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LARISSA CUERVO E KATHANA LUVISON CADERNO DE DIREITO COMERCIAL I Prof. Gustavo Saad Diniz (gsd@usp.br) SUMÁRIO CRONOGRAMA 4 1. HISTÓRIA E FASES DO DIREITO COMERCIAL 4 2. CARACTERÍSTICAS DO DIREITO COMERCIAL 7 3. DIREITO COMERCIAL NO BRASIL 7 4. CONCEITO E FUNÇÃO DO DIREITO COMERCIAL 8 5. ORDEM ECONÔMICA E PRINCÍPIOS DO DIREITO COMERCIAL 8 6. FONTES DO DIREITO COMERCIAL 11 7. TEORIA JURÍDICA DA EMPRESA E DA ORGANIZAÇÃO 11 7.1. DIREITO COMERCIAL E ECONOMIA 11 7.2. EMPRESA: DO ATO À ATIVIDADE 12 7.3. TEORIA DOS PERFIS DE ASQUINI 13 7.4. JURIDICIZAÇÃO DO CONCEITO ECONÔMICO 14 8. EMPRESÁRIO 14 8.1. EMPRESÁRIO E REGISTRO 16 8.2. SISTEMA DE REGISTRO PÚBLICO DE EMPRESAS MERCANTIS (Lei 8.934) - RPEM 17 8.3. REQUISITOS ESPECÍFICOS PARA SER EMPRESÁRIO 18 8.4. CONSEQUÊNCIAS DE EXERCÍCIO IRREGULAR DA PROFISSÃO DE EMPRESÁRIO 20 8.5. OBRIGAÇÕES DO EMPRESÁRIO 20 9. ESTABELECIMENTO 21 10. NEGÓCIOS SOBRE O ESTABELECIMENTO 27 10.1. TRANSFERÊNCIA 27 10.2. RESPONSABILIDADE POR DÍVIDAS 28 10.3. CONCORRÊNCIA 29 10.4. AÇÃO RENOVATÓRIA DE LOCAÇÃO NÃO RESIDENCIAL 29 11. PESSOAS JURÍDICAS E FUNÇÃO DAS ORGANIZAÇÕES 31 11.1. AGRUPAMENTOS DE INTERESSE COMUM 31 11.2. PESSOAS JURÍDICAS 32 11.2.1. ASSOCIAÇÕES 32 11.2.2. SOCIEDADES 33 11.2.3. FUNDAÇÕES 33 1 11.2.4. EIRELI 34 12. TEORIA GERAL DO DIREITO SOCIETÁRIO E AS ORGANIZAÇÕES (DE GARANTIA, SOCIETÁRIA, PATRIMONIAL E DE ATIVIDADE) 37 12.1. CONCEITO DE SOCIEDADE (ART. 981, CC) 37 12.2. CONJUNTO DE REGRAS DE UMA SOCIEDADE 37 12.3. CLASSIFICAÇÃO 40 13. CONTRATO DE SOCIEDADE 41 13.1. NATUREZA JURÍDICA 41 13.2. ELEMENTOS DO CONTRATO 42 13.3. O CONTROVERTIDO AFFECTIO SOCIETATIS 43 13.4. STATUS SOCII (STATUS DE SÓCIO) 43 13.4.1. DIREITOS 44 13.4.2. PODERES 45 13.4.3. OBRIGAÇÕES 45 13.4.4. RESPONSABILIDADE 45 13.4.5. PECULIARIDADES 46 14. TEORIAS DA PERSONIFICAÇÃO 46 14.1. O QUE A PESSOA JURÍDICA É? 46 14.2. AQUISIÇÃO PELO REGISTRO 47 15. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA 47 15.1. MOVIMENTAÇÃO TEÓRICA 47 15.2. ART. 50 DO CC 49 15.3. INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO 49 16. SOCIEDADES NÃO PERSONIFICADAS 50 16.1. SOCIEDADE EM COMUM 50 16.1.1. FUNÇÃO 50 16.1.2. REGRAS ESPECÍFICAS 51 16.2. SOCIEDADES EM CONTA DE PARTICIPAÇÃO 52 16.2.1. REGRAS ESPECÍFICAS 53 16.2.2. RIR (Regulamento do Imposto de Renda - Decreto nº 9.580/2018) 55 16.2.3. UTILIZAÇÃO FRAUDULENTA 55 17. SOCIEDADES PERSONIFICADAS NÃO EMPRESÁRIAS 57 17.1. SOCIEDADE SIMPLES 57 17.1.1. REGRAS ESPECÍFICAS 57 17.1.2. ÓRGÃOS INTERNOS 60 17.1.2.1. ASSEMBLEIA OU REUNIÃO (quóruns) 60 17.1.2.2. ADMINISTRAÇÃO 61 17.1.3. RESPONSABILIDADE 62 17.1.3.1. DE SÓCIO 62 17.1.3.2. DE ADMINISTRADOR 63 2 17.1.4. RESOLUÇÃO DA SOCIEDADE QUANTO A UM SÓCIO 63 17.1.5. DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE 65 17.2. SOCIEDADE COOPERATIVA 66 17.2.1. SISTEMA DE DIREITO POSITIVO COOPERATIVO NO BRASIL 66 17.2.2. CONCEITO (ART. 981, CC) 68 17.2.3. CARACTERÍSTICAS 68 17.2.4. ORGANIZAÇÃO SOCIETÁRIA 71 17.2.4.1. TIPICIDADE 71 17.2.4.2. INTERESSE SOCIAL E PODER DE CONTROLE 72 17.2.4.3. STATUS DE SÓCIO 72 17.2.4.4. DISSOLUÇÃO E LIQUIDAÇÃO 73 17.2.5. ORGANIZAÇÃO DE PATRIMÔNIO 74 17.2.5.1. RESPONSABILIDADE 75 17.2.5.2. OPERACIONAL 77 17.2.6. ORGANIZAÇÃO DA ATIVIDADE 78 17.2.7. ORGANIZAÇÃO DAS GARANTIAS 78 17.2.8. AMICUS CURIAE 78 17.2.9. AÇÕES COLETIVAS 78 18. SOCIEDADES DE PESSOAS 79 18.1. SOCIEDADES LIMITADAS 79 18.1.1. CONCEITO 79 18.1.2. MARCO LEGAL 80 18.1.3. QUOTAS 80 18.1.4. VISÃO DA TEORIA GERAL 82 18.1.5. REGRAMENTO SUPLETIVO (art. 1053, CC) 82 18.1.6. CAPITAL 83 18.1.7. RESPONSABILIDADE DO SÓCIO 83 18.1.8. ÓRGÃOS 84 18.1.8.1. ADMINISTRADOR 84 18.1.8.2. CONSELHO FISCAL 85 18.1.8.3. ASSEMBLEIA GERAL OU REUNIÃO 85 18.1.9. RESOLUÇÃO DA SOCIEDADE QUANTO A UM SÓCIO 88 18.1.10. PAGAMENTO DE HAVERES 89 18.1.11. DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE 90 19. CONCENTRAÇÕES E DESCONCENTRAÇÕES 91 19.1. “TRANSFORMAÇÃO” (220 LSA e 1113 CC) 91 19.2. INCORPORAÇÃO (223 LSA e 1116 CC) 91 19.3. FUSÃO 91 19.4. CISÃO 92 19.5. GRUPOS NO DIREITO BRASILEIRO 92 19.5.1. GRUPOS ECONÔMICOS 92 19.5.2. CONCENTRAÇÕES POR RELAÇÕES CONTRATUAIS 92 3 19.5.3. GRUPOS DE SOCIEDADES 92 EXTRA: MEDIDA PROVISÓRIA (881/2019) DA LIBERDADE ECONÔMICA 92 REVISÃO PARA A PROVA 1 93 O CONTRATO PLURILATERAL, TÚLIO ASCARELLI 93 PROVA 96 REVISÃO COM CASOS 97 CRONOGRAMA 15/10: 5 PERGUNTAS DISCURSIVAS - 1 DO ASCARELLI, 1 TEÓRICA, 3 CASOS, MATÉRIA ATÉ SOCIEDADE SIMPLES. 22/10: trabalho DIFÍCIL (em grupo ou individual) que vale 8 + monitoria que vale 2. 19/11: teste com 10 questões. 1. HISTÓRIA E FASES DO DIREITO COMERCIAL O direito empresarial analisa a empresa da porta para dentro, enquanto o comercial analisa-a de forma ampla, isto é, a empresa e seus negócios. O direito comercial é um direito construído a partir de categorias históricas, pois é criado originalmente pela classe de mercadores (que depois tornaram-se comerciantes e, agora, empresários). Por ser um direito de classe, ele é formado com vistas a dar lucro à sua classe criadora, isto é, os próprios mercadores criam as categorias jurídicas para que sejam lucrativas para eles. O que acontece é o seguinte: à medida em que surgem necessidades ou ideias capazes de aumentar a lucratividade, categorias novas são criadas, as quais apenas posteriormente passam a ser reguladas pelo direito positivo - é um movimento pendular constante. A princípio, os mercadores atuavam sozinhos, depois passaram a atuar em conjunto (ex: contrato de franquia). Desde a pré-história o ser humano celebra trocas conforme suas necessidades (ex: escambo). O direito comercial não é só sobre dinheiro, é também sobre cultura (ex: Mercador de Veneza). 1. Fase subjetiva: de autorregulamentação e autojulgamento. Fase de conhecimento reiterado, de direito costumeiro, prático, em que o mercador era aquele reconhecido pelos seus pares (jus mercatorum). Fase do associativismo (guildas, hansas, Companhia das Índias), em que os mercadores se protegiam. Aqui já havia guildas, a partir das 4 quais muitas cidades estruturaram-se. A Companhia das Índias iniciou um tipo de sociedade para captar investimentos e expandir o comércio. Mercadores passaram a se organizar em associações de mercadores e, posteriormente, em sociedades de mercadores. Época das trocas em praças, do início dos títulos de créditos. As praças eram um local de publicidade (aqui, começou a bolsa de valores). O título de crédito surgiu da necessidade de garantir que a pessoa que transportava riquezas as levaria ao banco. Comércio e guerra andam sempre de mãos dadas - p. ex., a China entrou em guerra para defender as rotas comerciais da seda. Na idade média, como categoria sistematizada, o direito comercial se emancipa quando as pessoas migram para as cidades e passam a fazer contratos de forma mais sistemática, profissional. Os mercadores eram profissionais que efetivamente se organizavam (ex: em associações ou em sociedades de tecelões, sapateiros, padeiros) e que regulamentavam os instrumentos úteis a eles (ex: regulamentação das tabuletas nas portas que identificavam sua profissão), criando, por exemplo, regras para as trocas (ex: trigo e tecido em Veneza - aqui, surge o título de crédito). Nessa época, as pessoas faziam negócios entre si de forma padrão, independentemente das diferenças linguísticas. Essa fase de regulamentação mostra que essa classe adquiriu muito poder ao longo da história. Na fase seguinte, então, ocorreu o rompimento da autorregulação, para que esse poder fossedomado por um Estado déspota. 