTAÇÃO Ao longo da história, os grupos cultivavam determinados produtos, caso a colheita fosse bem- sucedida e suficiente para prover o próprio sustento e de seu grupo, o restante seria usado como troca. Assim, teve início o sistema comercial. No entanto, com o passar dos anos, a necessidade de se constituir uma legislação que disciplinasse esse instituto tornou-se mais evidente. Inicialmente, o Código Comercial de 1850 foi estabelecido para disciplinar as relações mercantil entre os cidadãos. Anos mais tarde, o Código Civil, em 2002, trouxe em seu texto um livro disciplinando o ato empresarial e o empresário. Assim, nesta Unidade de Aprendizagem, você vai estudar a evolução do Direito Comercial desde os primórdios até o âmbito brasileiro, suas fases, bem como o surgimento da teoria da empresa e suas fontes. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Descrever a evolução normativa do Direito Comercial brasileiro.• Analisar a teoria da empresa como novo paradigma do Direito Comercial.• Identificar as fontes do Direito Empresarial.• DESAFIO Levando em consideração que até o ano de 2002 estava vigente o Código Civil de 1916 e o Código Comercial de 1850, bem como o Regulamento no 737 de 1850, veja o seguinte caso. Diante do que foi relatado, responda: o costume comercial pode ser provado por testemunha e servir de fonte de direito? INFOGRÁFICO Sociedades empresárias são as organizações econômicas dotadas de personalidade jurídica e patrimônio próprio, constituídas, ordinariamente, por mais de uma pessoa, que têm como objetivo a produção ou a troca de bens ou serviços com fins lucrativos, como disciplina o art. 981 do Código Civil. Essa organização é regulamentada pela legislação, as regras versam sobre a responsabilidade, assim como sobre as deliberações da sociedade, orientando cada tipo empresarial conforme suas especificidades, tais como: participação dos sócios, responsabilidades, proventos, grupos entre tantas outras providências. O Código Civil de 2002 positiva a sociedade empresária em seu artigo 981. Há diversos tipos regulamentados em leis, cada uma com suas particularidades; confira no Infográfico os detalhes de cada uma delas. CONTEÚDO DO LIVRO O texto final que instituiu o Código Comercial do Império do Brasil foi aprovado em 06 de março de 1850, sancionado em 25 de abril de 1850 e promulgado em 25 de junho do mesmo ano, transformando-se na Lei Federal no 556. O Direito de Empresa no Brasil começou a trilhar seu caminho ainda na época do Código Comercial. Desde então, a definição de empresa e de empresário foi se aperfeiçoando até atingir o que hoje é estabelecido pelo Código Civil. No capítulo Evolução histórica do direito comercial, do livro Direito Empresarial I, você conhecerá toda a evolução desse tema, suas fases, bem como o surgimento da teoria da empresa e suas fontes. Boa leitura. Evolução histórica do Direito Comercial Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Descrever a evolução normativa do Direito Comercial brasileiro. Analisar a teoria da empresa como novo paradigma do Direito Comercial. Apresentar as fontes do Direito Empresarial. Introdução A troca de produtos entre os seres humanos ocorre desde os tempos mais remotos da nossa história. No entanto, a necessidade de constituir uma legislação que disciplinasse esse instituto tornou-se cada vez mais evidente ao longo dos anos. Inicialmente, o Código Comercial de 1850 foi estabelecido para disciplinar as relações mercantis entre os cidadãos. Mais tarde, já em 2002, o Código Civil apresentou um livro que disciplina os atos empresarial e empresário. Neste capítulo, estudaremos a evolução e as fases do Direito Comercial brasileiro, bem como o surgimento e as fontes da teoria da empresa. Evolução do Direito Comercial brasileiro O ato de trocar produtos e serviços sempre existiu entre os seres humanos, antes mesmo de ser denominado comércio. Ao longo da história da humanidade, inúmeros grupos cultivavam produtos e, caso a colheita fosse bem-sucedida e sufi ciente para prover o sustento de todos os seus integrantes, o restante era usado como moeda de troca para que obtivessem provisões, alimentos e ferramentas que facilitassem as tarefas diárias. Inicialmente, as trocas se estabeleceram em