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< m D < X m m < m 0 2 m Q < Q õ m m < m < m < N _ A Psicologia dn Scnridn da Vida (Jopyright 20130 Imr Aparccida dc Moracs Xausa Imprcsso no Bmsil 1J udição - dczcmbro dc 201 1 - CEDET 2^' cdiçjo - nmiu dc 2013 - CEDET ()› dircirm dcsm ediçio pcrtcnccm ao CEDET - Ccntro dc Dcsenvolvimenm Proñssional e Tecnológíco Rua Angclo Vlccmim 7U CEPz 13084-060 - Campinas - SP Tclcfunuz 19732490580 crnmih livr<›s@k*cdcr.com.hr A Psícología do Sentido da Vida Edilunu Adclicc Lclre dc Godoy d'Ávíla Reuisãm César Kyn d'ÁviIa Cdpa ÕV Diugramuçãm j. Ontivcro lmprzssãm Daikoku Editora e GráHca IZAR APARECIDA DE MORAES XAUSA (Ímzsc1/m lidiloriah Adclicc Gudoy (Iésar Kyn d'Ávila Dlogo (Íhiuso Silviu Grímaldo dc Camargo Rcscrvados todos os dircitos desta obm. Pmílwida mda e qualquer repmdução desta edição por qualquer meio ou fornm. sejn cla clctrônica ou mccânica, fotocópia, gravação ou qualquer outro mcio dc rcprodução, scm pcrmissão expressa do cdiror. 'v|'m Enmowu l› .›__- - SUMÁRIO INTRODUÇÃO. PARTE I- RELAÇÃO EXISTENCIAL DA VIDA DE VIKTOR FRANKL COM A LOGOTERAPIA 1 - A TRAJETÓRIA EXISTENCIAL DE FRANKL 1.1 - O DESPERTAR DA EXISTÊNCIA E o PANORAMA VIENENSE.,,. I.2. - O PANORAMA FAMILlAR E A PERSONALIDADE Dt FRANKL 1.3 - () PANORAMA CULTURAL L A FORMAÇÃO ma FRANKL ., . ¡.4 - O PANORAMA cmmínco ¡; A REALIZAÇÃO I'ROFISSIONAL. ._ z - A REFLEXÃO SOBRE A EXISTÊNCIA DESNUDA 2..1 - O CIDADÃO MARCADO PIÂLA ESTRkLA DE DAVI .................................... 2.Z _ O PRISIONEIRQ ll9.104 E 0 l'\.lCÓLO(F0-MÁRTIR............................. 2.3 - O IWICÓLOGO PRISIONEIRO E A BUSCA DO SENTIDO ...................... Z.4 - O PRISIONEIRO LlBERTO E 0 PSICÓLOGO DA REDILNÇÃO HUMANA . . . 3 - A PLENITUDE EXISTENCIAL E A SABEDORIA 3.1 - O CIENTISTA b AUTOR l)A I.0(¡0TER.›\PIA................................................. 3.2 - 0 SÁBIO E CIDADÃO DA 11UMANIDADE._.... .. _ PARTE lI - O HOMEAL A LOGOTERAPIA L o (,l)NTl:.\'T() HlS'IÓRIC()-CULTURAL 1 - CONTEXTO HLOSÓH(10~(JlliNTÍFKIO ANTERIOR A FRANKL 1.1 - CARACHERÍYIICAS DU PENSAMENTO FILosÓHc0-C1LNríHCO DO s-L"(.UL0 À\'Ix. I.z -A PstANÁmF L)F. FRLUD r A CONCLPÇÃU uo uumu N.~m'R,+ 2 -A BUSCA DO HOMEM NO (ÍONTEXTO l<'[L()S(')FICO- CIENTÍHCO E AS ORIGENS DA l.0(i()Tl~ÍRAPlA 2..1 - ALGUMAS <:Ak,\(7n«.m'snms no I'l-,NSAMEN'1'0 l<IL05Ól'-l(.'0 DO sícuw xx .. . .. . . z.z - lNTUís'Mo, MÉTODO FENOMENOLÓGICO h PSICOLOGIA .. 2..2.1 -A VALORIZAÇÃO DA INTUIÇÃQ . .. 2.z.2 - 0 MÉTODO 1-L'N0ML'~NoLóc1(:o E A INTUIÇAUL\"Sl-N(;1Al.._. _ ... 2.2.3 - 0 MÉTODO I'~LN()ML'~NOLÓGICO L A psrcowcm .. . . . 7..3 _A ONTOLOCIA DO SlzR HUMANO. v v . 31 33 35 55 57 2.4 - A PLSSOA L- A ANTROPOLOGIA FILOSÓHCA 2..5 - A VALORIZAÇÃO DA Ex1s.'rÊNc1A HUMANA NO EXISTENCIAUSMO......... 8 I z.5.¡ -TRAÇ()S GERAIS l)O I'L-NS.AMENTO ExnsTENcmusTAm . z.5.z. _ () L=msTEN<3lALIsMo [)F. HlilDIL-(¡GER_ .. _ 245.3 - O EXISTENCIALISMO DE JASPERb z.5.4 - 0 ¡-.x1srL«N(:1AL1s.Mo Dlz GABthL MARCELW 2..6 - () ENCONTRO COM 0 HOMLM NA ANÁLISE EXlSTENCIAL 3 - EXIGÊNCIA HISTÓRICA DE UMA NOVA TFORIA PSICOLÓGICA v 4 - A TRAJETÓRIA (Ill-1NTÍF¡CA l)li FRANKL RUMO AO HUMANISMO PSICOLÓGICO 4.1 - As hscoms DL PsxcoTummA L- 4.1.1 - FRANKL L= A PsuzANÁus«L'...... 4.1..1 - FRANKL E A PSICOLOGIA lNDlVIDUAL .. . v ., 4.1.;_ - FRANKL E A PSICOLOGIA 1)r-, ALLERS . . 4. x .4 - FRANKL L7 A DAs~LJNSANALYSL-_ 4.2. - Dhsvlos DO HUMANISMO NA CIÊNCIA PSl(70LÓGl(LA., 4.;_ - FRANKL 5 A DENÚNCIA no SUBUMANISMO I'S.l('.0Tl:RAPÊ-UTICO. PARTL lH _ A I.()G()'I'Iíl(APlA ¡-. 0 HuMu lllfMANlVX I - CONCEITOS GERAIS SOBRE 0 HOMEM _. .. 2 - A LOGOTFARAPIA Ê UMA PSICOONTOLOGIA DIMENSIONAL DO SER HUMAN() 3 - A L()GOTERAPIA É UMA PSICOLOGIA QUE BROTA DO ESPIRITUALz NOOS , 4 - A LO(-'()TERAP1A É UMA PSICOLOGIA PERSONALISTA QUE AFIRMA 0 PRIMADO DAPESSOA-HUI\1ANA 5 - A LOGOTERAPIA É UMA PSKIOLOGIA (IOI\1PR()Ml-1TIDA COM A (ÍOMUNIDADE HUMANA 6 - A L0(.()TERAPIA É UMA PSICOLOGIA CO.\4PRO\.1ETII)A COM .›\ VIDA E 0 DEVIR HUMAN() v v 6.¡ - O sLNTmo DA va r-. 0 (.'0MPROMISS() EXISThNClAL . v. .,..127 v.›.131 ..I37 ..I43 ....I47 ›.V...155 .. Iss 6.2. - 0 LOGOS, A VONTADE DE anrwo 5 A EXLSTÊNCIA ................................ I 59 6.3 - () \'l\l'|0 FXISTENCIAL E A "DOENÇA1)0 SÉCULO XX“.. .. I 65 7 -A LOGOTERAPIA É UMA PSICOLOGIA LlBERTADORA E [)() bER RESPONSÁVIÊL v...171 8 - A L()(i()Tl-1RAI'IA UMA PSICOLOGIA DO VAl.OR. DA D()R E DA ESPERANÇA XJ - O CAMINHO Dos VALORH 8.z - O SENI IDO uo SOFRIMFNTOW x.3 - O cAMINHo I)A HHRANÇA 9 - A LOGOTERAPIA E A Rl-Í-HU\AIANIZAÇÃO DA PSICOTERAPIA . PARTE IV - O mmo Rl I I(.I(›\lf›\ L' A LOGOIIRAPIA 1 -¡\ REPRESSÃO (ZULTURAI DÀ R1~.'ll(.'l()SlDADlí p _ ., 2 - A Rl-.'PRI-ZSSÃO P1~ÍSS()AL DA RELK.'IOSH)ADI§. 3- AMPLIAQÀO l)() (.'()N(Il,"lT() l)lt' IN,'(J()N5( Í1ENTE: () IN(Í()1\JS(IIENTE ESPIRITUAL 4 -AI.IN(§UAGEN1REI.ICIOSADOS SONHOS 5 - A TRANSCENDENTAIJDAI)li I)A (.'()NS(ÍII1À“N(ÍIA .. › 6 _ () SENTIDO ÚLTIMO l)A EXISTÊN(,'1A 7 - LOGOTERAPIA E REI IGIÃO PARTE V - (IoN.sID1-_RA(.0~L5 HNAls -L sLI(;rasr(›¡«s 1 - LlMITAÇÕES E PERKÊOS 1)E DESVIOS DA LOGUFLJRAPIA 1.1 _ LIMITAÇOH DA l.(›(;on-Rm›m I.). -P1:1u<;0s DL 1›1-'.sv1(›s DA l.0(.'0'l'l:R/\I'IA z - AVALIAÇÃO Ii C()N(Jl.US(')l-ZS ANEXOS 1 - ÚLTIMO AUXÍLI(). . . 2 _ l-'RANKL EXPLICA 0 QUE FREUD NÃO |:-x1›1_1(:ou 3-CAS()7 .. _ 4 -l-,'Xl:'r\1PI.() DE INTENÇÃO PARADOXAL 5 _ A FORÇA DE RIZaSISTÊNClA D() l-'SPÍR|T() \'[VIZN(JIAI)A POR UMA PACIENTE ACOAHZTIDA 1›1:- UMA PsuzomTIA BIBLIOGRAHA 1 - BlBLthRAHA (IITA1)A 2 - BIBLIOGRAFIA (.'()NSULT.›\DA 3- BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR I77 .I78 180 .182 ,.,185 °-37 l.37 .l39 °-4,5 149 251 ”~í..¡ l$.7 °~7$_ .285 “ECCE HOMO” - SÉCULO XX IZAR APARECIDA Guerrilheiro. Prisioneir0. Operárío Com bandeira de liberdade. Jazz. jeans. Luz e Som Jovem em busca de identidada Trabalh0. CapitaL Produção. Alienação para conscguir cstabilidadc Am(›r. Paixã(›. Scxo na czIma, no teatro e na mcntc pruduzindo impotência. Marxisma Psicanálisc. Pacifismo produzindo violência. Angústia. Solídã0. Carência Suicídio com a televisão, Fuga com espaç()nave, Defesa com ideol0gia, Ilusão Com adição, Apelo à agressãoz “Ecce Homo” - Seculo XX... não sabe pam onde ir se para os abismos do céu se para os abismos de si; não sabe a que aderir se à guerrilha ideológicag se à guerrilha psicológica; apátrída - ide(›logi1.'ado, órfão de pai - psiamalisad(›, órfão de Dcus - intelectualizado. Não sabe qual o sentido da H<›r, Não sabe qual 0 sentido do amor, Não sabe qual 0 scntido da d(›r, com traumatísmo de scr perdeu conta de seu ser.' “Ecce H0mo” - Século XX! WDÀEDÍICATÓRIAÍ Ao autor, mestre e amigo Dr. Vilztor Emil Frankl Dedico esta tcse c ao fazê-lo não posso dcixar dc di- zer que a minha tmjetória intelcctual foí acompanhada de uma trajctórlll ilfCtÍVkL Ao lcr a vcrsão cspanhola dc seu livro “Um Psiaílogo no Campo dc szrentmção " (1:'I /7()HI[)I'C' cn Imsca de sen- tid0), sofri um verdadciro impacto intclcctuaL Scnti, tam- bém, uma gmndc cmoção c uma imcnsa alcgria. A emo- ção quc acompanh0u, passo a passo, aquclc pcrson.1'g,16m vivo, cuio sofrimento e martírio cruentos marulram um dos maiorcs pecados da humanídadc A alcgria profunda ao sentir quc 0 psícólogo prisioneir(›, Clamando cm dores e salmodiando em lOLl\'()I'CS., provou a dignidadc humana e sobrcviveu na libcrdadc do cspírito e na cspcmnçm E toda a força do cspírito humano, inractm transccn~ dia àquela tcntativa dc destruição. E mda a sua conquista Cultural comprovava 0 Homcm tomL sintctizlando c cx~ pressando, na doutrina do log(›s, o mais dcnso dos huma- nismos quc vinha iluminar os caminhos obscuros dc uma psicologia epicurimn inlancntistm parcial c dogmáticm como a quc era fcita até cntã0. Desdc univcrsitárim dcpois como cducadora c psicotc- rapeuta, cu buscava uma síntcsc dc idéias c um clo dc íntc- gração entre os princípios tcóricos cicntíñuw e os valorcs culturais e espirítuais. Buscavm sobrctud(›, uma rcsposta que conñrmasse a procura da verdadc cicntíhbm scm ahal- far com rótulos conccptu.1'is (›sarroubos ñl<›sóñcns, p(›é- ticos e m1".sticos do cspírit0. Era o trilhar dc quem sempre buscou um scntido mais alt0. Ao encontrar a logotcrapia comprecdi então, quc- anco- rava na humanidade. Ao conhecê-lo através da vida, da obra e pessoalmente, compreendi o quanto os homens podcm-se unir. Era o sen- tído da minha vida que se confundia com o sentido da vida do auton E mais tarde... de milhares de outras pessoas. Por quê.> Porque o essencial pertcnce à humanidada Em meu nome e no de todos os que me acompanharam nesta trajetória, meu agradecimento. IzAR APARECIDA DE MORAES XAUSA INTRODUÇÃO Vivenciando nzl clínica como psicotcrapcuta e acompa- nhando na escola como cducadora (› problcma angustiante do Homo-século XX, scntimos a ncccssidadc dc aiudar os educandos e os pacientes a encontrar uma .s*olução. Da educação à fílosoña c desta à psicotcrapia, do questionamento ao serviç0, numa trajetória vocacionaL buscamos longa e arduamentc uma integração de idéias, valores e ações para vislumbrar uma proposra de solução. Tínhamos a intuição de que 0 divórcio entre os pos- tulados ñlosóñcos, os príncípios éticos e as interpretações psico|ógicas, de um lado, e a parcialidade c (› dogmatis- mo de algumas tcorías psicolo'gicas, dc outro, impediam a compreensão ampla e profunda do homcm c de sua problemática. A nossa formação humanísta e cspiritual fazia-nos sentir a imensa lacuna cxistente diante do desenvolvimento da Ciência psicológica no que tange à comprcensão humana mais completa. Em busca do preenchimento desta lacuna é que c~nc0n- tramos a logotcrapia de Víktor FrankL O presente trabalho é, dcssa Imncira, 0 símbolo do encontro dc uma rusposra procurada cum scriedade cien- tíñca para melhor realimr o scrviço a quc nos propomos. Descjamos, portanto, au aprcscntar a primcira obra de logoterapia do país, cxpor seus princípios básicos que tão bem sc coadunam Com os nossos objetivos educacionais humanísticos e da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Compreendendo o valor da Iog(›terapia, esta mesma Universidade acolhewa e lanç0u-a dc forma píoneira para o cenário cultural brasileiro c latin0- americano conferin- do ao seu autor - Viktor E. Frankl - 0 título de Dnctor Honorís Causa. Assim, com a presença do próprio mcs- tre, recebemos as principais lições de log()terapia. A Psmm UGIA Do Sl-.N'l mo l).