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Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) Autor: Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas 01 de Outubro de 2021 22400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO Sumário 1. Nulidades ........................................................................................................................................................ 3 1.1 Noções gerais ........................................................................................................................................... 3 1.2 Formas e tipicidade processual ................................................................................................................ 3 1.3 Nulidade – significados e conceitos ......................................................................................................... 5 1.4 Sistemas ................................................................................................................................................... 7 1.5 Vícios dos atos processuais ...................................................................................................................... 8 1.5.1 Inexistência ...............................................................................................................................................................8 1.5.2 Irregularidade ...........................................................................................................................................................9 1.5.3 Nulidade....................................................................................................................................................................9 1.5.4 Anulabilidade ......................................................................................................................................................... 13 1.6 Princípios informadores ......................................................................................................................... 13 1.6.1 Princípio da tipicidade das formas ......................................................................................................................... 13 1.6.2 Princípio do prejuízo – pas de nullité sans grief .................................................................................................... 13 1.6.3 Princípio da instrumentalidade das formas ........................................................................................................... 14 1.6.4 Princípio do interesse ............................................................................................................................................ 15 1.6.5 Princípio da lealdade (boa-fé)................................................................................................................................ 17 1.6.6 Princípio da convalidação ...................................................................................................................................... 17 1.6.7 Princípio da causalidade/contaminação/consequencialidade/extensão: ............................................................. 19 1.6.8 Princípio da conservação ....................................................................................................................................... 21 1.6.9 Princípio da eficácia ............................................................................................................................................... 21 1.6.10 Princípio da restrição processual à decretação da ineficácia .............................................................................. 22 1.7 Hipóteses de nulidades absolutas .......................................................................................................... 23 1.8 Hipóteses de nulidades relativas ............................................................................................................ 24 1.9 Momento para arguição das nulidades relativas .................................................................................. 25 1.10 Reconhecimento das nulidades ............................................................................................................ 27 1.11 Nulidades em espécie/cominadas ........................................................................................................ 27 1.11.1 Incompetência ..................................................................................................................................................... 27 1.11.2 Suspeição ............................................................................................................................................................. 28 1.11.3 Suborno ............................................................................................................................................................... 30 1.11.4 Ilegitimidade de parte ......................................................................................................................................... 30 1.11.5 Falta de denúncia, queixa ou representação....................................................................................................... 31 1.11.6 Falta de exame de corpo de delito ...................................................................................................................... 32 1.11.7 Falta de nomeação de defensor .......................................................................................................................... 32 1.11.8 Falta de intervenção do Ministério Público ......................................................................................................... 33 1.11.9 Falta de citação, interrogatório ou prazos........................................................................................................... 34 1.11.10 Falta de pronúncia ............................................................................................................................................. 35 1.11.11 Falta de intimação do réu para a sessão ........................................................................................................... 35 1.11.12 Falta de intimação das testemunhas ................................................................................................................. 36 1.11.13 Falta de número mínimo de jurados ................................................................................................................. 36 1.11.14 Falta de sorteio dos jurados e incomunicabilidade ........................................................................................... 37 1.11.15 Formulação de quesitos .................................................................................................................................... 37 1.11.16 Falta de acusação e defesa na sessão................................................................................................................ 38 1.11.17 Falta de sentença ............................................................................................................................................... 38 1.11.18 Falta de recurso se ofício ................................................................................................................................... 39 1.11.19 Falta de intimação de sentenças e decisões recorríveis .................................................................................... 39 1.11.20 Falta de quórum para julgamento nos tribunais ............................................................................................... 40 1.11.21 Omissão de formalidade essencial .................................................................................................................... 40 1.11.22 Carência de fundamentação .............................................................................................................................. 41 1.12 Nulidadesno inquérito policial ............................................................................................................. 41 Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 2 79 2. Questões ...................................................................................................................................................... 42 2.1 Questões sem comentários .................................................................................................................... 42 2.2 Gabarito ................................................................................................................................................. 49 2.3 Questões com comentários .................................................................................................................... 49 3. Resumo ......................................................................................................................................................... 70 3.1 Princípios informadores ............................................................................................................................................ 71 3.2 Hipóteses de nulidades absolutas ............................................................................................................................ 