função da necessidade imediata de subsistência, mas, mais tarde, percebeu-se a vantagem de produzir uma quantidade excedente que servisse como futuro escambo. Nesse primeiro período, caracterizado pela permuta de mercadorias e pela inexistência de uma moeda semelhante às que conhecemos hoje, sucedeu o que identificamos como troca direta (PORTO, 2014). Nessa fase, não havia a real presença do comércio categoricamente estabelecido, pois os produtos se reservavam apenas para o sustento, de modo que os contingentes ainda não cultivavam com vistas a trocas remanescentes, como sucederia com o transcorrer do tempo. Conforme leciona Martins (2000, p. 1): No início da civilização, os grupos sociais procuravam bastar-se a si mesmos, produzindo material de que tinham necessidade ou se utilizando daquilo do que poderiam obter facilmente da natureza para a sua sobrevivência alimentos, armas rudimentares, utensílios. O natural crescimento das populações, com o passar dos tempos, logo mostrou a impossibilidade desse sistema, viável apenas nos pequenos aglomerados humanos. Passou-se, então, à troca dos bens desnecessários, excedentes ou supérfluos para certos grupos, mas necessários a outros [...]. Inegavelmente, a troca melhorou bastante a situação de vida de vários agrupamentos humanos. Nos tempos primitivos, os seres humanos viviam em grupos, sendo a maioria nômade e pertencente à mesma família. Eles viviam afastados uns dos outros, fator que exigia a autossuficiência do grupo. Todavia, com o decurso do avizinhamento, iniciou-se a primeira forma de comércio propriamente dita: a troca, que ocasionou melhor aproveitamento das riquezas e maior dedicação do homem ao desenvolvimento das culturas, como cereais, gado, ferramentas, etc. O Direito Comercial se divide em quatro períodos. O primeiro se situa entre meados do século XII e fins do XVI, momento em que o Direito era aplicado somente a integrantes da corporação dos comerciantes, seguindo, portanto, um critério subjetivo para a sua aplicação (TRABALLI, 2016). Nesse período, cada país adotava um modo particular de desenvolver o comércio. A Grécia se baseava nos costumes e foi responsável pelos primeiros contratos relativos à comercialização marítima, assim como pela lei escrita. Já em Roma, o comércio se fundamentava no jus gentium (do latim “direito das gentes” ou “direito do povo”) e compunha-se de normas que eram aplicáveis aos estrangeiros, visto que a prática do comércio não era bem aceita pela aristocracia, pois era apontado como degradante (MEDEIROS, 2011). Evolução histórica do Direito Comercial2 Etimologicamente, o vocábulo comércio advém do latim commercium, que podemos traduzir como “tráfico de mercadorias”. Na acepção do termo, indica o câmbio espon- tâneo de mercadorias ou serviços por produtos diversos ou valores (MEDEIROS, 2011). No segundo período, entre os séculos XVI e XVIII, destacou-se o aperfei- çoamento do critério subjetivo, uma vez que surgiu o instituto da sociedade anônima, adequado aos empreendimentos da expansão colonial que ocorriam no momento. Já no terceiro período, entre o século XIX e a primeira metade do XX, fixou-se o critério objetivo sob a influência dos ideais iluministas da Revolução Francesa, quando enfim o Direito dos comerciantes se tornou o Direito dos atos do comércio, adotando o sistema francês. Em meados do século XX, aconteceu a unificação das normas do Direito Privado, de forma que o Direito Comercial deixava de indicar “atos de comércio”e passava a referir “empresa”, adotando o sistema italiano (TRABALLI, 2016). No que tange ao Brasil, ainda que o comércio desenvolvido no período colonial fosse intenso, o País submetia-se às regras da Coroa Portuguesa, sob regência do Rei Felipe II. Em 1603, ele editou as Ordenações Filipinas, em alusão ao seu nome, o que vigorou até determinado momento após a chegada de Dom João VI ao Brasil, em 1808. Pressionada por Napoleão, que ameaçou invadir Portugal, a Corte Lusitana refugiou-se no Brasil, então sob a condição de sede provisória da Coroa, e produziu profundas mudanças de caráter eco- nômico para a colônia, medidas que incontestavelmente contribuíram para o desenvolvimento da atividade mercantil (MORAES, 2011). A respeito desse momento histórico, é