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1 Humanização no Cuidar: Uma Proposta de Desenvolvimento de Equipei Paula Camargo Psicóloga e Administradora de Empresas. Pós-graduada nos cursos de Psico-Oncologia pela Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais (FELUMA), Psicologia Junguiana pelo Instituto de Medicina de Reabilitação – Rio, Recursos Humanos pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, e certificada pela Sociedade Brasileira de Psico-Oncologia do Rio de Janeiro. Recentemente, desenvolveu para o curso avançado em Cuidados Paliativos pela Casa do Cuidar o trabalho de Conclusão de Curso “Humanização no Cuidar: Uma Proposta de Desenvolvimento de Equipe”. Resumo: O interesse por este tema é decorrência de uma série de estudos que se iniciaram com o despertar da importância da qualidade de vida diante da finitude. Cuidados paliativos e humanização, inexoravelmente compõem este cenário, necessitando de aportes que equilibrem saber e sentir, levando-se em consideração os aspectos intersubjetivos e interdisciplinares que constituem sua equipe de saúde. Um modelo de proposta de desenvolvimento de equipe é apresentado com a finalidade de estreitar laços que priorizem a arte do cuidado de forma compartilhada e totalmente comprometida com sua concepção de integralidade no cuidar. Palavras chave: Cuidados paliativos, humanização, instituição hospitalar e equipe multiprofissional. Introdução: Atualmente, à concepção de morrer em nossa sociedade, implica em expor demasiadamente as fragilidades naturais do doente, como também as dificuldades dos familiares em sustentar, financeiramente, todo um aparato tecnológico que não soluciona e nem ameniza a dor e o sofrimento de quem vai deixar de existir. Isso sem contar com a inabilidade e falta de competência de alguns profissionais em lidar com uma questão tão delicada onde envolve sentimentos de profunda simplicidade que muitas vezes assusta. Socialmente, o que parece diferenciar o passado do presente, é a predisposição de encarar a morte de uma maneira mais equilibrada e humanizada, respeitando o limite natural que ela representa. Aquela ideia de que com a evolução tecnológica, supostamente, o homem seria capaz de controlar o seu próprio fim, levou a humanidade a coisificar a morte, resultando num processo de profundo sofrimento e solidão. Hoje, em pleno século XXI, percebe- se que a morte existe, está muito mais próxima do homem; enquanto pensamento, cabendo a ele mesmo buscar a alternativa para lidar com a sua subjetividade frente à finitude. A repercussão desta nova atitude, forçosamente instaura um novo paradigma no contexto institucional, na medida em que a dor, o sofrimento e o tempo de sobrevida passam a ser questionados pelo próprio doente ou por sua família, exigindo do profissional de saúde uma postura diferenciada diante da vida e da morte, legitimado pelo novo código de ética médica. Cuidar de forma humanizada, estabelecendo um equilíbrio entre competências técnica e emocional, sugere promover emergência no estabelecimento de articulações que visem introduzir a concepção de integralidade de cuidados, cujos preceitos se fundamentam numa multidimensionalidade de sistemas constituídos por doença – paciente – familiar – equipe de saúde e a instituição hospitalar. i Artigo publicado na REVISTA BRASILEIRA DE CUIDADOS PALIATIVOS 2012; 3 (4), p. 19-30, ABCP – São Paulo. 2 Sob a perspectiva da humanização na saúde, dentre seus pressupostos, são encontrados de forma clara e abrangente a importância de um aprimoramento no campo de interações entre todos os envolvidos no processo saúde – doença, visando melhorias de qualidade e prestações de serviços ofertados pela rede de saúde. Esta preocupação se intensifica na medida em que se constatam deficiências no eixo comunicacional, mais precisamente na rede pública hospitalar, prejudicando sensivelmente a execução de cuidados, tanto na condição de usuário, quanto na de cuidador profissional. Esta lacuna, por sua vez, parece suscitar uma ausência de comprometimento emocional projetada sob a forma de descontentamento profissional, transparecendo em inúmeras situações tais como, discrepâncias entre colegas de equipe dificultando uma adequada abordagem de cuidados na condição de interdisciplinaridade, descrédito nos desígnios institucionais, incidência de burnout entre os profissionais devido aos excessivos desgastes frente às exigências instituídas pela própria rotina de trabalho, ausência do espírito de equipe, dificuldade em lidar com situações de intenso sofrimento provocadas pela experiência do processo de morrer e da morte e não elaboração do luto. Desta forma, este artigo apresenta como propósito aprofundar conceitos levando em consideração as contribuições dos cuidados paliativos e da humanização para a busca de uma reeducação que promova à conscientização e sensibilização do cuidador profissional sob a perspectiva de integralidade no cuidar. 1. Cuidados Paliativos: O Renascer das Cinzas Com base na definição estabelecida pela Organização Mundial da Saúde (2002), juntamente com os princípios que o legitimam, cuidados paliativos surgem como uma nova modalidade de assistência, priorizando a relação dialógica entre paciente fora de possibilidade de cura, família e equipe de saúde, integrando aspectos de natureza biopsicossocial e espiritual. Este é o cenário da morte contemporânea, instaurado na década de 1970, promovedora de profundas transformações no que diz respeitos às atitudes diante da morte. De acordo com Menezes¹, “o ideal é que o indivíduo que está morrendo tenha controle do processo de morte, realizando escolhas a partir de informações sobre as técnicas médicas e espirituais que achar adequadas. A palavra de ordem é a comunicação franca entre profissionais de saúde e pacientes: o tratamento deve ser discutido, em suas várias etapas, entre enfermos, seus familiares e o médico responsável”. Em se tratando de comunicação em cuidados paliativos, imprescindível reconhecer a peculiaridade da experiência pessoal, tanto no cuidador quanto naquele que é cuidado, no intuito de viabilizar o vínculo necessário para que o desligamento da vida aconteça. Segundo Kovács², “aprender a escutar e a falar, a dar más notícias e manter-se parceiro, compreender que cuidadores e doentes podem cuidar uns dos outros, autocuidar-se e ser cuidado e reconhecer e aprender a lidar com a angústia que a fase final da vida traz são aspectos básicos para a boa comunicação em cuidados paliativos.” Pondera Menezes¹ que a inclusão do diálogo na assistência paliativa, além de dignificar a condição da mortalidade humana, promove o reconhecimento dos limites reais, seja no contexto individual quanto profissional, de todos os envolvidos no processo de morrer. 