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Capítulo Fatores ecológicos Fundamentos em Ecologia 93 Objetivos Descrever as relações de convivência que se processam entre os orga- nismos no ambiente em que vivem. Mostrar as principais associações simbióticas que ocorrem entre os seres vivos; Discutir os principais mecanismos de defesa das plantas contra a herbivoria. 1. Fatores bióticos Em ecologia, existem estruturas funcionais (Figura 40) que estabelecem uma hierarquia natural dos sistemas ecológicos. Organismo: Ecossistema: Fluxo de energia e ciclo de nutrientes Interações entre as populações Processo Global Figura 40 – Hierarquia das estruturas funcionais BONILLA, O. H., DE LUCENA, E. M. PEREIRA. 94 O organismo é a unidade básica da Ecologia, o sistema ecológico ele- mentar. O agrupamento de indivíduos de mesma espécie, em um determinado local, denomina-se população. A interação entre várias populações determinam as comunidades. A junção entre diferentes comunidades interagindo com o formam os ecossistemas. O intercâmbio entre todos os ecossistemas do plane- ta constituem a biosfera. A Figura 41 esquematiza essas relações. Figura 41 – Esquematização dos agrupamentos naturais de espécies até a constitui- ção da biosfera. Todos os organismos interagem de diversas maneiras, originando um con- entre indivíduos da mesma espécie ou entre organismos de espécies diferentes. Fundamentos em Ecologia 95 Fatores bióticos representam todos os efeitos causados pelos organismos presentes em um determinado ecossistema e suas relações. A presença ou a ausência de determinados tipos de organismos pode constituir um fator determinante para a ocorrência ou não de outro tipo de organismo no ambiente. Por exemplo, para uma população de predadores, a presença ou não de uma população de presas determina sua ocorrência em um determinado ambiente, sendo, portanto, um fator preponderante na sua distribuição. Outros organismos alteram as condições do meio, de forma a permitir que determinados organismos colonizem o ambiente. Essas intera- ções entre os organismos originam um conjunto de associações e de inter- simbiose67. O Quadro 2 mostra as principais interações entre os seres vivos: Quadro 2 Fonte: DAJOZ, 2005. 1.2. Tipos de simbiose É empregada usualmen- te também para descrever a biologia de pares de organismos que vivem jun- tos e que não se maltratam. 67Simbiose (palavra originada do grego: syn = juntos; bios = vida). É associação entre duas ou mais espécies distintas, a qual permitir-lhes viver com vantagens recíprocas. BONILLA, O. H., DE LUCENA, E. M. PEREIRA. 96 2. Competição Competição é uma interação entre indivíduos que compartilham uma quantida- de de recursos limitada, que leva à diminuição ou à redução da sobrevivência, do crescimento e/ou da reprodução desses indivíduos. A competição ocorre em duas circunstâncias: 1ª) quando indivíduos da mesma espécie ou de espécies diferentes buscam e exploram o mesmo recurso, que está presente em quanti- dade limitada; 2ª) quando os indivíduos se prejudicam, mesmo quando não há - nuição da constituição individual do organismo para próxima geração. O uso ou a defesa de um recurso68 por um indivíduo reduz sua utilização por outro indivíduo. Portanto, tem-se um efeito que depende da densidade dos seres, pois, quanto maior for o número de envolvidos maior será a utilização, per capita, dos recursos, e mais deletérios serão os efeitos sobre a totalidade dos indivíduos. O efeito da competição entre espécies é negativo sobre suas popula- ções. A espécie que será mais prejudicada será a que tiver a menor capacida- de de utilizar os recursos em comum. Se as espécies não tiverem habilidades iguais para explorar determinados recursos, uma vai ser necessariamente mais Pode-se dividir a competição em dois tipos básicos: a) por exploração (por recurso): quando uma espécie consegue obter um recurso de modo mais recursos. Por exemplo, formigas que fazem recrutamento em massa (forragean- do de forma organizada com trilhas químicas e/ou físicas) e exploram um inseto morto de tal modo que outras espécies de formigas, que utilizam forrageamento solitário, podem não ter nem tempo de encontrar o recurso; e b) competição por interferência ou explotativa: ocorre