importante destacarmos o Decreto da Abertura dos Portos às Nações Amigas, promulgado em Salvador em 1808. Esse decreto determinava a reinstituição do Tribunal da Junta do Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegação no Rio de Janeiro, bem como a criação do Banco do Brasil, medidas que foram tomadas no mesmo ano da promulgação do docu- mento (MORAES, 2011). Em 1832, José Lino Coutinho, que ocupava o cargo de Ministro da Re- gência do Império, compôs uma comissão e nomeou José Antonio Lisboa, Inácio Ratton, Guilherme Midosi e Lourenço Westin, considerados os ne- gociadores, para, sob a presidência do magistrado Antonio Limpo Abreu, posteriormente substituído por José Clemente Pereira, apresentar um projeto 3Evolução histórica do Direito Comercial de código comercial. Tal projeto foi apresentado em 1834 e encaminhado à Câmara dos Deputados. Após os trâmites, o Código Comercial foi aprovado em 1845 e remetido ao Senado, de onde retornou com emendas. O texto final foi aprovado em 6 de março de 1850, sancionado em 25 de abril desse ano e promulgado pouco tempo depois, em 25 de junho, transformando-se na Lei Federal nº. 556, que formalmente instituía o Código Comercial do Império do Brasil (FRANÇA, 1977-1982). Na Figura 1, você pode conferir uma reprodução do Código Comercial de 1850. Figura 1. Reprodução da imagem original do Código Comercial do Império do Brasil, de 1850. Fonte: Ança (1977–1982). Regido por uma forte influência francesa, o Código Comercial brasileiro acolheu a teoria dos atos de comércio, que considerava como comerciante todo o indivíduo que realizasse compra e venda de mercadorias e de algumas classes Evolução histórica do Direito Comercial4 de serviços de forma profissional. Para que os comerciantes desfrutassem das benesses da legislação comercial, havia a obrigatoriedade disposta no art. 4°, que solicitava a inscrição nos tribunais do comércio, mais tarde denominados juntas comerciais (MORAES, 2011). Surpreendentemente, mesmo com todas as mudanças, não houve enume- ração dos chamados atos do comércio, diferentemente do que se encontrava no Código francês da época, que enumerava todos esses atos. Assim, somente após a edição do Regulamento nº. 737, em 25 de novembro de 1850, que o art. 19 disciplinou as diversas operações de câmbio, seguros, banco e corretagem, bem como a compra com o objetivo de posterior revenda de bens móveis ou semoventes, transporte de mercadorias, entre outros, como podemos verificar: Art. 19 Considera-se mercancia: § 1º A compra e venda ou troca de bens móveis ou semoventes, para os ven- der por grosso ou a retalho, na mesma espécie ou manufaturados, ou para alugar o seu uso. § 2º As operações de câmbio, banco e corretagem. § 3º As empresas de fábricas, de comissões, de depósito, de expedição, con- signação e transporte de mercadorias, de espetáculos públicos. § 4º Os seguros, fretamentos, riscos; e quaisquer contratos relativos ao co- mércio marítimo. § 5º A armação e expedição de navios (BRASIL, 1850, documento on-line). No decorrer dos anos, inúmeros dispositivos do Código Comercial foram suprimidos por novas regras, isto é, por leis que se adequassem melhor à evo- lução do comércio. Como exemplos, temos a Lei de Falências e Concordatas, de 1945, a Lei das Sociedades Anônimas, de 1976, etc. Igualmente impor- tante foi a edição da Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002, que instituiu o Código Civil e suprimiu quase todos os artigos que ainda regulavam os atos comerciais datados de 1850. Subsistiram apenas os que faziam referência ao comércio marítimo. A nossa legislação civil contemporânea foi influenciada pelo modelo do Código Civil italiano de 1942, que motivou a combinação legislativa entre o Direito Privado, agregando regras básicas dos Direitos Civil e Comercial. Com isso, o Código adveio para regular matérias específicas do Direito Comercial, como empresários, empresas, livros empresariais, registro público de empresas, nome empresarial, entre outras matérias (MORAES, 2011). 