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ANALÍSE LITERÁRIA UNICAMP

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O Cortiço – Aluísio de Azevedo 
Professor: Flávio Brito 
 
 
Contexto Histórico 
 
Já na Segunda metade do século XIX, a burguesia tinha substituído a aristocracia no poder. A Revolução Industrial 
provocara um avanço expressivo no campo das ciências e da tecnologia. A concepção espiritualista de mundo, típica do período 
romântico, foi aos poucos cedendo lugar a novas atitudes diante da realidade: o cientificismo e o materialismo. O espírito 
científico era o critério supremo na compreensão e análise da realidade. A ciência determinava novas maneiras de pensar e viver, e 
esse novo contexto influenciou todos os campos, inclusive o da arte. Em 1859, o cientista inglês Charles Darwin publicou uma 
obra revolucionária, A origem das espécies, em que considera a evolução das espécies como resultado do mecanicismo de seleção 
natural. A idéia básica de tal mecanismo é a de que o meio ambiente condiciona todos os seres, deixando sobreviver os mais fortes 
e eliminando os mais fracos. Por isso, a natureza de todos os seres, inclusive a do homem, seria determinada por circunstâncias 
externas. O meio ambiente deveria ser considerado como fator de importância fundamental, já que condicionaria a matéria e o 
espírito. Negando a origem divina do mundo, a obra de Darwin causou polemica, sendo rejeitada por muitos e exaltado por outros, 
que a consideravam uma espécie de “nova bíblia”. 
O positivismo, corrente filosófica baseada no método empregado nas ciências naturais, aceitavam o determinismo, tese 
segundo a qual todos os acontecimentos do mundo e todas as ações humanas são decorrentes de leis físicas, químicas, e biológica. 
Ainda se mostraram como influenciadores, a psicologia, e na economia o liberalismo, além é claro, das idéias republicanas e 
socialistas, que se intensificavam e conflitavam cada vez mais. Em suma: a ciência, que tinha conseguido revelar as leis naturais, 
bastante objetivas, suplanta o idealismo do período romântico, sustentando uma concepção de mundo predominantemente 
materialista. 
No Brasil, a ciência e a burguesia encontravam respostas e possíveis soluções para os problemas do momento histórico que 
o país vivia. Jornais e revistas divulgavam as idéias de intelectuais que viam no método científico uma base segura para a 
renovação do pensamento histórico, político e econômico em nosso país. Alguns outros fatores importantes desta época que 
podemos destacar como sendo influenciadores para o contexto social, político e econômico do Brasil. Em 1888, a abolição do 
tráfico negreiro, que resultou no crescimento das cidades e seu conseqüente desenvolvimento econômico; A chegada dos 
imigrantes italianos para substituição da mão-de-obra escrava; A grande prosperação da lavoura cafeeira; O telégrafo; e o 
aparecimento dos primeiros jornais periódicos. 
A literatura realista e naturalista surge na França com Flaubert (1821-1880) e Zola (1840-1902). Flaubert (1821-1880) é o 
primeiro escritor a pleitear para a prosa a preocupação científica com o intuito de captar a realidade em toda sua crueldade. Para 
ele a arte é impessoal e a fantasia deve ser exercida através da observação psicológica, enquanto os fatos humanos e a vida comum 
são documentados, tendo como fim a objetividade. O romancista fotografa minuciosamente os aspectos fisiológicos, patológicos e 
anatômicos, filtrando pela sensibilidade o real. 
Contudo, a escola Realista atinge seu ponto máximo com o Naturalismo, direcionado pelas idéias materialísticas. Zola, por 
volta de 1870, busca aprofundar o cientificismo, aplicando-lhe novos princípios, negando o envolvimento pessoal do escritor que 
deve, diante da natureza, colocar a observação e experiência acima de tudo. O afastamento do sobrenatural e do subjetivo cede 
lugar à observação objetiva e à razão, sempre, aplicadas ao estudo da natureza, orientando toda busca de conhecimento. 
Vindo da Europa com tendências ao universal, o Realismo acaba aqui modificado por nossas tradições e, sobretudo, pela 
intensificação das contradições da sociedade, reforçadas pelos movimentos republicano e abolicionista, intensificadores do 
descompasso do sistema social. O conhecimento sobre o ser humano se amplia com o avanço da Ciência e os estudos passam a ser 
feitos sob a ótica da Psicologia e da Sociologia. A Teoria da Evolução das Espécies, de Darwin, oferece novas perspectivas com 
base científica, concorrendo para o nascimento de um tipo de literatura mais engajada, impetuosa, renovadora e preocupada com a 
linguagem. 
Os temas, opostos àqueles do Romantismo, não mais engrandecem os valores sociais, mas os combatem ferozmente. A 
ambientação dos romances se dá, preferencialmente, em locais miseráveis, localizados com precisão; os casamentos felizes são 
substituídos pelo adultério; os costumes são descritos minuciosamente com reprodução da linguagem coloquial e regional. 
http://www.nilc.icmsc.sc.usp.br/literatura/romantismo1.htm
O romance sob a tendência naturalista manifesta preocupação social e focaliza personagens vivendo em extrema pobreza, 
exibindo cenas chocantes. Sua função é de crítica social, denúncia da exploração do homem pelo homem e sua brutalização, como 
a encontrada no romance de Aluísio Azevedo. 
A hereditariedade é vista como rigoroso determinismo a que se submetem as personagens, subordinadas, também, ao meio 
que lhes molda a ação, ficando entregues à sensualidade, à sucessão dos fatos e às circunstâncias ambientais. Além de deter toda 
sua ação sob o senso do real, o escritor deve ser capaz de expressar tudo com clareza, demonstrando cientificamente como reagem 
os homens, quando vivem em sociedade. 
Os narradores dos romances naturalistas têm como traço comum a onisciência que lhes permite observar as cenas 
diretamente ou através de alguns protagonistas. Privilegiam a minúcia descritiva, revelando as reações externas das personagens, 
abrindo espaço para os retratos literários e a descrição detalhada dos fatos banais numa linguagem precisa. 
 
Principais características do Realismo/Naturalismo 
 
a) Objetividade/ compromisso com a verdade - O narrador deve ser imparcial e impessoal diante dos fatos narrados e dos seres 
que inventa para viver esses fatos. 
b) Contemporaneidade - O escritor preocupa-se com o seu momento histórico, diferentemente dos autores do Romantismo, que 
davam grande destaque ao passado. 
c) Semelhança das personagens com o homem comum - As personagens criadas pelos escritores do período assemelham-se ao 
homem comum, com todos os seus contrastes. Não há idealização, como ocorria no Romantismo. 
d) Condicionamento das personagens ao meio físico e social - Nos romances realistas/naturalistas as personagens aparecem 
condicionadas a fatores naturais (temperamento, raça, clima) e fatores sociais (ambiente, educação). 
e) Lei da causalidade - No romance realista/naturalista as atitudes das personagens e os acontecimentos sempre apresentam 
relação de causa e efeito, sempre têm uma explicação lógica, racional. Tudo o que pareça fantástico, sobrenatural, é rejeitado. f) 
Detalhismo - Como o escritor pretende retratar fielmente a realidade, visando a convencer o leitor da veracidade do que está 
escrito, autor descreve com detalhes, com minúcias o espaço e as personagens que cria. 
g) Linguagem mais simples que a dos românticos - Há uma preferência pelos períodos curtos, de compreensão mais imediata, pois 
o escritor procura atingir um público mais amplo, não se restringindo à elite intelectual. 
 
Diferenças entre Realismo e Naturalismo 
 
a) personagens: os naturalistas o fato de a hereditariedade física e psicológica determina o comportamento das personagens. 
b) conflito: juntando-se os fatores herança biológica e ambiente, criam-se condições para que se manifeste o conflito dramático da 
personagem naturalista. 
c) espaço: o escritor naturalista dá preferência a espaços miseráveis, pois estes, além de favorecerem o desabrochar do conflito das 
personagens, evidenciam os desequilíbrios que o escritor pretendedenunciar. 
d) enredo e intenção do escritor; o romance tipicamente naturalista tem intenções combativas. Pretende apresentar situações que 
façam o leitor refletir sobre as condições da realidade social de seu tempo. 
Tanto o romance realista quanto o naturalista combateram três instituições da época; a Igreja, a família e a monarquia. 
 
Biografia - Aluísio Tancredo Gonçalves de Azevedo nasceu em São Luiz do Maranhão em 14 de abril de 1857. Desde cedo 
mostrou interesse pela pintura e chegou a ir para o Rio de Janeiro, onde já morava seu irmão mais velho, Artur Azevedo, e chegou 
a trabalhar em vários jornais como cartunista, mas a morte do pai levou-o de volta à terra natal. Só então dedicou-se como 
escritor, mostrando a gente, as paisagens, usos e costumes de São Luiz. Já bem sucedido como escritor mas insatisfeito com sua 
situação econômica e com as críticas do clero, voltou ao Rio onde se engajou na vida diplomática. Em 1897, foi eleito para a 
Academia Brasileira de Letras. Veio a falecer em 21 de janeiro de 1913, em Buenos Aires, onde era vice-cônsul. 
 
Características específicas: 
• Considerado o melhor escritor naturalista brasileiro. 
• Sua obra demonstra menor preocupação formal que seus contemporâneos. 
• Emprego de personagens e linguagem popular. 
• Fortes críticas à sociedade brasileira e ao clero. 
• Seus principais temas são: a ambição, a reificação, o sexualismo, a necessidade de ascensão sócio-econômica e o 
preconceito. 
 