73 3.3 Hipóteses de nulidades relativas .............................................................................................................................. 74 3.4 Momento para arguição das nulidades relativas ..................................................................................................... 74 3.5 Reconhecimento das nulidades ................................................................................................................................ 74 3.6 Nulidades em espécie/cominadas ............................................................................................................................ 74 3.7 Nulidades no inquérito policial ................................................................................................................................. 77 4. Referências bibliográficas ............................................................................................................................ 78 Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 3 79 1. NULIDADES 1.1 NOÇÕES GERAIS Iniciamos agora um dos temas mais delicados em processo penal. Não se trata de tema que tenha uma ampla construção teórica – não é isso! Aliás, constitui uma matéria que não é muito extensa. A complexidade se estabelece em relação às controvérsias (que são muitas), à confusão terminológica e à falta de sistematização e coerência científica, com muitas resoluções embasadas no casuísmo. O objeto de estudo das nulidades passa pela análise da forma dos atos processuais e, mais precisamente, pela consequência que o desrespeito a essa forma acarreta. Em última instância e diante de um determinado vício que se apresenta, o que se quer saber é se o ato praticado daquela maneira é válido ou não; se pode ser aproveitado ou não; se for invalidado, o que acontece com o processo ou com os demais atos do processo – dentre outras questões. Os atos processuais, evidentemente, são praticados de muitas formas; inúmeras são as possibilidades de incorrerem em vícios ou imperfeições. Seria impraticável querer estudar as nulidades somente a partir de casos concretos – inclusive porque a jurisprudência é vacilante e inconsistente. Assim, a melhor metodologia de aprendizado passa, antes de mais nada, pelo conhecimento dos sistemas, das regras gerais, dos princípios. 1.2 FORMAS E TIPICIDADE PROCESSUAL A missão constitucional do processo penal é por demais importante. Ele é instrumento de aplicação do direito penal material, que não pode olvidar os direitos e garantias individuais. Já imaginaram um processo penal cujos atos e procedimentos fossem totalmente discricionários? No qual a lei não prescrevesse formas, prazos, condições? No qual as partes pudessem agir com total liberdade no que diz respeitos à produção das provas e intervenções processuais? No qual os recursos não fossem nominados e disciplinados? Bom, não é preciso dizer mais para que percebamos a importância de toda a regulamentação que se estabelece em relação aos procedimentos e atos processuais; há uma necessidade lógica nisso. Essa disciplina muitas vezes é extensa e complexa, mas em boa medida necessária para que se tenha segurança jurídica e equivalência de oportunidades pelas partes, e se aplique o direito material com algum grau de cientificidade e respeito aos direitos e garantias individuais. “A tarefa de aplicar o direito às situações concretas não é realizada aleatoriamente pelos órgãos estatais; ao contrário, a atividade processual também é regulada pelo ordenamento jurídico, através de formas que devem ser obedecidas pelos que nela intervêm” (Grinover, et al., 2001). [...] o processo penal cumpre as suas missões constitucionais também por meio de procedimentos, nos quais os atos processuais praticados pelas partes e pelo juiz (e por terceiros Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 4 79 que houverem de participar da relação processual) desdobram-se sequencialmente rumo à decisão judicial final. Os ritos processuais ou procedimentais seguem um itinerário definido previamente, com o objetivo de organizar a participação dos sujeitos do processo na construção do provimento jurisdicional final, de modo a permitir uma contribuição efetiva e em igualdade de condições na tutela dos respectivos interesses. As formas processuais existem e atuam, portanto, na medida de sua finalidade específica (Pacelli, 2018). Formas processuais, portanto, são as prescrições legais que disciplinam os procedimentos e atos processuais. Haverá tipicidade processual quando determinado ato é realizado de acordo com o que prescreve a lei – é a subsunção do ato ao ‘tipo’ processual. “Nesse sentido, afirma-se que o processo exige uma atividade típica, composta de atos cujos traços essenciais são definidos pelo legislador. Assim, os participantes da relação processual devem pautar o seu comportamento segundo o modelo legal, sem o que essa atividade correria o risco de perder-se em providências inúteis ou desviadas do objetivo maior, que é a preparação de um provimento final justo”. “Por conclusão, o ato processual é espécie do ato jurídico e, portanto, deve obedecer a todas as formalidades exigidas em lei para sua realização, sob pena de haver a chamada atipicidade processual, ou seja, a desconformidade na prática do ato e à lei” (Rangel, 2018). Assim, uma boa noção da teoria dos atos jurídicos em geral, lá do Código Civil (arts. 104, 166, 185, 186, 187 etc.), nos auxilia na compreensão. Lembremos, ao menos de algumas passagens do Código Civil: Art. 104. A validade do negócio jurídico requer: I - agente capaz; II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável; III - forma prescrita ou não defesa em lei. Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando: [...] IV - não revestir a forma prescrita em lei; V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade; [...] Art. 185. Aos atos jurídicos lícitos, que não sejam negócios jurídicos, aplicam-se, no que couber, as disposições do Título anterior. Três são os requisitos: sujeito com capacidade, objetolícito e forma prescrita ou não defesa em lei. Portanto, se o ato processual for praticado por agente que não tem o atributo previsto em lei para praticá-lo, o ato será atípico e deverá sofrer uma sanção para que possa adequar-se à lei. Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 5 79 Exemplo: juiz incompetente proferindo julgamento em uma causa. Nesse caso, há afronta ao disposto no art. 5º, LIII, da CRFB. O ato está em desconformidade com o que diz a lei. A Lei diz, ainda (art. 41 do CPP), quais requisitos deve ter a denúncia, sendo um deles a exposição do fato criminoso, ou seja, a causa de pedir. Não havendo a causa de pedir, a denúncia é atípica, não encontrando perfeita harmonia com o que diz a lei. [...] Carnelutti, em sua preciosa obra, deixa consignado que: Quando o ato jurídico, em particular o ato processual, está provido de todos os seus requisitos, é dito que é perfeito. À perfeição do ato, na qual se expressa a presença de todos os seus requisitos, opõe-se sua imperfeição, a qual se resolve, reciprocamente, na ausência de algum de seus requisitos, isto é, na presença de algum vício. Da perfeição do ato deriva sua eficácia. Da imperfeição do ato pode derivar sua ineficácia. A perfeição é conceito estático; a eficácia é conceito dinâmico; a primeira refere-se ao ser do ato, a segunda a seu operar. O ato é eficaz ou ineficaz segundo produza ou não efeitos jurídicos (Instituições de Processo Civil. Editora Servanda, 1999, v. I, p. 582) (Rangel, 2018). Dissecando essa interessante passagem de CARNELUTTI, teríamos: o Ato processual provido dos seus requisitos = perfeito; o Ato processual sem algum dos seus requisitos = imperfeito; o Da perfeição (conceito estático, refere-se ao ‘ser’ do ato) = deriva eficácia (conceito dinâmico, refere- se a seu ‘operar’); o Da imperfeição = pode derivar invalidade/ineficácia; o O ato é eficaz ou ineficaz segundo produza ou não efeitos jurídicos. Normalmente, atos processuais viciados são considerados válidos até que tenham a ineficácia declarada por órgão jurisdicional. Pois bem. Não há dúvida de que o ordenamento jurídico, como um todo, estabelece formas/tipos processuais. Ok. Mas de nada adiantaria o Estado prescrever essas formas sem se preocupar com o efetivo cumprimento delas. Nessa condição – para outorgar caráter cogente às formas estabelecidas, como uma espécie de sanção, impondo coercibilidade aos tipos processuais –, é que surgem as nulidades. 