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EFÉSIOS
J. W esley Adams
e D onald C . Stamps (in memoriam)
INTRODUÇÃO
1. Uma Carta Majestosa
Efésios é o nome de uma obra magnífica
que se projeta tal como um ápice em meio
às revelações bíblicas — na mesma clas
se de Romanos, do Quarto Evangelho e
de Hebreus. Os escritores referem-se a
ela como a “Suíça do Novo Testamento”.
“A Rainha das Epístolas” (Barclay) e “O
Apogeu da Obra de São Paulo” (Robinson).
João Calvino a considerava sua corres
pondência favorita, e o grande poeta
Coleridge considerava Efésios como a “mais
divina das composições humanas”. Em
nenhuma outra obra a revelação do Es
pírito Santo se encontra mais evidente do
que nesta carta. Com muita propriedade,
Charles Hodge observa: “Essa Epístola se
revela tão evidentemente como obra do
Espírito Santo como as estrelas revelam
Deus como seu criador” (Hodge, xv).
Efésios, como pedra fundamental da
compreensão de Paulo sobre a revelação
do propósito eterno de Deus através de
Cristo para a Igreja, tem um caráter sin
gular entre todas as outras cartas escritas
por Paulo. Existe nela uma manifesta
ausência de controvérsias teológicas (como
encontramos em “Gálatas” e em “Roma
nos”) e também de problemas pastorais
(como nas cartas aos Tessalonicenses e
aos Coríntios). Ao contrário, “é uma car
ta pastoral afetuosa e espiritualmente sensível
em seus conselhos, tranqüila e profunda
mente reflexiva em seu tom, e facilmen
te transbordante em oração e alegre ado
ração” (Turner, 1222). Sua abrangência
eterna não deixa de ser empolgante e, ao
mesmo tempo, maravilhosamente concisa
em sua apresentação.
Como observei em outros autores (Adams,
4-6), infelizmente na era moderna os eru
ditos do Novo Testamento focalizaram com
maior intensidade as questões mais críti
cas a respeito da origem da obra de Efésios
e da autenticidade da autoria de Paulo, do
que sua profunda mensagem para a Igre
ja. Porém, todas as vezes que a revelação
do plano glorioso de redenção de Deus,
através de Cristo Jesus, é considerada como
de importância fundamental, e todas as vezes
que as implicações práticas da vida “em
Cristo” para o crente e a Igreja são realçadas,
Efésios continua sendo um livro muito apre
ciado, lido e pregado. Essa obra trata de
questões diretamente relevantes para a
renovação da Igreja e também de questões
tão profeticamente importantes e neces
sárias para levar a Igreja a atingir a matu
ridade— istoé, “à medida da estatura completa
de Cristo” (4.13)— que pode ser estabelecida
como a principal carta do Novo Testamento
para a Igreja do final dos tempos.
2. Autoria
Como em todas as suas cartas, Paulo cla
ramente se identifica no início de Efésios.
“Paulo, apóstolo dejesus Cristo” (1.1). À
sua maneira característica, também atri
bui sua autoridade apostólica “à vontade
de Deus” (1.1; cf. 2 Co 1.1; Gl 1.1; Cl 1.1).
Como em suas incontestes cartas, o nome
de Paulo reaparece mais tarde em Efésios:
“Eu, Paulo, sou o prisioneiro dejesus Cristo
por vós, os gentios” (3.1; cf. 2 Co 10.1; Gl
5.2; Cl 1.23; 1 Ts 2.18). Paulo freqüentemente
usa a primeira pessoa do singular e pede
aos leitores que orem para que destemi
damente declare o evangelho como um
embaixador cativo (6.19-20). Com a mis
são de levar notícias aos leitores em seu
nome (6.21-22), Paulo pede a Tíquico que
seja o portador da carta e seu represen
tante pessoal.
Apesar dessas provas, nos dias de hoje
muitas controvérsias têm cercado sua autoria.
Essa questão foi primeiramente discutida
em 1792 porEvanson, que não conseguia
conciliar o título da carta com seu conteúdo.
Por volta da década de 1820, alguns eru
ditos alemães discutiram a autoria de Paulo
apoiados em outros fundamentos. Des
1189
EFÉSIOS
de então, a autenticidade dessa carta tem
causado controvérsias entre muitos espe
cialistas do Novo Testamento (contempo
râneos notáveis como R. Schnackenburg,
C. L. Mitton e A. T. Lincoln), baseados em
seu estilo e vocabulário supostamente “não-
Paulinos” e em conceitos teológicos e
eclesiásticos pós-Paulinos (para resumos
mais detalhados das questões levantadas
a respeito da autoria e das respostas que
foram dadas veja Guthrie, 490-508; Foulkes,
19-49; Caird 11-29).
Enquanto Andrew Lincoln Qxxiii) contesta
que a autoria “não-Paulina” não diminui
a validade da carta, não só no que diz respeito
ao cânon do Novo Testamento, mas também
à autoridade de sua mensagem, T. K. Abbott
(xvii-xviii, xxiv) por outro lado, cuidado
samente assinalou muitos anos antes que
sua autenticidade é uma questão de suma
importância. Se outra pessoa que não Paulo
(ou seu designado amanuense) tivesse
escrito a obra de Efésios, apesar das ale
gações explícitas de ter sido escrita por
ele e as várias referências às suas circuns
tâncias pessoais como autor, teria sido
necessária uma falsificação com o propósito
de enganar os leitores em relação à sua
origem verdadeira.
F. F. Bruce (1961, 12) focaliza outro
problema da autoria que levou os erudi
tos que aceitam a tese do pseudônimo a
uma confrontação. Afirma que Efésios
representa um testemunho tão extraordi
nário da inspiração e da assimilação da
revelação paulina que, se não tivesse sido
escrita pelo próprio Paulo, então teria que
ter sido por alguém que lhe fosse seme
lhante ou que lhe fosse espiritual e inte
lectualmente superior. Bruce ainda acres
centa que não temos conhecimento da
existência de um segundo Paulo com a
mesma estatura nos primórdios da cris-
tandade. Seguindo a mesma linha de ra
ciocínio, HenryJ. Cadbury, professor emérito
da Harvard Divinity School, tratou do mesmo
problema do pseudônimo sob a forma de
uma pergunta. “O que seria mais prová
vel — que um imitador de Paulo do pri
meiro século tivesse escrito noventa ou
noventa e cinco por cento conservando
o estilo de Paulo, ou que o próprio Paulo
tivesse escrito uma carta divergindo cin
co ou dez por cento de seu estilo habitu
al?” (citado por Brown, 378) O presente
autor aceita totalmente o indiscutível tes
temunho da autoria do inspirado texto de
Efésios e acredita que todas as supostas
discrepâncias podem ser explicadas ade
quadamente, com base nas circunstânci
as em que Paulo escreveu a carta e em
seu exclusivo conteúdo e propósito.
3. Data e Local das Cartas
A Carta aos Efésios menciona claramen
te que foi escrita por Paulo como “o pri
sioneiro dejesus Cristo por vós, os gen
tios” (3.1), “como o preso do Senhor” (4.1)
e como um “embaixador em cadeias” (6.20).
Paulo testemunha em 2 Coríntios 11.23
que foi feito prisioneiro muitas vezes (55/
56 d.C.), mais do que qualquer outro
apóstolo. Mais tarde, o livro de Atos re
gistra duas importantes prisões de Pau
lo: dois anos em Cesaréia (24.1-26.32) e
dois anos em Roma (28.16-31). As Cartas
Pastorais de Paulo (sendo a ordem des
sas cartas 1 Timóteo, Tito, 2 Timóteo)
registram a atividade missionária de Paulo
após sua primeira prisão em Roma e ter
minam durante sua segunda prisão tam
bém em Roma. Além dessas, existem outras
três importantes experiências como pri
sioneiro e alguns escritores ainda propõem
que tenha havido uma quarta e importante
prisão ocorrida em Éfeso.
Alguns escritores procuraram levan
tar uma razão para Paulo ter escrito aos
Efésios enquanto prisioneiro em Cesaréia,
ou mesmo durante uma prisão não re
gistrada em Éfeso. Porém, a visão que
Paulo descreveu em Efésios, durante sua
primeira prisão em Roma, (60-62 ou 61-
63 d.C.), e mencionada em Atos 28, per
manece intacta entre os eruditos do Novo
Testamento e é a mais provável. Duran
te esse período ele escreveu Filemom,
Colossenses, Efésios e provavelmente
Filipenses. A melhor hipótese é que a Carta
aos Efésios tenha sido escrita logo de
pois de Colossenses (e Filemom) em 62
d.C., com todas as cartas sendo simulta
neamente levadas por Tíquico até o seu
destino (cf. Ef 6.21-22; Cl 4.7).
1190
EFÉSIO S
A CIDADE DE EFESO
Na época de Paulo
A província da Ásia, com suas muitas e esplêndidas
cidades, era umadas jóias no cinturão das terras
romanas que circundavam o Mediterrâneo.
Localizada à beira-mar, e na rota terrestre direta
para as províncias orientais do império, Éfeso foi um
entreposto comercial raramente igualado por algum outro
no resto do mundo. Com toda a certeza, nenhuma cidade da
Ásia era mais famosa ou mais populosa. Estava classificada
dentre os principais centros urbanos do império, podendo
ser igualada a Roma, Corinto, Antioquia e Alexandria.
Situada em uma baía interior (hoje em dia coberta de lodo),
a cidade se ligava, através de um canal estreito do Rio
Cayster, ao mar Egeu, a uma distância aproximada de 3
milhas (4.8 quilômetros). A cidade ostentava impressionan
tes monumentos cívicos, incluindo-se entre eles o proemi
nente templo deAríemis (Diana), uma das sete maravilhas
do mundo antigo. As moedas da cidade orgulhosamente
exibiam o “slogan” Neokoros, isto é, “guardiã do templo”.
Paulo pregou a grandes multidões nessa cidade. Os
artesãos se queixavam de que ele havia influenciado um
grande número de pessoas em Éfeso e em praticamente
As linhas trace
jadas representam
a provável localiza-
ção dos muros da
cidade.
.Sifc.
Ruas laterais (linhas
pontilhadas) refletem apenas
■ conceito do artista a título de
ilustração.