quando os organismos envolvidos na in- teração causam algum tipo de malefício ou de prejuízo, mesmo que o recurso disputado não esteja necessariamente em falta. Nesse tipo de competição, os indivíduos protegem o seu recurso por meio físicos e/ou químicos. - pulacional dentro da espécie, de um modo que depende da densidade. A competição, ou seja, a quantidade de indivíduos de cada espécie, em um ambiente limitado, poderá proporcionar a exclusão de alguns indivíduos, mo- 68Os recursos procurados entre os indivíduos podem ser: alimento, abrigo, local outros. Fundamentos em Ecologia 97 2.1. Subdivisões da competição Schoener e Rickfels (1996) subdividiram a competição em outras categorias a) Competição de consumo: quando ocorre uma acentuada competição por recursos que são renováveis; b) Competição de ocupação: quando o recurso em questão é a utilização de espaços livres; c) Competição de crescimento: quando o processo competitivo ocorre so- bre recursos (luz, água e nutrientes) que fazem com que uns organismos cresçam em taxas maiores do que outros; d) Competição química: quando a produção de substâncias químicas área por outros indivíduos (alelopatia)69; e) Competição territorial: defesas do espaço; f) Competição de encontro: interação transitória em torno de um recurso que pode resultar em perda de tempo e/ou de energia, em roubo de co- mida ou em dano físico. A competição e a predação são as interações que mais têm atraído a atenção dos ecólogos, talvez pelo fato de serem frequentemente observáveis - ções, como: I) Competição intraespecífica70: ocorre entre os membros de uma mesma espécie ou, mais precisamente, entre os membros de uma dada popula- ocorre entre orga- nismos pertencentes a espécies diferentes, disputando um mesmo recur- so e meio. O recurso disputado é, na maioria das vezes, alimento, água, luz, espaço físico para reprodução, descanso, etc. 2.2. A Competição entre vegetais - cido o fenômeno para o qual Schimper71, em 1898, chamou a atenção do A luta mencionada é fácil de perceber, pois as plantas travam-na desen- volvendo mecanismos que fazem as copas de umas árvores se colocarem assim do economizando material que é utilizado na construção do tronco, ou do 69Alelopatia é a produção e a adifusão, no ambiente, de substâncias químicas capazes de matar ou deimpedir o desenvolvimento de outros organismos. 70Competição entre indivíduos da mesma ocorre entre indivíduos de espécies diferentes. A competição e a predação são as interações que mais têm atraído a atenção dos ecólogos, talvez pelo fato de serem frequentemente observáveis na natureza. 71Andreas Franz Wilhelm Schimper (1856 – 1901) foi um botânico francês de origem alemã. Contribuiu nos campos da histologia vegetal e da ecologia. Schimper, A. F. W. Fonte: GOOGLE, 2011. BONILLA, O. H., DE LUCENA, E. M. PEREIRA. 98 eixo principal, e que eleva rapidamente as folhas sobre as demais plantas; ou, - xuosos, que usam, como suporte, os troncos e os ramos de outras plantas, nas - tícias curtas, ramos numerosos e curtos; ou, ainda, dispensando totalmente os troncos porque suas sementes são colocadas no cimo de uma árvore alta, onde entre tantas outras), formando raízes aéreas que descem em procura do solo e, do lado oposto, ramos com folhas que captam luz (Figuras 4.3 e 4.4). Figura 42 – Competição entre espécies de plantas em bosque tropical. Fonte: Larcher (1973). Figura 43 – Competição subterrânea entre raízes de plantas em um ambiente semiárido. Fonte: Larcher (1973). Nas matas citadas, porém, trava-se outra luta menos aparente, menos fácil de perceber: a luta pelos nutrientes, pela água e pelo oxigênio. Às vezes, tudo ocorrendo simultaneamente,outras, em separado. Essa luta é menos apa- Fundamentos em Ecologia 99 rente porque é travada pelas raízes no interior do solo. Vejam alguns exemplos: na Amazônia, podem se encontrar alguns tipos de formações vegetais muito densas e ricas em espécies. As árvores têm, geralmente, um porte médio rela- tivamente elevado. O solo, muitas vezes, é paupérrimo e coberto de água permanentemen- te (igapós) ou por um longo período, são conhecidos como solos de várzeas baixas. As plantas que vegetam nesse solo pobre e encharcado formam uma trama de raízes que disputam espaço umas com