1.3 NULIDADE – SIGNIFICADOS E CONCEITOS Afinal de contas, o que é nulidade❓ Qual o exato significado dessa palavra❓ A doutrina diverge. Para uns a nulidade é o vício, a falha, o defeito ou a imperfeição que atinge o ato processual; para outros é a sanção ou a consequência desse vício ou defeito. [...] nulidade não é o vício que inquina o ato, mas, sim, a sanção que se aplica ao ato viciado, em desconformidade com a lei. A nulidade é a consequência da prática do ato em desconformidade com a lei e não a desconformidade em si (Rangel, 2018). modelo legal observância da prescrição tipicidade processual Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 6 79 A nulidade é uma sanção que, no processo penal, atinge a instância ou o ato processual que não estejam de acordo com as condições de validade impostas pelo Direito objetivo. A nulidade é a sanctio juris porque o processo ou o ato processual, que não se ajustam às regras que lhe são impostas nos textos legais, devem ser considerados como contrários ao Direito (Marques, 1997). São os vícios que contaminam determinados atos processuais, praticados sem a observância da forma prevista em lei, podendo levar à sua inutilidade e consequente renovação (Nucci, 2018). Nulidade é um vício processual decorrente da inobservância de exigências legais capaz de invalidar o processo no todo ou em parte (Capez, 2018). A doutrina faz referência a esses dois significados distintos da locução nulidade: a) sanção processual de ineficácia: uma primeira corrente (majoritária) compreende a nulidade como espécie de sanção aplicada ao ato processual defeituoso, privando-o de seus efeitos regulares. Tendo em conta que a forma prescrita em lei não foi observada, aplica-se a sanção de nulidade a este ato viciado, daí por que se fala em "declaração da nulidade", no sentido de privar o ato de seus efeitos regulares. Exemplificando, se o interrogatório do acusado em juízo foi realizado sem a presença de defensor, caberá à defesa impugnar eventual decreto condenatório por meio de apelação, sem prejuízo da utilização do habeas corpus, objetivando o reconhecimento da nulidade absoluta do referido ato processual (Lima, 2018); A primeira posição (majoritária na doutrina) entende que caso haja desconformidade entre o ato processual praticado e o modelo legal, a sanção prevista pelo sistema é a sanção de nulidade (posição defendida por Ada Pellegrini Grinover, Antonio Magalhães Gomes Filho, Antonio Scarance Fernandes, Eugênio Pacelli, entre outros) (Dezem, 2018). b) defeito do ato processual: uma segunda corrente (minoritária) refere-se à nulidade como espécie de qualidade ou característica do ato processual ou do processo. A palavra nulidade seria utilizada, portanto, como expressão sinônima de defeito, vício, imperfeição, inobservância da forma legal. Logo, valendo-se do exemplo acima citado, na hipótese de o interrogatório judicial ser realizado sem a presença de advogado, este ato seria considerado nulo. Nesse caso, uma vez reconhecida a inobservância da forma prescrita em lei (CPP, art. 185, caput), ou seja, a nulidade do ato processual, a sanção a ser aplicada seria o reconhecimento de sua ineficácia (Lima, 2018). Segunda posição sustenta que a nulidade é o defeito ou a falta do ato processual previsto no processo, e a sanção para este defeito é a ineficácia. É a posição defendida por Denilson Feitoza e Paulo Sérgio Fernandes Leite (Dezem, 2018). Não é à toa essa discrepância de entendimento doutrinário. Na verdade, a indefinição parte da lei . O próprio Código de Processo Penal usa a locução ora com um, ora com outro significado. Vamos trazer apenas dois artigos para exemplificar, reparem: Art. 563. Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade [= defeito] não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa. Art. 566. Não será declarada a nulidade [= sanção] de ato processual que não houver influído na apuração da verdade substancial ou na decisão da causa. Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 7 79 No art. 563 a palavra nulidade está sendo usada com o significado de vício/defeito; no art. 566 a mesma locução é tida como a consequência/sanção de eventual imperfeição do ato processual. JULIO FABBRINI MIRABETE identifica essa dualidade de entendimentos e define. Para o mestre, que tem uma posição eclética, a nulidade tem um duplo significado ou dois aspectos: “um para indicar o motivo que torna o ato imperfeito, outro para exprimir a consequência que deriva da imperfeição. A nulidade, portanto, é, sob um aspecto, vício, sob outro, sanção, podendo ser definida como a inobservância de exigências legais ou uma falha ou imperfeição jurídica que invalida ou pode invalidar o ato processual ou todo o processo” (Mirabete, 2005). 1.4 SISTEMAS No Direito comparado e também diante da necessidade de se fixar critérios para apreciação das nulidades, podemos identificar, essencialmente, dois sistemas: Formalista, da legalidade/indeclinabilidadedas formas, certeza legal – como o próprio nome sugere, nesse sistema “há a predominância do meio sobre o fim. [...] toda vez que o ato não for praticado da forma determinada em lei, estará irremediavelmente viciado, não importando se alcançou ou não seu objetivo” (Avena, 2017). Nulos seriam os atos que assim considerasse a lei, independentemente de considerações outras “(forma dat esse rei: a forma dá existência à coisa), toda violação às prescrições legais acarreta a inviabilidade dos atos processuais” (Mirabete, 2005). Instrumental, teleológico ou da instrumentalidade das formas – “o ato processual é válido se atingiu seu objetivo, ainda que realizado sem a forma legal” (Mirabete, 2005). “O fim do ato deve prevalecer sobre a forma como ele é praticado. Destarte, se o ato, ainda que desobediente à forma legal, alcançar seu objetivo, poderá ser validado” (Avena, 2017). Questão que se coloca é a seguinte: qual o sistema adotado pelo processo penal brasileiro❓ O legislador é quem mais tem legitimidade para responder a essa indagação. Nesse sentido, vamos trazer alguns artigos do Código de Processo Penal: Art. 563. Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa. Art. 566. Não será declarada a nulidade de ato processual que não houver influído na apuração da verdade substancial ou na decisão da causa. NULIDADE defeito ou vício falha ou imperfeição NULIDADE consequência do vício resultado ou sanção S IS TE M A S formalista instrumentalidade das formas Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 8 79 O Código de Processo Civil vai no mesmo sentido: Art. 277. Quando a lei prescrever determinada forma, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade. Art. 283. O erro de forma do processo acarreta unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados, devendo ser praticados os que forem necessários a fim de se observarem as prescrições legais. Evidente, por essas disposições, que tanto no processo civil quanto no processo penal há propensão normativa para o sistema da instrumentalidade das formas✔. Ou seja: existem formas prescritas em lei que devem ser observas; a inobservância delas, todavia, devem ser encaradas pelo seu viés teleológico, de acordo com a instrumentalidade que é própria do processo. 1.5 VÍCIOS DOS ATOS PROCESSUAIS Eventual “desconformidade do ato com a forma prevista em lei implica, por primeiro, a sua irregularidade. O ato irregular, porém, não é nulo em si mesmo! A nulidade, como consequência do vício, constitui verdadeira sanção jurídica, a fim de retirar os efeitos do ato nulo ou de limitar-lhe a eficácia. A rigor, não se pode falar em ato nulo em processo. A nulidade não integra o ato. Ela deve ser imposta em razão do defeito, mas não como elemento intrínseco e automático do ato, e sim, repita-se, como sanção ao vício”. Depois de esclarecida a questão conceitual, vamos analisar as principais classificações utilizadas na doutrina com relação às nulidades (enquanto vícios e consequências que podem atingir o ato processual). Pontue-se, inicialmente, que atos perfeitos são os atos processuais que na sua realização concreta observaram integralmente as prescrições legais ou a forma estabelecida em lei (modelo legal); portanto, não carregam qualquer vício ou defeito. São “aqueles praticados em fiel observância ao modelo típico. Por isso, são válidos e eficazes, aptos a produzir os efeitos legais que lhe são próprios” (Lima, 2018). É o que se espera pelo menos da maioria dos atos processuais: que sejam praticados nos ditames da lei. 1.5.1 Inexistência Ocorre nas situações em que o ato processual é absolutamente contaminado por defeitos em seus elementos essenciais ou constitutivos. O vício é de tal gravidade que não vai se falar em nulidade, propriamente; o ato processual simplesmente é tido/considerado como inexistente. O ato inexistente é um não ato, vale dizer, algo que não existe. É claro que se pode pensar em um contrassenso: como se fala em inexistência se o ato foi praticado? Como falar em não ato se houve, sim, um ato praticado? Esta crítica leva muitos a rejeitar a categoria dos atos inexistentes (Dezem, 2018). Mas compreenda: essa inexistência não é de fato, mas sim de direito❗ De fato e empiricamente todo ato processual praticado existe. Juridicamente é que, nessas situações, é como se ele não existisse. A inexistência Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 9 79 é uma ficção jurídica. Independe de pronunciamento judicial, o ato é simplesmente desconsiderado, sem que haja uma invalidação formal. 