1
toda a província da Ásia (At 19.26). Em um dos eventos
mais dramáticos registrados no Novo Testamento, o apósto
lo conseguiu desvencilhar-se de uma grande multidão no
teatro. Essa estrutura, localizada na ladeira do Monte Pion,
no final do “Caminho da Arcádia”, podia acomodar 25.000
pessoas sentadas.
Outros lugares muito familiares ao apóstolo foram, sem
dúvida, a "Ágora Comercial”, o “Portão Magnesiano”, a
Prefeitura ou “A Casa do Conselho” e a “Rua Curetes”. A
localização da sala das conferências ou escola de Tirano,
onde Paulo ensinava (At 19.9), é desconhecida.
4. Os Destinatários
Ao contrário das outras cartas escritas por
Paulo, a identidade dos destinatários ori
ginais dessa carta é incerta. A saudação
“aos santos que estão em Éfeso” (1 .1)
poderia esclarecer a questão, exceto por
duas considerações:
1) As palavras “em Éfeso” não aparecem no texto
dos prim eiros e m elhores m anuscritos gre
gos, indicando qu e provavelm ente não es
tivessem n o original1.
2) N ão ex istem re ferên cias p e sso a is ao s le i
tores, co m o era característico das cartas de
P aulo, ou q u alq u er m en çã o d o n o m e de
um a p essoa , das igrejas q u e fundou ou dos
lugares onde era b e m conh ecid o. Está claro
em Atos 19 que era bem conhecido em Éfeso,
ten d o p assad o q u ase três an o s n e ssa c i
dade, em um ministério poderoso e espiritual
m en te u n gido (cf. 2 0 .3 1 ).
Por essas e outras razões, geralmente
se acredita que Paulo tenha escrito a Carta
aos Efésios para um conjunto maior de
leitores do que apenas os habitantes lo
cais . Inicialmente, ela pode ter servido como
uma carta circular para numerosas igre
jas na grande e populosa província romana
da Ásia, onde a cidade de Éfeso estava
localizada. Originalmente, cada igreja pode
ter inserido seu próprio nom e em 1.1,
testemunhando a relevância de sua pro
funda mensagem para todas as verdadeiras
igrejas de Jesus Cristo. Por fim, a carta foi
identificada com o tendo sua origem na
igreja mãe em Éfeso, a capital e a metró
pole mais importante da província.
5. O Motivo da Carta
Atos e as cartas que Paulo escreveu na
prisão contêm dados históricos que podem
ser agrupados e relacionados com a época
em que a Carta aos Efésios foi escrita.
Embora em prisão dom iciliar em Roma,
1191
EFÉSIOS
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Éfeso
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R O D E S
Éfeso era a capital e a cidade mais importante da
província da Ásia.
aguardando julgamento perante César.
Paulo tinha permissão para receber um
contínuo fluxo de visitantes (At 28.16-
31). Entre esses, encontravam-se repre
sentantes da Igreja, como Epafras (de
Colossos) e Tíquico (nativo de Éfeso).
Esses homens podem ter sido conver
tidos sob o ministério de Paulo quan
do “todos os que habitavam na Ásia ou
viram a palavra do Senhorjesus, tanto
judeus como gregos. E Deus, pelas mãos
de Paulo, fazia maravilhas extraordiná
rias... e o nome do Sen h o rjesu s era
engrandecido... Assim, a palavra do Senhor
crescia poderosamente e prevalecia” (At
19.10-11, 17c, 20).
Os comentários de Paulo a respeito de
Epafras sugerem que evangelizou o Vale
de Lico durante seu ministério em Éfeso
e que ajudou a fundar igrejas em Colossos,
Hierápolis e Laodicéia. Epafras visitou Paulo
em Roma, e lhe trouxe informações so
bre essas igrejas (veja Cl 1.7; 4.12; Fm 23).
Aparentemente também trouxe notícias
a respeito de falsas doutrinas em Colossos,
o que imediatamente levou Paulo a es
crever aos colossenses.
Enquanto isso, um escravo fugitivo de
Colossos, chamado Onésimo, entrou em
contato com Paulo em Roma e foi con
vertido. Depois de discipulá-lo, Paulo
decidiu devolvê-lo ao seu dono cristão
em Colossos, Filemom, para que fosse
perdoado. Paulo aproveitou essa ocasião
para enviar uma carta a Filemom, por meio
de Tíquico, e uma carta para toda a Igreja
em Colossos. Tíquico e Onésimo inici
almente navegaram até Éfeso e depois
prosseguiram a pé, através do Vale de Lico,
até Colossos.
Antes da partida de Tíquico e Onésimo,
Paulo escreveu ainda uma terceira carta
aos efésios, a qual pretendia que tivesse
um cunho mais geral, para ser divulgada
por Tíquico em Éfeso e outras igrejas nessa
província da Ásia. A Carta aos Efésios pode
ter sido “a carta de Laodicéia” menciona
da em Colossenses 4.16. Essa colocação
pode muito bem explicar a maior parte
das características da Carta aos Efésios e
explica, de forma bastante satisfatória, a
notável semelhança e grande afinidade
existentes entre essa carta e a de Colos
senses (cf. Ef 6.20; Cl 4.7).
As semelhanças literárias que se per
cebe entre as cartas aos Colossenses e aos
Efésios são tão nítidas que muitas vezes
são chamadas de “cartas gêmeas”. Um
escritor chegou a contar quarenta coin
cidências de conceito e de linguagem entre
elas. Ainda assim, estão “tão intimamen
te interligadas no conteúdo de cada epístola
que seria impossível terem sido obra de
qualquer tentativa de imitação ou falsifi
cação” (W. Martin, 1015). As sem elhan
ças poderiam ser razoavelmente explicadas
se Paulo as tivesse escrito simultaneamente.
As d iferen ças podem ser devido à sua
mudança de foco para o assunto da Igre
ja em Éfeso, longe da controvérsia sobre
a doutrina herética que é tratada na Car
ta aos Colossenses.
6. Propósito e Mensagem
Ao escrever aos efésios, o propósito de
Paulo era muito diferente daquele que tinha
em mente ao escrever aos colossenses.
Em Colossenses ele combate e corrige um
falso ensinamento envolvendo elemen
tos judeus e pagãos que pretendiam ne
gar o senhorio de Cristo no universo e a
perfeição de sua obra redentora na his
tória. Paulo responde a essa heresia de
senvolvendo o tema da pessoa e da obra
de Cristo em relação ao cosmos como um
todo, incluindo aqueles principados e
pdtestades com mais proeminência na
1192
EFÉSIOS
heresia. Como F. F. Bruce afirma (1984,
231) “os efésios acompanhavam a mes
ma linha de pensamento ao considerar as
implicações para a Igreja como corpo de
Cristo”.
Em Efésios, Paulo escreve sobre os
propósitos eternos de Deus em Cristo a
fim de criar entre judeus e gentios uma
nova humanidade através da cruz (2.11-
18) e uma nova comunidade como o corpo
de Cristo na terra (1.22,23; 2.19-22; 3-6).
Dessa maneira, Deus decidiu proclamar
e modelar seu evangelho de reconcilia
ção para o mundo e até mesmo tornar
conhecida sua multiforme sabedoria aos
“principados e potestades nos céus” (3.10).
Embora Paulo estivesse confinado e
prisioneiro em sua moradia alugada em
Roma, elevava-se como uma águia nos
domínios celestes da revelação.Agora
estava livre para escrever o que J. Armitage
Robinson (10) chama de “uma suprema
exposição, indiscutível, positiva e fun
damental da grande doutrina de sua vida
— aquela doutrina na qual vinha avan
çando ano após ano sob a disciplina de
sua circunstância ímpar — a doutrina
da unidade da humanidade em Cristo e
o propósito de Deus para o mundo através
da Igreja” tal como a plenitude da pre
sença de Cristo sobre a terra (1.22,23;
3 .20,21).
Dessa forma, o propósito de Paulo não
era simplesmente que seus escritos ser
vissem como inspiração, mas que também
fossem práticos.
1) Procurou fortalecer a fé e os fundamen
tos espirituais das igrejas da Ásia através
da revelação da plenitude dos propósitos
eternos de Deus na redenção “em Cristo”
(1,3-14; 3.10-12)paraalgreja(1.22,25\ 2.11-
22; 3.20,21; 4.1-16; 5.25-27) ep ara cada
membro individual de seu corpo (1.15-21;
2.1-10; 3.16-20; 4.1-3,17-32; 5.1— 6.20).
2) Exortava seus leitores a demonstrar clara
e visivelmente, através da pureza e do amor
em sua conduta diária, que Cristo Jesus é
seu “único Senhor” e a Igreja é “seu único
corpo" e, assim, pela contradição, abrir
caminho para o propósito de Deus para a
Igreja e seu testemunho de Cristo para o
mundo (4.1—6.20).
7. O Ministério do Espírito Santo
em Efésios
Embora os temas mais importantes em
Efésios sejam Cristo, a Igreja e o plano eterno
de Deus para a redenção, é o Espírito Santo
e o seu papel em relação ao crente e à
Igreja, como a presença poderosa de Deus,
que faz de nós o povo de Deus e o corpo
de Cristo na terra. Em relação à proemi-
nência do Espírito Santo em Efésios, Gordon
Fee comenta (732): “Existem raros aspectos
da vida cristã em que o Espírito Santo não
assume o papel principal, e são raros os
aspectos sobre o papel do Espírito que
não tenham sido mencionados nessa carta”.
Em 1.13, o Espírito Santo é chamado
(lit.) de “o Espírito Santo da promessa”,
cuja importante presença na promessa divina
é um sinal de que os últimos dias já che
garam Q1 2.28-32; At 2.16-21). Jesus pro
mete batizar seus discípulos com o (ou
no) Espírito Santo (At 1.5), assim como
João Batista havia pregado (Mc 1.8;Jo 1.33)
e nesse contexto refere-se ao Espírito como
aquEle que o Pai havia prometido (Lc 24.49;
At 1.4). Na ocasião do Pentecostes, Pedro
testemunha que Jesus, tendo sido exal
tado à mão direita de Deus, recebeu do
Pai “a promessa do Espírito Santo” e der
ramou aquilo que a audiência estava vendo
e ouvindo (At 2.33). Dessa forma, o ba
tismo com o Espírito está diretamente li
gado ao “Espírito da promessa” em uma
experiência não só individual, mas tam
bém coletiva e importante aos crentes que
se tornam “o corpo” de Cristo.