3 O ingresso da equipe multiprofissional evidencia a mudança de paradigma na medida em que a visão tradicional do modelo institucional cede lugar ao modelo sistêmico, cuja epistemologia incorpora os conceitos de multidisciplinaridade, interdisciplinaridade e transdisciplinaridade, na dimensão do cuidar. A importância dos mesmos consiste na busca da integração do conhecimento científico e da humanização junto à intervenção da medicina paliativa. Bowlby³ esclarece que a compreensão da formação e rompimento dos vínculos afetivos desde os primórdios da vida humana são de fundamental importância na relação de base segura, em virtude de serem sinalizadores das diversas formas de padrões de comportamento de ligação instaurados nas relações onde o vínculo afetivo se faz presenciar, dos quais são largamente utilizados no decorrer da vida. Compreender a formação e rompimento de vínculos como uma atitude inerente a singularidade do indivíduo, presente tanto nas situações de vida e de morte, sugere uma reflexão acerca dos sofrimentos instaurados mediante condições limitantes, tais como a finitude humana. Deacordo com Ferreira4, os termos vínculo e vincular-se suscitam uma diversidade de significados, tais como, respectivamente, ligação moral, nó, liame, ônus, restrições, relação, subordinação, nexo, sentido, eternizar-se, perpetuar-se, imortalizar-se, sujeitar, obrigar, submeter coisas a vínculo, entre outras coisas mais, quando relacionados à experiência da morte e do morrer. Estas definições permitem um olhar e uma escuta acerca dos arcabouços psicológicos construídos ao longo da vida no que diz respeito às relações primárias no campo da inter-relação e da afetividade. Na perspectiva psicanalítica, segundo Pichon-Rivière5 o vínculo normal é proveniente da “primeira relação da criança com o peito da mãe”, por meio das situações parasitárias e simbióticas, onde acontece um “intercâmbio de situações emocionais e de afeto”, e que quando minimizados por meio do desenvolvimento do bebê, permite uma diferenciação entre o objeto e o sujeito. Sugere ainda que por mais gradativo que seja este afastamento mãe-bebê ele é passível de uma ligação afetiva que orienta o próprio sujeito em sua sedimentação egóica. Tal colocação permite considerar que em se tratando de relações sedimentadas por meio de uma vivência primordial com a mãe, onde a dualidade de se estar vinculado – desvinculado permeia em tempo integral, imprescindível considerar a diversidade da natureza do vínculo, tão presentes na interação de fatores humanos e físicos, na conduta exterior, na vivência, nas somatizações e nas questões trazidas pelo próprio indivíduo, seja no nível concreto ou abstrato. Para Taragano5, “o vínculo configura uma estrutura dinâmica em contínuo movimento, que funciona acionada por motivações psicológicas, resultando daí uma determinada conduta, que tende a se repetir tanto na relação interna quanto na relação externa com o objeto”, sugerindo que este intercâmbio se manifesta em diversas situações, podendo estas pertencer à dimensão da vida ou da morte. Em situações de adoecimento cujo prognóstico conduz aos caminhos da terminalidade, vincular-se e desvincular-se neste contexto implica na capacidade de enfrentamento diante do inevitável. A partir deste cenário, onde incertezas e mudanças remetem à sensação de separação, desconexão ou desamparo, aparentemente relacionado apenas a questões extrínsecas, a angústia da morte parece mobilizar aspectos intrínsecos, relacionados a crenças e padrões inatos e herdados que entremeiam nossas teias de relações no decorrer de nossa existência até o momento da finitude, possibilitando refletir sobre as formas de 4 enfrentamento. De acordo com Lipp6, “o termo enfrentamento, usado com o mesmo sentido da palavra inglesa coping, significa a estratégia ou o esforço cognitivo e comportamental que o indivíduo emprega para administrar as exigências impostas por um agente estressor” e apresenta cinco funções principais que visam reduzir as condições ambientais que causam dano, tolerar ou adaptar-se a situações negativas, manter uma autoimagem positiva diante da adversidade, manter o equilíbrio emocional bem como um relacionamento satisfatório com os outros. Sendo assim, dois aspectos parecem ser de fundamental importância para o fornecimento da relação da base segura por parte do cuidador: seu autoconhecimento frente aos comportamentos de ligação que foram estabelecidos nas suas relações afetivas, bem como a exploração e cuidados dos mesmos, para melhor compreensão das possíveis formas de estabelecimento de ligação afetiva emanadas, principalmente, pelo paciente fora de possibilidade de cura. Desta forma, imprescindível uma reflexão sobre a consciência do morrer e da morte. As reações de temor e horror frente à morte e ao processo de morrer, que sugerem acompanhar o indivíduo na medida em que ele se conscientiza de sua própria condição de mortal, chamam atenção pelo seu comportamento desproporcional. Segundo Kastenbaum e Aisenberg7, o filósofo Jacques Choron elaborou uma análise sobre o medo à morte relacionado com a distinção eu/outro. De acordo com seus estudos, coloca que o indivíduo teme à morte em três situações específicas, sendo respectivamente; o medo de morrer, o medo da pós-morte e o medo da extinção. Em cada um desses medos, o filósofo diz que existem variados sentimentos manifestos, quando estudados na perspectiva morte do eu e morte do outro, justificando desta forma a atitude antagônica dos indivíduos frente à morte em nossa sociedade. Ressalta também que o maior temor do homem está ligado a possibilidade da sua não existência. 