1.5.2 Irregularidade No outro extremo dos vícios dos atos processuais temos a mera irregularidade, o menor dos defeitos que pode atingir um ato processual, situação que não lhe retira existência, validade e eficácia. Aqui estamos diante de um ato imperfeito cuja imperfeição não importa em nenhuma sanção. Situação em que existe um modelo legal e esse modelo, em alguma medida – normalmente em relação a elementos secundários –, não foi seguido, revelando incompatibilidade entre aquilo que prescrevia a lei e a forma que tomou o ato processual quando foi praticado. Vamos aos exemplos: É o que ocorre, a título de exemplo, com a citação por edital que indica o dispositivo da lei penal, embora não transcreva a denúncia ou queixa, ou não resuma os fatos em que se baseia, considerada pelos Tribunais Superiores como mera irregularidade, incapaz de autorizar o reconhecimento de nulidade (súmula nº 366 do STF). Outros exemplos de atos meramente irregulares podem ser lembrados: a) falta de outorga do recibo de entrega do preso ao condutor do flagrante, notadamente quando todas as garantias constitucionais lhe foram preservadas; b) deferimento de compromisso a pessoa impedida de prestá-lo; 160 c) ausência, no laudo do exame cadavérico, da qualificação dos peritos também caracteriza mera irregularidade, que não justifica a anulação do feito, por não haver prejuízo ao acusado (Lima, 2018). Denúncia sem rol de testemunhas; falta de pedido de citação ou de condenação na inicial acusatória; falta do recibo de entrega do preso ao condutor do flagrante; deferimento de compromisso à testemunha impedida de prestá-lo; ausência de qualificação dos peritos no laudo de exame cadavérico (Avena, 2017). Os exemplos podem ser os mais variados e neles normalmente se encontra alguma dessas condições: o defeito é superficial; a regra não observada diz respeito a questões secundárias, periféricas e sem reflexos para o processo e para os direitos e garantias individuais; a repetição do ato sem a irregularidade aparentemente não mudaria em nada o seu conteúdo; os princípios processuais não são atingidos, nem mesmo indiretamente. Dentro da famosa tríade , entre a inexistência e a mera irregularidade é que se situa o vício da nulidade, que passaremos a analisar. 1.5.3 Nulidade Segundo a doutrina majoritária, a nulidade se subdivide em relativa e absoluta. Tanto uma quanto outra, exigem pronunciamento judicial para serem reconhecidas. Podem produzir efeitos até que isso ocorra. Nulidade absoluta inexistência nulidade irregularidade Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 10 79 A concepção do que seja uma nulidade absoluta comporta divergências. A grosso modo, podemos destacar algumas características que normalmentenela estariam presentes: O vício do ato atinge o próprio interesse público. Ou seja: o defeito está relacionado ao interesse que o Estado tem na regularidade daquele específico ato para o devido processo legal; não é uma falha que atinge somente a pretensão das partes ou algum direito disponível, ao contrário. O modelo legal para aquela situação foi pensado em prol do interesse de todos e revela uma garantia indeclinável. A nulidade absoluta pode ser reconhecida a qualquer momento, em qualquer tempo e grau de jurisdição, não há preclusão. Dessa forma, a sentença condenatória (com a absolutória é diferente) não é acobertada pela coisa julgada – cabe revisão criminal e até habeas corpus para desconstituí-la. Nulidade relativa Na contramão da absoluta, a nulidade relativa teria as seguintes características: A forma violada visa à proteção de um interesse privado, particular ou disponível; ou seja: um interesse que não é do Estado, mas sim das partes. Está sujeita à preclusão ou prazo e devem ser arguidas em tempo oportuno (art. 572, I, CPP). No que se refere à possibilidade de reconhecimento de ofício, há divergência na doutrina. Parcela da doutrina entende não ser possível ao juiz reconhecer a nulidade relativa de ofício, parcela entende ser possível (Dezem, 2018). Pode convalescer (recuperar-se do vício sanável), diante de determinadas circunstâncias. Mudando um pouco de raciocínio, repare nos artigos 571 e 572 do Código de Processo Penal: Art. 572. As nulidades previstas no art. 564, III, d e e, segunda parte, g e h, e IV, considerar-se-ão sanadas: Na medida em que admite que sejam sanadas, seriam relativas, então, de acordo com a lei, as seguintes nulidades indicadas no art. 564. Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos: [...] III - por falta das fórmulas ou dos termos seguintes: d) a intervenção do Ministério Público em todos os termos da ação por ele intentada e nos da intentada pela parte ofendida, quando se tratar de crime de ação pública; e) a citação do réu para ver-se processar, o seu interrogatório, quando presente, e os prazos concedidos à acusação e à defesa; [?] g) a intimação do réu para a sessão de julgamento, pelo Tribunal do Júri, quando a lei não permitir o julgamento à revelia; Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 11 79 h) a intimação das testemunhas arroladas no libelo e na contrariedade, nos termos estabelecidos pela lei; IV - por omissão de formalidade que constitua elemento essencial do ato. O art. 572, portanto, é o “principal artigo capaz de indicar, embora não com muita técnica, quais seriam os casos de nulidades relativas existentes no sistema do CPP” (Gomes Filho, et al., 2018); na transcrição de lei acima eles ficaram em destaque (negrito), havendo alguma divergência quanto à alínea ‘e’: uns entendendo que a falta do interrogatório seria motivo de nulidade relativa e outros que seria a falta de prazos para as partes. A partir dessas quatro categorias mais conhecidas, para consolidar o aprendizado (ressalvadas pequenas divergências), trazemos quadro-resumo de NORBERTO AVENA: ATO IRREGULAR NULIDADE RELATIVA NULIDADE ABSOLUTA INEXISTÊNCIA Vício sem nenhuma gravidade, sendo incapaz, por si, de gerar prejuízo. Destarte, o refazimento do ato irregular poderá ser procedido pelo juiz segundo seu livre- arbítrio, vale dizer, com absoluta discricionariedade. Vício que, embora grave, decorre da violação de normas de interesse privado e sem nenhuma repercussão em nível constitucional. Seu reconhecimento depende de provocação do prejudicado, com demonstração do efetivo prejuízo. Quanto à terminologia a ser utilizada pelo juiz ao reconhecer a nulidade relativa, deve ser no sentido de decretar o vício. Tecnicamente, não se deve utilizar, portanto, o verbo declarar, que é próprio do reconhecimento das nulidades absolutas. Vício com muita gravidade, pois decorre da violação de normas de ordem pública, ou seja, normas que de forma direta ou indireta afetam garantias tuteladas pela CF. Também aqui, na atual concepção, é necessária a comprovação do prejuízo como condição para o reconhecimento da nulidade. Quanto à terminologia a ser utilizada pelo juiz ao reconhecer a nulidade absoluta, deve ser no sentido de declarar o vício. Tecnicamente, não se deve utilizar, portanto, o verbo decretar, que é próprio do reconhecimento das nulidades relativas. Vício gravíssimo, decorrente da violação de elementos constitutivos do ato jurídico processual. Tem-se um não ato, uma aparência de ato. O ato existe, é válido e eficaz. O ato existe, mas tem sua validade e eficácia condicionada a uma condição suspensiva, qual seja o saneamento (ou convalidação). Neste caso, a condição (o saneamento) suspenderá o óbice à validade e eficácia. O ato existe, porém, uma vez declarado o vício, jamais poderá ser válido ou eficaz. O ato não existe. Ora, não existindo, não pode ser válido nem eficaz. Não há o que sanar. O vício pode persistir, sem que isso importe em A nulidade relativa é sanável mediante a prática de certos atos. É insanável. O vício continuará a macular o ato, não sendo possível o saneamento. Não há falar em saneamento daquilo que não existe. Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 12 79 comprometimento da validade do ato. O vício decorre da violação de normas infraconstitucionais. O vício decorre da violação de normas infraconstitucionais. O vício decorre da violação direta ou indireta de normas constitucionais. O vício pode surgir tanto em razão da violação de normas constitucionais como infraconstitucionais. Não há, portanto, uma relação direta a respeito. A irregularidade afeta elementos meramente acidentais do ato jurídico. A nulidade relativa afeta elementos que, embora sejam importantes à validade e eficácia do ato, possuem conteúdo eminentemente processual. Não se trata, enfim, de normas assecuratórias de direito, nas quais se poderia reconhecer um conteúdo material. A nulidade absoluta afeta elementos importantes do ato. Não fica atingido, contudo, o plano da existência. Trata-se de vício que atinge elementos essenciais do ato jurídico, impedindo que subsista no plano da existência. Dispensa arguição ou declaração pelo juiz, dada a irrelevância da mácula. A nulidade relativa exige provocação dos interessados. A nulidade absoluta pode ser reconhecida ex officio ou mediante arguição das partes. O juiz, simplesmente, desconsidera o ato, não se exigindo, para tanto, provocação das partes. Sendo o vício irrelevante, não precisa ser declarado, pois não gera prejuízo. Necessita de declaração judicial. O juiz deverá reconhecer a nulidade. Exige pronunciamento judicial reconhecendo a nulidade absoluta. Dispensa uma declaração de inexistência. Basta que o ato seja desprezado. Trata-se de um não ato, uma aparência de ato. O vício, como se disse, é desconsiderado, não havendo falar, então, em tempo para sua arguição. Pretendendo a parte, apenas por cautela, argui-lo, isto deverá ocorrer antes da sentença ou do julgamento do recurso, conforme a fase