Além disso, em Efésios, o Espírito San
to é descrito como a marca ou o selo da
propriedade de Deus (1.13), a primeira parte
da herança do crente através de Cristo (1.14),
“o Espírito de sabedoria e revelação” (1.17),
aquEle que capacita o crente a ter intimi
dade com o Pai (2.18), aquEle pelo qual
Deus habita na Igreja (2.22), o revelador
do mistério de Cristo (3-4,5) e a pessoa que
fortalece os crentes em seu íntimo (3 .1 6 ).
Na Igreja, os crentes deverão “guardar a
unidade do Espírito pelo vínculo da paz”
(4.3); “há um só corpo e um só Espírito”
(4.4). O Espírito Santo se entristece pelo
pecado na vida dos crentes (4.30). São
1193
EFÉSIOS
aconselhados a continuar “cheios do Es
pírito” (5.18), a se prepararem para a gueixa
espiritual com “a espada do Espírito, que
é a palavra de Deus” (6.17) e a “orar no
Espírito” em todas as ocasiões (6.18).
ESTRUTURA E ESBOÇO
Utilizando os termos mais simples,
podemos dizer que existem dois temas
básicos no Novo Testamento:
1) O modo como somos remidos por Deus
— isto é, pela graça através da fé; e
2) Como nós, remidos pelo Senhor, devemos
viver— isto é, os imperativos éticos da graça.
De uma maneira abrangente, todos os outros
temas podem ser agrupados em qualquer
uma dessas extensas categorias — a teo
lógica ou a ética.
Efésios naturalmente pertence a estas
duas categorias distintas, como indica o
seguinte resumo da carta. Os capítulos
1 a 3 contêm gloriosas declarações teo
lógicas a respeito da redenção que Deus
nos concedeu através de Cristo; os ca
pítulos 4 a 6 consistem, em grande par
te, de ensinamentos práticos a respeito
das exigências que a redenção de Deus,
através de Cristo, nos faz em relação à
nossa vida individual e em coletividade,
como corpo de Cristo. Isso não quer dizer
que Paulo tenha colocado a teologia em
um escaninho e a ética em outro. As duas
são partes inseparáveis de um todo e estão,
muitas vezes, entrelaçadas em um mes
mo parágrafo. No entanto, para os pro
pósitos da apresentação e da organiza
ção, Paulo inclina-se por estabelecer uma,
em seguida a outra, em seu apelo a uma
vida cristã completa.
Parte I. G loriosas Declarações
Teológicas a Respeito da Redenção
(capítu los 1— 3)
1. Saudação (1.1,2)
2. A P re e m in ê n c ia de C r is to je s u s n a
Redenção (1.3-14)
2.1. A Preeminência de Cristo Jesus no
Plano Eterno do Pai (1.3-6)
2.1.1. As Bênçãos do Pai em Cristo (1.3)
2.1.2. A Eleição do Pai em Cristo (1.4)
2.1.3. A Predestinação do Pai na Adoção
em Cristo (1.5,6)
2.2. A Preeminência de Cristo na
Realização da Redenção (1.7-12)
2.2.1. A Redenção através de seu Sangue
(1.7-8)
2.2.2. A Redenção sob uma Autoridade
— ou Cabeça (1.9-12)
2.3. A Preeminência de Cristo no Papel
do Espírito Santo (1.13-14)
2.3.1. O Espírito Santo como o Selo de
nossa Fé em Cristo (1.13)
2.3.2. O Espírito Santo como a Primeira
Parte de nossa Herança em Cristo (1.14)
3. A Oração Apostólica pelo
Esclarecimento Espiritual dos
Crentes (1.15-23)
3.1. O Contexto da Oração Apostólica de
Paulo (1.15-17a)
3.2. O Foco da Oração Apostólica de
Paulo (1.17b-19).
3-3. Exaltação, o Senhorio e a Autoridade
de Cristo como Cabeça, como a Medida
do Poder de Deus que Está Disponível
(1.20-23)
4. Os Resultados da Redenção em
Cristojesus (2.1— 3.13)
4.1. Cristo Salva os Pecadores de sua
Condição Irremediável (2.1-10)
4.1.1. A Condição de Desespero da
Humanidade sem Cristo (2.1-3)
4.1.2. A Salvação pela Graça, através da
Fé em Cristo (2.4-10)
4.2. Cristo Reconcilia Grupos de Pessoas
Mutuamente Hostis a Deus e Entre Si
Mesmas, como uma Nova Humanidade
(2.11-18)
4.2.1. A Exclusão dos Gentios da
Presença de Deus, e o Povo da Aliança
( 2 .11,12)
4.2.2. A Inclusão dos Gentios na Única e
Nova Humanidade em Cristo (2.13-18)
4.3. Cristo Une Povos Separados em uma
Única e Nova Comunidade (2.19-22)
4.3.1. A Analogia com a Cidadania
(2.19a)
4.3.2. A Analogia com a Família (2.19b)
4.3.3- A Analogia com um Edifício (2.20-22)
4.4. Paulo e a Igreja como o Meio de
Revelação da Multiforme Sabedoria de Deus
na Redenção (3.1-13)
1194
EFÉSIOS
4.4.1. Paulo como um Poderoso
Instrumento de Deus (3-1-9)
4.4.2. A Igreja como um Instrumento
Coletivo (3-10-13)
5. A Oração Apostólica pelo
Esclarecimento Espiritual dos
Crentes (3.14-21)
5.1. A Fervorosa Súplica de Paulo (3.14-19)
5.2. A Gloriosa Doxologia de Paulo (3.20,21)
Parte II. Instruções Práticas para a Igreja
e para os Crentes (capítulos 4—6)
6. Implementando o Propósito de
Deus para a Igreja (4.1-16)
6.1. Preservar a Unidade do Espírito (4.1-6)
6.1.1. A Responsabilidade Individual
(4.1,2)
6.1.2. A Responsabilidade Coletiva (4.3-6)
6.2. Crescer em Direção à Plena
Maturidade do Coipo de Cristo (4.7-16)
6.2.1. A Provisão de Cristo quanto aos
Dons da Graça (4.7)
6.2.2. A Posição de Cristo como AquEle
que Dá os Dons (4.8-10)
6.2.3. O Propósito de Cristo ao Conceder
os Cinco Tipos de Liderança Ministerial
(4.11-13)
6.2.4.0 Plano de Cristo para o
Crescimento da Igreja (4.14-16)
7. Reproduzindo a Vida de Cristo nos
Crentes (4.17—5.21)
7.1. Deixar de Viver de Acordo com a
Personalidade Anterior (Natureza
Pecaminosa) (4.17-19)
7.2. Começar a Viver de Acordo com a
Nova Personalidade em Cristo (4.20-24)
7.3. Viver em Justiça como uma Nova
Criatura (4.25-32)
7.3.1.Deixar a Mentira e Falar a Verdade
(4.25)
7.3-2. Não Pecar pela Ira (4.26,27)
7.3-3. Abandonar o Roubo e Trabalhar
Diligentemente (4.28)
7.3.4. Deixar a Linguagem e as Conversas
Imorais e Falar Palavras Edificantes (4.29,30)
7.3.5. Deixar a Malícia e Perdoar
(4.31,32)
7.4. Viver em Santidade como Filhos da
Luz (5.1-14).
7.4.1. Andar em Amor (5.1-7)
7.4.2. Andar na Luz (5.8-14)
7.5. Viver Sabiamente como um Povo
Cheio do Espírito Santo (5.15-21)
7.5.1. Aproveitar ao Máximo cada
Oportunidade (5.16)
7.5-2. Compreender a Vontade do Senhor
(5.17)
7.5.3. Ser Cheio do Espírito Santo
(5.18-21)
8. Aplicando a Autoridade de Cristo
aos Relacionamentos do Lar (5.22—
6.9)
8.1. Esposos e Esposas (5.22,23)
8.1.1. Esposas, Sujeitai-vos a vosso
Esposo (5.22-24)
8.1.2. Esposos, Amem a sua Esposa
(5.25-33)
8.2. Pais e Filhos (6.1-4)
8.2.1. Filhos, Obedeçam a seus Pais (6.1-
3)
8.2.2. Pais, não Provoqueis vossos Filhos
à Ira (6.4)
8.3. Senhores e Servos (6.5-9)
8.3-1. Servos, Obedeçam a seus Senhores
Terrenos (6.5-8)
8.3.2. Senhores, Tratem seus Escravos -
ou Servos - com Justiça (6.9)
9. Estar Capacitado e Equipado para a
Batalha Espiritual (6.10-20)
9.1. Nosso Aliado - Deus (6.10-lla)
9.2. Nosso Inimigo - Satanás e suas
Forças (6.11b, 12)
9.3. Nossas Armas - Toda a Armadura de
Deus (6.13-20)
9.3-1- A Armadura (6.13-17)
9.3-2. A Vigilância através da Oração
(6.18-20)
10. Conclusão (6.21-24)
10.1. Paulo Recomenda Tíquico (6.21,22)
10.2. A Bênção (6.23,24)
COMENTÁRIO
Parte I. Gloriosas Declarações Teo
lógicas a Respeito da Redenção
(capítulos 1— 3)
Nos capítulos de 1 a 3, Paulo escreve a
respeito da gloriosa redenção que Deus
planejou e realizou através de Cristo para
os crentes e para a Igreja. Após uma sau
1195
EFÉSIOS 1
dação, inicia com um magnífico hino à
redenção (1.3-14), que oferece louvores
a Deus Pai por nos escolher e nos predestinar
em Cristo para sermos adotados como seus
filhos (1.3-6), por nos redimir através do
sangue de Cristo (1.7-12) e por nos con
ceder o Espírito Santo como selo e penhor
de nossa herança (1.13-14). Paulo afirma
que na redenção, sempre pela graça através
da fé em Cristo Jesus, Deus está nos re
conciliando consigo mesmo (2.1-10), está
derrubando as barreiras que nos separa
vam de outros que estão sendo salvos (2.11-
15) e está unindo os judeus aos gentios
como uma nova humanidade e como uma
nova comunidade, a Igreja (2.16-22). A
sabedoria e o propósito de Deus na re
denção são multiformes, à medida que Ele
age para “tomar a congregar em Cristo todas
as coisas... tanto as que estão nos céus como
as que estão na terra” (1.10).
Por duas vezes nesses capítulos, Pau
lo mergulha em profundas orações apos
tólicas, primeiro pelo nosso esclarecimento
espiritual em relação a essas verdades (1.16-
23) e segundo pelo cumprimento espiri
tual destas em nossas vidas (3.14-21).
