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1 NOCÕES DE METALURGIA FÍSICA Um dos grandes desafios da Engenharia de Materiais ainda é, sem dúvida, correlacionar as propriedades dos diversos tipos de materiais metálicos com o seu processamento e com sua estrutura. Os materiais metálicos podem ser definidos como uma combinação de elementos metálicos e não-metálicos que possuem um grande número de elétrons livres, ou seja sem estarem ligados a nenhum átomo em particular; o que os faz excelentes condutores elétricos e térmicos. Os metais não são transparentes a luz visível, e em função do seu tipo de estrutura apresentam excelente resistência mecânica e boa capacidade de deformação, quando comparados com outras classes de materiais, tornando-os os principais materiais atualmente empregados em engenharia. A estrutura de um material metálico está relacionada ao arranjo de seus componentes internos. A estrutura subatômica, ou subestrutura, envolve elétrons e átomos, assim como sua organização. O termo estrutura microscópica, ou microestrutura, diz respeito a grupos ou aglomerados de átomos que formam fases resolvíveis com o uso de um microscópio, por exemplo ótico. A estrutura que se observa a olho nu é denominada macroestrutura. Uma propriedade, para um material, corresponde ao tipo e à magnitude da resposta que este material apresenta a um determinado estímulo externo. A propriedade é normalmente independente da forma ou do tamanho do material, ou seja, o material apresentará a mesma forma e magnitude de resposta independente de suas dimensões. As propriedades mais importantes de um material podem ser agrupadas em cinco grandes categorias: 1. propriedades mecânicas; 2. propriedades elétricas; 3. propriedades magnéticas; 4. propriedades óticas; e 5. propriedades químicas. 2 Para cada categoria existe um estímulo externo característico capaz de provocar diferentes respostas; por exemplo, as propriedades mecânicas relacionam deformações e forças aplicadas, enquanto as propriedades químicas dizem respeito à interação entre o material e o meio, e à sua resistência à deterioração. As propriedades de um material metálico, principalmente as propriedades mecânicas estão intimamente relacionadas com a estrutura do metal ou liga metálica. A resposta a um estímulo mecânico varia com o tipo de estrutura atômica (ou seja com o tipo de liga metálica); com o tipo de microestrutura presente (para a mesma liga metálica); e com o tipo de macroestrutura (para a mesma liga metálica e mesma microestrutura). Dessa forma pode-se afirmar que as propriedades de um componente mecânico estão diretamente relacionadas com a macro e microestrutura presentes; que são determinadas pela composição química da liga e pelo processamento de fabricação do componente, que inclui os ciclos térmicos e os de deformação. ESTRUTURA CRISTALINA Os materiais sólidos podem ser classificados de acordo com a regularidade com que seus átomos estão arranjados um em relação aos outros. Um material que apresenta estrutura cristalina é aquele em que seus átomos estão em posições que se repetem no espaço por uma grande distância atômica existindo uma ordenação de longa distância. O que quer dizer que com a própria solidificação os átomos irão se arranjar segundo um modelo tridimensional no qual os átomos estarão ligados uns aos outros. Todos os metais e ligas metálicas possuem estrutura cristalina sobre condições normais de solidificação. Os materiais que não apresentam estrutura cristalina (ou seja ordenação atômica de longa distância) são denominados materiais amorfos. Para descrever os diferentes tipos de estrutura cristalina utiliza-se um modelo onde os átomos são representados por esferas rígidas e a ligação entre átomos vizinhos pelo toque entre as esferas. O menor grupo de átomos capaz de representar um determinado tipo de estrutura cristalina é denominado célula 3 unitária. A figura 1 apresenta um modelo de representação de uma estrutura cristalina e de sua respectiva célula unitária. Figura 1 - Modelo de esferas rígidas para representação da estrutura cristalina em sólidos. ESTRUTURA CRISTALINA DOS METAIS A não direcionalidade existente na ligação entre os átomos metálicos (ligação metálica) torna possível que a posição relativa dos átomos metálicos possa variar, dando origem a diferentes tipos de estrutura cristalina. Três tipos de estrutura cristalina são encontradas nos metais e ligas metálicas mais comuns, são elas: a estrutura Cúbica de Corpo Centrado (CCC), a estrutura Cúbica de Faces Centradas (CFC) e a estrutura Hexagonal Compacta (HC). A tabela 1 lista a estrutura cristalina de alguns metais de uso comum em engenharia. Tabela 1 - Exemplos de metais que se cristalizam nas estruturas CCC, CFC e HC. Estrutura Cristalina Metal CCC Ferro abaixo de 910°C e acima de 1394°C, Cromo, Molibdênio, Tântalo, tungstênio CFC Ferro entre 910°C e 1394°C, Alumínio, Cobre, Ouro Chumbo, Níquel, Prata, Platina, HC Cádmio, Cobalto, Zinco 4 ESTRUTURA CÚBICA DE CORPO CENTRADO (CCC) A célula unitária da estrutura CCC é representada por um cubo onde existem átomos em cada vértice e no centro da célula (figura 2). Cada átomo neste tipo de estrutura está coordenado com 8 átomos vizinhos e o fator de empacotamento (grau de preenchimento da célula) é 0,68 ou seja 68%. Figura 2 - Estrutura CCC ESTRUTURA CÚBICA DE FACES CENTRADAS (CFC) A célula unitária da estrutura CFC é representada por um cubo onde existem átomos em cada vértice e no centro de cada face, não existindo átomos no centro da célula (figura 3). Cada átomo neste tipo de estrutura está coordenado com 12 átomos vizinhos e o fator de empacotamento (grau de preenchimento da célula) é 0,74 ou seja 74%, que corresponde ao maior fator de empacotamento. 5 Figura 3 - Estrutura CFC ESTRUTURA HEXAGONAL COMPACTA (HC) Nem todos os metais possuem estrutura cristalina onde a célula unitária apresenta simetria cúbica. Na estrutura hexagonal compacta a célula unitária é hexagonal, sendo que 7 átomos estão posicionados nos vértices e no centro de cada base, e 3 átomos estão situados num plano paralelo às faces no centro da célula (figura 4). Neste tipo de estrutura o número de coordenação é 12 e o fator de empacotamento é 0,74, semelhante à estrutura CFC. MATERIAIS POLICRISTALINOS Define-se como cristal ou grão o conjunto de várias células unitárias com a mesma orientação. Quando este conjunto de células unitárias se estende por todo material pode-se dizer que se trata de um monocristal ou seja o material é constituído de um único grão. A solidificação monocristalina só ocorre em condições especiais. Em condições normais os materiais são compostos de vários pequenos grãos ou cristais . Estes materiais são denominados policristalinos. Os diferentes estágios da solidificação de materiais policristalinos estão apresentados esquematicamente na figura 5. Inicialmente pequenos cristais ou núcleos se formam em diferentes posições no líquido (na prática a nucleação ocorrerá de forma heterogênea a partir das paredes do molde ou recipiente que Figura 4 Estrutura HC 6 contenha o metal líquido). Estes núcleos possuem diferentes orientações cristalográficas como está indicado pelos quadrados. Os pequenos grãos crescem através da adição de átomos à sua estrutura, oriundos do líquido vizinho. Em função das diferentes orientações cristalográficas, no encontro entre os grãos se formará uma região onde as estrutura não se ajusta, denominada contorno de grão. DEFEITOS EXISTENTES NA ESTRUTURA CRISTALINA Apesar dos modelos existentes para as estruturas cristalinas dos metais considerarem uma estrutura com ordenação atômica perfeita, este tipo de estrutura não existe pois todos os sólidos cristalinospossuem um variedade de defeitos ou imperfeições em sua estrutura atômica. Os defeitos existentes na estrutura cristalina dos metais estão relacionados com irregularidades no arranjo atômico que podem envolver átomos individuais ou grupos de átomos. A presença destes “defeitos” possui influência marcante nas propriedades dos metais, sendo que esta influência nem sempre é negativa como poderia indicar a palavra defeito, existindo na verdade características benéficas que são função direta da presença destas imperfeições. Um exemplo é a capacidade dos metais se deformarem plasticamente, que é uma Figura 5 Esquema de solidificação policristalina 7 conseqüência direta da presença da discordância, um tipo de defeito linear. Os principais tipos de defeitos encontrados na estrutura cristalina dos metais e ligas são: DEFEITOS PONTUAIS Este tipo de defeito está relacionado a átomos individuais. O mais simples dos defeitos pontuais é o vazio ou lacuna, que está associado à falta de um ou mais átomos na estrutura cristalina. As lacunas são inerentes à própria cristalização, além de serem resultantes da vibração térmica, existindo um número de lacunas em equilíbrio na estrutura para cada temperatura. Este tipo de defeito possui importante papel na difusão atômica e nos mecanismos de deformação plástica em altas temperaturas. DEFEITOS LINEARES Os defeitos lineares são conhecidos como discordâncias e podem ser em aresta ou em espiral. A discordância em aresta é a linha de átomos extra gerada pela introdução de um semi-plano atômico na estrutura cristalina. As discordâncias em espiral são geradas pela ação de tensões cisalhantes que produzem uma distorção entre planos atômicos adjacentes. A figura 6 apresenta esquematicamente os dois tipos de discordâncias. Este tipo de defeito é responsável pela deformação plástica dos metais. As discordâncias são inerentes à própria cristalização dos metais e seu número cresce com a deformação