1. INTRODUÇÃO - (ANÁLISE DO PROF. AFFONSO ROMANO DE SANT'ANA) 
 
 Enquanto O Guarani e A moreninha buscam principal suporte no mito e na lenda., O Cortiço se realiza ao realizar os 
pressupostos científicos do séc. XIX revertidos para a série literária através do que se convencionou chamar de Naturalismo. 
Através de leituras científicas ou paracientíficas e absorvendo obras naturalista de autores europeus, Aluísio Azevedo fixou no 
livro que analisaremos alguns modelos científicos vigentes no séc. XIX gerados no campo da termodinâmica e da biologia. 
 O evolucionismo é ilustrado insistentemente dentro da estória do cortiço podendo-se localizar aí o revérbero de leis e 
princípios formulados por Mendell, Darwin, Huxley., Spencer e uma série de outros cientistas e pensadores que Hull rastreia em 
seu livro Histori y Filosofia da Ciencia para mostrar os focos de idéias estruturadoras da vida do século passado na civilização 
ocidental. A evolução sob forma de "progresso" aí aparece desfiando os organismos simples e complexos. O que a ciência nos dá 
como progresso biológico, nessa narrativa aparece sob forma sociológica e social. Na análise que se segue retomaremos algumas 
colocações teóricas e Hull e as aplicação à narrativa de Azevedo. Por ora, basta assinalar introdutoriamente que a ligação desse 
romance com modelos situados na série científica revela o espírito simétrico de sua composição, limitando o lúdico e o aleatório. 
Nesse sentido, em relação à série literária, O Cortiço se identifica como uma narrativa de estrutura simples compromissado com 
modelos exteriores ao seu texto, ainda que no enunciado sua produção o coloque do lado da contra-ideologia, uma vez que 
denuncia o código social vigente criticando o espaço da ideologia dominante. 
 
 2. PROPOSIÇÃO 
 Este trabalho se propõe a desenvolver as seguintes observações sobre a estrutura de O Cortiço: 
 1. Localizam-se aí dois grandes conjuntos: o conjunto 1 (O cortiço São Romão) e o conjunto 2 (a casa do Miranda), que 
definindo-se como conjunto simples e conjunto complexo, respectivamente, mantêm entre si um restrito e controlado regime de 
trocas. 
 2. Ambos os conjuntos estão sujeitos a um sistema de transformações. Essas transformações ocorrem num sentido ascendente 
e descendente, conforme os elementos se identifiquem com as leis da evolução e de entropia de seu universo. 
 3. Todo esse sistema de transformações é exemplificado por personagens protótipos, que são reduplicados em uma série de 
outros personagens secundários. Como uma célula que se multiplica por meios e a narrativa vai se reduplicando simetricamente na 
realização de modelos inspirados na série científica. 
 
3. DESENVOLVIMENTO 
 3.1. O Conjunto Simples e o Conjunto Complexo 
 Os 23 capítulos que compõem a narrativa de O Cortiço e que contam uma estória com princípio, clímax e desfecho, dentro de 
uma disposição tradicional, podem ser reestudados pela configuração de dois conjuntos que agrupam elementos de características 
semelhantes. 
 O conjunto 1 – cortiço de São Romão – define-se por sua composição elementar. Seus elementos têm uma constituição 
primária e estão ao nível da natureza e do instinto. O conjunto 2 – casa do Miranda – mostra a vigência de certas regras mais 
definidas culturalmente. Existe entre seus elementos uma coexistência baseada num maleável regime de trocas, que indica a 
predominância de outros interesses que não o puramente instintivo. 
 Portanto, ainda que correndo o risco de simplificar a questão se poderia dizer que o conjunto 1 está do lado da Natureza e o 
conjunto 2 está do lado da Cultura. Toda a movimentação de Romão, por exemplo, é para sair do solo puramente biológico e 
instintivo em que se agita o cortiço e entrar numa organização social regida por um sistema jurídico e político representativo da 
Cultura. 
 O conjunto simples nivela-se e vários sentidos, porque a sua dominante é a horizontalidade. De um ponto de vista racial sua 
grande maioria é de pretos e mestiços, e os elementos de outras raças que para aí vêem acabam por se comportar como a maioria. 
De um ponto de vista social, todos são empregados e assalariados, vivendo de pequenos misteres sendo, portanto, 
economicamente dependentes do regime imposto pelos elementos do conjunto 2. Nivelam-se por baixo pela miséria e pela 
pobreza. Agrupam-se num coletivismo tribal e identificam-se mais pelas semelhanças do que pelas diferenças. O próprio nome – 
“cortiço” – marca a sua natureza. Num cortiço , metaforicamente falando, também a grande quantidade de abelhas são as operárias 
com funções semelhantes, excetuando-se somente a abelha rainha. Não estranha, portanto, que o narrador insista numa seqüência 
de imagens de animais e insetos para caracterizar esse conjunto. Tome-se como exercício de pesquisa o cap. III relatando o 
despertar do cortiço. Por aí, através de um processo de antropomorfização não se diferenciam objetos, homens, animais e vegetais. 
É tudo um bando de “machos e fêmeas”, numa “fermentação sangüínea, naquela gula viçosa de plantas rasteiras”, mostrando “o 
prazer animal de existir”. Há um “verminar constante de formigueiro assanhado” e “destacam-se risos, sons de vozes que se 
alternavam, sem saber onde, grasnar de marrecos, cantar de galos, cacarejar de galinhas”. 
 Os elementos marcam-se pela sua impessoalidade, dissolvidos na comunidade instintiva e animal. Para ressaltar essa horda de 
seres primitivos, o narrador acentua a degradação dos tipos aproximando-os insistentemente de animais e conferindo-lhes 
apelidos. Leandra com “ancas de anima do campo”; Neném como uma “enguia”; Paula com “dente de cão” e Pombinha, com esse 
nome no diminutivo ocultando seu verdadeiro nome, significa a fusão do natural e do cultural, quando o narrador privilegia o 
apelido de caracterização zoomórfica. E assim, narrativa a dentro persiste um movimento de zoomorfização das criaturas, 
nivelando-as por baixo, pelo que tem de mais elementar. Romão e Bertoleza trabalham como uma “junta de bois’; o cortiço exala 
um “fartum de besta no coito”, os personagens se xingam de cão, vaca, galinha, porco; Jerônimo com sua “lascívias de macaco e 
cheiro sensual dos bodes”; Piedade abandonada surge “ululante como um cão”, soltando um “mugido lúgubre” como “uma vaca 
chamando ao longe”. 
 Poder-se-ia fazer um levantamento também da sujeição dos elementos do conjunto 1 ao instinto e aos sentidos mostrando que 
existe uma abertura maiorda parte deles para as coisa físicas. São todos sensíveis a um código sonoro, visual, aromático e tátil. 
Estão expostos às leis naturais reagindo dentro de um princípio de estímulo e resposta em relação ao ambiente. Este estudo que se 
poderia fazer partindo do que Lévi-Strauss fez com uma série de mitos sul-americanos em Le Cru et le Cuit encontraria seu 
melhor exemplo na imagem do sol e sua interferência não apenas sobre a comunidade, mas obre uma personagem especial, 
Pombinha, como é narrado no cap. IX. Noutra parte deste estudo nos referimos ao personagem Jerônimo exposto às intempéries 
dos trópicos revelando-se como elemento mais sensível às transformações. 
 Continuando um estudo semiológico sobre as técnicas que o narrador emprega para nivelar os elementos do Conjunto , 
encontraríamos a própria fisionomia ou planta da expansão do cortiço desde sua célula inicial. Aí conta a extensão, o linear, 
crescimento horizontal que reafirma a zoomorfização expressa conteudisticamente. A reprodução é quantitativa. Segue o modelo 
biológico: “El organismo empieza por ser una sola célula. Esta se divide en dos; cada uma de estas se divide a sua vez e assim 
sucessivamente. 
 No primeiro parágrafo encontramos Romão como proprietário de uma venda. Depois que se associa a Bertoleza explorando-
lhe o corpo e o trabalho, usa propriedade se expande: compra um pouco de terra ao fundo da taverna, rouba material do terreno 
vizinho, acaba construindo três casinhas “que foram o ponto de partida do grande cortiço São Romão”. Hoje quatro braças de 
terra, manhã seis, depois mais outras, ia vendeiro conquistando todo o terreno que se estendia pelos fundos de sua bodega; e, a 
proporção que o conquistava, reproduziam-se os quartos e o número de moradores (...) dentro de um ano e meio, arrematava já 
todo o espaço compreendido entre as suas casinhas e a pedreira”. 
 Por outro lado, seu negócio melhorava. Com sua ‘febre de possuir” ele transformava a simples taverna num bazar com 
produtos importados, e além de Bertoleza tema vários caixeiros. Ao fim o cortiço já se compõe de 95 moradias. Realizou-se o 
modelo biológico da transformação da vida pela meiose progressiva: “e naquela terra encharcada e fumegante, naquela umidade 
quente e lodosa, começou a minhocar, ao esfervilhar, a crescer, um mundo, uma coisa viva, uma geração, que parecia brotar 
espontânea, ali mesmo, daquele lameiro, a multiplicar-se como larvas no esterco”. 
 Assim a horizontalidade entre Venda ?Avenida passa por diversas etapas progressivamente: Taverna ? venda ? quitanda ? 
bazar ? grande armazém ? estalagem ? sobrado ? Avenida São Romão. 
 
 3.2. Conjunto Complexo 
 A expansão do conjunto 1 esbarra na instauração do conjunto complexo em sua verticalidade. Pode-se proceder a uma análise 
semiológica dos elementos a partir do desenho do sobrado do Miranda e os lugares se explicam e se completam em confronto com 
os elementos do conjunto 1. Instaura-se a verticalidade a partir do nome do Miranda: Lat. Miranda, gerundivo de miror, admirar, 
que deve ser admirado, e por ampliação – “evidente”. Miranda contempla lá de cima o avanço de Romão preparando-se para se 
beneficiar, e é lá de cima de sua janela que assiste aos festejos e às brigas do cortiço. Estela (estrela) é “senhora pretensiosa e com 
fumaças de nobreza”; é ela quem trouxe a fortuna ao Miranda através de seu dote; Zulmira – a excelsa, colocada também lá em 
cima no sobrado em sua palidez de adolescente; Henriquinho (rad. rik, poderoso, rico, príncipe da casa”), “tinha quinze anos e 
vinha terminar na corte alguns preparatórios que lhe faltavam para entrar na Academia de Medicina (cap. II). E aí, nesse conjunto, 
se instala Botelho, diferente dos demais; seu nome significa parasita, alga. E o próprio narrador cuida de chamá-lo de “parasita”, 
mostrando como “vegeta à sombra do Miranda” servindo de mediador nas transas sexuais de Henriquinho e Estela, e depois no 
casamento de Romão e Zulmira. 
 Esse conjunto complexo tem a caracterizá-lo sua capacidade de barganha mantendo um regime de trocas necessárias a sua 
própria sobrevivência, enquanto o conjunto simples resolve seus conflitos ao nível do instinto e da natureza impondo a violência 
como solução para os impasses. Metaforicamente se poderia dizer que a atitude de seus elementos é antropofágica: não existe uma 
possibilidade de mediação constante. O nível de mediação é muito baixo. Entre dois elementos em conflito (A e B) a única 
solução é a eliminação de um deles. Coabitar é inviável. A única solução é a violência e a morte. Exemplos: 
 
 a) Relação Bruno/Leocádia: quando Bruno descobre que Leocádia encontra-se com Henriquinho, a solução que encontra é a 
destruição de sua casa e a expulsão da mulher sob ameaça de morte. 
 b) Relação Jerônimo/Firmo: a rivalidade por causa da mulata Rita configura-se por uma briga de porrete versus navalha, e 
num outro ponto da narrativa pelo assassinato de Firmo. 
 c) Relação Romão/Bertoleza: ao se ver traída por Romão, Bertoleza cometa violência contra si mesma e rasga a barriga 
derramando vísceras no chão da cozinha. 
 d) Relação Rita/Piedade: reduplicando o conflito Firmo/Jerônimo, brasileiro/português, branco/mulato xingando-se as 
personagens com os mais diferentes nomes de animais, reafirmando o primitivismo de seu conjunto. 
 