1. Saudação (1 .1 ,2 )
Paulo começa suas cartas às igrejas com
uma saudação na qual se identifica como
um escritor apostólico e se dirige aos lei
tores utilizando uma forma de saudação
cristã. Essa saudação tem duas características
adicionais:
1) É a saudação mais breve dentre todas as
cartas de Paulo, e
2) De certa forma, a identidade dos destina
tários não é precisa. Como observamos na
introdução, as palavras “em Éfeso” (1.1)
não aparecem em muitos dos mais anti
gos e confiáveis manuscritos gregos, in
dicando que provavelmente não faziam parte
do original. A estrutura gramatical desses
mesmos manuscritos sugere que as primeiras
cópias de Efésios levavam em conta uma
pluralidade de nomes e lugares.
A carta tem em si uma qualidade uni
versal, como era de se esperar, se origi
nalmente fosse dirigida a diversas igrejas
como uma carta circular. Considerando que
em Éfeso estava uma igreja-mãe e que esta
cidade era a principal da província, loca
lizada no destino final da circulação da carta,
é fácil entender como essa carta chegou
a ser finalmente identificada com a cida
de de Éfeso em seu título e saudação.
A saudação contém três declarações
importantes:
1) Paulo se identifica como “apóstolo de je
sus Cristo, pela vontade de Deus” (1.1). Aqui
encontramos sua autoridade para escre
ver. No Novo Testamento, a palavra “após
tolo” foi aplicada em primeiro lugar aos
doze discípulos a quem Cristo designou
como líderes de sua Igreja. Logo esta se
tornou a designação oficial de um núme
ro mais amplo de líderes da Igreja no pri
meiro século como, por exemplo, Tiago
(o irmão do Senhor), Paulo, Barnabé e
provavelmente outros. A palavra “apóstolo”
significa mensageiro que tem a incumbência
de representar alguém, e que age através
da autoridade da pessoa que o incumbiu.
Paulo recebeu sua convocação e incum
bência diretamente de “Cristo Jesus”. Per
tencia a Cristo e o representava. Dessa forma,
quando Paulo fala ou escreve, o faz como
um porta-voz autorizado de Cristo, e dei
xa isso claro em todas as suas cartas. A
mensagem de Paulo é a própria mensagem
de Cristo, e Paulo a transmite através da
revelação e autoridade de Cristo. Atualmente,
algumas pessoas lêem um trecho ou um
verso de uma das cartas de Paulo e acham
que estão em conflito com as suas própri
as e apreciadas interpretações, e então
respondem: “Isso é apenas a opinião ou a
interpretação de Paulo: eu não concordo
com ele”. No entanto, sabendo que Paulo
escreve “como apóstolo dejesus Cristo”,
aqueles que discordam dele discordam
também de Cristo, a quem representa como
um porta-voz autorizado.
Paulo acrescenta que é um apóstolo “pela
vontade de Deus”. Ele não alcançou o
apostolado por mera aspiração, usurpação
ou nomeação feita por alguma comissão
da Igreja. Ao contrário, esse rabino judeu,
intensamente nacionalista e cruel perse
guidor da Igreja, tornou-se apóstolo dejesus
Cristo pela “atividade da soberana vonta
de de Deus” (Hendriksen,70).
2) A carta é dirigida “aos santos... e fiéis em
1196
EFÉSIOS 1
Cristo Jesus” (1.1b). A palavra “santos”
(hagioí), muito comumnoNovoTestamento
para designar os convertidos, significa li
teralmente “os santos”, aqueles que foram
separados e consagrados para serem pro
priedade de Deus. No Novo Testamento
os verdadeiros fiéis são chamados “santos”,
e não “pecadores”, isto é, estes últimos são
aqueles que estão sob a lei do pecado e
da morte (Rm 8.2), cujas vidas são carac
terizadas pela prática do pecado (1 Jo 3.8),
sendo escravos de sua natureza pecami
nosa. Por outro lado, “santos” são aque
les que através de Cristo Jesus praticam a
lei do Espírito Santo em sua vida (Rm 8.2)
e cujas vidas são caracterizadas pela justi
ça (Rm6.13,16,19-20,22). Não estão isentos
do pecado (1 Jo 1.8; 2.1,2), porém, sua ca
racterística predominante é a justiça (3.7).
Além disso, Paulo caracteriza os santos como
“os fiéis em Cristo Jesus”, Literalmente fa
lando, fiéis (pistoi) significa aqueles que “são
fidedignos” e essa expressão se refere àqueles
que colocaram toda a confiança de seu coração
em Jesus Cristo como Salvador e Senhor, e
que são constantes em sua devoção a Ele.
Mantêm a fé, são constantes na fé e perse-
veram na fé no Senhor Jesus Cristo.
3) Paulo transmite a habitual saudação cris
tã aos leitores no verso 2: “A vós graça e
paz, da parte de Deus, nosso Pai, e da do
Senhorjesus Cristo”. “Graça” (charís), adap
tada de charein (a saudação grega), é uma
característica palavra cristã, e “paz” é a forma
hebraica característica de saudação. Gra
ça é a amável e bondosa iniciativa de Deus
de nos redimir através da ação salvadora
de seu Filho. “Paz” é o primeiro resultado
da graça salvadora de Deus em nossa vida.
Derivada do termo hebraico shalom, esta
transmite a plenitude e a integralidade do
dom divino da vida, uma sensação de bem-
estar que abrange o espírito, a alma e o
corpo, e que flui de nosso ser, que é re
conciliado com Deus e que vive em co
munhão com Ele como nosso Criador e
Redentor. Tanto a “graça” como a “paz” são
dádivas de Deus e do Senhorjesus Cristo
como“autores conjuntos” (R. Martin, 133).
2. A Preeminência de Cristo Jesus
na Redenção (1.3-14)
No texto grego, esses doze versos formam
uma única, íntegra e complexa sentença
de 202 palavras. Para que seja totalmen
te apreciada na língua portuguesa, será
necessário ignorar a divisão 1.3-14 nas sen
tenças e parágrafos para considerá-la como
uma série de frases e cláusulas interliga
das. Em seguida, respirando fundo, deve-
se procurar lê-la de uma só vez. É real
mente de tirar o fôlego. Parece até uma
imensa torrente (como as cataratas do
Niágara) de inspiração e revelação. Cada
frase sucessiva, ao fluir da que a antece
de, dá origem à seguinte, e assim por diante,
até chegar à sua grande conclusão.
Efésios 1.3-14 é uma das passagens mais
profundas da Bíblia e, considerada sem
divisões, provavelmente é a frase mais
magnífica de toda a literatura. Esse trecho
representa um hino teológico de louvor à
gloriosa redenção de Deus, e se apresen
ta em três estrofes, de tamanhos variados.
Ao final de cada uma repete-se o refrão
“para louvor e glória da sua graça” (1.6)
ou “para louvor da sua glória” (1.12,14).
Existe um aspecto “Trinitário” nesses
versos imponentes. Cada estrofe realça a
contribuição de cada membro da Autori
dade Divina, desde o planejamento até à
efetivação da redenção. O Pai decidiu redi
mir as pessoas para si próprio (1.3-6); o
Filho, pelo preço de sua morte sacrificial,
também é o Redentor, e aquEle através
do qual a Igreja é a escolhida (1.7-12) e o
Espírito Santo aplica a presença viva e a
obra de Cristo à Igreja e à experiência
humana (1.13-14). O alcance da reden
ção fica revelado como originário da eter
nidade, mesmo antes da criação (1.4), até
sua futura e completa realização, por ocasião
do segundo advento de Cristo (1.14).
De acordo com o plano de Deus, Cristo
é a “pedra angular” da redenção — do
plano do Pai na eternidade, da obra vi
sível da redenção na história, e do mi
nistério do Espírito Santo. A frase “em Cristo”
(“N ele”, etc) ocorre repetidamente e
permeia toda essa passagem. O foco do
louvor está em toda parte, isto é, naqui
lo que Deus fez por nós “em Cristo”. Esta
é a frase-chave de toda essa passagem,
de toda esta carta, de toda a experiência
de Paulo, da Igreja e da vida cristã. R. C.
1197
EFÉSIOS 1
H. Lenski (350) observa: “Cristo é a cor
rente cie ouro na qual se prendem todas
as pérolas dessa cloxologia. Ele é o dia
mante central em volta do qual todos os
outros diamantes estão dispostos em forma
de raios cintilantes: ‘O Amado’ [ou Aquele
que Ele ama] é a manifestação da desig
nação divina”. Em 1.3-14, glória resplandece
sobre glória até que Paulo tenha reuni
do em uma única sentença a grande e
quase indescritível riqueza da redenção,
que Deus nos oferece como herança em
Cristo Jesus.
2.1. A Preeminência de Cristo
Jesus no Plano Eterno do
Pai (1.3-6)
A redenção foi concebida no coração
de Deus, o Pai, e se centralizou em Deus,
o Filho. Devido ao propósito do Pai, Paulo
inicia seu hino com uma explosão de louvor
“ao Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo”
(v. 3a). Observe os verbos nos versos 3 a
5, todos focalizando a obra do Pai. Ele “nos
abençoou” (v.3), “nos elegeu” (v.4) e “nos
predestinou” (v.5).
2.1.1. As Bênçãos do Pai em Cris
to (1.3). Esse verso contém três varia
ções da palavra grega para “abençoou”
ou “bênção”:
1) A primeira palavra “louvor” corresponde
à palavra eulogetos, freqüentemente traduzida
como “abençoado”. Aqui o objeto de nossa
bênção ou louvor é Deus, que é intrínse
ca e primariamente digno dEle, pelo seu
caráter e amor redentor.
2) Deus é aquEle “que nos abençoou
[eulogesasf, (isto é, derramou bênçãos sobre
nós).
3) Ele assim o fez dando-nos “todas as bên
çãos espirituais [eulogia]... em Cristo”. É
assim que Paulo define e resume o obje
tivo da redenção. “Bendito o Deus e Pai
de nosso Senhor Jesus Cristo, o qual nos
abençoou com todas as bênçãos espiritu
ais”. O objetivo do amor redentor de Deus
é criar um mundo repleto de bênçãos. O
objetivo de Satanás é roubar, matar e des
truir; o objetivo de Deus é que possamos
gozar todas as bênçãos de uma vida ple
na “em Cristo” (cf. Jo 10.10).