2. Fase objetiva (teoria do ato comercial): Código Civil (1804) e Código Comercial (1808) franceses inauguram a teoria do ato de comércio. O maior exemplo dessa fase é Napoleão Bonaparte, que, com o Código Comercial Francês (1808), definiu que o Estado passaria a dizer quem era comerciante: aquele que pratica o ato de comércio, isto é, os atos realizados por um profissional comercialmente, ou seja, voltados ao lucro. Nessa época, no Brasil, também houve a regulamentação do CCom. Essa fase não alcançou toda a sofisticação alcançada pela criação de novos instrumentos industriais, por isso, houve necessidade de outra fase. 5 3. Fase econômica, da Atividade: do ato à atividade. Teoria da firma (Ronald Coase) e Codice Civile (Itália). Houve rompimento da teoria do ato de comércio e juridicização da categoria do empresário. Período fascista, que buscava expansão. A teoria da firma (Ronald Coase) trata de duas maneiras de criação de preço na economia: (1) oferta e procura: pouca oferta + muita procura = preço maior (ex: ouro); muita oferta + pouca procura = preço menor. Essa já era conhecida. (2) organizações: esse modo foi estudado e percebido por Coase. Ele identificou ser possível apreender fatores de produção (capital, trabalho, propriedade e tecnologia) e organizá-los de maneira eficiente, de modo a obter lucratividade. É o surgimento do que passou a ser chamado de firma ou empresa. Quanto mais eficiente a estruturação desta cadeia econômica, maior a obtenção de resultado e lucratividade. Essa teoria surgiu no pós-guerra, com o fim de alocar capital de forma eficiente para produzir produtos de forma massificada com depreciação (redução do preço, do valor financeiro) programada. Para conseguir esses recursos é necessária a concentração econômica (ex: poucas empresas controlando a cadeia). Assim, tornou-se necessária uma nova regulamentação para o comércio, visto que uma nova figura tinha surgido. A fase do ato de comércio foi, portanto, rompida. No CC Italiano (1942, fascismo), então, foi criada a categoria jurídica dos “empresários”, a saber, aquele que desempenha uma atividade (e não ato) econômica, isto é, um conjunto de atos concatenados e finalisticamente organizados para a obtenção de lucro (art. 966, CC). Com essa definição, mais pessoas estão inseridas na categoria. 4. Fase do mercado: o empresário inserido na perspectiva do mercado em que negocia. Hoje, analisam-se os negócios entre si (ex: a franquia é permitida, ainda que não haja uma sociedade, já que só se vende sua marca). Aqui, o relacionamento entre as empresas passou a ser objeto de análise. O empresário e a sociedade empresária formaram estruturas hierárquicas por meio de coligação e controle em grupos ou por meio de arranjos de contratos 6 A mudança das fases tem a ver com o esforço do direito por regular aquilo que ele já não consegue atingir - movimento pendular: “o empresário engendra seu próprio direito”. 2. CARACTERÍSTICAS DO DIREITO COMERCIAL 1. Capacidade de adaptação e padronização: sociedade anônima, por exemplo, é a mesma independentemente do país. 2. Cosmopolitismo: funciona extra fronteiras, não é regido por costumes locais. São exemplos os títulos de crédito e as SAs (da mesma forma que se faz em Dubai, se faz no Brasil). ★ O cosmopolitismo é um pensamento filosófico que despreza as fronteiras geográficas impostas pela sociedade considerando que a humanidade segue as leis do Universo. 3. Uniformização. 4. Organização (dos fatores de produção) e garantias (mínimas dos interesses dos trabalhadores): a organização dos fatores sempre visa à redução dos custos de transação; cuidar das minorias (econômicas), reconhecendo-as como tal. 5. Preservação (1) do tráfico mercantil (inerência dos riscos) prezando-se pelo bom fluxo das negociações, para a supressão das incertezas. Os empresários correm os riscos para ganhar mais dinheiro; gostam de riscos, mas não de incertezas. Preservação (2) das organizações, que devem ser estáveis, bem estruturadas, preservadas pela legislação (ex: um país pode ter maiores incertezas, se for pouco estável). 3. DIREITO COMERCIAL NO BRASIL O Brasil Colônia não possuía de fato uma organização jurídica, pois seguia a metrópole. Mesmo após a independência, o Brasil ficou sob as ordenações. ★ Ordenações significam ordens, decisões ou normas jurídicas avulsas ou as coletâneas que dos mesmos preceitos se elaboraram, ao longo da história do direito português. 7 Inicialmente, as ordenações (Manuelinas, Filipinas, Afonsinas) previam a autorregulamentação de documentos não escritos, lei da boa razão (costumeira) e lex mercatoria. ★ A Lex mercatoria foi um sistema jurídico desenvolvido pelos comerciantes da Europa medieval e que se aplicou aos comerciantes e marinheiros de todos os países do mundo até o século XVII. Sistema de usos e costumes criado e adotado pelos atores do comércio internacional, dotado de força de lei entre as partes. A demora do rompimento com a escravidão prejudicou o Brasil economicamente, pois isso travou nossos recursos, enquanto outros países se industrializavam. Nessa época, Mauá expandiu a industrialização, inclusive, requerendo uma regulamentação comercial. O CC do Brasil foi inspirado no código francês (ato de comércio mitigado, com determinação taxativa de quem eram os comerciantes), assim, o comerciante era o que praticava o comércio e era inscrito no Registro do Comércio (art. 10, CCom/1850). Desde 2003, o Código Comercial Brasileiro de 1850 só está em vigor no que se refere ao Direito Comercial Marítimo, pois os demais assuntos foram revogados pelo CC/02. Em 2002, o CC unificou as obrigações e os direitos das empresas. Porém, apesar da unificação, o direito comercial continua tendo suas especificações, pois visa a compreender a atividade e não só o ato. 4. CONCEITO E FUNÇÃO DO DIREITO COMERCIAL Conjunto de princípios e regras (que lhes são próprios) de organização e garantias do tráfico mercantil e dos direitos e obrigações dos sujeitos que ocupam o mercado. Quando falamos de direito comercial, falamos de atividades profissionais e não de atos isolados. Nele, não há uma militância para proteger (equilibrar) alguma das partes, como acontece no direito do trabalho ou do consumidor. 5. ORDEM ECONÔMICA E PRINCÍPIOS DO DIREITO COMERCIAL Ao falarmos de direito comercial, estamos inserindo os sujeitos em uma ordem econômica. No momento em que o colocamos no ordenamento jurídico, percebemos que, apesar de ter uma lógica própria, ele se relaciona com a CF e outros códigos, como o CC. Temos um sistema fechado, de leis, regras etc., e um sistema aberto, composto por produções da ciência e da doutrina que influenciam o sistema de direito positivo. O sistema de direito positivo divide-se em 3 estratos: valores, princípios e regras. 8 Valores são variáveis de acordo com o tempo e o espaço. Princípios carregam uma carga normativa e são vetores interpretativos da legislação; representam valores, mas apenas orientam condutas, não as prescrevem. Os princípios não se revogam, mas prevalecem uns sobreos outros. Regras podem ser estruturantes, quando definem órgãos públicos, sistemas; e de condutas, quando determinam comportamentos. Nas regras de condutas, encontram-se 3 modais deônticos, que têm a ver com a semântica do comando legal: permitido, proibido e obrigatório. Elas produzem efeitos no caso concreto. O juiz é a pessoa que aplica a regra e produz normas. A figura do empresário, no Brasil, está inserida no ordenamento desde a CF, a qual delimita os princípios da ordem econômica. Inserir uma figura no ordenamento significa encontrar um conjunto normativo para regulá-la. 1. Princípios da Constituição Econômica (art. 170, CF): interpretá-la, atualmente, sob o viés da MP da liberdade econômica (881/2019). Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I - soberania nacional; A soberania nacional é um princípio importante e que precisa ser enunciado, porque existem países querendo conquistar espaços, existem guerras econômicas veladas (ex: comprar empresas em outro país). II - propriedade privada; III - função social da propriedade; Direito à propriedade também é um princípio constitucional, mas que também obriga o cumprimento da função social. Há uma função social da empresa? A empresa é um conceito econômico, mas pode haver uma função social da empresa no sentido de obrigar o empresário a não destruir o meio ambiente ao exercer a atividade empresarial, por exemplo. A empresa é uma organização, que se apropria dos meios de produção e que, por isso, possui grupos de interesse. A função social deve ser interna, porque a empresa tem a função de produzir lucros (resultados) e externa, quando deve respeitar os grupos de interesse que a atividade atinge. IV - livre concorrência; V - defesa do consumidor; 9 A livre concorrência deve ser respeitada, pois todos (e cada um de nós) podem empreender, já que nosso país baseia-se na livre iniciativa. Cabe ao Estado garantir a liberdade de empreender pela guarda da concorrência. Com isso, em segundo plano, o Estado protege o consumidor, pois nada é pior para ele que a existência de monopólios. Acontece que todo empresário tem vocação para garantir um monopólio. A livre concorrência tem a ver com a lealdade na concorrência, porque existe muita deslealdade nesse campo. O CADE é o órgão responsável por orientar, fiscalizar, prevenir e apurar abusos do poder econômico, garantindo a concorrência econômica. VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; Toda atividade que se insere na ordem econômica precisa respeitar o meio ambiente. VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego; IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. Lei Complementar 123, lei da micro e pequena empresa, que favorece sua atuação, garantindo que sua tributação seja a do sistema simples. A MEI também foi criada para garantir que esses pequenos empreendedores possam aposentar-se, além de regular sua tributação. Essas leis servem para inserir tais figuras econômicas no ordenamento. Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei. A CF econômica brasileira de 1988 foi originalmente carregada por forte presença estatal (com funções de fiscalização, incentivo e planejamento - art. 174, CF), com posterior alteração por reformas dos anos 90. A atuação direta do Estado em atividade econômica foi autorizada pelo art. 173 da CF quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo - empresas públicas e sociedades de economia mista se inserem em setores de interesse público (são estratégicas). O Estado deve estimular as cooperativas, pois são órgãos de solidariedade. O Estado brasileiro, atualmente, sobretudo nas áreas de interesse público, age mais como regulador por meio de Agências Reguladoras, como a Anatel, a Anvisa - e menos sob a forma de empresas. A liberdade de associação também é um princípio que impacta diretamente na ordem econômica. 10 2. Princípios do CC unificado: eticidade (boa-fé), sociabilidade (atendimento à função social), operabilidade (análise sistêmica do CC). 3. Quadripartição dos princípios do Direito Comercial: É possível destilar 4 princípios inerentes ao direito comercial, segundo a opinião de Gustavo Saad Diniz. 3.1. Autonomia privada: tudo o que a lei não proíbe é permitido. Assim, podem-se criar livremente conjuntos normativos que regulem sua atividade. É a atividade pendular, ou seja, o empresário cria ferramentas e o direito as positiva. 3.2. Confiança: ela demarca toda a interpretação da legislação, já que os instrumentos se mantém porque as pessoas colaboram, confiam umas nas outras. A confiança demarca os negócios e reduz custos de transação, porque dispensa a necessidade de serviços cartorários, por exemplo. “Os cartórios servem à desconfiança, são os templos da desconfiança”. 3.3. Risco de empresa ou de atividade: é inerente à atividade empresarial, inclusive, porque demarca a interpretação. É um princípio porque é algo próprio do empresário, que não pode socializar (dividir) seus riscos. 3.4. Preservação da empresa: o ordenamento se esforça para que a empresa permaneça, porque ela é uma organização que se relaciona com muitas e muitas pessoas (ela atinge quem está ao seu redor). A perda de uma unidade empresarial não é interessante para a sociedade. Art. 47, lei 11.101/05 (Lei de Falências). A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica. A empresa é um feixe de contratos (de trabalho, de tecnologia e informação, de circulação de riquezas, de locação, de fornecimento etc.). É uma cadeia econômica que tem como fim a produção de um produto ou serviço. Ao redor de toda essa organização há muitos interesses envolvidos e, por isso, há o princípio da preservação da empresa - protegê-la é proteger o interesse de muita gente. 6. FONTES DO DIREITO COMERCIAL Segundo Tércio Sampaio 11 1. Fontes estatais: leis, tratados, precedente vinculantes, regras administrativas. Existem tratados que definem o que são marcas de alto renome e protegem-nas. Há súmulas vinculantes em matéria de direito comercial. Há regras administrativas que regulam as agências reguladoras. 2. Fontes menos objetivas: usos e costumes (há costumes contra legem e que podem prevalecer sobre fontes estatais), jurisprudêncianão vinculante, decisões arbitrais, lex mercatoria. 3. Fontes subjetivas: contratos, doutrina, equidade. Têm menos carga normativa que as demais fontes. 7. TEORIA JURÍDICA DA EMPRESA E DA ORGANIZAÇÃO Esta aula é sobre o art. 966 do CC: quem é empresário, quem não é e quem pode se inscrever como tal. 7.1. DIREITO COMERCIAL E ECONOMIA A economia é útil ao estudo do direito comercial, pois usa-se conceitos econômicos. A ordem jurídica, a partir da CF, define os parâmetros do mercado (e não o inverso, pois o mercado não pode subjugar o direito), coibindo os efeitos autodestrutivos decorrentes do excesso de poder de mercado. O direito não só estuda a escassez, mas também modula os custos. As análises econômicas do direito (AEDs) auxiliam como modelo hermenêutico não exclusivo e para observar a função das instituições. A AED se apresentou como instrumento de explicação de estruturas hierárquicas (como a firma), a busca dos custos de transação como justificativos da tomada de decisões e, numa visão mais aguda, a supressão de falhas de mercado como pressuposto de eficiência sistêmica para o direito. 1. Ronald Coase (Teoria da Firma): análise dos custos de transação e custo benefício de regras. Diz que a empresa representa um feixe de obrigações para uma maior eficiência de organização e diminuição dos custos de transação. O direito deveria, então, garantir a eficiência alocativa dos recursos escassos para maximização de resultados. 2. Escola de Chicago (Richard Posner - escola Law and Economics): diz que o conceito de justiça é subjetivo e, por esse motivo, deve ocorrer a total substituição pela noção de eficiência. Para ele, o direito só serve para quando a economia falha (a economia prevalece sobre o direito), solucionando falhas de mercado (ex: monopólio, assimetrias informacionais). 12 3. Oliver Williamson (escola da Nova Economia Institucional - NEI): a governança organizacional deve lidar com as possibilidades futuras de rompimento de contratos. Então, as organizações passam a ser formas de coordenação e minimização dos custos de transação. 4. Economia comportamental: análise de qual o comportamento das pessoas diante de um padrão econômico (ex: se a pessoa está se comportando com ou sem boa-fé). 7.2. EMPRESA: DO ATO À ATIVIDADE A ciência econômica, a organização de fatores de produção e a descrição da formação de preços modificaram a percepção do que é empresa. A transição do ato para a atividade significa deixar de estudar atos isolados para compreender a atividade econômica, ou seja, um conjunto de atos organizados, concatenados com uma finalidade econômica, a saber, formação de riquezas e serviços (para a obtenção de lucro). A qualificação econômica se dá pela criação de riquezas e pelo resultado de serviços patrimonialmente avaliáveis. Tullio Ascarelli define atividade como a criação de riqueza e de serviços; enquanto Sylvio Marcondes, como a coordenação dos fatores de produção para uma utilidade específica. O termo organização tem fundamento econômico, pois se trata da “coordenação da influência recíproca entre atos”. Por meio de organização, conjuga-se o feixe de contratos que racionaliza os custos de transação da atividade. 7.3. TEORIA DOS PERFIS DE ASQUINI O termo “empresa” aparece na legislação brasileira, muitas vezes, de forma errada, imprecisa. Asquini adota o perfil corporativo, no qual a empresa deve servir para o engrandecimento do Estado. Isso porque ele era um grande entusiasta do fascismo. O Poliedro de Asquini acredita que existam 4 Perfis da Empresa, os quais servem para auxiliar na interpretação adequada. 1. Perfil Subjetivo: é a empresa enquanto sujeito (empresário ou sociedade empresária), é a pessoa que exerce a atividade. No perfil subjetivo a empresa se confunde com o próprio empresário, uma vez que somente ele, e não ela, possui personalidade jurídica. 13 ➢ A Lei de Registro Público de Empresa Mercantil usa de forma inadequada o termo “empresa”, já que ela se remete ao sujeito - isso porque, nessa época, ainda se falava em comércio. ➢ Ademais, a interpretação da palavra empresa de modo subjetivo (= sujeito) deve ser feita nos seguintes arts.: 966 e 5º, § único, V do CC (sujeito que se estabelece); 1º Lei 8.934/94; 2º e 10 da CLT (também fala em empresa, termo que só foi adotado pelo CC 60 anos depois); 222 da CF (por “empresa jornalística” entende-se o sujeito). 2. Perfil Objetivo: o aspecto objetivo ou patrimonial foca nas coisas (patrimônio) utilizadas pelo empresário individual ou sociedade empresária no exercício de sua atividade. Em suma, consiste no estudo da teoria do estabelecimento empresarial. ➢ Esse perfil deve ser identificado nos arts.: 1142, CC; 222, CF; 50 XIII e 140 LREF; 825, III, 835, X e 862, CPC. 3. Perfil Funcional: refere-se à dinâmica empresarial, isto é, à atividade própria do empresário ou da sociedade empresária, organizada para a produção de bens e serviços, para a obtenção de resultados. ➢ Esse perfil deve ser identificado nos arts.: 47 LREF; 45, §1º, LPI; 7º, XI, CF. 4. Perfil Corporativo: compreende a empresa como instituição, por formar núcleo social organizado e sob comando do empresário. Ideia de Rathenau, que, apesar de não ser fascista, entendia que a empresa devia servir à nação. Em geral deve-se entender que empresa é a atividade. Esquematicamente: o empresário e a sociedade empresária organizam os bens no estabelecimento e os colocam em função da atividade de produção ou de prestação de serviços. 