processual em que tenha ocorrido. Possui tempo certo, previsto em lei, para sua arguição. Não arguida nos intervalos legais, a nulidade relativa preclui. Como regra, o lapso de arguição é o estipulado no art. 571 do CPP. Não obstante, há situações em que a lei estabelece momentos próprios,como é o caso do art. 108 do CPP, aplicável apenas à incompetência territorial. Não possui tempo certo para arguição, até porque, sendo vício insanável, jamais estará sujeita à preclusão. Não há falar em tempo certo, podendo o vício ser detectado em qualquer tempo. (Avena, 2017) Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 13 79 1.5.4 Anulabilidade VICENTE GRECO FILHO, representando posição minoritária na doutrina, traz a anulabilidade. Veja o regime de invalidades representado na obra do mestre: Natureza do defeito Denominação Regime de decretação Violação de norma tutelar de interesse público Nulidade absoluta Pode ser decretada de ofício se houver instrumento. Não convalesce. Não depende de prova do prejuízo. Não se aplicam as exclusões de falta de interesse ou de quem tenha dado causa. Violação de norma cogente de interesse da parte Nulidade relativa Pode ser decretada de ofício. A parte pode abrir mão da formalidade. Se a invalidade não for decretada no momento ordinário, depois só se decreta se houver prejuízo. Aplicam-se as exclusões de ausência de prejuízo, falta de interesse e de lealdade. Não convalesce por falta de alegação. Violação de norma dispositiva de interesse da parte Anulabilidade Somente se decreta a requerimento da parte e se houver prejuízo. Convalesce se não for alegada no momento oportuno. Aplicam-se as exclusões de ausência de prejuízo, de interesse e de lealdade (Filho, 2012). 1.6 PRINCÍPIOS INFORMADORES 1.6.1 Princípio da tipicidade das formas Os atos processuais, regra geral, devem observância às prescrições legais, ao modelo legal estabelecido para a sua realização. Nem toda imperfeição, como vimos, vai gerar nulidade. De qualquer modo, sabe-se que, regra geral, os procedimentos e os atos processuais não são aleatórios, eles têm uma forma tipificada que delimita todo o desenrolar do processo. É disso que estamos tratando. 1.6.2 Princípio do prejuízo – pas de nullité sans grief Trata-se do principal princípio norteador em relação às nulidades, de amplo espectro de aplicação. Também conhecido como princípio da transcendência. Provém da fórmula francesa: pas de nullité sans grief. Tem base normativa no art. 563 do Código de Processo Penal: Art. 563. Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa. Atualmente, prevalece o entendimento (diferente de outrora) de que esse princípio é aplicável tanto para as nulidades absolutas quanto para as relativas. Em ambos os casos a demonstração do prejuízo pela parte interessada é essencial para o reconhecimento. Exemplo: suponha que o réu não seja citado num determinado processo (este é o vício grave); não obstante, acaba sendo absolvido pelo motivo da inexistência material do fato (art. 386, I do CPP, que vincula a esfera Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 14 79 cível) – seria caso de nulidade absoluta (falta de citação) passível de não declaração porque não houve prejuízo algum. Outro exemplo: suponha que um réu seja julgado em sessão do júri em que compareceram apenas 12 jurados; eis um vício grave, na medida em que o art. 463 exige, pelo menos, 15 para instalar os trabalhos. Imperfeição que, segundo a lei (art. 564, III, ‘i’, CPP), é de nulidade absoluta. Todavia, esse mesmo réu acaba sendo absolvido a pedido de ambas as partes. A ausência de prejuízo autorizaria a não invalidação da sessão de julgamento. A jurisprudência acolhe de modo pacífico o princípio do prejuízo. Embora a questionada manifestação do Ministério Público tenha sido posterior à apresentação da defesa preliminar, o agravante não demonstrou qualquer ato ou fato sobre o qual a defesa não teve possibilidade de se manifestar. Sem a demonstração de efetivo prejuízo causado à parte, em atenção ao disposto no art. 563 do CPP, não se reconhece nulidade no processo penal (pas de nullité sans grief). [HC 144.018 AgR, rel. min. Alexandre de Moraes, 1ª T, j. 7-11-2017, DJE 261 de 17-11-2017.] 1. Não se nega que o Juízo da Vara Única da Comarca de Boqueirão/PB não andou na melhor trilha processual quando intimou o Parquet estadual para ratificar a denúncia apresentada em grau superior e não fez o mesmo em relação à defesa do acusado por força do par conditio, desprestigiando, assim, o postulado constitucional do contraditório e da ampla defesa (CF, art. 5º, inciso LV). 2. Todavia, além da arguição opportune tempore da suposta nulidade, seja ela relativa ou absoluta, a demonstração de prejuízo concreto é igualmente essencial para seu reconhecimento, de acordo com o princípio do pas de nullité sans grief, presente no art. 563 do Código de Processo Penal (v.g. AP 481 EI-ED/PA, Tribunal Pleno, de minha relatoria, DJe de 12/8/14), o que não ocorreu na espécie. [RHC 138.752, rel. min. Dias Toffoli, 2ª T, j. 4-4-2017, DJE 143 de 27-4-2017.] Aliás, é nesse sentido a súmula 523 do STF, que refere expressamente ao prejuízo: No processo penal, a falta da defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu. 1.6.3 Princípio da instrumentalidade das formas Para muitos não seria propriamente um princípio, mas sim um ‘sistema jurídico de validade do ato processual’. Falou em instrumentalidade das formas relacione com finalidade. O processo não é um fim em si mesmo, ele é instrumento da jurisdição; as formas (prescrições legais processuais), nesse contexto, também não podem ser consideradas um fim em si mesmas e devem ser avaliadas de acordo com a sua finalidade (com aquilo que pretendem tutelar). “O que deve ser preservado é o conteúdo, e não a forma do ato processual”. Pelo menos um artigo do Código de Processo Penal é representativo desse princípio: Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 15 79 Art. 572. As nulidades previstas no art. 564, III, d e e, segunda parte, g e h, e IV, considerar-se- ão sanadas: [...] II - se, praticado por outra forma, o ato tiver atingido o seu fim; Mas é no Código de Processo Civil que encontramos um artigo que se ‘encaixa como uma luva’: Art. 277. Quando a lei prescrever determinada forma, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade. BRASILEIRO vê um bom exemplo de aplicação do princípio no Código de Processo Penal, no que se refere à comunicação de atos processuais: Art. 570. A falta ou a nulidade da citação, da intimação ou notificação estará sanada, desde que o interessado compareça, antes de o ato consumar-se, embora declare que o faz para o único fim de argui-la. O juiz ordenará, todavia, a suspensão ou o adiamento do ato, quando reconhecer que a irregularidade poderá prejudicar direito da parte. Com razão! Afinal o comparecimento do interessado demonstra que ele tomou conhecimento do ato ou do processo, justamente a finalidade que se buscava com as diligências de comunicação processual. 1.6.4 Princípio do interesse Perceba, antes de falarmos do interesse, a estreita relação entre os princípios informadores das nulidades – é como se um completasse a ideia do outro! Tanto isso é verdade que existe, inclusive, alguma divergência no que diz respeito ao desdobramento desses princípios e suas bases normativas. Para alguns autores, por exemplo, o princípio do interesse seria mais abrangente; para outros, menos, porquanto desdobrado com os princípios da boa-fé e do prejuízo.Uma mesma ideia, portanto, para uns está consolidada no princípio do interesse, para outros, por exemplo, no da boa-fé. Até por isso (dada a divergência), o melhor raciocínio é aquele que considera que vivemos em um sistema de instrumentalidade das formas; sistema que é regido por princípios informadores que se inter-relacionam e se complementam reciprocamente. De qualquer modo, o princípio do interesse tem uma previsão normativa reconhecida no art. 565 do Código de Processo Penal: Art. 565. Nenhuma das partes poderá arguir nulidade a que haja dado causa, ou para que tenha concorrido, ou referente a formalidade cuja observância só à parte contrária interesse. Art. 566. Não será declarada a nulidade de ato processual que não houver influído na apuração da verdade substancial ou na decisão da causa. Veja, de acordo com algumas importantes passagens (item XVII) da Exposição de Motivos do CPP, o que prega o princípio do interesse : Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 16 79 XVII – [...] É igualmente firmado o princípio de que não pode arguir a nulidade quem [...] não tenha interesse na sua declaração. Não se compreende que [...], no silêncio da parte prejudicada, se permita à outra parte investir‑se no direito de pleitear a nulidade. Encontramos correspondência, também, no art. 282 do Código de Processo Civil: § 2º Quando puder decidir o mérito a favor da parte a quem aproveite a decretação da nulidade, o juiz não a pronunciará nem mandará repetir o ato ou suprir-lhe a falta. Aliás, exatamente aqui (com base nesse dispositivo do Código de Processo Civil, aplicável analogicamente), alguns autores vão consignar sobre a existência de um outro princípio: o da preferência de julgamento pelo mérito da causa em detrimento da declaração de