Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Universidade do Sul de Santa Catarina UnisulVirtual Palhoça, 2013 Teoria do conhecimento teoria_do_conhecimento.indb 1 09/01/13 17:22 Reitor Ailton Nazareno Soares Vice-Reitor Sebastião Salésio Herdt Chefe de Gabinete da Reitoria Willian Máximo Créditos Pró-Reitor de Ensino e Pró-Reitor de Pesquisa, Pós- Graduação e Inovação Mauri Luiz Heerdt Pró-Reitor de Desenvolvimento e Inovação Institucional Valter Alves Schmitz Neto Diretora do Campus Universitário de Tubarão Milene Pacheco Kindermann Diretor do Campus Universitário Grande Florianópolis Hércules Nunes de Araújo Diretor do Campus Universitário UnisulVirtual Moacir Heerdt Universidade do Sul de Santa Catarina – Unisul Gerente de Administração Acadêmica Angelita Marçal Flores Secretária de Ensino a Distância Samara Josten Flores Gerente Administrativo e Financeiro Renato André Luz Gerente de Ensino, Pesquisa e Extensão Roberto Iunskovski Coordenadora da Biblioteca Salete Cecília de Souza Gerente de Desenho e Desenvolvimento de Materiais Didáticos Márcia Loch Coordenadora do Desenho Educacional Cristina Klipp de Oliveira Campus Universitário UnisulVirtual Coordenadora da Acessibilidade Vanessa de Andrade Manoel Gerente de Logística Jeferson Cassiano Almeida da Costa Gerente de Marketing Eliza Bianchini Dallanhol Coordenadora do Portal e Comunicação Cátia Melissa Silveira Rodrigues Gerente de Produção Arthur Emmanuel F. Silveira Coordenador do Design Gráfico Pedro Paulo Teixeira Coordenador do Laboratório Multimídia Sérgio Giron Coordenador de Produção Industrial Marcelo Bitencourt Coordenadora de Webconferência Carla Feltrin Raimundo Gerência Serviço de Atenção Integral ao Acadêmico Maria Isabel Aragon Assessor de Assuntos Internacionais Murilo Matos Mendonça Assessora para DAD - Disciplinas a Distância Patrícia da Silva Meneghel Assessora de Inovação e Qualidade da EaD Dênia Falcão de Bittencourt Assessoria de relação com Poder Público e Forças Armadas Adenir Siqueira Viana Walter Félix Cardoso Junior Assessor de Tecnologia Osmar de Oliveira Braz Júnior Educação, Humanidades e Artes Marciel Evangelista Cataneo Articulador Graduação Jorge Alexandre Nogared Cardoso Pedagogia Marciel Evangelista Cataneo Filosofia Maria Cristina Schweitzer Veit Docência em Educação Infantil, Docência em Filosofia, Docência em Química, Docência em Sociologia Rose Clér Estivalete Beche Formação Pedagógica para Formadores de Educação Profissional. Pós-graduação Daniela Ernani Monteiro Will Metodologia da Educação a Distância Docência em EAD Karla Leonora Dahse Nunes História Militar Ciências Sociais, Direito, Negócios e Serviços Roberto Iunskovski Articulador Graduação Aloísio José Rodrigues Serviços Penais Ana Paula Reusing Pacheco Administração Bernardino José da Silva Gestão Financeira Dilsa Mondardo Direito Itamar Pedro Bevilaqua Segurança Pública Janaína Baeta Neves Marketing José Onildo Truppel Filho Segurança no Trânsito Joseane Borges de Miranda Ciências Econômicas Luiz Guilherme Buchmann Figueiredo Turismo Maria da Graça Poyer Comércio Exterior Moacir Fogaça Logística Processos Gerenciais Nélio Herzmann Ciências Contábeis Onei Tadeu Dutra Gestão Pública Roberto Iunskovski Gestão de Cooperativas Pós-graduação Aloísio José Rodrigues Gestão de Segurança Pública Danielle Maria Espezim da Silva Direitos Difusos e Coletivos Giovani de Paula Segurança Letícia Cristina B. Barbosa Gestão de Cooperativas de Crédito Sidenir Niehuns Meurer Programa de Pós-Graduação em Gestão Pública. Thiago Coelho Soares Programa de Pós-Graduação em Gestão Empresarial Produção, Construção e Agro- indústria Diva Marília Flemming Articulador Graduação Ana Luísa Mülbert Gestão da Tecnologia da Informação Charles Odair Cesconetto da Silva Produção Multimídia Diva Marília Flemming Matemática. Ivete de Fátima Rossato Gestão da Produção Industrial Jairo Afonso Henkes Gestão Ambiental. José Carlos da Silva Júnior Ciências Aeronáuticas José Gabriel da Silva Agronegócios Mauro Faccioni Filho Sistemas para Internet Pós-graduação Luiz Otávio Botelho Lento Gestão da Segurança da Informação. Vera Rejane Niedersberg Schuhmacher Programa em Gestão de Tecnologia da Informação Unidades de Articulação Acadêmica (UnA) teoria_do_conhecimento.indb 2 09/01/13 17:22 Livro didático UnisulVirtual Palhoça, 2013 Designer instrucional Eliete de Oliveira Costa Teoria do conhecimento Alexandre de Medeiros Motta Gabriel Henrique Collaço Marciel Evangelista Cataneo Vilson Leonel teoria_do_conhecimento.indb 3 09/01/13 17:22 Livro Didático Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Universitária da Unisul Copyright © UnisulVirtual 2013 Professores conteudistas Alexandre de Medeiros Motta Gabriel Henrique Collaço Marciel Evangelista Cataneo Vilson Leonel Designer instrucional Eliete de Oliveira Costa Projeto gráfico e capa Equipe UnisulVirtual Diagramador(a) Marina Broering Righetto Revisor(a) Diane Dal Mago ISBN 978-85-7817-535-1 Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida por qualquer meio sem a prévia autorização desta instituição. 121 T 29 Teoria do conhecimento : livro didático / conteudistas, Alexandre de Medeiros Motta, Gabriel Henrique Collaço, Marciel Evangelista Cataneo, Vilson Leonel ; design instrucional Eliete de Oliveira Costa. – Palhoça : UnisulVirtual, 2013. 103 p. : il. ; 28 cm. Inclui bibliografia. ISBN 978-85-7817-535-1 1. Teoria do conhecimento. 2. Filosofia. I. Motta, Alexandre de Medeiros. II. Collaço, Gabriel Henrique. III. Cataneo, Marciel Evangelista. IV. Leonel, Vilson. V. Costa, Eliete de Oliveira. teoria_do_conhecimento_capitulo_iniciais.indd 4 30/06/14 15:40 Sumário Introdução I 7 Capítulo 1 Concepções e formas de conhecimento I 9 Capítulo 2 Ciência, Tecnologia e Arte I 25 Capítulo 3 As raízes da Teoria do Conhecimento I 43 Capítulo 4 Questões do conhecimento no pensamento moderno e contemporâneo I 61 Capítulo 5 Ética na produção e socialização do conhecimento I 85 Considerações Finais I 97 Referências I 99 Sobre os Professores Conteudistas I 103 teoria_do_conhecimento.indb 5 09/01/13 17:22 teoria_do_conhecimento.indb 6 09/01/13 17:22 7 Introdução Somos modernos, buscamos mais do que viver, compreender a vida e tudo que nos rodeia, instiga e desafia. No dizer de Nietzsche, “o conhecimento em nós, transmudou-se em paixão, que não se intimida diante de nenhum sacrifício e no fundo nada teme; a não ser a sua própria extinção.” (NIETZSCHE, F. W. Obras incompletas. 5.ed. São Paulo: Nova Cultural, 1991. p. 139 (Os pensadores). A sociedade em que vivemos é frequentemente caracterizada como sociedade do conhecimento. Conhecimento é mais do que ter informações e dados sobre determinado tema ou assunto. Conhecimento implica saber quais informações e dados são relevantes e em que situações usá-los. Conhecimento é sabedoria de vida. Esta perspectiva filosófica está na base de todo esforço humano por compreender as coisas e o mundo e atribuir-lhes sentido. Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai refletir sobre o conceito de conhecimento, suas formas, caminhos e possibilidades. Ele será apresentado como uma produção histórica e cultural. Uma reflexão filosófica e prática (isto é o sentido lato de “teoria”) sobre as raízes, desenvolvimento histórico e atualidade do conhecimento. Você ainda irá desenvolver as habilidades que lhe são inerentes: refletir criticamente, saber julgar e detectar contradições e incoerências na realidade e discursos, elaborar conclusões, saber argumentar em favor delas e demonstrá-las. Tudo isto, sempre atento/a às responsabilidades e exigências éticas da produção e socialização do conhecimento. Por fim, cabe ressaltar a importância desta Unidade de Aprendizagem para a sua trajetória universitária. As habilidades, conteúdos e atividades aqui disponibilizados são “propedêuticos”, ou seja, preparatórios para o estudo e compreensão de todas as outras Unidades de Aprendizagem do itinerário formativoque você escolheu. Todos os itinerários disponíveis na formação superior exigem a correta compreensão da questão do conhecimento e da aplicabilidade das suas conquistas e reconhecimento dos seus limites e responsabilidade, na busca de solução para os desafios e problemas que marcam os campos do saber e de ocupação profissional hodiernos. O pensamento e o conhecimento produzem ideias, renovam todas as coisas, reinventam o mundo. Entre as qualidades exigidas de todos nós nas relações sociais e laborais, se sobressai a capacidade de pensar e de tomar decisões. Ou seja, avaliar o peso de cada coisa, fato, situação. Medir o peso de cada teoria_do_conhecimento.indb 7 09/01/13 17:22 8 atitude, escolha, decisão. A sobrevivência e o sucesso pessoal e profissional em realidade tão competitiva dependem desta capacidade – oferecida pela teoria do conhecimento e pela ética, de compreender o mundo, os relacionamentos e as circunstâncias que nos rodeiam e nos definem. Vale muito o esforço para compreender os conteúdos, desenvolver as habilidades, apreender as competências desta Unidade de Aprendizagem. Esta atitude pode fazer a diferença na sua carreira acadêmica. Bons estudos! teoria_do_conhecimento.indb 8 09/01/13 17:22 9 Secões de estudo Habilidades Capítulo 1 Concepções e formas de conhecimento Este capítulo foi elaborado para propiciar ao aluno o desenvolvimento das habilidades de compreensão do conceito de conhecimento, observando as distinções das formas de conhecimento e a identificação das principais características do conhecimento do senso comum, artístico, religioso, filosófico e científico. Seção 1: A origem do conhecimento Seção 2: Tipos de conhecimento teoria_do_conhecimento.indb 9 09/01/13 17:22 10 Capítulo 1 Seção 1 A origem do conhecimento A palavra conhecimento tem sua origem no latim, cognitio, e pressupõe, necessariamente, a existência de uma relação entre dois polos: de um lado o sujeito e de outro o objeto. Figura 1.1 – Relação sujeito-objeto Fonte: Elaboração dos autores. Na relação sujeito-objeto, o sujeito é aquele que possui capacidade cognitiva, isto é, capacidade de conhecer. O objeto é aquilo que se manifesta à consciência do sujeito, que é apreendido e transformado em conceito. Isso equivale a dizer que o conhecimento é o ato, o processo pelo qual o sujeito se coloca no mundo e, com ele, estabelece uma ligação. Por outro lado, o mundo é o que torna possível o conhecimento ao se oferecer a um sujeito apto a conhecê-lo. (ARANHA; MARTINS, 1999, p.48). Temos que levar em consideração que todas as formas de conhecimento coexistem. Podemos pensar um fenômeno por meio de matrizes de compreensão, como o conhecimento do senso comum, filosófico, religioso, artístico e científico. Com suas peculiaridades, aproximações e diferenças, aparecem diferentes maneiras de o sujeito “conhecer”. E conhecer, segundo Costa (2001, p. 4, grifo do autor) “é mais do que ter na memória um conjunto de informações: é conseguir fazer com que essas informações transformem-se em prática e sejam úteis sob a perspectiva pessoal, profissional, social ou política”. Todas as pessoas julgam conhecer algo e, de fato, podemos dizer que o ser humano naturalmente busca conhecer o mundo a sua volta, pois essa é uma condição para manter-se vivo. Algumas vezes, dirigimos nossas perguntas ao mundo, outras vezes ao próprio fenômeno do conhecimento. Isso inclui o homem e o mundo na mesma dimensão e, então, temos uma visão mais complexa da realidade e a compreensão de nós mesmos como sujeitos ativos na produção do conhecimento. teoria_do_conhecimento.indb 10 09/01/13 17:22 Teoria do conhecimento 11 Num sentido geral, podemos dizer que conhecimento é o que permite aos seres vivos manterem-se vivos. Nesse caso, uma planta sabe que deve virar sua folhagem em direção à luz, assim como um cavalo sabe que determinado solo não é seguro para caminhar, e um homem sabe que, se jogar um objeto acima de sua cabeça, poderá, quando em queda, atingi-lo. Porém, num sentido exato, não seríamos capazes de definir, tão brevemente, o que é o conhecimento. Para Luckesi e outros (2003, p. 137-138), existem duas maneiras de o sujeito se apropriar do conhecimento. A primeira consiste na apropriação direta da realidade sem a mediação de outra pessoa ou de algum outro meio. Nesse caso, o sujeito opera “com” e “sobre” a realidade. A segunda ocorre de forma indireta, na qual a compreensão se dá por intermédio de um conhecimento já produzido por outra pessoa ou por meio de símbolos orais, gráficos, mímicos, pictóricos etc. 1.1 Distinção entre o conhecimento humano e o de outros animais Ao contrário do que acontece com outros animais, nos seres humanos existe uma clara diferença entre os dados percebidos no meio ambiente e as respostas expressadas como reação. A diferença se deve ao fato de que, além do comportamento instintivo, exclusivamente reativo, o ser humano tem um comportamento reflexivo. Antes de manifestar uma reação, o homem faz uma pausa e reflete. Imagina, idealiza e conceitua aquilo que apreende do mundo e depois é capaz de reconhecê-lo e identificá-lo. O ser humano atribui significado às coisas do mundo físico, às imagens mentais que ele mesmo constitui e aos sentimentos que experimenta. O desenvolvimento dessa capacidade de reflexão permitiu a ele agir baseado em uma vontade consciente e não mais somente nos instintos. Acredita-se que, em períodos remotos, o conhecimento humano respondia exclusivamente à necessidade de sobrevivência. Porém, por razões ainda não completamente elucidadas, ele foi além das solicitações imediatas, enquanto ser biológico, e passou a procurar respostas, por uma necessidade de compreensão e ordenação do mundo. A manifestação definitiva desse pensamento ordenador se deu com a criação de um sistema simbólico específico que chamamos de linguagem, capaz de representar a realidade, expressar o pensamento e comunicá-lo aos outros. Perceba que o ser humano ordena e dá significado ao mundo e isso inclui comunicá-lo. Disso depende a consolidação e validação do conhecimento, a existência da sociedade etc. teoria_do_conhecimento.indb 11 09/01/13 17:22 12 Capítulo 1 Nesse sentido, é difundida a tese de que existe certa correspondência entre a linguagem e a complexidade das operações mentais que um ser humano é capaz de executar. A capacidade humana de operar com elementos e situações abstratas está ligada a uma linguagem apropriada para transmitir raciocínios, de modo que, quanto mais complexo é o sistema de comunicação, mais complexo é o pensamento e o conhecimento humano. No decorrer da história da humanidade, desenvolveram-se e tornaram-se cada vez mais complexos os meios de comunicação e de socialização do conhecimento. O conhecimento depende do caráter coletivo, depende do outro. Ora, “dizer” ao outro o que se sabe é fundamental para a compreensão do meio ambiente e de si próprio. Esse “dizer” do homem não tem a função exclusiva de representar o mundo, mas também recria a realidade, à medida que não somente reproduz o que apreende, também abstrai, interpreta e humaniza a realidade. Por se tratar de um animal capaz de refletir sobre si mesmo, de ser autoconsciente, o ser humano produziu inúmeros tipos de conhecimento, além de ver a si como sujeito cognoscente, ou seja, como um ser que é capaz de conhecer. Agora que você acompanhou essas considerações preliminares sobre o conhecimento, veja como Abbagnano (2000) o define: Conhecimento encontra-se definido como um procedimento operacional, uma técnica de verificação de um objeto qualquer, isto é, qualquer procedimento que torne possível a descrição, o cálculo ou a previsão controlável de um objeto; e por objeto há de entender-se qualquer entidade, fato, coisa, realidade ou propriedade, que possa ser submetido a um tal procedimento. A relação cognitiva é uma identidade ou semelhança,e a operaçãocognitiva é um procedimento de identificação com o objeto ou uma sua reprodução. A relação cognitiva é uma apresentação do objeto e a operação cognitiva um processo de transcendência. Bem, na definição citada, permeiam várias questões importantes da Teoria do Conhecimento. Entre as suscitadas, destacamos duas fundamentais: a relação entre o sujeito e o objeto do conhecimento; a diferenciação entre o conhecimento empírico e o conhecimento abstrato. Acompanhe, na sequência, explicações sobre cada uma destas questões. teoria_do_conhecimento.indb 12 09/01/13 17:22 Teoria do conhecimento 13 1.1.1 Relação entre o sujeito e o objeto do conhecimento Retomamos aqui o que foi rapidamente explicado no início deste capítulo. É possível definir o conhecimento como algo que emerge da interação entre o sujeito que conhece ou deseja conhecer e o objeto a ser conhecido ou que se dá a conhecer. Nesse caso, o conhecimento pode ser identificado como processo ou como resultado da apreensão do objeto pelo sujeito. O objeto não é entendido, aqui, exclusivamente como sendo físico, mas no sentido de “objeto do conhecimento”, que inclui coisas e fenômenos físicos e mentais, mesmo tudo aquilo que se dá a conhecer. Essas operações são entendidas como ações internas do sujeito cognoscente, organizadas e coordenadas para fazer combinações, juntar e separar ideias, conceitos, imagens etc. Entre as operações mentais temos a abstração, a análise, a comparação, a classificação, a memorização, a imaginação etc. Conforme Ferrater Mora (1994), a fenomenologia é um método de investigação contemporâneo que propõe descrever a realidade como ela se apresenta. Para a fenomenologia nada deve ser pressuposto: nem o mundo natural, nem o senso comum, nem as proposições da ciência, nem as experiências psíquicas. Deve-se colocar “antes” de toda crença e de todo julgamento o simplesmente “dado”. Ao apreender o objeto, o sujeito cognoscente forma uma imagem mental que, até certo ponto, reproduz as características e propriedades do objeto. É a partir dessa imagem que as operações mentais interpretam e dão significado ao que é apreendido, ou seja, desenvolvem o conhecimento. A princípio, pode parecer que o sujeito exerce um papel exclusivamente ativo na apreensão do conhecimento, contra um papel passivo do objeto apreendido, e que ambos, sujeito e objeto, são seres independentes. Ora, tais papéis não são tão bem definíveis assim. Os sujeitos interagem no processo de construção do conhecimento e sofrem “passivamente” a interferência do ambiente cultural, do mundo do trabalho, do cotidiano etc. A própria linguagem envolvida nas informações e na socialização do conhecimento se torna relevante para esse processo. Além disso, o sujeito apreende o objeto e lhe atribui um significado, mas é inegável que esse conhecimento também modifica o próprio sujeito. A relação entre o sujeito e o objeto do conhecimento é um tema de discussão típico da Teoria do Conhecimento. Correntes filosóficas como a fenomenologia defendem que sujeito e objeto são distintos - visto que o sujeito somente pode apreender o que está fora de si - mas esses são tão interligados no ato de conhecer que não faz sentido tratá-los como entes independentes. teoria_do_conhecimento.indb 13 09/01/13 17:22 14 Capítulo 1 Para a fenomenologia, o sujeito que conhece tem uma intencionalidade que interfere na apreensão e no entendimento do objeto. Esse entendimento, por sua vez, pode modificar-se e adquirir outro significado em relação a outros objetos do contexto. Existem outras peculiaridades relativas ao sujeito e ao objeto do conhecimento, em que algumas vezes o objeto do conhecimento é o próprio sujeito que conhece; em outras, o objeto do conhecimento é uma ideia forjada pela mente do sujeito cognoscente de algo que não existe, tal como a ideia de um cavalo alado. Ainda, a distinção entre o sujeito e o objeto permite estabelecer