as outras, estendendo-se mui- coladas aos troncos, numa altura de alguns metros, como enormes tábuas (raí- zes tabulares ou sapopembas72 – Figura 44). Essas raízes, em contato com o ar atmosférico, retiram dele, diretamente, o oxigênio necessário a sua respiração. Em outras matas do Brasil pode-se ter um período de seca relativa, com vários dias sem chuvas. As plantas que não são adaptadas a isso podem perder a competição para outras capazes de suportar tal período de seca. Natural- mente, como no caso da luta pela luz e da luta por nutrientes: água e oxigênio, vencem as espécies melhores adaptadas para essa luta ou competição. - cies do mesmo fator, mas pela tentativa (consciente, no caso do Homo sapiens sapiens, ou inconscientemente, no caso das demais espécies de animais, de vegetais e de microrganismos) de eliminação de uma pela outra. A secreção de substâncias que uma espécie agressora produz e tolera, a outra espécie atingida não suporta. Por exemplo, os microorganismos que produzem álcool etílico, em seus processos fermentativos, eliminam vários outros tipos de microorganismos. Figura 44 – Raízes tabulares de uma árvore amazônica. Fonte: www.amazonia.org.br 72Sapopembas: o nome é originário da árvore Sapopema, espécie comum na Amazônia que desenvolve raízes de até 2 metros de altura ao redor de seu tronco. Mesmo que raízes tabulares. BONILLA, O. H., DE LUCENA, E. M. PEREIRA. 100 Conhecem-se muitos casos de plantas que eliminam, no solo, por suas folhas caídas ou por suas raízes, substâncias inibidoras do crescimento de outras espécies. Elas mesmas não são inibidas por essas substâncias, ao menos nas concentrações em que elas habitualmente se encontram. Às ve- zes, há competição por espaço somente. Isso se nota melhor entre os ani- mais. Em muitas espécies, o macho delimita e defende o seu território, com o outros, distribuídos quase uniformemente, como se tivessem sido plantados. Provavelmente, o suprimento de água, muito limitado, permite a sobrevivência de um indivíduo apenas em determinada área. Como é de supor que mais de uma semente dessa espécie tenha sido depositada na área considerada, deve ter havido uma competição entre os indivíduos oriundos dessas semen- tes, tendo sobrevivido apenas um. O que foi apontado no parágrafo anterior é uma competição intra- sabe que elas são muito densas e ricas em espécies. Em geral, os indivíduos de uma espécie se distribuem no território, a certa distância (às vezes consi- derável) uns dos outros. Na Amazônia, por exemplo, os coletores de látex de seringueira (Hevea brasiliensis) têm que fazer grandes percursos colocando as canequinhas em que o látex é recolhido, e, depois, novamente, para reco- lher o látex exsudado das feridas feitas nos vários indivíduos, que estão muito distantes uns dos outros. 2.3. Julgando a ocorrência de competição Alguns critérios podem ajudar a estabelecer se duas espécies estão em com- - drez” (checkerboard pattern), no qual a presença de uma espécie, em dado local, praticamente garante a ausência da outra. São eles: I) Existência de sobreposição no uso de recurso potencialmente limitante; II) III) IV) Uma ou mais espécies é (são) negativamente afetada(s). A competição pode ainda ser subdividida de acordo com a forma como se manifesta nos organismos envolvidos. Assim, poderá se dar por recursos e por interferência (ou competição explotativa), conforme mencionado anteriormente. Fundamentos em Ecologia 101 3. Predação O predatismo é a relação em que uma espécie animal predadora a se alimenta de indivíduos de outra espécie animal, as presas. Contudo, durante o seu ciclo biológico, o predador consome sempre mais de um espécime da presa. e o consumo da presa. Todavia, de modo geral, a predação seria o consumo herbivoria e parasitismo seriam tipos especializados de predação. Alguns au- Quadro 3 A predação envolve vários aspectos adaptativos do predador para cap- tura das presas e várias adaptações da presa para fugir do predador. Esse jogo biológico de caça e caçador dos organismos é denominado de “corrida armamentista” (ou army race). Um exemplo típico disso é quando a gazela de Thompson e o guepardo (cheetah), predador e presa respectivamente, estão literalmente apostando uma corrida entre a explosão de arranque e velocida- de do predador e da agilidade e capacidade de perceber a aproximação do algoz por parte da presa (Figura 45). BONILLA, O. H., DE LUCENA, E. M. PEREIRA. 