Cristo é a pedra angulai: Todas as bênçãos
espirituais de Deus Pai vêm a nós “em Cristo”,
em sua pessoa e obra. Expressões como
“em Cristo”, “Nele”, “no Senhor”, “em quem”,
etc., ocorrem 160 vezes nas cartas de Paulo
— 36 vezes em Efésios e 10 vezes em 1.1-
13 (1.1, 3, 4, 6 ,7 , 9 ,1 0 ,1 2 ,1 3 ). A experi
ência da união com Cristo constitui o âmago
da fé de Paulo. A expressão “em Cristo”
se refere à esfera na qual nós, como crentes,
vivemos, nos movemos e temos o nosso
ser. Vida “em Cristo” representa o opos
to de nossa corrompida vida anterior “em
Adão”, caracterizada pela desobediência,
escravidão à natureza pecaminosa, con
denação e morte. Nossa nova existência,
pelo contrário, é caracterizada pela sal
vação, filiação, graça, justiça, andar no
Espírito Santo e vida eterna.
As bênçãos “espirituais nos lugares
celestiais” devem ser diferençadas das
bênçãos materiais, igualmente concedi
das por Deus. As bênçãos materiais fo
ram enfatizadas no Antigo Testamento (por
exemplo, Dt 28.1-14) enquanto as espi
rituais são enfatizadas no Novo Testamento.
Dignas de nota em Efésios 1.3 são as três
ocorrências da preposição grega en (“em”).
Deus nos abençoou “em todas as bênçãos
espirituais nos lugares celestiais em Cris
to” (tradução literal). J. B. Lightfoot (312)
faz um resumo dessa ênfase: “Estamos
unidos a Deus em Cristo; tão unidos que
habitamos em lugares celestiais; assim
sendo, como habitantes, somos abenço
ados em todas as bênçãos espirituais”.
É evidente que as bênçãos espirituais
são conseqüência de estarmos unidos a
Cristo e de permanecermos nEle. As bênçãos
que Paulo tem em mente foram mencio
nadas nessa longa passagem. Fomos es
colhidos para sermos santificados e pu
ros (1.4), predestinados para sermos ado
tados como filhos (1.5), remidos através
do sangue de Cristo (1.7), acolhidos nos
desígnios de sua vontade através da re
denção (1.8-10), indicados para viver lou
vando sua glória (1.11-12), recebemos a
mensagem da verdade (1.13a) e fomos
selados com o Espírito Santo da promes
sa (1.13-14).
A frase “nos lugares celestiais” (1.3b) é
1198
EFÉSIOS 1
única nessa carta (também em 1.20; 2.6;
3.10; 6.12) — é uma frase que se refere ao
reino espiritual. A passagem em 1.20-22
refere-se ao reino em que Cristo ressusci
tado está assentado como Senhor acima
de toda a autoridade. E, em 2.6, ela se re
fere à esfera onde os crentes espiriaialmente
vivos gozam da união e da comunhão com
Cristo. Em 3-10, ela se refere ao reino dos
principados e potestades espirituais a quem
“a multiforme sabedoria de Deus” foi comu
nicada através da Igreja. Finalmente, em
6.12, ela se refere ao reino cia guerra espi
ritual onde os crentes lutam contra as for
ças das trevas e do mal. O “reino celestial”
não representa apenas o contraste entre
uma localidade celestial e outra terrena,
mas aquilo que existe entre a esfera espi
ritual cie existência e a dimensão material
da vida. Em 1.3, 20 e 2.6, ela especifica
mente expressa algo da glória e reverên
cia que existem na união espiritual do crente
com Cristo no reino de sua Autoridade.
2.1.2. A Eleição do Pai em Cristo
(1.4). A passagem em 1.4 mostra a ati
vidade de Deus, desde o verso 3 até seu
último recurso, a fim de explicar com o a
eleição foi executada — através da es
colha eletiva de Deus; “Ele nos escolheu”,
ou “Ele nos elegeu”. A palavra eleição
vem do termo (eklego) que significa “es
colha”: “Deus nos abençoou com todas
as bênçãos espirituais através de sua escolha
eletiva” (Summers, 11).
Existe um elemento de mistério na
doutrina bíblica da eleição que, duran
te séculos, tem impregnado de perple
xidade as maiores inteligências da Igre
ja. Aqueles que, seguros de si, dogmatizam
e sistematizam essa doutrina sob a for
ma de umpacote teológico, não compre
enderam o coração e a mente de Paulo
a respeito desse assunto. Nesse verso, o
propósito de Paulo era exaltar a iniciati
va de Deus, assim como o infinito amor
de Deus ao conceder-nos, como sua finita
criação, todas as bênçãos espirituais através
da obra redentora de seu Filho.
O verso 4 apresenta quatro importan
tes verdades a respeito do ensino da eleição:
1) A eleição é Cristocêntrica, isto é, centrada
em Cristo. “Ele nos elegeu nele” (1,4 a). O
próprio Cristo é “O Escolhido de Deus por
excelência" (Bruce, 1984, 254). Cristo foi
chamado de o Filho que foi escolhido (Lc
9.35) e de Messias, que é o Escolhido de
Deus (23-35; Jo 1.34); Deus apresenta seu
Servo em Isaías 42.1 como “meu eleito”.
Assim sendo, Cristo é o verdadeiro funda
mento de nossa eleição. Somente através
da união com Ele é que participamos como
eleitos. A vida espiritual é, necessariamente,
relacionai (Jo 15-1-8); não há ninguém entre
os eleitos cuja vida esteja fora de uma união
pela fé com Cristo. É tudo “nele”, desde o
começo até o fim. Na eternidade, nenhu
ma pessoa será escolhida ou rejeitada através
de um decreto contrário à sua própria von
tade. Cada um de nós toma-se um dos eleitos
quando, pela fé, a morte redentora de Cristo
na cruz se torna a base da “remissão das
ofensas, segundo as riquezas da sua gra
ça" (1.7).
2) A Eleição em Cristo é essencialmente co
munitária; isto é, Deus escolheu um povo
em Cristo (“nós”, a Igreja). Isso também
era verdade no caso de Israel no Antigo
Testamento, isto é, sua eleição também foi
essencialmente comunitária e se aplicava
individualmente aos israelitas somente
quando, genuinamente, se identificavam
com Deus e com a comunidade da alian
ça divina (cf. Ez 18.5-32). Da mesma for
ma, em Efésios, o eleito é identificado
comunitariamente: “a igreja, que é o seu
corpo” (1.22,23; cf. 2.16), “mas concidadãos
dos Santos e da família de Deus” (2.19),
“são co-herdeiros, e de um mesmo corpo,
e participantes da promessa em Cristo” (3.6),
“digo-o, porém, a respeito de Cristo e da
igreja” (5-32). Dessa forma, a eleição é uma
questão comunitária para a Igreja e inclui
individualmente as pessoas somente quando
se identificam com Cristo e seu corpo na
terra, formando a nova comunidade da
aliança divina.
3) A eleição envolve o plano eterno de Deus.
Esse plano foi elaborado antes mesmo da
criação do mundo (v. 4b), antes do início
dos tempos, na eternidade, quando somente
Deus existia: “Nesta eternidade anterior à
criação, [Deus Pai] elaborou um propósi
to em sua mente” (Stott, 36). Ele determi
nou que todas as pessoas que cressem em
1199
EFÉSIOS 1
seu Filho (pessoas que ainda não existi
am) se tornariam seus próprios “filhos” através
da obra redentora de Cristo (que ainda não
havia ocorrido). A nossa salvação em Cristo
não é uma reflexão tardia do Pai. Ele não
esperou que a tragédia do pecado acon
tecesse para planejar a salvação. Por amor,
Deus nos criou à sua imagem, portanto,
com o poder do livre-arbítrio. O livre-ar-
bítrio permite a rebelião, como aconte
ceu na queda de Satanás. Dessa forma,
Deus agiu antes do fato acontecer, atra
vés de um plano eterno. A salvação, através
do Filho, é a realização do plano e dos
propósitos gloriosos que Deus tinha desde
a eternidade. Através da encarnação de
Cristo, a eleição foi cumprida e realizada
na história.
4) Finalmente, a eleição tem como propósi
to a santificação do povo de Deus — para
que possam ser “santos e irrepreensíveis
diante dele” (v. 4c). Em Efésios, Paulo
repetidamente enfatiza esse propósito
supremo(2.21;4.1-3,13-32; 5.1-21; cf. também
1 Pe 1.2, 14-16). A realização desse pro
pósito estará assegurada para o corpo de
Cristo em um sentido comunitário, como
Efésios deixa bastante claro em 5.27: “para
a apresentar a si mesmo igreja gloriosa, sem
mácula, nem ruga, nem coisa semelhan
te, mas santa e irrepreensível”. A realiza
ção desse propósito para os indivíduos na
Igreja está condicionada à sua fé pessoal
em Cristojesus e a permanecerem fiéis em
Cristo. Em uma passagem semelhante (Cl
1.22,23) Paulo também deixa isso bastan
te claro: “para, perante ele, vos apresen
tar santos, e irrepreensíveis, e inculpáveis,
se, na verdade, permanecerdes fundados
e firmes na fé e não vos moverdes da es
perança do evangelho”. Quando biblica-
mente entendidos e proclamados, os
ensinamentos de Paulo a respeito da elei
ção deverão levar os crentes à justiça e não
ao pecado.
A frase “em amor” ou “em caridade”,
no final do verso 4, tem deixado os tra
dutores perplexos. Será que Paulo pre
tendia que fosse incluída no contexto do
verso 4 ou será que deveria ser transposta
para o contexto do verso 5? No caso primeiro
(como nas versões KJV, NKJV, NRSV) a
frase define adicionalmente a finalida
de da eleição, isto é, “ser santo e inculpável
em amor” ou santo e inculpável com amor
(Bruce, 1984,256). Se “em amor” pertencer
ao que se segue (como nas versões RSV,
NASB, NIV) então ela enfatiza o motivo
de Deus na predestinação. “Com amor”,
“nos predestinou para filhos de adoção
por Jesus Cristo” (1.5). Essa última ênfa
se está, com certeza, mais de acordo com
o sentido geral dessa passagem; no en
tanto, a primeira ênfase encontra apoio
no costume de Paulo de colocar en agape
(“em amor” ou “com amor”) após a clá
usula que está qualificando (por exem
plo: Ef 4 .2 ,1 5 ,1 6 ; 5.2; Cl 2.2; 1 Ts 5.13).
