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QUÍMICA E TOXICOLOGIA FORENSE Programa de Pós-Graduação EAD UNIASSELVI-PÓS Autoria: Patrícia Martins Botelho Nunes 1ª Edição CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090 Reitor: Prof. Hermínio Kloch Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Carlos Fabiano Fistarol Ilana Gunilda Gerber Cavichioli Jóice Gadotti Consatti Norberto Siegel Julia dos Santos Ariana Monique Dalri Marcelo Bucci Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais Diagramação e Capa: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Copyright © UNIASSELVI 2019 Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. N972q Nunes, Patrícia Martins Botelho Química e toxicologia forense. / Patrícia Martins Botelho Nunes. – Indaial: UNIASSELVI, 2019. 145 p.; il. ISBN 978-85-7141-312-2 1. Toxicologia forense. - Brasil. 2. Química. - Brasil II. Centro Univer- sitário Leonardo Da Vinci. CDD 363.25 Impresso por: Sumário APRESENTAÇÃO ..........................................................................05 CAPÍTULO 1 Farmacologia dos Agentes Tóxicos ..........................................07 CAPÍTULO 2 Principais Grupos de Agentes Tóxicos ....................................51 CAPÍTULO 3 Toxicologia Analítica e Qualidade do Laudo Toxicológico ....................................................................99 APRESENTAÇÃO Prezado aluno! A disciplina de Química e Toxicologia Forense tem por objetivos reconhecer, identificar e estudar os agentes tóxicos lícitos e ilícitos utilizados para a execução de crimes, bem como o processo de intoxicação e seus mecanismos, além de esclarecer o uso da química e da toxicologia para a elucidação de crimes; indicar os métodos analíticos e fatores interferentes na identificação do agente tóxico e apontar a importância da interpretação correta dos resultados e as normas e características a serem observadas para a confecção do laudo químico toxicológico, que será usado para instruir o inquérito policial e a ação penal. No primeiro capítulo serão apresentados os conceitos gerais relacionados à área de Toxicologia e Química Analítica, bem como as etapas da investigação toxicológica. Por meio do estudo da toxicocinética e da toxicodinâmica, você poderá identificar mecanismos de biotransformação de agentes tóxicos, suas rotas e formas de eliminação. E, ao final do capítulo, será discutido o panorama geral da execução dos principais crimes com entorpecentes, agrotóxicos, medicamentos, bebidas e combustíveis. Na sequência serão estudados os principais grupos de substâncias tóxicas – drogas recreativas lícitas e ilícitas (álcool, cocaína, anfetaminas, maconha, opiáceos, alucinógenos), domissanitários, agentes cáusticos e medicamentos. Ainda serão abordados aspectos relevantes do uso e identificação das substâncias facilitadoras de abuso sexual (date rape drugs). No terceiro capítulo será abordada a parte técnica e analítica do exame químico toxicológico. Você conhecerá as normas para a escolha e para a determinação da qualidade de amostras biológicas para a análise toxicológica, em que serão descritos os diferentes métodos de análise para a identificação de substâncias tóxicas, com seus respectivos possíveis interferentes, os quais podem comprometer o resultado da análise, sua interpretação e os trâmites legais. Portanto, este livro didático reúne informações de diferentes fontes bibliográficas para esclarecer e instruir você sobre os conceitos e atualidades da química e da toxicologia forense e, ainda, contribuir para a sua formação profissional dentro da área forense, visto que a Toxicologia é uma ciência de extrema importância para as descoberta, quantificação e identificação de substâncias tóxicas, responsáveis por ocasionar a morte de muitos indivíduos ou o favorecimento de crimes. Esta área forense é uma das principais ferramentas legais e um dos componentes da análise pericial. Bons estudos. Profª. Patrícia Martins Botelho Nunes CAPÍTULO 1 Farmacologia dos Agentes Tóxicos A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: � identificar a aplicação dos conhecimentos fundamentais de toxicologia; � definir toxicologia forense e diferenciar suas aplicações; � identificar mecanismos de biotransformação de agentes tóxicos, suas rotas e formas de eliminação; � entender os principais mecanismos de ação tóxica; � definir agente tóxico, intoxicação, risco e segurança; � descrever os principais mecanismos de crimes com entorpecentes, agrotóxicos, medicamentos, bebidas e combustíveis; � esclarecer o uso da química e da toxicologia para a elucidação de crimes; � analisar e classificar os efeitos de diferentes agentes tóxicos no organismo humano; 8 Química e Toxicologia Forense � examinar e identificar diferentes alterações relacionadas à ação de substâncias tóxicas; � aplicar as ferramentas e conhecimentos em química e toxicologia para a identificação de crimes; � analisar com imparcialidade e de maneira objetiva as informações obtidas por meio de técnicas científicas e precisas. 9 Farmacologia dos Agentes Tóxicos Capítulo 1 1 Contextualização Crimes, de modo geral, geram grande repercussão e interesse da sociedade. Não é à toa o grande sucesso das séries investigativas de TV, dos documentários e dos livros e filmes policiais. A personagem Sherlock Homes, que usa e abusa da química de forma bem irônica para a resolução de crimes inimagináveis, está presente nas nossas vidas desde 1887 e ainda é um sucesso. A grande curiosidade que cerca a análise pericial estimula e cativa a maioria das pessoas. O médico da série Dr. House conquistou milhares de fãs ao longo dos anos devido a sua curiosa habilidade de desvendar diagnósticos, usando dados técnicos e seu surpreendente raciocínio e pragmatismo. Portanto, quem busca conhecimento na área de perícia forense é um curioso nato e procura desenvolver habilidades que possam contribuir para esclarecer situações e desvendar mistérios. Pretende-se que você, ao longo do estudo, possa desenvolver seu raciocínio lógico e sua visão realística sobre os dados encontrados em amostras toxicológicas, usando o conhecimento técnico sobre as provas toxicológicas para extrair conclusões pertinentes. Ao final do curso, você poderá descrever e esclarecer a importância da coleta de amostras e da análise químico-toxicológica para a investigação criminal. Poderá questionar interferentes, procedimentos de coleta, métodos e amostras fora do padrão técnico-científico. E, ainda, refletir sobre: Como se deve escrever um laudo técnico? Existe crime sem prova pericial ou agente que não procurou direito? A análise química é um exame que subsidia tecnicamente o inquérito policial ou o processo penal? Qual é o papel do perito toxicologista dentro da investigação de um crime? Diante disso, este capítulo será o primeiro passo para uma imersão na toxicologia forense e que esclarecerá conceitos iniciais e os mecanismos de agentes tóxicos no organismo humano. Você entenderá as peculiaridades do trabalho do perito toxicológico e do uso da química forense. “Porque, na terra do House, e no resto do universo, quando aparece uma pergunta, ela pede por uma resposta” – Dr. House. 2 Introdução à Toxicologia Forense e Perícia Criminal: Conceitos e Considerações Gerais Substâncias químicas são usadas para tratar ou matar pessoas desde a Antiguidade. “Existem relatos do uso de cicuta, chumbo, plantas e até mesmo10 Química e Toxicologia Forense animais para fins terapêuticos ou letais de épocas anteriores a Cristo” (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008, p. 3). Trecho Romeu e Julieta, ato V, Cena I: [...] BOTICÁRIO – Ponde isto em qualquer líquido; tomando-o, embora a resistência possuirdes de vinte homens, caireis de pronto morto. ROMEU – Eis teu ouro, veneno mais nocivo para as almas dos homens, que mais crimes tem cometido neste mundo sujo, do que essas pobres drogas misturadas que não podes vender. Dei-te veneno; não tu a mim. Adeus [...] (SHAKESPEARE, 2000, p. 155). A Toxicologia é uma ciência multidisciplinar e envolve uma vasta área de conhecimentos e técnicas, desde as ciências básicas (Matemática, Biologia, Física) até as áreas mais tecnológicas (Biologia Molecular, Biotecnologia e Química Analítica). A Toxicologia se ocupa da identificação dos agentes tóxicos e de seus efeitos nos organismos vivos ou no post mortem. “Existem diferentes segmentos de aplicação da toxicologia e a área forense é um deles” (PASSAGLI, 2018, p. 5). A Toxicologia Forense combina procedimentos da química analítica e da toxicologia geral, com o objetivo de buscar e identificar evidências consistentes da presença de substâncias tóxicas ou de seus efeitos, para solucionar casos de crimes de morte ou de alteração comportamental e de adulteração de produtos. Este estudo pode ser feito no vivo ou no morto. In vivo, geralmente, se aplica a toxicologia para a identificação do abuso de drogas lícitas ou ilícitas e, também, para a determinação do uso de substâncias psicoativas durante a jornada de trabalho ou na fiscalização das condições psicomotoras de condutores de veículos. Essas informações podem ser usadas na caracterização de situações para a qualificação do delito (periculosidade ou inimputabilidade, por exemplo). No post mortem, a suspeita de morte por intoxicação se enquadra no âmbito de “morte violenta” e existe a obrigatoriedade legal, nesta hipótese, de proceder à necropsia, seguida da retirada de material biológico para a perícia químico-toxicológica. “A toxicologia forense pode contribuir de forma decisiva na investigação criminal, fornecendo informações relevantes sobre as circunstâncias que envolveram o delito ou o óbito” (PASSAGLI, 2018, p. 8-13). 