Já o outro conjunto – o complexo, soluciona os conflitos efetivando trocas de objetos e dons. Na verdade, mais objetos do que 
dons, uma vez que o romance se esforça por cumprir os preceitos naturalistas ressaltando sempre o aspecto físico/objetivo das 
relações. 
 a) Relação Estela/Miranda: Apontada desde o princípio da narrativa como uma associação de interesses onde a mulher 
entrava com o capital e o homem com a sua gerência, destaca-se a função do dote, na formação dessa sociedade econômico-
sentimental. 
 Os outros relacionamentos repetem a mesma permissividade. Botelho sabe das relações Henriquinho/Estela, mas não fala 
porque precisa agradar ao marido e à mulher para permanecer na casa. Miranda tolera essa e outras infidelidades por questão de 
dinheiro e para manter as aparências. 
 Retomando as comparações entre um conjunto e outro assim teríamos a caracterizá-los: 
 Conjunto 1 – simples – instinto – animal – horizontal – VIOLÊNCIA 
 Conjunto 2 – complexo – racional – cultural – vertical – TROCA 
 
3.3. O sistema de trocas e a passagem do simples ao complexo 
 Até agora estamos considerando as relações internas de cada conjunto, sem precisar, as funções que estabelecem entre si. 
Poder-se-ia, usando de terminologia biológica e científica tão ao agrado do Naturalismo, dizer que o regime de trocas dá-se num 
sentido endógeno (dentro do conjunto) e exógeno (entre os conjuntos). Neste sentido há que considerar a relação que envolve os 
personagens Romão./ Miranda, representando cada um o seu conjunto respectivamente. A relação entre os dois envolve a 
passagem do simples ao complexo. Na medida em que Romão é bem sucedido nas trocas que propõe escapa às leis quantitativas e 
horizontais de sue conjunto para ir se comportando segundo os princípios de outro grupo. Aí procura a verticalidade da cultura, 
perseguindo títulos de nobreza que devem soerguer o indivíduo da massa. Num trabalho mais detalhado pode-se localizar e 
descrever todo o processo de transformações por que passa o personagem ao se aproximar de Zulmira (metonímia do conjunto 
complexo). 
 A evolução de Romão se dá em duas fases: antes e depois do encontro de suas propriedades com as propriedades de Miranda. 
Este encontro, ou melhor, confronto, força a construção de um muro entre os dois. O muro passa a simbolizar o conflito e a sua 
possibilidade de superação, na medida em que se caracteriza como mais um obstáculo a vencer no avanço do personagem. A 
propósito, se poderia lembrar aqui que este romance de Aluísio se presta muito bem à análise descritivista de ClaudeBremond que 
ressalta a sucessão de obstáculos e tarefas a vencer pelo herói na realização da estória. Não a empregamos aqui por achar que ela 
trabalha num setor muito restrito e limitado da análise. Mas valeria a pena utilizá-la ainda que como exercício para alunos. 
 O muro estabelece-se, então, como a diferença entre Romão e Miranda, é o limite entre a “selva” e o “jardim”, entre a 
“natureza” e a “cultura”. Como a trajetória de Romão implica na aceitação das “regras” da cultura, ele desenvolve sua capacidade 
de negociação e troca. Vejamos sucintamente a evolução das fases em Romão até encontrar o obstáculo e superá-lo. 
 
1ª fase 
 proprietário da venda 
 proprietário de Bertoleza 
 proprietário da terra/casa 
 proprietário de 3 casas 
 proprietário do terreno 
 proprietário da pedreira 
 proprietário do cortiço – 95 casas 
 
 2ª fase 
 “travou-se, então, luta renhida e surda entre o português, negociante de fazendas por atacado, e o português negociante de 
secos e molhados” (cap. 1, p. 28). 
 Símbolo da querela são os termos empregados pelo narrador para fixar no nível zoomórfico o impasse do conflito. Romão 
coloca um cão de fila no seu terreno para guardar o material que amealhava. Tal cão ameaçava a família do Miranda. “Em 
compensação, não caía no quintal do Miranda galinha ou frango, fugidos da cerca do vendeiro, que não levasse imediato 
sumiço"(cap. 1). 
 Assim se poderia visualizar o jogo de imagens no conflito: 
 Romão ? (cão de fila) ? MURO ? (galinha) ? Miranda 
 
3ª fase 
 Inicia-se uma terceira fase entre os dois conjuntos, quando resolvem partir para um sistema de alianças. Através de um 
processo lento de conquista social e econômica, Romão consegue a mão de Zulmira como forma de conseguir as comendas e 
títulos futuros. Miranda, em contrapartida, reforça-se economicamente com esta aliança. Ao se verificar essa transformação de 
Romão, ele já não é mais o simples vendeiro, mas o proprietário da avenida São Romão. 
 
 3.4. Sistema de transformações comparadas 
 As transformações por que passa os elementos, cumprindo as leis genéticas, biológicas, econômicas, raciais e ecológicas 
podem ser estudadas através de confrontos. Esse sistema de transformações engloba o regime de trocas que é um dos elementos 
que possibilitam a modificação. Podemos pesquisar essas alterações nos personagens através de três deles, por coincidência, três 
portugueses que assumem espaços e funções diversas na estória: Romão, Miranda e Jerônimo. 
 a) Romão: significa o elemento vitorioso segundo uma seleção das espécies. Ele se modifica, mas ascende na escala social e 
econômica assumindo os valores tidos como positivos na cultura brasileira. 
 b) Miranda: sua posição de aristocrata com pequenas variações se mantém e ele atinge o baronato. 
 c) Jerônimo: depois de atingir o máximo de sua posição de assalariado, envolvido pelos elementos naturais do conjunto 1, no 
interior do qual foi viver, entra em degenerescência. 
 Teríamos, então, uma linha ascendente (Romão) que seguiria o modelo teórico do primeiro princípio da termodinâmica e 
reafirmaria os princípios da seleção natural das espécies. Teríamos uma linha estável (Miranda) reafirmando que os elementos 
sempre se transformam pois “la energía no puede crearse ni destruirse, sino sólo transformarse”; e, em terceiro lugar, a figura de 
Jerônimo (linha descendente) exemplo de entropia do sistema. 
 Para termos uma melhor idéia do contraste entre os personagens, tomemos os dois exemplos extremos: Romão e Jerônimo. 
Ambos descrevem uma linha ascensional e descendente com evidente sentido ideológico e sua interpretação: a cada avanço na 
escala social e financeira (no caso de Romão) corresponde a um degrau abaixo na degradação moral e humana. 
 d) Jerônimo: Quando aparece na estalagem de Romão é comparado a um Hércules. A figura mitológica aí não é acidental, 
mas ganha mais sentido com a fisionomia do personagem depois que entra em decadência. Ele aí chega com ideais de ascensão, 
pois saíra da roça onde “tinha que sujeitar-se a emparelhar com os negros escravos e viver com eles no mesmo meio degradante, 
encurralado como uma besta, sem aspirações nem futuro, trabalhando eternamente para outro”(cap. V). Todo esse capítulo é a 
exaltação das virtudes de Jerônimo como um tipo clássico-mitológico. 
 No interior do conjunto 1 aos poucos vai se envolvendo sensorial e irracionalmente como novo ambiente. O narrador 
estabelece uma competição entre a sensibilidade européia e a brasileira, descrevendo como o europeu sucumbe quando abre seus 
sentidos aos sol dos trópicos. A integração de Jerônimo se realiza segundo uma “fuga dos cinco sentidos” – parafraseando Lévi-
Strauss em suas análises em Le Cru et le Cuit. Ele se entrega à música brasileira (audição) e olvida os fados portugueses: não 
resiste à luz dos trópicos e à dança da baiana Rita (visual); entorpece-se com o seu aroma, com “aroma quente dos trevos e 
baunilhas, que o atordoava nas matas brasileiras” e diante do perfume da mulata prefere-lhe o café e a cachaça em vez do chá 
preto da mulher (olfativo-gustativo). Outros dados do código sensorial ainda se associam formando uma rede de envolvimento que 
levam o português a ser avesso do que no princípio parecia. Esse aspecto da análise deve ser ainda 
 A linha descendente de Piedade, mulher de Jerônimo, é semelhante. Ela perde sua estabilidade quando o marido se envolve 
por meio ambiente brasileiro (metonimicamente representando por Rita), e passa pelos mesmos degraus de decadência, 
conhecendo a decadência física, a desorganização do lar, a embriaguez, abriga com Rita e a miséria. Ela reduplica o modelo de 
transformações de Jerônimo exemplificando a entropia do sistema. 
 