›\ VIDA Prcsentcmente, usando o método de pcsquisa hist(›'rica e bíbliogníñcag pmcuramos desenvolver cstc rmbalho cujo núclco é a comprccnsão do Homo lamnanus pcla logotcrapm. Pmcuramos mostrar a origcm e o dcscnvolvimcnto da Iogotcmpía não só como surgiu historicamentg mas também dcntro do contcxto ñlosóñco e cicntíñco dcste século, como rcsposm a uma cxigência histórica dc maior Comprccnsão do homcm totaL A lngotcrapia rcprescnta, p(›rtanro, não só a antítesc às teorias c tcrapim rcducionistas do século pzlssado e a síntcsc dc uma viaão humanista cm dcscnvolvimento 110 sóculo XX, mas também e.\(pressa, com originalidade cientíñcm 0 nspccto fundanwntal do scntido na Vida dc cada homcm. Assim, a p.s'icoterapia do Iogos sc transfornw na mais apropriada para sanar as angústias originadas pclo taedium Uitac ou zuzzio cxisthcial causador de transtornns psicokígicos cspecíhâcos desta ép(›ca. A doutrina franklianm afirmando a uontadc dc scntido como motor básico da existência humana c defendendo a libcrdadc e a dignidadc cspiritual do homcm, tcve como prova Çrucnta a própria vida do scu autor no atperimcntum crucis dos campos dc concentmção n;1'/.i'.stas ondc clc cstcvc prisionciru l-.'stabelecendo, p()is, uma relação existcncíal entre a vida C a obra do aut(›r, trazemos sua rcHexão c vivéncias quc superam hípótcscs u pmvas csmtísticas na construção dc uma teoria psicológica viva c humaan A _t)sico/ogir.z das alturas, como o próprio Frankl a den()nn'nou, trata do homcm totaL brota da consídcração de espírito (no(›s). re.s'pcit.1*-lhc a dignidadc dc pessoa, tomwsc uma força libcrtadora dos condicionantes c dctcrminismos e aponta pam os valores mais alt05. C()nStÍtUÍ-SC tamhém numa dcmíncia a todas as formas de subumanismo do psicologismo c da ciência terapêutica. Enquanto psicoterapia, proporcioml através de sua análise eximcncml 0 cncontro com o homenL alcançando 14 l'/.Ak Al'ARt(.ll›A l)l.1\/Í()RAIS XAUxA a dignidadc do Homu Amans c do Homu Patiens, dando um scntido ao amor c ao sofrimcnto. Nas alturas da psicotempia do log()s, encontramos toda uma ínspiração com a dcscobcrta do inconscicntc espiritual e a prova dc transrendcntalidndc da consciêmzim Assim, a criação artísrica e a plcniñcação nn'st1'c;1, até então taxadas dc .s'ublimaçóes na teoria psicodinâmica, cncontram na logotcrapia o lugar que lhcs compctc. Considcrando a complcmentação do homcm no aspecto ético c rcligioso, a logotcrapia nos aponta para os valorcs como móvcis dc atração do comporramcnto humano e libcra a rcligiosidade dzl rcprcsxsño cientíñcm reconheccndo cm Dcus 0 sentido último da existência. C()nc|uím()s, dizcndo que tcntamos realizar nosso objetivo com cstc estud(›. Añrmamos que não só para a problcmática gcral do h0mcm, mas também nas situaçõcs particulares e nos problcmas lmrticularcs dc sua vida, a logoterapia oferece a mais ampla e complcta compreensão do ser humano. Sentimos tambérm ao abordar estcs aspcctos, que a logotcrapia p().s.s'ibilita a viabilização dc uma rc-humanização da psic()tcr.1'pi.1'. Espcram<›s, portanto, que esta psicologia da espemnça oportunizc no dia-a-día de nossa tarefa vocacional o nascimcnto de cada novo-bomem. 15 PARTE I RELAÇÃO EXISTENCIAL DA VlDA DE VIKTOR FRANKL COM A LOGOTERAPIA “A inacreditável temativa de desuma- nização do homem nos campos de concentração de Auschwitz e Dachau fizeram com que Frankl começasse a humanização da psiquiatria através da logoterapia”. GERHARD E KREYCHE A TRAJETÓRIA EXISTENCIAL DE FRANKL 1.1 - O desperiar da c.\'istênria e o pammmm viwzwzsc Aprcstntar uma tcoria scm o scu autor scría desconhecer a gcstação dcsta teoria e '.separá-la do humanu Especialmentg a logotcrapía não podc nem podcrá scr entcndida na sua alnplitudc, scm o conhccimento da vidn dc scu nutor Víktor Emíl ankL O posto dc cada homem no cosmos não sc faz dc mancira genéríca e absrratu, mas num mundo circundantc que o acolhc e o am'nha. E csta prcscnça quc sc az dcntro dc um aqui c agom possibilim uma troca nmnifcstada cm dar e reccben para cada pcssoa individual c abcrta para o Cosm(›s. Ao mcsmo tcmpo, à mcdida do scu dcscnvolvi- mento físicm psíquico e cspirituaL o homcm vai tomundo Consciência dc si e dc cstar num mundo c<›ncrct(›. Assim, no dia 26 dc março dc 1905 nasccu Viktor Emi1- para uma cxistência chcía dc .s*ignih'c;ulo - na cida- de histórica de Vicna. A paisagcm física da c¡'dadc, circun- dada pelo canal do Danúbio e pclas airvorcs do Pratcr quc inspiraram tantos artistas c músicos dc divcrms ép(›ca$. represcnta a inspiração circundantc na captaçãn csTética transmitidm postcri(›rmcntc, cm ritm(›. cor ou pnl;1vm. () mesmo uconteccu com arnístns do passado c com ns mú- sicos Gusrav Mahlcr c Arnold Sch(›cnbcrg, scus contcm- porâneos. Certanlentc, por isso, scntc-sc cm lünnkl um olhar bcnfazejo pela naturezm cxprcsso bclamcntc nas suas dcscrições c vivências tralmsmitidm arravés do calor da inspiração original c no manejo gracioso das pulavras. Delc diz, Com muita propricdadc o pr(›f. joão Batistzl Torelloz “Tip1"u¡mcnrc vicncnsuy cxpansivo c joviaL acolhc os docntcs com grandc cordia|1'dadc, quc nnda tcm dc prohís~ si(›nal; gosm dc convcrsnn qucr n;1 un1'vcrs.idadc. qucr na A PSlCOLOGlA DO SENTIDO DA VIDA família, à mcsa; polcmistu ñno, sabe mancjar o humor, a fantasia e o graceio. Os seus cursos e confcrências fascinam e enlcvam porquc são expressão de uma convicçào inrcrior de cxperiênciaa vividas, de sofrimcntos sup()rtados, dc um idealismo rel1l'tente, mas jamais desencnrnad0. A sua convcrsação inesgotách salpicada dc historictag de tiradas espir1'tuosas, dc guinadas imprevisív<:i5, dc voos cspcculativos e de mergulhos incessantesna mais trivial expcriência cotidiana - não tcm nada dc cspetáculo que se contemplc de fora: é Llnres uma contradança exrraordinária quc incita a participaçãa 05 “sisudos profcssorc§ inqu1'etmn~sc, os ingênuos dcfensores das ciências exams evimn1-no, os scus próprios compatrioms preferem por vczes ignorá-lo... Sc 0 qucrem ouvir - sempre acompanhado da cspnsa cncantadorm com qucm casou cm scgundas núpcias - podem fazê-Io hojc em Harvnrd, amanhã em Osl(›, dcpois cm Lcipzig, Londres, Pamplona, no Ccilão. cm nga ou em Sydncy. Por toda a parte dcsperta ou 0 cntusiasmo ou despcim, mas nunca ¡'ndifcrença“ (Torel|o apud FrankL l973.-Vl). Sem perder a qualidade científica, expressa suas idéias num estilo literário quc penctra a alma, não como um teorema apenas racionalmentc clemonstrado, mas com os acordes do coração e do espírit(). E estes acordes se fazem ouvir através de toda a sua 0bra. Mesmo nos campos de morte para os quais foi transportado, ainda era capaz de contemplação da natureza em todos os momentos em que 21 emoção cstética ultrapassava a dor, envolvendo a alma em enlevo que transmite em seu diário do Campo de Concentraçã0. “Se alguém houvera visto nossos mstos quando, durnntc a viagem dc Auschwitz para um campo da Bavicra, contcm~ plnmos as monmnhas dc Salzburgo Com scus cimos rcfulgcn- tes ao entardeccn que aparcciam por entre as ianclas gradca- das do vagão-cc¡a. nuncu havcria acrcditado quc sc tramva de mstos dc homens sem esperança de scr livrcs C de vivcr. Apcsar deste fato - ou talvcz em razão do mcsmo - sentían1o- -nos transportados pela beleza da naturc7.:1, da qual há tanto tempo nos havíamos privado“ (Frankl, 1982 (a): 47-8). Também revela estas qualidades de amante da natu- reza praticando o alpinismo, esportc do qual é mestre, encontrando nesta forma, descanso dos seus devercs, as- cendendo montanhas, num gcsto simbólíco da própria 20 IzAR APARECIDA DE MORAES XAUSA vida situada também cntre os abismos c os altos Cumes a que um homem pode ascenden 1.2 - O panomma familiar e a pemmmlidadc de Frankl Vikror foi cducado dentro da tmdição judaica, cnvolvido por grandc afeto familiar e no respeito aos valorcs cspirituais. Pertcncia 21 uma famílía judia dc rrês th()s, scndo Wal~ ter c Estcla mais velhos quc elc. Scus pais - Gabricl e lilsa - emm da Tchecoslováquim nasccram na Morávia do SuL cm Praga. A tradição dcssa famíliu ligavwsc pcla partc da mãc ao rabíno Locw dc Praga, da mais antiga sinago- ga da Europa. Scu pai cxcrccu lençÕCS no Ministério da Educação c c lmportantc destacar quc, postcri(›rmente, dedicou-se, com grande empcnhm a Çuidar dos problc- mas da juventude austríacau Cermmente foi a inHuência deste lar afetuoso, que fez brotar cm Frankl t(›do amor c toda fé que, desabrocha- dos mais tarde, 0 acompanharam no experimcnto crucíal da prisão. Estes traços dc sua personalidade tambóm se fazem sentir do desenvolvimento da log()tcrapia. a quaL deixando dc Iado as descrições fàtuais, pcnctra no âmago do amor humamL Sobre suas relações afetuosas com o pai, Contamos o autor peruano, radicado no México, Pareia Herrcra2 “A infância c .^ld(›lcs¡.'êncm dc Frankl sc dcscnvolveram num ambicntc fmniliar dc rico calor humanu Rccorda o dr. FrankL que uma manhã dcspcrtou com o pmfundo sentimcnto de paz c scren|'dadc. Lentamcme passou scu nlhar pclo quarro dc dormir até cncontrar o> olhos dc scu pai quc. dc pé, o contcmplava com carinho" (Parcja Hcrrcm, 1984 (a): 5~6). Um Ccrto prcssentimcnto, cm nutrn ()Czlsiã(), parecia prenunciar o quc se passaria com a família mais tarde. “Outr.-1 viva recurdação dc s.u.1 infáncia é LLüquch cena cm quc o pequcno Viktor dcspcrmu .'1tcrrorizado durume a noite crgucndo-sc da cannL Experimentava a consciência vivn da condicionalidade da mortc“ (P;1rej:1 Herrera, l984(a): 6). 