5Evolução histórica do Direito Comercial Teoria da empresa Juridicamente, a empresa surgiu na Europa no século XVII. No entanto, o Código Civil italiano de 1942 foi o verdadeiro marco no âmbito legislativo, sobretudo para os países que utilizavam o sistema da comercialidade, como o Brasil. Desde então, contemplava-se empresa mediante a adoção de leis esparsas que se adequassem ao caso concreto. Portanto, o Código italiano foi o instrumento que validou, de fato, o sistema normativo da empresa, visto que trouxe o estatuto jurídico qualifi cador do empresário, assim como o conceito de azienda (“empresa” em italiano). Dessa forma, ele organizou as atividades desenvolvidas e regulou as relações interpessoais de trabalho frente à empresa e em torno dela, todas as partes integradas de um único sistema de unifi cação obrigacional, suplementado por uma lei de falências independente (BULGARELLI, 1985). Logo, o Código Civil italiano associou a teoria da empresa à indispen- sabilidade de uma figura que se aplicasse a diversos moldes de atividades econômicas. A empresa foi inserida nessa circunstância como uma associação entre atividade econômica e organização. O legislador italiano não se ateve aos conceitos e particularidades, além de haver preterido a doutrina e a juris- prudência à atribuição de investigar esses elementos na esfera jurídica, nivelar princípios tradicionais em prol do lucro e da habitualidade, que são elementos determinantes do conceito de empresa (PACIELLO, 1978). Inúmeros jurisconsultos italianos se aplicaram ao estudo do conceito da empresa. Cesar Vivante (1932) defendia a ideia de que empresa é um organismo econômico que, por seu próprio risco, recolhe e põe em atuação sistemati- camente os elementos necessários para obter um produto destinado à troca. O doutrinador Waldírio Bulgarelli (1985), por sua vez, acrescenta que essa combinação dos fatores, sejam eles naturais, capitais ou trabalhistas, produ- ziriam resultados impossíveis de serem alcançados de maneira individual. Juntamente com o risco que o empresário assumiria para produzir uma nova riqueza, eles se tornariam requisitos indispensáveis à empresa. Atualmente, para conceituarmos empresa, é necessário atentarmos a quatro subdivisões que objetivam facilitar a administração e, ao mesmo tempo, evitar prejuízo. Como explica Coelho (2012), a persecução do lucro, a atividade econômica, o método do labor e a profissionalidade, aplicados de forma simul- tânea e harmônica, reduzem a probabilidade de eventuais perdas financeiras. Rubens Requião (2012) cita o parecer do professor Fábio Asquini ao explicar que a empresa não apresenta um único conceito devido à sua mutabilidade, de modo que é necessário pensarmos nela como um evento poliédrico, isto é, dividido em quatro formas (REQUIÃO, 2012): Evolução histórica do Direito Comercial6 1. Perfil subjetivo — a empresa é analisada perante a figura do seu administrador. 2. Perfil funcional — a instituição é analisada como investimento. 3. Perfil objetivo ou patrimonial — estuda a função dos bens da empresa, o que não engloba o estabelecimento empresarial, diferenciando, assim, o que é patrimônio individual do empresário.4. Perfil corporativo — a empresa é analisada enquanto instituição, o que inclui o seu administrador e os funcionários. De acordo com Requião (2012), a lição elaborada por Asquini demonstra que a empresa é compreendida como uma atividade organizada sem fins lucrativos, de forma que não há confusão entre a figura da empresa e a do estabelecimento. Como lecionam Valente, Castro Neto e Dias (2013), devemos lembrar que ela apresenta como foco principal produzir determinado bem ou serviço, além de obter lucro sobre o que foi investido inicialmente. Por outro lado, o estabele- cimento é o espaço para o funcionamento da empresa e, consequentemente, é fundamental na elaboração do produto ou na execução do serviço em questão. No século XIX, a doutrina passou a reconhecer a importância da relação existente entre as pessoas jurídicas do comércio, de modo a envolvê-las em parcerias que proporcionassem produtividade em larga escala, otimizassem a produção e reduzissem os custos. No século XX, no entanto, como explica Mamede (2008), torna-se essencial atentar às organizações com fins lucrativos, visto que objetivavam suprir as diversas exigências do público-alvo. Dessa forma, ocorre a transposição da teoria do comércio para a teoria da empresa. Notemos que a teoria da empresa transferiu a