 3.5. Função da mulher no sistema de transformação 
 Como vimos anteriormente a mulher participa do regime de trocas, ela dá e recebe. A posição da mulher na estética 
naturalista, no entanto, é bem diversa daquela na estética romântica. Descrita mais objetivamente, enraizada na realidade, ela 
surge sem as idealizações e falseamentos. Nessa narrativa de Azevedo, a mulher é descrita principalmente como fêmea, que se 
acasala com o macho por interesses físicos e materiais. 
 Três tipos diferentes de mulher encontramos aqui descritos nessas relações: 
 a) a mulher-objeto que é trocada como nas sociedades primitivas; 
 b) a mulher sujeito-objeto que aceita as regras do sistema dando tanto quanto recebe; 
 c) a mulher-sujeito que regula os regimes de troca capaz de impor condições e manobrar o macho em benefício próprio. 
 
a) Mulher-objeto. Exemplifica-se inicialmente em Bertoleza, elemento feminino que se associa ao masculino (Romão) para 
criação do cortiço. Macho e fêmea trabalham dia e noite, e quanto mais o tempo passa, mais o macho se afasta da fêmea, uma vez 
que ela era peça fundamental apenas no princípio da carreira de Romão: “à medida que ela galgava posição social, a desgraçada 
descia mais e mais, fazia-se mais escrava e rasteira”. Outro exemplo é Zulmira: vai ser outro degrau utilizado por Romão, agora 
não no conjunto 1, mas no conjunto 2. A passagem de um conjunto ao outro implica na presença de um elemento feminino no 
regime de troca. Reafirmam-se certas regras da sociedade, daquilo que José de Alencar chamara de “mercado matrimonial”. As 
ligações entre ele e Bertoleza e ele e Zulmira são totalmente circunstanciais. As mulheres aí são elementos cambiáveis no 
comércio que ele opera. 
 b) Mulher sujeito-objeto. A relação Estela/Miranda coloca os dois em nível de igualdade. Ambos se beneficiam. Essa relação 
ajusta o regime de trocas sexuais, que são a contrapartida das trocas econômicas e sociais. A dupla Rita/Jerônimo exemplifica o 
mesmo regime de trocas. O Narrador vem ao nível do enunciado para dizer que entre eles se cumpria o ritual da atração racial. 
Rita é metonímiada natureza tropical enquanto Jerônimo é o símbolo daquilo que o autor chama de “raça superior” (sic): “mas 
desde que Jerônimo propendeu para ela, fascinado-a com sua tranqüila seriedade de animal bom e forte, o sangue da mestiça 
reclamou os seus direitos de apuração, e Rita preferiu no europeu o macho de raça superior” (cap. 15). 
 Todas essas personagens têm a caracterizá-las ou a permanência no mesmo status econômico e social ou a decadência. 
Nenhuma sai de seu conjunto, as transformações são endógenas e não exógenas como se dará com Leonie, Pombinha, Senhorinha. 
 c) Mulher-sujeito. O termo “sujeito” aqui implica numa interpretação dos valores ideológicos da comunidade descrita. Assim 
como Romão consegue se impor afirmando-se enquanto indivíduo dentro dos padrões vigentes na sociedade, aquelas mulheres 
(Leonie, Pombinha, Senhorinha) também se destacam na dependência contínua ao macho e passam a exercer o poder através do 
sexo-luxúria. Como Romão, elas extrapolam de seu conjunto original e se realizam no conjunto complexo. 
 Leonie – como protótipo da mulher do cortiço que saiu para a prostituição de elite, mantém trânsito livre entre um conjunto e 
outro. Ela pode desfilar com os amantes pelas ruas e teatros com, a mesma leveza com que regressa ao cortiço para ver sua 
afilhada. Sua ascensão social permite-lhe o trânsito. O modelo de Leonie repete-se em Pombinha, que é por ela seduzida, 
deixando de lado seu aspecto angelical para assumir a imagem da “serpente”, que o narrador maneja para classifica o vigor do 
instinto e a ameaça sexual. Repete-se em termos onomásticos o determinismo: a Pombinha vai ser devorada pela leoa através da 
iniciação homossexual: “a serpente vencia afinal: Pombinha foi, pelo próprio pé, atraída, meter-se-lhe na boca”. Pombinha, enfim, 
“desfere o vôo”. Tal modelo se repete com a filha de Jerônimo/Piedade atraída por Pombinha: “a cadeia continuava e continuaria 
interminavelmente; o cortiço estava preparando uma nova prostituta naquela pobre menina desamparada, que se fazia mulher ao 
lado de uma infeliz mãe ébria” (cap. 22). 
 Pode-se destacar ainda que, malgrado essas diferenciações quanto ao papel da mulher, existe uma constante a destacar: a 
estética naturalista em Azevedo acentua a supremacia do feminino sobre o masculino, da fêmea sobre o macho em proporções 
como esta: 
 soberania : escravidão: feminino: masculino 
 Os homens, segundo a versão de Leonie, existem para “servir ao feminino” enquanto as mulheres são “rainhas”, senhoras num 
“império” onde homens são “escravos”. 
 
 3.6. Reduplicação dos modelos de evolução e entropia 
 Como uma narrativa centrada em modelos conscientes e interessados ideologicamente em defender uma tese determinada, O 
Cortiço reduplica, numa série de quadros, seus modelos principais. Por exemplo, o modelo da evolução e da entropia exemplifica-
se agora no confronto entre os dois cortiços: São Romã o e Cabeça de Gato. 
 Há que retomar e retificar aqui algumas observações que fizemos sob a expansão do cortiço São Romão. A sua 
horizontalidade não é completa. É relativa à verticalidade do palacete do Miranda. Na medida em que Romão vai evoluindo 
econômica e socialmente, seu cortiço sofre um processo de modificações também qualitativas até chegar à Av. São Romão. 
Alinha de ascensão do cortiço é a mesma de seu proprietário que, na verdade, funciona como uma metonímia de seu conjunto. 
 O novo cortiço (Cabeça de Gato) não é apenas o que o São Romão era em sua origem, mas se torna o refúgio daqueles que não 
evoluem nem se transformam. É um reduto de excluídos reincidentes, como Firmo, que para lá muda. Repete-se com os dois 
cortiços as duas linhas de ascensão e decadência que marcam a trajetória de Romão e Jerônimo, respectivamente. O capítulo 20 
conta a transformação final do cortiço na Avenida São Romão: “João Romão conseguira meter o sobrado do vizinho no chinelo; o 
seu era mais alto e mais nobre, e então com as cortinas e com a mobília nova impunha respeito. Foi abaixo aquele grosso e velho 
muro da frente com seu largo portão de cocheira, e a entrada da estalagem era agora dez braças mais para dentro, tendo entre elas 
e a rua um pequeno jardim com bancos e um modesto repuxo ao meio, de cimento, imitando pedra (...) e na tabuleta nova, muito 
maior que a primeira, em vez de “Estalagem de São Romão” lia-se me letras caprichosas “Avenida São Romão”. 
 Enquanto isso: o Cabeça de Gato à proporção que o São Romão se engrandecia, mais e mais ia-se rebaixando acanalhado, 
fazendo-se cada vez mais torpe, mais abjeto, mais cortiço, vivendo satisfeito do lixo e da salsugem que o outro rejeitava, como se 
todo o seu ideal fosse conservar inalterável, para sempre, o verdadeiro tipo da estalagem fluminense, a legítima, a legendária; 
aquela em que há um samba e um rolo por noite; aquela em que se matam homens sem a polícia descobrir os assassinos; viveiros 
de larvas sensuais em que irmãos dormem misturados com as irmãs na mesma cama; paraíso de vermes; brejo de lodo quente e 
fumegante, donde brota a vida brutalmente, como de uma podridão” (cap. 22). 
 Antes que se diferenciassem tanto, os dois cortiços guardavam características de uma sociedade primitiva, realizando em sua 
interação todos os quesitos de uma sociedade fechada. Como tal, tinham suas regras próprias excluindo-se e opondo-se aos outros 
conjuntos da sociedade . Exemplo disto é como reagem diante da lei – o aparecimento da polícia. Organizam-se contra o elemento 
estranho-invasor como se fossem uma só comunidade. Veja-se o episódio da luta de Jerônimo/Firmo e a chegada da polícia: “João 
Romão atravessou o pátio, como um general em perigo, gritando a todos: - Não entra a polícia! Não deixa entrar! Agüenta! 
Agüenta! – Não então! Não entra! Repercutiu a multidão em coro (...) Um empenho coletivo os agitava agora, todos, numa 
solidariedade briosa, como se ficassem desonrados para sempre se a polícia entrasse ali pela primeira vez. Enquanto se tratava de 
uma simples luta entre dois rivais, estava direito! Jogassem lá as cristas, que o mais homem ficaria com a mulher, mas agora 
tratava-se de defender a estalagem, a comuna, onde cada um tinha a zelar por alguém ou alguma coisa querida” (cap. 10). 
 Ainda na comparação do primitivismo desses dois conjuntos importa ressaltar as características tribais de ambos. O narrador 
tenta dar uma certa dignidade às lutas entre os dois cortiços convertendo a briga numa “batalha” e numa “guerra” de uma tribo 
contra outra. Procura-se uma nobreza para os contendores. Trazem símbolos clássicos de guerreiros. Estamos entre um torneio 
medieval e uma festa tribal. Se agrupam totemicamente, tomando como símbolos animais que sintetizam as características de 
ambos: 
 Carapicus (peixe) ----------------------- Cabeça de Gato (gato) 
 Assinalada a rivalidade nos símbolos totêmicos, ela se confirma nas cores da bandeira: 
 Carapicus (vermelha) ------------------ Cabeça de Gato (amarela) 
 O autor é explícito coincidindo o enunciado e a enunciação de sua estória: “Em meio do pátio do Cabeça de Gato arvora-se 
uma bandeira amarela; os carapicus responderam logo levantando um pavilhão vermelho. E as duas cores olhavam-se no ar como 
um desafio de guerra” (cap.13). 
 Definidos totemicamente com sua bandeira os grupo se aproximam com suas armas (navalhas) e com suas músicas (danças 
dos capoeiras). Tem início o torneio, que culmina com o incêndio desencadeado pela Bruxa – sempre envolvida com o fogo. E 
para explicar a gênese do confronto, surge o narrador reafirmando a ideologia naturalista e servindo-se dos modelos da série 
científica: “E, no entanto, o sol, único causador de tudo aquilo”... 
 