2. Multidimensões da Humanização: Uma Questão de Consciência Ao iniciar o estudo sobre humanização do setor de saúde, bem como suas contribuições na abordagem paliativa, imprescindível compreender o desenvolvimento do conceito humanismo, que se originou na Grécia Antiga, demarcando suas passagens em períodos mais significativos ao longo da História, levando em consideração aspectos relacionados aos condicionamentos herdados. De acordo com a cronologia da História, o Renascimento foi um período marcado por transformações em muitas áreas da vida humana, que assinalam o final da Idade Média e o início da Idade Moderna, recebendo tal designação em virtude da redescoberta e revalorização das referências culturais, que nortearam as mudanças deste período em direção a um ideal humanista e naturalista. Importante considerar que esta fase parece implicar num resgate de valores e princípios vivenciados sob o predomínio de uma consciência coletiva em detrimento da consciência individual. De acordo com Minayo8, as contribuições do período Renascentista no que diz respeito a este conceito estão “relacionadas ao resgate do humanismo preconizado na Antiguidade”, sendo uma de suas mudanças estruturais a busca de “uma nova atitude em relação à humanidade”, já que a época precedente fora delimitada pelo obscurantismo, caracterizada pelo domínio da religião sobre o poder e as consciências humanas. Surge então o antropocentrismo, que instaura um novo paradigma calcado na racionalidade humana, cuja ênfase consiste “no 5 ideal de autonomia do homem e a crença de que toda sabedoria pode ser transformada em conhecimento”, concedendo à ciência o lugar da formalização e legitimação da vida manifesta, conforme consta no artigo de revisão A Humanização na Assistência de Saúde9. Na fase do Iluminismo, o aprofundamento de questões relacionadas aos direitos dos indivíduos e dos cidadãos funda um movimento de busca que unifica existência humana, faculdade de pensar, articulações entre a experiência vivida e a razão lógica. Com o advento da Modernidade, caracterizado pelo desenvolvimento industrial, mudanças sensíveis repercutem em nível de mentalidades, no que diz respeito à definição inicial concedida a qualidade de humano, onde demarca a presença de uma integralidade de sistemas que legitimam a produção e atuação de cada indivíduo. Devido às transformações ocasionadas pelo conhecimento e utilização da tecnologia, o desarraigar dos pressupostos humanistas parecem emergir quando o foco não está mais destinado à necessidade humana e sim, a eficiência de resultados, que na área de saúde parece se estabelecer mediante a inserção do processo de medicalizaçãoii. Com seu ingresso, a partir do final do século XIX, consolida-se a instituição hospitalar representada pela sistematização e, consequentemente instauram-se os processos de medicalização do social aliado individualização, transformando sensivelmente condutas e comportamentos humanos na área da saúde, principalmente em relação à morte. Assim sendo, o humanismo no século XXI pressupõe uma sucessão de ressignificações onde procuram coadunar multidimensões subjetivas associadas às necessidades de aprimoramento técnico e científico. Na atualidade, esta busca de equilíbrio acerca do conceito humanismo transparece, através do “vocábulo humanização”, tendo na área da saúde a representação de “um movimento instituintedo cuidado e da valorização da intersubjetividade das relações”, conforme afirma Minayo8. Sob a perspectiva de cuidados paliativos, cuja abordagem de assistência visa aliviar a dor e o sofrimento, preconizando a importância de um trabalho integrado urgem a necessidade de um despertar para a sensibilização profissional, quesito indiscutível para a dimensão psicológica nos fatores de humanização. No Brasil, a conceituação e a análise da humanização do cuidado provieram de uma pesquisa realizada na rede pública dos serviços de saúde, cujos resultados implicaram na constituição de uma política ministerial a partir do ano de 2000. De acordo com Deslandes10, a preocupação com o atendimento à saúde e a inserção da humanização no setor público é legitimada através do Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar (PNHAH) na intenção de “promover uma nova cultura de atendimento à saúde” e “aprimorar as relações entre profissionais, entre usuários/profissionais (campo das interações face-a-face) e entre hospital e comunidades (campo das interações ii A medicalização pode ser compreendida como um processo pelo qual a continuada evolução tecnológica modifica as práticas da medicina por meio de inovações em várias áreas, como métodos diagnósticos e terapêuticos, indústria farmacêutica e equipamentos médicos. A medicalização do social pode ser referida à redescrição médica de eventos de gravidez, parto, menopausa, envelhecimento e morte, bem como de comportamentos sociais tidos como desviantes, como alcoolismo e uso de drogas. A medicalização refere-se à ampliação de atos, produtos e consumo médico e a interferência crescente da medicina no cotidiano individual, com a imposição de normas de conduta social. (Menezes, 2004; apud Corrêa, 2001 pg. 24). 6 sociocomunitárias), visando à melhoria da qualidade e eficácia dos serviços prestados por estas instituições”. Na abordagem paliativa, a subjetividade exerce um papel fundamental nesta modalidade de assistência em virtude dinâmica interacional, provenientes das sucessivas relações interpessoais exigidas pela rede de cuidados ao qual o indivíduo está inserido. Muito embora, de modo geral, a atenção recaia na relação paciente – família, imprescindível analisar como o profissional de saúde lida com sua dimensão emocional ao se deparar com a dualidade humanização – desumanização, tão presentes em sua prática cotidiana. A presença de uma articulação constante entre linguagem, verbal ou não verbal, e, realidade, oriundos dos diversos modos de existir do ser humano, promove uma reflexão acerca da comunicação e do estabelecimento de relação empática num universo composto por sujeitos capazes de “construir rede de significados que, ao serem compartilhadas, conformam uma identidade cultural”. Segundo Deslandes10, a inviabilidade e o estreitamento das comunicações, detectados na atualidade nos serviços de saúde, sugerem ser provenientes de