102 Figura 45 – A luta pela sobrevivência entre a gazela de Thompson e o guepardo. Fonte: GOOGLE (2011). Geralmente, pensa-se em predadores e presas a partir de uma relação de tamanho (antílope-felino, foca-orca, coelho-raposa), mas existem grandes predadores que se alimentam de presas muito pequenas, como, baleias que caçam krill73. O mais importante nessa relação são as adaptações morfológi- cas e comportamentais que os predadores desenvolvem para se especializa- rem em determinados tipos de presa e as adaptações que as presas desen- volvem para escapar da predação. ato de um animal consumir outro organismo para dele alimentar-se. Esse ato envolve sempre a morte da presa, que pode ser imediata ou pode acontecer durante um processo de exaustão (consumo das reservas da presa pelo pre- 3.1. Tipos de predação Existem cinco tipos diferentes de predação, quais sejam: a) Carnívoros de primeira ordem: são os predadores típicos, consumidores de herbívoros; predadores de carnívoros; c) Herbívoros: podem consumir uma planta inteira ou partes dela, como se- d) Insetos parasitoides: predadores que depositam seus ovos sobre ou pró- ximo ao hospedeiro que será subsequentemente consumido (exaurido) pelas larvas (formas jovens) do parasitoide. [Nota: aqui, tratando-se dos in- setos, há alguns pesquisadores, como J. H. R. Santos, que fazem restrição 73Krill é o nome coletivo dado a um conjunto de espécies de animais invertebrados semelhantes ao camarão. Esses pequenos crustáceos são importantes organismos do zooplâncton, especialmente porque servem de alimento a baleias, a jamantas, a tubarões-baleia, entre outros animais. O termo krill é de origem norueguesa, sendo derivado do neerlandês kriel, que designa peixes acabados de nascer ou em fase juvenil. Espécie de animal que faz parte do grupo denominado Krill. Fonte: www.pt. wikipedia.org Fundamentos em Ecologia 103 - -os em endoparasitas (postura efetivada dentro do corpo do hospedeiro) e exoparasitas (postura consumada fora do corpo do hospedeiro). Neste completar o seu ciclo biológico]; e) Canibais: são predadores que consomem indivíduos da própria espécie. A predação é um dos fatores ecológicos mais importantes, pois afeta não somente as populações, mas também toda a comunidade. 3.2. Estratégia de fuga das presas Proporcionalmente ao número de estratégias de caça dos predadores, exis- tem estratégias de fuga da presa. No caso da baleia e do krill, - ginar que este último possa ter alguma estratégia de defesa. Mas as presas menores podem se esconder, lutar, fugir, ter gosto ruim ou produzir substân- cias químicas que afastem os predadores (Figura 46). Por exemplo, em locais abertos, onde não se pode fugir ou se esconder, manter-se atento e ser capaz de detectar o predador torna-se imprescindível. Figura 46 – Coleóptero bombardeiro (exemplo de presa que tem adaptações para escapar dos predadores, por meio daemissão de substâncias químicas). Fonte: RICKLEFT (2001). Uma adaptação muito interessante das presas é a que se refere à colo- ração de advertência, como uma forma de avisar ao predador que a presa pos- sui toxinas defensivas. Esse processo é denominado aposematismo e segue padrões bastante constantes na natureza. Geralmente, envolvem a presença de listras avermelhadas, amareladas e/ou pretas. Um pássaro (predador inex- periente), que prova uma borboleta com um padrão aposemático (com sabor desagradável), não comerá novamente algo com um padrão semelhante. Diz- -se que esse padrão passou a ser evitado pela imagem de procura do predador. BONILLA, O. H., DE LUCENA, E. M. PEREIRA. 