plástica. O aumento da resistência à deformação plástica ocorre em função do aumento da densidade de discordâncias com a progressão da deformação. Este fenômeno é denominado encruamento. DEFEITOS DE INTERFACE Este tipo de defeito envolve planos atômicos, ou seja são defeitos bidimensionais. O exemplo mais simples é a própria superfície externa dos metais, onde a estrutura cristalina é interrompida e o número de vizinhos de cada átomo da superfície é menor do que o do interior do material. Outro tipo de defeito de interface é o contorno de grão, onde as características da estrutura, como o número de coordenação e o fator de empacotamento, são diferentes do interior de cada grão. 8 Figura 6 - Discordância em aresta e em espiral discordância em aresta discordância em espiral 9 PRESENÇA DE IMPUREZAS E ADIÇÃO DE ELEMENTOS DE LIGA Raramente se utiliza industrialmente os metais puros. Sempre existirá a presença de impurezas e não raro outros elementos serão intencionalmente adicionados para conferir propriedades específicas, dando origem às ligas metálicas. A adição de elementos de liga ou a presença de impurezas não se constituem em defeitos do material, mas a distorção gerada na rede cristalina pela presença de átomos com raios atômicos diferentes promove um defeito. Quando um átomo intencionalmente adicionado ou um átomo de impureza passa a fazer parte integrante da estrutura cristalina de um metal puro este átomo é dito em solução sólida e denominado soluto enquanto o metal que se encontra em maior quantidade é denominado solvente. Por exemplo em uma liga metálica cobre-zinco com 30% de zinco, o cobre é o solvente e o zinco é o soluto; nos aços o ferro é o solvente e o carbono é o soluto. A máxima quantidade de átomos de soluto em solução sólida em um dado solvente é limitada pela distorção que este elemento soluto causa na rede cristalina do solvente. Esta quantidade máxima que é possível manter em solução sólida sem descaracterizar a estrutura cristalina do solvente é denominada limite de solubilidade. Quando uma liga metálica possui elementos de liga em maior quantidade do que o limite de solubilidade, para uma dada temperatura, uma nova fase será originada, passando a existir uma material bifásico, onde a fase de maior fração volumétrica será rica no elemento solvente com átomos de soluto em solução sólida até o limite de solubilidade; e a outra fase será formada pelos átomos solutos em excesso. De forma análoga às soluções líquidas, o limite de solubilidade sólido varia com a temperatura, crescendo com o aumento da temperatura. Além de ser sensível à temperatura, o limite de solubilidade é dependente da relação entre os raios atômicos do soluto e do solvente. Quanto mais próximos forem os raios maior será o limite de solubilidade. A figura 7 mostra como varia o limite de solubilidade do cobre com diversos outros elementos, em função da relação entre os raios 10 atômicos. Atinge-se valores tão altos como 100% para a liga cobre-níquel e tão baixos como zero para a liga cobre-chumbo. Figura 7 - Limite de solubilidade no cobre em função da relação entre raios atômicos. FASES METÁLICAS E SUAS PROPRIEDADES Os materiais metálicos podem ser classificados como monofásicos ou polifásicos. Os materiais metálicos monofásicos são os metais comercialmente puros e as ligas metálicas nas quais a quantidade de elementos solutos encontra-se abaixo do limite de solubilidade. Os materiais metálicos polifásicos são ligas metálicas onde a quantidade de elementos solutos ultrapassa o limite de solubilidade. LIGAS MONOFÁSICAS As propriedades mecânicas dos materiais metálicos monofásicos varia em função da quantidade de elemento soluto. Se for comparado um metal 11 comercialmente puro, como por exemplo o cobre, com suas ligas monofásicas observa-se que a introdução de elementos de liga em solução sólida aumenta as tensões limite de escoamento e limite de resistência, assim como a dureza Por serem monofásicas as ligas metálicas com percentual de elemento soluto abaixo do limite de solubilidade, e também os metais comercialmente puros, são pouco sensíveis aos ciclos térmicos não sendo possível modificar suas propriedades através de tratamentos térmicos. A microestrutura dos metais puros e ligas monofásicas é constituída de grãos de uma única fase. A exposição a altas temperaturas pode promover o crescimento dos grãos e com isso o material pode perder resistência mecânica e tenacidade. A deformação plástica realizada “a frio”, por sua vez favorece o aumento de resistência mecânica às expensas da ductilidade, através do fenômeno de encruamento, que se constitui na única forma de aumentar significativamente a resistência mecânica de materiais monofásicos. Através da recristalização é possível restaurar as propriedades de ligas metálicas monofásicas encruadas. Este fenômeno, como o próprio nome diz, se constitui em uma nova cristalização de onde se originam novos grãos livres de deformação. Isto é possível em função da instabilidade gerada pela deformação plástica e conseqüente aumento da densidade de discordâncias nos materiais encruados. A exposição de materiais encruados a temperaturas superiores a 1/3 da temperatura homóloga de fusão (°K) provoca a difusão atômica direcionada no sentido da nucleação e crescimento de novos grãos com baixa densidade de discordâncias e consequentemente com a recuperação das propriedades mecânicas existentes antes do encruamento. A figura 8 apresenta a variação de propriedades para duas ligas de cobre monofásicas em função do grau de deformação a frio, ou seja deformação abaixo da temperatura de recristalização. A figura 9 mostra o efeito da recristalização na recuperação das propriedades anteriores à deformação plástica.12 Figura 8 Variação de proprieades mecânicas com percentual de deformação a frio Figura 9 Recuperação de dureza através da recristalização 13 LIGAS POLIFÁSICAS Nas ligas constituídas de mais de uma fase, ou seja naquelas em que o percentual de elementos solutos supera o limite de solubilidade, as propriedades finais do material serão função das propriedades inerentes a cada fase presente e da interação entre as diversas fases. Nas ligas polifásicas, além do efeito de elementos em solução sólida e do encruamento, é possível também variar as propriedades mecânicas através de ciclo térmicos. Os ciclos térmicos podem modificar as fases presentes inibindo ou promovendo a formação de fases específicas ou mesmo modificando a forma, distribuição e o tamanho das fases presentes. Com isso as propriedades mecânicas, físicas e até mesmo químicas da liga metálica se modificam. Em outras palavras, é possível obter diferentes microestruturas, e consequentemente diferentes propriedades, a partir da mesma composição química. Quando uma liga é resfriada lentamente a partir da fase líquida, as fases presentes no estado sólido a cada temperatura estarão em equilíbrio termodinâmico e podem ser previstas por diagramas que mostram as fases termodinâmicamente estáveis em função da temperatura e da composição química ou seja percentual de elemento soluto. Estes diagramas são denominados diagramas de fases. Um exemplo clássico de diagrama de fases é o diagrama ferro-carbono (figura 10). O ferro puro apresenta duas transformações alotrópicas ou seja de mudanças de estrutura cristalina. A temperatura ambiente a estrutura tremodinâmicamente estável é a cúbica de corpo centrado (CCC). Quando aquecido acima de 910°C o ferro passa de CCC para CFC (cúbico de faces centradas) e volta a ser CCC acima de 1394°C; passando para o estado líquido a aproximadamente 1540°C. Com a introdução do carbono aparecem três tipos de soluções sólidas: uma de carbono em ferro CCC, denominada ferrita, outra de carbono em ferro CFC denominada austenita e a terceira novamente de carbono em ferro CCC 14 denominada ferrita delta. A ferrita ou fase alfa (αα) é estável da temperatura ambiente até aproximadamente 727°C e a austenita ou fase gama (γγ) é estável a partir de 727°C até aproximadamente 1400°C; quando passa a existir a ferrita delta (δδ). O carbono em excesso em relação ao limite de solubilidade, que varia em função da estrutura cristalina do ferro sendo 0,02% de carbono no máximo para a ferrita e 2% no máximo para a austenita, dá origem a uma nova fase denominada cementita que é um carboneto de ferro com estrutura cristalina ortorrômbica e fórmula estequiométrica Fe3C, ou seja para cada átomo de carbono existem três átomos de ferro. Em termos de propriedades é importante mencionar que a ferrita e a austenita são macias e dúcteis enquanto a cementita é dura e frágil. Figura 10 - Diagrama de fases Ferro-Carbono. 