21 A Pslcowcm DO SENTIDO DA VIDA Quando foi deflagrada a guerra e a perseguição nazista atingiu os judeus, Viktor obteve um passe para os Estados Unidos; Estela conscguiu emigrar para a Austrália e seu irmã0, tentando ir para a Itália, foi Capturado pelos SS. Entretanto, Vikt0r, sem fazer ainda uso de seu vist0, acompanhava os pais em idade avançada. No scu interior persistia uma preocupação sobre a opção que deveria fazer entre a defesa de sua vida e da esposa e a realização proñssional em outro país, ou a proteção a seus pais e o apoio aos companlwiros. A dccisão cra de sua intcira responsab1'lidadc. Seus pais insistiram para ele deixar 0 país. Nessa oportunidade teve um estranho sonho, porém profético, que lhe indicava 0 Caminho a seguirz naquelcs dias tive um sonho estrunho. que ainda hoje faz parte das minhas cxperiências mais profundas do reino dos sonhos. Sonhei com uma grande multidão dc psicóticos e pacientes em ñlcira para scrcm conduzidos às câmaras de gás. O sentimento de compaixão experimenmdo foi rão forte que decidi me unir a eles. Pcnsava que devia fazer algoz atuar como psicoterapeuta em um campo dc conccntração haveria dc ser mais signiñcutivo quc scr um dos psiquiatras de Manharmn... Dcpois dcste sonho a dúvida aumcntava” (Frankl, apud Fizzotri, 1977:25). Pareja Herrera comenta este sonho como um grande exemplo de Conteúdo cxistcncíal dos sonhos que apontam para uma dímensão de sentid0, além dc si mesmos. Frankl, cntretanto, necessitava recolher-se intimamcnte para tomar a decisão. Fiel aos princípios dc amor e de fé, perguntava a si mesmo o que dcveria fazen Pensando, saiu pelas ruas de Viena e penetrou na catedral católica para mcditar, recolhído no mais intimo de seu ser. Ele mesmo nos relata este momento de tão grande signiñcação para toda a sua vida futura. '“Uma mrdmcobrindo com a Carteira a estrela amarcla que devhlmos Ievar na jaquetm fui à catedraL Havia um concerto de órgão. Dissc-me a mim mcsmo que dcvcria escutar atcntamcnte a música c refletir sobre minha preocupação. “Re|axe, Vikton estás muito distrm'do. Tmta de meditar e contcmpl.'1r. longc do tumulto dc Viena'. Perguntava-me que 22 IzAR APARECIDA DE MORAES XAUSA deveria fazerz sacriñcar minha família por amor da causa à qual havin dedicado minlm vída ou sacriñcar esta caus.a por amor de mcus paisP Quando sc cstá cm tal divisão, dcscia- -se vivamcnrc rcccbcr uma rcsposta do cc'u. Dcixci a catcdral e volrei à minha casa. Tudo cra normaL Vi, sobrc o rád1'o, um pcdaço de mármore c pcrguntci ao mcu pai 0 que cr.1. 0 Sr. ankl cra iudcu picdoso c havia rccolhido aqucla pedra dcntrc os cswmbros da grandc sin.1'goga, fonnavn partc da Tábua quc continlu os Dcz M.'md.1'mentos c tinha a inscríção dc uma lcrr'.l, em hcbmico. Mcu pai mc Cxplicou quc aqucla lctra rcprescntavu a fórmula abrcviadn dc um dos mandan1cntos, corrcspondia uo quc diLz 'H<›nra rcu pahi c tua mãc sobre a terru quc o Scnh(›r, tcu Dcus, vai tc dar' Iíxodo 20,12). Isto basmu pnra quc mc dccidisse ñcar na ustria, deixando caducar o pasmporte amcricano" (Frankl, apud Fizz.()tti, 1977:25). Na ép0ca, Viktor Frankl era casado em primciras núpcias com Tilly Grosser, tcndo contraído matrimônio no mês de dczcmbro de 1941. Frankl foi brutalmcnte afastado de Tilly; ambos foram prcsos c scparados pclos nazistas. Ele a amou profundamentc c cla csteve presente em seu coraçào durante todo o tempo de scu cativeiroz “A ñgura dc minha mulhcr csrá anre mim... De tcmpos em tcmpos olho pam o Céu ondc as estrclas cmpalidcccm ou ali, ondc atrás dum Iúgubre muro dc nuvcns comcça a aurora a clarean Mas 0 mcu cspirito cstá cheio da ngra quc dá graça à minha inquicta c vívidu falntglshn ral comu nunca 0 havia conhccido cm mith vida normaL Sustcnm conversaçóes com minha mulhcn Ouço como me c<›ntcsta, vcio seu sorriso e o olhar alenmdon e - cm carnc c osso (›u funmsia - scu olhar brilha com mais força quc 0 sol quc jnsmmcntc agom sc levantau Um pcnsamcnto .'¡tr;1vcss.1'-mc a mcntcz pcln primeira vez em minha vida pcrcebo -.1 rcalidadc que tantos pensadorcs têm qualiñcado como a quintcssência da vcrdadc dc sua vida e 0 quc tantos poctas tôm cantadoz sínm em mim a vcrdade de quc. cm ccrto mod(›, o amor é 0 ultimo c 0 mais alto a que pode chcgara cxistência humana. Comprccndo agora o que há dc mais sublimc quc podc exprcssar a poesia ou o pensamcnto humann c tamhém a féz a salvação das criaturas por amor c no amon Concebo que 0 h0mcm, ainda quando nadu lhe resta dcste mundo, pode scr bcm-avcnturado e, ainda que não seja mais que por uns instanteâa - entregar-se intensamente ñgura do ser amado” (Frankl, apud Pareia Hcrrera. 1984 (a): 34). 23 A P.le()LUL;lA DO SLNHDO l)¡\ Vum Tilly foi nmrtir1'1.'ada, pagando com a vida aquela perseguição aos ñlhos dc IsraeL Sobre sua morte dissera, uma vez, o dr. Franklz “Ela morreu em Bergchelsen (Alemanlm) e ainda não sci n data de sua morte“ (Parcin Herrera, 1984 (a):17). Enrretanr(›, a vida ainda possíbilitaria pam Frankl uma cmoção particular e uma rcvclação espcciaL Em 25 dc abril dc 1984, o criador da logotcrapia, ao descer cm Porto Alcgrc para presídir o “I° Encontro Latino- -Amcriamr› Hzmzmns'tico-E.~cisfwzcial: Logotcmpia”, foi reccpcionad0, entre outras pc55()as, pela irmã dc Tilly. A famílía Grosscr emigrou para Porto Alegre e scu sogro Ferdínando Grosser foí profcssor da Pontifícia Uníversi- dade Católica do Río Gmnde do Sul, uma das promoto- ras do referido encontro. A despedida de Frankl e de sua atual esposa não foí revestida de menor emoção que sua chegada, pois, nos últímos ínstantes quc lhe restavam no solo gaúcho, ele soube das circunstâncím~ em que Tilly partira para a eternidade, cncontrando a pcssoa nos braços da qual sua amada morrera. Compreendemos assim 0 que Frankl tranquílamente escreveu sobre aquílo quc vivc2 “Privar a vida da neccssidddc e da morre, do dcstino c do sofrimentm scria Como rirar~lhc a conñguraçã0, a formzL quc a vida só adquirc forma t fígura C()lTl as marteladas que o destino Íhc dá quando o sofrimento a põe ao rubro” (ankl, l973: l54). Sobre estes JCOHÉCCÍHICHIOS dizía o Dr. Ricardo Sardi, prcsidente da Socicdade argenti1w-brasilcira de logotcrapia em seu discurso de saudação ao Dr. Franklz “Não me cabe julgan mas cstão coordcnadas aqui em Porro Alegrc, algumas séries de forças c energias misteriosas que cu dcsconhcçm Como é mistcrima a vjda para quc vocês tenham n Ímcnsa fortuna de trazer dr. Viktor FrankL c que cstes momenros tenham sido compartilhados com todos os outros" (Sardi. 1984(a) - gravação). 24 ÍZAR APARECIDA m-: MORAEs XAUSA Sua scgunda csposa, Ellconorc Katharina, com quem sc casou em 18 dc julho dc l947, c da qual teve doís th(›s, o acompanha i11can.s*;1'vcl c dcdicadmnentc, com a alegria c doçum quc lhe são pcculizlr65. Para c|a, ao dedícar-lhe (› Iivro Psiu>tcm_1n'a e Humanismu (1982), agradecc publicamcnte todos os “sncrifícios quc tcm rcalizado através dos anos com 0 Hm dc aiudar-mc a ajudar os dcmais”. E, a propósito. cita o quc disse 0 professor americano jacob Needlemam '“P.1ra 0 calur que acompanha a lu/.". '.1crt:.s*ccnmndo: “quc o calor pcrsism dummc muito rcmpo quando a luz sc tenhn extinguidd “ (Frankl, 1982( c ): s/n) 1.3 - O panomma cultural e a formação de ankl Viktor Frankl nasceu quando Vicna alcançava seu apo- geu arrístico c intclectuaL sendo sob cstc ponto de vista a capital cultural da Europa. () cenário sócio-polític0 cra 0 de luta dc classcs. Havia uma carência dc signiñaldo dc vida. Os jovens questionavam as tradiçõcs c criticavam o militarismo jactancioso do Kaiser e ao mesmo tcmpo escreviam poemas c diários rcplctos de rédio, manifes- tando, cntrctant0, esperança dc dias mclh(›rc.s', scndo cstc gcrme da rclwlião da juventudc quc cclodirá após u 2“'. Gucrra MundiaL A juvcntude dc FrankL p()rém, transcorrcu tmnqu"íla, conservando-sc alhcio aos movimcntos sociais, dcdicandw -se à sua formação culturaL Aos 16 anos manifcsrou 0 interesse em estudar medicinm dccisão quc foi acolhidu com cntusiasmo por parre do pai. Tcndo ingrcssado na Univcrsidade de Víenm cm l924. diplomou-sc médico no ano dc l930. Durantc o período dc bacharclado entregowse à publicação dc numcrosos artigos dcdicados àquela mesma juventude traumatizadm Foi discípulo de Freud, Adlcr, PotzL SchwartL Geslcr- mann c Allcrs. Sua relação com Freud foi marcada por três fascs dis- tintasz a primeira da adnúraçã(›, a segunda do questionm mento, a tcrceira da contestaçãa Quando aluno do grande 25 A PSICOLOGIA DO SI:N'I'IDO DA VlDA médíco, cuja fama sc estendia pelo mundo, tinha pclo mestrc uma revcrêncm mesclada por um certo tcmor de apmximaçãa Por este motivo optou por escrever cartas e Ihc cnvian ainda C(›n1(›cstL1dante, um artigo que cscrcvcra sobrc A mímica da afírmação e da negação (Zur mimi$- cbcn Bejalmng mzd Verneinm1g). Este artigo para espanto scu foi publicado em l924, na Revista Intermcional de P51'can.1"lisc (Internationalc Zcitschrift fur Psychoanalysc) por rwomendação expressa de Freud. A publicação desre artigo foi um dos cstínmlm para dcdicar-sc ao cstudo e ao aperfeiço.1'1nento da psicologizL Scu cnconrro pessoal com FrcucL vcmos descrito na obra, ainda inédítm de Pareja Herremz “Eu csmm cnminhando pcrto dzl Universidade c mc dei conta que uma pcssoa cnminlmva diantc dc mim. Esm pessoa me lembrou a Frcud pclas fotograñas quc havia visro, mas pcnsei que era impossích Este homem esmva dcsalinhado. scm chapéu e scu casaco cstava muito dc.s'g.1'stad0. Freud, pcnscL chzlva uma bengala ncgra com empunhadeim de pram c ia golpeando a calçada e movcndo sua b0ca. Ele sofria há nlgum rcmpo dc cânccr dc mzmdíbu|a. FÀu 0 acguL E pensciz se este é realmentc Freud dcve dobmr a esquina pam ir a Bcrgasse. Eu sabia seu cndereço por causa de nossa corrcspondência. Dei volm à csquina e dirigi~me a ele, dizcndo~|hcz '0h! dr. Frcud1 Mcu nnmc é Viktor Frnnkl'. Elc me respondcuz “Oh! Viktor FrankL Czerningassc n. 6, imerior 25, segundo Distrito de Vienam (Frankl, apud, Pareja HcrrcraL l984(al):8). Nesta época, a tendência do ensino universitário era marcadamentc organicisnL Uma oc.'lsiã<), na aula de historia naturaL o professor explicava à classe quc a vida, inclusive a do homenL era simplesmente um processo de combusrão e 0¡\'idação. Frankl ao ouvir esta añrmação, para cspanto de