11 Farmacologia dos Agentes Tóxicos Capítulo 1 Além dessas aplicações, a análise toxicológica pode ser usada para exames de substâncias que oferecem risco à saúde pública, com a adulteração de medicamentos, alimentos e bebidas. Um exemplo de aplicação da toxicologia forense para o esclarecimento das circunstâncias de um crime seria o caso recente da morte do jogador do São Paulo, Daniel Corrêa. Através da detecção e quantificação do teor de etanol, comprovou-se a presença de álcool e, ainda, a promotoria descartou a hipótese de estupro devido ao elevado teor alcóolico (13,4 dg/L) no sangue de Daniel. Desta forma, o laudo pericial contribui para o esclarecimento da dinâmica dos fatos e para individualizar as condutas dos suspeitos. FONTE: <https://g1.globo.com/pr/parana/noticia/2018/11/06/ caso-daniel-apos-ouvir-testemunhas-delegado-diz-que-nao-houve- tentativa-de-estupro.ghtml>. Acesso em: 9 mar.2019. Para iniciarmos o estudo da toxicologia, precisamos definir alguns conceitos. São eles: a) Perícia Criminal Tem como função auxiliar a Justiça Criminal, atuando na parte da investigação (policial) para a realização e obtenção de prova material dos incidentes (acidentes, crimes ou delitos) e da autoria do crime. Segundo Espíndula (2002, p. 22): [...] a prova pericial é produzida a partir de fundamentação científica, enquanto que as chamadas provas subjetivas dependem do testemunho ou interpretação das pessoas, podendo ocorrer uma série de erros, desde a simples falta de capacidade da pessoa em relatar determinado fato, até o emprego de má-fé, onde exista a intenção de distorcer os fatos para não se chegar à verdade. Portanto, na presença de vestígios, o exame de corpo de delito é imprescindível para a obtenção de indícios e é obrigatório, podendo ocorrer a nulidade processual caso ele não seja realizado nos termos do artigo 158 do Código de Processo Penal Brasileiro (Figura 1). 12 Química e Toxicologia Forense O médico legista é o profissional que realiza o exame de corpo de delito em indivíduos mortos ou vivos. O toxicologista forense tem como papel estabelecer a causa e o efeito de determinado evento, de forma imparcial e com isenção, baseando-se em análises de alta qualidade e apresenta uma declaração – o laudo químico toxicológico –, fornecendo informação qualificada e técnica com dados instrutórios a um julgamento dentro do processo judicial. “Por meio deste laudo, o perito leva ao juiz e jurados elementos informativos de ordem técnica- científica e o juiz, por sua vez, pode aceitá-lo ou rejeitá-lo em todo ou em parte” (PASSAGLI, 2018, p. 5). Portanto, o toxicologista forense exerce o papel de testemunha técnica em processos judiciais, através do seu testemunho objetivo ou de uma emissão de opinião, prestando, dessa forma, assistência ao júri. A cadeia de custódia é um método utilizado para manter a integridade, o rastreamento e a idoneidade de uma evidência. É usada para manter e documentar a história cronológica da evidência, desde a sua coleta, transporte, recebimento, armazenamento até a análise, portanto engloba, todo o tempo, pessoas e procedimentos usados para manusear a evidência. Este protocolo legal é usado para garantir a identidade e integridade da amostra, em todas as etapas do processo, reforçando a qualidade das perícias e evitando possíveis questionamentos. Leia mais em De Menezes, Borri e Soares (2018). FIGURA 1 – PAPEL DA PERÍCIA NA OBTENÇÃO DE INDÍCIOS PARA A INSTALAÇÃO DO PROCESSO PENAL FONTE: Passagli (2018, p. 4) Corpo de Delito: Vestígios/ Evidências Examinados e Correlacionados: Indícios Processo Penal 13 Farmacologia dos Agentes Tóxicos Capítulo 1 Dica de filme: Para entender melhor o papel da perícia criminal, assista ao filme Seven – Os sete pecados capitais (EUA, 1995). FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Seven_ (filme)>. Acesso em: 22 nov. 2018. Dica de Documentário: Investigação Criminal (Netflix, 2012). b) Investigação Toxicológica A identificação de substâncias tóxicas em amostras biológicas é um desafio devido ao grande número de substâncias químicas tóxicas que podem ser o agente da intoxicação. Portanto, a obtenção e coleta das amostras, seu preparo e análise devem seguir critérios bem específicos e rígidos para a manutenção da qualidade da amostra e do laudo final, que deve ser representativo do estado fisiopatológico do indivíduo. O resultado explicitado no laudo toxicológico deve refletir com clareza e segurança a realidade da amostra e/ou as condições físico-toxicológicas do indivíduo vivo ou morto. Muitos fatores podem interferir no resultado do laudo, entre eles: • Complexidade das matrizes biológicas (material coletado do indivíduo ante mortem ou post mortem para a análise toxicológica. Existem diversas matrizes – sangue, plasma, urina, vísceras, líquidos biológicos, fios de cabelo etc. – e essas são escolhidas de acordo com fatores que relacionam a natureza e integridade da amostra, facilidade de coleta, transporte etc. (BORDIN et al., 2015). As matrizes biológicas apresentam composição muito complexa, sendo compostas por diferentes tipos de moléculas, como proteínas, carboidratos, ácidos nucleicos e substâncias orgânicas e inorgânicas. É importante ressaltar que as matrizes biológicas trazem alterações de fenômenos fisiológicos e também do post mortem, 14 Química e Toxicologia Forense possivelmente alterando a sua constituição química ebioquímica. Isso torna a análise toxicológica ainda mais complexa. • Tipo e quantidade de amostras disponíveis. Devem ser levadas em consideração as informações sobre a distribuição e a biotransformação dos analitos, para que a amostra obtida seja aquela que apresenta a maior concentração da substância a ser pesquisada. • Informações sobre históricos do paciente e da amostra, incluindo informações sobre a necropsia. • Tratamento das amostras e tipo de análise a ser realizada. Etapa crítica do processo analítico, pois o tratamento inadequado da amostra pode comprometer a análise, obtendo-se falsos resultados negativos. Além disso, os métodos utilizados de análise devem ser padronizados e validados, e apresentar especificidade e sensibilidade suficientes para analisar o que se pretende. Portanto, é importante organizar e protocolar todas as etapas do processo de análise das amostras. Esse protocolo recebe o nome de Análise Toxicológica Sistemática (ATS). A ATS é um conjunto de procedimentos padronizados (Procedimentos Operacionais Padrão – POP) para a coleta, processamento e quantificação da substância tóxica com o objetivo de identificar a presença de determinada substância através de dados analíticos, independente das demais substâncias potencialmente presentes na amostra (metabólitos, compostos endógenos e outros interferentes). Para isso, “a ATS possui três etapas: preparação da amostra, isolamento e concentração dos analitos; detecção e diferenciação e, por fim, identificação e quantificação” (PASSAGLI, 2018, p. 318). A Figura 2 mostra as etapas de uma análise toxicológica e seus pontos críticos que devem ser observados e controlados para a obtenção de laudos de qualidade e passíveis de esclarecer as circunstâncias de determinado incidente: FIGURA 2 – ETAPAS DA ANÁLISE TOXICOLÓGICA Fasé Pré-analítica Fase Analítica Fase Pós-analítica ● Coleta de material para a análise ● Identificação do material ● Transporte/ armazenamento ● Disponibilidade de metodologias sensíveis e seletivas ● Escolha dos procedimentos analíticos ● Controle de qualidade ● Análise confirmatória com técnicas diferentes das usadas na triagem ● Equipamentos calibrados e manutenidos ● Interpretação dos resultados ● Confecção do laudo FONTE: Adaptado de Passagli (2018) 15 Farmacologia dos Agentes Tóxicos Capítulo 1 É importante ressaltar que, devido à complexidade das matrizes e ao grande número de substâncias a serem pesquisadas, torna-se extremamente importante as informações sobre a história do caso/evidência que está sendo analisada. Essas informações podem direcionar as análises (escolha de amostras, métodos e avaliação de possíveis interferentes) para a obtenção de resultados mais rápidos e evitar análises desnecessárias. Por exemplo, no caso de análise toxicológica em um motorista envolvido em um acidente de trânsito, apresentando hálito com odor forte e comprometimento da fala e do equilíbrio, pensa-se, inicialmente, em uso de etanol. Porém, obtendo-se análise negativa para a presença de etanol no sangue, com a análise dos achados clínicos disponíveis, pode-se direcionar as análises para a pesquisa de acetona e de fármacos depressores do sistema nervoso central. A produção de corpos cetônicos em um indivíduo com diabetes descompensada e o uso de barbitúricos ou benzodiazepínicos explicariam os achados clínicos. Sem essas informações, o laboratório ficaria “às cegas” e liberaria o laudo negativo para etanol e os resultados clínicos e laboratoriais seriam discordantes (PASSAGLI, 2018, p. 331). 1 Defina o que são matrizes biológicas e cite exemplos. 