15 A 727°C e a 076% de carbono acorre uma reação denominada reação eutetóide que é a transformação da austenita para ferrita + cementita, dando origem a um constituinte lamelar denominado perlita. As ligas ferro carbono com até 2% de carbono são denominadas Aço e aquelas com teor de carbono superior a 2% são denominadas Ferros Fundidos. Na prática os aços ainda contêm elementos inerentes ao seu processo de fabricação (Mn, Si P e S) ou possuem elementos adicionados intencionalmente para destacar propriedades específicas (Cr, Ni, Mo, V, Nb, Ti, W ....). Os aços sem a adição intencional de elementos de liga são classificados como aços ao carbono e os demais em aços liga (baixa , média e alta liga). Se considerarmos um aço com 0,4% de carbono sendo resfriado lentamente a partir da fase líquida verifica-se que após a solidificação e em torno de 900°C a fase estável será a austenita e todo o carbono estará em solução sólida. Com a queda da temperatura atinge-se a chamada zona crítica, onde a austenita começa a se transformar em ferrita e a aumentar relativamente o seu teor de carbono. A 727°C 50% da austenita já terá se transformado em ferrita e a austenita remanescente terá atingido 0,76% de carbono, ocorrendo a partir deste ponto a reação eutetóide, com toda a austenita presente se transformando em perlita. A microestrutura final será composta portanto de ferrita + perlita (figura 11). Figura 11- Microestrutura característica de um aço com 0,4 % de carbono após resfriamento lento 16 Figura 12- Microestrutura característica de um aço com 0,8 % de carbono após resfriamento lento Figura 13- Microestrutura característica de um aço com 1,3 % de carbono após resfriamento lento Variações na taxa de resfriamento modificam os tamanhos de grãos ferrítico e perlítico; o espaçamento entre as lamelas de ferrita e cementita na perlita; e até mesmo a quantidade de perlita, promovendo alterações nas propriedades mecânicas. Os diagramas de fase mostram apenas as fases em equilíbrio termodinâmico, não considerando a cinética de formação e dissolução das diferentes fases, ou seja, voltando ao exemplo do diagrama Ferro-Carbono, verifica-se que este mostra que a austenita deve se transformar em ferrita + cementita mas não dá indicativos de quanto tempo é necessário para que isto ocorra. A cinética das transformações de fase pode ser visualizada através de curvas tempo - temperatura -transformação, curvas TTT. 17 CURVAS TTT As curvas TTT são curvas obtidas experimentalmente e mostram o tempo necessário para uma dada transformação ocorrer em uma determinada temperatura. Um exemplo típico é mostrado na figura 14 para um aço eutetóide (0,8%C). Neste exemplo observa-se que são necessários cerca de 1000 segundos a 700°C para que a reação eutetóide se inicie, enquanto a 550°C a mesma reação começa após aproximadamente 1 segundo. Outro fato interessante é que taxas de resfriamento altas o suficiente para não cortar a curva, ou seja não dar início a reação perlítica, podem manter a austenita presente e sem transformações abaixo de 723°C. Neste caso específico a alta instabilidade da austenita e a impossibilidade de ocorrer a reação difusional eutetóide dá lugar a uma reação não difusional que ocorre por cisalhamento, denominada reação martensítica. A fase resultante é metaestável, dura e frágil, supersaturada em carbono e com elevada densidade de discordâncias, conhecida como martensita. Figura 14 - Curva TTT típica de um aço eutetoide 18 EFEITO DOS ELEMENTOS DE LIGA NOS DIAGRAMAS DE FASE E CURVAS TTT Os efeitos da adição de um terceiro elemento de liga sobre um dado diagrama de fase estão relacionados a: • a estabilização de uma fase pré-existente , em outras palavras o aumento de seu campo de estabilidade permitindo que esta permaneça estável em mais baixas temperaturas; ou • o surgimento de novas fases . Para facilitar a visualização deste fenômeno pode-se retornar ao diagrama ferro-carbono. Se for adicionado cromo a um aço ao carbono este elemento aumentará o campo de estabilidade da ferrita (elemento ferritizante) e promoverá a formação de carbonetos de cromo. Caso a adição seja de níquel haverá um aumento do campo de estabilidade da austenita (elemento austenitizante), que dependendo da quantidade de níquel pode se tornar estável na temperatura ambiente; e neste caso não haverá a formação de novas fases. Os principais elementos ferritizantes ou alfagenos são silício, cromo, molibdênio, fósforo, vanádio, titânio, alumínio, tântalo, boro, enxofre e nióbio. Os principais elementos austenitizantes ou gamagenos são carbono, nitrogênio, manganês, níquel, cobalto, cobre e zinco. A adição de elementos de liga pode agir também sobre a cinéticadas transformações de fase no estado sólido, ou seja sobre as curvas TTT. Neste caso o principal efeito será o de retardar ou acelerar a transformação termodinâmicamente estável, seja pelo aparecimento de novas fases que podem atuar como agentes nucleadores ou por dificultar a difusão atômica, tornando a transformação mais lenta. Para os aços os elementos que retardam a transformação perlítica tornam o material mais temperável, ou seja aumentam a facilidade de obtenção de martensita. De forma geral a adição de todos os elementos com exceção do cobalto aumentam a temperabilidade do aço deslocando a curva TTT para a direita. 19 Tratamentos Térmicos RECOZIMENTO É o tratamento térmico realizado com o fim de alcançar um ou vários dos seguintes objetivos: remover tensões devidas aos tratamentos mecânicos a frio ou a quente, diminuir a dureza para melhorar a usinabilidade do aço, alterar as propriedades mecânicas como resistência, ductilidade etc., modificar os característicos elétricos e magnéticos, ajustar o tamanho de grão, regularizar a textura bruta de fusão, remover gases, produzir uma microestrutura definida, eliminar enfim os efeitos de quaisquer tratamentos térmicos ou mecânicos a que o aço tiver sido anteriormente submetido. O recozimento consiste no aquecimento do aço acima da zona crítica, durante o tempo necessário e suficiente para se ter solução do carbono ou dos elementos de liga no ferro gama, seguido de um resfriamento muito lento, realizado ou mediante o controle de velocidade de resfriamento do forno ou desligando-se o mesmo e deixando que o aço resfrie ao mesmo tempo que ele. NORMALIZAÇÃO Consiste no aquecimento do aço a uma temperatura acima da zona crítica, seguido de resfriamento ao ar. Esse tratamento está esquematizado na figura 15. Para os aços hipoeutetóides, pode-se admitir que a temperatura de aquecimento ultrapassa a linha A3 para os hipereutetóides a linha Acm sem os inconvenientes, neste último caso, no esfriamento ao ar que se seguem da formação do invólucro frágil de carbonetos. A normalização visa refinar a granulação grosseira de peças de aço fundido principalmente; freqüentemente, e com o mesmo objetivo, a normalização é aplicada em peças depois de laminadas ou forjadas. A normalização é ainda usada como tratamento preliminar à têmpera e ao revenido, justamente para produzir estrutura mais uniforme do que a obtida por laminação, por exemplo, além de reduzir a tendência de empenamento e facilitar a solução de carbonetos e 20 elementos de liga. Sobretudo nos aços – liga, quando os mesmos são esfriados lentamente após a laminação, os carbonetos tendem a ser macios e volumosos, difícil de se dissolver em tratamentos posteriores de austenitização. A normalização corrige esse inconveniente. Os constituíntes que se obtém na normalização são ferrita e perlita fina, ou cementita e perlita fina. Eventualmente, dependendo do tipo de aço, pode-se obter a bainita, como mostra a figura 15. No caso de aços - liga – produtos fundidos, laminados e forjados, utiliza-se a normalização como tratamento prévio de tratamento térmico definitivo. Em geral, a temperatura situa-se 35 a 40ºC acima das linhas A 3 ou Acm, conforme o aço em consideração. Do mesmo modo, em produtos fundidos, laminados ou forjados que sofreram um resfriamento uniforme a partir de altas temperaturas, a normalização é aplicada para refinar sua estrutura. Os aços – liga hipereutetóides são normalizados para eliminação total ou parcial dos rendilhados de carbonetos que caracterizam suas estruturas. Obtém-se, assim, uma estrutura que, nu tratamento de esferoidização posterior, apresenta-se cem por cento esferoidizada, conferindo boa usinabilidade ao material e é mais adequada ao tratamento de têmperatura. TÊMPERA Consiste no resfriamento rápido do aço de uma temperatura superior à sua temperatura crítica (mais ou menos 50ºC acima da linha A 1 para os hopereutetóides) em um meio como óleo, água, salmoura ou mesmo ar, A figura 56 esquematiza a operação de têmpera. O objetivo pricípuo da têmpera é a abtenção da estrutura martensítica, para o que se deve, portanto, fazer com que a curva de esfriamento passe a esquerda do cotovelo da curva em “C”, evitando-se assim a transformação da austenita. 21 A velocidade de resfriamento, nessas condições, dependerá do tipo de aço, de forma e das dimensões das peças. Já foram vistos os meios de esfriamento mais utilizados e quais os característicos que os diferenciam. Como na têmpera o constituinte final desejado é a martensita, o objetivo dessa operação, sob o ponto de vista de propriedades mecânicas, é o aumento do limite de resistência à tração do aço e também da sua dureza; na realidade, o aumento de dureza deve verificar-se até uma determinada profundidade. Resultam também da têmpera redução da ductilidade (baixos valores de alongamento e estricção), da tenacidade e o aparecimento de apreciáveis tensões internas. Tais inconvenientes são atenuados ou eliminados pelo revenido. Para que a têmpera seja bem sucedida vários fatores devem ser levados em conta. Inicialmente, a velocidade de resfriamento deve ser tal que impeça a transformação da austenita nas temperaturas mais elevadas, em qualquer parte da peça que se deseja endurecer. De fato, as transformações da austenita nas altas temperaturas podem dar como resultado estruturas mistas, as quais ocasionam o aparecimento de pontos moles além de conferirem ao aço baixos valores para o limite de escoamento e para resistência ao choque. Portanto, a seção das peças constitui outro fator importante porque pode determinar diferenças de esfriamento entre a superfície e o centro. Em peças pequenas ou de pequena espessura, essa diferença é desprezível. O mesmo, contudo, não se da com peças de grandes dimensões, no centro dais quais a velocidade de esfriamento é menor do que na superfície, resultando estruturas de transformação mista, a não ser que o teor de elementos de liga de aço seja suficiente para impedir essa transformação e produzir somente a estrutura martensítica. Às vezes, por outro lado, é conveniente um núcleo mais mole e, então, escolhe-se um aço e uma velocidade de esfriamento que produzam superfície dura e núcleo macio. 