um parâmetro de objetividade em que, quanto mais “distância” houver entre o sujeito e o objeto, mais “objetivo” e universal, pode-se dizer, que é o conhecimento; e quanto mais “próximo” um estiver do outro, mais comprometida fica essa objetividade, pois mais subjetivo será o conhecimento emergido dessa interação. A objetividade é uma característica daquele conhecimento que não depende dos pontos de vista particulares, mas do consenso entre especialistas. No caso do conhecimento científico, a instituição conhecida como comunidade científica cerca-se de regras, métodos e instrumentos que buscam garantir a validade universal do conhecimento em questão. Principalmente pela utilização da linguagem matemática, tanto na formulação quanto na comunicação das suas teorias, a ciência busca evitar equívocos ou duplas interpretações. Além disso, as condições em que as experimentações científicas são realizadas não dependem da “escolha” dos cientistas, não são acidentais ou variadas, de acordo com a experiência de vida de cada pessoa, mas são determinadas pela comunidade científica, seguem procedimentos preestabelecidos. Tudo isso faz com que o conhecimento científico sobre o objeto estudado seja o mais fiel possível ao próprio objeto, de acordo com o jeito que ele existe e não do jeito que um ou outro cientista julga que ele é, ou seja, tudo isso faz com que o conhecimento científico seja objetivo. Sendo assim, para finalizar esta seção, segundo Costa (2001, p. 4), “conhecer é apropriar-se mentalmente de algo”. Um resultado de uma busca de conhecimento, que não basta acumular informações e experiências, mas o mais importante é saber a maneira como essas serão aplicadas. A seguir você conhecerá os tipos de conhecimento, cada qual com suas características. teoria_do_conhecimento.indb 14 09/01/13 17:22 Teoria do conhecimento 15 Seção 2 Tipos de conhecimento No cotidiano, é comum ouvir as pessoas afirmarem que conhecem coisas. O mecânico diz que conhece o carro. A mãe diz que conhece o filho. O advogado conhece a questão. O mendigo conhece a praça. O treinador conhece o time. O matemático conhece a fórmula etc. Nas situações citadas, o conhecimento tem significado diverso e, ao mesmo tempo, mantém algo em comum, visto que todos os sujeitos afirmam conhecer. O conhecimento pode ocorrer de diversas formas, isso significa dizer que um único objeto pode ser entendido à luz de diversos ângulos e aspectos. Estamos nos referindo aos tipos de conhecimento: senso comum, filosófico, religioso, artístico e científico. Para facilitar a compreensão deste assunto, considere, como exemplo, o problema da justiça. Você já imaginou de quantas formas é possível compreender este fenômeno tão antigo na história da humanidade? Esse problema pode ser “entendido” à luz do senso comum, da Religião, da Arte, da Filosofia e da Ciência. Você já imaginou as soluções que os referidos tipos de conhecimento apresentariam para esse problema? Observe a figura: Figura 1.2 – Tipos de conhecimento Fonte: Elaboração dos autores. teoria_do_conhecimento.indb 15 09/01/13 17:22 16 Capítulo 1 2.1 O conhecimento popular ou do senso comum O conhecimento popular ou do senso comum é “[...] aquele que não surge do estudo sistemático da realidade a partir de um método específico, mas provém do ‘viver e aprender’, da experiência de vida” (RAUEN, 1999, p. 8). Por isso, por meio desse tipo de conhecimento, não conseguimos explicar adequadamente um fenômeno, não se constituindo em uma teoria. Forma de conhecimento que provém da experiência cotidiana, do senso comum. Considerada a primeira forma de conhecimento, gerada basicamente pela interação do ser humano com o mundo e fundamentada na experiência individual. É uma forma de conhecimento assistemática e a-metódica. (APPOLINÁRIO, 2004, p. 52). Consiste na ação pela ação, sem ideias comprovadas, que não permitem o estudo ou a investigação sobre um determinado fenômeno. Então, o seu conteúdo se forma a partir da experiência quese vivencia no dia a dia. Todos nós sabemos muitas coisas que nos ajudam em nosso dia a dia e que funcionam bem na prática. Nas zonas rurais, muitas pessoas, mesmo sem nunca ter frequentado uma escola, sabem a época certa de plantar e de colher. Esse conjunto de crenças e opiniões, essencialmente de caráter prático, uma vez que procura resolver problemas cotidianos, forma o que se costuma chamar de conhecimento comum ou senso comum. (GEWANDSZNAJDER, 1989, p. 186). O conhecimento popular, como não busca, profundamente, as raízes da realidade, como não suporta a dúvida permanente e como está vinculado à cultura e a práticas antigas, passadas de geração em geração, às vezes incorpora explicações religiosas ou míticas. Observe, porém, que o conhecimento “popular”, do senso comum, está alinhado com um sentido pragmático, uma utilidade habitual. Köche (1997, p. 23-27) apresenta as seguintes características para o senso comum: “resolve problemas imediatos (vivencial); elaborado de forma espontânea e instintiva (ametódico); subjetivo (fragmentado) e inseguro; linguagem vaga e baixo poder de crítica; impossibilita a realização de experimentos controlados; as verdades apresentam certa durabilidade e estabilidade (crença); dogmático (crenças arbitrárias); não apresenta limites de validade”. Além das características mencionadas, é possível afirmar também que o conhecimento do senso comum é sensitivo. teoria_do_conhecimento.indb 16 09/01/13 17:22 Teoria do conhecimento 17 Em muitas situações, próprias desse tipo de conhecimento, observamos o abandono da razão e um apego àquilo que é captado apenas pelos órgãos sensoriais: visão, audição, olfato, paladar e tato. Você, por exemplo, tem a sensação de que a Terra está parada e não em movimento? Você vê que o céu é azul? Pois bem, para entender que a Terra não está parada e que o azul do céu é apenas uma ilusão de ótica, é necessário muito mais do que os órgãos sensoriais (visão, audição). Nesse caso, precisamos do uso da razão. O senso comum representa um conhecimento sensitivo e aparente, porque se apega à aparência dos fatos e não à sua essência. Para Laville e Dionne (apud RAUEN, 2002, p. 23), as fontes do conhecimento popular ou do senso comum são a intuição e a tradição. A intuição é a percepção imediata que dispensa o uso da razão, e a tradição ocorre quando, uma vez reconhecida a pertinência de um saber, organizam-se meios sociais de manutenção e de difusão desse conhecimento, tornando-se uma marca visível na formação da identidade cultural de uma comunidade. Contudo, não se pode dizer de maneira alguma que o conhecimento do senso comum possa ser considerado como de qualidade inferior aos demais conhecimentos, pois em muitas ocasiões de nossas vidas ele funciona socialmente, como no caso do manuseio do chá caseiro ou das ervas medicinais, a partir do conhecimento adquirido por certas pessoas de seus pais ou avós, passando a se tornar uma sabedoria proveniente da cultura popular. A ideia de sabedoria, em muitas culturas, está ligada à figura do ancião pelo fato de ele ter vivido muito tempo e ter acumulado muito conhecimento. 2.2 O conhecimento religioso ou teológico O conhecimento religioso ou teológico tem base na fé e na crença, ou seja, na aceitação de princípios dogmáticos, que podemos entender como irrefutáveis e indiscutíveis. Isto é, a forma de conhecimento religioso fundamenta-se na fé das pessoas, partindo do “[...] princípio de que as verdades nas quais [se] acredita são infalíveis ou indiscutíveis, pois se tratam de revelações da divindade”, tendo a visão do mundo interpretada como resultante da criação divina, sem questionamentos (OLIVEIRA NETTO, 2005, p. 5). O conhecimento religioso apoia-se em seres divinos que revelam aos homens proposições sagradas, dogmáticas e inquestionáveis. Essas ‘verdades’ reveladas são aceitas como lei, não pela sua veracidade empírica ou validade lógica, mas pela autoridade de quem as revela, por isso mesmo, não é necessário comprová- las, mas apenas aceitá-las pela fé. teoria_do_conhecimento.indb 17 09/01/13 17:22 18 Capítulo 1 Assim, “essas verdades são em geral tidas como definitivas, e não permitem revisão mediante a reflexão ou a experiência. Nesse sentido, podemos classificar sob este título os conhecimentos ditos místicos ou espirituais”. (MÁTTAR NETO, 2002, p. 3). Sua “matéria de estudo é Deus, como ser que existe independente e o qual detém não as potencialidades, mas a ação do perfeito”. Portanto, neste tipo de conhecimento há a necessidade da “[...] reflexão sobre a essência e a existência naquilo que elas têm como causa primeira e última de toda a vida”. (BARROS; LEHFELD, 1986, p. 52). Para Chauí (2005, p. 138), “a percepção da realidade exterior como algo independente da ação humana nos conduz à crença em poderes superiores ao humano e à busca de meios para nos comunicar com eles. Nasce assim, a crença na(s) divindade(s)”. Sendo assim, reflita: Para o conhecimento religioso, a verdadeira justiça é produzida pelos homens ou pela divindade? A justiça, pensada nessa perspectiva, não seria a realização do projeto de Deus? Reflita sobre essa questão e descubra situações as quais você conhece ou que estejam presentes na sua comunidade e que expressem a forma do conhecimento religioso, definir ou se posicionar frente à questão da justiça. Você refletiu sobre a situação anterior? Observe ao seu redor. Será importante para compreender melhor o assunto tratado neste capítulo. Continue seu estudo, passando a conhecer sobre o conhecimen to artístico. 