condicionamentos herdados no que diz respeito ao uso da palavra e o estabelecimento da linguagem médico científica. O papel da comunicação na humanização parece ocupar grande parte das carências existentes nas relações estabelecidas, sejam elas de nível pessoal quanto profissional. Outra questão de suma importância é atribuída à empatia, cuja habilidade consiste na capacidade de colocar-se no lugar do outro, avaliando aspectos de cunho emocional e subjetivo. Tal atitude merece consideração, pois, a incapacidade do estabelecimento de uma relação empática repercute sensivelmente sob a forma de obstáculos, podendo emergir em várias situações, como por exemplo, na constituição e desenvolvimentos de equipes interdisciplinares, na estruturação de diretrizes de tratamento, na qualidade da assistência em cuidados, no alcance de metas estabelecidas pela instituição, dentre outros. O despreparo e a suscetibilidade emocional frente à incapacidade do cuidador profissional em estabelecer vínculos saudáveis sugerem dificultar ainda mais o exercício de uma assistência pautada no cuidar e assegura a crença arquetípica de que os ensejos cognitivos atribuídos à mentalidade do curar ainda prevalecem, inviabilizando, desta forma, a inserção de uma atenção humanizada e compartilhada entre todos os envolvidos. De acordo com pesquisa sobre o luto do profissional de saúde11 realizada com dezoito profissionais da área de saúde, com a finalidade de investigar como os mesmos lidam com situações de perda em sua rotina de trabalho, um de seus resultados aponta para a dificuldade de autopercepção e expressão de sentimentos relacionados ao processo de morrer e a morte, e posteriormente, a elaboração do luto da equipe, questão bastante presente em se tratando de abordagem paliativa. Refletir sobre a importância dos cuidados paliativos bem como elencar possíveis fatores estressores que se evidenciam mediante a assistência prestada pelos seus profissionais de saúde, envolvendo o contexto de humanização de saúde aliado às experiências existenciais que envolvem o processo de morrer e à morte, solicita atenção na medida em que ainda se detecta deficiências no que diz respeito às questões emocionais, conforme afirma uma pesquisa denominada A Relação Docente-Acadêmico no Enfrentamento do Morrer12, tais como carências existenciais, ausência de sentido e sentimentos de onipotência. Outro artigo, intitulado Papel dos 7 Profissionais de Saúde na Política de Humanização Hospitalar13, corrobora tal pensamento quando afirma que “continua ser importante curar doenças, mas sem esquecer que mais importante ainda é curar o doente; e não somente curá- lo, mas também cuidar dele”. Na pesquisa acima mencionada, dentre as limitações e dificuldades existentes por parte do cuidador profissional em situações de dor, sofrimento e perda, destaca-se a não expressão de emoções ou o manejo de questões afetivas, como forma de assegurar crenças preestabelecidas, tanto na formação acadêmica quanto na institucional, principalmente em se tratando da temática morte. Averiguar o ponto de encontro entre humanização e cuidados paliativos, bem como elencar possíveis dimensões que possam interferir na atuação do profissional de saúde, parece ser o grande desafio da atualidade, na medida em que se sinaliza a inexistência de um espaço de escuta que coadune ambas as necessidades. Cada vez mais na prática hospitalar a presença de situações limites, como por exemplo, escolher e testemunhar os últimos momentos de vida do paciente juntamente com seus familiares, vem exigindo dos profissionais de saúde condutas individuais e sociais que viabilizem o equilíbrio entre viver e morrer de forma cuidadosa. Esta afirmação permite uma análise exploratória acerca daquele que cuida. 3. Cuidando de Quem Cuida: Entre o Conhecimento e a Vivência Por definição, intersubjetividade14 “pressupõe a existência de um espaço relacional entre duas ou mais pessoas envolvendo suas subjetividades, no campo da linguagem, local de compreensão de diferenças de ponto de vista, necessidades e desejos, e construção de respostas conjuntas para questões de interesse comum”, e interdisciplinaridade, visa a buscar a “compreensão integral do ser humano no contexto das relações sociais e do processo saúde – doença, assim como, em sua prática, uma maior abrangência e melhor qualidade na assistência prestada ao paciente”. Carvalho6 afirma que, “equipe é um grupo de trabalho altamente efetivo, coeso, constituído por indivíduos que atuam juntos, comprometidos em alcançar um objetivo comum”, demandando trabalho sistematizado e presença de elementos que o constituam com tal, como por exemplo, “liderança compartilhada, habilidades de trabalho em grupo, clima coesão e nível de contribuição dos membros do grupo”. Tal afirmação parece sugerir a existência de um distanciamento emocional no que diz respeito à intersubjetividade de seus integrantes, priorizandoapenas os aspectos de natureza formal acerca do trabalho em grupo, característica muito peculiar nas esferas acadêmicas e institucionais. Esta deficiência também foi evidenciada no documento oficial do Programa Nacional de Humanização de Assistência Hospitalar (PNHAH), realizados a partir de 2000, onde uma das propostas a serem trabalhadas eram a articulação dos avanços tecnológicos com o bom relacionamento no eixo relacional existente entre usuários de sistema de saúde, profissionais de saúde e a própria instituição, devido à existência de ações desumanizadoras na rede de cuidados. Importante salientar que a busca da conscientização e reintrodução da dimensão subjetiva no contexto da assistência e atenção em saúde, abrangendo todos os envolvidos no processo de cuidados inclusive os aspectos socioculturais e institucionais, vem a ser um dos pressupostos da humanização na assistência hospitalar. 