22 REVENIDO O revenido é o tratamento térmico que normalmente sempre acompanha a têmpera, pois elimina a maioria dos inconvenientes produzidos por estas; além de aliviar ou remover as tensões internas, corrige as excessivas dureza e fragilidade do material, aumentando sua ductilidade e tenacidade. O aquecimento da martensita permite a reversão do reticulado instável para uma estrutura CCC, produzindo reajustamentos internos que aliviam as tensões e uma precipitação de carbonetos. Recozimento Noramilzação Têmpera e Revenido Figura 15 Ciclos Térmicos de Recozimento, Normalização, Têmpera e Revenido 23 Martensita Martensita Revenida 24 Princípios de Metalurgia Mecânica ESTADOS DE SOLICITAÇÃO MECÂNICA RESISTÊNCIA E COMPORTAMENTO MECÂNICO Para o engenheiro uma das características mais importantes a ser considerada nos materiais sólidos é a sua resistência mecânica. Ainda que esse material não seja diretamente empregado como um componente de máquina ou uma peça estrutural, casos em que é fundamental a resistência, normalmente existira preocupações com sua integridade nas condições de uso o que obriga a se considerar a resistência mecânica. No caso dos metais e suas ligas o comportamento mecânico é de primordial relevância tanto pelas condições de utilização quanto pelos processos de fabricação que normalmente envolvem técnicas de conformação plástica. Em particular nos processos de união de partes metálicas por soldagem é importante que se leve em consideração o comportamento mecânico (resistência a ductilidade)das microestruturas associadas ao metal de base, zona termicamente afetada e metal de solda, para garantir o desempenho operacional da junta. TENSÃO E DEFORMAÇÃO A resistência de um material vem de sua capacidade de suportar solicitações mecânicas quer seja uma força externa aplicada ou a ação de seu próprio peso. Como uma força atua sempre sobre uma certa área do material, define-se tensão como sendo a relação da força sobre a área. De um modo geral a força atua inclinada em relação à área sendo conveniente desmembrá-la em um componente normal a área (α) e outro componente tangencial a área (τ); também chamado tensão cisalhante. Além disto para analisar-se a ação da força em três dimensões pode-se considerar 3 eixos coordenados (cartesianos ortogonais) o que permite levar em conta os componentes segundo esses eixos. Dessa forma qualquer conjunto complexo de forças que solicite um elemento de volume do material, como um pequeno cubo, 25 pode ser analisado através das nove componentes de tensão ilustrados na figura 16 para uma peça solicitada mecanicamente até a fratura. FIGURA 16 - Componentes de um estado de tensão atuante sobre um elemento. Nessa figura as componentes do estado de tensão possuem índices nos quais o primeiro se associa ao plano onde atua a força e o segundo à direção desta força. Como decorrência da atuação desta força, será sempre provocado um deslocamento no material produzindo movimento ou alterando as dimensões. No segundo caso, a relação entre o deslocamento e a dimensão origina define a deformação do material. Da mesma forma que o estado de tensão, qualquer solicitação mecânica imposta a um elemento de volume do material acarretará um estado de deformação que não necessita mais que 3 componentes normais εxx, εyy, εzz e 6 componentes cisalhantes γxy, γxz, γyz (e bem como seus simétricos) para representar as situações mais genéricas. Não é objetivo desta publicação aprofundar-se nos conceitos ligados ao estado de tensão, mas vale aqui exemplificar o fato de que um estado que só possua um componente normal será uniaxial de tração ou compressão. Por outro lado um estado que possua dois componentes simétricos de cisalhamento como τxy e τyx dará origem a um estado de torção. Outro exemplo relativamente simples é aquele correspondente a três tensões normais iguais que dará origem a uma 26 pressão hidrostática. Na verdade a pressão hidrostática, definida como a média aritmética das tensões normais, pode ser também visualizada como um estado de tensão componente de qualquer estado geral. REGIME ELÁSTICO ELASTICIDADE Qualquer solicitação mecânica aplicada a um material inicialmente afasta seus átomos das posições de equilíbrio interatômicas, em virtude da alteração externa introduzida no balanço das forças internas que promovem as ligações atômicas. Em principio pode-se associar esse afastamento das posições de equilíbrio com mudanças nos raios e na esferoidicidade dos átomos. Não havendo outras alterações na subestrutura, a tensão aplicada será proporcional à deformação resultante da solicitação mecânica e diz-se que o material sofreu somente deformação elástica. Nessas condições de regime elástico de resposta do material à solicitação mecânica, um gráfico da tensão contra a deformação será representado por uma linha reta em escala macroscópica. Na realidade medidas mais sensíveis mostram que a relação pode não ser linear em virtude dos seguintes fatores: - alterações subestruturais que já ocorreram logo no início da solicitação mecânica; - comportamento elástico não linear; - efeitos de enelasticidades. Esses fatores serão analisados mais adiante e, para fins práticos, será considerado que no regime elástico a tensão variar linearmente com a deformação. A elasticidade dos materiais também conhecida como rigidez elástica é medida pelo coeficiente de proporcionalidade entre a tensão e a deformação. Assim, no caso de um esforço normal uniaxial, quer seja de tração ou de compressão, a elasticidade será dada pelo coeficiente E denominado módulo de elasticidade ou módulo de young. σ = E . ε 27 Vale notar que o valor de E é dado pela tangente do ângulo que a reta elástica faz com os eixos das deformações. Outro ponto a se destacar é o fato que uma solicitação uniaxial produz não só uma deformação com mesmo sentido na direção da tensão aplicada mas também deformações “compensatórias” nas direções perpendiculares. Assim, se uma tração uniaxial for aplicada na direção x, será gerada uma elongação nessa direção bem como contrações nas direções y e x relacionadas entre si pela expressão: εyy = εzz = -ν . εxx onde ν é chamado coeficiente de Poisson. No caso de uma solicitação cisalhante, a elasticidade será dada pelo coeficiente G conhecido como módulo de cisalhamento τ = G . γ onde a deformação cisalhante γ é definida pela relação d/h da figura 17. FIGURA 17 - Deformação cisalhante. Observe que o módulo de cisalhamento também é obtido pela tangente de um ângulo α como mostra a figura 17. Os módulos de elasticidade e de cisalhamento estão relacionados entre si pela expressão: E = 2G (1 + ν) 28 No caso de uma pressão hidrostática, a elasticidade será dada pelo módulo de compressibilidade K relacionando a pressão com a deformação volumétrica P = K . ∆V/Vo Esse módulo de compressibilidade está relacionado ao módulo de elasticidade pela expressão: E = 3K (1 – 2. ν) A elasticidade dos materiais depende de alguns fatores como a orientação cristalográfica, a composição química, e sobretudo a temperatura. A elasticidade de todos materiais decresce a medida que aumenta a temperatura podendo apresentar descontinuidades nos pontos de transformações alotrópicas como ilustra a figura 18 para o ferro. FIGURA 18 - Variação do módulo de elasticidade com a temperatura ELASTICIDADE NÃO – LINEAR A linha que caracteriza a relação tensão versus deformação no regime elástico dos metais pode ser aproximada à uma reta para efeitos práticos. Entretanto a possibilidade de movimentação de discordâncias para tensões muito baixas não permite que na verdade esta linha seja uma reta. 29 Outro aspecto que compromete a linearidade da linha elástica é o fato do deslocamento atômico sob ação de uma força crescente torna-se complexo e não mais proporcional acima de um certo valor da força. I.2.3) ISOTROPIA E ANISOTROPIA Um meio (ou material) isotrópico é aquele em que as propriedades físicas, incluindo a resistência mecânica, têm o mesmo valor em qualquer direção. Normalmente se observa que as propriedades mecânicas dos metais não são as mesma em todas as direções. Essa Variação do valor das propriedades com a direção é chamada de anisotropia. De um modo geral existem dois tipos de anisotropia: Anisotropia cristalográfica que resulta da orientação preferencial dos grãos induzida por conformação plástica. Planos ou orientações preferenciais, como o (100) no caso de metais CFC, tendem a se alinhar ao longo de todos os grãos produzindo o fenômeno de textura ou seja diferentes resultados nas propriedades medidas segundo diferente direções como ilustra a figura 19. FIGURA 19 - Efeito de anistropia na redução de área de peça forjada. Anistropia de fibramento que resulta da existência de estruturas de fibras provocadas pela formação de cordões segregados (inclusões, segundas fases) 30 segundo a direção principal de conformação do metal. A anistropia de fibramento produz efeitos como os indicados na figura 18. REGIME PLÁSTICO Ao atingir-se um certo nível de tensão durante a solicitação mecânica, por exemplo a tensão de escoamento σy, alterações estruturais ocorrem desviando visivelmente a relação σ x ε da reta elástica e acarretando deformações não reversíveis. Diz-se então que o material entrou no regime plástico. Os grãos de uma peçametálica deformada plasticamente apresentam marcas em sua superfície metalográfica (polida e atacada) coincidentes com planos e direções super - compactas da rede cristalina. Essas marcas são associadas a degraus na superfície correspondentes ao deslizamento dos planos mais compactos segundo direções mais compactas como ilustra a figura 20. FIGURA 20 - Deslizamento de planos cristalinos durante a deformação plástica de um metal. Esse deslizamento de planos mais compactos produzindo degraus, figura 21, é a causa da deformação plástica dos metais para as condições operacionais de tensões e temperaturas normalmente utilizadas. Outros mecanismos de escoamento plástico dos metais baseados em difusão atômica podem prevalecer para condições de tensões muito baixas e temperaturas muito altas. 