104 Esse tipo de associação, padrões de cores com sabores ruins, ocorre frequente com predadores que se orientam visualmente na procura da presa (aves, lagar- tos, mamíferos etc.). Como na natureza cada estratégia bem sucedida (leva a uma maior reprodução diferencial de quem a possui) pode acabar favorecendo táticas alternativas oportunistas, alguns grupos de animais que não possuem as de- fesas químicas e que, consequentemente, não têm o gosto ruim, imitam os padrões de cores dos animais tóxicos. Com esse padrão de aposematismo presente, esses animais passam a não ser comidos, mesmo pelos predado- res experientes. Chama-se esse processo de mimetismo batesiano, em ho- menagem ao seu descobridor, o grande naturalista Henry Walter Bates74. Esse processo adaptativo oferece vantagem se as densidades da presa palatável75 forem mais baixas que as densidades dos animais impalatáveis. Porém, se as densidades forem semelhantes, ou se a presa palatável for mais abundante, os predadores não chegam a associar cor/forma com impalatabili- dade e ambas as populações (modelo e mímico) serão prejudicadas. Em outro tipo de mimetismo, no mimetismo mulleriano (em homenagem a Johann Friedrich Theodor Müller76), diferentes grupos próximos de animais impalatáveis repetem os mesmos padrões de coloração. Neste caso, as es- pécies miméticas reforçam o modelo de advertência. A estratégia oposta ao “olha que eu estou aqui, mas sou ruim de virar presa ou o predador se confunde com as características da paisagem; por exemplo, a coloração e disposição da vegetação. Boa parte dos peixes pelá- gicos é escura na parte dorsal do corpo, para serem confundidos com o fundo do oceano por predadores que os olham de cima; e claro na parte ventral, encontro junto aos predadores de fundo. - Algumas mariposas apresentam um complexo padrão de defesa quando, em situação normal com o meio, a partir de um determinado estímulo, abrem suas asas, apresentando padrões de falsos olhos, o que assustaria o preda- dor, afastando-o. As estratégias de defesa das presas podem ter muitas outras táticas, como utilização de refúgios, agregação em cardumes, em bandos e em ninhais, entre outras. 74Henry Walter Bates (1825 - 1892) foi entomólogo e naturalista inglês. Realizou uma viagem à Amazônia, junto com Alfred Russel Wallace, com o objetivo de recolher material zoológico e botânico para o Museu de História Natural de Londres, permanecendo no Brasil durante onze anos. Catalogou cerca de 14.712 espécies, as quais foram enviadas para a Inglaterra. 75 um animal de gosto agradável ao paladar de um predador. Já um animal oposto.. 76Johann Friedrich Theodor Müller (1822 - 1897) foi professor de Ciências Naturais e de Matemática, sendo o pioneiro em apoiar a teoria da evolução apresentada por Charles Darwin. Fundamentos em Ecologia 105 Figura 47 – (A) O bicho-pau pode ser confundido com galhos secos. (B) A borboleta se confunde com o substrato de rochas de granitos. Fonte: OHB, 2008. 4. Defesa das plantas contra herbívoros As plantas, por serem imóveis, estabelecem estratégias de defesa que se ba- seiam em evitar a predação dos herbívoros (Figura 48). Entre as defesas físi- espinhos; pelos; dureza e textura da folha; proteção externa da semente, por invólucro resistente; entre outras. No entanto, a maior defesa das plantas está no seu arsenal químico. Esses compostos tóxicos, denominados de substân- cias secundárias, inibem ou impedem o consumo das plantas pelos herbívoros. Os compostos secundários mais importantes são os taninos, os alca- vegetais, óleos essenciais e látex), que são compostos de grande impor- - macêuticos. Outra defesa muito utilizada é o baixo conteúdo nutritivo dos tecidos vegetais, uma vez que os herbívoros selecionam seus recursos pelo seu conteúdo nutricional (Figura 49). Tecidos com alto conteúdo de celulose só podem ser explorados por organismos adaptados para digerir e retirar energia desse polímero. BONILLA, O. H., DE LUCENA, E. M. PEREIRA. 106 Figura 48 – Resposta das plantas a herbivoria. Os herbívoros, em reação à adaptação das plantas, desenvolveram me- canismos de digestão e de excreção de substâncias secundárias, tornando- -se especialistas em plantas que são venenosas para a maioria das espécies. Fundamentos em Ecologia 107 O resultado do efeito desses especialistas sobre a concentração de populações de plantas, utilizadas como recurso, é bastante conhecido pelo homem. As mono- culturas são grandes áreas onde estão concentrados recursos que um herbívoro especialista pode transformar rapidamente em novas gerações de especialistas. Boa parte das pragas agrícolas é resultado dessa binômia especializa- ção-concentração de recursos. Em uma área natural, os recursos geralmente estão em um grande espaço e, muitas vezes, dispersos de forma variável no tempo, sendo necessário um grande gasto energético para encontrá-los. Além disso, as quantidades de recursos, nesses ambientes heterogêneos, não comportam o desenvolvimento e o crescimento de uma grande prole. Através das condições ideais, criadas nas monoculturas, o inesperado seria o não surgimento do que denominamos pragas. 