4. CONCLUSÃO 
 Essa análise, evidentemente, não esgota o conhecimento da estrutura do livro. Centramo-nos aqui mais no nível da narração e 
dos personagens com incursões pelo nível da língua (gem). Fosse um trabalho maior e se teriaobrigação de ampliar as 
observações constatando no nível da frase os modelos que regem a composição da narrativa. Uma análise estilística, por exemplo, 
embricaria nesse nível, mostrando que a língua de Azevedo, em sua plurivalência de nacionalidades, mostra como o francês, o 
italiano, o português de Portugal, o falar do cortiço, o falar dos salões se mesclam constituindo conjuntos que integralizam a 
língua brasileira num sentido mais amplo. Sua língua é mestiça como seus personagens e se espalha pelo simples e pelo complexo. 
Por aí se poderia chegar a tocar de novo no problema da ideologia que configurou o romance. Ideologia esta que tanto mais se 
configura quanto mais se sabe que a arte de Aluísio se voltava para o receptor. Sua produção tinha um endereço certo: o jornal, o 
teatro e uma grande massa de leitores. E parece que ele foi bem sucedido nisto, porque teria sido o nosso primeiro escritor 
profissional, segundo afirmou Valentim Magalhães, só tendo largado apenas para um emprego no Ministério da Relações 
Exteriores. 
 Dentro de uma concepção teórica para compreender a teoria e a prática do romance no Brasil, Aluísio teria praticado em 
relação à série social uma narrativa contra-ideológica, apontando as falhas do sistema ao denunciar a exploração dos cortiços 
(alguns dos quais pertencentes ao Conde D’Eu). Em relação à série literária, sua obra é ideológica quando cumpre à risca os 
preceitos naturalistas seguindo de perto o modelo europeu. Trabalhou com modelos conscientes, predominantemente, realizando 
uma narrativa da transparência interessada no espaço real. 
 
O Cortiço - Resumo 
 João Romão, português, bronco e ambicioso, ajuntando dinheiro a poder de penosos sacrifícios, compra pequeno 
estabelecimento comercial no subúrbio da cidade (Rio de Janeiro). Ao lado morava uma preta, escrava fugida, trabalhadeira, que 
possuía uma quitanda e umas economias. Os dois amasiam-se, passando a escrava a trabalhar como burro de carga para João 
Romão. Com o dinheiro de Bertoleza (assim se chamava a ex-escrava), o português compra algumas braças de terra e alarga sua 
propriedade. Para agradar a Bertoleza, forja uma falsa carta de alforria. Com o decorrer do tempo, João Romão compra mais terras 
e nelas constrói três casinhas que imediatamente aluga. O negócio dá certo o novos cubículos se vão amontoando na propriedade 
do português. A procura de habitação é enorme, e João Romão, ganancioso, acaba construindo vasto e movimentado cortiço. Ao 
lado vem morar outro português, mas de classe elevada, com certos ares de pessoa importante, o Senhor Miranda, cuja mulher 
leva vida irregular. Miranda não se dá com João Romão, nem vê com bons olhos o cortiço perto de sua casa. No cortiço moram os 
mais variados tipos: brancos, pretos, mulatos, lavadeiras, malandros, assassinos, vadios, benzedeiras etc. Entre outros: a Machona, 
lavadeira gritalhona, "cujos filhos não se pareciam uns com os outros"; Alexandre, mulato pernóstico; Pombinha, moça franzina 
que se desencaminha por influência das más companhias; Rita Baiana, mulata faceira que andava amigada na ocasião com Firmo, 
malandro valentão; Jerônimo e sua mulher, e outros mais. João Romão tem agora uma pedreira que lhe dá muito dinheiro. No 
cortiço há festas com certa freqüência, destacando-se nelas Rita Baiana como dançarina provocante e sensual, o que faz Jerônimo 
perder a cabeça. Enciumado, Firmo acaba brigando com Jerônimo e, hábil na capoeira, abre a barriga dó rival com a navalha e 
foge. Naquela mesma rua, outro cortiço se forma. Os moradores do cortiço de João Romão chamam-no de "Cabeça-de-gato"; 
como revide, recebem o apelido de "Carapicus". Firmo passara a morar no "Cabeça-de-Gato", onde se torna chefe dos malandros. 
Jerônimo, que havia sido internado em um hospital após a briga com Firmo, arma uma emboscada traiçoeira para o malandro e o 
mata a pauladas, fugindo em seguida com Rita Baiana, abandonando a mulher. Querendo vingar a morte de Firmo, os moradores 
do "Cabeça-de-gato" travam séria briga com os "Carapicus". Um incêndio, porém, em vários barracos do cortiço de João Romão 
põe fim à briga coletiva. O português, agora endinheirado, reconstrói o cortiço, dando-lhe nova feição e pretende realizar um 
objetivo que há tempos vinha alimentando: casar-se com uma mulher "de fina educação", legitimamente. Lança os olhos em 
Zulmira, filha do Miranda. Botelho, um velho parasita que reside com a família do Miranda e de grande influência junto deste, 
aplaina o caminho para João Romão, mediante o pagamento de vinte contos de réis. E em breve os dois patrícios, por interesse, se 
tornam amigos e o casamento é coisa certa. Só há uma dificuldade: Bertoleza. João Romão arranja um piano para livrar- se dela: 
manda um aviso aos antigos proprietários da escrava, denunciando-lhe o paradeiro. Pouco tempo depois, surge a polícia na casa de 
João Romão para levar Bertoleza aos seus antigos senhores. A escrava compreende o destino que lhe estava reservado, suicida-se, 
cortando o ventre com a mesma faca com que estava limpando o peixe para a refeição de João Romão. 
 
 
 
 
Memórias Póstumas de Brás Cubas – Machado de Assis 
Comentários: FávioBrito 
 
CONTEXTO HISTÓRICO - Já na Segunda metade do século XIX, a burguesia tinha substituído a aristocracia no poder. A 
Revolução Industrial provocara um avanço expressivo no campo das ciências e da tecnologia. A concepção espiritualista de 
mundo, típica do período romântico, foi aos poucos cedendo lugar a novas atitudes diante da realidade: o cientificismo e o 
materialismo. O espírito científico era o critério supremo na compreensão e análise da realidade. A ciência determinava novas 
maneiras de pensar e viver, e esse novo contexto influenciou todos os campos, inclusive o da arte. Em 1859, o cientista inglês 
Charles Darwin publicou uma obra revolucionária, A origem das espécies, em que considera a evolução das espécies como 
resultado do mecanicismo de seleção natural. A idéia básica de tal mecanismo é a de que o meio ambiente condiciona todos os 
seres, deixando sobreviver os mais fortes e eliminando os mais fracos. Por isso, a natureza de todos os seres, inclusive a do 
homem, seria determinada por circunstâncias externas. O meio ambiente deveria ser considerado como fator de importância 
fundamental, já que condicionaria a matéria e o espírito. Negando a origem divina do mundo, a obra de Darwin causou polemica, 
sendo rejeitada por muitos e exaltado por outros, que a consideravam uma espécie de “nova bíblia”. 
O positivismo, corrente filosófica baseada no método empregado nas ciências naturais, aceitavam o determinismo, tese 
segundo a qual todos os acontecimentos do mundo e todas as ações humanas são decorrentes de leis físicas, químicas, e biológica. 
Ainda se mostraram como influenciadores, a psicologia, e na economia o liberalismo, além é claro, das idéias republicanas e 
socialistas, que se intensificavam e conflitavam cada vez mais. Em suma: a ciência, que tinha conseguido revelar as leis naturais, 
bastante objetivas, suplanta o idealismo do período romântico, sustentando uma concepção de mundo predominantemente 
materialista. 
No Brasil, a ciência e a burguesia encontravam respostas e possíveis soluções para os problemas do momento histórico que 
o país vivia. Jornais e revistas divulgavam as idéias de intelectuais que viam no método científico uma base segura para a 
renovação do pensamento histórico, político e econômico em nosso país. Alguns outros fatores importantes desta época que 
podemos destacar como sendo influenciadores para o contexto social, político e econômico do Brasil. Em 1888, a abolição do 
tráfico negreiro, que resultou no crescimento das cidades e seu conseqüente desenvolvimento econômico; A chegada dos 
imigrantes italianos para substituição da mão-de-obra escrava; A grande prosperação da lavoura cafeeira; O telégrafo; e o 
aparecimento dos primeiros jornais periódicos. 
A literatura realista e naturalista surge na França com Flaubert (1821-1880)e Zola (1840-1902). Flaubert (1821-1880) é o 
primeiro escritor a pleitear para a prosa a preocupação científica com o intuito de captar a realidade em toda sua crueldade. Para 
ele a arte é impessoal e a fantasia deve ser exercida através da observação psicológica, enquanto os fatos humanos e a vida comum 
são documentados, tendo como fim a objetividade. O romancista fotografa minuciosamente os aspectos fisiológicos, patológicos e 
anatômicos, filtrando pela sensibilidade o real. 
Contudo, a escola Realista atinge seu ponto máximo com o Naturalismo, direcionado pelas idéias materialísticas. Zola, por 
volta de 1870, busca aprofundar o cientificismo, aplicando-lhe novos princípios, negando o envolvimento pessoal do escritor que 
deve, diante da natureza, colocar a observação e experiência acima de tudo. O afastamento do sobrenatural e do subjetivo cede 
lugar à observação objetiva e à razão, sempre, aplicadas ao estudo da natureza, orientando toda busca de conhecimento. 
Vindo da Europa com tendências ao universal, o Realismo acaba aqui modificado por nossas tradições e, sobretudo, pela 
intensificação das contradições da sociedade, reforçadas pelos movimentos republicano e abolicionista, intensificadores do 
descompasso do sistema social. O conhecimento sobre o ser humano se amplia com o avanço da Ciência e os estudos passam a ser 
feitos sob a ótica da Psicologia e da Sociologia. A Teoria da Evolução das Espécies, de Darwin, oferece novas perspectivas com 
base científica, concorrendo para o nascimento de um tipo de literatura mais engajada, impetuosa, renovadora e preocupada com a 
linguagem. 
Os temas, opostos àqueles do Romantismo, não mais engrandecem os valores sociais, mas os combatem ferozmente. A 
ambientação dos romances se dá, preferencialmente, em locais miseráveis, localizados com precisão; os casamentos felizes são 
substituídos pelo adultério; os costumes são descritos minuciosamente com reprodução da linguagem coloquial e regional. 
O romance sob a tendência naturalista manifesta preocupação social e focaliza personagens vivendo em extrema pobreza, 
exibindo cenas chocantes. Sua função é de crítica social, denúncia da exploração do homem pelo homem e sua brutalização, como 
a encontrada no romance de Aluísio Azevedo. 
A hereditariedade é vista como rigoroso determinismo a que se submetem as personagens, subordinadas, também, ao meio 
que lhes molda a ação, ficando entregues à sensualidade, à sucessão dos fatos e às circunstâncias ambientais. Além de deter toda 
sua ação sob o senso do real, o escritor deve ser capaz de expressar tudo com clareza, demonstrando cientificamente como reagem 
os homens, quando vivem em sociedade. 
Os narradores dos romances naturalistas têm como traço comum a onisciência que lhes permite observar as cenas 
diretamente ou através de alguns protagonistas. Privilegiam a minúcia descritiva, revelando as reações externas das personagens, 
abrindo espaço para os retratos literários e a descrição detalhada dos fatos banais numa linguagem precisa. 
 