31 Teoricamente verifica-se que a tensão cisalhante necessária para produzir deslizamento de planos atômicos, figura 20, é 3 ou 4 ordens de grandeza (1000 ou 10000x) maior do que a obtida experimentalmente na prática. FIGURA 21 - Deslizamento teórico de planos cristalinos. Na realidade este deslizamento na prática é conseguido com a participação de discordâncias, como visto anteriormente, produzindo degraus com o tamanho do vetor de Burges. Um estado qualquer de tensão, por exemplo uniaxial de tração, possuem componentes cisalhantes que se rebatem sobre os planos mais compactos e ocasionam o movimento das distâncias logo que atingem um valor crítico τc como está ilustrado na figura 22. FIGURA 22 - Deslizamento de planos de rede cristalina dentro de um grão metálico. 32 Como cada grão de uma peça metálica está inclinado aleatoriamente em relação a tensão externamente aplicada, cada grão atingirá a tensão crítica τc para deslizamento de seus planos mais compactos segundo suas direções mais compactas em momentos diferentes como mostra a figura 23. FIGURA 23 - Diferença nas tensões cisalhantes para deslizamento de planos cristalinos e efeito da orientação de um grão. Em um determinado grão a tensão cisalhante τ para deslizamento de planos cristalinos mais compactos será dada pela expressão τ = σ . cosθ . cosφ onde θ é o ângulo entre a tensão aplicada σ e a normal ao plano mais compacto de deslizamento e φ o ângulo entre σ e a normal ao plano mais compacto de deslizamento, como também mostra a figura 22. Essa expressão é conhecida como equação de Schmid. Microscopicamente, ao tensionar-se uma peça metálica, alguns poucos grãos possuem inicialmente orientações (θ e φ) favoráveis. Esses grãos atingirão a tensão crítica τc antes dos outros embora a tensão aplicada σ seja a mesma para toda a 33 peça. Começa então o deslizamento de planos cristalinos em poucos grãos produzindo um degrau interatômico (vetor de Burges) para cada discordância que se movimenta até a superfície. A deformação plástica resultante praticamente não é detectada em escala macroscópica pois o número de degraus ainda é pequeno e só acarretam micro – desvios da linha elástica. A medida que aumenta o nível de tensão aplicada a tensão crítica para cisalhamento τc, vai sendo atingida em outros grãos e eventualmente todos os grãos sofrerão deslizamento. Quando o deslizamento de planos mais compactos, segundo direções mais compactas por movimento de discordâncias, generaliza-se por todos os cristais de peça metálica um intenso processo de multiplicação de discordâncias ocorre sobre tudo por nucleação nos degraus formados nas superfícies e nos contornos de grão devido à concentração de tensões. A partir daí todos os grãos estarão participando na produção de degraus e a densidade de discordâncias aumenta 3 ou 4 ordens de grandeza de 10σ para 109 ou 1010 cm/cm3. Têm-se então macroscopicamente um desvio sensível da linha elástica e na prática diz-se que a peça metálica entrou em regime de deformação plástica embora isto já viesse ocorrendo microscopicamente um pouco antes. Concluindo: - Nas condições usuais, a deformação plástica é realizada quase exclusivamente pela movimentação de discordâncias. Assim em um tarugo de aço que se conforma a quente para tornar-se uma chapa fina, a multiplicação e movimentação de discordâncias produzindo deslizamento de planos e deixando degraus nas superfícies é o mecanismo responsável pela grande redução de espessura na laminação. A mesma coisa com a estampagem de chapas de automóveis ou na trefilação de fio máquina para produzir pregos. TRABALHO A FRIO; ENCRUAMENTO Caso um metal tenha um mínimo de ductilidade, o que é mais comum, sua deformação plástica estende-se razoavelmente além do limite de escoamento. A temperaturas não muito altas ocorrerá um aumento contínuo de tensão durante o escoamento plástico caracterizando o efeito de encruamento. 34 Macroscopicamente o efeito do encruamento é visto na contínua deformação do corpo de prova. Onde é necessária uma tensão cada vez mais alta para continuar deformando o material. Microscopicamente os grãos apresentam marcas de deslizamento dos planos mais compactos segundo as direções mais compactas. Inicialmente essas marcas são todas paralelas e correspondem a um sistema primário de deslizamento por grãos como ilustra a figura 24. FIGURA 24 - Estágios de encruamento. Com a evolução de deformação plástica as marcas correspondentes a outros sistemas cruzam-se com as do primário e os grãos vão tornando-se altamente marcados e distorcidos. Para elevadas deformações plásticas os grãos estarão inteiramente marcados distorcidos e alongados segundo a direção principal de tensionamento como também mostra a figura 24. Subestruturalmente, as discordâncias inicialmente associadas aos sistemas primários dentro dos grãos, apresentam arranjos lineares ao começar a deformação plástica como mostra a figura 25. Com a “avalanche” de multiplicação de discordâncias e a participação de outros sistemas de deslizamento os arranjos tornam-se emaranhados e evoluem para subestruturas celulares com paredes de células densas de discordâncias e interiores vazios como também ilustra a figura 25. 35 O aumento da densidade de discordância ρ com o aumento da tensão, σ, durante o encruamento obedece a equação de Taylor σ = K . √ ρ válida a partir do limite de escoamento correspondente à uma densidade inicial (106 cm/cm3 no caso de metais bem recozidos). FIGURA 25 - Evolução dos arranjos de discordâncias com a deformação plástica. Para tensões ainda maiores durante o encruamento as células de distâncias vão diminuindo de tamanho d, segundo a equação: σ = σι + kd-1 TRABALHO A QUENTE E RECOZIMENTO Para sofrer deformação plástica com tensão crescente ou seja, encruamento, o metal deve encontrar-se em temperaturas não muito altas. Na verdade, em qualquer temperatura a difusão atômica, sobretudo devido à grande quantidade de 36 lacunas geradas no movimento de discordâncias após interseção entre elas, tende a amolecer a estrutura deformada agindo em oposição ao encruamento. Entretanto, para os níveis de tensões e velocidade de deformação utilizados na prática, o amolecimento do material só é efetivo acima de aproximadamente metade da temperatura absoluta de fusão, Tf/2. Isto é, os efeitos do amolecimento da estrutura encruada só são sentidos em tempos razoáveis, por volta de 1 hora ou menos, para temperaturas acima de Tf/2. Esse nível de temperatura, Tf/2, é utilizado tecnologicamente para caracterizar: a) deformação a frio – aquela realizada abaixo de Tf/2, onde predominam os mecanismo de encruamento (endurecimento) sobre os de amolecimento. Em condições normais a tensão aumenta com a deformação plástica durante a deformação a frio. O conceito de deformação a frio é relativo para cada metal assim a temperatura ambiente o estanho que se funde a 232ºC, estará sendo deformada a quente (Tf = -21ºC). Enquanto à 1500ºC em que os metais irradiam luz brancade tão quente, o tungstênio, com ponto de fusão de 3410ºC, estará sendo deformado a frio (Tf/2 = 1569ºC). A deformação a frio realizada até uma certa tensão, mantém esse nível de tensão, a menos de uma pequena perda por relaxação, na peça metálica. Isso pode ser usado na pratica para endurecer os metais que, por outro lado, perdem ductilidade. Além disto as peças metálicas conformadas a frio não podem ser aquecidas acima de Tf/2 sob risco de alterarem suas propriedades mecânicas. b) deformação a quente – aquela realizada acima de Tf/2 onde predominam os mecanismos de amolecimento sobre os de encruamento. Os principais mecanismos de amolecimento acima de Tf/2 são: - aniquilamento de discordâncias – quando duas discordâncias opostas se encontram; - escalagem de discordâncias – correspondente a ascensão da linha de discordâncias arestas verticalmente ao plano mais compacto de deslizamento pela chegada de lacunas como ilustra a figura 26. FIGURA 26 - Aniquilamento e escalagem de discordâncias. 