todos, repentinamente perguntouz “SE EA551M,QLL~\L É 0 SENTIDO DA VIDA?” O jovem Frankl recusava-se a aceitar ser a vida rcduzida a um mero processo químico-orgânico. A esta ins.'1tist11ção com 0 reducionismo organícista, seguiram- -se outras no campo da psicologim À pergunta sobre 0 26 lZAR APARECIDA Dli MORAbh XAUSA sentido da vida inicíada na juventudc, scguiram-sc outras revestidas das mais variadas f(›rmas, tcstadas não só na esfera culturaL mas também no submundo da prisã0. Sua matumção psicológica c intclcctual seguc um caminho que, reflctindo sobre OS Conceitos analíticos, conclui pclas Iimítaçõcs da p.s*icamilísc. Comcça, Cntã0, uma nova fase cm sua trajcuSria intelectuaL Discordando do posicionamento reducionista analítico, quc dcscreve o psiquísmo com modclos da an.1't(›mia, c añrmando um determinismo instintivo carentc de uma cxplicação unitária, vai cm busca dc uma vcrdadc cientíñca maís condizcntc com a pessoa hummm. Seu distanciamento de Freud não lhc fez perder o rcspcito pclo gênio psicanalítico, nem pcln sua formulnção sobre (› inconsc1'entc, muito mcnos o afcto quc scmpre conservou. Guardou consigo as carms c os casos clínicos quando iuntos cstivcrcm na mcsma clínica em Viena, confiscados posteriormeute pelos nazistas. Manteve também uma particular amizade com Anna Freud. F0i,igualInente,alu11(›chd'lcre,depoisdoafastamento de Freud, entrou no círculo adlcríamo, quc contnva com alguns nomcs de rcspcito em ViuuL Sua participaçâo foi brcve, mas cntusiasmada. Encontrou na psicologia individual de A'dlcr, aspcctos mais comprccnsivos sobre a totalidadc do ser humano c 0 sentido da vida. Em 1926, com 21 an()s, pronunciou uma Conferencia sobre n sentido da L'ida, examinand0-0 cm relação à situação social da gcração após a l". GuerrzL Esta palcstra foi proferida na Associação Intcnmcional dc Psicologia Individual Vicncnsc. Em l)usseldorf, a 27 dc sctembro do mesmo ano, participou do III Cungresso Intcrnacimzal de Psicologia IndiuiduaL onde apresentouum trabalho sobre A neurose mmo expressão e meio. Esta abordagem da neurose vista em alguns casos Como uma necessidade profunda de signihkado não agradou a Adler, que evítou sua publicação. Encontramos aí, a semente originaría da logoterap1'a. 27 A PSICOLOGIA DO SENTlDO DA VIDA 1.4 - O panorama cientiñco e a realização proñssional FrankL em Porto Alegre, Brasil (1984), explica à rep0r- tagem da revista Mancbete como surgiu a Logoterapiaz “...cm 1926, durunte uma confcrência para psiquiatras que houve em Viena. usci pcla primeira vez a expressão log(›tcrapia. Enrão, em três .'1n(›s, passci dc Frcud a Adlcr e, por ñm, criei uma nova escola“ (Frankl, 19842 24-6). Em, 1927, Frankl fundou e dirigiu uma revista de orientação da psicologia individual com o nome de O bomem do día-a-día - revista para divulgação e aplicação da psicologia individual (Dcr Mensch im Alltag, Zeitsclarift zur Vebreitung mzd Anwendzmg der Indiuidual-Psychol()gie). Mostrou por intermédio deste órgão, a necessidade de criar Centros dc consulta para jovens quc, derrubando as tradições, fugindo do lar e tentando suicídios, necessitavam de ajuda psícológica e moraL Sua preocupação com a juventude, sua sensibilidade aos problemas psicossociais e a visão humana ñzeram Com que Frankl se dedicasse a esse trabalho. Assim, o primeiro centro jovem foi dirigido pelo jovem Frankl, tendo recebido a adesão de ourros grandes colaboradores como Schwarz, Rudolf Allers, incluindo 0 próprio Adler, que davam Consulta gratuita a cstes jovens. A Oswald PótzL muíto rcspeitado em Viena pela serícdadc de seu trabalho clínico e de suas publicaçõcs, coube a presidência honorária do Centro de Aconselhamento para a Juventude ( Vereín für jugendberatung). Estes centros situavam-sc em residências particulares ou iunto aos príncípaís colégios da época, numa cstratégia paramelhoratraírosjovensproblematizados.Dcstinavam- -se não só a estudantes, mas também a trabalhadores, visto que Frankl tinha uma grande preocupação sociaL Os rcsultados alcançaram plenamente os objetivos tcndo- se resolvido inúmeros problemas pessoais, tornando quase nula a taxa de suicídi(›s. 28 IZAR APARECIDA DE MoxALs XAUsA Com estes modelos foram Criados centros, cm 1930, na cidade de Chemnitz e nas capitais européias dc Praga e Zurique, em Berlim e Frankfurt na Alcmanha e, mais tarde, em outros países Como Hungria, Polônizh Iugoslávia e Lituânia. SObrC CSÍCS CCIIÍTOS transcreve em SCU liVFO O autor italiano Eugenio Fizzottiz “É .s*1'gnificativ;1 a notícia publicada por Dicnclt (1959), que descobrindo os méritos da iniciativa tomada por FrankL indica que no pcrkídico dc 13 de Julho dc 1931 não se registrava ncnhuma tcntativa dc suicídio, somentc o seguintc comentário do rcdator chcfe: *A atividadc dc consultas e a prcpamção escolar para jovcns ncccssitados têm sido uma feliz idéia do doutor FrankL fundador c responsável direto do centro dc consulta vicncnse” ( Fizzotm l977z21). Frankl publicou uma resenha destc trabalho em decorrência de um estudo de 900 Casos pessoais, com a indicação de possíveis soluções. Nesta ocasião, Oswald Schwartz animou Frankl a escrever suas reflcxões sobre a psicoterapia existenciaL manifesta em suas idéias e estudos, comparand0-o a Kant na filosoña. Frankl continuava com a recusa dc prender-se a uma ortodoxia, a apr(›fundar-se na investigação L~'x1'stencial dos problemas psicológicos c intuía a necessidade de investigar o sentido da vida, deñnindo assim a sua posição no campo da psicologia e da psiquiatr1'a. Foi esta posição que levou Frankl a ser expulso da Sociedade Adleriana. Tendo se licenciado em Medicina (1930), trabalhou no setor de neurologia da clínica da Universidadc de Viena. Especializou-se em neurologia e psiquiatria. Durante 25 anos, exerceu a direção do setor de ncurologia do RothchildspitaL Durante a 2" Guerra MundiaLViktor Frankl foi forçado a interromper sua carreira. Esta primeíra etapa de sua vida foi denominada por Mário Caponctto como sendo 0 m0- mento interrogatiuo. Seguiram-se outros três momentosz 29 0 /niticu, o cientthko c 0 sapiwzCiaL Momcntos muito difcrentes quc marcaram profundamentc o cientista, t0r- nado a sua obra ímpar na hisuíria da psicol(›gia, onde vive, realiza e sofre sua própria ()bra. Por ísso, repetimos com Torelloz A REFLEXÃO SOBRE A EXISTÊNCIA DESNUDA 2.1 -- O cidadão marazdo pcld cstrela de Davi “0 quc imprcssiom dcsde 0 início na 0bra, bastante considcrávcl iá, dc Viktor E. FrankL é a profundeza de humanidadc quc~ cla rcñcttz 21 intcnsidadc da vida quc dcla se dcsprcndez estas qualidades não lhc diminucm cm nada 0 valor proprinmcnte cientíñu›, antcs 0 realçanV (T(›rello, npud FrankL 1973:V). °'Umns l.500 pCSSOLlS cstivcram viainndo de trcm vários dias c várias no1'tcs; cm cada vagào émmos uns 80. Todm tínhamos que nos estcndcr em cima dc nossas l›.1'-;.,agcns. 0 pouco que rcsmva dc nossos pcrtcnccs. Os cnrros esmvam rão abarrumdos quc só Hcava livrc a partc supcrior das vcntamlas por ondc passnm n clnridadc gris do amanhcccn Todos críamos quc 0 rrcm sc cncaminlmva paru uma fáhrica dc muniçõcg ondc nos cmprqgariam como força dc tmbalho. Não sabíamos ondc nos cnwntrámmos, ncm ›c, todaviay cstávmnos n.1 Silési.1 ou já h.-1ví_-uno› cntrado lm Polônim 0 silvo da locomotivn tinha um som nústcriosm como sc cnvmssc um grito de socorro cm considcraçh à dcsdimsa cnrga quc ia dcstinada à pcrdiçãu Então 0 trcm fwt uma mnnobrm nos acercávamos, sem dúvid.1, da cstação principaL E. dc su'bito, um grito cscapou dos angustiados pasmgcirosz “Há um sinnL Auschwit7.!'. Scu nomçu somcmm cvocavn tudo 0 quc lni dc horrívcl 110 mundU: caHnaras dc gá.s, fornos crunmróri()5, matanças indiscrin1il'mdas. 0 trcm amnçuva muiro dcv.1g'.1r, diria-sc quc csmva indcciw comn sc quiscsw cvimr dc scus pmcsagcir05, como se fossc possích a atroz C()nstat.1'ç.1"o: Auschwit7.! À mcdida quc ia anmnhccmdo fazimn~sc visívcis os pcrñs do imcnw cnmpoz a larga cxrcnsão dc ccrcu das várias ñlciras dc ammcs lerpudox 215 torrcs dc obscrv.1çã(›, os focos c as inrcrmimvcis colunas dc cshlrrap;1dns ñgums humanas, pnrdas à luz grisáccn do '.1m'.mhcccr, armsmndo~ se pclm desolados campm pam um destino dcsconlmcido. Ouvianrsc vwncs isoludas c silvos dc mgmdm mas não sabíanms 0 quc qucriam dizcn Minha inmmnação mc Icvava n vcr forcas com gcntc pcnduradn nelasn Estrcmeci dc horror, mas não andava muito dcscncaminh'.1d(), iá quc p.'|ss(› n passo nos fomos .1*c(›stumando a um hormr imcnso c tcrrich (Frankl, 1982: l9-20). Estas experiências estão descritau na sua ohra “Um Psicólogo no Campo dc Concentmção" ondc Frankl conta como pcrdcu a idcntidade de cidadão austríaco e passou a ser 0 prisioneiro l19.104 dos campos de Concentração nazistas, na 2" Guerra MundiaL A PSICOLOGIA DO SENTIDO DA VIDA “Não sc tmta, pormnto, dc um relato de fatos e sucessos, c sim dc expcriéncms pcss<›ais, cxperiêncms de mílhões de scrcs humanos quc também a sofreram. É a história ínrima dc um campo de conccntração contada por um de scus sobrcvivcntcs“ (Frankl, |982(a): 13). Ncstc contexto, a relação existencial entre a vida c obm dc Frankl se faz mais íntima e patente que em qualquer Outro autor ou teoria. Theresienstadt, Türkheim, Kaufering e Auschwítz foram as etapas de scu experinmztum crucis, percorridas não como psiquiatra, nem Como médico, mas como prisioneiro comum. E foram os locais em que, de forma dolorosa, dcsenvolveu as rcflexões que confírmaram a logoterapia. Assim, de prisão em prisã0, experimentando quase em grau absoluto os condicionamentos e as frustrações de toda a 0rdem, 0 nosso psicólogo era sujcito ao progressivo desnudamento da existência para sc tomar um número entre outros. Sob as ordens dos guardas da SS deviam deixar tud(›, somentc conservando os sapatos, o cinturão, os tirantes, os óculos. Frankl lembra: “Não tinlmmos Ilada, só nosso corpo dcsnud0; não nos restava nada. a única coisa que possuíamos, litcralmente falando,era a nossa “ex¡stencía dcsnuda"'(Frankl,1982(a):25) FrankL entretanto, procurou salvar algumas coisas queridas, entreelas o pedaço de mosaico da sinagoga c 0 manuscrito de sua obra. Queria conservar este manuscrit0, a qualquer preço, pois reprcsentava o seu trabalho de uma vida inteira, realizado como psiquiatra, mas até isto lhe foi tirad0, cancelando assim uma vida transcorridn até então. Recorda as rcações inicíais que principiaram com a primeira fase de shoclz, como também a ílusão do indulto que é comum aos Condenados à morte. Comparando-se COHI CSÍCS, pensava: “Também nós nos agarrávamos aos farrapos da esperança e uté 0 u'ltimo momento críamos que nem tudo seria tão mau” (Frankl. l982(a):21) 32 IZAR APARECIDA DE MORAES XAUSA A ameaça da morte, porém, cra contínua naqueles porões da humanidade C dia após dia, hora após hora, minuto após minut0, os cercava, levando muitos ao desespcro, surgindo assim o pcnsamento dc suicidar-sc. Porém, o prisioneiro 119.l()4, ñel às suas convicçoes e guardando no íntimo seu profundo amor à vida, fcz para sí mesmo a promcssa de não se lançar contra a cerca elctriñcada do campo - a forma de suicídio mais fácil e comum naquelas circunstâncías. 