7.4. JURIDICIZAÇÃO DO CONCEITO ECONÔMICO A partir do conceito econômico de empresa, pode-se concluir que as regras do direito comercial, em geral, e do direito empresarial, em especial, são de: 1. Organização: atuam na descrição da coordenação de atividades. 2. Garantia: atentam-se às pessoas atingidas em seus interesses, contendo abusos de poder. Numa organização é preciso compreender o relacionamento que se trava com o Poder 14 Público (autorizações de funcionamento, p. ex.), empregados, fornecedores, consumidores, sócios minoritários etc. 8. EMPRESÁRIO O empresário pode organizar sua atividade empresarial tanto (1) individualmente, como pessoa física, quanto (2) em sociedade, com duas ou mais pessoas fazendo um contrato de sociedade, bem como através de uma (3) EIRELI ou uma (4) sociedade limitada unipessoal. Ao organizar sua atividade empresarial, o empresário insere-se na ordem econômica constitucional, do CC e tudo o mais que se atualizar. No art. 966 do CC, encontram-se três núcleos importantes de caracterização da figura do empresário. O dispositivo trata de pessoas físicas, naturais SOMENTE (não de sócios e afins), que, ainda que possuam CNPJ para fins fiscais, não se tratam de PJs. Art. 966. Considera-se empresário quem (sujeito, pessoa natural) exerce profissionalmente atividade econômica (núcleo 1: atividade essencialmente onerosa e com objetivo de lucrar a partir dos riscos inerentes à coordenação e à direção dos fatores de produção organizados) organizada (núcleo 2: organiza-se fatores de produção - capital,trabalho, tecnologia -, colocando-os em função da atividade desempenhada profissionalmente) para a produção ou a circulação de bens ou de serviços (núcleo 3: ou seja, atividades de indústria e de comércio, respectivamente). Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual (conhecida como liberal), de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa. A justificativa: falta organização de fatores de produção e, sobretudo, objetiva a proteção de clientes e pacientes. Tais profissionais ficarão preponderantemente sujeitos aos regramentos específicos das respectivas congregações de classe, assegurando capacidades técnica e deontológica necessárias ao exercício profissional. Ainda que tais pessoas atuem em sociedade simples, qualificada como não empresária por essência, prepondera o exercício intelectual da atividade, servindo a sociedade somente como suporte para tal finalidade (STJ – REsp nº 958.116). Todavia, ocorre subsunção pelo conjunto de regras da empresa, se a profissão intelectual for absorvida como parte da organização e constituir elemento de empresa. Como exemplo de elemento de empresa, pode-se considerar a situação de um médico especialista que inicialmente atende em um consultório particular e conta somente com a ajuda de uma secretária, para prescrever medicamentos - usando seu intelecto. Até aqui, ainda que possua uma sociedade, ela será simples e, portanto, ele não será empresário. Após expandir suas atividades, vendo a necessidade, contrata mais médicos especialistas para trabalhar no local, bem como disponibiliza serviços referentes a atividade que exercem, oferece exames, estrutura hospitalar, atendimento personalizado, vende equipamentos e hospeda pacientes em sua própria clínica, passando a contar com toda uma equipe de administradores, secretários, serviço de 15 limpeza, setor de RH, advogados. Assim, passa a constituir uma empresa, em que o médico que deu início será um elemento da empresa, fará parte do todo - a sua atividade intelectual passará a ser um elemento de sua empresa. Outro exemplo de empresário é um corretor de imóveis que passa a administrar bens. Os advogados são exceção à essa subsunção da atividade do advogado a um elemento da empresa, pois, segundo o art. 17 do Estatuto da OAB (lei 8906/94), a atividade do advogado não pode se confundir com atividade empresarial. Isso vale, inclusive, para sociedades. Inscrição facultativa da atividade rural: Art. 971. O empresário (é considerado empresário, mas não está formalizado como tal; se ele quiser, pode fazê-lo), cuja atividade rural constitua sua principal profissão, pode (é facultativo), observadas as formalidades de que tratam o art. 968 e seus parágrafos, requerer inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, caso em que, depois de inscrito, ficará equiparado, para todos os efeitos, ao empresário sujeito a registro. Produtores rurais podem optar por se inscrever ou não, ainda que já sejam considerados empresários. Essa é uma opção legislativa histórica. O que a lei faculta é a inscrição no sistema de Registro Público de Empresas Mercantis, equiparando-o ao empresário comum para todos os fins. É uma opção do empresário rural, inclusive para efeito de pedido de recuperação de empresa e falência. A vantagem de não se cadastrar é tributária, pois a tributação de pessoa física é menor. Por que o empresário rural não se registra? Se ele se registrar, vai ter que manter livros organizados. Há muitos problemas quanto a facultatividade do registro: existem muitos rurais que são grandes empresários, mas sem registro. Não está na lei, mas o empresário individual é a pessoa física. Assim, não há distinção entre a PF e a PJ. A técnica da PJ permite a distinção (isolamento) dos centros de imputação. Isto é, com a separação de patrimônio, separam-se os bens que serão atingidos e os que não serão em caso de insolvência, por exemplo. Além disso, distinguem-se os bens que serão atingidos imediatamente dos que deverão ser buscados posteriormente, em caso de desconsideração da PJ. 8.1. EMPRESÁRIO E REGISTRO Para ser considerado empresário não é preciso registro, apesar de ser obrigatório (art. 967, CC). Isso porque a empresa é um fato econômico e a qualificação como empresário também é fática (requisitos do art. 966). No entanto, a obrigatoriedade não atinge a caracterização fática do 16 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm#art968 empresário, mas somente a regularidade do exercício da atividade. Então, quem não se registra é empresário que atua de maneira irregular, não podendo se valer do sistema de regras de organização e garantia que decorrem dessa inscrição, entre os quais o valor probatório dos livros (art. 226, 1.179 a 1.195 do CC e arts. 417 e 418 do CPC) e o pedido de recuperação da empresa (art. 1º da LREF). Art. 967. É obrigatória a inscrição do empresário no Registro Público de Empresas Mercantis (Lei nº 8934 94) da respectiva sede, antes do início de sua atividade. O registro afeta sujeitos, objetos e negócios. O empresário tem o dever de se registrar, para dar publicidade ao seu negócio. Para que ele atue regularmente, é necessário se registrar na junta comercial e, a partir daí, haverá presunção (iuris tantum, relativa) de legalidade e adequação formal, pela publicidade que se dá de atos constitutivos e declaratórios. Por meio do site da junta comercial, pode-se acessar todas as informações daquele empresário, inclusive as atas de reuniões de uma sociedade. É possível, ainda, recorrer quando não se concorda com algum ato da empresa. Quem pede o registro está sujeito aos subprincípios registrários, próprios dessa atividade: 1. Prioridade: preferência àquele que pede o registro primeiro (ex: nome empresarial). 2. Continuidade: há uma sequência de atos atinentes àquela atividade que deve ser cumprida para que outros possam ser realizados (ex: não se pode transformar uma sociedade limitada em anônima sem antes resolver a questão do antigo sócio falecido). 3. Presunção de fé pública: presume-se boa-fé daquilo que está registrado. 4. Disponibilidade de direitos: ninguém pode transferir direitos, além do que seja titular, proprietário ou possuidor (ex: ceder seu estabelecimento a outrem). 5. Oponibilidade: uma vez cumpridas as formalidades, o ato registrado pode ser oposto a terceiros (erga omnes), não podendo eles alegarem ignorância. 8.2. SISTEMA DE REGISTRO PÚBLICO DE EMPRESAS MERCANTIS (Lei 8.934) - RPEM Prevê a CF a competência privativa da União para legislar sobre registros públicos (art. 22, XXV, CF) e a competência concorrente da União e dos Estados para legislar sobre Juntas Comerciais (art. 24, III, CF). 17 http://www.institucional.jucesp.sp.gov.br/ http://www.institucional.jucesp.sp.gov.br/ http://www.institucional.jucesp.sp.gov.br/ Ministério da Economia (Secretaria Especial da Micro e Pequena Empresa): responsável pelo registro. ⇓ Departamento de Registro Empresarial eIntegração (DREI): órgão regulatório, com função supervisora, orientadora, coordenadora e normativa, no plano técnico, e supletiva, no plano administrativo. ⇓ Juntas comerciais: órgão executivo e administrador dos serviços de registro. 