37 Durante a deformação plástica a quente a tensão “não aumenta” e o material “não se encrua”. Esse tipo de processo é conveniente na conformação de metais para obter-se grandes redução de área, por exemplo no forjamento, sem despender-se muita energia devido ao aumento contínuo da tensão como ocorre na deformação a frio. EFEITOS TERMICAMENTE ATIVADOS Como foi comentado, em qualquer temperatura ocorrem efeitos de amolecimento durante a deformação plástica dos metais. Esses efeitos de amolecimento são também chamados efeitos termicamente ativados sendo mais efetivos quanto maior for o tempo disponível e vice-versa. Assim as deformações plásticas que se processam lentamente são mais susceptíveis de amolecimento que as realizadas rapidamente. Em conseqüência qualquer nível de tensionamento plástico de um metal, desde o escoamento até a tensão máxima, decresce com o aumento de temperatura como ilustra a figura 27. FIGURA 27 - Variação de tensão com a temperatura. Em ligas e soluções sólidas metálicas pode existir intervalos de temperatura em que a tensão e a dureza passam por máximos com a temperatura como também 38 ilustra a figura 27. Esse efeito é chamado envelhecimento dinâmico e corresponde à interação de átomos solutos interferindo com o movimento das discordâncias. A ductilidade normalmente aumenta com a temperatura devido aos efeitos termicamente ativados embora possam existir intervalos de mínimos de ductilidade devido à condições especiais de fragilização. RECUPERAÇÃO E RECRISTALIZAÇÃO Acima de Tf/2 a deformação plástica é realizada à quente devido a eficiência dos mecanismos de amolecimento particularmente o aniquilamento e a escalagem de discordâncias assistidos por intensa difusão de lacunas. Microscopicamente a deformação a quente produz importantes modificações no estado sólido, sem transformação de fase, podendo separar totalmente o encruamento e acarretar completa alteração da microestrutura do metal. Esse processo evolui em três estágios seqüenciais: 1º) Recuperação – é a primeira fase do processo de amolecimento, começa a manifestar-se por volta de 0,4 Tf provocando essencialmente alterações subestruturais como formação de arranjos de baixa energia a partir de paredes de células com alta densidade de discordâncias. Esses arranjos de discordâncias correspondem à redes planares de discordâncias espirais ou empilhamento verticais de discordâncias arestas associadas à contornos de subgrãos. Durante a recuperação as propriedades tendem a retornar a seus valores originais como por exemplo a resistividade e a dureza como ilustra a figura 28. Microscopicamente não se observam mudanças sensíveis nos grãos distorcidos e marcados pelo encruamento. 2º) Recristaliza ção – é a etapa que segue à recuperação ocorrendo entre 0,4 e 0,5 Tf como mostra a figura 29. 39 Durante a recristalização os contornos de subgrãos se combinam formando arranjos com número cada vez maior de discordâncias até que essas perdem sua identidade e se transformam em defeitos subestruturais associados a verdadeiros contornos de grão. Nesse instante formam-se novos pequenos grãos com orientações diferentes do antigo grão como mostra a figura 31. FIGURA 28 - Arranjos planares de discordâncias espirais (a) e empilhamento verticais de discordâncias aresta (b) formando contornos de subgrãos. FIGURA 29 - Recuperação de resistividade e da dureza. 40 Figura 30 – Relação entre a temperatura absoluta de fusão e a temperatura absoluta de recristalização para diversos metais. FIGURA 31 - Formação subestrutural de um novo grão na rede encruada. 41 Microscopicamente a recristalização revela uma nova estrutura de grãos que, dependendo das condições de deformação plástica prévia, temperatura e tempo pode ter tamanhos de grão, em média, tão baixos quanto 5 µm. Com a recristalização o metal terá novas propriedades mecânicas devido aos novos tamanhos e distribuição dos grãos. Esse processo de deformação a frio e recristalização é utilizado para refinar-se (diminuir-se) o grão. Caso a deformação seja realizada a quente, acima de Tf/2, o processo de recristalização poderá ocorrer concomitante com a deformação tendo-se então a recristalização dinâmica que permite ao metal recuperar-se ao mesmo tempo que está sendo encruado e assim atingir grandes deformações plásticas. Em princípio qualquer material metálico pode ter grande maleabilidade isto é, ser reduzido a folhas finas sendo conformado em condições de recristalização dinâmica. Logo que são formados os novos grãos recristalizados começam a crescer como está ilustrado na figura 32. 3º) Crescimento de Grão – na realidade o crescimento de grão ocorre quer o material tenha sido encruado e passe pelas duas etapas (recuperação e recristalização) anteriores ou não tenha sido deformado plasticamente. A força motriz de crescimento do grão é a energia liberada quando um átomo atravessa o contorno passando da parte côncava para a convexa como ilustra a figura 33. Na região côncava o átomo está coordenado com um maior número de vizinhos situados à uma distância igual a de equilíbrio, figura I.20. Consequentemente o contorno se move em direção ao centro de curvatura da região côncava. Como os grãos pequenos tendem a ter superfícies de concavidades mais pronunciadas que os grãos maiores, eles desaparecem, como mostra a figura 33 alimentando o crescimento dos grãos maiores. O efeito final é o crescimento do grão da microestrutura. 42 FIGURA 32 - Recristalização e crescimento de grão no latão encruado. 43 FIGURA 33 - Mecanismo atômico de crescimento de grão. FIGURA 34 - Desaparecimento de grãos menores e crescimento de grãos maiores. 44 COMPORTAMENTO MECÂNICO A BAIXAS TEMPERATURAS Os metais e ligas metálicas ao trabalharem à temperatura ambiente ou temperatura mais elevadas normalmente apresentam uma resistência à fratura relativamente elevada, o que se traduz, entre outras coisas, num elevado consumo de energia para que o processo de fratura possa ocorrer. Em outras palavras, isso significa que uma elevada quantidade de energia deve ser fornecida ao componente ou estrutura para que a fratura possa ocorrer, daí a elevada resistência à fratura dos mesmos. Na medida que esses metais ou ligas trabalham em condições em que a temperatura de serviço é menor que a temperatura ambiente, certos metais e suas ligas podem apresentar um tendência a necessitarem uma quantidade de energia bastante menor para sofrerem um processo de fratura, caracterizando, desse modo, um maior risco de fratura dos mesmos, quando trabalhando a baixas temperaturas. A resistência que os metais e ligas metálicas apresentam à fratura é normalmente chamada de tenacidade a fratura, podendo ela ser medida de vários maneiras sendoa mais popular a medida da energia absorvida no processo de fratura, embora existam várias outras medidas de tenacidade. Quando o metais apresentam elevada resistência à fratura eles são ditos tenazes ou de elevada tenacidade à fratura. O oposto, quando os metais são poucos resistentes à fratura, fica caracterizada uma condição de baixa tenacidade à fratura, em cujo extremo situam-se os metais de comportamento frágil. Ao comportamento tenaz normalmente está associado um modo de fratura característico, de fratura dúctil. O comportamento frágil, por outro lado, está normalmente associado à fratura por clivagem. Aqui evidentemente, estão sendo feitas simplificações pois não consideramos no curso caso de fraturas intergranulares, onde os comportamentos tenaz ou frágil não estão diretamente associados às fraturas dúcteis por clivagem. Vamos a seguir analisar os dois modos principais de fratura. 45 FRATURA DÚCTIL Na temperatura ambiente ou temperaturas mais elevadas os metais e ligas metálicas usualmente utilizados na fabricação de equipamentos de processo fraturam por esse modo fratura. Nessas condições, o processo de fratura dúctil esta intimamente ligado à presença de partículas de segunda fase que normalmente estão presentes nas ligas utilizadas comercialmente. Assim, por exemplo, num aço estrutural com 0,15% C. na condição de laminado a quente, que é o normal para esse tipo de aço, têm-se uma matriz de ferrita com uma dispersão de perlita e inclusões não metálicas, normalmente de sulfetos e óxidos. Em aços inoxidáveis austeníticos tem-se uma matriz de austenita com partículas de segunda fase de carbonetos e inclusões não metálicas. Isso é também normal nas ligas não ferrosas e nos outros tipos de aço. Quando esses materiais são submetidos à deformação plástica, microcavidades (dimples) são formadas em torno das partículas de segunda fase, devido a inabilidade da matriz metálica em escoar complemente em torno dessas partículas, que normalmente são indeformáveis. Assim, com o decorrer da deformação plástica do metal, as microcavidades que envolvem as partículas de segunda fase aumentam de volume (crescem). Tal processo está ilustrado na figura 35. FIGURA 35 - Nucleação, crescimento e coalescimento das microcavidades (dimples) em um corpo de prova submetido à tração. 46 O crescimento das microcavidades com a deformação plástica do material continua a ocorrer até que uma condição crítica é alcançada, havendo então um coalescimento dessas cavidades pelo cisalhamento da matriz metálica entre as cavidades adjacentes. Desse modo, o processo de fratura dúctil pode ser dividido nas etapas: - nucleação das microcavidades em torno das partículas de 2º fase; - Crescimento das microcavidades; - coalescimento das microcavidades com separação do corpo de prova em duas partes (fratura propriamente dita). Segundo certos autores, o processo de coalescimento das cavidades ocorreria quando o comprimento das cavidades na direção de carregamento, se igualar ao espaçamento entre as partículas de segunda fase que originam a fratura. O processo de fratura dúctil ocorre com intensa deformação plástica do material, isto é, ele ocorre de tal maneira que uma grande quantidade de energia deve ser fornecida ao material para que essa deformação plástica possa ocorrer. Daí a elevada tenacidade à fratura ou comportamento tenaz dos metais e ligas metálicas que fraturam de forma dúctil. São casos típicos de fratura dúctil e comportamento tenaz aqueles que ocorrem com os aços ao carbono estruturais com baixo teor de carbono, de aços inoxidáveis austeníticos, de ligas de alumínio, cobre e níquel, à temperatura ambiente ou superiores. FRATURA POR CLIVAGEM A fratura por clivagem ocorre por separação direta das duas partes de corpo de prova segundo planos cristalográficos, devido a simples quebra de ligações atômicas. Sua principal característica é a de ocorrer seguindo certas famílias de planos característicos, os planos de clivagem. No ferro, por exemplo, a fratura por clivagem ocorre segundo os planos (100), conforme ilustrado na figura 36. 