2.3 O conhecimento artístico O conhecimento artístico é baseado na intuição, que produz emoções, tendo por objetivo maior manifestar o sentimento e não o pensamento. Sendo assim, para Oliveira Netto (2005, p. 5), “a preocupação do artista não é com o tema, mas com o modo de tratá-lo”, configurando-se, necessariamente, em uma interpretação marcada pela sensibilidade. O conhecimento artístico é uma forma de conhecimento que transmite informações de natureza emocional, cuja referência é a estética. Baseia-se na interpretação subjetiva produzida pelo artista e pelo intérprete. Para Heerdt e Leonel (2006, p. 30): teoria_do_conhecimento.indb 18 09/01/13 17:22 Teoria do conhecimento 19 [...] a arte combina habilidade desenvolvida no trabalho (prática) com a imaginação (criação). Qualquer que seja sua forma de expressão, cada obra de arte é sempre perceptível com identidade própria, dando-lhe também componentes de manifestação dos sentimentos humanos, tais como: emoção, revolta, alegria, esperança. Nesse sentido, qual é a visão artística ou estética sobre a questão da justiça? Você pensa que a poesia, a música, as obras de arte podem apresentar expressões de justiça ou de injustiça vividas pelo homem? Reflita sobre essa questão e descubra situações as quais você conhece ou que expressem a forma do conhecimento artístico, definir ou se posicionar frente à questão da justiça. 2.4 O conhecimento filosófico A palavra filosofia vem do grego e é formada pelas palavras Philo, que significa amigo e sophia, sabedoria. Portanto, filosofia significa, em sua etimologia, amigo da sabedoria. Segundo Appolinário (2004, p. 52, grifo do autor), [...] forma de conhecimento caracterizada pela reflexão racional [...] e pelo foco na lógica interna, ou seja, pela coerência dos conceitos articulados em sua formulação, todavia prescindindo de verificação empírica (o que a diferencia do conhecimento científico, por exemplo). A origem da Filosofia, na história do pensamento humano, é do século VI a.C., o qual foi marcado por uma grande ruptura histórica: a passagem do mito para a razão. Nesse período, houve uma grande modificação na forma de expressar a linguagem escrita, que passou do verso para a prosa. O verso representava o período anterior ao século VI a.C. e era a forma de transmitir o conhecimento mítico, produzido, principalmente, pelas experiências,narrativas e pelos relatos de Homero e Hesíodo. Com a origem da Filosofia, no chamado milagre grego, houve a passagem da consciência mítica para a consciência racional ou filosófica e a linguagem escrita passou a representar a forma de manifestação da razão. A origem da palavra razão está em duas fontes: ratio (latim) e logos (grego). Ambas apresentam o mesmo significado: contar, calcular, juntar, separar. teoria_do_conhecimento.indb 19 09/01/13 17:22 20 Capítulo 1 [...] logos, ratio ou razão significam pensar e falar ordenadamente, com medida e proporção, com clareza e de modo compreensível para outros. Assim, na origem, razão é a capacidade intelectual para pensar e exprimir-se correta e claramente, para pensar e dizer as coisas tais como são. (CHAUÍ, 2002, p. 59, grifo nosso). Esse tipo de conhecimento surgiu em nossa sociedade para superar ou se opor a quatro atitudes mentais: conhecimento ilusório (conhecimento das aparências das coisas); emoções (sentimentos e paixões cegas e desordenadas); crença religiosa (supremacia da crença em relação à inteligência humana); êxtase místico (rompimento do estado consciente). (CHAUÍ, 2002, p. 59-60). Refletir ou conceber o mundo à luz do conhecimento filosófico significa, antes de tudo, usar o poder da razão para pensar e falar ordenadamente sobre as coisas. Assim, a reflexão filosófica é radical, rigorosa e de conjunto sobre os problemas que a realidade apresenta. Radical porque vai às raízes do problema, rigorosa porque é sistemática, metódica e planejada, e de conjunto porque analisa o problema em todos os seus ângulos e aspectos. (ARANHA; MARTINS, 1999). Do mesmo modo, é possível afirmar que “o conhecimento filosófico constrói uma forma especulativa de ver o mundo. Especulação, de especulum que significa espelho, é um saber elaborado, a partir do exercício do pensamento, sem o uso de qualquer objeto que não o próprio pensamento”. (RAUEN, 1999, p. 23). Por isso, um dos papéis mais significativos desse tipo de conhecimento para o homem é o de desestabilizar o que está posto, no sentido de demonstrar que as coisas não estão prontas e acabadas, tornando o nosso pensamento falível e superável à medida que vamos conhecendo novos horizontes. O conhecimento filosófico não é verificável, daí não se pautar na experiência sensorial e por isso a utilização da razão é uma forma de bloquear a interferência dos sentimentos no ato de conhecer determinada coisa. Sendo assim, a prática do conhecimento filosófico torna-se cada vez mais necessária em nosso cotidiano e meio acadêmico, pois nos estimula e motiva à reflexão mais crítica sobre a nossa vida, a sociedade e o mundo em que vivemos. Enfim, como a Filosofia aborda a questão da justiça? Não é difícil pressupor que se a Filosofia faz uma reflexão radical, rigorosa e de conjunto sobre os problemas da realidade fará também a mesma reflexão (radical, rigorosa e de conjunto) sobre o problema da justiça. O filósofo, ou qualquer pessoa que se propõe a pensar sobre o assunto, fará especulações racionais, procurando apontar os seguintes questionamentos: a justiça é justa? A quem serve a justiça? Por que a justiça é mais severa para uns e mais branda para outros? teoria_do_conhecimento.indb 20 09/01/13 17:22 Teoria do conhecimento 21 E você, como pensa, filosoficamente, o problema da justiça? Reflita sobre essa questão. Será um bom exercício para que você compreenda melhor sobre o conhecimento filosófico. E agora, para encerrar este capítulo de estudo, conheça mais detalhes sobre o co nhecimento científico, tão enfatizado em nossa realidade acadêmica. 2.5 O conhecimento científico Como você já estudou nas seções anteriores, cada tipo de conhecimento tem características próprias e um modo bem particular de compreender os fatos, os fenômenos, as situações ou as coisas. Com o conhecimento científico também não é diferente. Dos apresentados até o momento, o conhecimento científico é considerado o mais recente. A ciência, da forma como é entendida hoje, é uma invenção do mundo moderno. Kepler, Copérnico, Bacon, Descartes, Galileu, Newton, entre outros, foram os grandes expoentes que, no final da Idade Média e durante a Idade Moderna, criaram as bases do conhecimento científico. Para Köche (1997, p. 17), o conhecimento científico surge não apenas da necessidade de encontrar soluções para os problemas de ordem prática da vida diária, característica esta do conhecimento ordinário, mas do desejo de fornecer explicações sistemáticas que possam ser testadas e criticadas através de provas empíricas que é o conhecimento que advém dos sentidos ou da experiência sensível. Observe que, “[...] o conhecimento científico é real – no sentido que se prende aos fatos – e contingente – porque se pauta, além da racionalidade, pela experiência e pela verificabilidade [das coisas]”. (RAUEN, 2002, p. 22). Geralmente, ele se verifica na prática, pela demonstração ou pela experimentação, dependendo da área de estudo em que esteja inserido: seja nas áreas sociais e humanas ou nas “exatas” e biológicas, por exemplo. Para Silva (2005, p. 22), o conhecimento científico é alcançado através da ciência, porque a ciência está buscando constantemente explicações e soluções, revisando e avaliando os seus resultados, com uma clara consciência de que está sujeita a falhas e que tem limitações. A ciência é um processo de construção, ela está sempre se renovando e se reavaliando. teoria_do_conhecimento.indb 21 09/01/13 17:22 22 Capítulo 1 Sendo assim, o conhecimento não se dá de forma absoluta, pesquisando não só o fenômeno, mas também as suas causas e suas leis. E então, você está lembrado do problema apresentado no início desta seção de estudo para exemplificar os tipos de conhecimento? Pois bem, com base nas informações apresentadas sobre o conhecimento científico, como você analisa o problema da justiça? Quais são as bases conceituais, no âmbito do conhecimento científico, para fundamentar de forma metódica, racional e sistemática essa questão? Se você ainda não formalizou uma ideia consistente ou convincente sobre a visão da justiça sob o prisma do conhecimento científico, não seja impaciente, pois no decorrer do próximo capítulo serão apresentadas outras características desse tipo de conhecimento, além de estabelecer uma relação entre ciência, tecnologia e arte, de resgatar elementos de definição e classificação das ciências. 