4.1. Amensalismo O amensalismo, também chamado antibiose, ocorre quando os membros de uma espécie eliminam substâncias que prejudicam o crescimento ou a repro- dução de outras espécies com as quais convivem. Geralmente, há vantagens indiretas para o organismo que provoca inibição de outro. Diversas espécies de fungos77 presentes no solo, por exemplo, liberam substâncias antibióticas, que atacam bactérias. Dessa forma, evitam a competição com as bactérias por alimento. Certas plantas, como o eucalipto, liberam, em suas raízes, substân- cias que impedem a germinação de sementes ao redor, evitando-se que outras plantas venham a competir com elas por água e por outros recursos do solo. O amensalismo é conhecido também como uma interação, em que uma das espécies causa efeitos negativos na outra, mesmo que a primeira não tenha qualquer efeito (bom ou ruim) sobre a segunda. Diferentemente de outras relações, no amensalismo, o organismo que causa o efeito negativo, em muitos casos, não tem qualquer vantagem, nem em termos de benefícios de obtenção de recursos nem em termos competitivos. Um rebanho bovino, por exemplo, ao caminhar sobre uma pastagem, pisoteia inúmeras plantas, ainda que sem nenhum interesse em se alimentar. Contudo, ao serem pisote- adas, essas plantas perdem, em termos de capacidade de sobrevivência e de reprodução, em relação às não pisoteadas. 4.2. Parasitismo Alguns autores consideram o parasitismo como algo diferente da predação, porém algumas características particulares devem ser ressaltadas. No parasi- tismo, o parasita (predador) é, geralmente, menor do que o hospedeiro e apre- senta uma relação de especialidade variável, podendo ser endoparasita78 ou 77Diversas espécies de fungos presentes no solo liberam substâncias antibióticas que atacam bactérias. Dessa forma, evitam a competição com as bactérias por alimento. BONILLA, O. H., DE LUCENA, E. M. PEREIRA. 108 ectoparasita (Figura 50). Contudo, em todo caso, sempre consome um único espécime do hospedeiro para completar o seu ciclo biológico. Figura 50 – A erva-de-passarinho (Tripodanthusacutifolius Ruis & Pav) possui raízes sugadoras ou haustórios que penetram no tronco do hospedeiro, retirando deles a seiva elaborada, debilitando a árvore e podendo causar-lhe a morte. Fonte: www.plantasonya.com.br/plantas-parasitas/. - culdades encontradas por um parasita, para completar seu complexo ciclo de vida, estão na localização e na infecção de novos hospedeiros. Uma interes- sante situação criada por essa associação é a que o parasita retira parte da capacidade de sobrevivência em gerações do hospedeiro, mas sua própria sobrevivência em gerações depende dele para não ser extinto. o hospedeiro é uma praga. Essa espécie, que se desenvolve rapidamente numa monocultura, pode ter sua população controlada quando se descobre infestação, pelo parasita, reduz consideravelmente a infestação pela praga (por exemplo, o controle biológico79). 78Endoparasita é o termo dado ao parasita que vive no interior do corpo do seu hospedeiro (ex.: solitária, lombriga). Já o termo ectoparasita refere-se ao parasita que vive externo ao corpo do hospedeiro (ex.: pulga, percevejo das camas). 79Controle biológico consiste no emprego de um organismo (predador, parasita ou patógeno) que ataca outro que esteja causando danos econômicos às lavouras. Essa técnica é muito utilizada em sistemas agroecológicos. Fundamentos em Ecologia 109 Saiba Mais O controle biológico consiste no emprego de um organismo (predador, parasita ou - - - - - - dução dos agentes de controle biológico, graças a técnicas simples e de baixo custo - - - - - - - - - - BONILLA, O. H., DE LUCENA, E. M. PEREIRA. 