47 O modo como ocorre a fratura por clivagem faz com que a superfície de fratura seja relativamente plena e isso é tão mais verdade quanto mais nos aproximarmos da condição de monocristais. É sabido, entretanto, que os metais e ligas metálicas são normalmente utilizadas na forma policristalina. Como nos policristais a orientação dos grãos adjacentes é diferente, a superfície da fratura por clivagem não é completamente plena pois ela muda de direção de grão para grão, embora mantendo o seu caráter cristalográfico, isto é, a fratura por clivagem propaga-se segundo famílias específicas de planos. Tal fato é ilustrado na figura 37. FIGURA 36 - Modelo de fratura por clivagem no ferro submetido a carregamento por tração. FIGURA 37 - Fratura por clivagem em um corpo de prova policristalino de ferro carregado em tração. 48 A Figura 38 apresenta o aspecto de fraturas ductil (dimples) e frágil por clivagem. FIGURA 38 – Aspecto da fratura dúctil e frágil observada por microscopia eletrônica de varredura O processo de fratura por clivagem ocorre sem que haja deformação plástica no material ou com uma quantidade de deformação plástica desprezível. Desse modo, a quantidade de energia que deve ser fornecida ao material para que ocorra este tipo de fratura é muito pequena, resultando daí o comportamento frágil associado a esse tipo de fratura. Com base no aspecto metalográfico a fratura pode ser classificada em transgranular (através dos grãos) ou intergranular ( entre os grãos). A fratura transgranular pode ocorrer tanto por clivagem como por cisalhamento. A intergranular corresponde a condições de fragilização dos contornos de grão acarretando propagação de trincas intergranulares, com baixo consumo de energia. Fratura Intergranular 49 TRANSIÇÃO DÚCTIL – FRÁGIL Certos metais são tenazes à temperatura ambiente e temperaturas mais elevadas, mantendo também esse comportamento quando a temperatura é diminuída, mesmo para valores muito baixos, até a temperatura do nitrogênio líquido. Os metais CFC apresentam normalmente esse tipo de comportamento. Desse modo o alumínio, cobre, níquel e muitas de suas ligas apresentam tenacidade que não decresce abruptamente com a diminuição da temperatura. Por outro lado, os metais CCC e HC podem apresentar comportamento tenaz ou frágil dependendo da temperatura em que eles forem deformados. Além do efeito da temperatura são também importantes para esse comportamento duplo outras variáveis, como o estado de tensão, velocidade de deformação e algumas variáveis metalúrgicas. Desse modo, um aço doce estrutural, dependendo das condições em que ele for ensaiado, poderá apresentar um ou outro comportamento. Convém aqui enfatizar a importância desse fato, uma vez que o risco na utilização desse materiais que podem apresentar comportamento duplo é grande se houver qualquer possibilidade dos mesmos virem a enfrentar condições de utilização que levem a um comportamento frágil. Esses metais que são tenazes à temperatura ambiente ou elevada e frágeis à baixas temperatura apresentam uma transição dúctil – frágil também em função dessas variáveis. Vamos a seguir analisar o efeito das diversas variáveis na transição dúctil – frágil. EFEITO DA TEMPERATURA As curvas que apresentam o decréscimo de ductilidade (ou tenacidade) dos metais com o decréscimo da temperatura podem ser de dois tipos: da classe I ou II, conforme a figura 39. 50 FIGURA 39 - Curvas de ductilidade em função da temperatura. Na classe I há um decréscimo pronunciado da ductilidade (ou tenacidade) em uma faixa estreita de temperaturas, de tal modo que para as temperaturas mais elevadas a fratura é dúctil e a ductilidade (ou tenacidade)é relativamente elevada. Nas baixas temperaturas, abaixo da faixa de temperaturas em que ocorre a transição, a fratura é por clivagem e ductilidade muito baixa. Costuma-se definir uma temperatura Tc de transição acima da qual tem-se fratura dúctil e abaixo, por clivagem. Na classe II o decréscimo de ductilidade (ou tenacidade) ocorre de forma gradual, numa faixa bastante ampla de temperaturas, enquanto que não chega a ocorrer uma mudança do modo de fratura para clivagem, Esse tipo de comportamento é mais desejável nas aplicações desses materiais, embora a perda de ductilidade (ou tenacidade) a baixas temperaturas possa ser tal que assegure uma baixa performance para o componente. Nos metais que apresentam uma transição abrupta de comportamento, os mecanismos de deformação plástica são progressivamente inibidos com o decréscimo de temperatura, resultando, para temperaturas suficientemente baixas, uma tal dificuldade para os mesmos operarem que torna a deformação plástica impossível e faz com que o material frature por clivagem, tão logo que o seu limite de escoamento seja ultrapassado. Um efeito semelhante ao da temperatura pode resultar também de um aumento da velocidade de transformação do material ou da presença de 51 concentradores de tensões que também provocam um decréscimo da ductilidade (ou tenacidade) do material em função de dificultarem a deformação plástica do mesmo. EFEITO DA VELOCIDADE DE DEFORMAÇÃO O aumento da velocidade de deformação aumenta a temperatura de transição dúctil – frágil dos metais e ligas que apresentam essa transição. Isso se deve a uma maior dificuldade à uma deformação plástica devido ao aumento da velocidade de deformação, acarretando uma fragilização do material, isto é, mudança de comportamento de dúctil para frágil em temperaturas mais elevadas. O efeito da velocidade de deformação na ductilidade está representando esquematicamente na figura 40, onde é representada a velocidade de deformação. FIGURA 27 - Efeito da taxa de deformação na ductilidade de materiais que apresentam transição dúctil – frágil (curvas esquemáticas). EFEITO DE CONCENTRADORES DE TENSÕES A presença de concentradores de tensões pode criar um estado de triaxilidade de tensões nas pontas dos concentradores, o que acarreta uma maior dificuldade à deformação plástica nessas regiões. Devido a esse fato, a presença desses concentradores na forma de entalhes, marcas de usinagem, variações bruscas de diâmetros em eixos, etc., nos componentes ou estruturas tem também efeito fragilizante. Eles fazem com que a ductilidade (ou fragilidade) do componente 52 seja reduzido à uma dada temperatura de ensaio quando o mecanismo de fratura é o dúctil. Eles acarretam também um acréscimo na temperatura de transição dúctil - frágil, fazendo que o risco de fratura catastrófica exista para temperaturas superiores àquelas em que haveria tal risco se o componente não apresentasse esses concentradores de tensão. O efeito da presença de um concentrador de tensões na ductilidade de um aço que pode apresentar transição dúctil – frágil está apresentando esquematicamente na figura 28. FIGURA 28 - Efeito de concentradores de tensões na ductilidade de metais que podem apresentar transição dúctil – frágil. Do que foi exposto anteriormente é possível concluir-se que os fatores que dificultam a deformação plástica nos metais e ligas metálicas tem um efeito fragilizante, diminuindo a sua ductilidade e tenacidade à fratura. O efeito dessas variáveis é ainda acentuado quando os metais e consideração podem apresentar uma transição no modo de fratura, de dúctil para clivagem, o que acarreta uma mudança bastante brusca na resistência à fratura desses materiais e resultante aumento do risco de fratura catastrófica na estrutura. EFEITO DE VARIÁVEIS METALÚRGICAS NA TENACIDADE À FRATURA DOS METAIS Várias são as variáveis metalúrgicas que podem Ter influência na tenacidade à fratura dos metais. Entre as mais importantes podemos citar: 53 - estrutura cristalina - tamanho de grão - microconstituintes - anistropia dos microcostituintes ESTRUTURA CRISTALINA Já vimos anteriormente que os metais e ligas com estruturas CFC como o cobre, alumínio, níquel, aço inoxidável austenítico e outros não fraturam por clivagem, não apresentando portanto transição dúctil – frágil. Essas ligas são, consequentemente, as mais indicadas para situações criogênicas. Já os metais e ligas CCC como o ferro e aços ferríticos e HC como o titânio, zinco, zircônio e suas ligas podem fraturar por clivagem, apresentando a transição dúctil – frágil para combinações para baixas temperaturas, elevadas velocidades de deformação e presença de concentradores de tensões. Essas ligas devem ser utilizadas levando-se em conta o risco que elas apresentam do modo de fratura, para certas condições críticas daquelas variáveis, levando eventualmente a situações de fraturas catastróficas. Essas ligas evidentemente não devem ser utilizadas em temperaturas muito baixas. TAMANHO DE GRÃO Em aços ferríticos de baixo e médio carbono e muitos outros aços ferríticos, a temperatura de transição dúctil – frágil aumenta com o aumento do tamanho de grão da ferríta. Esse efeito fragilizador dos grãos grandes pode ser atribuído à concentração de tensões nos finais das bandas de deslizamento, nos contornos de grão. Quantos maiores forem os grãos, maiores serão as bandas de deslizamento e maiores as concentrações de tensões. Essas concentrações de tensões elevadas induzem uma nucleação de microtrincas nos contornos de grão causando a fratura catastrófica prematura do material, por clivagem. Desse modo, é uma boa prática metalúrgica reduzir tanto quanto possível o tamanho de grão dos mesmos, através de processo termo – mecânico adequado, resultando assim aços de elevada tenacidade à fratura e também limites de escoamento mais elevados. 