Dessa forma, o leitor poderá desejar aceitá-
la como a mensagem de ambos, isto é,
dos versos 4 e 5, considerando que ló
gica e teologicamente falando ela se ajusta
muito bem aos dois.
2.1.3. APredestinaçãodoPainaAdo-
ção em Cristo (1.5,6). O verso 5 dá pros
seguimento à revelação de Paulo a res
peito da importância de Cristo no plano
de redenção do Pai. Deus nos predestinou
para sermos adotados através de Cristo.
Em conjunto com nossas bênçãos e nos
sa eleição em Cristo, esses três elemen
tos estão relacionados ao propósito eter
no do Pai, da redenção, e não podem ser
separados.
O verbo “predestinar” (proorizo) Ocorre
seis vezes no Novo Testamento, uma vez
em Atos (4.28) e nas outras cartas de Paulo
(Rm 8.29,30;lCo2.7;Ef 1.5,11). Esse verbo
significa “decidir antecipadamente” e se
aplica ao propósito de Deus compreen
dido pela eleição. A eleição é Deus esco
lhendo “em Cristo” um povo para si mes
mo, e a predestinação diz respeito ao que
Deus planejou, antecipadamente, fazer com
aqueles que foram escolhidos. Dessa forma,
a questão da predestinação não significa
Deus decidindo antecipadamente quem
será salvo ou não, mas decidindo anteci
padamente o que planeja que os eleitos,
em Cristo, sejam ou venham a ser. Deus
predestinou como os eleitos (isto é, aqueles
que estão sendo salvos em Cristo) deve
riam ser: em primeiro lugar, conforme a
semelhança de seu Filho (Rm 8.29) e em
1200
EFÉSIOS 1
seguida serem chamados (8.30), justificados
(8.30), glorificados (8.30), santos e irre
preensíveis (Ef 1.4), adotados como seus
filhos (1.5), redimidos (1.7), para o lou
vor de sua glória (1.11,12), aqueles que
receberiam o Espírito Santo (1.13), desti
natários de uma herança (1.14) e serem
criados para realizar as boas obras (2.10).
Para ilustrar os ensinamentos de Pau
lo a respeito da eleição e da predestinação,
observe a analogia com um grande na
vio (isto é, a Igreja, o corpo cie Cristo) em
seu caminho para o céu. O navio foi es
colhido por Deus para ser sua própria
embarcação. Cristo é o Capitão e o Pilo
to desse navio. Todas as pessoas foram
convidadas para participarem desta via
gem juntamente com este navio e este
Capitão que foram eleitos, mas somente
terão permissão para embarcar aqueles
que colocarem sua fé e confiança em Cristo
Jesus. Enquanto permanecerem no navio
e em companhia de seu Capitão, estarão
entre os eleitos. Se alguém preferir aban
donar o navio e seu Capitão, deixará de
fazer parte dos eleitos. A eleição é sem
pre um assunto de comunhão com o Capitão
ede permanecer a bordo de seu navio. A
predestinação nos fala a respeito de sua
direção e destino e o que Deus decidiu
de antemão para aqueles que nEle per
manecerem.
Deus claramente decidiu de antemão
que seus eleitos seriam “adotados como
seus filhos através dejesus Cristo”. A adoção
na família de Deus se origina do amor,
da boa vontade do desejo de Deus e do
desejo de ter muitos filhos e filhas em
sua família (através da adoção), todos par
ticipando da semelhança com seu úni
co Filho (por natureza) (cf. Rm 8.29; Hb
2.10). Somente Paulo, entre os escrito
res do Novo Testamento, usa a palavra
“adoção”, e ele o faz cinco vezes (Rm 8.15,
23; 9.4; Gl 4.5. Ef 1.5). Em algumas des
sas referências Paulo parece desenhar um
paralelo entre o ato de adoção de Deus
e a prática legal existente em Roma. Através
da adoção, a filiação tem uma dimensão
simultaneamente presente e futura e, pro
vavelmente, um conceito mais amplo do
que aquele que Paulo usa em relação à
nossa restauração na redenção. F. F. Bruce
(19ó l, 29) tece alguns comentários a
respeito da abrangência da adoção.
Essa “adoção” é mais do que um re
lacionamento com Deus como seus fi
lhos, que já alcançamos pelo novo nas
cimento: ela abrange todos os privilégi
os e responsabilidades que pertencem
àqueles que Deus reconheceu como seus
filhos, nascidos livres e conscientes. Éuma
posição que recebemos de Cristo, nos
so Redentor, através da fé (Gl 3-36; 4.5);
da qual nos apropriamos na prática através
da obediência à orientação do Espírito
Santo (Rm 8.14 e seguintes; Gl 4.6 e se
guintes); à qual será concedido total e
universal reconhecimento por ocasião do
segundo advento de Cristo, pois o dia
em que o Filho de Deus for revelado será
também o dia da revelação dos filhos de
Deus (Rm 8.19). E quando esse dia ama
nhecer, Paulo nos assegura que toda a
criação participará dessa alegria.
Pelo fato da filiação adotiva ser o resul
tado da vontade benevolente de Deus
realizada através de Cristo, redundará em
“louvor e glória da sua graça” (1.6). A res
peito dessa cláusula, Max Turner (1226)
afirma com toda sua competência: “E porque
já somos unidos a Cristo através do Espí
rito Santo, essa graça, inclusive a filiação,
já pode ser considerada como livremente
concedida a nós: desde que isso seja qua
lificado pela assertiva. ‘Naquele que Ele ama’
(isto é, Cristo; cf. Mc 1.11; 9-7; Cl 1.13)”.
2.2 A Preeminência de Cristo
na Realização da
Redenção (1.7-12)
Essa segunda estrofe do hino teoló
gico de Paulo oferece a exaltação que,
através da vida e morte de seu amado
Filho, Deus Pai revelou em sua glorio
sa graça (1.6-8; cf. Jo 1.14, 17), e efe
tuou em seu propósito de redimir um
povo para si mesmo (Ef 1.7; cf. 1 Pe 1.18-
21; 2.9,10). A provisão de Deus para a
redenção através de Cristo cobre todo
o espectro das necessidades humanas
1201
EFÉSIOS 1
— perdão, libertação, reconciliação, paz,
amor, uma nova vida, sabedoria, com
preensão, participação, aceitação, ordem,
segurança, esperança e vitória na luta
contra Satanás e sua forças.
2.2.1. A Redenção através de seu
Sangue (1.7,8). A palavra “redenção”
Capolytrosis) ocorre três vezes em Efésios
(1.7,14; 4.30). No grego clássico ela sig
nifica “libertar mediante resgate e se aplica
a prisioneiros de guerra, escravos e cri
minosos condenados à morte” (TDNT, 4.351-
52). Provavelmente, a libertação de Isra
el do Egito serviu como protótipo para Paulo
quando usou essa palavra, com o signifi
cado de emancipação da escravidão e da
servidão ao opressor, e da restauração à
plena liberdade como povo de Deus. Para
o Israel espiritual (isto é, a Igreja) reden
ção inclui emancipação da culpa, dos
castigos e do poder do pecado (Jo 8.34;
R m 7.l4; 1 Co 7.23; Gl 3.13) e a restaura
ção à plena liberdade como filhos de Deus
(Jo 8.36; Gl 5.1) (Hendriksen 83).
Paulo usa a palavra apolytrosis no sentido
de libeitação com um preço— exorbitante
nesse caso, isto é, o “sangue” de Cristo
(uma referência direta à morte sacrificial
de Cristo na cruz como um Cordeiro
inocente e imaculado). “Seu sangue” lembra
o cordeiro pascal do Egito, cujo sangue
foi espargido nas casas dos hebreus a fim
de que a morte e o julgamento de Deus
pudessem poupá-los e que o sangue pu
desse libertá-los da escravidão.
“A redenção pelo seu sangue” alcan
ça para nós o perdão de [nossos] peca
dos (1.7b). A palavra “absolvição” ou “per
dão” (aphesis) se origina do verbo aphiemi,
istoé, “mandar embora”. Salmos 103.12
nos traz uma análise perfeita sobre a
absolvição: “Quanto está longe o Ori
ente do Ocidente, assim afasta de nós
as nossas transgressões”. Deus perdoa
nossos pecados através de nossa fé em
Cristo, não porque os considere levia
namente, mas devido à morte expiatória
de seu Filho em nosso lugar e a nosso
favor. Sua absolvição não é, de forma
alguma, medida com parcimônia; pelo
contrário, é concedida “segundo as ri
quezas da sua graça” (Ef 1.7c) — uma
expressão característica de Paulo (cf. Rm
2.4; 9.23; 11.33; 2 Co 8.9; Cl 1.27; 2.2).
A graça é infinitamente mais valiosa e
preciosa do que qualquer riqueza tan
gível. Em Efésios, Paulo escreve seis vezes
a respeito das riquezas de Deus, de sua
graça, misericórdia e glória (1.18; 2.4,
7; 3.8, 16).
O verso 8 leva essa mensagem ainda
mais adiante dizendo “que Ele tornou
abundante para conosco” sua graça para
nosso perdão. Isso exprime a grandiosa
generosidade da dádiva de Deus. Ele não
preserva, nem distribui apenas o mínimo
necessário; Ele concede com abundân
cia. O caráter de prodigalidade da graça
ainda é acompanhado por “toda sabedoria
e prudência” (1.8b; cf. Is 11.2). Observe
a oração de Paulo em Colossenses 1.9 para
que nos tornemos repletos de “toda a
sabedoria e inteligência espiritual”. Corno
dádivas concedidas por Deus, “sabedo
ria e inteligência [ou entendimento]” não
podem ser atribuídas à inteligência que
nos é inata ou às conquistas humanas no
aprendizado. No entanto, elas podem ser
c a d a vez m ais con qu istadas através da
oração, da dedicação à leitura da Palavra
e à comunhão com o Espírito de Deus.
Robinson (30) faz uma distinção entre
“sabedoria” e “inteligência [ou entendi
mento]”. “Sabedoria” vê o âmago da questão
como ela realmente é; “inteligência [ou
entendimento]” está relacionada com
discernimento ou prudência na conduta
correta, isto é, uma “compreensão que leva
a agir corretamente”.