2.6 Considerações finais Neste capítulo, você estudou a origem e o conceito de conhecimento. A palavra conhecimento vem do latim (cognitio) e resulta da relação entre o sujeito e o objeto. Como formas de apropriação do conhecimento, podemos destacar a direta e a indireta. A forma direta ocorre quando o sujeito enfrenta a realidade e opera “com” e “sobre” a mesma. Na indireta, o conhecimento é obtido por intermédio de símbolos gráficos, orais, mímicos etc. Você também estudou os tipos de conhecimento. O senso comum é aquele que provém do viver e aprender, da experiência de vida, sem apresentar uma preocupação com o estudo sistemático da realidade. O religioso ou teológico se funda na fé, acreditando que as verdades são infalíveis ou indiscutíveis, vinculadas às revelações divinas. O artístico preocupa-se em produzir emoções, por meio da manifestação dos sentimentos, marcadas pela sensibilidade do artista ou do intérprete. O filosófico utiliza o poder da razão para pensar e falar ordenadamente sobre as coisas, possibilitando uma reflexão rigorosa, radical e de conjunto sobre os problemas que a realidade apresenta. Esse conhecimento constrói uma forma especulativa de ver o mundo. O conhecimento científico, por sua vez, fornece explicações sistemáticas que podem ser testadas e criticadas por meio de provas empíricas, caracterizando-se como real e contingente. Assim, como você pode observar, cada tipo de conhecimento apresenta uma forma bem peculiar de interpretar os fenômenosproduzidos pela natureza ou pelo teoria_do_conhecimento.indb 22 09/01/13 17:22 Teoria do conhecimento 23 homem. O problema da justiça, que foi o exemplo utilizado no decorrer de todo o capítulo, ou qualquer outro problema, pode ser concebido ou interpretado à luz dos diversos tipos de conhecimento. Os teóricos do conhecimento são capazes de descrever inúmeras semelhanças e diferenças entre os tipos de conhecimento apresentados aqui. Também ressaltam que as fronteiras entre eles nem sempre são tão claras quanto pensamos. Os tipos de conhecimento que abordamos não descrevem as variadas formas de manifestação do conhecimento humano, mas estão entre as mais discutidas pela Teoria do Conhecimento, como base para entendimento das teorias dos filósofos, sobre como podemos conhecer. teoria_do_conhecimento.indb 23 09/01/13 17:22 teoria_do_conhecimento.indb 24 09/01/13 17:22 25 Secões de estudo Habilidades Capítulo 2 Ciência, Tecnologia e Arte Neste capítulo, com a preocupação de ser competente no ato de produzir cientificamente, você terá a oportunidade de desenvolver habilidades sobre como argumentar e demonstrar ideias ou refletir criticamente os estudos sobre o conhecimento científico, por meio de sua definição, características, perspectiva histórica e, principalmente, da relação com a tecnologia e a arte. Seção 1: Uma definição de ciência Seção 2: Ciência, tecnologia e arte Seção 3: Classificação das ciências Seção 4: A perspectiva histórica da ciência teoria_do_conhecimento.indb 25 09/01/13 17:22 26 Capítulo 2 Seção 1 Uma definição de ciência A ciência está relacionada diretamente às necessidades humanas do nosso cotidiano, como alimentação, vestuário, saúde, moradia, transporte, entre outros. O conhecimento científico está por trás do remédio que tomamos, da orientação médica que recebemos, da roupa que vestimos. A ciência, na época em que vivemos, tornou-se um bem cultural. Por isso, é muito difícil imaginarmos nossa vida sem a presença dela. O significado etimológico da palavra ciência vem do latim (scientia) e significa saber, conhecer, arte, habilidade. Apesar de a palavra ciência remontar à Antiguidade, é somente no século XVII que surge como um conhecimento racional, sistemático, experimental, exato e verificável. Trujillo Ferrari (1973, p. 3) destaca cinco funções básicas das ciências, que são: a. aumento e melhoria do conhecimento; b. descoberta de novos fatos e fenômenos; c. aproveitamento espiritual; d. aproveitamento material do conhecimento; e. estabelecimento de certo tipo de controle sobre a natureza. Se não há unanimidade na definição de ciência, por conta de fatores culturais, históricos, filosóficos ou ideológicos, há, por outro lado, características que são unânimes em praticamente todas as tentativas de definição desse tipo de conhecimento. Com base nisso, é possível afirmar que o conhecimento científico é: • Verificável; • Factual; • Racional; • Objetivo; • Intersubjetivo • Preditivo; • Comunicável; • Descritivo-explicativo; • Metódico; • Movido por paradigmas. teoria_do_conhecimento.indb 26 09/01/13 17:22 Teoria do conhecimento 27 A partir das características apresentadas, você deve estar se perguntando: quais são, então, os significados dessas características? Acompanhe, a seguir, uma sucinta descrição de cada uma delas. 1.1 Verificável Corresponde à ideia de prova ou de constatação da experiência pela ação e demonstração de um fenômeno, com a preocupação básica de testar a consistência da validade desse fenômeno. O método adotado em uma pesquisa científica deve permitir a outro pesquisador atingir os mesmos resultados alcançados, desde que adote os mesmos critérios e procedimentos. 1.2 Factual Diz respeito aos fatos que acontecem na realidade, que está à disposição da nossa observação numa dada realidade. O conhecimento científico estuda fenômenos naturais e humanos que ocorrem ou acontecem na natureza ou vida humana. 1.3 Racional Relaciona-se com a construção de conceitos e juízos a partir do uso sistemático do raciocínio, ou melhor, o que se quer na verdade é “[...] atingir uma sistematização coerente do conhecimento presente em todas as suas leis e teorias” (KÖCHE, 1997, p. 31). As teorias científicas não podem apresentar ambiguidade ou incoerência entre seus enunciados, por isso, a necessidade de um conhecimento racional e lógico. Köche chama isso de verdade sintática, como se explica a seguir: O conhecimento das diferentes teorias e leis se expressa formalizado em enunciados que, confrontados uns com os outros, devem apresentar elevado nível de consistência lógica entre suas afirmações [...] A ciência, no momento em que sistematiza as diferentes teorias, procura uni-las estabelecendo relações entre um e outro enunciado, entre uma e outra lei, entre uma e outra teoria, entre um e outro campo da ciência, de forma tal que se possa, através dessa visão global, perceber as possíveis inconsistências e corrigi-las. (KOCHE, 1997, p. 31). teoria_do_conhecimento.indb 27 09/01/13 17:22 28 Capítulo 2 1.4 Objetivo Refere-se ao propósito de querer encontrar a verdade contida na realidade, dispensando as impressões imediatas que acobertam essa mesma realidade, permitindo, inclusive, a manipulação dos fatos e o desenvolvimento de uma linguagem específica inerente aos conceitos próprios de cada área do conhecimento científico. Quando se fala em objetividade científica, quer se dizer que os enunciados, conceitos ou teorias científicas devem corresponder aos fatos. Objetividade, portanto, significa a correspondência da teoria com os fatos. Köche chama isso de verdade semântica, ou melhor, “o ideal da objetividade [...] pretende que as teorias científicas, como modelos teóricos representativos da realidade, sejam construções conceituais que representem com fidelidade o mundo real [...].” (KÖCHE, 1997, p. 31). 1.5 Intersubjetivo De nada adianta uma teoria ser coerente na sua construção lógica (ideal de racionalidade ou verdade sintática); de nada adianta uma teoria apresentar correlação entre seus enunciados e conceitos e os fatos (ideal de objetividade ou verdade semântica) se essa teoria não for submetida à apreciação e/ou validação e/ou crítica da comunidade científica. Köche chama isso de verdade pragmática, ou seja, o ideal de intersubjetividade é a possibilidade dos enunciados científicos serem “[...] submetidos a testes, em qualquer época e lugar e por qualquer sujeito [reconhecido pela comunidade científica]”. (KÖCHE, 1997, p. 33). Assim, “[...] um enunciado científico é objetivo quando, alheio às crenças pessoais, puder ser apresentado à crítica, à discussão, e puder ser intersubjetivamente submetido a teste”. (POPPER, 1977 apud KÖCHE, 1997, p. 32). 1.6 Preditivo Remete ao entendimento de que, com o conhecimento científico, é possível prever como os fenômenos podem ocorrer. Não se trata de uma questão de simples vidência ou premunição, mas de previsão baseada na repetição contínua dos fatos. O sol nasce todos os dias. Após a primavera, vem o verão. Objetos soltos caem com aceleração constante, se for desprezada a resistência do ar. Gatos dão sempre à luz gatinhos [sic]. teoria_do_conhecimento.indb 28 09/01/13 17:22 Teoria do conhecimento 29 Como se pode ver, há uma ordem na natureza e [...] o cientista tenta descobrir e estudar estas regularidades, enunciando-as na forma de leis gerais e utilizando estas leis para explicar e prever novos fatos. (GEWANDSZNAYDER, 1989, p. 9, grifo nosso). 1.7 Comunicável Implica dizer que os resultados das investigações científicas devem ser comunicados à sociedade em geral e não ficarem restritos ao meio acadêmico. Uma descoberta científica só é reconhecida pela comunidade científica se for publicada em uma revista de circulação internacional. Qualquer estudo ou pesquisa que você desenvolver só será consideradoverdadeiramente um trabalho científico se for publicado ou submetido à apreciação da comunidade acadêmica. Fazer uma pesquisa e guardar os resultados para si não é uma postura de quem deseja contribuir para o desenvolvimento do conhecimento científico, você não concorda? 1.8 Descritivo-explicativo Significa dizer que o conhecimento científico é expresso por meio de enunciados que explicam as condições que determinam a ocorrência dos fatos e dos fenômenos relacionados a um problema, pois somente por meio das leis e teorias é possível explicar os fenômenos. As leis e teorias surgem da necessidade de se ter de encontrar explicações para os fenômenos da realidade. Esses fenômenos são conhecidos pelas suas manifestações, pelas suas aparências, assim como se percebe pela cor e pelo perfume quando um fruto está maduro. Pode-se descobrir nos fenômenos da mesma natureza a manifestação de alguns aspectos que são comuns e invariáveis. Por exemplo: sempre que um objeto é jogado para o alto, cai. O estudo dessas manifestações pode conduzir à descoberta da uniformidade ou regularidade do comportamento desse fenômeno, conjeturando sobre a estrutura dos fatores que interferem ou produzem essa regularidade. (KÖCHE, 1997, p. 90). A função da Física consiste em descrever e explicar os fenômenos físicos, da Sociologia em descrever e explicar os fenômenos sociais, da Psicologia em descrever e explicar os fenômenos psíquicos. Isso que ocorre com a Física, a Sociologia e a Psicologia também ocorre com as demais ciências. 1.9 Metódico Significa um conjunto de etapas, ordenadamente dispostas, estabelecidas pelo pesquisador, a fim de investigar um determinado tema/questão/problema. Não há ciência sem método. Entre o sujeito que conhece (cientista) e o objeto que é teoria_do_conhecimento.indb 29 09/01/13 17:22 30 Capítulo 2 conhecido há um conjunto de procedimentos, regras, instrumentos, técnicas e processos que permitem a elucidação mais precisa do objeto de estudo. A definição se deu a partir de dois polos: de um lado o sujeito e, de outro, o objeto. O método, enquanto exigência do conhecimento científico, coloca-se entre essa relação. 