2 Explique como a fase pré-analítica pode comprometer o laudo toxicológico. Geralmente, a análise toxicológica é iniciada com testes mais gerais e simples para a detecção de grupos químicos, por exemplo, obtendo-se uma triagem das amostras e identificando os casos negativos. E, em seguida, usam- se métodos mais específicos de identificação e confirmação de cada substância e, se necessário, faz-se também a sua quantificação (PASSAGLI, 2018). Por fim, com a emissão do laudo, o perito fornece à corte a “sua opinião” sobre os dados obtidos, para isso ele utiliza conhecimentos sobre toxicocinética e toxicodinâmica, realizando a análise e interpretação dos resultados. c) Agente tóxico É qualquer substância química, orgânica ou inorgânica, que interagindo com o organismo é capaz de produzir um efeito tóxico, causando alteração comportamental ou funcional ou até a morte. A maioria das substâncias químicas, consideradas como agentes tóxicos, são substâncias exógenas também chamadas xenobióticos. Porém, segundo Oga, Camargo e Batistuzzo (2008, p. 6), 16 Química e Toxicologia Forense em toxicologia, também se pode considerar xenobiótico uma substância química entranha quantitativamente no organismo, ou seja, em baixas concentrações essa substância seria considerada não tóxica, mas acima de um limite quantitativo, passa a ser um agente tóxico. Os agentes tóxicos podem ser agentes poluentes na atmosfera e metais, como o chumbo e o mercúrio, e são classificados quanto as suas propriedades físicas (gases, vapores, partículas), quanto as suas características químicas (se destacam os halogêneos, fenóis, metais etc.) e quanto ao tipo de ação tóxica (hepatotóxicos, neurotóxicos, nefrotóxicos). d) Fármaco Substância de estrutura química definida capaz de alterar estado fisiológico ou patológico em benefício do organismo receptor. e) Droga É toda substância capaz de modificar sistemas fisiológicos ou estados patológicos, utilizada com ou sem intenção de benefício do receptor. f) Veneno Substância ou mistura de substâncias químicas que provoca intoxicação ou morte em pequenas quantidades (baixas doses). g) Medicamento “Toda substância, ou associação de substâncias, utilizada para modificar ou explorar sistemas fisiológicos ou estados patológicos para benefício do sistema receptor” (ZANINI; OGA, 1994, p. 3). Veneno x Medicamento Existe uma linha tênue que separa a definição de medicamento e veneno. A diferenciação desses dois conceitos não é simples, e basicamente é um conceito quantitativo que depende da dose. Segundo Paracelsus (1493-1541), famoso médico e alquimista suíço, “todas as substâncias são venenos, não há nenhuma que não seja veneno, a dose correta diferencia o veneno de um remédio” (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008, p. 4). h) Risco É a probabilidade de uma substância produzir dano sob condições controladas de exposição. 17 Farmacologia dos Agentes Tóxicos Capítulo 1 i) Segurança É a certeza de que determinada substância não causa danos para um indivíduo exposto à quantidade e forma recomendadas para seu uso. j) Intoxicação É a manifestação do efeito tóxico, representado pelos sinais e sintomas que revelam o desequilíbrio orgânico produzido pelo contato do agente tóxico e o sistema biológico. O efeito tóxico só será produzido se o contato com o agente tóxico ocorrer em dose e por tempo suficiente para romper o equilíbrio do organismo. Portanto, de modo geral, ocorrem diferentes processos em sequência, desde o contato do agente tóxico com o organismo, até o sintoma clínico que revela esta interação. Isso permite dividir a intoxicação em quatro fases distintas, como mostra a Figura 3: FIGURA 3 – FASES DA INTOXICAÇÃO FONTE: Adaptado de Oga, Camargo e Batistuzzo (2008, p. 6) 3 Toxicocinética de Agentes Tóxicos Antes de estudarmos toxicocinética, vamos observar aspectos importantes da fase de exposição. 18 Química e Toxicologia Forense A fase de exposição é representada pelo período em que o ser humano fica exposto à substância tóxica e ocorre o contato do agente tóxicocom as superfícies externas ou internas do organismo. São importantes nesta etapa: • Concentração e tipo de substância: propriedades físico-químicas, solubilidade, estabilidade. A dose vai determinar a extensão da resposta biológica. É a quantidade do agente tóxico que entrou em contato com o organismo do indivíduo. Além disso, deve ser levado em consideração que o agente tóxico pode ser uma mistura de substâncias químicas. Portanto, a resposta final aos xenobióticos combinados pode ser maior ou menor que o efeito de cada uma separadamente. A composição química do agente tóxico vai determinar a sua maior ou menor absorção pelas membranas biológicas. • Duração e a frequência da exposição. FIGURA 4 – TIPOS DE INTOXICAÇÃO DE ACORDO COM A EXPOSIÇÃO AO AGENTE TÓXICO FONTE: A autora Quanto à frequência de exposição, normalmente, doses fracionadas do agente tóxico reduzem o efeito tóxico. Assim, uma dose única de um agente que produz efeito imediato e severo, poderá produzir menos do que a metade ou nenhum efeito, quando dividida em duas ou mais doses, administradas durante um período de várias horas ou dias. No entanto, a redução do efeito provocado pelo aumento de frequência (ou seja, do fracionamento da dose) só ocorrerá quando: 1) a velocidade de eliminação é maior do que a de absorção, de modo que os processos de biotransformação e/ou excreção ocorram no espaço entre duas 19 Farmacologia dos Agentes Tóxicos Capítulo 1 exposições; 2) o efeito tóxico pela substância é parcial ou totalmente revertido antes da exposição seguinte. Caso nenhuma destas situações ocorrerem, o aumento de frequência resultará em efeitos tóxicos crônicos (PASSAGLI, 2018). Nas exposições agudas, as substâncias químicas são rapidamente absorvidas e os efeitos produzidos geralmente são imediatos. Mas, em certas situações podem ocorrer efeitos retardados, similares ou não aos efeitos produzidos nas exposições a longo prazo. Em contrapartida, as exposições crônicas a um agente tóxico podem produzir efeitos imediatos (agudos) após cada administração, além dos efeitos produzidos a longo prazo em baixas concentrações do agente. • As principais vias de exposição são gastrointestinal (ingestão, via muito usada nas intoxicações intencionais), pulmonar (inalação), cutânea (contato) e parenteral. A via de introdução influi tanto na potência quanto na velocidade de aparecimento do efeito tóxico. • Fatores do indivíduo: saúde, estado nutricional, sexo, idade, estrutura genética. A variabilidade de resposta biológica a um agente tóxico depende de cada indivíduo exposto. Usaremos um artigo para ilustrar a ideia da variabilidade dos indivíduos. Para trabalhadores que desempenham funções iguais durante anos na área de produção de lâmpadas elétricas e, portanto, expostos ao mesmo ambiente e nas mesmas condições ao mercúrio, é possível que apenas uma parte deles desenvolva uma determinada enfermidade pela exposição ao metal presente no ambiente de trabalho. E, ainda, cada trabalhador pode apresentar alterações fisiológicas diferentes em resposta à exposição. Nenhuma pessoa é igual à outra, portanto, as respostas tóxicas podem variar de um indivíduo para outro. Com base no artigo de Kavariz e Glina (1993), disponível em https://www.scielosp.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102- 311X1993000200002, identifique as diferentes alterações clínicas apresentadas pelos trabalhadores. Todos os trabalhadores apresentaram todas as manifestações clínicas? Por quê? “Todos esses fatores determinam a disponibilidade química do xenobiótico e a fração do mesmo que estará disponível para a absorção” (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008, p. 7). 20 Química e Toxicologia Forense O grau de toxicidade de uma substância é definido pela sua DL 50 (Dose Letal Média), que é a dose obtida estatisticamente necessária para matar 50% dos organismos expostos ao agente tóxico. Portanto, quanto menor a DL 50, mais tóxica é a substância. A DL 50 é uma característica intrínseca da substância, mas não é uma descrição absoluta da toxicidade de um composto a todos os indivíduos, visto que não reflete a habilidade do indivíduo em responder ao contato com o agente tóxico. A via de introdução pode influenciar na toxicidade da substância química. Por exemplo, espera-se que um agente que é destoxificado pelo fígado seja menos tóxico quando introduzido no organismo por via oral (passagem pela circulação porta) do que por inalação (circulação sistêmica). A comparação da dose letal de um agente tóxico por diferentes vias de exposição também fornece informações úteis referentes ao processo de intoxicação. Os xenobióticos que apresentam doses letais por via oral e dérmica similares àquela administrada por via intravenosa, considera-se que o agente é pronta e rapidamente absorvido por essas vias. Por outro lado, quando a dose letal dérmica é muito maior que a dose letal oral, significa que a pele constitui uma barreira efetiva à absorção desse agente tóxico. A toxicocinética descreve as ações do organismo sobre os fármacos, enquanto que a toxicodinâmica descreve o que o fármaco faz no organismo. Usando os conhecimentos destas áreas da toxicologia, o perito pode traçar uma estratégia de análise que melhor fornece os resultados para a identificação das substâncias presentes na amostra. A DL 50 é uma característica intrínseca da substância, mas não é uma descrição absoluta da toxicidade de um composto a todos os indivíduos, visto que não reflete a habilidade do indivíduo em responder ao contato com o agente tóxico. FIGURA 5 – COMPORTAMENTO DO AGENTE TÓXICO NO ORGANISMO FONTE: Adaptado de Azevedo e Chasin (2003) 21 Farmacologia dos Agentes Tóxicos Capítulo 1 De todo o processo de transporte, transformação e eliminação do agente tóxico resulta a quantidade de agente tóxico que irá reagir com o receptor biológico e esse conjunto de ações é bastante complexo, por isso estudaremos cada etapa separadamente. 