8 Transformar o conhecimento em experiência vivencial implica na permissão de um espaço interacional onde reúnam interesses institucionais e grupais, rompendo com a mentalidade paternalista focada na decisão médica como única alternativa, no que diz respeito à assistência e cuidados. Deslandes10mostra que a “leitura paternalista” vem a ser fruto de uma cultura de atendimento instituída em decorrência de barreiras comunicacionais, onde a instituição de uma linguagem diferente e interdita, por si só, propiciava um distanciamento natural na relação profissional de saúde – paciente. Esta atitude, ainda vigente na atualidade, sugere reforçar a ideia da unidisciplinaridade, contrapondo os pressupostos da visão interdisciplinar bem como, assegura ao profissional julgar “saber o que é melhor para o paciente e tenta prover os meios para satisfazer pretensas expectativas, o que não dá resposta satisfatória ao problema”, devido a sua incapacidade de se colocar no lugar do outro. Pensar sobre a qualidade das relações intersubjetivas no contexto da instituição hospitalar remete inevitavelmente à importância das equipes interdisciplinares no que diz respeito à busca de humanização da assistência em saúde, principalmente nos cuidados paliativos. Esta correlação entre os termos transparece na medida em que a integralidade de cuidados passa a ser inserida no campo da prática, principalmente em situações de final de vida, conforme pondera Rios14 quando afirma que, “os cuidados paliativos, como modelo de atenção que escapa ao reducionismo biológico, operariam os valores da humanização das práticas de saúde, particularmente nos aspectos considerados essenciais para o cuidado integral da pessoa em momento significativo da história”. De modo geral, na dinâmica do cuidar e ser cuidado emerge questões de cunho sociopsicológico relacionadas ao convívio com o processo do adoecer, padrões funcionais ou disfuncionais existentes na interação familiar, luto antecipatório, conspiração do silêncio, oscilação permanente das formas de enfrentamento, diversidade emocional quanto à aceitação de um diagnóstico desfavorável, sentimentos de impotência, incertezas, mudanças, perdas, a iminência da morte, conduzindo seus cuidadores profissionais a fatores estressores despendendo intensa carga emocional. O processo de cuidar exige por parte da equipe interdisciplinar uma percepção consciente sobre estas inúmeras formas em estar se colocando junto ao paciente, ou seja, através do olhar, da proximidade corporal; respeitando-se evidentemente os espaços interpessoais estabelecidos pela interação, do toque e do tom da voz, bem como oferecer, em momentos críticos do adoecer, o reconhecimento de estar sendo visto, em ambas as perspectivas. Sendo assim, no exercício dos cuidados paliativos, a equipe de saúde se depara com a dualidade vida-morte de modo a instigar seus movimentos de defesa ou enfrentamento. As exigências externas e internas incitadas pelo ato de cuidar, neste caso, permitem uma reavaliação sobre a prioridade do cuidado, uma vez que a atitude da equipe de saúde pode recorrer a um distanciamento emocional em circunstâncias cuja aproximação do espelhamento do medo, da dor e sofrimento vicário, atesta a inviabilidade dos preceitos da cura. Desta forma, refletir sobre o limite real ou imaginário originado ao se estar em contato direto com a morte, por intermédio do relacionamento equipe de saúde e paciente, parece constituir uma questão importante a ser compreendida. Esta questão sinaliza a necessidade de atenção ao cuidador no que diz respeito ao exercício ético de sua profissão, 9 bem como a qualidade relacional despendida ao paciente no que diz respeito aos limites da possibilidade terapêutica. A intensa rotina de cuidados com o paciente fora de possibilidade de cura instiga uma aproximação constante com a dor e o sofrimento, podendo conduzir o cuidador profissional a um profundo desgaste físico, psíquico e emocional, levando-o a um nível de estresse conhecido como síndrome de burnout, conforme aponta a revisão de literatura denominada Síndrome de Burnout ou Estafa Profissional e os Transtornos Psiquiátricos16. Muito embora esta pesquisa tenha sido realizada no ano de 2007, seus dados conclusivos parecem contribuir sensivelmente para a questão apresentada. Com base no pensamento destes autores, conceitualmente, a síndrome de burnout é um processo iniciado com excessivos e prolongados níveis de estresse no trabalho. Para o diagnóstico, leva-se em consideração a concepção sociopsicológica, cujas características individuais estão associadas as do ambiente e as do trabalho propiciando o aparecimento dos fatores multidimensionais da síndrome, dentre eles, exaustão emocional, distanciamento afetivo e baixa realização profissional. Estes por sua vez, surgem com intensidade quando o profissional de saúde lida com situações- limite, deflagrando alguns distúrbios. Conforme explica Carvalho15 os fatores estressores de natureza interna e externa, prevalecentes na tarefa do cuidador, se caracterizam, respectivamente, pela característica pessoal do profissional e pelas respostas decorrentes da assistência imbricada no contexto do adoecer, envolvendo relacionamento interpessoal com todos os envolvidos. Desta forma, imprescindível considerar questões de ordem ética e bioética na dimensão do cuidar. De acordo com Pessini15, os cinco referenciais éticos cruciais para o exercício da medicina paliativa são: a veracidade, a proporcionalidade terapêutica, o referencial duplo efeito, prevenção e o não abandono. Em relação à bioética, o autor compreende a mesma como sendo “o resgate da dignidade humana e qualidade de vida, num momento crítico da existência humana em que as pessoas estão enfrentando a morte iminente e inevitável”. Nos cuidados com pacientes fora de possibilidade de cura, a função do cuidar consiste em paliar nos momentos em que já não há mais possibilidade de cura, podendo o paciente incidir nos caminhos do desejo de morrer, da obstinação terapêutica ou da supressão do tratamento, denominadas eutanásia, distanásia e ortotanásia, respectivamente. Sob a perspectiva da boa morte, cujas concepções se diferenciam em detrimento das necessidades tanto do paciente quanto do cuidador, os cuidados paliativos priorizam a visão da ortotanásia no que diz respeito à garantia dos preceitos éticos e bioéticos no encontro do viver e morrer. Estas situações, por sua vez, são geradoras de profundos desgastes emocionais em virtude de acionar aspectos subjetivos e singulares existentes na formação pessoal e profissional de cada integrante da equipe, reacendendo sentimentos de vulnerabilidade e impotência, além