2.2 - O prisioneiro ]1'9.104 e o psicóÍogo-mártir Passada a primeira fase, Frankl nos relata a invasão de um sentimento de apatia, qualiñcada como uma espécie dc morte emocionaL Naquelas C1'rcunst.1'^nc1'as, havía como que um embotamenro dos sentiment<›s, onde as cenas mais duras eram contempladas com impassividada Os prisioncims, nesta fase, não mais se comoviam com os sofrimentos dos enfermos, nem com as agonias, nem mesmo com as mortes. Aos olhos do psiquiatra prisi(›neir(›, cstc adormecimento das cmoções era um dos sintomas quc se manifestavam nesta segunda etapa. Assim, graças a essa insensibilidadq o prisioneiro se protcgia com uma couraça contra os golpcs - um mecanismo dc autodefcsa. “A rcalidadc ss confonnava dcfeituusamcnrc c todos os nossos esforços e todas as nossas cmoçocs sc conccntravan1 em uma úmca tarefuz a Conservação dc nossas vidas e a dos companheiros" (ankl, l982(a):38). Dentro da estrutura social sui generis do campo, algumas altcrações de caráter típico enrre OS prisioneiros faziam-se notar, acompanhadas de uma irritabilidade Crescente; enquanto entre os carcereiros veríñcava-se um delírio dc czarismo. O tempo interior era modíñcado pela vivência da falta de futuro, um sentimcnto de vivência do intermínável levava alguns ao desesper0, ao suicídio ou ao sucumbimento diante de uma infecção por falta de resistências físicas. 33 A PsICOLOGIA DO SENTIDO DA VIDA Alguns colcgas psicanalistas que estavam com Frankl na prisão recordavam 0 fenômcno da regressã0, isto é, uma rctirada para umu forma mais primitiva da vida mentaL Em consequência, scus dcscjos c apctites se transformavam em sonhos. Sonhavam com cigarros, Comidas e banhos de água morna. Buscavam a satisfação de suas neccssidadcs através dos sonhos. Scndo a fome uma constante, 0 dcsejo dc procurar alimcntos, por derivar de um instinto primitivm era o centro da vida mental do prisioneiro. A desnutrição agravava estc fato e o organismo perdia complctamente a resistência, os corpos se devoravam a si mcsmos, tornando~se cadáveres ambulames. Nesta extrema valorização do alimento, alguns cscondiam um pedaço dc pão durantc a noite para mastigá-lo com delcite ao amanhacen Os prisíoneirosg scgundo a descrição de FrankL sc ocu- pavam pouco com o sexo c era pouca a perversão sexuaL Esta observação é muito signiñcativa, e vinha desconñrmar a abordagem analítica da inibição sexual. Segundo esta, 0 desejo sexual deveria nmnifestar~sc de forma cspccial nos sonhos, mas isso não ocorreu porque outras emoções se tornaram mais intensas. Um fenômeno decorrcnte da internação era também a hibernação culturaL restando, porém, dois assuntos preferenciais cntre os prisioneirosz política e rcligião. O interessc político se situava ao redor da situação militar e dos rumorcs sobre a guerra, numa otimista cxpectativa de solução da mesma. A neccssidadc de um vínculo religioso sc fazía prescnte e se exprcssava das mais divcrsas formas. Uma situaçao se vinculava à espcrança do término daqucla terrível situação que seria 0 ñm da gucrra. Outra, indicava 0 apoio para suportar aquele terríñco e tortumnte pesadelo vitzll e a indicação do reconhecimento de um sentido último da vida prestes a se extinguir. Uns tinham espcrança. Um espemva uma obra inconclusa; outro, um ser humano. A esperança estava vinculada a um scntido que ultrapassava a prisão, não só à obra e o scr amado, como também à solução da guerra ou a busca de Deus. 34 IZAR APARECIDA l')L" MORALS XAU\,A Sobre a vída religiosa no camp(›, descrcve-nos Frankl: “Qu.-1ndo ()s prisionciros scntiam inqulctudcs rcligu)5.1'›, csms cmm ns mais sinccms que cabc sc imuginar c, muito a miúd0, 0 recém-chegado caia surprccndido c admirado pcla profundidadc c pcla força das crcnças rcligiosas. A cssc rcspcitm o mais impressiommte cmm as orações c os scrviços rcligiosm impmvisados num rincãn dc lmrmcão ou na (›bscuridadc de um caminhão de gado, em que nos lcvavam dc volta ao campo longc do lugar dc trabalho. cansados, faminros e gclados sob nossns roupns csf.'1rr;1p.1'das“ (Frankl, 'l982(a1):44). Aos poucos, as tristes cxperiências dos desditosos relatos quc nos dão a imprcssão dc uma volta a um primitivismo de humanidadg tanto por partc dos carcerciros como dos prisioneiros, começam a ccdcr às manifcstações mais sublimcs e profundas do espírito humano. E o prisionciro 1 19. 104 com a delicadeza dc sua alma vívencia só ou com os seus colcgas as mais densas cxpcriômias dc humanísm0. Ora nos fala da contemplação da mulhcr anmdtL Ora experimenta a dor da existência desnuda e ora qucstiona 0 sentido, tão-somente, desta experiência que subsisrc. Ora sofre todos os condicíonamentos da prisão e ora scguc n liberdade do espírito que não se deixa aprisionan Ora vê homcns rcduzidos à mais brutal possibilidadc humana e ora descreve as mais Cmocionantes expressões da dígnidade do homem Sua obra poderia ter sido apenas este relato de dor e de amon dc dcsespcro c cspcrança c já scria o basmntc para dar à humanidade uma linda lição dc grandeza humanaz mas FrankL c<›m alma dc poem c cspírito cicntí6c0, vai-nos rclatando, através da maestria das palavrag as observaçóes mais sutis e profundas sobre a natureza humana. 2.3 - O psicólogo-prisioneiro e a busca do sentido Jogado naquela situação limite da humanidz1de,1'ndaga sobre o sentido de tudo aquilo, sobre o sentido da vida naquelas circunstâncias. Debatend0-se por encontrar 35 A PSICOLoclA DO SENTIDO DA VIDA a razão dc seus sofrimcntos em sua lenta agonía, tendo perdido pais, irmão, mulher, profíssã0, posição social - diante de sua e.x'istência desnuda, protesta contra o sofrimcnt0, a vida, a terra e os céus naqucla madrugada c1'nzenta. É elc qucm nos Contaz “Em um último c violcnto protesro contra o inexorávcl de minha mortc imincntc, scnti como sc o mcu cspírito rrans- passara a melancolia quc nos cnvolvia; scnti-mc transcendcr aquele mundo dcsespemd0, insensato, e de alguma partc es~ cutei o virorioso “sim” como contcstação à minha pergunta sobre a cxistência dc uma intencionalidadc ú|t1'ma. E naquelc momento, em uma frania longínqua asccndcu uma lu.7, quc ñcou a|i. fíxa no horizonte, como se alguém a houvera pinta- do, em meio do gris miserávcl daque|c amanhccer na Baviera. Et lux tcncbris lucet, c a luz brilhou em mcio a obscuridade" (Frankl, l982(a):48). Sobrevivcremos ao campo de concentração? Do Contrárío, todos esses sofrimcntos Careceriam dc scntido. Tem algum sentido todo este sofrimento, todas estas mortes? Se Carecem de sentido, por que sobreviver ao internamcnto? Estas eram as perguntas angustiantes quc se fazia. E no seu monólogo Carregado de d0r, a si mesmo responclia que uma vida cujo sentid0, em última instância, dependera da casualidade - de sucumbir ou dc sobreviver ao internamento ~ não mereceria, em absoluto, a pcna de ser vivida. Estaria o homcm naquela exísténcia prouisional condc- nado aos condicionamentos do Campo de ConcentraÇãOP Haveria no mundo maior condicionamentoambicntal do que aquele que esmagava a natureza física e psicológica do prisioneiroP Qual a razão que obrigava 0 prisioneiro a ade- quar sua conduta a um determinado conjunto dc pautasP Assim, dc prisão em prisão, 0 nosso psicólogo era suieito àquele progressivo desnudamento da existência, para se tornar apenas um número entre os outros, mas, olhando para o quase nada que lhe restava, continuava em sua indagação. 36 IZAR APARECIDA DE IVÍORAES XAUSA “É Ccrta a tcoria quc nos cnsina quc o homcm não é mais que o produto dc muitos fatorcs an1hicntais condici()nantcs. scjam dc naturcza bi()lógica, psicokâgica ou sodolo'gica?" (ankl, 1987_(a):68). Como superar a fome, a apatia c encontrar algo para realizar naquele rccluso recôndiro da vidaP O que determinava se ia ou não ia ser joguete das cír~ cu11$tâncias, renunciando à liberdadc e à d1'g11idadc, para deixar-se moldar até Convertcr-sc cm um rcduso típico? Não há liberdadc cspíritual com rcspcíto à condutaP Muitos, tendo-lhcs sido cxtmídos até ao último grau os recursos físicos, acabaram pcrdendo os scus princípíos morais e também o scntido da própria indiv1'dualidade, considcrando-se só uma parrc da massa da genre, rebai- xando assim sua existência ao nível da vida animaL Mas entre as rcaçócs gencralizadas dos prisioneiros, estava também a dos homens quc iam de barracão em barracão Consolando os dcmais, dando 0 último pcdaço de pâo que possuíam. “Foram poucos em nu'mcro, mas ofercciam pmva suñcicnre de que ao homem sc pode arrcbamr tud(›, salvo umn coisaz a última dus Iibcrdadcs humanas ~ a cleição da -.1tividade pes~ soal ame um Conjunto de circunstâncias - para dccidír scu próprio caminho”(FrankL 1982(a):69). Foí esta decisão que levou Viktor FrankL Contm o con- sclho de scus amigos, a prcstar scrviço como mcdico cm enfermaria num campo de infecciosos vitimados pela fcbre tifóidc. Sabcndo que no grupo dc trabalho podcria morrer em pouco temp0, prcferiu ajudar os seus camaradas como médico, pois com isso, daría algum scntido à sua mortc. Ficava patcntc quc o tipo de pcssoa cm que se Convcrtia o prisioneíro era resultado de uma decisão íntima.1\«1uitos pcreccram antes da condcnação à mortc; alguns, porém, caminharam para 0 forno dc cabeça erguidm ao que Frankl chamou de o poder de resístência do espírito. Aí, se elaborava - através de prova cruenta e não estatística, 37 A PSICOLOGIA DO SENTIDO DA VIDA nos porões da humanidade e não nos bancos acadêmic05, com acontecimentos densos de humanidade e não com hipóteses forjadas, com vivências dolorosas e não Com obscrvaçõcs construídas - uma teoria psicológica viva, humana c libertadora. Aí se evidenciava qucz “"qu.1lqucr homcm podia, inclusivc sob tais circunstâncias, dccidir o quc seria dclc - mcnml c cspirítualmcntc - pois ainda no campqdc conccntmção se pode Conscrvar n dignidnde humana. E csta libcrdadc cspirituaL quc não nos podcm arrcbat.