CARACTERÍSTICAS 
 
 1- Posição do artista diante da realidade 
• O artista procura nivelar sua atitude à do cientista.daí decorre a objetividade que o escritor procura manter durante a narrativa 
– sem idealizações, limitando-se a registrá-la de forma quase fotográfica, o que nem sempre consegue. 
• O artista não emite julgamentos a respeito de fatos ou personagens. 
 
2- Posição do artista diante da obra de arte 
• Romance = instrumento de denúncia e combate, uma vez que focaliza os desequilíbrios sociais. 
• Arte engajada. O narrador analisa e denuncia um problema social ou humano qualquer. 
 
3-Concepção de homem 
• Para o romântico, o homem é a medida de todas as coisas. 
• Para o realista/naturalista, o homem é apenas uma peça na engrenagem do mundo, com funções semelhantes às das demais 
peças pertencentes ao reino animal ou vegetal. 
• O naturalismo enfatiza com mais ênfase os comportamentos instintivos das personagens e as compara com animais. 
 
4- Personagens 
• Deveriam ser moldadas de acordo com a realidade observada de fora pelo narrador, sem idealizações. 
• O escritor toma duas direções: 
1- retrato do corpo e do comportamento exteriores da personagem ( tendência naturalista) 
2- retrato do espírito e da vida interior da personagem ( tendência realista). 
• O comportamento das personagens decorre de causas biológicas ou sociais que o determinam. Suas ações nunca são 
gratuitas. 
• Nos escritores de tendência naturalista, é comum o aparecimento de personagens que representam casos patológicos, 
porque elas podem funcionar como índices dos males que corrompiam a sociedade. 
• Para os naturalistas, a personagem está condicionada ao meio ambiente em que vive, nada podendo fazer contra o peso das 
influências externas, tornando-se vítima da fatalidade das cegas leis naturais. 
• É comum que personagens naturalistas sejam reduzidas a meros joguetes de forças biológicas e sociais. Cada uma é um 
caso a ser analisado com os recursos da ciências, para comprovar uma tese aceita pelo escritor. ( Romances de Tese). 
 
5- Concepção de amor e casamento 
• Os românticos detinham-se na análise dos antecessores do casamento. O realista/naturalista está preocupado, principalmente, 
em focalizar o adultério, que é visto como a causa da destruição da família e, conseqüentemente, da sociedade. 
• O amor para os naturalistas é um ato 
 
http://www.nilc.icmsc.sc.usp.br/literatura/romantismo1.htm
6- Tempo histórico focalizado 
• O escritor realista/naturalista preocupa-se sobretudo com personagens que retratem pessoas de sua época, diferindo assim de 
alguns procedimentos românticos de volta ao passado ou de projetos para o futuro. 
• Encara seu presente histórico – capta os conflitos do homem da época, os seus problemas concretos, dando preferência aos 
dramas cotidianos de gente simples. 
 
7- Narrativa 
• O romancista propõe-se a criar enredos em que os conflitos se resolvam de acordo com determinadas forças que estejam em 
ação. 
• O processo narrativo, obedecendo à lógica, elimina os acasos e milagres, comuns nos romances românticos. 
• Por vezes, o desenlace de uma trama é previsível e raramente ocorrem sobressaltos ou surpresas para o leitor. 
 
 8- Linguagem 
• Mais simples que a linguagem usada pelos românticos. 
• Detalhismo- com ele pretende-se um retrato fiel da realidade focalizada. 
• Nos escritores que tendem para o naturalismo, ocorrem muitas expressões tomadas às ciências físicas e biológicas. 
 
 
MACHADO DE ASSIS - Joaquim Maria Machado de Assis nasceu no Rio de Janeiro, em 1839, e faleceu no mesmo local, em 
1908. Filho de pai mulato e pobre, e mãe, lavadeira açoriana, foi criado pela madrasta, Maria Inês, em extrema miséria, após a 
morte do pai. Ocupou as mais variadas profissões: vendedor de balas, sacristão da igreja da Lampadosa, aprendiz de tipógrafo, 
empregado da Imprensa Nacional e do Diário do Rio, redator do Diário Oficial, jornalista e funcionário público, nomeado 
oficialmente pela Secretaria da Agricultura. Fez o primário em escola pública e estudou francês e latim com o padre Silveira 
Sarmento. Posteriormente, seguiu como autodidata, entregando-se à leitura variada. Na revista A Marmota publicou seus 
primeiros versos aos 18 anos de idade. 
De saúde frágil, epilético, gago e míope, Machado se tornou reservado e tímido. Aos 30 anos casou-se com Carolina Xavier 
de Novais, irmã do poeta português Faustino Xavier de Novais. A esposa, que não lhe deu filhos, lhe inspirou a criação da 
personagem Dona Carmo da obra Memorial de Aires (1908). Foi o fundador e primeiro presidente da Academia Brasileira de 
Letras. 
 
CARACTERÍSTICAS MACHADIANAS 
• Objetividade por parte do narrador; 
• Nivelamento do homem aos demais seres do universo; 
• Não idealização das personagens; 
• Condicionamento das personagens ao meio físico e social (determinismo); 
• Concepção de amor como um fato predominantemente fisiológico;• Predominância do espaço urbano; 
• Preocupação do escritor em focalizar seu tempo histórico; 
• Linguagem mais simples que a dos românticos; 
• Subordina os sonhos à realidade; 
• Procura apresentar a verdade ( verossimilhança) . 
• A emoção é retratada sem excessos, sem sentimentalismos ou artificialidade. 
• Busca da verdade por meio do retrato fiel de personagens ( indivíduos concretos, conhecidos) No Realismo os incidentes do 
enredo decorrem do caráter das personagens ( e não dos tipos) e os motivos humanos dominam as ações. Daí a relação com a 
psicologia ( que surgiu nessa época); 
• Preferência pela narração lenta (Realismo) – narram fatos minuciosos, acumulam documentos, selecionam e sintetizam 
buscando um sentido para o encadeamento dos fatos; 
• Precisão e fidelidade na observação e na pintura dos fatos. Os detalhes são reunidos e harmonizados para dar a impressão da 
própria realidade; 
• O Realismo apóia-se sobretudo nas impressões sensíveis, escolhe a linguagem mais próxima da realidade, da simplicidade, da 
naturalidade. Há o predomínio da personagem sobre o enredo, da caracterização sobre a ação. Busca atingir a beleza sob os 
disfarces do comum e do familiar, o ambiente local e na cena contemporânea. 
 
Introdução - Memórias Póstumas de Brás Cubas 
 
É a obra inaugural da fase realista de Machado de Assis, representando uma verdadeira revolução de idéias e formas: de idéias, 
porque aprofunda o desprezo pelas idealizações românticas, fazendo emergir a consciência nua do indivíduo, fraco e incoerente; 
de formas, pela ruptura com a linearidade da narrativa e pelo estilo "enxuto". É também obra inaugural do romance psicológico no 
Brasil. 
É a partir de Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881) que Machado de Assis atinge o ponto mais alto e equilibrado da 
ficção brasileira. 
É o drama da irremediável tolice humana. São as memórias de um homem igual a tantos outros, o cauto e desfrutador Brás 
Cubas, que tudo tentou e nada deixou. A vida moral e afetiva é superada pela existência biologicamente satisfeita, e as 
personagens se acomodam cinicamente ao erro. 
 
Estrutura da obra 
 
A estrutura de Memórias Póstumas de Brás Cubas tem uma lógica narrativa surpreendente e inovadora. A seqüência do livro não 
é determinada pela cronologia dos fatos, mas pelo encadeamento das reflexões do personagem. Uma lembrança puxa a outra e o 
narrador Brás Cubas, que prometera contar uma determinada história, comenta todos os outros fatos que a envolvem, para retomar 
o tema anunciado muitos capítulos depois. 
Organizados em blocos curtos, os 160 capítulos de Memórias Póstumas de Brás Cubas fluem segundo o ritmo do 
pensamento do narrador. A aparente falta de coerência da narrativa, permeada por longas digressões, dissimula uma forte 
coerência interna, oferecendo ao leitor todas as informações para conhecer a visão de mundo de um homem que passou pela vida 
sem realização nenhuma, apenas ao sabor de seus desejos. 
Logo nas primeiras páginas, o escritor brinca com a expectativa do leitor de chegar logo às ações do romance. Machado de 
Assis, por intermédio do seu narrador, se dirige diretamente ao leitor, metalingüisticamente, para comentar o livro. Diz Brás 
Cubas: 
“Veja o leitor a comparação que melhor lhe quadrar, veja-a e não esteja daí a torcer-me o nariz, só porque ainda não 
chegamos à parte narrativa destas memórias. Lá iremos. Creio que prefere a anedota à reflexão, como os outros leitores, seus 
confrades, e acho que faz muito bem”. 
 
Personagens 
 
Brás Cubas - narrador - morto aos 64 anos - “ainda próspero e rijo”, fidalgo. Peralta quando criança, mimado pelo pai, 
irresponsável quando adolescente, tornou-se um homem egoísta a ponto de discutir com a irmã pela prataria que fiou de herança 
do pai e tornar-se amante de seu amigo, Lobo Neves, se bem que nesse romance não se pode dizer propriamente que alguém é 
amigo de outro. 
 
Virgília - filha do comendador Dutra, segundo o pai de Brás, Bento Cubas A “Ursa Maior” amante de Brás Cubas casa-se com 
Lobo Neves por interesse. Mulher bonita, ambiciosa, que parece gostar sinceramente de Brás Cubas, mas jamais se revela disposta 
a romper com sua posição social ou dispensar o conforto e o reconhecimento da sociedade. 
 
Damião Lobo Neves - casado com Virgília, homem frio e calculista. Marido de Virgília, homem sério, integrado ao sistema, 
ambicioso, mas muito mais supersticioso, pois recusou nomeação pra presidente de uma província só porque a referida nomeação 
aconteceu num dia 13. 
 