8.3. REQUISITOS ESPECÍFICOS PARA SER EMPRESÁRIO Art. 972. Podem exercer a atividade de empresário os que (1) estiverem em pleno gozo da capacidade civil e (2) não forem legalmente impedidos. 1. Capacidade (arts. 3º a 5º e 972 do CC) Art. 3º São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de 16 (dezesseis) anos. Art. 4º São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer: I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos; II - os ébrios habituais e os viciados em tóxico; III - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade; IV - os pródigos. Parágrafo único. A capacidade dos indígenas será regulada por legislação especial. Art. 5º A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil. Parágrafo único. Cessará, para os menores, a incapacidade: I - pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver dezesseis anos completos; II - pelo casamento; III - pelo exercício de emprego público efetivo; IV - pela colação de grau em curso de ensino superior; V - pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com dezesseis anos completos tenha economia própria. A continuidade da empresa na superveniência de incapacidade (art. 974, CC) depende de representação e aferição de riscos. Art. 974. Poderá o incapaz, por meio de representante ou devidamente assistido, continuar a empresa antes exercida por ele enquanto capaz, por seus pais ou pelo autor de herança. 18 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13146.htm#art127 A possibilidade de ser sócio é diferente, pois o incapaz pode se tornar sócio de uma PJ, desde que não assuma funções de administrador, esteja assistido e o capital esteja integralizado (art. 974, § 3º do CC). 2. Ausência de impedimentos para pessoas físicas (art. 973, CC) Art. 973. A pessoa legalmente impedida de exercer atividade própria de empresário, se a exercer, responderá pelas obrigações contraídas. Esses impedimentos não servem para proibi-los de ser sócios de alguma empresa; mas sim para proibir que administrem empresas e que sejam empresários diretamente. A atividade empresarial é incompatível com determinadas profissões, públicas ou privadas, que conflitem seu interesse com ela. 2.1 Funcionários públicos (art. 117, X, da Lei nº 8.112/90): incompatibilidade de carga horária e função. Gera conflito de interesses potenciais. Um juiz, por exemplo, pode defender seus interesses empresariais ao exercer sua função de juiz. 2.2 Empresários falidos (art. 243, II, da Lei nº 10.261/1968): são considerados maus empresários, pois a decretação da falência implica o reconhecimento do estado de insolvência (devedor). Durante certo tempo, o falido é retirado do mercado, sendo impedido de exercer atividade empresarial e de atuar na administração de sociedade empresárias. Da reabilitação para frente, o ex-falido pode ser empresário. 2.3 Militar da ativa (art. 29 da Lei nº 6.880/80; art. 204 do CP Militar - Estatuto dos Militares). 2.4 Leiloeiros (art. 36 do Decreto 21.981/1932): se um leiloeiro for empresário, pode alocar o resultado do leilão em seu benefício. 2.5 Juízes (art. 36, I, da Lei Complementar nº 35/79). 2.6 Membros do Ministério Público (art. 128, §5º da CF; art. 237, III, da Lei Complementar nº 75/93, para MPU; art. 44, III da Lei nº 8.625/93 - Lei Orgânica Nacional do MP, normas gerais para a organização do MPEs). 2.7 Os condenados a penas que vedem acesso a cargos públicos, crime falimentar, de prevaricação, peita ou suborno, concussão, peculato ou contra a economia popular, contra o sistema financeiro nacional, contra as normas de defesa da concorrência, contra as relações de consumos, a fé pública ou a propriedade, enquanto perdurarem os efeitos da condenação 19 (art. 1.011, §1º, CC): após a reabilitação penal (depois de passados os efeitos da condenação), o ex-condenado pode ser empresário ou administrador de empresa. 8.4. CONSEQUÊNCIAS DE EXERCÍCIO IRREGULAR DA PROFISSÃO DE EMPRESÁRIO A irregularidade do exercício é o mesmo que atuar sem registro. 1. Impossibilidade de autenticação de livros na Junta Comercial (art. 1.181, §único, CC): os livros registrados tem presunção iuris tantum (que admite prova em contrário) de veracidade. Por isso, quando atua irregularmente, perde-se a eficácia probatória (art. 226, CC). 2. Perda da prioridade de proteção do nome empresarial (art. 1.166, CC). 3. Perda da legitimidade ativa de pleitear a recuperação judicial da empresa (art. 48, da LREF). 4. Como credor, falta de legitimidade ativa para pedido de falência do devedor (art. 97, §1º, da LREF): é uma causa de crime falimentar, além de haver contravenção penal de exercício irregular de profissão. 5. Caracterização de crime falimentar (art. 178 da LREF) e contravenção de exercício irregular de profissão (art. 47 do Dec. Lei nº 3.688/41 - Lei das Contravenções Penais). 6. Vedação de participação em licitações (art. 28, II e III, da Lei nº 8.666/93). O judiciário não combina com a dinâmica da atividade empresarial, a velocidade é incompatível. Na maior parte das vezes, a presença de um juiz nos negócios é sinônimo de obstáculo. 8.5. OBRIGAÇÕES DO EMPRESÁRIO 1. Escrituração contábil (art. 1.779, CC): obrigação de manter sistema de contabilidade (mostrar a situação do patrimônio, dos lucros e prejuízos etc.), sob pena de crime falimentar. 2. Manutenção de livros obrigatórios: como Livro Diário (descrição das operações relativas ao exercício da empresa) e Livro Razão (enfatiza as contas que compõem o patrimônio) - ressalvadas ME e EPP (art. 68 da LC 123), para diminuir os custos de uma empresa de pequeno porte. A escrituração em livros dá fidedignidade à atividade empresária, permitindo acesso a interessados, como os sócios ou o fisco. 20 3. Manutenção de livros auxiliares: sociais (ex: atas de assembleias), fiscais (ex: inventário), administrativos (ex: registro de empregados), como o livro de ações, por exemplo. A eficácia probatória é dada pela existência de tais livros. Aquilo que o empresário escreve neles tem presunção (relativa) de veracidade (art. 206, CC), pois é revestido de fé pública. Então, quem duvida, deve produzir prova em contrário. Somente na hipótese do art. 373, do CPC, permite-se inversão do ônus da prova. 9. ESTABELECIMENTO Até aqui, continuamos vendo o empresário pessoa física, que tem CNPJ, mas não é PJ. Agora vamos ver estabelecimento empresarial, que é o conjunto de bens (A), materiais e imateriais (B) que o empresário ou a sociedade empresária organiza (C) e os coloca em função da atividade empresarial, para fins produtivos (D). É um patrimônio especializado,uma universalidade de fato e bens organizados. O estabelecimento não é apenas o local, pois este é chamado de ponto. Ele é mais que simplesmente o prédio e os móveis que estão dentro dele, porque engloba também, p. ex., a marca, a clientela e os contratos. No estabelecimento forma-se um centro ativo de negócios e de giro econômico do empresário, com vinculação de clientes, consumidores e demais interesses da organização. Art. 1.142, CC. Considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária. A. CONJUNTO DE BENS Conjunto organizado economicamente. A lei não diz que o conjunto é uma universalidade de fato, mas o fato de o empresário dar-lhe uma destinação unitária, caracteriza-o assim. Por isso, apesar do estabelecimento não ser uma pessoa jurídica, ele pode participar de relações jurídicas próprias - tanto que se pode penhorar a sede de uma empresa, mas não a empresa em si. A todo sujeito corresponde um patrimônio. O patrimônio precisa ser compreendido sob suas duas faces, a ativa (conjunto de bens) e a passiva (conjunto de dívidas). Se alguém tem mais ativos que passivos, ele é solvente. Se tem mais passivos que ativos, é insolvente e pode ser retirado do mercado através da falência (reconhecimento do estado fático de insolvência). 