ocorrência do Direito Co- mercial de uma atividade (a prática de atos de comércio) para um indivíduo (o empresário), seja ela natural ou jurídica. A essência dessa teoria fundamenta- -se justamente nesse indivíduo economicamente estabelecido e determinado à produção e ou à circulação de bens e serviços que se denomina empresa. No Brasil, a reforma do Código Civil (BRASIL, 2002) permitiu a inserção de um livro específico para tratar do Direito de Empresa. Durante o processo de reforma do Código, o doutrinador Miguel Reale, que era supervisor da comissão elaborada para estabelecer o novo código, afirmou: O Código mantém, com efeito, a estrutura do Código anterior, porém com as modificações fundamentais, entre elas, a inserção de uma parte relativa ao Direito de Empresa, o qual veio dar colorido novo ao Direito Comercial. O Direito Comercial que teve no Brasil e tem ainda desde Mendonça até agora, grandes cultores, o Código Comercial mudou de significado e de represen- tatividade no momento em que surgiram atividades outras iguais senão su- 7Evolução histórica do Direito Comercial periores ao do próprio comércio. A indústria e o poderoso ramo dos serviços tornaram indispensável levar em consideração o conceito de empresa, para estabelecer a unidade das obrigações civis e comerciais que já se tornara uma realidade no Brasil em virtude do obsoletismo do Código Comercial de 1850. Os juristas não faziam mais referência ao Código, de 1850, mas em matéria de Direito Obrigacional tinham presente especificamente o Código Civil. A unidade das obrigações civis e comerciais já era, portanto, uma realidade vigente nos Tribunais e na doutrina quando eu assumi a responsabilidade de elaborar uma nova codificação. Este ponto de partida é fundamental para a noção daquilo que se entende por Código Civil de 2002. É que na realidade, nós não pretendemos fazer a codificação toda do Direito Privado, mas pura e simplesmente a unificação das obrigações civis e comerciais (Tribunal de Contas do Município de São Paulo [TCMSP], 2003, documento on-line). Assim, sob a responsabilidade do comercialista brasileiro Sylvio Marcon- des, o Direito de Empresa encontra-se disciplinado no Livro II do Código Civil de 2002. O seu art. 966 disciplina o que o termo “empresário” refere: “[...] considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade eco- nômica organizada para produção ou circulação de bens ou de serviços” (BRASIL, 2002, documento on-line). Segundo Nery Júnior e Nery (2008), a definição de empresário dá-se a partir da tarefa organizada com a finalidade de produzir lucro, ao gerar a disponibilidade de bens no mercado, combinando- -se ou não com os serviços prestados. Nesse sentido, o caráter de administrar os recursos disponíveis concede ao empresário um dos fatores inerentes ao bom desempenho da instituição, visto que a boa administração garante um menor índice de prejuízos aos investidores (VALENTE; CASTRO NETO; DIAS, 2013). Miranda (2009) defende que a empresa é o evento criado pelo ser humano como resultado do desenvolvimento instrumental e da evolução ideológica da sociedade, cuja finalidade é buscar os resultados esperados pelo empreen- dedor. Assim, o empresário coordena as funções exercidas na empresa com o objetivo de alcançar a meta definida. Podemos concluir, então, que a empresa é a instituição administrada pelo empresário com o intuito de produzir bens e serviços, enfocando o lucro (VALENTE; CASTRO NETO; DIAS, 2013). Fontes do Direito Empresarial As fontes do Direito Empresarial são os meios pelos quais as normas jurídicas se manifestam externamente e podem ser divididas em diretas ou primárias e indiretas ou secundárias. As fontes diretas, ou primárias, englobam as leis Evolução histórica do Direito Comercial8 comerciais, como o próprio Livro I do Código Civil de 2002 (BRASIL, 2002), que dispõe acerca dos contratos mercantis e dos títulos de crédito, ou o seu Livro II, que estabelece o Direito de Empresa. Ademais, há leis autônomas, de cunho comercial, como a Lei das Sociedades Anônimas (Lei nº. 6.404, de 15 de dezembro de 1976); a Lei do Registro de Empresas (Lei nº. 8.934, de 18 de novembro de 1994); a Lei da Propriedade Industrial (Lei nº. 9.279, de 14 de maio de 1996); a Lei sobre o