nulidade. Insistimos: independente da nomenclatura ou autonomia, o mais importante é a elaboração intelectual, a compreensão da ideia. A ideia do princípio do interesse, portanto , relaciona-se com a legitimidade de a parte invocar a nulidade e de ter algum proveito com o seu reconhecimento. A parte só pode arguir nulidade se puder ter alguma vantagem com o seu reconhecimento e em relação a prescrições legais que lhe digam respeito. Verificamos, no princípio do interesse, o binômio legitimidade+proveito. O próprio nome nos dá a noção do que representa o princípio – interesse. Ou seja: a parte que alega deve ser aquela que foi atingida pelo vício no ato processual e, mais que isso, deve ter algum benefício com a decretação da nulidade. Não se pode especular com o prejuízo alheio. Teoricamente aplicável a ambas as partes, acusação e defesa, esse princípio seria mitigado (ou não aplicável) em relação ao Ministério Público, segundo a doutrina. Isso porque no processo penal o papel do parquet não é somente o de parte – vai mais longe e é mais abrangente, segundo os ditames da Constituição Federal: Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Esse princípio se aplica indistintamente para as nulidades absolutas e relativas❓ Segundo MADEIRA há divergência. “GUSTAVO BADARÓ afirma que este princípio não pode ser aplicado às nulidades absolutas, somente às nulidades relativas. Isto porque a nulidade absoluta é estipulada no interesse público e, como o juiz pode dela conhecer de ofício, afastaria a incidência do art. 565 do CPP. Também defende DENILSON FEITOZA esta posição” (Dezem, 2018). Segundo nos parece, prevalece o entendimento pela aplicação do princípio somente em relação às nulidades relativas✔. Esse princípio é aplicável apenas às nulidades relativas. Isso porque, em se tratando de nulidade absoluta, como há, em regra, violação de norma protetiva de interesse público com status constitucional (v.g., devido processo legal, ampla defesa, contraditório), qualquer parte pode fazer a arguição. [...] Portanto, considerando que o princípio do interesse não se aplica às nulidades absolutas, nem tampouco ao Ministério Público, conclui-se que, na verdade, referido Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 17 79 princípio tem aplicação restrita às nulidades relativas, impedindo que a defesa se insurja contra ato processual defeituoso cuja observância interesse apenas à acusação (Lima, 2018). 1.6.5 Princípio da lealdade (boa-fé) Boa parte da doutrina trabalha a ideia da lealdade/boa-fé como uma vertente do princípio do interesse. De qualquer modo, numa roupagem ou noutra, com ou sem autonomia, o importante é compreender a elaboração intelectual no sistema das nulidades. A concepção normativa está na primeira parte do art. 565 do CPP: Art. 565. Nenhuma das partes poderá arguir nulidade a que haja dado causa, ou para que tenha concorrido, ou referente a formalidade cuja observância só à parte contrária interesse. Tem correspondência com o art. 276 do Código de Processo Civil: Art. 276. Quando a lei prescrever determinada forma sob pena de nulidade, a decretação desta não pode ser requerida pela parte que lhe deu causa. As seguintes passagens da Exposição de Motivos elucidam: XVII – [...] É igualmente firmado o princípio de que não pode arguir a nulidade quem lhe tenha dado causa [...]. Não se compreende que alguém provoque a irregularidade e seja admitido em seguida, a especular com ela; [...] A ideia está dentro do princípio geral de que a ninguém é lícito se beneficiar da sua própria torpeza. [...] trata-se de norma claramente inspirada em postulados civilistas, oriundos da noção geral de que ninguém pode se beneficiar da própria torpeza (Recurso Ordinário em HC 119.882-RR, de 2015). Sempre que a parte contribuir para a prática inválida do ato processual, não haverá interesse em obter-se a declaração de nulidade. Dessa forma, a prática defeituosa ou precária de um recurso, não enseja a declaração de nulidade por lesão à ampla defesa (Gomes Filho, et al., 2018). Enfim, se o defeito na prática do ato se deve ao comportamento da própria parte que o alega (seja por dolo ou culpa), não há se declarar nulo o ato, pois significaria ‘premiar’ aquele que agiu contrário à lei. BRASILEIRO sustenta que “o princípio da lealdade também não se aplica às nulidades absolutas. Como o interesse tutelado pela norma violada é de natureza pública, qualquer parte pode arguir o vício, ainda que tenha concorrido para a sua produção” (Lima, 2018). 1.6.6 Princípio da convalidação Com a ideia central muito relacionada com a instrumentalidade das formas, alguns autores o estudam com o mesmo conteúdo do princípio da conservação dos atos processuais ou do confinamento da nulidade. Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 18 79 A base normativa indireta do princípio é encontrada no art. 572 do CPP: Art. 572. As nulidades previstas no art. 564, III, d e e, segunda parte, g e h, e IV, considerar-se- ão sanadas: I - se não forem arguidas, em tempo oportuno, de acordo com o disposto no artigo anterior; II - se, praticado por outra forma, o ato tiver atingido o seu fim; III - se a parte, ainda que tacitamente, tiver aceito os seus efeitos. Também conhecido como princípio do aproveitamento ou da proteção, ele prega que não se decrete a nulidade quando for possível suprir o defeito do ato processual (Lima, 2018). Na Exposição de Motivos doCPP, são elucidativas as seguintes passagens: XVII - Somente em casos excepcionais é declarada insanável a nulidade. Fora desses casos, ninguém pode invocar direito à irredutível subsistência da nulidade. Sempre que o juiz deparar com uma causa de nulidade, deve prover imediatamente à sua eliminação, renovando ou retificando o ato irregular, se possível; mas, ainda que o não faça, a nulidade considera‑se sanada: a) pelo silêncio das partes; b) pela efetiva consecução do escopo visado pelo ato não obstante sua irregularidade; c) pela aceitação, ainda que tácita, dos efeitos do ato irregular. Se a parte interessada não argui a irregularidade ou com esta implicitamente se conforma, aceitando‑lhe os efeitos, nada mais natural que se entenda haver renunciado ao direito de argui‑la. Convalidar significa restabelecer a validade; “tem o significado de remover o defeito, remediar a falha, sanear o vício, a fim de que um ato processual inicialmente imperfeito possa ser considerado válido, apto a produzir os efeitos legais inerentes ao ato perfeito” (Lima, 2018). De um modo geral, portanto, o princípio recomenda o aproveitamento do ato processual atípico, sempre que possível – através de vários mecanismos –, deixando a declaração de nulidade somente para casos excepcionais. Esse princípio – que está em harmonia com os axiomas da celeridade e economia processuais – é expressão maior das nulidades relativas, embora já se reconheça sua incidência nas nulidades absolutas. Outro ponto a atentar é o de que, embora seja a convalidação um atributo específico das nulidades relativas, alguns doutrinadores sustentam que pode atingir as nulidades absolutas em uma situação específica: na hipótese de trânsito em julgado, para a acusação, da sentença absolutória. Para os adeptos dessa corrente, levando em conta que revisão criminal é cabível apenas em face da sentença condenatória passada em julgado e considerando que a Súmula 160 do STF proíbe aos tribunais reconhecer contra o réu nulidades não arguidas no recurso da acusação, o trânsito em julgado da sentença absolutória importa em convalidar nulidades absolutas ocorridas no curso do processo, em razão da impossibilidade de seu reconhecimento posterior. Discordamos, porém, desse entendimento. Isso porque é característica das nulidades absolutas a insanabilidade, em face da natureza pública das normas violadas. Assim, o ato Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 19 79 absolutamente nulo jamais poderá ser convalidado. No tocante à impossibilidade de ser reconhecida a mácula após o trânsito em julgado da decisão absolutória, isto não ocorre em face de eventual saneamento da nulidade absoluta. Pelo contrário, esta continua existindo, apenas não sendo viável um pronunciamento judicial declaratório a respeito em face da ausência de instrumento jurídico capaz de permitir a desconstituição dessa ordem de decisão (Avena, 2017). 1.6.7 Princípio da causalidade/contaminação/consequencialidade/extensão: Alguns chamam também de efeito expansivo. A base normativa está no art. 573 do Código de Processo Penal: § 1º A nulidade de um ato, uma vez declarada, causará a dos atos que dele diretamente dependam ou sejam consequência. § 2º O juiz que pronunciar a nulidade declarará os atos a que ela se estende. Tem correspondência no Código de Processo Civil: Art. 281. Anulado o ato, consideram-se de nenhum efeito todos os subsequentes que dele dependam [...]