1.10 Movido por paradigmas Todo conhecimento científico baseia-se em modelos ou representações formadas por pressupostos teórico-filosóficos. Um exemplo disso é a física aristotélica, física newtoniana, física quântica, psicologia comportamentalista, psicanálise, dogmática jurídica ou qualquer outro modelo filosófico-científico. Afirmar que a ciência é movida por paradigmas significa dizer que a ciência é movida por modelos, marcada por concepções ou formas de interpretar o mundo, a vida e a sociedade. Kuhn (2003, p. 13), em sua obra “A estrutura das revoluções científicas”, assim se expressa sobre os paradigmas: Considero ‘paradigmas’ as realizações científicas universalmente reconhecidas que, durante algum tempo, fornecem problemas e soluções modelares para uma comunidade de praticantes de uma ciência. Nesta seção, você estudou as principais características da ciência, que possibilitam defini-la de forma mais precisa e objetiva. Assim, prosseguiremos nossos estudos sobre a ciência, estabelecendo uma relação dessa com a tecnologia e a arte. É o que você verá a seguir. Seção 2 Ciência, tecnologia e arte Um dos desafios da Ciência tem sido marcado pela vontade de dominar a natureza, por meio do desenvolvimento tecnológico. Assim, “além de aumentar nosso conhecimento, a Ciência também pode ser utilizada como fonte de poder sobre a natureza”. (GEWANDSZNAJDER, 1989, p. 16). Para Barros e Lehfeld (1986, p. 70), a ciência é o meio mais adequado para o controle prático da natureza, transformando-a em “[...] matriz de recursos técnicos e/ou tecnológicos, os quais utilizados com sabedoria contribuem para uma vida humana mais satisfatória, enquanto efetivação instrumental do fazer e do agir”. teoria_do_conhecimento.indb 30 09/01/13 17:22 Teoria do conhecimento 31 Do mesmo modo, Köche (1997, p. 43) afirma que a ciência pode “[...] satisfazer às necessidades humanas como instrumento para estabelecer um controle prático sobre a natureza”. Como você pode observar, não há ruptura epistemológica entre a ciência e a técnica, mas há um encadeamento. Sendo assim, “há técnica para o conhecer e há técnica para o agir”, de modo que esta (técnica) se utiliza “[...] das orientações fornecidas pela ciência sobre a realidade, e transforma-as em programas e planos de execução”. (BARROS; LEHFELD, 1986, p. 71). A técnica ou tecnologia (do grego téchne, que significa arte ou habilidade) pode utilizar tanto o conhecimento comum quanto os conhecimentos obtidos na pesquisa básica ou na ciência aplicada para criar novos artefatos ou produtos (aparelhos elétricos, computadores, medicamentos, corantes etc.), melhorar a produção, modificar o ambiente ou amenizar as atividades humanas. (GEWANDSZNAJDER, 1989, p. 16). Segundo Barros e Lehfeld (1986, p. 71), “genericamente, a técnica é o manejo do conceito; é o exercício da investigação e o da intervenção sobre o objeto, para atingir resultados práticos compatíveis com as exigências situacionais de mudanças”. Nesse sentido, Köche (1997, p. 43) afirma que: a eletricidade, a telefonia, a informática, o rádio, a televisão, a aviação, as aplicações tecnológicas no campo da medicina, das engenharias e das viagens espaciais, o uso da genética na agricultura e na agropecuária e tantos outros relacionados à psicologia, e aos mais diferentes campos do conhecimento mostram a evolução crescente do uso do conhecimento científico na vida diária do homem, a tal ponto que dificilmente se desvincula a produção do conhecimento do seu benefício tecnológico e pragmático. Aos poucos, o conhecimento científico toma conta das nossas decisões e ações cotidianas, configurando uma sociedade do conhecimento, na qual o poder se constitui pelo domínio do próprio conhecimento. Outro aspecto importante a ser abordado é a relação entre a ciência e a arte, que pode ser estudada de diversas formas no processo histórico. O escultor, pintor, engenheiro e cientista Leonardo da Vinci (1452-1519), por exemplo, dizia que ciência e arte completavam-se formando uma atividade intelectual. Também a literatura de ficção científica indica proximidade entre ciência e arte. teoria_do_conhecimento.indb 31 09/01/13 17:22 32 Capítulo 2 Vários artistas desenvolvem obras ligadas às áreas tecnocientíficas, aos avanços da computação e dos meios de comunicação, a biologia e a engenharia genética, entre outros. Esse é o caso da arte eletrônica, arte-comunicação, ou ainda, arte transgênica. Também, pelo universo digital, podem-se conhecer museus e exposições de arte, sem contar que, por meio da tecnologia, o produtor de arte tem a oportunidade de divulgar seu trabalho e torná-lo conhecido mundialmente. Apesar dos vários recursos que a tecnologia e a ciência oferecem, uma grande quantidade de arte continua a ser realizada alheia às inovações, confirmando que a utilização de técnicas e materiais tradicionais ainda não se esgotou. Hoje, como se percebe, ciência, arte e tecnologia se comunicam abertamente, seja pela complementariedade ou pela influência recíproca. Essa relação só tende a crescer, já que, a cada dia surgem novos meios tecnológicos que ajudam a propagar e aprimorar os conhecimentos. A busca por recursos dessa natureza é cada vez maior em nossa sociedade para resolver ou contornar as mais diversas situações. Nesse sentido, o diálogo entre tecnologia, ciência e arte não pode ser separado do contexto social, político e ideológico que nos rodeia. O próprio conceito de arte sofre abalos constantes, quem dera os da ciência e da tecnologia. Por isso, Alves (2004) afirma: há uma ciência dos olhos. Há uma especialidade médica que se dedica a eles: a oftalmologia. Mas, por mais que procuremos nos tratados de oftalmologia referências ao olhar, não encontraremos nada. O olhar não éobjeto de conhecimento científico. Nem tudo o que é real pode ser pescado com as redes metodológicas da ciência. Há objetos que escapam pelos buracos de suas malhas. Será possível fazer uma ciência dos olhares? Tratá-los estatisticamente? Não tem jeito. Aí a proposta de uma tese sobre o olhar foi rejeitada sob a justa alegação de que não era científica. E não era mesmo. Mas o fato é que os olhares são reais! Você acabou de estudar a relação da ciência com a tecnologia e a arte, e percebeu que estão próximas, sendo, portanto, complementares. Isso permite ampliar sua visão sobre a abrangência dos estudos científicos. Nesse sentido, partimos para a próxima seção, a qual aborda a classificação das ciências. teoria_do_conhecimento.indb 32 09/01/13 17:22 Teoria do conhecimento 33 Seção 3 Classificação das ciências A classificação das ciências é outra tarefa um tanto difícil de estabelecer. Se você fizer um estudo na literatura sobre o assunto, com certeza, você encontrará muitas formas de agrupar ou de separar as ciências. O que há de comum entre elas é que, em todas as classificações, os autores procuram levar em conta o critério do objeto de estudo, isto é, procuram agrupar as ciências pelas semelhanças ou diferenças que há entre elas. Assim, as ciências que estudam fenômenos produzidos pela ação humana fazem parte de um grupo, enquanto as ciências que estudam os fenômenos produzidos pela ação da natureza fazem parte de outro grupo. Qual a classificação das ciências? Observe a classificação de Bunge apud Gewandsznayder (1989, p. 12): Figura 2.1 – Classificação das ciências Fonte: Bunge apud Gewandsznayder (1989, p. 12). A lógica e a matemática são ciências do pensamento, pois lidam com fenômenos ideais e abstratos. Enquanto a matemática opera com números, a lógica opera com ideias, mas ambas não possuem realidade física. Você já imaginou a realidade física do zero ou a realidade física do pensamento? Toda ideia é uma abstração, o zero, ou qualquer outro número, é uma convenção humana, que por meio de um símbolo representa ausência de alguma coisa. teoria_do_conhecimento.indb 33 09/01/13 17:22 34 Capítulo 2 As operações lógicas e matemáticas se dão exclusivamente no campo do pensamento. A lógica e a matemática são importantes tanto para o homem comum que necessita pensar de forma ordenada e operar com números no seu dia a dia, como para a ciência, principalmente no que diz respeito a sua aplicação como contribuinte ou instrumento para testar a validade de suas teorias. Pitágoras, na Antiguidade Clássica, dizia que a essência de todas as coisas é o número, que tudo pode ser representado numericamente. Os positivistas lógicos no século XX afirmavam que um enunciado para ser verdadeiro deveria passar pelo crivo da lógica. Ambas são consideradas Ciências Formais porque são instrumentais e lidam com operações que se encadeiam por meio dos números, ideias, funções, proposições etc. Alguns autores chegam a afirmar que a lógica ou a matemática não seriam propriamente ciência, mas método. Ambas não estão preocupadas com o conteúdo de suas operações, mas com a implicação dos elementos que compõem essas operações. As Ciências Factuais referem-se aos fatos ou fenômenos concretos que correspondem a alguma coisa real e podem ser observados ou testados. As Ciências Naturais lidam com fenômenos produzidos pela ação da natureza (Química, Biologia, Física, Ecologia). As Ciências Culturais, sociais ou humanas lidam com os fenômenos produzidos pela ação do homem nas relações socioculturais (Sociologia, Psicologia, Antropologia, História). Além da classificação apresentada (Ciências formais e factuais), alguns autores acrescentam um outro agrupamento: o das Ciências Aplicadas. Nesse grupo, encontram-se todas as ciências que se propõem a criar artefatos ou tecnologias para a intervenção na vida humana ou na natureza: Medicina, Arquitetura, Engenharia, Ciências da Computação, entre outras. Como você acabou de