Sistema Financeiro Nacional (Lei nº. 4.595, de 31 de dezembro de 1964); o Código de Defesa do Consumidor (CPC) (Lei nº. 8.078, de 11 de setembro de 1990), entre tantas outras. Já as fontes indiretas, ou secundárias, consistem nas analogias, nos costumes e nos princípios gerais do Direito. Elas são utilizadas para preencher eventuais lacunas legislativas que possam surgir, complementando o sistema normativo. Fontes na época das corporações de ofício No século X, a atenção se voltou ao comércio, que ganhava força e se expandia pelo mundo por meio das vias marítimas, o que fez com que a agricultura deixasse de ser a atividade econômica principal. Em virtude da tendência volante do ofício dos comerciantes desse período, a maior parte da população se instalava às margens dos feudos, movimento que originou as vilas e os burgos, desenvolvendo uma ligação entre os núcleos urbanos e a economia (MACHADO, 2005). Na época, não havia sistema regulamentar para ordenar a dinâmica mercantil em fase de desenvolvimento. Em consequência disso, as fontes adotadas no Direito do Comércio eram os usos e costumes dos próprios mercadores. É relevante salientarmos que, a partir da necessidade de ordem nas relações mercantis, surgiu o Direito, então conhecido pela expressão latina ius mercatorum. Dessa forma, os mercadores criaram as corporações de ofício. Havia in- tegrantes de cada uma das especialidades de comerciantes: carpinteiros, tecelões, ferreiros, artesãos, etc., todos ordenados e obedientes ao rito que regia o período, ou seja, os já mencionados usos e costumes. Tais regras eram manipuladas por um cônsul, que atuava como juiz ao julgar na esfera dos tribunais consulares de cada corporação. Contudo, além dos usos e costumes, a jurisprudência elaborada pelos cônsules e os estatutos das corporações mercantis também integravam o ius mercatorum (BARREIRA, 2017). Essa fase inicial do Direito Comercial seguia os regramentos advindos das fontes anteriormente citadas. Todavia, eles se aplicavam somente aos comer- ciantes associados a uma corporação, o que configurava, portanto, um direito subjetivo. Afinal, a regra era aplicada com base na interpretação individual, 9Evolução histórica do Direito Comercial logo, valia para o indivíduo, mas poderia não ser válida para todos. Porém, alterações nesse cenário não tardam, uma vez que as monarquias absolutistas se encontravamem ascendência, gerando tamanha insatisfação ao ponto de se extinguirem ao fim do século XVII. Em meio à Revolução Francesa, inicia-se a próxima fase de desenvolvimento do Direito Empresarial (BARREIRA, 2017). Fontes na época dos atos de comércio Com o Absolutismo em declínio e a Revolução Francesa em ebulição, no ano de 1804, Napoleão Bonaparte coroou-se imperador e implementou um novo sistema de governo, com novas regras. As fontes advindas da primeira fase, como os usos e costumes, os estatutos das corporações mercantis e a jurisprudência dos tribunais consulares, serviram como base para a elaboração do Código Comercial de 1808 na França, que passou a ser a fonte direta desse ramo do Direito (BARREIRA, 2017). Assim, o Estado criava leis, corporificadas pelos códigos, e se tornava a fonte principal do Direito. A teoria dos atos do comércio foi utilizada como critério objetivo de incidência do Direito Comercial e listava os atos costu- meiros praticados pelos comerciantes, sendo que os demais atos ficavam a cargo do Código Civil. A edição do Código francês trouxe o objetivismo e a segunda fase, que substitui o subjetivismo do sistema corporativista vigente na primeira fase de andamento do Direito Empresarial. Fontes na época da teoria da empresa Em decorrência da decadência da segunda fase, a teoria da empresa conquistou espaço e suprimiu a prática dos atos de comércio, de modo a se articular em direção ao desenvolvimento da atividade econômica organizada para reco- nhecer, na fi gura do empresário, o sujeito do ordenamento empresarial. Eis que se instaurou a terceira fase (BARREIRA, 2017), cujas fontes diretas ou primárias englobam as leis comerciais. Dessa forma, a lei é a principal fonte do Direito Comercial, que se fragmenta hierarquicamente em Constituição, Código Civil e legislação comercial extravagante, compreendendo regras