21 Cada pessoa tem um patrimônio geral e pode ter vários patrimônios especiais. É possível especializar parte do patrimônio geral de uma pessoa em uma atividade empresarial. O estabelecimento é um patrimônio especializado. Primeiramente, a responsabilidade é obtida do estabelecimento, isto é, do patrimônio especializado (como em uma penhora de bens). Só depois de analisá-lo é que o restante dos bens serão procurados. Os bens singulares (art. 89, CC) devem ser analisados de forma singular, isolada. O empresário pode ter seu carro e seu estabelecimento analisados separadamente, por exemplo. Art. 89. São singulares os bens que, embora reunidos, se consideram de per si, independentemente dos demais. Os bens coletivos devem ser analisados coletivamente. Há dois tipos de universalidades: 1. Universalidade de fato (art. 90, CC): são bens singulares, unificados por alguém, com destinação unitária - que é, no caso do estabelecimento empresarial, a atividade empresária. Art. 90. Constitui universalidade de fato a pluralidade de bens singulares que, pertinentes à mesma pessoa, tenham destinação unitária. Parágrafo único. Os bens que formam essa universalidade podem ser objeto de relações jurídicas próprias (negócios). 2. Universalidade de direito (art. 91, CC): p. ex., tem-se o espólio, que é extinguido após a partilha dos bens. Ou então, a massa falida, que é criada quando um empresário vai à falência, tendo por objetivo conduzir a atividade do falido até seu fim, arrecadando ativos e pagando passivos. Art. 91. Constitui universalidade de direito o complexo de relações jurídicas, de uma pessoa, dotadas de valor econômico. B. MATERIAIS E IMATERIAIS Não compõem o estabelecimento somente os ativos específicos como prédios, mobiliário, estoques e maquinário, mas também clientela, aviamento, propriedade industrial, direitos autorais, contratos, dentre outros. 1. Corpóreos: são materiais, tangíveis, como os imóveis, que costumam ter critérios de aferição de valor mais simples. 2. Incorpóreos: são imateriais, intangíveis e acabam tendo maior importância, a depender da atividade empresarial que se analisa. 22 2.1 Aviamento ou goodwill (objetivo e subjetivo): é o potencial, a capacidade de produção de rendimento, de lucro de um estabelecimento. O objetivo tem a ver com o locus, o local onde o estabelecimento foi montado - é o ponto. Montado num local apropriado, capaz de atrair o cliente, por possuir seu perfil (ex: um depósito com finalidade logística precisa ser bem localizado, independentemente da aparência). É fruto de um estudo estratégico e independe do titular do estabelecimento. Existem atividades para as quais o local não é importante. O subjetivo tem a ver com o sujeito do negócio, depende do seu domínio sobre a arte do comércio. Ele é tido por quem domina profundamente a arte de vender, e, por isso, sabe da necessidade do cliente. “Se você tem uma pastelaria colocada em um local errado, mas que faz um bom pastel, ela vai ter sucesso”. É um obstáculo à concorrência. 2.2 Clientela: ela é resultado do aviamento. É o conjunto de pessoas vinculadas pelo interesse na atividade empresarial e na confiança de que a legítima expectativa será concretizada, que buscam seus interesses no estabelecimento. Ela deve ser obtida de modo leal e lícito, pois o desvio de clientela está sujeito à responsabilidade civil, além de que, a concorrência desleal caracteriza um tipo penal, por configurar fraude (art. 195, III e 207 da LPI). Art. 195. Comete crime de concorrência desleal quem: III - emprega meio fraudulento, para desviar, em proveito próprio ou alheio, clientela de outrem; Há empresas que valem pela clientela que tem e não pela estrutura que montam. A Ambev fideliza os estabelecimentos, fornecendo geladeiras, fachadas etc. e com isso, monopoliza o comércio de cervejas. Uma transportadora vale pelo tanto de caminhões que ela tem. Já uma imobiliária não vale o tanto de computadores que ela tem, mas sim pela clientela que consegue angariar e pela capacidade de produção de rendimentos. Dessa forma, os bens incorpóreos possuem mais relevância que os corpóreos. 2.3 Sinais distintivos e criações industriais: há diversos sinais e o fundamento geral de proteção deriva do art. 5º, XXIX, da CF: “a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País”. 23 2.3.1. Nome empresarial (art. 1.155, CC) é o que leva registro na junta comercial. Ele é protegido, além de ser dado prioridade ao que pediu primeiro o registro. Por meio do nome empresarial, apresenta-se o titular da atividade perante o mercado, inclusive para que se inicie primeira averiguação dos riscos envolvidos na negociação com aquele empresário específico. 2.3.2 Título de estabelecimento (nome fantasia) e insígnia (ou tabuleta, placa do estabelecimento, que atrai as pessoas para o estabelecimento): isso também conta com proteção, pois outras pessoas não podem copiar. Ambos (título e insígnia) atendem a critérios de novidade e prioridade no uso e estão protegidos contra práticas de concorrência desleal (art. 195, V, da LPI). Ademais, a primeira utilização do título do estabelecimento pode representar obstáculo para que terceiro pleiteie a mesma marca (art. 124, V, da LPI). Art. 124. Não são registráveis como marca: V - reprodução ou imitação de elemento característico ou diferenciador de título de estabelecimento ou nome de empresa de terceiros, suscetível de causar confusão ou associaçãocom estes sinais distintivos; Art. 195. Comete crime de concorrência desleal quem: V - usa, indevidamente, nome comercial, título de estabelecimento ou insígnia alheios ou vende, expõe ou oferece à venda ou tem em estoque produto com essas referências; 2.3.3. Desenhos industriais: são um tipo de produção industrial, que geram uma distinção no produto. É comum nas indústrias de moda e de móveis o pedido de registro dos desenhos para proteger essa produção e evitar que terceiros “roubem” seus desenhos. As empresas produzem conhecimento e buscam meios para protegê-lo. 2.3.4. Patentes: são uma proteção a uma inovação no estado da técnica (art. 8º da LPI). ★ É um documento formal, expedido por uma repartição pública, por meio do qual se conferem e se reconhecem direitos de propriedade e uso exclusivo para uma invenção descrita amplamente. Trata-se de um privilégio concedido pelo Estado aos inventores (pessoas física ou jurídica) detentores do direito de invenção de produtos e processos de fabricação, ou aperfeiçoamento de algum já existente. Ela é sua apenas por 20 anos, depois torna-se de domínio público, porque não é justo que você detenha o conhecimento sobre aquele produto para sempre. 2.3.5. Marcas: é o sinal distintivo de produtos ou serviços, tornando-os singulares, distintos. Caracteriza seu produto ou serviço e permite sua exploração com exclusividade perpetuamente, desde que seguidas as determinações legais. Não se pode pegar carona na marca alheia, fazendo um logo muito parecido. Existe até um direito marcário. ★ A marca nunca é uma representação simbólica de uma entidade, mas sim de produtos ou serviços, relacionando-os com uma pessoa ou determinada entidade. A marca deve ser sempre registrada. Só assim, o 24 titular da marca poderá garantir a proteção da mesma. É importantíssimo efetuar uma vigilância constante à marca, com vista a garantir a inexistência de novas marcas iguais ou confundíveis com a existente. A proteção às marcas se dá por classes. Existem marcas protegidas por serem de alto renome, impedindo que elas sejam usada de modo brega e oportunista, como ao colocar o símbolo da Nike em um leite. 2.3.6. Expressão propaganda: são bordões ou slogans autorais e que, caindo no gosto e na memória da clientela, destaca e consolida o sinal distintivo. É algo que caracteriza muito o produto ou a marca, como “51, uma boa ideia”. Isso pode valorizar sobremaneira a marca. 2.3.7. Direitos autorais de obras literárias, científicas, artísticas (Lei nº 9.610/98): uma empresa vale muito pelos direitos autorais que ela tem. Por exemplo, a Disney tem direitos autorais sobre as histórias que ela concebeu e, por isso, ela recebe por cada produto que as utiliza em sua embalagem. É lícito transferir para pessoa jurídica o recebimento de direitos de imagem e arena de esportistas e artistas, embora a Receita Federal entenda que seria burla à tributação. Portanto, vê-se como válido o planejamento tributário, de transferência de gestão de direitos de imagem para pessoa jurídica empresária. 2.3.8. Proteção do ponto (ou do contrato de locação) (arts. 51, 52, 72 a 74 da lei do inquilinato): o local, o aviamento objetivo é protegido. É uma forma de proteger o empresário, obrigando que haja a renovação do contrato de locação após o vencimento. 2.3.9. Contratos de trabalho especializado (art. 448, CLT): a equipe que você monta (qualifica) gera valor na empresa. Esse também é o elo causador da sucessão do adquirente por débitos trabalhistas porque, conforme prevê o art. 448 da CLT, “a mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados”. 2.3.10. Contratos especiais (como leasing, concessão mercantil, distribuição, franquia): o Mc Donald’s vale o que vale porque é uma franquia. Nesses casos, o conjunto de contratos tem protagonismo da definição de preços da organização. O estado de compliance de um estabelecimento (o dever de estar em conformidade com atos, normas e leis, para seu efetivo cumprimento) também agrega valor à empresa. 