estudar, a classificação das ciências não é uma tarefa nada fácil de estabelecer, pois existem várias formas de agrupar ou de separá- las. Então, continuemos nossos estudos. Agora, partimos para o estudo da história da ciência. teoria_do_conhecimento.indb 34 09/01/13 17:22 Teoria do conhecimento 35 Seção 4 A perspectiva histórica da ciência Dos vários tipos de conhecimentos que existem (conhecimento do senso comum, conhecimento religioso, conhecimento artístico e conhecimento filosófico), o científico é o que pode ser considerado o mais recente. A ciência, da forma como é entendida hoje, é uma invenção do mundo moderno, decorrente da Revolução Científica do século XVII. Kepler, Copérnico, Bacon, Descartes, Galileu, Newton, entre outros foram os grandes expoentes que, no final da Idade Média e durante a Idade Moderna criaram as bases do conhecimento científico. Todavia, a história da ciência começa muito antes desse período, remetendo-nos para a Grécia Antiga do século VI a.C. Nesse sentido, para que você possa iniciar o estudo da história das ciências com mais segurança e clareza, é importante, primeiramente, determinar os principais períodos históricos pelos quais se desenvolveu o conhecimento científico. Visão Grega Visão Moderna Visão Contemporea Século VI a.C. até o final da Idade Média. Século XVII ao Século XIX. Século XIX até os nossos dias. 4.1 A visão grega de ciência Os gregos dos séculos VI a IV a.C. foram os primeiros a desenvolver um tipo de conhecimento racional desligado do mito. “O pensamento laico, não religioso, logo se tornava rigoroso e conceitual, fazendo nascer a filosofia no século VI a.C.” (ARANHA, MARTINS, 1999, p. 93). Uma das preocupações mais evidentes nesse período era a da busca do saber, a compreensão da natureza das coisas e do homem. Buscava-se uma nova forma de compreensão do universo em contraposição à visão mitológica. Os filósofos “[...] pré-socráticos substituíram a concepção de mundo caótico concebido pela mitologia pela ideia de cosmos”. Agora o universo passava a ser a ordem ou o cosmos, contrapondo-se à concepção mitológica de que os fenômenos aconteciam no mundo de forma caótica, como se fossem movidos por forças espirituais e sobrenaturais, comandadas pelas forças dos deuses. (KÖCHE, 1997, p. 44). teoria_do_conhecimento.indb 35 09/01/13 17:22 36 Capítulo 2 Os primeiros filósofos buscavam o princípio explicativo de todas as coisas (a arché), cuja unidade resumiria a extrema multiplicidade da natureza. Os fenômenos estavam relacionados a causas e forças naturais que podiam ser conhecidas e previstas. “As respostas eram as mais variadas, mas a teoria que permaneceu por mais tempo foi a de Empédocles, para quem o mundo físico é constituído de quatro elementos: terra, água, ar e fogo”. (ARANHA; MARTINS, 1999, p. 93). Assim, a noção de ciência na Grécia voltava-se para a especulação racional e se desligava da técnica e das preocupações práticas, pois “numa sociedade escravista, que deixava tarefas, trabalhos e serviços aos escravos, a técnica era vista como uma forma menor de conhecimento”. (ARANHA, MARTINS, 1999, p. 255). Segundo essa concepção, era preciso buscar a ciência (episteme) que consistia no conhecimento racional das essências, das ideias imutáveis, objetivas e universais. As ciências como a matemática, a geometria e a astronomia são passos necessários a serem percorridos pelo pensamento, até atingir as culminâncias da reflexão filosófica. (ARANHA, MARTINS, 1999, p. 94). Para Aristóteles (384-322 a.C.), discípulo de Platão, a ciência (episteme) “[...] produz um conhecimento que pretende ser um fiel espelho da realidade, por estar sustentado no observável e pelo seu caráter de necessidade e universalidade”. A Physis era o princípio ativo, a fonte intrínseca natural do comportamento de cada coisa, determinada por sua matéria e forma. Portanto, a ciência física era uma ciência da natureza (KÖCHE, 1997, p. 47).Nesse sentido, a concepção estática do mundo se mantém definida, na qual os gregos costumavam associar a perfeição ao repouso, caracterizada pela ausência de movimento. Assim, na visão grega de ciência, predominou esse modelo cosmológico aristotélico, posteriormente confirmado por Ptolomeu (um helênico do século II d.C.), que defendia a ideia de um mundo “geocêntrico, finito, de forma esférica, limitado às estrelas visíveis e fechado, com princípios organizadores próprios, tal qual um organismo vivo, dotado de inteligência própria”. (KÖCHE, 1997, p. 48, grifo dos autores). Outra característica marcante dessa astronomia (de Aristóteles) foi a hierarquização do cosmos, ou seja, o universo se achava dividido em dois mundos, sendo que um era considerado superior ao outro: o mundo sublunar, considerado inferior, correspondia à região da Terra [...] e o mundo supralunar, de natureza superior, correspondia aos Céus. (ARANHA, MARTINS, 1999, p. 94). A partir desse breve esboço, segundo Aranha e Arruda (1999, p. 95), podemos atribuir à Ciência grega cinco características marcantes, as quais são: teoria_do_conhecimento.indb 36 09/01/13 17:22 Teoria do conhecimento 37 a. a ciência encontra-se ligada à filosofia; b. a ciência é qualitativa; c. a ciência não é experimental; d. a ciência é contemplativa; e. a ciência baseia-se em uma concepção estática do mundo. 4.2 O período medieval e a cristianização da concepção grega de ciência Continuando o estudo, chegamos ao mundo medieval (que se estende, aproximadamente, dos séculos V ao XV), no qual observamos que continua a vigorar a influência da herança grecolatina, no que se refere à manutenção da mesma concepção de ciência. “Apesar das diferenças evidentes, é possível compreender essa continuidade, devido ao fato de o sistema de servidão também se caracterizar pelo desprezo à técnica e a qualquer atividade manual”. (ARANHA, MARTINS, 1999, p. 95). Agora a ciência “[...] se vincula aos interesses religiosos e se subordina aos critérios da revelação, pois, na Idade Média, a razão humana devia se submeter ao testemunho da fé” (ARANHA, MARTINS, 1999, p. 95). O que valia eram as verdades reveladas pelos “velhos livros”, fossem eles a Bíblia, Aristóteles ou Ptolomeu. “Eles eram o próprio conhecimento, a própria Ciência”. (ALFONSO- GOLDFARB, 1994, p. 30). Por isso, nessa fase histórica, não houve desenvolvimento das ciências particulares, fazendo com que a lógica aristotélica passasse a ser amplamente utilizada para justificar as verdades da fé. Nesse sentido, você pode perceber que o Teocentrismo, tendo na figura de Deus o centro de todas as atenções humanas, passou a ser a visão de mundo que marcou o imaginário da maioria das pessoas que viveram neste momento. Portanto, o período medieval se constituiu, sobretudo, na primazia da fé sobre a razão. 4.3 A visão moderna de ciência A visão moderna de ciência surge no final da Idade Média, perpassa o período renascentista e culmina no século XVII, com a chamada Revolução Científica. Nicolau Copérnico (1473-1543), em oposição ao modelo geocêntrico de astronomia de Ptolomeu, no século XVI, propõe o modelo da teoria heliocêntrica. (ARANHA, ARRUDA, 1999, p. 96, grifo nosso). teoria_do_conhecimento.indb 37 09/01/13 17:22 38 Capítulo 2 No período renascentista, inicia-se uma concepção de ciência, em que as culturas fundamentadas no conhecimento racional das essências (da Antiguidade clássica) ou nas verdades reveladas pelos parâmetros bíblicos (do medieval) deveriam ser apagadas do imaginário e da mentalidade dos europeus ocidentais, de modo a valorizar-se apenas o uso de métodos experimentais rigorosos que, amparados no conhecimento matemático, eram capazes de proporcionar respostas consideradas cientificamente verdadeiras. Assim, em princípio, temos a concepção racionalista de ciência, que se consolida até o final do século XVII. Nesse tipo de concepção, a ciência é definida como um conhecimento racional dedutivo e demonstrativo. Paralelamente à concepção racionalista, temos a concepção empirista de ciência, que se baseava no modelo de objetividade da medicina grega e da história natural do século XVII, estendendo-se até o final do século XIX. Nessa concepção, defendia-se a posição de que não existiam ideias inatas, tendo na experiência o parâmetro de aprendizado. Assim, aos poucos, os pensadores modernos, seja pela concepção racionalista ou empirista, passam a negar tacitamente o saber aristotélico incorporado à teologia católica do período medieval europeu. No campo da Física e da Astronomia, os estudos realizados por Galileu possibilitaram a Isaac Newton (1642-1727) elaborar a teoria da gravitação universal. A proposição física se tornava uma lei, obtida pela observação e generalização indutiva, transformando-se em “[...] proposições confiáveis e destituídas de dúvida ou de arbitrariedade, [como se fosse] um decalque fiel e objetivo da realidade”. (KÖCHE, 1997, p. 57). A partir desse momento, estava instituída a Física Mecânica (de Newton), como paradigma para todas as ciências, criado matematicamente, as humanas e sociais inclusive. Agora, a ciência experimental newtoniana se transformava no modelo de conhecimento. René Descartes (1596-1650) é considerado o pai do racionalismo, pois defendia a ideia de que a verdade dos conceitos e demonstrações matemáticos era inquestionável. John Locke (1632-1704) é considerado um dos grandes responsáveis por essa concepção de Ciência. Dizia que a mente era uma página em branco a qual a experiência viria a preencher. Galileu Galilei (1564-1642) foi, certamente, um dos grandes expoentes da Ciência moderna, sendo o primeiro a formular o método quantitativo-experimental, o primeiro a formular o problema crítico do conhecimento. teoria_do_conhecimento.indb 38 09/01/13 17:22 Teoria do conhecimento 39 Figura 2. 