de instigar aspectos referentes à conduta profissional mediante a disponibilização tecnológica ofertada pela instituição hospitalar. Desta forma, o encontro entre vida e morte se instaura no papel do cuidador, convidando-o à busca da conscientização da morte contemporânea, cujo maior desafio consiste em aliar conhecimento técnico,autoconhecimento e humanização através dos caminhos “da aceitação e da assimilação do cuidado da vida humana no adeus final”. Recentemente foi divulgado um estudo inédito realizado pela unidade de inteligência da revista The Economist17, onde atribui ao Brasil indicadores 10 qualitativos e quantitativos que indica seu mau desempenho na qualidade da morte, englobando questões relacionadas à formação do profissional, o uso adequado da medicação em situações de assistência paliativista, bem como, um forte determinismo acerca do poder medicalizado, atribuindo à figura do profissional de saúde à representação do curador. Aliado a estes resultados, sob a perspectiva do luto na área da saúde, em Casellato11 consta a falta de apoio por parte das instituições hospitalares no que diz respeito ao estabelecimento e a preservação de um espaço de escuta, onde trocas comunicativas entre os profissionais de saúde pudessem existir, em consonância com as necessidades pessoais, profissionais e institucionais. 4. Humanização no Cuidar: Uma Proposta de Desenvolvimento de Equipe Promover uma conscientização e sensibilização no nível de equipe, levando em consideração a rede de sistemas operacionais e administrativos que contemplam o alcance de uma missão assistencial, assegurando um espaço de escuta seguro e protegido com a intenção e propósitos bem delineados pelo grupo, pode propiciar resultados calcados em mudanças de atitudes compartilhadas que, invariavelmente, irá repercutir nos propósitos e metas preestabelecidos. Estas modificações de comportamento frente à morte, manifestada tanto no campo individual quanto no social possibilita refletir sobre quais os fatores que vem determinando esta nova atitude no âmbito hospitalar, além de ofertar assistência dos cuidados paliativos; um espaço promissor no que diz respeito à integralidade dos cuidados, que vai desde a aplicabilidade de medidas de conforto até o momento da passagem. Ressalta-se que a concepção de integral abrange questões de natureza física, emocional, social e espiritual, tanto do paciente quanto daqueles que o assistem, bem como a instituição aos quais seus atores estão vinculados. A problemática existente entre falta de apoio institucional frente a experiências cotidianas que acionam aspectos de natureza emocional chama atenção pela ausência de cuidado da alta administração quanto às necessidades da equipe no que diz respeito à melhoria de desempenho da própria equipe e mudanças comportamentais a nível institucional. Segundo Katzenbach18, existe uma sutil diferença nestas definições no que diz respeito aos fundamentos de cada um, quando explica que “equipes são mais flexíveis do que grupamentos organizacionais maiores, porque podem ser mais rapidamente montadas, ativadas, redirecionadas e dissolvidas, geralmente de maneira que realce em vez de romper as estruturas e processos mais permanentes. As equipes são mais produtivas do que os grupos que não possuem objetivos claros de performance, porque seus participantes estão compromissados com a obtenção de resultados tangíveis”. Esta afirmação permite deduzir a existência de fragmentação estrutural, dificultando à interação e comunicação entre os profissionais que compõe o corpo institucional, assinalando uma linguagem específica correspondente a cada área de atuação, bem como, estabelecendo uma gradativa perda de foco e objetivos a ser alcançada coletivamente, fortalecendo deste modo a postura individualizada, traço marcante da abordagem grupo de trabalho. Para um gestor institucional, usualmente a atenção ao cuidador profissional está delimitada à oferta de um aparato tecnológico e educacional onde assegure resultados que alcancem metas estipuladas e controles de 11 qualidade, muitas vezes eximindo o lugar da ação e expressão espontâneas, conforme pondera Deslandes10 num dos eixos discursivos do PNHAH designado humanização como melhoria das condições de trabalho do cuidador. No ambiente hospitalar da rede pública, por exemplo, comumente são verificados níveis de desmotivação dos profissionais de saúde através do desinvestimento emocional do profissional aos objetivos e metas estipuladas pela instituição, em decorrência das constantes desvalorizações e ausências de reconhecimento, refletidas na falta de recursos materiais e pessoais, tendendo ao profissional não se reconhecer como pessoa que atua e contribui para aquisição dos pressupostos organizacionais sob a perspectiva de uma equipe de atuação, e sim, como um elemento individualizado, setorizado, contratado para garantir e realizar apenas o ofício de cuidados em saúde estabelecidos pelo seu grupo de trabalho. Outros parâmetros detectores da falta de motivação de um grupo de trabalho num ambiente institucional rondam em torno da alta rotatividade de pessoal, absenteísmo, baixos resultados operacionais, custos elevados, além dos altos índices de acidentes no trabalho. Traçando um paralelo com as manifestações desencadeadas pela síndrome de burnout, já mencionadas anteriormente, possível deduzir que tanto o cuidador profissional quanto a instituição carecem da identificação de necessidades prementes para inclusão de uma abordagem de equipe mais efetiva. Moscovici19 afirma que “um grupo se transforma em equipe quando passa a prestar atenção à sua própria forma de operar e procurar resolver os problemas que afetam seu funcionamento. Esse processo de autoexame e avaliação são contínuos, em ciclos recorrentes de percepção dos fatos, diagnóstico, planejamento de ação, prática, resolução de problemas e avaliação”, sugerindo a necessidade de conscientização e sensibilização de seus integrantes quanto à vinculação de variáveis internas e externas que influenciam o comportamento humano existente na instituição. Para que tal metamorfose aconteça, imprescindível avaliar os elementos constituintes de um grupo de trabalho, levando em consideração os modos de