3.1 Absorção Para que o agente tóxico se movimente pelo organismo e chegue ao sítio de ação no organismo, ele precisa primeiramente transpor as membranas biológica, e existem fatores importantes que afetam o transporte através das membranas: a) Fatores relacionados à membrana • Estrutura da membrana, a qual é constituída de uma dupla camada de fosfolipídios com camada lipídica, com grupos polares voltados para a face externa e ácidos graxos voltados para a parte interna, sendo, portanto, bimolecular. Os ácidos graxos que compõem a camada lipídica, na temperatura fisiológica, apresentam características fluidas. “A permeabilidade da membrana é determinada pela estrutura e proporção desses ácidos graxos” (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008, p. 24; PASSAGLI, 2018, p. 36). o espessura da membrana; o área de membrana disponível; o seletividade da membrana. b) Fatores relacionados ao agente tóxico • Lipossolubilidade/hidrossolubilidade: as substâncias químicas lipossolúveis (apolares) transpõem mais facilmente as membranas biológicas (difusão passiva). As substâncias hidrossolúveis penetrarão no organismo mais facilmente se forem moléculas pequenas, que possam ser filtradas pelos poros aquosos. • Grau de ionização/dissociação: a maior parte dos agentes tóxicos são ácidos ou bases fracas. A sua ionização depende do pH do meio e do próprio pKa da substância. A forma ionizada é a forma polar, hidrossolúvel e, portanto, tem pouca facilidade para transpor as membranas biológicas. Essa transposição é dependente do pH do meio. Quando o pH for igual ao pKa da substância, metade do composto estará na forma ionizada (PASSAGLI, 2018). O transporte dos agentes tóxicos do meio externo para o meio interno, através das membranas, ocorre segundo trêsmecanismos de absorção: 1- Transporte passivo: mecanismo que depende do gradiente de concentração e da composição físico-química do agente tóxico, principalmente em relação ao coeficiente 22 Química e Toxicologia Forense de partição óleo/água. O coeficiente de partição é o parâmetro que define o grau de lipossolubilidade de uma substância. É determinado agitando a agente químico em uma mistura de solvente orgânico e água. Quanto maior a concentração da substância na fase orgânica, maior a sua lipossolubilidade e maior a sua absorção (PASSAGLI, 2018). O transporte passivo envolve o processo de filtração (o agente tóxico, na forma de soluto, passa através dos poros da membrana junto ao fluxo de água; é influenciada pela solubilidade do agente tóxico em água e pela hidratação do tecido) e de difusão lipídica (simples), que é a passagem das moléculas hidrofóbicas por difusão através das membranas. Existe também o processo de difusão facilitada, a favor do gradiente de concentração, sem gasto de energia e com a presença de transportadores moleculares (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008; PASSAGLI, 2018). 2- Transporte ativo: caracterizado pelo consumo de energia, movimento contra o gradiente de concentração e a presença de proteínas transportadoras, as quais são saturáveis e seletivas frente às substâncias. FIGURA 6 – TRANSPORTES ATRAVÉS DA MEMBRANA FONTE: Adaptado de Whalen, Finkel e Panavelil (2016) 3- Endocitose: determinadas células “incorporam” o agente tóxico, fazendo-o através de dobras da membrana celular: FIGURA 7 – ESQUEMA COMPARATIVO DOS TRÊS TIPOS PRINCIPAIS DE ENDOCITOSE FONTE: <https://wikiciencias.casadasciencias.org/wiki/index. php/Endocitose>. Acesso em: 21 mar. 2019. 23 Farmacologia dos Agentes Tóxicos Capítulo 1 Vias de absorção: há três vias importantes de absorção dos xenobióticos no organismo: a entérica, respiratória e dérmica. A via parenteral é considerada uma via normal para introdução de agentes medicamentosos no organismo, que, dependendo da dose, podem causar alterações graves. Após a entrada do agente tóxico na corrente sanguínea, seja pela absorção ou pela administração direta, ele estará apto para ser distribuído (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008; PASSAGLI, 2018). FIGURA 8 – VIAS DE ENTRADA DE XENOBIÓTICOS NO ORGANISMO FONTE: A autora a) Via Dérmica Normalmente, as intoxicações via cutânea são aquelas de efeito local, ou seja, as dermatoses, produzidas pelo contato com os agentes tóxicos. Porém, também pode ocorrer a penetração do agente tóxico através da pele e seu posterior ingresso na corrente circulatória, por meio da epiderme, causando efeitos sistêmicos. A pele constitui-se numa barreira de revestimento do corpo, sendo um obstáculo contra a penetração de xenobióticos. A epiderme é a camada mais externa, e a derme, a camada interna, em que se observa a presença de glândulas sudoríparas, vasos sanguíneos, nervos e folículos pilosos. “A pele é geralmente impermeável à maioria dos íons e soluções aquosas, mas é permeável a um grande número de toxicantes sólidos, gasosos e líquidos lipossolúveis” (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008, p. 12). Muitos fatores influenciam a absorção através da pele, tais como: abrasão ou descontinuidade da pele, que tornam fácil a penetração do xenobiótico; inflamação; pilosidade 24 Química e Toxicologia Forense (a presença de pelos facilita a absorção cutânea); tamanho da área exposta; presença de outras substâncias na pele; tempo de exposição; redução da camada gordurosa protetora (efeitos dos solventes e sabões). b) Via Gastrointestinal Ao entrar no trato gastrointestinal, o agente tóxico poderá sofrer absorção desde a boca até o reto, por difusão passiva ou por transporte ativo. Na mucosa oral é raro ocorrer absorção devido ao fato do tempo de contato ser muito pequeno entre o agente tóxico e a mucosa. “Cocaína e derivados do ópio podem sofrer absorção via oral, nesse caso, esses agentes não sofrem com efeitos do suco gastrointestinal, alcançando elevados níveis sanguíneos” (PASSAGLI, 2018, p. 37). Nas demais seções do trato gastrointestinal (TGI) a absorção varia em função das características do agente tóxico e ele sofrerá maior absorção na região onde existir maior quantidade de sua forma não ionizada. De modo geral, devido ao epitélio e mucosa do TGI, as substância lipofílicas são absorvidas mais facilmente (difusão passiva). Portanto, as substâncias com baixo coeficiente de partição óleo/água (hidrossolúveis) têm uma baixa absorção. “O curare, composto quaternário de amônio, é polar e não absorvível pelo TGI, por isso já foi muito utilizado para abater caças, não causando intoxicação nas pessoas que comem a carne” (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008, p. 13). Nesta via, a absorção é dependente da composição e da quantidade de alimento. A absorção será favorecida quando o estômago estiver vazio (exceto no caso de intoxicação por álcool), já que haverá mais contato entre o agente tóxico e a mucosa estomacal. O leite, por exemplo, pode aumentar a absorção de chumbo (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008). No estômago ocorre a absorção de ácidos fracos, como os barbitúricos, os quais não estarão ionizados em pH ácido. A seguir, no intestino, o pH varia de 12 a 14, e isso facilita ou interfere na absorção de bases fracas, como êxtase (ecstasy) e anfetaminas. No intestino grosso, a ação de bactérias sobre o agente tóxico poderá levar à produção de moléculas absorvíveis (PASSAGLI, 2018). A mobilidade intestinal reduzida aumenta o tempo de contato do agente tóxico com a mucosa. Outro fator relevante desta via é a possibilidade de ocorrer o ciclo entero- hepático, que consiste na reabsorção de uma substância já excretada. As sustâncias lipofílicas passam pelo fígado e são excretadas no intestino através da bile, podendo ser reabsorvidas ou excretadas nas fezes. É muito importante levar em conta também a passagem dos agentes tóxicos (AT) por este ciclo em caso de insuficiência hepática. Neste caso, o AT levará mais tempo para ser eliminado do organismo. 25 Farmacologia dos Agentes Tóxicos Capítulo 1 FIGURA 9 – ROTA DO AGENTE TÓXICO PELA VIA ENTÉRICA, INCLUINDO O CICLO ENTERO-HEPÁTICO FONTE: Adaptado de <http://www.vademecumfarmacia.com>. Acesso em: 24 nov. 2018. 26 Química e Toxicologia Forense 1 A clorotiazida é um ácido fraco com pKa de 6,5. Em qual dos seguintes locais de absorção ela consegue passar facilmente através da membrana se for administrada por via oral? Justifique sua resposta. a) ( ) Boca (pH aproximado de 7). b) ( ) Estômago (pH de 2,5). c) ( ) Duodeno (pH aproximado de 6,1). d) ( ) Jejuno (pH aproximado de 8). e) ( ) Íleo (pH aproximado de 7). c) Via Respiratória Neste caso, a absorção do agente tóxico se dá tanto nas vias aéreas superiores quanto nos alvéolos. A superfície de contato pulmonar, composta pela superfície interna dos brônquios e bronquíolos é estimada em 90 m2, a superfície interna dos alvéolos pulmonares estimada em 70 m2, e as duas juntas formam a interface de contato com o exterior. Essa área, somada a uma rede capilar de vasos sanguíneos com área média de 140 m2, aumenta a extensão da absorção, particularmente de substâncias na forma gasosa. Levando em conta o consumo diário de ar pelo ser humano, e, dependendo de alterações, por exemplo, com o esforço físico realizado (metabolismo), conclui-se que essa via é uma grande facilitadora da entrada de agentes tóxicos. As partículas sólidas ou mesmo as líquidas de maiores diâmetros podem ficar retidas nas partes superiores do aparelho respiratório, onde podem causar doenças irritativas. Quando menores que 1 µm, podem chegar até os alvéolos pulmonares, onde são absorvidas e chegam à corrente sanguíneae à linfática, podendo também ser fagocitadas pelos macrófagos. Quando os xenobióticos fixam-se firmemente nas paredes pulmonares, tornando-se resistentes às tentativas de remoção do organismo, que tenta dissolvê-los, através