2.2.2. A Redenção sob uma Autori
dade— ouCabeça(1.9-12). Paulo ago
ra nos apresenta uma nova característica
da obra amorosa de Deus em relação à nossa
absolvição e redenção. Ele nos fez conhecer
“o mistério da sua vontade” (1.9). Assim
como as características em 1.3-8, o foco está
na obra do Pai e no que fez em nosso be
nefício “no amado” (1.6), isto é, Cristo Je
sus, que é o supremo objeto de seu amor
(cf. Mc 1.11; 9.7; Cl 1.13).
A palavra “mistério” (mysterion) ocorre
periodicamente em Efésios (3; 3, 4, 6, 9;
5.32; 6.19). Paulo usa essa palavra quan
do se refere a alguma coisa no propósito
1202
EFÉSIOS 1
de Deus que estava anteriorm ente escon
dida ou mantida em segredo, “alguma coisa
impossível de ser descoberta pela mente
humana” (W. G. M. Martin) e “demasia
do maravilhosa para ser totalmente en
tendida” (Max Turner). Mas agora esse
segredo foi desvendado (cf. Rm 16.25,26).
Na literatura apocalíptica judaica intertes-
tamentária e nos escritos de Qumran, a
palavra “mistério” foi usada para o plano
secreto de Deus que seria revelado ao final
da história. Por outro lado, Paulo enfatiza
que a descoberta do mistério já havia
ocorrido na revelação de Cristo, portan
to, não precisamos esperar pelos acon
tecimentos que irão concluirnossa era para
conhecer a estratégia da vontade de Deus
(TDNT, 4.819-22).
Ás vezes, Paulo usa mysterion quan
do se refere a todo o escopo e a toda a
esfera do propósito redentor de Deus em
Cristo (Rm 16.25; 1 Co 2.7; Ef 1.9,10; 6.19;
Cl 1.26; 1 Tm 3-9, 16); e às vezes ele serefere a um aspecto particular do propó
sito de Deus, como por exemplo, a inclusão
dos gentios no plano da redenção (Rm
11.25; Ef 3-3-9), no instante da transfor
mação física em espiritual dos corpos dos
crentes ainda vivos por ocasião da Segunda
Vinda de Cristo (1 Co 15.52) ou ainda a
união sagrada entre Cristo e a Igreja como
seu corpo (Ef 5.32).
Para o homem natural, ainda ignoran
te da revelação de Deus através de Cristo
e cias Escrituras, os propósitos divinos para
a história da humanidade ainda perma
necem um mistério; e a vida é desprovi
da de sentido. Para aqueles que estão
“entenebrecidos no entendimento, sepa
rados da vida de Deus” (Ef 4.18), a vida é
(como Shakespeare fez com que Macbeth
a descrevesse) “uma história contada por
um tolo, cheia de som e movimento, mas
que não tem qualquer significado” (Macbeth,
Ato V, Cena V).
Nem mesmo a religião pode ser con
siderada como a resposta. Falando de um
modo geral, religião quer dizer pessoas
tentando encontrar a Deus e estar bem
com Ele através de seus próprios esfor
ços. Redenção, por outro lado, é inteira
mente o resultado da iniciativa de Deus.
Ele decidiu revelar a si próprio e seu supremo
propósito à sua criação, àqueles que re
ceberem a revelação de seu Filho. Como
1.9 indica, a obra benevolente da reden
ção divina na encarnação de Cristo foi o
resultado da livre determinação de Deus
e em conformidade com as riquezas de
sua graça. Usando outras palavras, a re
denção não foi o resultado de qualquer
pressão externa, mas a representação
exterior do próprio “propósito benevo
lente” de Deus em Cristo (Westcott, 20).
Deus se propôs terminar a redenção
“na dispensação da plenitude dos tempos”
(1.10). A palavra grega para “tempos” é
kairos, uma expressão que está relacio
nada com épocas ou com as grandes eras
da vida. Markus Barth (1.128) afirma que
a frase “a plenitude dos tempos” (tradu
ção literal de Ef 1.10) traz consigo “a idéia
de períodos consecutivos da história que
cleverão ser completados e coroados por
uma era que irá suplantar todos os perí
odos anteriores". Como Paulo menciona
em outra passagem, Deus enviou seu Filho
ao mundo na “plenitude dos tempos” (Gl
4.4). Da mesma forma, quando o tempo
tiver alcançado sua plenitude, Deus com
pletará seu plano de redenção enviando
seu Filho uma segunda vez.
O objetivo, ou o coroamento do pro
pósito redentor de Deus em Cristo, será
“reunir todas as coisas no céu e na terra
sob uma única autoridade, a de Cristo”. A
expressão “todas as coisas” inclui tanto a
criação terrena quanto a celestial. O pro
pósito de Deus foi colocado em ação quando,
através de Cristo, “todas as coisas foram
feitas” (Jo 1.3). Deus não só criou “todas
as coisas, no céu e na terra”, mas também
“todas as coisas foram criadas... p a r a Ele”
(Cl 1.16). Paulo acrescenta que em Cristo,
a cabeça da Igreja, Deus deu início ao seu
plano de recuperar o universo para si (Cl
1.18-20). Na Epístola aos Romanos, Paulo
também menciona esse tema quando diz
que, por causa do pecado, toda a criação
tomou-se sujeita à discórdia e ao sofrimento,
mas que no dia da consumação da reden
ção esta “será libertada da servidão da
coraipção, para a liberdade da glória dos
filhos cie Deus” (Rm 8.21).
1203
EFÉSIOS 1
A ruptura da união e da harmonia da
criação, como conseqüência da transgressão
de Adão, será ao final reparada e harmo
nizada através de Cristo. Assim, Cristojesus
não é simplesmente o Messias de Israel,
nem a designação “Salvador do mundo”
é o bastante para Ele. “Na plenitude dos
tempos” Cristo será “o Salvador do uni
verso” e toda discórdia cessará. A união
e a conformidade, pelas quais todos os
seres criados por Deus, no céu e na terra,
tanto aspiram, finalmente se tornarão
realidade sob a autoridade do Senhor Jesus
Cristo. “Cristo já é a cabeça de seu corpo,
a Igreja, porém um dia ‘todas as coisas’
reconhecerão sua autoridade” (Stott, 42).
Essa expectativa gloriosa da redenção
para todo o universo tem levado muitos
teólogos a concluírem que a Bíblia ensi
na o “universalismo”, isto é, a noção de
que, ao final, tudo e todos serão salvos.
Consideram que, em algum ponto á a eter
n idade, todos os impenitentes serão le
vados à penitência e que até Satanás, com
todo seu reino demoníaco, será reconci
liado com Deus, de forma que literalmente
“todas as coisas" criadas serão redimidas
e reunidas sob o governo de uma única
autoridade: Cristo. No entanto, Paulo fala
sobre “todas as coisas” reunidas sendo
colocadas sob a autoridade de Cristo, não
em algum distante ponto da eternidade,
depois que o lago de fogo tiver termina
do sua tarefa temporal de alcançar a pe
nitência universal (como alguns univer-
salistas acreditam), mas na Segunda Vinda
de Cristo (“a plenitude dos tempos”) , quando
o Anticristo e o falso profeta, Satanás e
seus anjos, e todos os pecadores e iníquos
não arrependidos serão lançados no lago
de fogo para sofrerem a separação de Deus
“para todo o sempre” (Ap 20.10,15; 21.8).
Então, quem é, ou o que são “todas as
coisas no céu e na terra” que serão reuni
das sob a autoridade de Cristo no dia fi
nal da redenção? Com toda eloqüência,
John Stott (44) responde a essa questão
da seguinte maneira:
Certamente elas incluem [todos] os
cristãos vivos e mortos [incluindo os que
foram remidos do Antigo Testamento],
a Igreja na terra e a Igreja no céu. Isto é,
todos que estiverem agora “em Cristo”
(verso 1), e que “em Cristo” receberam
o perdão (verso 3), a eleição (verso 4),
a adoção (verso 5), a graça (verso 6), a
redenção ou o perdão (verso 7) estarão
um dia perfeitamente reunidos “nEle”
(verso 10). Sem dúvida, os anjos tam
bém estão incluídos (cf. 3-10,15). Porém,
“todas as coisas” (tapanta) normalmente
significa o universo, que Cristo criou e
sustém. Portanto, parece que Paulo está
novamente se referindo à renovação cós
mica, à regeneração do universo, à li
bertação da criação sofredora, sobre a
qual já havia escrito em Romanos. O plano
de Deus é que “todas das coisas” que
foram criadas através de Cristo e para
Cristo e que estão mantidas em Cristo,
sejam finalmente reunidas sob Cristo e
submissas à sua autoridade, pois o Novo
Testamento declara que Ele é “o herdeiro
de todas as coisas”. Dessa forma, o ver
so 10 é traduzido na NEB da seguinte
maneira: “Que o universo possa ser
conduzido à unidade em Cristo” e que
J. B. Lightfoot escreve a respeito de “toda
a harmonia do universo que não mais
conterá elementos estranhos e discor
dantes, mas no qual todas as partes
encontrarão seu centro e vínculo de união
em Cristo”. Na plenitude dos tempos,
as duas criações de Deus, todo o seu
universo e toda a sua Igreja estarão
unificados sob o Cristo cósmico, que terá
suprema autoridade sobre ambos.
No entanto, embora em 1.10 Paulo tenha
subido até as regiões celestiais para ob
ter uma rápida visão da futura reconcili
ação cósmica, essa reconciliação que ele
en fa tiza ao longo de Efésios é aquela em
que grupos divididos de povos (tais como
judeus e gentios) serão conjuntamente
reconciliados através da cruz (por exem
plo, 2.16) a fim de dar origem a um único
corpo de Cristo, a Igreja, “como o primeiro
estágio da unificação de um universo
dividido” (Bruce, 1984, 26l).
A NIV começa a passagem em 1.11 com
as palavras “Nele... fomos escolhidos”. O
termos “escolhidos” traz consigo o signi
1204
EFÉSIOS 1
ficado de “fomos escolhidos como uma
porção de Deus” (Robinson, 146) ou como
a própria herança de Deus (cf. 1.18). Entre
todas as nações do período do Antigo
Testamento, Deus considerava Israel como
sua propriedade ou porção escolhida (Dt
32.8,9). Da mesma forma, sob a nova ali
ança divina aqueles que estão com Cris
to se tornaram agora o novo Israel de Deus,
a “geração eleita, o sacerdócio real, a nação
santa, o povo adquirido... vós que, em outro
tempo, não éreis povo, mas, agora, sois
povo de Deus” (1 Pe 2.9,10; cf. Êx 19.6).