enfrentamento mediante situações de conflito, estratégias de atuação, funcionamento, graus de autonomia, resistências, crenças, além de questões comportamentais, campo complexo e multidimensional quando analisado sob a perspectiva de relações humanas, além de abranger todos os níveis hierárquicos que contribuem para o funcionamento do trabalho. Criar um espaço de valorização da escuta verbal e não-verbal instituída pela linguagem de cuidados, abordando assuntos ainda considerados tabu; como por exemplo, processo de morrer, luto antecipatório e morte inevitavelmente revelam uma necessidade de desenvolvimento de equipe, através de um programa educacional dirigido a grupos de pessoas interdependentes que precisam unir esforços tanto nos procedimentos de trabalho quanto na resolução de problemas. A autora explica que desenvolvimento de equipe vem a ser “uma intervenção psicossocial no sistema humano da organização”, levando-se em consideração aspectos que abrange necessidades, objetivos, características do grupo e da organização, dentro da perspectiva espaço – tempo – contexto. Por definição, desenvolvimento de equipe contempla “incrementar a efetividade de um grupo trabalhar colaborativamente para alcançar resultados”, e pressupõe “mudanças significativas pessoais e interpessoais dentro dos 12 conhecimentos, sentimentos, atitudes, valores, motivação, postura comportamento”, apresentando como desafio desenvolver um processo de integração que englobe variadas unidades de trabalho, com suas diversas representações funcionais numa proposta de respeito e potencialização de cada empreendimento humano para a produtividade almejada pela instituição. Trata-se, portanto, de um trabalho de resgate do processo de interação que ainda prima pela abordagem racional, ampliando novos espaços de compartilhamento que coadunem nível tarefa e socioemocional de forma equilibrada, sendo estes respectivamente, “atividades visíveis e observáveis, acordadas tanto nos grupos formais de trabalhoquanto nos grupos informais e as sensações e sentimentos variados, já existentes ou gerados pela convivência e atividade no grupo”, conforme salienta Moscovici19. Aspectos dimensionais de natureza intrapessoal e interpessoal demarcam os processos grupais através da relação eu/eu e eu/outro, sendo que muitos problemas de participação no grupo se originam de dificuldades provenientes destas etapas de desenvolvimento, quando mal estruturadas. Detectar estas limitações e trabalhá-las dentro de um grupo possibilita o indivíduo a buscar novas formas de confrontação, pois “o grupo, quando bem conduzido, pode ajudar os participantes a enfrentarem suas dificuldades pessoais”. Face aos benefícios expostos pelo trabalho de desenvolvimento de equipe e, concomitantemente, às necessidades do cuidador profissional detectada ao longo deste estudo realizado sobre a temática cuidados paliativos e humanização, o projeto Humanização no Cuidar é um projeto que apresenta como objetivo transformar este campo de saber em um curso de capacitação de abordagem vivencial, destinado aos profissionais da área da saúde que lidam com a prática dos cuidados paliativos e humanização. Trata-se de um treinamento que intenciona identificar grupos e sensibilizar equipes sobre a importância de desenvolver uma nova postura comportamental frente aos desafios propostos pela Instituição na busca de maior qualidade e produtividade em seus resultados. Projeto Humanização no Cuidar Objetivo Geral: Conscientizar e sensibilizar os profissionais da área da saúde sobre a importância nos cuidados paliativos e humanização, no intuito de viabilizar uma maior receptividade às situações suscitadas através desta experiência. Objetivos Específicos: Integrar e capacitar o profissional da saúde frente à experiência de sobrevida em nível de doença, do processo de morrer e a morte; desenvolver recursos internos para estudar, analisar e debater com base em conhecimento teórico-prático sobre o sentido e o significado que a morte pode adquirir no decorrer do tratamento paliativo; propiciar um espaço terapêutico para que os profissionais da saúde possam compartilhar e aprender a elaborar situações relacionadas à temática da finitude, através da abordagem vivencial, promover entre os integrantes eventos de natureza informativa sobre a experiência de sobrevida em nível de doença, do processo de morrer e a morte, através da vivência prática numa abordagem multiprofissional. Público Alvo: Enfermeiros, fisioterapeutas, psicólogos, médicos, assistente social, nutricionista, e demais profissionais da área de saúde que abordem pacientes sob cuidados paliativos em assistência hospitalar. Metodologia: Técnicas de dinâmica de grupo e jogos empresariais, permitindo criar dentro do ambiente de trabalho de treinamento um espaço necessário para que o grupo possa vivenciar de forma lúdica e espontânea suas atitudes concretas diante das tarefas propostas. Será utilizado junto ao grupo 13 material de apoio atendam a demanda dos módulos mencionados abaixo, aliados aos aspectos psicossociais e culturais na prática do cuidado. Módulo 1 Módulo 2 Módulo 3 Módulo 4 Cuidado Paliativo – Afinal, curar ou cuidar? Apresenta como finalidade abordar o princípio do cuidado paliativo, bem como inserir seu campo de atuação, levando em consideração o papel do cuidador neste processo diante da inviabilidade da cura. Comunicação – Você sabe com quem está falando? Visa capacitar e aprimorar o profissional da área da saúde em identificar, apurar e compreender os diversos níveis de linguagem estabelecidos na relação do cuidado. Cuidando de quem cuida – Quem somos nós? Introduz a perspectiva da representação simbólica do cuidador e da morte na dimensão do cuidado, bem como incita uma reflexão acerca do autocuidado. Equipe – Cuidar junto ou em conjunto? Sensibilizar os profissionais da área da saúde sobre o sentido e significado do trabalho multidisciplinar, bem como ressaltar a importância do mesmo mediante o processo de morrer. Módulo 5 Módulo 6 Módulo 7 Módulo 8 Humanização do cuidado – Quando o cuidar é humano? Trabalhar aptidões individuais e grupais acerca do SER humano, nas etapas que conduzem ao final do ciclo da vida, levando em consideração as emoções no cuidar, oriundas