do sangue e muco, surgem reações pulmonares a essa agressão, como inflamações e cicatrizações que acabam por afetar a função dos pulmões a longo prazo (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008). A quantidade de um agente tóxico que será absorvida pelo organismo, quando a penetração se dá pela via respiratória, depende de alguns fatores, tais como: 27 Farmacologia dos Agentes Tóxicos Capítulo 1 • concentração do agente tóxico no ar; • taxa de respiração (quantidade de ar respirada, que depende da taxa de metabolismo); • solubilidade do material no sangue (coeficiente de partição); • reatividade do material com tecidos do organismo. À medida que as moléculas passam pelos alvéolos e chegam ao sangue ocorre uma espécie de equilíbrio dinâmico, depois de algum tempo, entre as moléculas contidas no ar inspirado e dissolvidas no sangue. Com as moléculas altamente solúveis, esse equilíbrio é rápido e, nesse momento, é constante a relação da concentração do gás no ar e no sangue. Cada gás apresenta uma solubilidade no ar e no sangue e essa correlação é chamada coeficiente de partição sangue/ar (Tabela 1). Substâncias com alto coeficiente de partição sangue/ar passam facilmente do ar para o sangue. A alta perfusão pulmonar e o aumento da circulação sanguínea favorecem a absorção de gases de baixo coeficiente de partição sangue/ar. Em contrapartida, o aumento de frequência respiratória favorece a absorção de gases com alto coeficiente de partição sangue/ar (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008, p. 26). TABELA 1 – FATORES LIMITANTES DE ABSORÇÃO DE GASES E VAPORES POR VIA RESPIRATÓRIA FONTE: Oga, Camargo e Batistuzzo (2008, p. 26) 3.2 Distribuição e Armazenamento Uma vez absorvido ou administrado diretamente, o agente tóxico (AT) está disponível para ser distribuído pelo organismo e alcançar o seu “sítio de ação”. O sítio de ação ou sítio-alvo é o local (tecido ou órgão) onde o agente tóxico vai exercer sua ação nociva. A intensidade e a duração do efeito tóxico dependem da concentração do AT no sítio de ação. “Pode ocorrer, entretanto, a ligação do AT a outros constituintes do organismo (tecidos de depósito), e, então ele poderá ser encontrado em locais diferentes do sítio de ação” (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008, p. 14). Substância Coeficiente de partição sangue/ar Tempo de equilíbrio (min.) Fator Limitante Clorofórmio 15 Superior a 60 respiração Etileno 0,14 8 a 21 circulação 28 Química e Toxicologia Forense O acúmulo do AT em locais que não são o seu sítio de ação é uma forma de proteção do organismo, pois previne a elevada concentração do xenobiótico no sítio-alvo. O sangue é de grande importância para a distribuição, uma vez que circula por todos os tecidos. Assim, existe certo equilíbrio entre as concentrações do AT no sangue e nos tecidos. Se a concentração da forma livre cai, o agente tóxico armazenado em outro tecido tende a ser liberado em quantidade tal que o equilíbrio seja restabelecido. E, por isso, a concentração plasmática do AT fornece melhor avaliação da ação tóxica que a dose (PASSAGLI, 2018, p. 38). A distribuição geralmente é rápida e a sua velocidade e extensão dependem de dois fatores principais: • fluxo sanguíneo através dos tecidos de um dado órgão; • facilidade que tem o agente tóxico para atravessar a membrana capilar e atingir as células de um determinado tecido. A fixação ou concentração de um agente tóxico em um determinado tecido pode ser vista como um processo de armazenagem. A armazenagem poderá ocorrer inclusive no próprio tecido sanguíneo, através das ligações entre o xenobiótico e as proteínas plasmáticas. O elevado peso molecular das proteínas plasmáticas dificulta a passagem do complexo AT-proteína pelas membranas dos capilares, assim, o AT permanece mais tempo na corrente sanguínea e estará menos disponível para a distribuição aos tecidos. A albumina é a principal proteína plasmática a se ligar aos AT, por possuir afinidade por um grande número de moléculas e está em alta concentração no sangue. Fármacos de caráter ácido, como o fenobarbital e naproxeno, ligam-se quase que exclusivamente à albumina. Já molécula de caráter básico tem maior afinidade pela α1-glicoproteína ácida. As crianças possuem uma concentração menor de albumina que os adultos, portanto os AT estarão mais livres e podem ser mais rapidamente distribuídos. Deste modo, a idade e a concentração proteica interferem na distribuição do AT (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008; PASSAGLI, 2018). Pelo fato do armazenamento de agentes tóxicos em determinados órgãos ocorrer pelo mecanismo de ligação celular, do qual participam as proteínas intracelulares, as células dos rins e fígado têm uma enorme capacidade de fixação de agentes tóxicos. Doenças hepáticas alteram a capacidade fixadora de xenobióticos, por alterarem a produção de proteínas plasmáticas (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008). O acúmulo do AT em locais que não são o seu sítio de ação é uma forma de proteção do organismo, pois previne a elevada concentração do xenobiótico no sítio- alvo. 29 Farmacologia dos Agentes Tóxicos Capítulo 1 O armazenamento pode funcionar, portanto, como um mecanismo de defesa, visto que mantém o AT menos disponível para atingir o sítio-alvo. O tecido adiposo (gorduroso) (em média 50% de peso em uma pessoa obesa e 20% em uma pessoa magra) é também um local de armazenagem de agentes tóxicos. Nesse caso, o fenômeno se dará por simples dissolução do xenobiótico nesse tecido e a toxicidade de um AT será menos para pessoas obesas (esse efeito é bastante significativo no quadro de intoxicação alcoólica) (PASSAGLI, 2018, p. 38). O corpo humano possui diferentes mecanismos de proteção para minimizar ou até evitar a absorção do xenobiótico. Por exemplo: a pele e a película de suor e gordura que a recobrem atuam como barreira efetiva para várias substâncias químicas, impedindo sua penetração; a camada queratinosa da pele (formada por células mortas) resiste, até certo ponto, à ação da água, ácidos, raios ultravioleta etc. e ação das células sanguíneas denominadas macrófagos alveolares que englobam e tentam destruir os agentes estranhos. Porém, caso a exposição persista e/ou ocorra em altas doses, esses mecanismos de proteção tornam-se ineficientes e o xenobiótico instala-se no organismo. Ocorrendo isto, o processo de intoxicação prossegue, ou seja, o agente tóxico começa a movimentar-se no organismo. Para se evitar uma doença ou intoxicação, deve-se então eliminá-lo ou neutralizá-lo. Entram em cena os mecanismos de desintoxicação, que são a biotransformação e a excreção. 3.3 Biotransformação Biotransformação é o conjunto de alterações químicas que as substâncias sofrem no organismo, geralmente pela ação de enzimas. Essas alterações modificam as moléculas dos agentes tóxicos, produzindo compostos mais polares e hidrossolúveis. Biotransformação e detoxicação não são sinônimos. A detoxificação (desintoxicação) pode ser entendida como a biotransformação de um agente tóxico que resulta em um composto menos tóxico. O oposto à detoxificação seria a biotoxificação (intoxicação). A maior parte dos agentes tóxicos ao serem biotransformados sofrem desativação, ou seja, o produto resultante da biotransformação é menos ativo (menos tóxico) que o precursor. 30 Química e Toxicologia Forense Nestes casos, a biotransformação é, realmente, um mecanismo de detoxificação. Esta não é, entretanto, uma regra geral; como exemplo cita-se a biotransformação dos hidrocarbonetosaromáticos policíclicos, quando os mesmos são convertidos em derivados arilados, que podem reagir com proteínas, induzindo a mutações, câncer e anormalidades embrionárias (PASSAGLI, 2018, p. 42). Enzima é um tipo de proteína que possui ação catalítica, ou seja, interferem nas reações químicas, normalmente sem participar de forma direta da mesma, alterando a sua velocidade de reação. Uma proteína, por sua vez, é um polímero de um aminoácido. As proteínas existem em todas as células vivas, constituindo-se em cerca de 3/4 do peso seco dos tecidos animais. Algumas proteínas têm função estrutural (pele, cabelos, fibras musculares); outras têm função reguladora (hormônios); outras participam ativamente dos mecanismos imunológicos de defesa dos organismos (anticorpos); outras têm a função catalisadora, atuando como enzimas (HOFFMAN, 1996). A biotransformação dos xenobióticos é catalisada por enzimas inespecíficas. As reações envolvidas na biotransformação são divididas em: • Reações de Fase I: oxidação, redução, hidrólise, as quais adicionam às moléculas grupos polares, aumentando sua hidrossolubilidade e sua toxicidade (compostos mais ativos que o agente tóxico) e esse processo também é chamado bioativação. Na metabolização do etanol ocorre a produção de um agente mais tóxico ao final da fase I (aldeído), em seguida, uma outra reação de fase I transforma o aldeído em ácido carboxílico, o qual é menos tóxico que o anterior e é a forma hidrossolúvel excretada na urina (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008, p.18). • Reações de Fase II: conjugação, acetilação, glicuronidação, metilação etc. Essas reações caracterizam-se pela incorporação de cofatores endógenos aos produtos da fase I. Porém, alguns AT, como morfina, codeína e heroína sofrem diretamente a conjugação com ácido glicurônico, sem passar pela fase I (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008, p. 16). Na metabolização do etanol ocorre a produção de um agente mais tóxico ao final da fase I (aldeído), em seguida, uma outra reação de fase I transforma o aldeído em ácido carboxílico, o qual é menos tóxico que o anterior e é a forma hidrossolúvel excretada na urina (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008, p.18). 