Quincas Borba - menino terrível que dava tombos no paciente professor Barata, colega de escola de Brás que o encontrará mais 
tarde mendigo que rouba-lhe um relógio mas retorna-o ao colega após receber uma herança. amigo de infância do protagonista. 
Desde criança era de um temperamento ativo, exaltado, querendo ser sempre superior nas brincadeiras. Cubas diz que ele é 
impressionante quando brinca de imperador. Quando adulto, passa pelo estado de mendigo, evoluindo depois para filósofo e 
desenvolve um sistema filosófico, denominado Humanitismo, que pretende superar e suprimir todos os demais sistemas até tornar-
se uma religião. 
 
Marcela - Segundo grande amor de Brás Cubas, uma prostituta de elite, cujo amor por Brás duraria quinze meses e onze contos 
de réis. Mulher sensual, mentirosa, amiga de rapazes e de dinheiro. Ganha muitas jóias do adolescente Brás Cubas. Contrai varíola 
e fica feia, com a pela grassa como uma lixa. 
 
Sabina - irmã do narrador e que, como ele, valoriza mais o interesse pessoa e a posição social do que amizade ou laços de 
parentesco. 
 
Cotrin - casado com Sabina, é interesse, traficante de escravos e cruel com eles, mandando-os castigar até correr sangue. 
 
Eugênia - Filha de Eusébia e Vilaça, menina bela embora coxa. Era moça séria, tranqüila, dotada de olhos negros e olhar direito e 
franco. Tinha “idéias claras, maneiras chãs, certa graça natural, um ar de senhora, e não sei se alguma outra cousa; sim, a boca 
exatamente a boca da mãe". 
 
Nhá Loló - moça simplória, tinha dotes de soprano - morre de febre amarela. 
 
Cotrim - casado com Sabina, irmã de Brás; ambos interesseiros. 
 
 Nhonhô - filho de Virgília. 
 
 D. Plácida empregada de Virgília confidente e protetora de sua relação extra conjugal. 
 
Enredo 
 
O romance é a autobiografia de Brás Cubas, narrador-personagem (1ª pessoa) que, depois de morto, na condição de "defunto-
autor", resolve escrever suas memórias. Por estar morto, Brás Cubas assume uma posição transtemporal, de quem vê a própria 
existência já de fora dela, "desse outro lado do mistério", de modo onisciente, descontínuo e sem a pressa dos vivos. 
O fato de Brás Cubas colocar-se como um "defunto-autor", isto é, como alguém que conta a sua vida de além-túmulo, dá-nos 
a impressão que se trata de um relato caracterizado pela isenção, pela imparciabilidade de quem já não tem necessidade de mentir, 
pois deixou o mundo e todas as suas ilusões. Essa é uma das famosas armadilhas machadeanas, contra a credulidade do leitor 
ingênuo e romântico de sua época. 
Os fatos são narrados à medida que afloram à memória do narrador, que vai tecendo suas digressões, refletindo sobre seus 
atos, sobre as pessoas, exteriorizando uma visão cínica, irônica e desencantada de si mesmo e dos outros. 
Espécie de anti-modelo, de personagem-símbolo da ironia machadeana quanto ao ideal burguês de "vencer na vida", a figura 
de Brás Cubas constitui uma inversão da travessia de heróis burgueses, tematizados pela literatura realista. 
Machado de Assis ao escolher a situação fantástica de um morto que conta histórias, e que mesmo estando do outro lado da 
vida procura mais "parecer" do que "ser", isto é, na mente, ilude e distorce os fatos, escondendo suas misérias para que sejam 
vistas como superioridades, questiona tanto a forma quanto o conteúdo do realismo tradicional. 
Brás Cubas conta a história de sua vida, a partir de sua morte. Seu ouvinte é o leitor virtual, cinco oudez leitores, segundo 
acredita (cap. 34), Virgília, que espera venha a ler o livro (cap. 27), ou um cavalheiro (cap.87), narrador diferente da leitura 
romântica a quem o narrador das obras anteriores se dirige. 
Brás Cubas nasceu em 20/10/1805, no Rio de Janeiro, filho de Bento Cubas, da família burguesa que se enriqueceu com o 
comércio. Tinha uma única irmã, Sabina, casada com Cotrin, com quem teve uma filha, Venância. Seus tios eram João, oficial da 
infantaria, Ildefonso, padre , e Emerenciana, a maior autoridade de sua infância. Ao falecer, tinha 64 anos (...expirou às duas da 
tarde de uma Sexta-feira de agosto de 1869), era solteiro e seu enterro teve 11 pessoas. Sua morte foi assistida por 3 mulheres: a 
irmã Sabina, a sobrinha e Virgília, um de seus amores não concretizados. 
Nos nove primeiros capítulos, Brás Cubas descreve a sua morte (cap.1), o emplasto (uma idéia fixa que teve, ao final da 
vida, de inventar um “medicamento anti-hipocondríaco”, isto é, que curasse a mania de doença das pessoas), sua origem (cap.3), a 
idéia fixa do emplasto (cap.4), sua doença (cap.5), a visita de Virgília (cap.6), o delírio (pesadelo que teve antes de morrer em que 
lhe aparece Natureza ou Pandora, dona dos bens e dos males humanos, dentre os quais, o maior de todos é a esperança, cap.7), 
razão contra a sandice (em que a razão expulsa a sandice, cap.8) e transição (cap.9, em que o narrador faz uma reflexão 
metalingüística e retoma o fio narrativo, cronológico de sua vida, a partir de seu nascimento em 1805). A partir do cap.10, a vida 
de Brás Cubas é contada de forma sucessiva: nascimento, batizado, infância, juventude. 
Relata um episódio de 1814 quando, aos nove anos, delata uma cena de beijo entre Dr. Vilaça, “casado e pai” e D. Eusébia, 
uma “robusta donzela”. É aluno do mestre Ludgero Barata, “calado, obscuro, pontual” e colega de Quincas Borba, “uma flor”, o 
menino “mais gracioso, inventivo e travesso”. 
Em 1822, data da independência política do Brasil, torna-se o prisioneiro amoroso de Marcela, “amiga do dinheiro e de 
rapazes”, em quem dá o primeiro beijo e cuja paixão dura “quinze meses e onze contos de réis”. Obrigado pelo pai, vai para a 
Europa, estudar. Em Coimbra, torna-se bacharel, “mediocremente”. 
Na história de sua vida, são intercalados capítulos como O almocreve (cap.21) e A borboleta preta (cap.31), que são 
puramente filosóficos. 
Quando a mãe adoece, Brás Cubas volta ao Brasil, para velá-la, em seus últimos dias. 
Tendo aprendido na universidade a ornamentação da História e da Jurisprudência, e não sua essência, passa a usá-la para 
viver na superficial sociedade em que vivia. Seu pai quer que se torne deputado e lhe arranja uma noiva, Virgília, filha do 
Conselheiro Dutra, 15 ou 16 anos, atraente e voluntariosa. No entanto, Brás Cubas vai visitar Eusébia, a mesma do episódio de 
1814, que tinha uma filha de dezessete anos, Eugênia, “coxa de nascença”, uma “Vênus manca”. Brás Cubas a corteja, mas opta 
por Virgília, “uma jóia, uma flor, uma estrela, uma coisa rara”. Brás Cubas encontra Marcela, envelhecida, rosto marcado pelas 
“bexigas”, com um pequeno comércio na rua dos Ourives. Ao encontra-se com Virgília, tem uma alucinação e vê a namorada com 
o rosto marcado como o de Marcela, mas passa. 
Virgília, no entanto, ambiciosa, casa-se com Lobo Neves, um homem que lhe pareceu mais promissor que Brás Cubas. O pai 
de Cubas, desgostoso, morreu, inconformado. Brás Cubas, a irmã Sabina e o cunhado, Cotrin, disputaram a herança do pai e em 
tudo pode-se observar o interesse material determinando o comportamento das pessoas. Brás Cubas torna-se recluso, escrevendo 
política e fazendo literatura, chegando a alcançar reputação de polemista e poeta. 
Luis Dutra, um primo poeta de Virgília, avisa Brás Cubas de que Virgília e Lobo Neves tinham regressado de São Paulo. 
Brás Cubas começa a freqüentar a casa deles e torna-se amante de Virgília. À mesma época, encontra, na rua, o Quincas Borba, 
seu colega de infância, que vivia como mendigo. Ajuda-o com cinco mil réis e este lhe rouba o relógio, ao despedir-se. 
Quando algumas pessoas começam a desconfiar do relacionamento de Brás Cubas e Virgília, estes montam uma casinha, no 
recanto de Gamboa, cuja caseira era D. Plácida, uma antiga agregada da casa de Virgília. 
Lobo Neves, marido de Virgília aguarda sua nomeação para presidente da província e convida Brás Cubas para ser seu 
secretário. Este reluta em aceitar. 
Virgília tem um filho, Nhonhô, do marido, mas Cubas sonha ter um filho com ela. 
Brás Cubas recebe uma carta de Quincas Borba que lhe devolve o relógio roubado e quer lhe expor sua teoria filosófica do 
Humanitismo, o princípio das coisas. 
Lobo Neves recebe denúncias da traição da mulher. E nomeado Presidente da Província e o casal parte, terminando aí o 
romance proibido entre Virgília e Brás Cubas. 
Quincas Borba visita Brás Cubas, conta-lhe da fortuna herdada de um tio de Barcelona, mas só se ocupa de sua doutrina 
filosófica, o humanitismo, uma paródia das teorias científicas no final do século XIX. Brás Cubas fica seduzido pela teoria do 
Humanitismo, identificando-se com sua explicação materialista da existência humana. 
Outros motivos que lhe compensaram a perda de Virgília foram a tentativa da irmã de casá-lo com Nha Loló e a ambição 
política. Aquela no entanto, morre, aos 19 anos de febre amarela. Brás Cubas torna-se deputado, atuando ao lado de Lobo Neves. 
Em 1855, Brás Cubas encontra Virgília, num baile. Ele a acha magnífica, mas nada mais ocorre entre eles. 
Ao chegar ao 50 anos, Brás Cubas perde o interesse pela vida, que é o amor. Quincas Borba o convence de que era a idade 
da ciência e do governo, mas Brás Cubas perde sua cadeira de deputado e, conseqüentemente, a paixão pelo poder. Sua única 
companhia é Quincas Borba, com quem filosofa sobre a vida e a existência humana através de observações da realidade, como 
uma luta de cães por um osso. 
Brás Cubas recebe um bilhete de Virgília que pede-lhe para socorrer D. Plácida, que está a morrer. Ele dá-lhe algum dinheiro 
e a interna na Misericórdia, onde falece. 
Resolve publicar um jornal, de oposição ao governo, que contraria Cotrin, seu cunhado. Pouco mais de seis meses depois, o 
jornal deixa de sair. 
Lobo Neves morre, na iminência de ser ministro. Brás Cubas vai-lhe ao enterro e vê que Virgília chorava “lágrimas 
verdadeiras”. 
Brás Cubas reconcilia-se com o cunhado Cotrin, ingressa na ordem, para dar alguma utilidade a sua vida, segundo ele, foi a 
fase mais brilhante de sua vida. No hospital da ordem, viu morrer a ex-namorada, a linda Marcela, agora feia, magra, decrépita; 
também encontrou, num cortiço, outra ex, Eugênia, a filha de D. Eusébia e do Vilaça, tão coxa como antes e mais triste. 
Quincas Borba, que havia partido para Barcelona, volta, mais louco ainda, morrendo pouco tempo depois. O último capítulo, 
Das negativas, finaliza a obra com o tom cético e realista que atravessa toda a obra: Brás Cubas não se torna famoso por seu 
emplasmo, não foi ministro, nem califa, nem se casou. Em compensação, não comprou o pão com o suor do rosto, pois nunca teve 
de trabalhar. Não morreu como D. Plácida, Marcela, Eugênia e tantos outros, nem se tornou louco como Quincas Borba. Ao 
morrer, chega ao outro lado, sentindo-se um pouco credor, pois não teve filhos e portanto, não transmitiu “a nenhuma criatura o 
legado de sua miséria”. 
 