54 ANISTROPIA DOS MICROCONSTITUINTES Os metais adquirem orientação preferencial ou direcionalidade em função da deformação de textura cristalográfica preferencial e fibramento mecânico durante os tratamentos termo – mecânico dos mesmos. Desse modo, os resultados de testes de avaliação de tenacidade à fratura e outras propriedades mecânicas de metais trabalhados mecanicamente variam com a orientação do corpo de prova em relação as direções de trabalho mecânico dos mesmos. Assim, a anistropia dessas propriedades é uma consideração importante no projeto, fabricação e análise de fraturas de componentes forjados, laminados ou extruturados. A textura cristalográfica geralmente é determinada por métodos e técnica de difração de raios-x. 55 Ensaios Mecânicos 56 II) Ensaios Mecânicos II.1) ENSAIOS DE TRAÇÃO O ensaio de tração uniaxial é amplamente utilizado para caracterizar a resistência mecânica à tração e encontra-se descritos em métodos de ensaio com as normas MB – 4/77 da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) e E8 da ASTM (Americam Society for Testing and Materials). Várias outras normas existem sobre o ensaio de tração, inclusive também das entidades citadas, para situações particulares. Este ensaio consiste em se tracionar corpos de prova, como os apresentados na figura 1 em máquinas, com a exposta na figura 2. A máquina de tração solicita o corpo de prova na direção de seu eixo longitudinal, através do deslocamento de um barramento pela rotação de dois parafusos sem – fim ou pela ação de um mecanismo hidráulico. A célula de carga mede o esforço aplicado e a deformação do corpo de prova é determinada pelo deslocamento do barramento, ou diretamente medida pela utilização de um extensômetro. FIGURA 1 - Corpos de prova típicos empregados em ensaios de tração. Por acordo internacional, exceto em casos especiais, adota-se a relação Lo=5,65.√So o que torna Lo=5d para corpos de provade seção circular (adaptada da MB-4/77). 57 FIGURA 2 - Esquema de um ensaio de tração. Neste caso o corpo de prova é tracionado pelo deslocamento de um barramento acionado pela rotação de parafusos sem-fim. A região do corpo de prova onde se concentra a deformação possui uma seção reduzida, é denominada parte útil, como visto na figura 29. Nesta região é tomado um trecho de comprimento Lo, denominado base de medida ou comprimento útil. A área inicial de seção reduzida é Ao e o esforço de tração sobre o corpo de prova é a força F. A elongação δ do corpo de prova, dividida pelo comprimento útil inicial Lo, é o alongamento específico ou deformação de engenharia ε. Tem-se que: ε = δ / Lo = ∆L / Lo = L – Lo / Lo Onde L é o comprimento num dado instante da região do corpo de prova, tomado como base de medida. 58 A figura 3 apresenta um curva típica resultante de um ensaio de tração, relacionando a tensão com a deformação de engenharia (também chamadas tensão e deformação convencionais). Nesta curva estão assinalados parâmetros importantes para a caracterização da resistência a tração dos materiais. Estes, assim como outras propriedades determinadas pelo ensaio de tração, encontram-se comentados a seguir. FIGURA 3 - Curva típica tensão/deformação convencionais e etapas do comportamento durante o ensaio de um material dúctil. MÓDULO DE ELASTICIDADE A proporcionalidade entre a tensão e a deformação foi determinada por Robert Hooke em 1678. O coeficiente de proporcionalidade E é o módulo de elasticidade, ou módulo young. E = σ / ε 59 Os materiais tem um comportamento elástico quando, ao ser retirado o esforço causador da deformação, retornam as suas dimensões originais. Caso haja deformação residual, esta é a deformação plástica. MÓDULO DE POISSON Como conseqüência da deformação no sentido do comprimento, tem-se uma redução na seção transversal de um material tracionado. A relação entre a deformação longitudinal e a concentração lateral é o módulo ou coeficiente de Poisson, ν. No caso do material isotrópico, isto é, ocorrendo deformação igual no plano da seção transversal, tem-se que ν = 0,5. TENSÃO LIMITE DE ESCOAMENTO (σy) (LE) A maioria dos metais apresenta nas curvas tensão/deformação uma transição do comportamento elástico para o comportamento plástico, como se pode ver na figura 3. O limite de escoamento convencional é a tensão determinada pela interseção da curva σ x ε com uma linha paralela ao trecho elástico, deslocada deste, pelo valor de uma deformação estabelecida. O valor convencionado para a deformação plástica varia em função do material. Para os aços, este valor é geralmente igual a 0,2%. Para aços ou ligas não ferrosas muito duras, este valor é da ordem de 0,01 a 0,1%. Para materiais que não possuem trecho linear na curva σ x ε, como é o caso do cobre ou do ferro fundido cinzento, define-se o limite de escoamento com a tensão onde a deformação total é igual a 0,5%. 60 A distinção entre os comportamentos elásticos e plásticos pode ser feita através dos critérios do limite de elasticidade e do limite de proporcionalidade, que não são usualmente adotados devido a dificuldades práticas na sua determinação. O limite de elasticidade é a maior tensão que pode ser aplicada sem deformação plástica remanescente. Portanto, aumentando-se a sensibilidade da medição, o limite de elasticidade diminui até o chamado limite elástico verdadeiro, tomando para deformações medidas com precisão da ordem de 10-6 cm/cm. Para uma precisão de 10-4 cm/cm tem-se que o limite de elasticidade é superior ao limite de proporcionalidade, que é a tensão onde ocorre desvio da linha reta na curva σ x ε. TENSÃO LIMITE DE RESISTÊNCIA À TRAÇÃO (σT) (LLR) É a carga máxima registrada no ensaio de tração, dividida pela área inicial. DUCTILIDADE A ductilidade é medida pelo alongamento ou elongação na fratura, εf e pela redução de área Ra na fratura, calculados pelas expressões abaixo e usualmente fornecidos em termos percentuais. εf = Lf –Lo / Lo Ra = Ao – Af / Ao Um material completamente dúctil teria redução de área na fratura de 100%. Na prática são considerados dúcteis, materiais, cuja redução de área na fratura seja superior a 30%. Este critério, entretanto, não é rígido. RESILIÊNCIA A resiliência é a energia que o material absorve na região elástica. Mede-se pelo modo de resiliência, que é a energia por unidade de volume para tensionar o material até a tensão limite de escoamento. 61 Esta energia corresponde à área sob a curva σ x ε até o limite de escoamento. Aços com elevada resiliência são adequados à fabricação de molas. Na figura 4 pode-se comparar a resiliência de um aço estrutural com a de um aço – mola de alto carbono. FIGURA 4 - Curvas σ x ε de aços com diferentes propriedades. As curvas σ x ε, apresentadas na figura 3 e 4 relacionam a tensão e deformação convencionais, ou de engenharia, que tomam como referência a área inicial de seção transversal do corpo de prova e o seu comprimento lo. Como, a medida que varia a carga sobre o corpo de prova, varia sua seção transversal e também comprimento da região tomada como base de medida, tem-se que num dado instante a tensão e a deformação atuante são: S = F / A e εv = dl / l S e εv são denominadas, respectivamente, tensão e deformação verdadeiras e se relacionam com a tensão e deformação de engenharia pelas expressões: S = σ ( ε + 1 ) 62 εv = ln ( ε + 1 ) Estas relações são validas, admitindo-se que o volume se mantenha constante e que a deformação seja uniforme ao longo de todo o comprimento útil do corpo de prova. A figura 5 apresenta os tipos de fratura observados nos ensaios de tração de metais. Verifica-se nos casos c e d que, no processo de fatura ocorre a concentração da deformação numa seção do corpo de prova, produzindo o chamado empescoçamento. As relações entre σ e ε, e S e εv necessitam de uma correção nestes casos. A figura 6 permite a comparação entre as curvas σ x ε e S x εv com e sem a correção, devido a deformação do pescoço, que se inicia normalmente na carga máxima. FIGURA 5 - Tipos de fraturas que ocorrem nos ensaios de tração (a) Fratura frágil de monocristais e policristais; (b) Fratura cisalhante em monocristais dúcteis; (c) Fratura completamente dúctil; (d) Fratura dúctil em policristais. 63 FIGURA 6 - Comparação entre as curvas tensão x deformação de engenharia e tensão x deformação verdadeiras. DESCONTINUIDADE NO LIMITE DE ESCOAMENTO Muitos materiais não apresentam transição gradual do comportamento elástico para o plástico exibindo uma curva tensão – deformação do tipo apresentado na figura 7. Verifica-se neste caso que o início da deformação plástica ocorre com queda na carga aplicada. A tensão correspondente a este primeiro máximo da curva tensão – deformação de engenharia, é o limite superior de escoamento (Les). O limite inferior do escoamento (LEi) é menor valor da tensão no escoamento, não se computando um possível efeito transitório inicial. A menos de uma ressalva especial, a deformação “limite do escoamento”, apresentada nas fontes de referência de propriedades mecânicas dos materiais, refere-se ao limite superior de escoamento. 64 No caso dos aços de baixo carbono, este fenômeno ocorre devido à interação entre discordâncias e átomos intersticiais em solução. Os átomos intersticiais de carbono e nitrogênio se difundem para regiões mais “abertas” na estrutura cristalina, como a linha das discordâncias aresta, por exemplo, formando neste caso uma fileira de átomos intersticiais. FIGURA 7 - Curva σ x ε apresentando limites de escoamento superior e inferior. Propagação das bandas de Luders. Os átomos intersticiais bloqueiam a movimentação das discordâncias, que só poderão deslocar sob
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