31 Farmacologia dos Agentes Tóxicos Capítulo 1 A biotransformação de agentes tóxicos por oxidação se dá pela ação das enzimas do grupo oxidase, localizadas no fígado. As reações de oxidação são as mais frequentes, sendo esta a tendência dos processos bioquímicos no reino animal. O sistema enzimático principal na oxidação de xenobióticos é o chamado Citocromo P450 (CYP450). Essas enzimas representam uma superfamília ampla e diversificada de proteínas responsáveis por oxidar um grande número de substâncias para torná-las mais polares e hidrossolúveis. O CYP450 parece estar localizado nas camadas profundas na membrana do retículo endotelial liso (REL), mais especificamente nos microssomos hepáticos. Esta enzima é a oxidase terminal do sistema de oxidases mistas. Ela recebe os elétrons provenientes de outras fases da reação, se reduz e se liga ao O2 e ao fármaco, promovendo de fato a oxidação do composto (PASSAGLI, 2018, p. 43). Em menor escala, a biotransformação de agentes tóxicos por redução se dá pela ação das flavoproteínas, também situadas no fígado. As reações de hidrólise ocorrem pela ação das enzimas do grupo esterases, as quais podem localizar-se no fígado, plasma do sangue e outros tecidos. Geralmente estas esterases não têm uma boa especificidade, ou seja, uma esterase pode, além de hidrolisar ésteres, provocar a quebra de acetanilidas, amidas e outros derivados da anilina (PASSAGLI, 2018, p. 43). Nas reações de conjugação, o xenobiótico, proveniente ou não da fase pré- sintética, se liga a substratos endógenos do organismo formando metabólitos com tamanho molecular elevado e, consequentemente, mais excretáveis e menos tóxicos. Ou seja, na conjugação observa-se: aumento do tamanho, maior polaridade, maior ionização, maior excreção, menor toxicidade. Os principais compostos endógenos envolvidos na conjugação são: • Aminoácidos e seus derivados, tais como a glicina, cisteína etc. • Carboidratos e seus derivados, especialmente o ácido glicurônico e glicose. • Conjugação com compostos simples, como por exemplo, sulfato e acetato. O composto endógeno envolvido na conjugação está, geralmente, na sua forma “ativa”, ou seja, ligado a uma coenzima da qual é transferido para o xenobiótico. As conjugações mais frequentes são aquelas feitas com ácido glicurônico e com o sulfato (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008, p. 18). A biotransformação pode ser intensificada pela presença de substâncias indutoras da síntese de enzimas específicas, esse fenômeno ocorre devido ao aumento da concentração de algumas enzimas microssomiais e acarreta um aumento da velocidade de excreção dos produtos biotransformados. Contrariamente, substâncias inibidoras de certos grupos enzimáticos reduzem 32 Química e Toxicologia Forense a velocidade do processo de biotransformação (PASSAGLI, 2018, p. 44). A biotransformação varia com alguns fatores, tais como: • Idade: o recém-nascido tem biotransformação mais lenta, pois apresenta apenas 20 a 50% da atividade do cit. P450 dos adultos. Os idosos possuem menor biotransformação de AT porque apresentam atividade diminuída de cit. P450, menor fluxo sanguíneo e menor eficiência dos sistemas de excreção renal e biliar. • O estado nutricional: deficiências de vitaminas reduzem a velocidade de biotransformação. • Dose e frequência: a frequência pode levar a uma sensibilização ou indução de receptores enzimáticos, aumentando a biotransformação. • Estado patológico: doenças cardiovasculares diminuem o fluxo sanguíneo no fígado e doenças hepáticas acarretam redução drástica da atividade hepática e, consequentemente, a taxa de biotransformação (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008, p. 21; PASSAGLI, 2018, p. 44). 3.4 Excreção A excreção de xenobióticos pode ocorrer através de fluidos corporais e outros materiais, como fezes e ar expirado. A via de eliminação de importância é determinada pelas propriedades físico-químicas dos compostos. A excreção pode ser entendida como o processo oposto ao de absorção e é a eliminação do agente tóxico “in natura” ou biotransformado. Essa eliminação pode ocorrer através das secreções (secreção biliar, sudorípara, lacrimal, salivar, láctea), através das excreções (urina, fezes e catarro) ou através do ar expirado. O processo mais importante para a toxicologia é a excreção urinária (PASSIAGLI, 2018, p. 46). A excreção renal ocorre em três etapas: a) filtração glomerular, em que após a filtração pelos glomérulos pode ocorrer a reabsorção passiva do AT ou de seus metabólitos nos túbulos renais. Ou, as substâncias podem ser eliminadas. As substâncias de caráter alcalino são eliminadas na urina ácida e as substâncias ácidas são eliminadas na urina alcalina, assim essas substâncias estarão ionizadas e serão hidrossolúveis; b) difusão tubular passiva: substâncias lipossolúveis nos capilares renais podem atravessar a membrana por difusão passiva e cair nos túbulos e podem ser eliminadas ou reabsorvidas; c) secreção tubular renal, que tem as características do transporte ativo (WHALEN; FINKEL; PANAVELIL, 2016). 33 Farmacologia dos Agentes Tóxicos Capítulo 1 De acordo com Passagli (2018, p. 48), vários fatores podem interferir na velocidade e na via de excreção, são eles: • via de introdução; • afinidade por elementos do sangue e tecidos (AT na sua forma livre está disponível à eliminação); • facilidade de ser biotransformado (aumento da polaridade facilita a excreção urinária); • frequência respiratória (as trocas gasosas ocorrem mais rapidamente); • função renal(qualquer doença ou disfunção leva ao acúmulo de AT). Associado ao fenômeno de excreção surge o conceito de meia vida biológica do agente tóxico. Os AT encontrados nas fezes são, geralmente, aqueles com fração não ingerida ou absorvida, por isso esse material tem pouca relevância toxicológica. A eliminação de AT (líquidos voláteis e gases inalados) pode ocorrer, parcialmente, pelo ar exalado. Nesse processo ocorre difusão través de membranas e os gases com menor solubilidade no sangue são rapidamente eliminados (PASSAGLI, 2018, p. 48). 1 A toxicocinética é um estudo da relação entre a quantidade de um agente tóxico que atua sobre um organismo e a concentração dele no plasma, relacionando os processos de absorção, distribuição e eliminação do agente, em função do tempo. Em relação a este assunto, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas: ( ) Biotransformação é toda alteração que ocorre na estrutura química da substância no organismo. ( ) As substâncias lipofílicas são facilmente absorvidas e facilmente excretadas. ( ) As substâncias hidrofílicas têm absorção mais precária, mas são facilmente excretadas. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) V - F - V. b) ( ) F - F - V. c) ( ) F - V - V. d) ( ) V - V - F. 34 Química e Toxicologia Forense 4 Toxicodinâmica de Agentes Tóxicos A toxicodinâmica descreve as ações dos AT no organismo e as influências das suas concentrações na magnitude das respostas. Todas as substâncias químicas tóxicas atuam alterando as condições fisiológicas e normais das células (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008, p. 29). A Figura 10 mostra os estágios potenciais no desenvolvimento da toxicidade após a exposição a xenobióticos. Uma via comum é quando o toxicante alcança a molécula-alvo e reage com ela, resultando numa disfunção celular. Outras vezes, o xenobiótico não alcança o alvo específico, mas influencia adversamente o (micro) ambiente biológico, causando disfunção molecular, celular, de organelas ou órgãos, levando a efeitos deletérios. O caminho mais complexo envolve mais etapas. Primeiro, o toxicante alcança o alvo e interage com moléculas endógenas, causando perturbações na função ou estrutura celular, iniciando mecanismos que provocam dano. Quando estas perturbações induzidas pelo toxicante excedem a capacidade de reparação do organismo, a toxicidade se manifesta, podendo ocorrer, por exemplo, necrose tissular, câncer ou fibrose. FIGURA 10 – ESTÁGIOS POTENCIAIS NO DESENVOLVIMENTO DE TOXICIDADE APÓS EXPOSIÇÃO A TOXICANTES FONTE: Adaptado de Gregus e Klaasen (2001) 35 Farmacologia dos Agentes Tóxicos Capítulo 1 A intensidade de um efeito tóxico depende primeiramente da concentração e persistência do toxicante (toxicante final) no seu sítio de ação. O toxicante final é a espécie química que reage com moléculas endógenas-alvo (por exemplo, receptor, enzima, DNA, proteína, lipídio) ou altera criticamente o (micro) ambiente biológico, iniciando alteração estrutural ou funcional que resulta na toxicidade. Frequentemente, esse toxicante final é um metabólito do composto inicial, ao qual o organismo é exposto, gerado na biotransformação. Ocasionalmente, o toxicante final pode ser uma molécula endógena. No caso dos medicamentos, é importante diferenciar reação adversa e intoxicação. Reação adversa é provocada com dose terapêutica, devido a não seletividade do medicamento por um único alvo molecular ou por esse medicamento estar distribuído em diferentes sítios do organismo. A intoxicação medicamentosa deve-se ao uso de dose excessiva do medicamento, intencionalmente ou de forma acidental (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008, p. 29). Tolerância é uma resposta diminuída a um AT devido a uma exposição prévia a esse AT ou a uma substância química de estrutura similar. Seletividade de ação é quando o AT causa danos somente a um tipo de órgão ou estrutura (WHALEN; FINKEL; PANAVELIL, 2016). Principais mecanismos de ação tóxica: a) Modificação na permeabilidade da membrana Como foi visto anteriormente, as membranas celulares têm papel fundamental na absorção ou não absorção do AT. “A modificação de sua permeabilidade afeta a entrada e saída de nutrientes como fármacos e excretas, além dos íons Na, K e Ca, responsáveis pelos fenômenos de polarização e despolarização da membrana e, consequentemente, pela transmissão elétrica do impulso nervoso” (GOLAN et al., 2012, p. 95). A neurotoxicidade do DDT, por exemplo, é o resultado da interferência nos íons sódio, alterando a permeabilidade da membrana. Muitos solventes orgânicos produzem efeitos depressores do sistema nervoso central devido a sua capacidade de alterar a fluidez da membrana, tornando-a mais densa e rígida, comprometendo processos que necessitem de mudanças rápidas e reversíveis na estrutura das membranas. O álcool etílico altera a fluidez das membranas devido a sua propriedade lipofílica. Desta forma, ele dissolve o componente lipídico e diminui a sua viscosidade (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008, p. 29). 