110 - Vale ressaltar que, segundo os princípios da Agroecologia, a superação do proble- ma do ataque de pragas e de doenças só será alcançada por meio de uma abordagem - Fonte: Jornal “A Folha de São Paulo”, caderno “Agrofolha”, 1998. O modo de vida parasitário é muito mais comum na natureza do que se imagina. Há, inclusive, algumas famílias de insetos que são inteiramente pa- rasitas (por exemplo, os himenópteros80 da família Braconidae). Nos Quadros 4 e 5, são apresentados exemplos de algumas interações entre seres vivos. Quadro 4 Quadro 5 80Os himenópteros, insetos altamente evoluídos, destacam-se pela especialização para a vida social. Constituem uma ordem com mais de 120.000 espécies já reconhecidas, ocorrem em todas as faunas e compreendem as abelhas, vespas, formigas e outros insetos, muitos dos quais são chamados microimenópteros. Os himenópteros se caracterizam pela metamorfose completa que sofrem, pelo aparelho bucal dotado de mandíbulas, pelo abdome com o primeiro segmento incorporado ao tórax e pelas quatro asas membranosas de nervulação reduzida, embora, em alguns casos, sejam ápteros, ou seja, desprovidos de asas. Em certas espécies, a nervulação das asas reduz-se tanto que desaparece, o que pode estrutura do tórax. Fonte: www. biomania.com.br Fundamentos em Ecologia 111 Resumo descritivo das relações entre seres vivos: indivíduos unidos que atuam em conjunto e que, às vezes, repar- tem funções. Ex.: corais; b) Sociedade: indivíduos independentes que são organizados cooperativa- mente. Ex.: abelhas. indivíduos concorrem pelos mesmos recur- sos do meio. Esse tipo de relação existe em praticamente todas as espécies. a) Protocooperação: não é obrigatória. Ex.: caranguejo-eremita e anêmona-do-mar; b) Inquilinismo: indivíduo usa outro como moradia, sem prejudicá-lo. Ex.: c) Comensalismo: indivíduo usa restos da alimentação de outro, sem preju- dicá-lo. Ex.: hienas, que aproveitam restos das presas dos leões; d) Mutualismo: - mental à sobrevivência de ambos. Ex.: algas e fungos que formam liquens. indivíduos com nichos ecológicos similares competem por recursos do meio. Ex.: animais que se alimentam do mes- mo tipo de planta; b) Amensalismo: relacionamento no qual os indivíduos liberam substâncias que inibem o crescimento de outros. Ex.: fungos que liberam antibióticos contra bactérias; c) Herbivorismo: animais (herbívoros) que devoram plantas. Ex.: gado, que se alimenta de capim; d) Predatismo: animais (carnívoros) devoram outros animais. Ex.: gavião, que devora outros pássaros e roedores; e) Parasitismo: indivíduo que vive à custa de outro, causando-lhe prejuízos, mas que geralmente, não leva à morte. Ex.: lombrigas que parasitam o in- testino humano. 4.3. Protocooperação Surge quando algumas espécies formam uma associação que não é indispen- sável, pois cada uma pode viver isoladamente. São os casos de simbioses, por exemplo, entre o caranguejo-eremita e as anêmonas-do-mar81 (Figura 51); as plantas e seus polinizadores ou seus agentes dispersores; a acácia e suas 81A interação mantida entre a anêmona-do-mar (cnidário) e o caranguejo- eremita (crustáceo) não é obrigatória, ou seja, eles podem viver independentemente, porém a associação traz benefícios maiores aos dois. Esse caranguejo vive no interior de conchas vazias de gastrópodes, permitindo a existência de anêmonas sobre a estrutura dessas conchas. Neste caso, a anêmona- do-mar proporciona ao caranguejo-eremita proteção contra predação, devido à presença de substâncias urticantes contidas em seus tentáculos. Já o caranguejo-eremita, ao se deslocar no substrato marinho, possibilita à anêmona-do-mar maior chance de obtenção de alimento e de propagação, mesmo que através da reprodução. O desenvolvimento indireto da forma larval de vida livre proporciona maior dispersão. BONILLA, O. H., DE LUCENA, E. M. PEREIRA. 112 formigas; os pássaros que comem piolhos em ruminantes; e as formigas e alguns ectoparasitas em vegetais, como as cochonilhas. Figura 51 – Relação cooperativa entre o caranguejo-eremita e as anêmonas-do-mar. Fonte: GOOGLE (2011). 