Comentários 
 
O autor, nesta obra, acabou com o sentimentalismo, o moralismo superficial, a fictícia unidade da pessoa humana, as frases 
piegas, o receio de chocar preconceitos, a concepção do domínio do amor sobre todas as outras paixões; afirmava-se a 
possibilidade de construir um grande livro sem recorrer à natureza, desdenhava-se a cor local, um autor colocava-se pela primeira 
vez dentro dos personagens. 
O humorismo começa pela dedicatória do narrador: “Ao verme que primeiro roeu as frias carnes de meu cadáver dedico 
como saudosa lembrança estas Memórias póstumas.”Em seguida, como que preparando o leitor para a revolução estética que o 
espera, Brás Cubas anuncia o espírito inusitado de sua obra: “Escrevia-a com a pena da galhofa e a tinta da melancolia”. A visão 
irônica dos acontecimentos e dos pensamentos do narrador mesclada a comentários amargos e cínicos sobre a existência produz 
uma concepção de mundo absolutamente singular que estrutura todas as obras de segunda fase de Machado de Assis. 
Além disso, Brás Cubas adverte que também o seu modo de narrar é inovador: “Trata-se, na verdade, de uma obra difusa”. 
O enredo de ações trepidantes, que vai num crescendo até o clímax, é completamente abandonado, cedendo lugar a episódios mais 
ou menos soltos, que se alicerçam em pormenores aparentemente banais, em considerações filosóficas abusadas e em tiradas 
humorísticas, tudo ilusoriamente desvinculado da história central. Brás Cubas usa um estilo de vaivém, interrompendo o fluxo da 
intriga para brincar com o leitor ou tecer algum comentário de fingida irrelevância. Quando, no entanto, o romance se fecha, os 
inúmeros episódios formam uma unidade, dando a este mesmo leitor a noção de um conjunto harmonioso e convincente. 
Aspecto importante nas Memórias é o gosto pela citação que o narrador exibe. A cultura de Brás Cubas é enciclopédica, 
passando por todo o conhecimento geral da época. Esta cultura, entretanto, é examinada sob o ângulo da paródia. Todas as 
citações e referências são extraídas de seu contexto específico e remetidas para o contexto pessoal do narrador, como se este 
debochasse da tradição histórica e religiosa, colocando o saber culto de seu tempo de cabeça para baixo. 
A escolha de um defunto autor para relatar a obra pode ser interpretada de vários ângulos. Alguns críticos vêem a morte de 
Brás Cubas como um símbolo do fim da concepção romântica que ainda se fazia presente nos romances de primeira fase de 
Machado de Assis. Outros sugerem um enfrentamento do escritor com as propostas do Realismo / Naturalismo, então em plena 
voga, já que uma fala vinda do túmulo contrariava os princípios de racionalidade e verossimilhança, obrigatórios aos autores 
daquela escola. Indiscutível, no entanto, é a idéia machadiana de que só um morto poderia apresentar os fatos de sua existência 
sem escrúpulos, sem fantasias e sem o temor da opinião pública. Só um morto – por não ter nada a perder – revelaria os seus 
intuitos mesquinhos, o seu egoísmo, a sua impotência para a vida prática e a sua desesperada sede de glória. 
Brás Cubas não é a tradução ficcional de Machado de Assis. Esta confusão entre o autor e seu personagem advém da 
narrativa ser feita em primeira pessoa. Contudo, Brás Cubas visivelmente representa uma classe social que não é a de Machado. O 
ângulo com que o narrador examina o mundo é o dos grandes proprietários: trata-se de alguém que não trabalha, que vive 
parasitamente, de alguém cheio de caprichos, enredado com a falta de perspectivas de sua existência. A própria técnica de narrar 
de Brás Cubas, misturando irreverência e desrespeito a tudo e a todos, corresponde à desfaçatez da classe dominante brasileira do 
século XIX. Assim, os erros e transgressões do personagem expressariam o arbítrio e a falta de significado ético de uma elite 
historicamente condenada à destruição. 
O procedimento básico de Brás Cubas em relação a sua vida é o do desmascaramento. Entre a norma social e a opinião 
pública, de um lado, e as intenções e desejos escusos do personagem, de outro lado, forma-se uma zona obscura que o narrador 
trata de esclarecer. Os “bons sentimentos são a máscara hipócrita” do egoísmo, do interesse e da luta pela glória. Instaura-se um 
terrível relativismo moral e emerge com freqüência certa noção da gratuidade e mesmo do caráter absurdo de certos gestos 
humanos. Episódio revelador desta dimensão inexplicável de alguns atos ocorre, por exemplo, no capítulo A borboleta preta. A 
borboleta invade o quarto de Brás Cubas e este, sem nenhuma razão plausível, a abate com uma toalha. Depois, ele tenta justificar 
a sua ação dando-lhe uma forma socialmente aceitável: “Também por que diabo não era ela azul?” Falsas racionalizações como 
esta são emitidas o tempo inteiro pelo narrador. 
Personagem de grande significação na obra é Quincas Borba, antigo colega de Brás Cubas. Convertido em mendigo 
cleptomaníaco e filósofo, Quincas Borba expõe com hilariante seriedade um sistema de idéias designado como Humanitismo. A 
teoria do Humanitas é uma caricatura feroz ao positivismo e ao cientificismo dominantes na época. Paradoxalmente, o ridículo 
discurso filosófico de Quincas Borba, próximo da insanidade, – cujo lema darwinista é “Ao vencedor as batatas” – parece 
expressar a própria concepção machadiana de mundo, centrada na luta selvagem do indivíduo para estabelecer algum tipo de 
supremacia sobre os demais. 
No capítulo O almocreve, Brás Cubas está sendo arrastado por um jumento, pois tinha sido jogado fora da sela ficara com o 
pé preso no estribo. Possivelmente morreria não fosse a corajosa intervenção de um almocreve (condutor de bestas de carga), que 
deteve o animal. A primeira intenção do narrador foi a de presentear o seu salvador com cinco moedas de ouro, depois pensou dar-
lhe duas, uma moeda de ouro. Acabou metendo na mão do almocreve uma moeda de prata, mas ao afastar-se pensou com remorso 
que deveria ter-lhe dado apenas uns vinténs, racionalizando que o homem não tinha em mira nenhuma recompensa ao salvá-lo, 
cedendo apenas a um impulso natural. 
O mais célebre capítulo do livro, porém, é O delírio. Em estado de transe causado pela febre, Brás Cubas é arrebatado por 
um hipopótamo que o leva a origem dos séculos. Surge então uma mulher imensa de contornos indefinidos que diz-se chamar 
Natureza ou Pandora. Quando, por fim, Brás Cubas vê de perto o rosto da estranha, percebe-lhe a impassibilidade egoísta e sua 
eterna surdez, ou seja trata-se de algo ou alguém indiferente ao clamor humano. Ela conduz o defunto autor ao alto de uma 
montanha e lhe permite contemplar a passagem dos séculos e entender o absurdo da existência, sempre igual, centrada apenas no 
egoísmo e na luta pela conservação. O personagem vê a história como uma eterna repetição. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISBELA E O PRISIONEIRO 
OSMAN LINS 
 
 
 
Osman da Costa Lins – História, trajetória e literatura 
 
Osman da Costa Lins nasceu a 05 de julho de 1924 em Vitória de Santo Antão, cidade de Pernambuco. Aos dezesseis dias 
de vida, perdeu a mãe, Maria da Paz de Mello Lins, em decorrência de complicações do parto. 
Com freqüência, Osman Lins menciona, em entrevistas, desconhecer seu rosto, porque ela não deixou fotografia. Segundo 
ele, esse fato teria configurado seu trabalho de escritor que, metaforicamente, seria o de construir com a imaginação um rosto 
inexistente. A transfiguração poética dessa situação aparece em vários momentos de sua obra em que irrompe o motivo da 
fotografia. 
A perda da mãe determinou seu convívio com parentes próximos que lhe deram afeto familiar: sua avó paterna, Joana 
Carolina; sua tia Laura casada com Antonio Figueiredo, comerciante, de quem o menino, maravilhado, ouvia narrações de suas 
viagens, até altas horas da noite. As estórias orais, inventadas pelo tio, despertaram nele o gosto de narrar. 
Ecos de sua ligação afetiva com o pai, Teófanes da Costa Lins, localizam-se em crônicas dedicadas ao dia do alfaiate, sua 
profissão, e em vários momentos de reflexão teórica, nos quais Osman Lins estabelece relações entre o trabalho do escritor e o do 
artesão. 
Cursou o primário de 1932 a 1935, no Colégio Santo Antão. Ao terminar o ginásio, realizado no período 1936-1940 no 
Ginásio de Vitória, impõe-se para ele a necessidade de deixar a cidade natal que pouco podia lhe oferecer em termos de estudos. 
Muda-se para Recife, em 1941, quando consegue o primeiro emprego, como escriturário na secretaria do, então, Ginásio de 
Recife. 
A essas alturas, já era habilitado em datilografia, curso que finalizou

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