2 - Pensadores modernos René Descartes (1596-1650) é considerado o pai do racionalismo, pois defendia a idéia de que a verdade dos conceitos e demonstrações matemáticos era inquestionável. John Locke (1632-1704) é considerado um dos grandes responsáveis por esta concepção de Ciência. Dizia que a mente era uma página em branco a qual a experiência viria a preencher. Galileu Galilei (1564-1642) foi, certamente, um dos grandes expoentes da Ciência moderna sendo o primeiro a formular o método quantitativo- experimental, o primeiro a formular o problema crítico do conhecimento. Fonte: Portal Sofia (2010). As Ciências Humanas e Sociais tiveram enorme dificuldade em estabelecer um estatuto próprio ou uma autonomia, pois, como você percebeu, todo o modelo de cientificidade, necessariamente, estava vinculado às Ciências Naturais. A Física era considerada a ciência perfeita. Assim, a Economia, a Sociologia, a Psicologia, entre outras Ciências Sociais e Humanas, nos séculos XVIII e XIX, para atingirem o status de conhecimento científico, inicialmente tiveram que adotar o modelo experimental proposto pela Física. A Sociologia chegou a ser chamada de Física Social e a Psicologia de Psicofísica. A exaltação à ciência e ao método experimental deu origem ao chamado cientificismo: visão reducionista segundo a qual a ciência seria o único conhecimento válido. Dessa forma, o método das Ciências da natureza – baseado na observação, experimentação e matematização – deveria ser estendido a todos os campos do conhecimento e a todas as atividades humanas. A ciência virou praticamente um mito. (HEERDT; LEONEL, 2006, p. 42). teoria_do_conhecimento.indb 39 09/01/13 17:22 40 Capítulo 2 4.4 A visão contemporânea de ciência Esse período é marcado pela crise do modelo de ciência da Idade Moderna. Nesse sentido, “a principal contribuição para uma nova concepção de ciência foi dada (pelo físico) Einstein, pois “as teorias da relatividade restrita e da relatividade geral foram importantes não apenas pelo conteúdo que apresentaram, mas pela forma como foramalcançadas”. (KÖCHE, 1997, p. 60). A cientificidade passa a ser pensada nesse momento como uma ideia reguladora de alta abstração e não mais como sinônimo de modelos e normas a serem seguidos. Agora a teoria não será mais aceita como definitivamente confirmada. Então, “a objetividade da ciência resulta do julgamento feito pelos membros da comunidade científica que avaliam criticamente os procedimentos utilizados e as conclusões, divulgadas em revistas especializadas e congressos”. (ARANHA, MARTINS, 1999, p. 89). Dessa maneira, a ciência procura demonstrar que é capaz de fornecer respostas dignas de confiança, desde que submetidas continuamente a um processo de revisão crítica, sistemática e fundamentada nas teorias vigentes. “A ciência, em sua compreensão atual, deixa de lado a pretensão de taxar seus resultados de verdadeiros, mas, consciente de sua falibilidade, busca saber sempre mais”. (KÖCHE, 1997, p. 79). Assim, o conhecimento científico pode ser definido como provisório e construído, até que outro venha a superá-lo. A visão contemporânea de ciência é marcada pelas rupturas epistemológicas, não havendo um modelo exclusivo que caracterize o conhecimento científico nessa época. Ruptura epistemológica significa revisão crítica do conhecimento e tentativas de superar aquela visão estática, marcada pelas verdades dogmáticas e imutáveis, tão característico em toda a história do conhecimento científico. 4.5 Considerações finais Você estudou, neste capítulo, a definição de ciência, a relação entre ciência, arte e tecnologia, a classificação das ciências e a perspectiva histórica da ciência. Você percebeu que não há uma única forma de definir ciência. Esta dificuldade resulta de fatores culturais, históricos, filosóficos ou ideológicos. Entretanto, mesmo existindo essa dificuldade, é possível identificar algumas características que são próprias do conhecimento científico. Nesse sentido, podemos dizer que o conhecimento científico é verificável, factual, objetivo, racional, preditivo, comunicável, descritivo-explicativo, metódico, movido por paradigmas, intersubjetivo, entre outros. teoria_do_conhecimento.indb 40 09/01/13 17:22 Teoria do conhecimento 41 Sobre a relação entre ciência, arte e tecnologia você percebeu que a ciência é o meio mais adequado para o controle prático da natureza. Alimentação, transporte, saúde, produção industrial dependem das inovações tecnológicas, que, por sua vez, dependem dos avanços na ciência. A arte também se relaciona com a ciência, comunicando-se abertamente, seja pela complementariedade ou pela influência recíproca. Essa relação só tende a crescer, já que a cada dia surgem novos meios tecnológicos que ajudam a propagar e a aprimorar os conhecimentos. Dessa maneira, torna-se difícil separar a ciência e a arte da tecnologia. As ciências se dividem em dois grupos: as formais e as factuais. As ciências formais ocupam-se de elementos ideais e abstratos e estudam as implicações lógicas e matemáticas do pensamento. As ciências factuais estudam fenômenos naturais (Física, Química, Biologia, Ecologia etc.), humanos e sociais (Sociologia, Economia, Antropologia, História, Psicologia, Direito etc.). As ciências se agrupam conforme a familiaridade com o objeto de estudo. Assim, as ciências que estudam os fenômenos da natureza estão reunidas em um grupo e as que estudam os fenômenos sociais e humanos em outro grupo, apesar de ambas pertencerem ao grupo das Ciências Factuais. Estudando a divisão da ciência, também podemos entender o conhecimento científico como sendo o conhecimento das especialidades, das particularidades. Nesse sentido, podemos dizer que todo cientista é um especialista em determinada área do conhecimento. Você estudou também sobre as três grandes concepções históricas de ciência: a visão grega, moderna e contemporânea. Na visão grega, você estudou que se desenvolveu um tipo de conhecimento racional desligado do mito. Nessa época, as concepções míticas do universo dão lugar às concepções baseadas na racionalidade, fazendo surgir a Filosofia. Na visão grega de ciência, predominou o modelo cosmológico de universo chamado geocentrismo (a Terra como centro do universo). Na Idade Média, o modelo de ciência grega vincula-se aos interesses religiosos e se subordina aos critérios da revelação. Esse modelo perdurou até o final da Idade Média, quando foi questionado pelos principais protagonistas da ciência moderna que propuseram o modelo heliocêntrico (sol como centro do universo), em substituição ao geocêntrico. Na Idade Moderna, a concepção de ciência se desvincula da visão grega, por meio da chamada Revolução científica. Kepler, Copérnico, Bacon, Descartes, Galileu, Newton, entre outros foram os grandes expoentes que, no final da Idade Média, e durante a Idade Moderna criaram as bases do conhecimento científico. Duas concepções marcaram a Ciência no mundo moderno: a racionalista e a empirista. A concepção racionalista preconiza um conhecimento racional, dedutivo e demonstrativo e seu maior expoente é René Descartes (1596-1650). A concepção empirista defendia a posição de que não existem ideias inatas teoria_do_conhecimento.indb 41 09/01/13 17:22 42 Capítulo 2 e a experiência é o parâmetro para todo aprendizado. O grande expoente da concepção empirista é John Locke (1632-1704), ele dizia que a mente era uma página em branco a qual a experiência viria preencher. O modelo de cientificidade estava vinculado às Ciências Naturais e era baseado na matematização e na experimentação. A Física era a ciência perfeita e considerada modelo de cientificidade. A visão contemporânea de ciência é marcada pelas rupturas epistemológicas, não havendo um modelo exclusivo que caracterize o conhecimento científico. Como você estudou, ruptura epistemológica significa revisão crítica do conhecimento. A concepção atual de ciência é marcada pela ideia de que não há verdades eternas, pois as teorias são transitórias e podem ser renovadas ou até substituídas. teoria_do_conhecimento.indb 42 09/01/13 17:22 43 Secões de estudo Habilidades Capítulo 3 As raízes da Teoria do Conhecimento Pensando nas raízes da teoria do conhecimento nas concepções dos filósofos clássicos sobre as origens e possibilidades do conhecimento, propomos desenvolver as seguintes habilidades: refletir criticamente sobre essa temática, interpretar informações e dados, extrair conclusões e julgar, argumentar e demonstrar esse aprendizado, elaborar sínteses. Seção 1: A descoberta da racionalidade Seção 2: O conhecimento na filosofia de Sócrates, Platão e Aristóteles teoria_do_conhecimento.indb 43 09/01/13 17:22 44 Capítulo 3 Seção 1 A descoberta da racionalidade A partir desta unidade, você começará a estudar a questão do conhecimento em uma perspectiva histórica. Verá a questão do conhecimento no pensamento grego antigo de alguns filósofos pré-socráticos (primeiros filósofos ocidentais) e de Sócrates, Platão e Aristóteles (filósofos gregos mais estudados). Estudará, também, questões fundamentais sobre o conhecimento originado na Grécia Antiga e Clássica, que permaneceram sendo discutidas por pensadores medievais, modernos e contemporâneos. Até aproximadamente o século VII a.C., o conhecimento cultivado na Grécia Antiga estava ligado a certos aspectos da vida em sociedade. Esse conhecimento constituía-se, basicamente, de técnicas aplicadas à agricultura, do desempenho dos ofícios tradicionais e da preparação para a guerra. Havia, também, o conhecimento mitológico, que, além de motivar os cultos religiosos, explicava boa parte da realidade, ligando os deuses diretamente aos fenômenos da natureza e aos acontecimentos da vida humana. Aos poucos, porém, os gregos foram aprimorando suas técnicas de produção de alimentos e produtos, o que os levou a produzir muito mais do que precisavam para seu consumo. É comum historiadores afirmarem que a excelência no modo de produção da vida
Compartilhar