4.4. Mutualismo Tipo de associação entre organismos de espécies diferentes, na qual há benefícios para uns e outros, (ex.: algas e fungos que formam liquens; os cupins e sua fauna intestinal de protozoários - Figura 52); a rêmora82 e o tubarão; e as micorrizas. As associações podem variar de duas ou várias espécies. A interação obrigatória ou facultativa entre duas espécies com benefícios mútuos proporciona uma maior ap- tidão dos indivíduos de ambas as espécies (vespas e pássaros alfaiates; besouros em ninhos de insetos sociais, peixes limpadores, aves limpadoras etc.). Um tipo de mutualismo muito importante é a polinização. Entre o polini- zador e a planta são utilizados inúmeros sinais químicos atrativos e estímulos visuais83. Para o polinizador, ocorre a recompensa em termos de obtenção de manter, de aumentar a variabilidade genética das populações e de realizar a fecundação dos óvulos. Figura 52 – Representação do proto- zoário que habita o intestino do cupim (associação mutualística). Os cupins abrigam, em seu intestino, protozoários espécies) que lhes permitem digerir a celulose e, em troca, fornecem abrigo aos microorganismos, sem os quais não podem sobreviver. Fonte: GOOGLE (2011). 82Rêmora é o nome vulgar dos peixes da família Echeneidae, os quais possuem a barbatana dorsal transformada numa ventosa, com a animais, como tubarões ou tartarugas, podendo assim viajar grandes distâncias. 83O papel das cores e a percepção pelos insetos Borboletas são atraídas Mariposas preferem as púrpura, branca ou rosa claro; Vespas preferem cores monótonas, escuras e pardacentas; Moscas são atraídas marrom, púrpura ou verde; Alguns besouros são visualmente inertes às cores e dependem de outro tipo de sinais para serem levados a elas. Preferem o que para nós é amarela ou azul. Percebem a região UV do espectro Insensíveis ao vermelho Sensíveis a Flavonas. Fundamentos em Ecologia 113 4.5. Síndromes Florais Reunião de características que se desenvolveram em conjunto, provocadas polinizam. É um importante processo de comunicação que garante a sobre- vivência de ambas espécies. No Quadro 6, apresentamos algumas dessas síndromes quemostram a profunda harmonia dessa relação. Quadro 6 Muitas plantas precisam de animais para realizar a dispersão de suas sementes. Muitos dos frutos utilizados pelo homem como alimento são resul- tados dessa associação. Ao comer a polpa do fruto, o animal pode carregar as sementes, realizando a dispersão. O tipo de fruto, seu tamanho, sua estrutura, - mentes elimina a competição que as plantas jovens enfrentariam, por estarem próximas da planta-mãe, além de terem a possibilidade de atingirem locais adequados para sua germinação e seu crescimento. Nos trópicos, os processos de polinização e de dispersão apresentam entendimento de como essas interações mutualísticas ocorrem. 4.6. Comensalismo Relação entre dois tipos de organismos, na qual um deles, o comensal, re- cebe benefício sem que o outro seja prejudicado. É importante ressaltar que todas essas relações contribuem para manter a harmonia da comunidade. Um exemplo dessa interação é a relação entre o tubarão e a rêmora (Figura 53), em que esta se alimenta dos restos de comida deixados pelo tubarão. Nessa associação, o tubarão não ganha nem perde benefícios com BONILLA, O. H., DE LUCENA, E. M. PEREIRA. 114 a presença da rêmora. Outro exemplo, um homem pesando cerca de 70 kg possui aproximadamente 2,5 kg de simbiose no seu corpo. Para nossa sorte, a grande maioria dessa quantidade ilimitada de microrganismos não nos cau- sa mal, boa parte deles são comensais. - locamento. Fonte: www.horta.uac.pt O inquilinismo84 pode ser considerado uma das mais frequentes formas de comensalismo. A convivência de uma espécie, como, um besouro em ni- nhos de formigas ou de cupins é bastante comum na natureza. Vários casos de inquilinismo acabam gerando relações mais complexas. Síntese do Capítulo Neste capítulo, são tratadas as relações que são estabelecidas pelos organismos com outras espécies dentro de um habitat. Nessas relações, que são recíprocas, as formas de vida animal, vegetal ou ao nível de microorganismos terminam exer- ou se prejudicam mutuamente. Discutiu-se ainda acerca da necessidade dessas relações se realizarem para que as populações sejam mantidas em equilíbrio. Abordou-se também a herbivoria como uma relação que, contrário ao que nor- 84 como uma associação na qual apenas uma sem existir prejuízo para a outra espécie associada. O inquilino obtém abrigo (proteção), ou suporte, no corpo da espécie hospedeira. Também comensalismo.
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