do paciente, família e cuidador profissional. Integralidade do cuidado – Da dimensão física à espiritual: um desafio no cuidar. Abordar a concepção do conceito de dor total, preconizado no Cuidado Paliativo, levando em consideração a postura do profissional da área de saúde frente à visão do cuidado integrado. Morte – O percurso do cuidador. Aproximar o arquétipo da morte bem como a sua representação simbólica mediante a finalização dos cuidados. Trabalhar aspectos culturais, sociais e emocionais suscitados no percurso do cuidador. Luto – O cuidar de si- mesmo. Capacitar o profissional a lidar com a perspectiva do luto na dimensão do cuidado e autocuidado. Duração: A carga horária para realização do projeto consistirá de oito encontros mensais, com duração de 08 horas, distribuídos em 04 horas no turno da manhã e 04 horas no turno da tarde, uma vez por mês, distribuídos de acordo com a disponibilidade do grupo institucional. Considerações Finais Atualmente incessantes estudos e pesquisas são realizados sobre cuidados paliativos e humanização, no intuito demonstrar e comprovar cientificamente os inúmeros benefícios deste novo paradigma de atenção à saúde a todos os envolvidos. Todavia, pensar em cuidados paliativos e humanização como modalidades de assistência acessível a todos aqueles que se enquadrem nas suas indicações, inevitavelmente conduz a questionamentos acerca do amadurecimento pessoal, profissional e institucional para lidar com uma abordagem que não comporta mais a profilaxia terapêutica, contrapondo um dos ensinamentos básicos da ciência médica, círculo vicioso aos quais os profissionais da saúde ainda retroalimentam. Importante considerar que neste contexto, estamos falando de profissionais de saúde que constituem diferentes áreas de saber. Segundo o Conselho Federal de Medicina, na normatização que legitima a prática de cuidados paliativos, através do sexto Código de Ética Médica reconhecido no Brasil e em vigor desde 13 de abril de 2010, na cláusula XXII consta que “nas situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a 14 realização de procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários e propiciará aos pacientes sob sua atenção todos os cuidados paliativos apropriadosiii”. Indubitavelmente, trata-se de um reconhecimento valioso sobre a abordagem da assistência paliativa em nosso país, que convoca ao estabelecimento de cuidados especializados aliados a preparação de profissionais aptos a sua implantação, desde nos meios institucionais até os meios acadêmicos. O paradoxo parece se instalar quando se constatam indicadores negativos no que diz respeito à assistência e atenção à saúde, objeto de estudo do Programa Nacional de Humanização de Assistência Hospitalar, onde se identifica a existência de um desinvestimento do cuidado, na medida em que os níveis de insatisfação de cuidadores profissionais e usuários do sistema de saúde pública são temas motivacionais constantes em pesquisas acadêmicas, com absoluta ausência de medidas pautadas na integralidade de cuidados que visem modificar este cenário. A questão parece se tornar mais delicada ainda quando se constata, no campo da prática, elevados índices de medidas desumanizadoras em detrimento de medidas de conforto e alívio de dor e sofrimento, favorecendo a busca de uma fragmentação através do reconhecimento de uma especialidade médica. Sabe-se, portanto, que cuidados paliativos e a prática da humanização na assistência em saúdenão exigem título de reconhecimento, mas sim, a necessidade de conscientização e sensibilização das intenções de cada componente deste processo, mobilizando indivíduos ao aprendizado e a unificação entre o saber e o sentir, de forma abrangente, disponibilizando estes recursos todos os indivíduos que necessitam de cuidados e atenção. Portanto, edificar novos caminhos que conduzam à sensibilização e conscientização frente ao reconhecimento das próprias limitações diante do desconhecido, ou seja, promover o religar dos aspectos materiais e espirituais que compõe a natureza humana, expansão horizontes onde oportunidades e possibilidades coadunem em seus princípios, invariavelmente perpassa pela reavaliação de valores morais e éticos, que constituem a qualidade do ser, em consonância com propósitos institucionais. Sob este aspecto, o atual desafio perpassa pela validação de uma teia relacional que ultrapasse as limitações demarcadas pela ausência de ressonância e pela presença de solidão, ambas originárias de um condicionamento herdado proveniente de padrões arcaicos, estipulados ao longo das décadas. Para finalizar, cabe relembrar que na trajetória de Saunders e Kübler- Ross, estas sistematizações ressurgiram sob diversas formas, e, soberanamente foram molas propulsoras para que a incorporação de uma nova filosofia de cuidados frente à temática morte fosse uma realidade. Atualmente, esta iniciativa ainda ressona em nossa mentalidade no que diz respeito às atitudes e comportamentos mais humanizados despertando constantes reformulações, seja na dimensão das relações intersubjetivas, compostas por todos os seus integrantes, seja através do meio sociocultural, através da opção de uma morte digna de forma compartilhada. Um caminho sem volta, que certamente, irá exigir de seus seguidores a constante presença iii Resolução CFM Nº1931/2009, publicada no D.O.U. de 24 de setembro de 2009, Seção I, p. 90, retificação publicada no D.O.U. de 13 de outubro de 2009, Seção I, p.173. 15 da unicidade de valores e princípios constituintes dos desígnios do viver e morrer cercado de cuidados, de forma consciente, sensível e humanizada. Referências bibliográficas 1. Menezes, A R. Em busca da boa morte: antropologia dos cuidados paliativos. Rio de Janeiro. Garamond: Fiocruz; 2004. 2. Kovács, M J. Educação para a morte: temas e reflexões. São Paulo. Casa do Psicólogo: FAPESP; 2003. 3. Bowlby J. Formação e rompimento dos laços afetivos. São Paulo. Martins Fontes; 2006. 4. Ferreira, A B de H. Mini- aurélio: o dicionário de língua portuguesa. Curitiba. editora positivo; 2008. 5. Pichon-Riviére, E. Teoria do vínculo. São Paulo. Martins Fontes; 2000. 6. Carvalho, V. Franco, M H P, Kóvacs, M J et al. 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