-1r, o quc faz quc a vida tcnha scntido c propósito” (Frankl, l982(;1)69›70). Esta foi a resposta de Viktor FrankL Como homem, àquela indagação e tambem à vida. Enfrentowse com seu trágico destino e não se dcixou aniquilar pelo terrível peso das circunstâncias infra-humanas a quc foi submeti- do, tendo conservado a dignidade acima dcr todos os so- frimentos. Como psicólogo, Captando atrás da aparência dos acontecimentos a essência do ser human0, posto no último escalão da exístência; como médico, dando-nos uma lição de metaclíníca, servindo à vida até 21 última possibilidade de sua v0caçã0. H0je, esta cena se eleva do passado para se eternízar de forma triunfanta pois seu sofrimento permitiu escrcver com o próprío sangue uma teoria psicológica, quc não é feita de constructos, mas dc vivências. Assim Viktor Frankl, Com 0 peso do martíri0, transformou-se em psicólogo da redenção bumanm 2.4 - O prisioneíro liberto e 0 psicólogo da redenção humana ““Somos livrcs! nm dizíamos uma e outra vcz c ainda assim não pndíamos crô-|0'. Havíamos repetido tanms vezcs esta palavra quc durante anos sonhávamos com cla e que já havia pcrdido 0 seu signiñcnda Sua rcalidade não pcnetrava em nossa constiêncim não podíamos aprcender o fato de que a liberdade nos perrencia“ (Frankl, l982(a):91). 38 ÍZAR AmmacmA Dla MORmzs XAUsA Ao ser libermd0, Frankl descreve scus prímeiros m()- mentos em liberdnda 0 senrimento inicial de despcrsonw lização e o dcsaparccimcnto daqucla prcssão tcrrívcl que chegara ao Hmz “dclicios.1' scnsaçñ(› dc pcrccbcr quc nada no mundo sc tem a rcccnr a não ser seu Dcus" (ankl, I'~)32(a):93). Ao rccomcçar da vida, scmprc cm ligação com Dcus, contemplando os espaços livres do céu c da natureza, rclembra: “Naqucle momcnto, cu sabia muito pouco de mim ou do mundo, só tinha na cahcça umn frasc, scmprc a mcsmaz desde minha estrelta prisào clmmci ao mcu Senhor c elc mc rcspondcu dcsdc o cspaço n_-1 libcrdadu 'Não rccordo quanto tcmpo permancci ali, dc joclh()s, rcpctindo uma quc ourra vez minha Jliculatórim I\«1as naqucle dia c naquclc momcnto, minha vida comcçou nutra \'CZ. Fui ava11çando,p.'15$o .1 pnsso, atc tornar-mc um novo scr humanom (ankl, l982(;1): 91). Em Porto Alegre, no día 29 de abril de 1984, no 39” ano de sua libertação, Frankl repetiu 0 gesto que nesta data sempre fez, durantc os anos desdc sua libcrtação, comparecendo à sinagoga para orar c cantar 0 Sbema Ysrael!” Frankl fora não só o psicólogo mártir, na dor e na alegrim mas o salmista do século XX. Rccorda também quc o repcntmo afrouxamcnto daquela tensão resultou em outras sensnções psicológicas e em outras experiências nlentais, como p(›r excmplo, a amargura e a desilusão dc voltar à vida antiga. A amargura estava ligada a algumas formas conven- cionais Com que foram recebid(›s, com gestos c frases gastos dos quc não conscguiam avaliar o sofrimcnto da prísão. A dcsilusão, com a atitude superñcial de amigos diante daquclc sofrinlento. Daí decorrcu a sensação de que 0 sofrimcnto humano não tcm limites c que poderia sofrer mais intensamentc. Ainda sobrevinha a dor diante da desilusão de ninguém ou nada encontrar à sua espera. 39 A YSICOLOGIA DO DENTIDO DA VlDA ankl dedicou seus prímeiros tempos de liberdade a procurar saber do paradeiro dos seus. Ao saber da morte de Tilly, Frankl sob o impacto da emoção dítou para 0 gravador a primeira versão do livro Um psicólogo no campo de concentraçá0. Convidado pela Socíedade de Medícína dc Viena a fazer um discurso, a 25 de marco de 1949, em homenagem aos associados mortos nos campos de concentração nazistas Frankl indaga sobre o homemz - “Quem é entâo 0 homem?” “[...J Nós 0 conhccemos no campo de Concentraçã0, onde tudo o que não lhe era essencial foi jogado fora [...| Sobrou o que ele não pode “ter,, mas 0 que deve “ser'. O que fícou foi o próprio homem, em sua essência, queimado pela dor, dissolvido pelo sofrimento - o elemento humano em sua quintcssênc1'a”. [...] “O homem é a criatum que inventou a câmara dc gás, mas ao mesmo tcmpo e a criatura que foi pam a câmara de gás de cabeça erguida rezando 0 Pai-nosso ou com uma prece dos judeus nos láhios. “Também isto é 0 homemw (Frankl, 1978.-255). Frankl não é um homem só de reHexões intelectuais. No cativeiro, no Cenário cultural, em todo o lugar e em todo o dia, não só defendeu a dignidade humana, mas tomou atítudes de grande dignidade. Nesta mesma solen1'dade, falando sobre 0 mérito c a Culpa, añrma que ela não pode ser coletiva, mas somente individuaL dizendoz “P0rtanto, da nossa parte, não dcsejamos apenas evocar os mortos, mas também perdoar aos vivos. E assim como por cima de todos os túmulos estcndemos a mão aos que morreram, assím por cima de todos os ódios, queremos igualmente estendê-la aos que vivem, E, quando proclamamos “honra aos mortos”, logo acresccntamosz *e paz na tcrra aos homens de boa vontade”°(FrankI. 1978: 256). Em suma, o campo de concentração foi para Frankl o laboratório vivo que ensinou ou conñrmou muitas 40 ÍZAR Ammacum mz MoRMas XAUSA lições sobre o ser humano. Uma antropologia vivencial do próprio aut0r. Considcrando sua cxpcriência pessoalaí, bcm como a de scus companhcíros dc rcclusão, clc Conclui que as ncccssidadcs supcriorcs não ncccsxsimm dc estar condicionadus às infcriorcs como ahãrma Maslow; que 0 sex0, ncstas condições existcncímlsy não desempenhou o papcl que lhe dá Freud; que a maioría dos condicionantes humanos foram supcrados e que a vonradc de poder de Adler não foi a mola mcstra do comportamento humano. Sua sobrevivêncía c dos companheiros que rcsistiram devia-se ao sentido que lhes dava capacidade de transcendcr àquelas gradcs, através do sofrímento, e de uma atitude intencional e livremente aceita rumo a um valor mais alto. 41 A PLENITUDE EXISTENCIAL E A SABEDORIA 3.1. - O cientista c o autor da Logotcrapia A vida dc Frankl foi dividida pclo autor argentino Mario Caponetto em quatro momentos, aos quais já nos referimos anteriormente. A primeira fase de sua vida como discípulo inquisidor, como proñssional idealista e como psiquiatra atento em busca de uma verdade cientíñca condizentc com 0 ser hu- mano foi denominada de momento interrogativ0. A fase da rcflexão sobre a existência desmtda nos campos de concentração, não maís como psiquiatra, mas Como prisioneiro, aprendendo a conhecer o homem, através de seu próprio sofrimento e dos seus Companheiros de prisão, caracteriza o que foi chamado momento pático. Ultrapassado o período da guerra, ainda profundamente emocionado com a morte dos seus, Frankl aprcscnta ao mundo 0 seu Iivro Um psicologo 710 campo de concentracao,' que contém os fundamentos da logoterapizL Este livro foi ditado entre Iágrimas num período dc nove dias. Mais tarde revisado para a edição em inglês rccebeu uma parte que trata dos princípios básicos du logoterapia. Somente a cdição amcricana dc Mans' Searcb for Meaning (O Homem em Busca de Sentido) vcndcu maís de 9 milhõcs de exemplares até 1997. É considcrado pelos editores americanos, não somentc um bcst-seller como também um 10ng~seller. Sobre ele declara o próprio autorz “Escrcvi com ahsoluta rcsolução c dcscio dc pLIbll'C.1"-Io anoninmmcntc, p(›rquc eu qucria mosrrar às pcssoas quc, mesmo quando clas sc encontram cm uma situação descspera~ dora, a vida ainda pode ter um scntid(›, mcsmn nos limites de 'Ein Psychologcr lebt das Konzentrationslagen Vcrlag fur Jugcnd und V0|k, Wícn, 1946. A PSICOLOGIA DO SENTIDO DA VIDA scus últímos momcntos. Eu quería mostrar às pessoas que até em uma situação desesperadora ao cxtrcmo, como eu próprío vivi, cm um campo de concentraçã0, a vida terá um senti- do se desejarmos. Quando alguém me diz que passou alguns anos na prisão ou que está sofrendo dc uma doença incurável como o câncer, ou ainda quc cstá cnfrcntando qualquer tipo de situação desagradáveL que não pode scr 1nodiñcada. rcs- pondo a essa pcssoaz se você não pode mudar a situação vucê ainda pode sc siruar dentro dela com liberdad6. O ser huma- no sempre conserva a maís importanre das liberdades que é a capacidade de transformar sua atitude frente a uma situação inevitáveL Por isso digo que todos nós temos a oportunidadc de crescer como screm humanos, crescer além de nós, por mais dolorosa que seja a situação dc vida. Quando alguém aprcnde a elevar-se acíma de si mcsmo, passa a ofcreccr 0 tcs- temunho de uma capacídade que é única c própría do ser hu- mano. Nestc momento, a pessoa Conseguc rransformar uma situação pessoal que era trágica em um triunfo. L0g1'can1enre, nem todos vâo acreditar nessas palavras, se forem pregadas de um púlpito de uma igreja. Nem rodos, também, acredi- tariam nisso se apenas estivesse escrito cm algum livro dc ética. Mas, quando Você ouvc alguém dizcr isso dcpois dessa pessoa ter vivido à sombra das câmaras de gás emAuschw1'tz, então você passa a acreditar nela. Por isso, eu me sentia na obrigação de escrever este livro, era uma responsabilidade que eu tinha, era preciso contar para outras pessoas como eu testemunhei pessoas superando mesmo uma situação tão ex- trema. E, ao cscrever este Iivro, assumi uma responsa bilidade com milharcs dc pessoas que sc encontram