que não estavam elencadas nos códigos. As fontes indiretas ou secundárias apresentam-se como ferramentas aces- sórias utilizadas na falta de uma lei que regule a matéria. Fazem parte desse rol os costumes, a analogia, a doutrina, a jurisprudência, a equidade e os princípios gerais do Direito. Tais fontes têm a função de se incorporar ao Direito para auxiliar em prol da melhor resolução do caso concreto. Evolução histórica do Direito Comercial10 Costume É a prática reiterada de hábitos sociais que, ao longo do tempo, tornam-se arraigados no espírito social, de forma que passa a transitar como se fosse lei. A aplicação frequente de atos ou hábitos incorpora-se ao costume e eles passam a ser percebidos como obrigatórios, momento em que a conduta repetitiva de uma ação ou hábito assume caráter de costume. Entre as diversas fontes subsidiárias, o costume alcança singular importância no âmbito empresarial e pode inclusive ser levado a registro na junta comercial. No entanto, esse registro não é necessário para ser levado a juízo, embora facilite a prova (ALBANO, 2012). Analogia Consiste em um método de interpretação jurídica empregado mediante a verifi cação de uma lacuna na lei, ou seja, em função da ausência de previsão específi ca. Nesse caso, adota-se uma norma que disciplina casos semelhantes. O CPC de 2015 contempla essa importante fonte secundária, estabelecendo que o juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuri- dade da lei. No julgamento da lide, cabe a ele aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de Direito. Doutrina Segundo a perspectiva dos especialistas no assunto, a doutrina resulta do estudo dos mestres, fi lósofos, estudiosos do Direito e operadores do sistema que, nas suas obras, retratam o verdadeiro sentido das normas. Jurisprudência É o agrupamento de deliberações judiciais cujos veredictos constantemente versam sobre casos semelhantes. Trata-se da resolução reiterada dos júris a respeito de casos de igual nexo fático. Equidade Compreende o exercício do bom senso ao se exercer a coerência e a adequação da regra ao caso concreto. 11Evolução histórica do Direito Comercial Jurisprudência é um termo jurídico, que significa o conjunto das decisões, aplicações e interpretações das leis A jurisprudência pode ser entendida de três formas, como a decisão isolada de um tribunal que não tem mais recursos, pode ser um conjunto de decisões reiteradas dos tribunais, ou as súmulas de jurisprudência Princípios gerais do Direito São convicções normativas de valor generalizado que adéquam e guiam o entendimento do ordenamento jurídico, de maneira a auxiliar a aplicação e a composição ou atualização das normas. Assim, os princípios gerais do Direito são convicções essenciais dessa faculdade do conhecimento humano. É o Direito que lhe confere embasamento e coesão com o respaldo da justiça, da liberdade, da igualdade, da democracia, da dignidade, e de toda e qualquer fonte de proteção fundamental em caráter geral incorporado ao seu âmbito de atuação. De acordo com Reale (2003, p. 37): Princípios são enunciações normativas de valor genérico, que condicionam e orientam a compreensão do ordenamento jurídico, a aplicação e integração ou mesmo para a elaboração de novas normas. São verdades fundantes de um sistema de conhecimento, como tais admitidas, por serem evidentes ou por terem sido comprovadas, mas também por motivos de ordem prática de caráter operacional, isto é, como pressupostos exigidos pelas necessidades da pesquisa e da práxis. No mesmo sentido, ao elucidar o significado de princípios, o doutrinador Delgado (2011, p. 180) leciona: “[...] princípio traduz, de maneira geral, a noção de proposições fundamentais que se formam na consciência das pessoas e grupos sociais, a partir de certa realidade, e que, após formadas, direcionam-se à compreensão, reprodução ou recriação dessa realidade”. ALBANO, C. J. Direito Empresarial. Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Paraná, Curitiba, 2012. Disponível em: <http://redeetec.mec.gov.br/images/stories/ pdf/proeja/direito_empresarial.pdf>. Acesso em: 9 ago. 2018. ANÇA, R. L. Projecto do Codigo commercial do Imperio do Brazil. In: FRANÇA, R. L. Enciclopédia Saraiva do Direito. São Paulo: Saraiva, 1977-1982. v. 15, p. 396. Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/227302>. Acesso em: 9 ago. 2018. BARREIRA, R. R. Teoria das fontes do Direito Empresarial: análise e releitura a partir do paradigma constitucional contemporâneo. 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Conteúdo: DICA DO PROFESSOR Ter uma empresa nos dias de hoje representa, para muitos, liberdade, afinal, você é o seu próprio chefe e pode definir suas horas de trabalho, escolher quem irá trabalhar com você, etc. Mas você sabe como se faz para abrir um negócio? Um dos itens essenciais é o contrato social. Na Dica do Professor a seguir, você verá mais detalhes sobre os caminhos para a construção de um contrato social. Confira. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! EXERCÍCIOS 1) Nos primórdios, por qual motivo os homens estabeleceram as trocas de mercadorias e produtos? A) Para que a colheita fosse bem-sucedida. B) Pela necessidade imediata de subsistência. C) Para prover o próprio sustento. D) Pois havia sobra de colheita. E) Apenas para estabelecer relação com os demais produtores. 2) Qual o objetivo de editar o regulamento no 737, de 1850? A) Para regular o Código Comercial promulgado no mesmo ano. B) Para efetivar as medidas instauradas em 1808. C) Para disciplinar as operações de mercância. D) Para dispor sobre a criação da Junta Comercial. E) Para se aproximar do Código Francês. 3) Qual o conceito de empresa defendido por Cesare Vivante? A) Organização com a persecução do lucro, a atividade econômica, o método do labor e a profissionalidade, utilizadas de forma simultânea e harmônica, reduzindo a probabilidade de eventuais perdas financeiras. B) Um organismo que combina fatores, sejam naturais, capitais ou trabalhistas, que produzam resultados que seriam impossíveis de serem alcançados de maneira individual. C) Um organismo econômico que, por seu próprio risco, recolhe e põe em atuação sistematicamente os elementos necessários para obter um produto destinado à troca. D) Uma atividade organizada, sem fins lucrativos, de forma que não há confusão entre a figura da empresa e a do estabelecimento. E) Uma atividade organizada que apresenta como foco principal a produção de determinado bem ou serviço, além de obter lucro sobre o que foi investido inicialmente. 4) Como são divididas as fontes da teoria da empresa? A) Costume, analogia, doutrina e jurisprudência. B) Apenas as fontes consideradas secundárias. C) Apenas as fontes consideradas primárias. D) Equidade, doutrina, jurisprudência e princípios gerais do direito. E) Fontes primárias e secundárias. 5) O que são princípios gerais do direito? A) Compreende o exercício do bom senso exercendo a coerência e adequação da regra ao caso concreto. B) É o agrupamento de deliberações judiciais, em que os vereditos constantemente versam sobre casos semelhantes. C) É a resolução reiterada dos júris a respeito de casos de igual nexo fático. D) Consiste em um método de interpretação jurídica, empregado quando ocorre uma lacuna na lei. E) São convicções normativas, de valor generalizado, que adequam e guiam ao entendimento do ordenamento jurídico, auxiliando na aplicação e ou na composição ou atualização das normas. NA PRÁTICA A responsabilidade dos sócios tem algumas limitações, principalmente no que tange ao lapso temporal após o desligamento da sociedade. Esse período é definido pelo Código Civil, em seu artigo 1003. Seguidamente, ocorre a situação em que, reconhecido crédito em reclamação trabalhista ao reclamante, no curso da execução de sentença, constata-se que o executado não possui patrimônio livre e desembaraçado para satisfazer o crédito do exequente. Nessas hipóteses, o próprio credor e seu advogado diligenciam ao máximo no sentido de encontrar quem seja responsável pelo débito da empresa, surgindo aí a oportunidade da desconsideração da personalidade jurídica da empresa devedora, ingressando o juízo da execução no patrimônio de um terceiro que venha a ser identificado como responsável pelo débito. Muitas vezes o ex-sócio, ou sócio retirante, é chamado como réu ao processo. Veja um caso desses a seguir. SAIBA MAIS Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor:
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