36 Química e Toxicologia Forense b) Modificação na atividade enzimática Alguns AT são capazes de inibir a ação de enzimas com funções essenciais. Entre os agentes que atuam dessa forma estão os organofosforados e o cianeto. Os organofosforados inativam as enzimas colinesterases, através da fosforilação do sítio esterásico, tornando a recuperação da enzima extremamente lenta e, assim, ocorre acúmulo de acetilcolina nas terminações nervosas. “O cianeto age complexando com o heme da citocromo oxidase, incapacitando-o de fixar o oxigênio” (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008, p. 33). Além do fenômeno de inibição enzimática deve-se considerar o fenômeno relacionado com a indução enzimática, que supõe um incremento na atividade de algumas enzimas como consequência da absorção de determinados xenobióticos. c) Interações de agentes tóxicos com receptores Os receptores seriam macromoléculas situadas nas membranas celulares, citoplasma ou núcleo. Por exemplo, o curare (alcaloide extraído de plantas da América do Sul) atua em receptores das junções neuromusculares. d) Inibição da fosforilação oxidativa Interferências na produção de energia celular (ATP) e bloqueio da liberação de oxigênio aos tecidos. Esse bloqueio pode ocasionar alteração na integridade das membranas, interferência nas bombas iônicas e na síntese proteica. O cianeto, por exemplo, bloqueia a utilização de oxigênio pelos tecidos por inibição do transporte de elétrons. A oxidação do ferro na hemoglobina pelos nitritos, formando metemoglobina, interfere com a transferência de oxigênio, pois a metemoglobina não transporta O2 (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008, p. 33). Na exposição a mais de dois toxicantes, deve-se considerar a possibilidade de um composto interferir na ação do outro. Portanto, numa mistura de agentes tóxicos pode haver alterações dos efeitos que produziriam separadamente. No efeito aditivo, o efeito tóxico final é igual à soma dos efeitos produzidos separadamente. Por exemplo, a exposição ao chumbo e ao arsênio na inibição da biossíntese do heme, em que ocorre um aumento aditivo de coproporfirinogênio na urina. No efeito sinérgico, o efeito final é maior do que a soma dos efeitos individuais. A exposição ao tetracloreto de carbono e compostos clorados aromáticos promovem uma hepatotoxicidade sinérgica. 37 Farmacologia dos Agentes Tóxicos Capítulo 1 Na potenciação, um xenobiótico apresenta seu efeito aumentado por interagir com outro toxicante que, originalmente, não produziria aquele efeito tóxico. O propanolol não é hepatotóxico, entretanto, junto ao tetracloreto de carbono aumenta a hepatotoxicidade deste (KLAASSEN; WATKINS III, 2009, p. 8).Quando um toxicante reduz o efeito tóxico de outro, observa-se um antagonismo, em que o efeito tóxico final será menor. No antagonismo competitivo, o antagonista compete com o agonista pelo mesmo sítio de ação, sem reagir com este último, nem com seus receptores. Por exemplo, os praguicidas organofosforados inibem a enzima colinesterase, com o acúmulo de acetilcolina nas sinapses colinérgicas. A atropina (antagonista) bloqueia os receptores de acetilcolina, sendo usada no tratamento das intoxicações por organofosforados. No antagonismo químico, o antagonista reage com o agonista (responsável pela ação tóxica), inativando-o. Por exemplo, o EDTA forma complexos solúveis com o chumbo. Quando dois agonistas agem sobre o mesmo sistema produzindo efeitos contrários, tem-se o antagonismo funcional. Os glicosídeos cardiotônicos, por exemplo, aumentam a pressão arterial e os bloqueadores α-adrenérgicos atuam diminuindo a pressão arterial (GOLAN et al., 2012, p. 275). 4.1 Efeitos Tóxicos Reversíveis e Irreversíveis Algumas substâncias químicas podem provocar efeitos tóxicos com lesão patológica a um tecido que pode ser reversível ou irreversível, isso vai depender da capacidade regenerativa do tecido. O tecido hepático apresenta alta capacidade de regeneração, portanto, a maioria das lesões são reversíveis. Já no sistema nervoso central, que apresenta células diferenciadas que não são substituíveis, as lesões são normalmente irreversíveis. Efeitos carcinogênicos e teratogênicos sempre serão irreversíveis (KLAASSEN; WATKINS, 2009, p. 8). 38 Química e Toxicologia Forense FIGURA 11 – VISÃO GERAL DO METABOLISMO DO BENZENO FONTE: Adaptado de Anderson et al. (2014) 1 Que é DL50 e o que representa? 2 Na intoxicação, os complexos eventos envolvidos podem ser desdobrados nas chamadas fases de intoxicação. Qual é a fase em que as superfícies externa ou interna do organismo entram em contato com o toxicante? 3 No âmbito da toxicologia existem conceitos que devem ser conhecidos para estudo do tema. Dentre os conceitos de toxicologia, analise as afirmativas a seguir: I- Agente tóxico é a entidade química capaz de causar dano a um sistema biológico, alterando seriamente uma função ou levando-o à morte, sob certas condições de exposição. II- Droga é toda substância capaz de modificar ou explorar o sistema fisiológico ou estado patológico, utilizada com ou sem intenção de benefício do organismo receptor. III- Ação tóxica é a maneira pela qual um agente tóxico exerce sua atividade sobre as estruturas teciduais. Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) Somente a afirmativa I está correta. b) ( ) As afirmativas II e III estão corretas. c) ( ) As afirmativas I, II e III estão corretas. d) ( ) Somente a afirmativa II está correta. 39 Farmacologia dos Agentes Tóxicos Capítulo 1 5 Aplicação da Química, Farmacologia e Toxicologia na Elucidação de Crimes Envolvendo Tráfico de Entorpecentes, Agrotóxicos, Medicamentos, Bebidas e Adulteração de Combustíveis A toxicologia e a química forense são responsáveis pela análise de vestígios e produção de provas materiais de interesse judiciário. Essas áreas englobam a identificação de substâncias lícitas e ilícitas em materiais biológicos (sangue, esperma, liquor, tecidos) e em outros tipos de materiais; a análise da presença de agrotóxicos e da adulteração de medicamentos, bebidas, alimentos e até combustíveis. A química pode contribuir para a elucidação de diferentes casos de crimes facilitados por drogas, os quais normalmente implicam no uso de substâncias com fortes efeitos depressores do sistema nervoso central, e que são usadas para transformar as pessoas em vítimas fáceis de roubos ou assaltos sexuais. Dentre os crimes, nos quais a química forense pode atuar ativamente estão: • Crimes contra o patrimônio, como por exemplo, roubo com o uso de boa- noite cinderela. • Crimes contra a vida: homicídio, indução ao suicídio, infanticídio e aborto. • Crimes contra a dignidade sexual: na análise de fluidos corporais e detecção de drogas facilitadoras de abuso sexual. • Crimes contra a administração pública: diferenciação de papéis e tintas usados para a falsificação de documentos. • Crimes ambientais: análise de água, solo e ar que podem estar poluídos. • Crimes em relação à Lei de Drogas: na análise, identificação e caracterização de substâncias lícitas ou ilícitas. Acidentes de trânsito: análise do teor de etanol. • Fraudes diversas: nas fraudes de medicamentos, suplementos alimentares, bebidas, alimentos e combustíveis (BRUNI; VELHO; OLIVEIRA, 2012). Investigações sobre narcóticos e o tráfico de entorpecentes tomam conta do país devido ao alto número de substâncias lícitas e ilícitas comercializadas. 