. Partindo da premissa de que o processo se desenvolve num conjunto sequencial de atos encadeados para a solução do caso penal, o princípio reconhece a possibilidade de o defeito na prática de um determinado ato se estender (e contaminar) a outros atos subsequentes e que dele dependam ou resultem. Nesse sentido, inclusive, fala-se em nulidade originária e nulidade derivada (derivação das nulidades) e se estabelece uma espécie de ‘ineficácia contagiosa’. A nulidade derivada não vai ocorrer pelo simples fato de o ato ser subsequente; não, é necessário que haja uma espécie de ‘relação de causalidade’. O ato posterior tem de ser dependente ou sofrer influência do ato inválido anterior. O princípio se aplica tanto para as nulidades absolutas quanto para as relativas. Das premissas que utilizamos em matéria de nulidades, é preciso não confundir nulidade do ato com nulidade do processo. Se se estiver diante de ato absolutamente nulo, significa que, tecnicamente, não há como sanar aquele ato. Entretanto, não necessariamente haverá a nulidade do processo. Se não for possível praticar outro ato (em substituição, mesmo que posterior, ao ato anulado), não deverá ser decretada, automaticamente, a nulidade do processo a partir daquele ato com a eiva da nulidade. O dispositivo é bastante claro no sentido de que somente deverão ser anulados os atos que dele diretamente dependam ou sejam consequência. Todos os demais que não se enquadrem nessa relação de causalidade não deverão ser anulados (Pacelli, et al., 2018). ato processual ato viciado nulidade originária ato contaminado nulidade derivada Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 1 20 79 Uma denúncia inepta, por exemplo, normalmente redunda na nulidade de todos os atos subsequentes – é ela que delimita toda a atuação das partes, especialmente da defesa. Exemplo: denúncia sem a causa de pedir, atípica, ou seja, em desconformidade com o que diz o art. 41 da Lei Processual Penal. Se o processo encontra-se na fase das alegações finais e for reconhecida a nulidade, todos os atos subsequentes à denúncia serão eivados de nulidade, porque dela dependem. A isso chamamos de “contaminação, contagiosidade ou causalidade”. Em nossa vida forense de promotor de justiça, tivemos acesso a uma denúncia pelo crime de furto que apenas disse, depois de qualificar o réu: No dia 15 de janeiro do ano de 1993 o réu subtraiu para si coisa móvel alheia. Isto posto, requer o Ministério Público a citação do réu, sob pena de revelia e sua condenação no art. 155 do CP. Não tivemos dúvida, ao nos manifestarmos em alegações finais, momento em que tivemos acesso aos autos, de requerer a decretação de nulidade de todo o processo, por manifesta ilegalidade na formulação da denúncia. Pois, além de não descrever, minuciosamente, a conduta do réu, a denúncia não mencionou o local do crime, horário em que foi perpetrado e demais circunstâncias do delito, bem como qual a res furtiva subtraída. Nesse caso, a nulidade da peça exordial acarretou a nulidade de todos os demais atos processuais, inclusive, levando tal fato à prescrição do direito de punir. Portanto, por força do art. 573, § 1º, do CPP, há a nulidade originária (a do ato em si) e a nulidade derivada (dos atos que são subsequentes e que dependem do anterior) (Rangel, 2018). Mais exemplos da doutrina (eles são importantes nesse tema): Exemplificando, reconhecida a nulidade do processo a partir da citação, revela-se inviável o reaproveitamento da prova testemunhal colhida, visto que o acusado foi privado não só do seu direito de autodefesa, como também não teve a possibilidade de constituir defensor de sua confiança. Não por outro motivo, em caso concreto em que foi declarada a nulidade do processo a partir da citação editalícia, concluiu o STJ que tal mácula acarretaria a nulidade, por derivação, de todos os atos processuais subsequentes. [...] Caso não haja qualquer relação de causalidade entre o ato anulado e os demais atos processuais, a eficácia destes deve ser preservada (princípio da conservação dos atos processuais). Por isso, em caso concreto no qual foi anulada a sentençacondenatória em virtude da inversão da ordem de apresentação das alegações finais pelas partes, concluiu o STJ que tal vício não teria o condão de contaminar os atos instrutórios anteriormente praticados (Lima, 2018). “Outro exemplo de contaminação da nulidade ocorreria nas hipóteses de provas obtidas a partir de outras cuja ilicitude seja reconhecida, tal como se dá na aplicação da conhecida teoria dos frutos da árvore venenosa ou fruits of the poisonous tree , acolhida, expressamente, no art. 157, § 1º, CPP (Lei nº 11.690/08)”. Acerca da nulidade como consequência de nulidade anterior, poder-se-ia citar o exemplo de decisão de segundo grau concedendo habeas corpus impetrado contra o recebimento de denúncia por ausência de justa causa. Todos os atos processuais posteriores ao recebimento da Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO c 21 79 peça acusatória seriam reputados igualmente nulos, como consequência da rejeição da denúncia (Pacelli, 2018). Diante da dificuldade de se estabelecer a relação de dependência de um ato para outro, a doutrina traz uma espécie de regra geral (repleta de exceções): geralmente a nulidade de atos postulatórios se propaga, ao contrário dos atos instrutórios. [...] é preciso que se sistematizem as nulidades a partir do momento das fases do processo (postulatória, instrutória e decisória). Desta forma, temos: a) nulidades da fase postulatória – afetam todos os atos que dela decorram; b) nulidades da fase instrutória – em geral, não afetam os demais atos, apenas o ato que fora anulado e, evidentemente, a sentença, que é o momento em que o magistrado analisa o conjunto probatório produzido; c) nulidades da fase decisória – em geral afeta a sentença e os atos que lhe são subsequentes (Dezem, 2018). 1.6.8 Princípio da conservação Esse princípio não tem base normativa no CPP, mas encontra previsão no Código de Processo Civil: Art. 281. Anulado o ato, consideram-se de nenhum efeito todos os subsequentes que dele dependam, todavia, a nulidade de uma parte do ato não prejudicará as outras que dela sejam independentes. Como destaca VICENTE GRECO FILHO, referido por MADEIRA, o “princípio da conservação dos atos processuais é a interpretação, a contrario sensu, do princípio da causalidade: todos os atos não afetados pelo ato nulo são considerados válidos” (Dezem, 2018). É o ‘reverso da moeda’ em relação à contaminação; se não há relação de dependência, se os demais atos do processo são independentes devem ser conservados – como se a nulidade originária ficasse ‘confinada’ (daí alguns referirem a princípio do confinamento da nulidade). 1.6.9 Princípio da eficácia Retrata a ideia de que o ato processual defeituoso é eficaz, produz efeitos até que sua nulidade seja declarada – diferente do que ocorre no âmbito do Direito Civil. “No âmbito do direito civil, o ato nulo não produz efeitos, não havendo necessidade de declaração judicial para o reconhecimento da nulidade. Já no âmbito do Direito Processual Penal, enquanto não for declarada a nulidade, o ato processual continua a produzir efeitos. Vale dizer, o reconhecimento da nulidade depende da declaração do Poder Judiciário” (Dezem, 2018). ato viciado nulidade confinada sem relação de dependência um não é consequência do outro ato conservado Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 2 22 79 Isso significa dizer que, no âmbito processual, não existe a figura do ato jurídico nulo de pleno direito, que, desde o momento de sua prática, não gera efeitos. Na verdade, todos os atos viciados são meramente passíveis de anulação, já que sempre dependem de decisão judicial a reconhecer o vício, somente deixando de produzir efeitos após a prolação da decisão. Destarte, por força do princípio da eficácia dos atos processuais, os atos nulos continuam a produzir seus efeitos regulares enquanto não houver uma decisão judicial expressamente declarando a invalidação do ato, privando-o de sua eficácia para produzir efeitos no mundo jurídico. Exemplificando, se um acusado for processado, julgado e condenado sem a assistência de defensor, enquanto não for reconhecida expressamente a nulidade absoluta da sentença condenatória, esta continuará a produzir seus efeitos regulares, dentre eles o possível recolhimento do acusado à prisão (Lima, 2018). 1.6.10 Princípio da restrição processual à decretação da ineficácia A “invalidade dos atos processuais somente pode ser declarada se o sistema processual previr instrumento para decretá-la, e somente poderá ser decretada no momento em que a lei admitir. [...] O processo é um continente fechado, diferentemente dos atos da vida civil, de modo que somente no processo e no momento adequado é que se pode declarar a invalidade dos atos” (Filho, 2012). Quando se fala que apenas ‘no processo’ é que se irá declarar, não significa que será unicamente no processo em que ocorreu a nulidade, uma vez que o habeas corpus também pode ser utilizado para o reconhecimento da nulidade. Vale dizer, uma vez que o habeas corpus é um processo autônomo, também poderá haver aí a declaração da nulidade (Dezem, 2018). Esse princípio, portanto, trabalha com o binômio instrumento + oportunidade. GRECO FILHO diz que a “impossibilidade da decretação da invalidade não significa sanação. Sanar é curar o que estava mal. [...] Os defeitos dos atos podem não ficar sanados, ainda que a sua ocorrência não possa ser declarada” (Filho, 2012). Analisados os princípios informadores das nulidades e de maneira a facilitar a assimilação, trazemos uma tabela com os princípios e suas ideias centrais (simplificadas): PRINCÍPIO IDEIA CENTRAL SIMPLIFICADA Tipicidade Não dá pra fazer de qualquer jeito. Existem formas na lei. Prejuízo O vício lhe causou algum dano? Se não, segue a vida. Instrumentalidade Afinal, o que interessa: o conteúdo ou a forma? Olhe a finalidade. Interesse Legitimidade ➕ proveito. Você foi o prejudicado? O que você ganha? Lealdade/boa-fé Fez ou contribuiu? Ninguém pode se beneficiar da própria torpeza. Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 4 23 79 Convalidação Tem remédio? Se sim, vamos usar e curar. Causalidade Estarão contaminados❌ os atos dependentes ou consequentes. Conservação Estarão preservados✔ os atos sem dependência. Eficácia Ato processual defeituoso vale e tem efeitos até que juiz diga o contrário. Restrição Só se invalida ato processual diante de instrumento ➕ oportunidade. 1.7 HIPÓTESES DE NULIDADES ABSOLUTAS É possível fixar um rol ou se estabelecer algum critério rígido e inflexível que abarque todas as nulidades absolutas❓ Com a sistemática vigente NÃO, isso é impraticável. Aliás, como já dissemos, a definição das nulidades absolutas e relativas encontra muita divergência na doutrina e na jurisprudência e sempre são contextualizadas com os princípios informadores. Todavia, de acordo com a mesma sistemática, é possível trazer algumas situações que, ordinariamente (comportando exceções), dão ensejo à nulidade absoluta. Isso acontece através de um simples raciocínio: o art. 572 faz remissão expressa a algumas nulidades que, em determinadas situações, podem ser sanadas. Art. 572. As nulidades previstas no art. 564, III, d e e, segunda parte, g e h, e IV, considerar-se- ão sanadas: [...] Se podem ser sanadas (inclusive pelo decurso do tempo, como estabelece o inc. I do art. 572 do CPP), essas especificadasconstituiriam, então, nulidades relativas (como já dissemos em outra oportunidade). As demais hipóteses previstas no art. 564, residualmente, seriam de nulidades absolutas. “Portanto, por meio de interpretação a contrario sensu do referido dispositivo, conclui-se que as nulidades cominadas do art. 564 do CPP não ressalvadas pelo art. 572 do CPP têm natureza absoluta” (Lima, 2018). BRASILEIRO traz, ainda, outras duas situações em que haveria, de regra, nulidade absoluta: b) quando houver violação de normas constantes da Constituição Federal ou de Tratados Internacionais sobre Direitos Humanos (v.g., Pacto de São José da Costa Rica), ainda que essa nulidade não esteja expressamente prevista no art. 564 do CPP (nulidade não cominada). Mais que meros direitos subjetivos das partes, princípios e regras constitucionais e convencionais como o contraditório, a ampla defesa, o juiz natural, a publicidade, o duplo grau de jurisdição, etc., constituem características de um processo penal justo e legal, regularmente instaurado não apenas em benefício das partes, mas em prol de toda a coletividade, que tem evidente interesse no exercício da função jurisdicional consoante as regras do devido processo legal. Logo, não há espaço para meras irregularidades. Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO d 24 79 c) quando, a despeito da ausência de previsão legal expressa de nulidade (nulidades não cominadas), verificar-se que houve a violação de forma prescrita em lei que visa à proteção de interesse de natureza pública (Lima, 2018). Basicamente, então, em 3 situações provavelmente (mas com muitas exceções) teremos nulidades absolutas: 1.8 HIPÓTESES DE NULIDADES RELATIVAS Da mesma forma, é impossível fixar um rol taxativo ou estabelecer critérios inflexíveis para definir as nulidades relativas. De qualquer modo, normalmente traduzirão nulidades relativas aquelas hipóteses fixadas no art. 572 (já falamos sobre isso): Art. 572. As nulidades previstas no art. 564, III, d e e, segunda parte, g e h, e IV, considerar-se- ão sanadas: [...] b) quando, a despeito da ausência de previsão legal expressa de nulidade (nulidades não cominadas), verificar-se que houve a violação de forma prescrita em lei que visa à proteção de interesse preponderante das partes. É o que ocorre, por exemplo, com a ausência de intimação das partes acerca da expedição de carta precatória. Considerando que recai sobre as partes o ônus de provar a veracidade das afirmações por elas firmadas ao longo do processo, na hipótese de o juiz não intimar as partes acerca da expedição de carta precatória, subentende-se que houve violação à norma protetiva de interesse preponderante das partes, do que deriva a possibilidade de reconhecimento de nulidade relativa do ato processual. Acerca do assunto, eis o teor da súmula n° 155 do STF: "É relativa a nulidade do processo criminal por falta de intimação da expedição de precatória para inquirição de testemunha". Sem nenhuma pretensão de esgotar a questão, basicamente, em 2 situações provavelmente (mas com muitas exceções) teremos nulidades relativas: n u lid ad e s ab so lu ta s nulidades do art. 564 não ressalvadas no art. 572 violação de normas constitucionais ou de tratados de direitos humanos violação de formas que protegem interesse público n u lid ad es r el at iv as situações especificadas no art. 572 violação de formas que protegem interesse das partes Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 25 79 1.9 MOMENTO PARA ARGUIÇÃO DAS NULIDADES RELATIVAS As nulidades relativas estão sujeitas à preclusão (convalescem, de regra, se não forem alegadas ‘em tempo oportuno’); elas têm um prazo ou momento máximo, fixado em lei, para que sejam reclamadas. São dois os critérios usados pela lei para estabelecer os marcos: Com a recomendação de que as nulidades devem ser alegadas na primeira oportunidade em que a parte se manifestar nos autos, vamos analisar cada uma das situações, é importante. [...] É ônus da parte, na primeira oportunidade que lhe couber falar nos autos, impugnar a nulidade de ato processual, sob pena de preclusão temporal e convalidação do ato. [...] (HC 156616 AgR, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 17/09/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-200 DIVULG 20-09-2018 PUBLIC 21-09-2018) Lembre-se de que o art. 572 do CPP determina que as nulidades relativas considerar-se-ão sanadas [...] se não forem arguidas, em tempo oportuno, de acordo com o que estabelece, justamente, o art. 571. Na prática, portanto, a parte que deixa passar o prazo ou o momento para reclamar pela nulidade poderá suportar o ônus de sua desídia: convalidação do ato viciado. Não é bem assim. É preciso cuidar para não gerar situações de perplexidade a afirmação – simples e genérica – de que nulidades havidas e não alegadas oportunamente restarão preclusas. Como regra, é assim mesmo, não há a nulidade. Insistimos que é preciso sempre ver o caso concreto. Assim, não deverá ser declarada a nulidade do ato (ou então do processo) se: (a) não houver prejuízo efetivo para as partes; (b) o ato, malgrado nulo, tiver atingido a finalidade por outra forma; (c) não influenciar na apuração da verdade ou decisão da causa (Pacelli, et al., 2018). Pois bem. Art. 571. As nulidades deverão ser arguidas: I - as da instrução criminal dos processos da competência do júri, nos prazos a que se refere o art. 406; II - as da instrução criminal dos processos de competência do juiz singular e dos processos especiais, salvo os dos Capítulos V e VII do Título II do Livro II, nos prazos a que se refere o art. 500; III - as do processo sumário, no prazo a que se refere o art. 537, ou, se verificadas depois desse prazo, logo depois de aberta a audiência e apregoadas as partes; natureza do procedimento fase em que ocorra o vício Leonardo Ribas Tavares, Equipe Materiais Carreiras Jurídicas Aula 16 PC-RJ (Delegado) Direito Processual Penal - 2021 (Pós-Edital) www.estrategiaconcursos.com.br 11527722400681830 - EDUARDO ALVES DE CASTRO 26 79 Tanto o artigo 406 (referido no inc. I) quanto o art. 500 (mencionado no inc. II) foram revogados; quando vigentes, falavam das alegações finais. Instrução criminal traduz a fase de produção de provas em juízo, mediante contraditório. O processo sumário (indicado no inc. III) foi revogado. “O CPP ainda mantém o rito [não processo] sumário, muito diverso daquele que faz menção esse dispositivo. Dessa maneira, esse dispositivo se tornou imprestável” (Gomes Filho, et al., 2018). Diante disso, podemos concluir, então, que eventuais vícios que ocorram durante a fase de produção de provas (sumário da culpa no rito do júri – 1ª fase) deverão ser reclamados pela parte, no máximo, até os debates ou memoriais, sob pena de convalescimento. Isso no procedimento comum ordinário, sumário e sumaríssimo e, regra geral, também nos especiais e processos de competência originária dos tribunais. IV - as do processo regulado no Capítulo VII do Título II do Livro II, logo depois de aberta a audiência; A referência, aqui, era ao procedimento de aplicação de medida de segurança por fato não criminoso (artigos 549 a 555). Segundo entendimento pacificado, seja pela Constituição Federal, seja pela reforma da parte geral do Código Penal, isso não existe mais. V - as ocorridas posteriormente à pronúncia, logo depois de anunciado o julgamento e apregoadas as partes (art. 447); Apesar de fazer referência a um dispositivo revogado (art. 447), “pode-se
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