25 2.3.11. Nome de domínio de internet (www.): muitas atividades estão migrando para o ambiente eletrônico. Por isso, o app da empresa ou seus programas podem gerar valor nela. 2.3.12. Trade dress: é o conjunto imagem-marca (vestimenta do produto; variedade de elementos visuais de diferenciação arquitetônica do estabelecimento, do produto, do prédio, do site, da pigmentação de cores, da composição das letras, das imagens utilizadas para o destaque da atividade etc.). Não é a marca nem o logo, é a aparência do produto ou da loja, a embalagem, que não podem confundir os clientes na hora da compra. O objetivo é coibir sua contrafação e a imitação, ainda que sutil. Sua proteção não está na legislação, trata-se de uma discussão jurisprudencial, pautada na vedação à concorrência desleal e na proteção aos direitos autorais (ex: Taco Bell x Taco Cabana - marcas que pegaram carona uma na outra, porque copiaram suas cores; Nestlè Grego x Danone Grego; solado Louboutin). C. ORGANIZADOS PELO EMPRESÁRIO Organização finalística dos bens e apropriação dos meios de produção. Os bens organizados valem como um todo, inclusive para fins de pagamento de dívidas. REsp nº 1.355.812, STJ: a filial é espécie (parte, extensão) de estabelecimento, para todos os fins, protetivos, de cobrança de dívidas etc. Súmula 451, STJ: é legítima a penhora da sede do estabelecimento. Porém, existe uma ordem de preferência na penhora de bens, que coloca os bens móveis em primeiro lugar e a sede em último. Art. 835, CPC. A penhora observará, preferencialmente, a seguinte ordem: I - dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira; II - títulos da dívida pública da União, dos Estados e do Distrito Federal com cotação em mercado; III - títulos e valores mobiliários com cotação em mercado; IV - veículos de via terrestre; V - bens imóveis; VI - bens móveis em geral; VII - semoventes; VIII - navios e aeronaves; IX - ações e quotas de sociedades simples e empresárias; X - percentual do faturamento de empresa devedora; XI - pedras e metais preciosos; XII - direitos aquisitivos derivados de promessa de compra e venda e de alienação fiduciária em garantia; XIII - outros direitos. § 1º É prioritária a penhora em dinheiro, podendo o juiz, nas demais hipóteses, alterar a ordem prevista no caput de acordo com as circunstâncias do caso concreto. 26 § 2º Para fins de substituição da penhora, equiparam-se a dinheiro a fiança bancária e o seguro garantia judicial, desde que em valor não inferior ao do débito constante da inicial, acrescido de trinta por cento. § 3º Na execução de crédito com garantia real, a penhora recairá sobre a coisa dada em garantia, e, se a coisa pertencer a terceiro garantidor, este também será intimado da penhora. Em princípio, as dívidas são vinculadas ao estabelecimento. Só posteriormente é que se pode chegar aos bens do empresário. Os processos executivos, com débito já reconhecido, servem para promover a cobrança; neles é possível penhorar um estabelecimento. 10. NEGÓCIOS SOBRE O ESTABELECIMENTOAinda estamos falando de pessoa física. Enquanto universalidade de fato, o estabelecimento pode ser objeto unitário de relações jurídicas próprias. 10.1. TRANSFERÊNCIA 1. Alienação (ou trespasse): passar o estabelecimento para frente, por meio de uma compra e venda. Antigamente, falava-se em “vender o ponto”. A alienação do estabelecimento precisa ser feita com cautela, pois afeta a terceiros que negociam com o empresário e o contrato pode ser ineficaz se prejudicar terceiros. Não se confunde com a cessão das quotas na Ltda ou a alienação do controle da S/A. 2. Usufruto: comum em casos de doação, como quando o pai doa para o filho o estabelecimento, mas o filho torna-se apenas nu-proprietário. 3. Arrendamento: locação. A transferência do estabelecimento provoca a sub-rogação do adquirente em contratos (art. 349 do CC), exceção feita àqueles de caráter pessoal e vinculativo somente do alienante, como no caso do mandato, franquia etc. Fatores de eficácia: 3 hipóteses de ineficácia do negócio jurídico. 1. Para terceiros: para que o efeito valha para terceiros (oponível erga omnes), deve-se dar publicidade à compra e venda, registrando-a na junta comercial. Art. 1.144. O contrato que tenha por objeto a alienação, o usufruto ou arrendamento do estabelecimento, só produzirá efeitos quanto a terceiros depois de averbado à margem da inscrição do empresário, ou da sociedade empresária, no Registro Público de Empresas Mercantis, e de publicado na imprensa oficial. 2. Para credores: os credores são as pessoas para as quais o alienante do ponto deve. 27 Se não restarem bens, a eficácia do negócio, para credores, fica suspensa até o pagamento de todos eles ou até eles expressarem seu consentimento. Os credores devem ser comunicados da venda, com antecedência de 30 dias, para que se manifestem. Art. 1.145, CC. Se ao alienante não restarem bens suficientes para solver o seu passivo, a eficácia da alienação do estabelecimento depende do pagamento de todos os credores, ou do consentimento destes, de modo expresso ou tácito, em trinta dias a partir de sua notificação. Se foram notificados e não se manifestaram, concordaram tacitamente. Caso contrário, os credores poderão considerar ineficaz o negócio e ainda fazer recair a satisfação dos créditos sobre os bens do estabelecimento alienado. 3. Na falência: quando não sobra mais nenhum bem ativo ao devedor e ele resolve alienar o ponto, a venda pode ser causa do pedido de falência (art. 94, c, LREF) e pode gerar ineficácia do negócio em relação à massa falida (art. 129, VI, LREF), quando os credores não são pagos nem consentem com ele. Art. 94. Será decretada a falência do devedor que: [...] III - pratica qualquer dos seguintes atos, exceto se fizer parte de plano de recuperação judicial: [...] c) transfere estabelecimento a terceiro, credor ou não, sem o consentimento de todos os credores e sem ficar com bens suficientes para solver seu passivo; [...] Art. 129. São ineficazes em relação à massa falida, tenha ou não o contratante conhecimento do estado de crise econômico-financeira do devedor, seja ou não intenção deste fraudar credores: [...] VI - a venda ou transferência de estabelecimento feita sem o consentimento expresso ou o pagamento de todos os credores, a esse tempo existentes, não tendo restado ao devedor bens suficientes para solver o seu passivo, salvo se, no prazo de 30 (trinta) dias, não houver oposição dos credores, após serem devidamente notificados, judicialmente ou pelo oficial do registro de títulos e documentos; 10.2. RESPONSABILIDADE POR DÍVIDAS 1. Geral: Art. 1.146. O adquirente do estabelecimento responde pelo pagamento dos débitos anteriores à transferência, desde que regularmente contabilizados, continuando o devedor primitivo solidariamente obrigado pelo prazo de um ano, a partir, (1) quanto aos créditos vencidos, da publicação, e, (2) quanto aos outros, da data do vencimento. Se você quer comprar um estabelecimento, você deve primeiro analisar suas dívidas, porque você não vai querer se responsabilizar por elas. Os débitos não contabilizados são só do devedor primitivo. Os demais são de responsabilidade solidária dele apenas por 1 ano. O legislador protege terceiros em geral e credores em especial, pelas técnicas da ineficácia e da solidariedade, além da sucessão pelos débitos. 