em situaçõcs de sofrimcnto que não podem modifícar” (Frankl, l984(a): 26 Revism Manchete). Com a publicação desta obra ínicia~se o momento cien- tíñco, em que outras obras foram publicadas e a logo- terapia alcança uma formulação teórica. O professor Etchevérry comenta: “É 0 período em que a Iogotcrapía alcança seu maior grau de elaboração conceptual como teoria antropológic0-psiquíá- tríca. É o período em que o pensamento frankliano, maduro e inquiet0, se desprega, paulatinamcnte, para a maioria dos países graças à sua fecundídade literária c às suas frcqüentcs viagcns” (Etchevérry, 1984(a): 3). Em Auschwitz, f0í-lhe tirado o manuscrito. Em 1945, Frankl o reconstruiu 1'nteiramente, com base em papéis 44 IZAR APARECIDA DE MoxAus XAU.sA escritos com notas taquigráñcas. É o livro traduzido para 0 português com o nomc dc Psicotcrapia e sentido da uidaf Segundo a Classifícação e dcscríção destcs autorcs, segue-se o momento sapienciaL que corresponde ao des- Cobrimento do inconscíentc cspirituaL Obtém a plenítudc Científíca, que é uma síntese dos conhecímentos vivenciais e conceptuais, uma integração entrc os conhecímentos teóricos e a prática terapêutica c onde o humano abre definitivamente a porta da transccndência. Rctornando a Viena, Frankl recomcçou suas ativida- des Como médiC0-Chefe do dcpartamento de neurologia da Policlínica, onde conhcceu Eleon(›rc, enfermcira odon- tológica da mesma clínica, com qucm se casou no zmo de 1947. O livro “A presença ignorada de DeusnI foi publicado em 1948, o mcsmo ano em que alcança a docência dc neurologia e psiquiatrim No ano seguinte obtém a licen- cíatura em ñlosoña. Nesse lívro, FrankL além de dcscrever Com profundi- dade a análíse existencial da consciênci3, descreve a sua transcendentalídade e manifesta (› ponto máximo de sua cr1'atividade, apresentando 0 inconsciente espirituaL A uoz da consciêncía aparecc como scndo a uoz da trans- cendência, os sonhos também são Considerados como manifestação de uma linguagem espiritual e relígios.1', além dos elementos instintivos no inconscicntc. Frankl apresenta este clcmento espirituaL descrevendo o estado íntimo de relação com Deus, ao que ele chamou de presença ígnorada dc Deus. Frankl escreveu 39 livros que foram traduzidos em 40 idiomas difcrentcs, incluindo o japonês, o chinês, o coreano e as línguas africanas. 1›Em cspanholz Psicoanálisxs _v Existcnciahsmm EC.E. Nícxicm 1978. Em alcmão: Arztlichc Scclsorgn Grundlagcn dcr Lugorhcrapic und Existcnzanalysm I946. Franz l)cutichc, Wicn. KDU unbcwussrc GorL Psychotherapic und Religiun. Ko"sel-Verlag. Munchen, 1948. 45 A Psrcowcm DO SENTIDO DA VlDA Sua ação não sc limitou apcnas ao atcndimcnto psicotcmpêutico, mns sc estcndcu à dinâmica da atividadc quc inclui pulcstras rndiofônicas, confcrêmias ao público c em univcrsidadcs bcm como cursos nos mais diversos paíscs dos cinco c(›ntincntcs. Rcunindo numa Colctânca, publicou cstas palestras com o nomc dc “Dic Psychotbcrapie in Alltag",4 rceditada com o nomc dc “let(›logie des ZeitgcinstcrÊí 0 que lhc valeu 0 Prêmio Nacional de Fornmção do P(›vo. Em I950, Frankl c Otto Põtzl fundaram a Sociedade Médica de Psiquiatrizy cujos primciros mcmbros dc honra foram Anna Freud, Alcxandcr Adler c Rudolf Allers, que não cram médicos. As suas liçõcs na Policlínica gcraram os Iivros “Der unbedingtc Menscb "'“ c “H(›m(› Patiens ", nos quais ataca o biologismo e 0 sociologismo juntamcntc com 0 psicol(›- gismo. Nesrc últim0, sobretudo, aprcsenta a valorização humanística do sofrimcnt0. Em Colaboração com Victor E. Von Gebsattel e _]. H. Schultz public0u, também, uma 0bra em cinco volumes para 0 tratamcnto das neuroses, editada em 1956. O livro “Te(›ria y Terapm de las Ncumses" data de 1956 e é constituído por liçõcs dadas na Faculdadc de Medicina da Universidade dc Viena. Esre cstudo abrangc a etiologia das ncur(›scs, quc podem ser classíñcadas em somat<>gênicas, psicogênicas, noogênicas ou mistas. A logoterapia apresenta-se como a terapêutica especíñca paraa neumse noogênica. 3.2 - O sábio e cidadão da bumanidade A fama de Frankl ultrapassou as frontciras da Europa Continental e cle passou a Iecionar na Inglaterra, América 4Tradução cm portuguôsz A psicotcrapia no dia-a-dia. “Purol0gia do espírito da época. "Tradução em portuguêsz O homem incondltionada 46 IZAR APARhClDA ma MORAES XAU§A do Norrc, Austrália, tcndo sido convidado para ir também à Ásia c à América LatinzL Nomeado membro dc honra da Associação Argcntina dc Antropologia Médica cm 1954, estcve ncstc país. Recc- bcu cm 1955 o mcsmo dcstaque pela sociedade dc Neu- ropsiquiatria C Mcdicina Legal dc Lima. A logotcrapia é considcrada a Terceira Escola de Psícotcrapia de ViemL Gordon Allp(›rt, no prólogo do primeiro livro de Frankl traduzido para 0 ínglês com o título “Tl)e Doctor and the S(›uI”, em 1955, c nos livros também editados no mcsmo an(›, “From Deatb-Camp to Iisztcncialism ” e “Mans' Search for Meaning",7 vai além da considcração da logoterapia como uma escolax Elc traça a Comparação cntrc Frankl c Freud dcnominando~0 Copémico da psícoterapia c da psiquiatria (Allport apud FrankL 'l973, p. II) c considcrando a logoterapia “a introdução do mouimento psiculógico mais importante do nosso temp(›” (Allport apud FrankL 1979(a):10). Em 196], 0 mesmo Allporr convidou Frankl para lccionar na Universidade dc Harvard. Em 196(), Frankl foi nomcado membro honorário da Sociedade Española de Hipnosis Clínica y ExpcrimcntaL Foram rCC(›nhccidos, também, seus méritos como psicotcrapcuta no lndianapolis Pastor Conseling Ccntcr. Foi profcssor de logoterapia na Universidadc Internacional de San Diego (Califórnia). Também lccionou nas universidades de Dallas e Pittsburg Em 1976, rccebeu o título de Cidadão Honorário da capital do Tcxas. Durantc 25 an(›s, (› professor Frankl foi diretor da Policlínica Neurológica de Viena c, desde sua fundação, o presidcnte da Sociedade Médica de Psicotcrapia da Áustria. 7Publicado em língua portugucsaz FRANKL, Vikror. Um psicólogo no campo dc concentração. Trad. de Nuno Santos. Lisboa, Astcr, s.d., 110p. 47 A PSICOLOGIA DO SENTIDO DA VIDA Sobre a logoterapia, existe vasta bibliograña, em dife- rentes idiomas. Sobre FrankL em língua espanhola, contamos com a obra de Pareia Herreraz v.e. Frankl (1984) e a tradução do livro do autor italiano Eugenio Fizzotti “De Freud a Frankl " (interrogantes sobre el vacio existencial), editado em Milão no ano de 1974 e traduzido para o Espanhol em 1977. Em Berkeley, na Califómia, foi fundado por Josefh Fabry um instituto de logoterapia que edita a revista “T/7e International Forum for Logotherapy" e na Universidade de São Francisco exíste na biblioteca a “Frank1 Library and Memorabilia”. Outros institutos similares existem em Viena e na Itália. Sobre o sentido da uida, várias pesquisas foram realizadas, comprovando os escritos da logoterapia de Frankl e indicando o uazio exístencial como causa de inúmeras neuroses, sobretudo nas tentativas de suicídios entre jovens americanos. Nos Estados Unidos, da autoria de James C. Crumbaugh e Leonard Maholick, saiu o “PIL-Test (The Purpose In Life Test)”* e em Viena, o Lo,g0-Test,9 da autoria de Elisabeth Lukas. Recebeu, segundo o website do Viktor Frankl Institute Vienna (viktorfrankl.org), 29 Títulos de Doutor Honorís Causa, concedidos por Universidades de diversos países, ínclusive no BrasiL A grandeza de Frankl não foi somente apreciada nas universidades. No corredor da morte da Penitencíária Esta- dual de San Quentin, também falou aos prisioneiros C0n- denados, tendo sido aceito como ex-prisioneiro e causando viva impressão com suas palavras ñrmes e humanas. “CRUMBHAUGH7.J.7&V MAHOLICK, L. Mmmal ofinstructions for the Purpose in Life TesLTnuL da Socicdude Latino Americuna de Logotcrapia. Muster, In- diana, Psychomemc Afñlliates, 1983. "LUKAS, Elisabcth S. Zur Validierung der Logotherapie. In: FRANKL,Viktor E. Der WiIlc Zum Sinn. Viena, Hans Huber, 1982. 344p. p. 275-305. 48 lZAR APARECIDA DE Momas XAusA Em 1982, a Argentina, ao fundar a Sociedade Argen- tina de Logoterapia, vinculou os grupos de Buenos Aires e Mendoza e, em 1983, deu-se a vinculação com 0 Brasil através da fundação da Sociedade Argcntino-Brasileira de Logoterapia. A traictória existencial de Frankl ultrapassou todas as fronteiras dos cinco continentes, tornando a logoterapia aceita em todas as partes do mund0. Na Améríca Latina, no ano de 1984, Frankl recebeu dois títulos de Doctor Honoris Causa: no Brasil, out0r- gado no dia 29 de abril, pela Pontifícia Uníversidade Católica do Rio Grande do Sul e o segundo concedido pela Venezuela. Nesta oportunidadg os reprcsentantes do continente latino-americano, reunidos no I Encontro Latino Americano Humanístico Existencial de Logote- rapia, com a presença de FrankL fundaram a Sociedade Latino Americana de Logoterapia, que integra Argenti- na, México, Chíle, Porto Ric0, Uruguai e Brasil, na qual o autor da logoterapía é seu presidentc de honra. Sobre o campeão do logos, disse em seu discurso de saudação 0 Dr. Ricardo Sardi: “Dr. Frankl viu 0 mundo transformado em vida e nós todos participantes dc sua causa” (Sardi, 1984(a): gravnçãoL Também nesta ocasião, pergunta 0 presidentc da Sociedade Argentino-Brasileira de Logoterapia, uma das entidades promotoras do evento:. - "A que pátria pcrtence anklÊ É ccrto quc o conceito de pátría varia para as pessoas. Há pessoas para as quais pátria é 0 terreno em que sc tcnha nascido. para outros a proporção geográñca de um território e ainda para outros a pátria é humanidade. Eu creio que para Viktor Frankl podemos dizer que a pátria é a llumanidadc!" (Sardi, 1984(a): gravação). Após a estada de Dr. Frankl em Porto Alegre, ele escreveu-me agradecido afirmando que o Brasil foi 0 lugar do mundo, onde ele mais recebeu homenagens 49 A PsICOLOGIA no SENTIDO DA VlDA afetuosas. Fícou, também, muito impressionado com 0 grande número de participantcs e (› grande entusiasmo dos mesmos. Em vista disso propôs que o próximo Congresso Mundial fossc aqui c solicitou que