40 Química e Toxicologia Forense Maconha, cocaína, opioides e drogas sintéticas são substâncias consumidas mundialmente e em taxas que mudam de acordo com o país e a região. Segundo o Relatório Mundial Sobre Drogas (UNODC, 2018), a cannabis foi a droga mais usada em 2016, o número global de usuários de cannabis continua a aumentar e aparenta ter expandido em aproximadamente 16% na última década até o ano 2016, refletindo assim um aumento similar na população global. Drogas como a heroína e a cocaína, que têm estado disponíveis por um período significativo, coexistem de modo crescente com novas substâncias psicoativas (NSP) e medicamentos sob prescrição. Houve aumento no fluxo de preparações farmacêuticas de origens pouco claras destinadas ao uso não medicinal. FIGURA 12 – NÚMERO DE USUÁRIOS DE DROGAS NO ANO DE 2016 FONTE: Adaptado de UNODC (2018) As drogas sintéticas (“designer drugs”) ou NPS são substâncias químicas ou mistura delas com ação principal sobre o sistema nervoso central. Essas drogas são produzidas em laboratórios domésticos e clandestinos, por meio de síntese química com componentes ativos normalmente não encontrados na natureza. Porém, seus componentes apresentam baixo custo e são facilmente encontrados no mercado ilícito. Essas drogas são muito usadas em “raves” e clubes noturnos (PASSAGLI, 2018). De acordo com o Escritório das Nações Unidas (UNODC, 2018), no Brasil, o mercado consumidor de novas drogas sintéticas é crescente. No período entre 2008 e 2015 foram identificadas 644 NPS em 106 países. Ainda, segundo a 41 Farmacologia dos Agentes Tóxicos Capítulo 1 UNODC (2018), canabinoides sintéticos representam 35% das NPS reportadas até 2015. Eles podem ser vendidos sob o nome de K2, “spice’’ ou incensos herbais. Sua venda é feita através da internet ou coffeshops em países onde a venda da cannabis é legal (PASSAGLI, 2018). A legislação brasileira só considera droga uma substância elencada na Portaria nº 344/1998 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA. Logo, uma substância que foi modificada quimicamente e não se encontra na lista da Portaria nº 344 não pode ser considerada droga. Infelizmente, o mercado de novas drogas sintéticas está em plena expansão. Em seu trabalho, o toxicologista e químico forense deve analisar, identificar e classificar as substâncias ilícitas e as NSP em uso no país, contribuindo para a fiscalização e controle do crescimento deste mercado ilícito no país. A identificação inicial de drogas pode ser realizada através de métodos colorimétricos, através de kits, de uma forma simples e rápida. Em seguida, ocorre uma análise detalhada das substâncias que compõem o material apreendido, pelo uso de equipamentos e técnicas mais seguras, por meio das quais se consegue conhecer a origem dos entorpecentes (MOTA, 2013). O trabalho da toxicologia forense é indispensável na elucidação de crimes, na punição de responsáveis e no conhecimento disponibilizado à sociedadeatravés de seus dados (SILVA et al., 2018). A identificação e quantificação do teor alcoólico em seres vivos é realizada em indivíduos envolvidos em acidente de trânsito ou em operações de fiscalização. Após um acidente de trânsito com vítima fatal, o motorista pode passar por exames clínicos e toxicológicos. Como a eliminação do álcool ocorre de forma gradativa e regular, esses exames devem ser realizados em tempo hábil para que as provas materiais sejam geradas. Além disso, a estabilidade do etanol nas amostras coletadas é um ponto crítico para a análise. Dentro do frasco de coleta pode ocorrer formação de etanol pela ação de microrganismos. Também pode ocorrer diminuição do álcool etílico pelo consumo de bactérias ou pela evaporação do álcool dentro do frasco, ocorrendo o escape para a atmosfera quando o frasco for aberto (BRUNI et al., 2012). Art. 277. O condutor de veículo automotor envolvido em acidente de trânsito ou que for alvo de fiscalização de trânsito poderá ser submetido a teste, exame clínico, perícia ou outro procedimento que, por meios técnicos ou científicos, na forma disciplinada pelo Contran, permita certificar influência de álcool ou outra substância psicoativa que determine dependência (Lei nº 12.760, de 2012, s.p.). Outra questão que deve ser levada em consideração é a adulteração de bebidas, drogas e medicamentos. É enorme e crescente o número de ocorrências 42 Química e Toxicologia Forense de crimes facilitados com o uso de drogas e isso se tornou um problema sério de saúde e segurança pública. O surgimento de NSP e a facilidade de acesso às mesmas aumentam a demanda de trabalho dos toxicologistas forenses. Há uma grande dificuldade na identificação das novas substâncias sem métodos analíticos para a sua detecção rápida (PRIOR; RIBEIRO; SANTOS, 2013). De acordo com a Sociedade dos Toxicologistas Forenses (SOFT, do inglês Society of Forensic Toxicologists), existem mais de 50 drogas reconhecidas ou suspeitas de serem usadas em crimes facilitados por drogas (SOFT, 2018). As substâncias mais comumente encontradas são drogas de abuso recreativo, medicamentos sujeitos à prescrição médica obrigatória e etanol. Entre os fármacos normalmente implicados nestes casos podem destacar-se os benzodiazepínicos, barbitúricos e anti-histamínicos. Todas essas substâncias apresentam propriedades ansiolíticas, calmantes ou hipnóticas e são depressores do sistema nervoso central. Adicionalmente, os seus efeitos são perigosamente potenciados quando as drogas são ingeridas com álcool. Uma observação interessante é que é de extrema relevância a execução de análises nas bebidas suspeitas de adulteração, visto que a estabilidade química e a concentração das substâncias são maiores nas bebidas do que no material biológico (PRIOR; RIBEIRO; SANTOS, 2013). Um ponto que tem levantado muitos estudos e pesquisas é a presença de adulterantes e/ou diluentes nas drogas, os quais o usuário consome com a droga, sem prévio conhecimento. Estes adulterantes podem ter princípios ativos que geram efeitos tóxicos nos usuários, podendo levar a consequências graves associadas aos efeitos das drogas ou até mascarar a presença dessas drogas nos ensaios laboratoriais (MAGALHÃES et al., 2013). O objetivo da adulteração da composição final da droga é, principalmente, aumentar seu volume ou potencializar o efeito do princípio ativo da droga em si. A identificação destes adulterantes permite descobrir a sua fonte de fabricação, caso já existam registros de investigação policial e padrões laboratoriais conhecidos (MAGALHÃES et al., 2013). Uma das drogas que vem sendo adulterada constantemente é a cocaína (Tabela 2), que é comercializada principalmente como sal (cloridrato de cocaína) ou como “crack”, pasta-base de cocaína, mais barata e mais facilmente produzida. Várias podem ser as consequências para o usuário. Existem vários relatos de casos na literatura de usuários que deram entrada em hospitais com quadros graves devido à presença de certos adulterantes. O levamisol, por exemplo, desencadeia infecções recorrentes e oportunistas por ser um imunossupressor (ALCÂNTARA, 2006). Uma observação interessante é que é de extrema relevância a execução de análises nas bebidas suspeitas de adulteração, visto que a estabilidade química e a concentração das substâncias são maiores nas bebidas do que no material biológico (PRIOR; RIBEIRO; SANTOS, 2013). 43 Farmacologia dos Agentes Tóxicos Capítulo 1 TABELA 2 – PRINCIPAIS ADULTERANTES ENCONTRADOS NA COCAÍNA E SEUS EFEITOS FONTE: Adaptado de Alcântara (2006) A adulteração de combustíveis e a falsificação de agrotóxicos são áreas criminais em que a química tem papel importante na identificação de substâncias. O uso de combustíveis adulterados acarreta deterioração precoce dos veículos, danos ao meio ambiente, devido à combustão irregular e o prejuízo à arrecadação de impostos. A adulteração de combustíveis ocorre principalmente pela adição de solventes ou água, ou pela presença de substâncias acima das especificações permitidas. A fiscalização da qualidade dos combustíveis está a cargo da ANP (Agência Nacional de Petróleo). Porém, quando há suspeita de adulteração, é comum a realização de laudos preliminares e, havendo indício de irregularidade, as amostras são encaminhadas para a análise definitiva. Nesse contexto, a ANP pode contar com a parceria da polícia técnica (DE SOUZA NETO et al., 2004). Agrotóxicos proibidos no território brasileiro são comercializados legalmente em países vizinhos, o que facilita a compra dos produtos no exterior e o contrabando no Brasil (LEMOS; CARVALHO; ORTIZ, 2018). A agricultura brasileira é altamente dependente de agrotóxicos e, em 2008, nos tornamos o país com o maior mercado mundial desses produtos. No Brasil, o uso de agrotóxicos ilegais é tipificado como crime e infração penal ambiental e a sua importação é considerada contrabando e sonegação fiscal. A existência de alimentos produzidos em lavouras que utilizam agrotóxicos ilegais traz riscos à saúde pública. A realização de análises quantitativas em agrotóxicos apreendidos pela perícia toxicológica, pode gerar informações confiáveis para embasar políticas de repressão a esse crime (FRAGA et al., 2016). “Art. 15. Aquele que produzir, comercializar, transportar, aplicar, prestar serviço, der destinação a resíduos e embalagens vazias de agrotóxicos, seus componentes e afins, em descumprimento às exigências estabelecidas na legislação pertinente estará sujeito à pena de reclusão de dois a quatro anos, além de multa” Lei nº 7.802/89 (com a redação que lhe deu a Lei nº 9.974, de 06.06.2000) (BRASIL, 1989, s.p.). Adulterante Efeito Lidocaína Anestésico local Benzocaína Anestésico local Caféina Estimulante Fenacetina Analgésico e antipirético Aminopirina Analgésico antiinflamatório Levamisol Imuno regulados e antihelmíntico amido, carbonatos, talco Diluentes inertes “Art. 15. Aquele que produzir, comercializar, transportar, aplicar, prestar serviço, der destinação a resíduos e embalagens vazias de agrotóxicos, seus componentes e afins, em descumprimento às exigências estabelecidas na legislação pertinente estará sujeito à pena de reclusão de dois a quatro anos, além de multa” Lei nº 7.802/89 (com a redação que lhe deu a Lei nº 9.974, de 06.06.2000) (BRASIL, 1989, s.p.). 44 Química e Toxicologia Forense O gráfico a seguir representa a relação dose/resposta para uma substância hipotética em uma população homogênea, sendo que o efeito medido foi a letalidade. A respeito desta análise toxicológica, em que DL50 é a dose que causou a morte de 50% dos indivíduos analisados, assinale a opção correta: FONTE: Adaptado de CESPE/UnB
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