2. Sucessão: 28 Trabalhista: art. 448, CLT. Art. 448. A mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados. Não importa, o sucessor sucede o devedor, inclusive quanto ao passivo trabalhista. Parágrafo único. A empresa sucedida responderá solidariamente com a sucessora quando ficar comprovada fraude na transferência. Tributária: art. 133, CTN. Art. 133. A pessoa natural ou jurídica de direito privado que adquirir de outra, por qualquer título, fundo de comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou profissional, e continuar a respectiva exploração, sob a mesma ou outra razão social ou sob firma ou nome individual, responde pelos tributos, relativos ao fundo ou estabelecimento adquirido, devidos até à data do ato: I - integralmente, se o alienante cessar a exploração do comércio, indústria ou atividade; II - subsidiariamente com o alienante, se este prosseguir na exploração ou iniciar dentro de seis meses a contar da data da alienação, nova atividade no mesmo ou em outro ramo de comércio, indústria ou profissão. § 1º O disposto no caput deste artigo não se aplica na hipótese de alienação judicial: Casos de isenção na sucessão tributária: I – em processo de falência; II – de filial ou unidade produtiva isolada, em processo de recuperação judicial. § 2º Não se aplica o disposto no § 1º deste artigo quando o adquirente for: Não estão isentos da sucessão tributária: I – sócio da sociedade falida ou em recuperação judicial, ou sociedade controlada pelo devedor falido ou em recuperação judicial; II – parente, em linha reta ou colateral até o 4º (quarto) grau, consangüíneo ou afim, do devedor falido ou em recuperação judicial ou de qualquer de seus sócios; ou III – identificado como agente do falido ou do devedor em recuperação judicial com o objetivo de fraudar a sucessão tributária. § 3º Em processo da falência, o produto da alienação judicial de empresa, filial ou unidade produtiva isolada permanecerá em conta de depósito à disposição do juízo de falência pelo prazo de 1 (um) ano, contado da data de alienação, somente podendo ser utilizado para o pagamento de créditos extraconcursais ou de créditos que preferem ao tributário. Quem comprar um estabelecimento, em caso de falência/recuperação, não sucede o falido. Caso Varig e Gol. 10.3. CONCORRÊNCIA Dependendo do caso, o aviamento subjetivo de um empresário tem potencial de desvalorizar ou mesmo tornar irrelevantes os ativos transferidos com o estabelecimento por conta do desvio de clientela. Art. 1.147. Não havendo autorização expressa, o alienante do estabelecimento não pode fazer concorrência ao adquirente, nos cinco anos subseqüentes à transferência. Veda o desenvolvimento de atividadeempresarial semelhante. A vedação aqui é à concorrência. Ela se dá para trespasse; não há vedação para a venda de controle societário. Então, ela deve estar expressa no contrato para que a vedação valha. Parágrafo único. No caso de arrendamento ou usufruto do estabelecimento, a proibição prevista neste artigo persistirá durante o prazo do contrato. A violação da proibição gera pretensão de reparação de danos correspondentes à redução do movimento de clientela no estabelecimento do adquirente, além de impactos no próprio aviamento. É possível cumular o pleito de obrigação de não concorrência, com fixação de multa pelo descumprimento do preceito cominatório. 29 10.4. AÇÃO RENOVATÓRIA DE LOCAÇÃO NÃO RESIDENCIAL É uma medida processual para proteção do ponto. Com a revogação da Lei de Luvas (Decreto 24.150/34), a do Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/91) passou a regulá-la. Ser dono, proprietário na atividade empresarial, às vezes, não significa muita coisa. Isso porque, ser dono pode significar ter um dinheiro “parado” - rico não compra casa e sim a aluga, pagando o aluguel com o rendimento do valor que utilizaria para comprá-la. Por isso, a locação é uma boa estratégia desse mercado. O contrato é um instrumento que pacifica uma relação antagônica, reduzindo os possíveis atritos e comportamentos oportunistas que podem surgir dela. Por meio dessa ação constitutiva, o locatário-empresário pleiteia ao juiz que, uma vez vencido o contrato de locação não residencial, ele seja renovado por igual prazo e por preços de mercado, ainda que sem a anuência do locador. Para tanto, é preciso que sejam preenchidos os 4 requisitos cumulativos. Art. 51. Nas locações de imóveis destinados ao comércio (não residenciais), o locatário terá direito a renovação do contrato, por igual prazo, desde que, cumulativamente: cumpridos os requisitos, há a obrigatoriedade na renovação do contrato de locação. I - o contrato a renovar tenha sido celebrado por escrito e com prazo determinado; II - o prazo mínimo do contrato a renovar ou a soma dos prazos ininterruptos dos contratos escritos seja de cinco anos; III - o locatário esteja explorando seu comércio, no mesmo ramo, pelo prazo mínimo e ininterrupto de três anos. Usar para a mesma atividade. § 1º O direito assegurado neste artigo poderá ser exercido pelos cessionários ou sucessores da locação; no caso de sublocação total do imóvel, o direito a renovação somente poderá ser exercido pelo sublocatário. § 2º Quando o contrato autorizar que o locatário utilize o imóvel para as atividades de sociedade de que faça parte e que a esta passe a pertencer o fundo de comércio, o direito a renovação poderá ser exercido pelo locatário ou pela sociedade. § 3º Dissolvida a sociedade comercial por morte de um dos sócios, o sócio sobrevivente fica sub-rogado no direito a renovação, desde que continue no mesmo ramo. § 4º O direito a renovação do contrato estende-se às locações celebradas por indústrias e sociedades civis com fim lucrativo, regularmente constituídas, desde que ocorrentes os pressupostos previstos neste artigo. § 5º Do direito a renovação decai aquele que não propuser a ação no interregno de um ano, no máximo, até seis meses, no mínimo, anteriores à data da finalização do prazo do contrato em vigor. De 1 ano a 6 meses antes de acabar o contrato. É um prazo decadencial (ex: se o contrato termina 31/12, a ação de renovação deve ser proposta entre 01/01 e 30/06). Art. 52. O locador não estará obrigado a renovar o contrato se: I - por determinação do Poder Público, tiver que realizar no imóvel obras que importarem na sua radical transformação; ou para fazer modificações de tal natureza que aumente o valor do negócio ou da propriedade; II - o imóvel vier a ser utilizado por ele próprio ou para transferência de fundo de comércio existente há mais de um ano, sendo detentor da maioria do capital o locador, seu cônjuge, ascendente ou descendente. § 1º Na hipótese do inciso II, o imóvel não poderá ser destinado ao uso do mesmo ramo do locatário, salvo se a locação também envolvia o fundo de comércio, com as instalações e pertences. § 2º Nas locações de espaço em shopping centers, o locador não poderá recusar a renovação do contrato com fundamento no inciso II deste artigo. 30 § 3º O locatário terá direito a indenização para ressarcimento dos prejuízos e dos lucros cessantes que tiver que arcar com mudança, perda do lugar e desvalorização do fundo de comércio, se a renovação não ocorrer em razão de proposta de terceiro, em melhores condições, ou se o locador, no prazo de três meses da entrega do imóvel, não der o destino alegado ou não iniciar as obras determinadas pelo Poder Público ou que declarou pretender realizar. Art. 72. A contestação do locador, além da defesa de direito que possa caber, ficará adstrita, quanto à matéria de fato, ao seguinte: I - não preencher o autor os requisitos estabelecidos nesta lei; II - não atender, a proposta do locatário, o valor locativo real do imóvel na época da renovação, excluída a valorização trazida por aquele ao ponto ou lugar; III - ter proposta de terceiro para a locação, em condições melhores; IV - não estar obrigado a renovar a locação (incisos I e II do art. 52). § 1º No caso do inciso II, o locador deverá apresentar, em contraproposta, as condições de locação que repute compatíveis com o valor locativo real e atual do imóvel. § 2º No caso do inciso III, o locador deverá juntar prova documental da proposta do terceiro, subscrita por este e por duas testemunhas, com clara indicação do ramo a ser explorado, que não poderá ser o mesmo do locatário. Nessa hipótese, o locatário poderá, em réplica, aceitar tais condições para obter a renovação pretendida. § 3º No caso do inciso I do art. 52, a contestação deverá trazer prova da determinação do Poder Público ou relatório pormenorizado das obras a serem realizadas e da estimativa de valorização que sofrerá o imóvel, assinado por engenheiro devidamente habilitado. § 4º Na contestação, o locador, ou sublocador, poderá pedir, ainda, a fixação de aluguel provisório, para vigorar a partir do primeiro mês do prazo do contrato a ser renovado, não excedente a oitenta por cento do pedido, desde que apresentados elementos hábeis para aferição do justo valor do aluguel. § 5º Se pedido pelo locador, ou sublocador, a sentença poderá estabelecer periodicidade de reajustamento do aluguel diversa daquela prevista no contrato renovando, bem como adotar outro indexador para reajustamento do aluguel. Art. 73. Renovada a locação, as diferenças dos aluguéis vencidos serão executadas nos próprios autos da ação e pagas de uma só vez. Art. 74. Não sendo renovada a locação, o juiz determinará a expedição de mandado de despejo, que conterá o prazo de 30 (trinta) dias para a desocupação voluntária, se houver pedido na contestação. 11. PESSOAS JURÍDICAS E FUNÇÃO DAS ORGANIZAÇÕES Até aqui analisamos o empresário que atua individualmente, como pessoa física. A partir de agora, falaremos sobre as pessoas jurídicas. 11.1. AGRUPAMENTOS DE INTERESSE COMUM Comunhão: concorrência de direitos iguais
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