Dr. Fabry e ourros logotcrapeutas dos Estados Unidos e Canadá se Comunicassem comigo. Porém por motivos de saúde de um familiar não consegui atender seu pedido. Voltou ao Brasil cm 1986 para prcsidir um Encontro Nacional de Logotcrapia em Brasília e no mesmo ano, mais tarde, presidiu o 1° Congresso Brasileiro de Logoterapia, no Rio de Janciro. Em 28 de março de 1995 complctou 90 anos e foi agraciado com a mais importante condecoração pelo Presidente da Áustrim Estcndidas as cclcbraçolxs ofíciais referente ao seu aniversárim foi realizado em maio do mesmo ano um grande Congresso Mundial de L0go- terapia na Univcrsidade de Viena. Cclebraçócs festivas em caráter oñciaL também, na Prcfeitura de Viena. Uma comitiva brasileira, coordenada por mim, representou nosso país em todas as Cclcbraçõcs e tevc a oportunida- de ímpar de estar com Dr. Frankl em sua residência. Nesta ocasião ofereceu-me seu último livro biográñco intituladoz “O que não está escrito em meus livr(›s”, h0je, já traduzido para 0 português. Aos 19 de julho de 1997 celebrou com Elly 50 anos de matrimônio. Seguramente não houvc outro cientista da Psicologia tão reconhecido no mundo pela sua obra, agraciado e honrado em várias universidades dos cinco continentes. Faleceu em 2 dc setembro de 1997. De sua união com Elly teve uma ñlha Chamada Gabrielle, casada com Sr. Franz Versely, dos quais nasceram 2 netosz Katharina e Alexander. Todos os jornais do mundo 0 homenagearam, Consi- derando-o “um dos maiores nomes do século XX”. De Dr. Frankl ouvimos com gratidãoz “Minha Pátria é o lugar onde me entendem”. 50 Estc “enrcndcr” não se prendc a um aspccto mcra~ mente intelectuaL mas certamente afetiv0. Dr. Frankl ensinou-nos acima da teoria a trcr uma convívência de doação. Em discurso cm homcnagem aos médicos mortos pela tirania do nazismo disse: “eu estendo a mão acima de todos os túmulos dos COlegas sacriñcados e o perdão acima de todos os ódios”. Portamo, devemos seguHo não só na doutrína, massobre tudo na doação de vida que vcm coroar 0 sentido de sua vida. TPARTEH o HOMEM, A LOGOTERAPIA E o CONTEXTO HISTÓRICO-CULTURAL “Se eu desejar trabalhar com pessoas, sob qualquer ponto de vista demro da psicologia, vou basear-me em umn te- oria determinada, neste caso deveria ter o mínimo de informações acerca das circuñstâncias históricas em que viveu aquele a quem ocorreu esta teoria e poder deixar de Iado o pura~ mente circunstancial e o que é valido fora deste contexto”. HORÁCIO CABALLERO CONTEXTO FILOSÓFICO- CIENTÍFICO ANTERIOR A FRANKL 1.1 - Características do pensamento fílosófico- cientzfco do século XIX A história cultural apresenta-nos três momentos, clas- sificados no livro de Fizzoti, em três grandes giros his~ tóricos: cósmico de Copérníco, emo-antropológico de Darwín e sociológico de Marx. Herrera acrescenta 0 giro psicanalítico de Freud (Pareja Herrera, 1984(a):85-7). Estes giros mudaram respectivamente as visões sobre o cosm(›s, sobre a origem da espécie humana, sobre as es- truturas histórico~sociais e sobre as fontes do comporta- mento humano. Estes gíros incluíram elementos deterministas e relativistas, e podemos verificar que no campo cientíñco apareceu em conseqüência delesz 1 - Um determinismo genétic0; 2 - Um pan-determinismo psicossexual; 3 - Um determinismo sociaL Na revolução cosmológica, a Terra deixa de ser con- siderada o centro do Universo e passa a ser um mundo entre os muitos outros mundos Clas grandes galáxias do ñrmamento. A scgunda revolução, que descreve as or¡- gens do homem, dcclara a espécie humana como uma parte na escala dos seres animados; a terceíra proclama a dependência dos acontecimcntos sociais aos econômícos c ofercce uma revisão das estruturas sociais e históricas. A ps¡'canalític.1', por sua vez, descobrindo um mundo tão insondável como o das galáxias, mostra que 0 compor- tamento humano não é apenas consciente, nem se move exclusivamente na liberdade. Estes gir(›s, que mostram o determinismo da terra às leis dos sistemas solares, o determinismo do univer~ so do homem à evolução da raça e do reino animal, o ;Ó' 7 A PSICOLOGIA DO SENTIDO DA VIDA determinísmo da sociedade às leis da evolução socio- econômica e o determinismo do comportamento do ho- mem ao poder das forcas instintivas, tiveram influências marcantes na cultura e oríginaram posições Hlosóñcas e teorias psicológicas diversas e importantes, marcando o pensamento cultural que lhes seguiu. Na segunda metade do século XIX, só havia um meio de compreender a narureza e esclarecer seus mistérios. Era a época de Darwin na biologia, de Mendel na genética, de Fechner e suas leís de conservação da energia. Era a época dc Lord Lister e do ínícío da bacteriologia, 0 tempo do microscópio, do tubo de ensaio e do galvanômetro. Na nova era da ciência natural, as Coísas que não podíam ser observadas, medidas, pesadas e provadas não merecíam atenção. Tenta-se aplicar os princípios e os métodos das ciências à fílosoña, com a esperança de se Conseguír profundos resultados na solução dos problemas do mundo e da vída. Assim, ao final do século XIX, devido ao grande progresso das ciências naturais, particularmente as ciêncías bíológicas e ñsiológicas, a ñlosoña ataca e deprecia toda investígação metafísica idealista e vai desembocar no naturalismo e no posítiuisma Sobre este rumo do desenvolvimento cultural nos fala Bochensky: “... o progresso das ciências da natureza havia suscitado a formação de uma imagem materíalisra do universo, que foi se ampliando, tanto mais que não havia então ñlosoña capaz de lhe oferecer resistência” (Bochensky, l962.-27). As características fundamentais desta nova ñlosofía foram o mecanicismo, que explica toda a estrutura dinâ- míca da realidade conforme as leis mecânicas e o sub/Ae- tivismo, que centraliza seu ínteresse no sujeito humano. A consideração das teorias e princípios da física como absolutos geraram o absolutísmo e o materialísmo, que via a matéria como o dado mais simples e sensível a ser reduzido logícamente. Seguiu-se a esta tendência o empi- rocriticismo, originado no ponto de partida positiw'sta. 56 IZAR APARECIDA DE MORAES XAusA No século XIX, indentiñcou-se a razão com a razão mecânica das ciências. Sob a forma e a influência do darwinismo transferiu-se para a vida a visão mecânica do mundo. O positivismo, que ocupou mais ou menos a segunda mctade do século XIX em todo 0 mundo civílizado, añrmou que a única realidade exístente era a rcalidade física, isto é, o que se podia atingir cientiñcamente. “A lei única e suprema que domína o mundo conccbído, posin'visticamente, é a evolução necessária de uma indefectível energia naturalisra, como resultado das ciências naturais” (Padovani, 19541376). A ciência posítiva é a cíência pura. Nega, portanto, a metafísica e desenvolve uma gnoseologia positivista, gera o agnostícismo religioso, Considerando unicamente concebível 0 que é do domínio da Cíência. Propugna uma redução imanentista e, em conseqüência, añrma que a ñnalidade suprema do homem é materiaL 0riginando, assim, o materialismo. O positívismo oferece várias perspcctivas distintas: o positivismo cientiñcista, 0 materialismo e o evolucionismo mecânicos, e sintoniza com o empirismo. Encontramos, também, tendências naturalistas abarcando 0 biologismo e 0 ñsiologismo e, na aprcciação de Padovani, um realismo ingênuo, em alguns casos. Assim 0 positivismo: “mais que uma dourrina ñlosóñca, foi um métod0, uma forma mentis, isto é, qualquer quc seja o objeto da investigação considerar-se-á a experiência como único critério de verdade” (Sciacca, l970.'546). 1.2 - A psicanálíse de Freud e a concepção do Ioomo natura Não só nas ciências físicas, matemáticas e bioñsiológicas se realizaram progressos, mas particularmente a psicologia tomou novos rumos através da psicologia experimental e do aparecimento da psicologia dinâmica. 57 A PSICOLOGIA DO SENTIDo DA VIDA No âmbito das ciências psícológicas houve também uma reação à psicologia racional e uma valorização dos aspectos psicogenéticos e psicofísicos. Foi na psicologia, na apreciação dC B(›chcnsky, quc sc manifestaram com força especial as correntes materialistas. Entre as principaLs correntes destacou~sc o bel7aw'orísmo, fundando por John Watson (1878-1959), que é uma metodologia cientíñca que rejeita a íntrospecção e não aceita os fenômenos anímicos como anímicos internos, admitindo como objeto da psícologm o comportamento extcrno (behavior) e a reflcxologia de Ivan Pavlov (1849- 1936) que explíca os rcHexos condicionados ou inibidos, reduzíndo a estes as funções psíquicas superiorcs. A psicanálise de Sigmund Freud, segundo aquele aut0r, é considerada como 0 movimcnto psicológico mais importante procedente do empirismo. “Freud, que aceita 0 princípio fundamental do mecanis~ mo evolucionisra, segundo 0 qual o Supcrior sc explica pelo inferior. defende a tese de que a vida da consciência não é ou~ tra Coisa senão o resultado de um jogo puramcnre mecânico dos elemenros da °subconsciência'. Os fenômenos psíquicos superiores todos não são mais que “suhlimações” do impulso erótico. Assim, Freud elaborou sistemas que explicam a reli- giã0, a arte, etc.” (Bochensky, l979z46). A ínterpretação psicanalítica dO ser-h0mem prende-se, por sua vez, unicamente à descrição e à interpretação do psícofísic0, baseada em Conceiros físiológiC0-mecanicistas e numa vísão antropocêntrica do homem, que não ultrapassa o imanente. Freud (1856-1939), o criador da psicanálise e 0 gênio da psícologia moderna, colaborou incontcstavelmenta de forma deñnitiva, para o progresso desta ciência e é a expressão do cspírito cientíñco da ép0ca, repudiando em nome deste a metafísica. Expressou isso em carta a Pñster: “Tem você razão ao recordar que a análise não nos leva a nenhuma Concepção do mundo. Não necessito dela, 58 IZAR APARECIDA DE MORAES XAUSA pois descansa sobrc a conccpção cientíñca gcral do mundo“ (Freud, apud Plc, l952zl45). A psicanálise, Como sistema psicológico, é antes de tudo
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