Tanto Paulo como Pedro sereferem à Igreja,
inclusive aos gentios convertidos, usan
do as mesmas palavras com que descre
veram o especial privilégio de Israel sob
a antiga aliança.
Paulo vai mais longe ao afirmar três
verdades importantes a respeito da Igre
ja como herança de Deus:
1) A herança de Deus não foi um mero aci
dente da história; ela foi predestinada por
Deus de acordo com seu plano (1.11b).
2) O que Deus projetou foi a garantia de sua
realização, “conforme o propósito daquEle
que faz todas as coisas, segundo o conse
lho da sua vontade” (1.11c). Aqui, a ênfa
se na predestinação (e em 1.5) não anula
“o verdadeiro arbítrio humano e sua res
ponsabilidade, como fica bem claro nos
apelos feitos no restante da carta, mas nos
deixa seguros do envolvente poder sobe
rano de Deus e de seus propósitos dirigi
dos à obra no crente” (Turner, 1226).
3) Deus escolheu a Igreja como uma porção
de si a fim de que pudéssemos existir “para
louvor da sua glória” (1.12). Esse refrão,
ao final da segunda estrofe do hino de louvor
de Paulo (cf. também 1.6,14) enfatiza que
o propósito, e a mais importante conquista
do povo remido de Deus, é o “louvor da
sua glória”. Não apenas nossa adoração
verbal, mas o próprio testemunho de nossas
vidas, diante de um mundo descrente,
manifesta tal louvor (cf. 2 .1-10 , 19-22; 3-9-
21; 4.1-6.20).
Em 1.12, o pronome “nós” refere-se es
pecificamente àqueles que foram os pri
meiros a ter esperança em Cristo. A maio
ria dos comentadores acredita que essa ex
pressão denota judeus cristãos, enquanto
“em quem também vós estais” (1.13a) denota
os gentios convertidos que também vie
ram se juntar à porção de Deus. Outros
estudiosos acreditam que a freqüência de
“nós” em 1.3-11 claramente se refira a to
dos os crentes (não apenas os judeus), como
acontece em 1.12. Porém, o entendimen
to mais natural é que Paulo está aqui reu
nindo, como um único povo, tanto a si próprio
como representante dos judeus crentes (1.12)
como seus leitores representando os gen
tios convertidos (1.13; cf. 3.1; 4.17). Des
sa forma, ele introduz pela primeira vez
um importante tema em Efésios, isto é, que
tanto os judeus como os gentios foram
reconciliados em Cristo como “um mes
mo corpo, e participantes da promessa em
Cristo pelo evangelho” (3.6; cf. 2.11-22).
2.3- -A Preeminência de Cristo
no Papel do Espírito Santo
(1 .1 3 ,1 4 )
O verso 13 registra o começo de uma
transição dupla:
1) Ele indica, no início da terceira e última
estrofe do hino de louvor de Paulo, a mudança
de seu foco sobre a obra de Cristo de pro
mover a redenção para o crente, para a obra
do Espírito Santo no crente, em nome de
Cristo. Antes de sua morte, Jesus prome
teu aos doze discípulos que, quando o Espírito
Santo chegasse como o Paracleto e o Es
pírito da Verdade (Jo 14— 16), viria como
o realizador da herança de Cristo (Jo 16.14,15).
Paulo assegura aos verdadeiros crentes que
eles foram “selados com o Espírito Santo
da promessa” (Ef. 1.13c).
2) Paulo também transfere sua atenção dos
judeus, que foram os primeiros a ter es
perança em Cristo (1.12a), aos gentios e
seu relacionamento com o evangelho
(1.13a). A forma pela qual os gentios fo
ram “incluídos em Cristo” e em sua redenção
é a mesma para os judeus. Há muito sig
nificado nos três verbos usados por Pau
lo para descrever as etapas progressivas
durante as quais foram “incluídos em Cristo”:
ouvir, crer e ser selado: (a) Eles ouviram
a palavra da verdade, o Evangelho de sua
salvação (1.13b). Os gentios, que viviam
em seu desesperado estado de desobe
1205
EFÉSIOS 1
diência e pecado (2.1), na escuridão e na
depravação (4.17-19), como objetos da justa
ira de Deus (5.5,6,8), ouviram as boas novas
da salvação divina em Cristo, que Paulo
e os outros evangelistas haviam anunci
ado, como uma graça a ser recebida pela
fé (2.1-10). Esta proclamação era acom
panhada pela obra do Espírito Santo no
intuito de convencer os gentios de sua culpa
em relação ao pecado, à justiça e ao juízo
(Jo 16.8). (b) Eles creram (1.13c). Tendo
ouvido a verdade pelo poder do Espírito
Santo, os gentios colocaram sua fé (1.13b)
no Senhor Jesus Cristo para serem salvos
pela graça de Deus (2.5,8). (c) Os genti
os “foram selados com o prometido Es
pírito Santo” (1.13c, tradução literal).
2.3.1.0 Espírito Santo como o Selo
de nossa Fé em Cristo (1.13). Essa é a
primeira referência que aparece em Efésios
a respeito do papel do Espírito Santo na
redenção. Daí em diante, Paulo raramente
deixa de mencionar os aspectos de sua
atuação na vida cristã. O crente é marca
do, ou selado, em Cristo com o selo do
Espírito Santo da promessa. Aqui encon
tramos duas questões: o “selo” e o Espí
rito Santo da “promessa”:
1) Na antigüidade, o selo era um sinal de pro
priedade ou de posse pessoal. Concedendo
o Espírito Santo como um selo, Deus nos
marca em Cristo, como aqueles que auten
ticamente lhe pertencem (cf. 2 Co 1.22).
No período do Novo Testamento aplica
va-se cera quente em cartas, contratos e
documentos oficiais, onde o signatário
comprimia sua identificação pessoal. Bruce
(1984, 2Ó5) afirma que, “por conceder o
Espírito Santo aos crentes, Deus os assi
nala ou os ‘sela’ como sua propriedade
pessoal”. Portanto, temos provas de que
Deus nos adotou como filhos e que nossa
redenção será verdadeira quando o Espí
rito Santo morar em nós como o Espírito
vivificador de Cristo (Rm 8.9), testemunhar
que Deus é nosso Pai (8.15) e produzir em
nós o fruto do verdadeiro relacionamen
to com Ele (Gl 5.22,23).
2) A designação “prometido”, referindo-se ao
dom do Espírito, como aparece em Atos
2, está relacionada principalmente à pro
messa de Joel 2.28,29, tal como foi inter
pretada e aplicada por Pedro no livro de
Atos, e no restante do Novo Testamento.
Quando Paulo empregou essa expressão
em Efésios, quis dizer que o Espírito San
to virá para transmitir “sabedoria e reve
lação”, a fim de podermos conhecer me
lhor a Deus e sermos informados a respeito
das implicações de nossa vida “em Cris
to” (1.17-20), para fortalecer nosso ser interior
e revelar o amor de Cristo (3.16-19), para
estabelecer a união entre o povo de Deus
como o primeiro passo em direção à uni
dade cósmica (4.2-4), para inspirar uma vida
santificada (4.30) e cheia de adoração no
Espírito (5.18-20) e para tomar as orações
realmente eficazes (6.18-20).
2.3.2.0 Espírito Santo como a Pri-
meiraParte de nossaHerançaem Cristo
(1.14). O papel do “Espírito Santo da pro
messa” mencionado acima identifica os
crentes como o autêntico povo de Deus.
“Essas atividades do Espírito prenunciam,
em forma e qualidade, o que Ele irá rea
lizar mais completamente na nova cria
ção (isto é, nos tempos vindouros) e as
sim o Espírito Santo, com o qual Deus nos
marca com seu selo de propriedade, também
é muito apropriadamente chamado de ‘de
pósito’, ‘penhor’, ‘garantia’ e até de ‘pri
meira parte’ de nossaherança (cf. Rm8.23;
2 Co 1.22; 5.5)” (Turner, 1227). A palavra
“depósito” (arrabon ) tem origem semítica
e era usada nas transações comerciais. Ela
significa um compromisso pelo qual um
comprador entregava algo de valor ao
vendedor como um depósito ou pagamento
inicial para assegurar a transação até que
o preço de compra fosse totalmente pago.
O Espírito Santo é o “depósito” que ga
rante a futura herança “daqueles que são
propriedade de Deus” (1.14b). Em nossa
era, o Espírito Santo nos é concedido pelo
Pai, e acreditamos ser Ele o primeiro
pagamento daquilo que iremos receber
em sua total plenitude no dia da reden
ção final (cf. 4.30).
Em 1.1-14, a palavra “herança” é em
pregada de duas diferentes maneiras: para
descrever aquilo que representa a porção
ou herança de Deus em seu povo remi
do (1.11; cf. v.18) e a eterna porção que
Deus reservou para os “fiéis em Cristo Jesus”
1206
EFÉSIOS 1
(1.1,14). A plenitude da redenção e de nossa
herança, como povo de Deus — da qual
a presença do Espírito Santo na Igreja e
no crente será em breveo “depósito” de
Deus (NIV), o “penhor” (NASB, NRSV),
“a garantia” (NJKV) ou “o valioso” (KJV)
— espera pela total revelação de Cristo e
dos filhos de Deus em sua Segunda Vin
da (Rm 8.23). Nesse dia de redenção fi
nal, todos os que foram escolhidos e
adotados como filhos e filhas em Cristo,
que foram redimidos através de seu san
gue e marcados com o selo do prometi
do Espírito Santo, serão verdadeiramen
te “para o louvor da sua glória” (1.14c).
Esse terceiro coro da doxologia do hino
relembra o destino para o qual Israel havia
sido convocado e que não se realizou, isto
é, “para me serem por povo, e por nome,
e por louvor, e por glória; mas não de
ram ouvidos" (Jr 13-11). Esse destino tor
nar-se á totalmente realidade quando Cristo
apresentar diante de si mesmo uma “igreja
gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa
semelhante, mas santa e irrepreensível”
(Ef 5.27), tendo sido purificada “com a
lavagem da água, pela palavra” (5.26).
3. A Oração Apostólica pelo Esclare
cimento Espiritual dos Crentes
(1.15-23)
3-1. O Contexto da Oração
Apostólica de Paulo
(1.15-17a)
Será muito importante observar o re
lacionamento entre 1.3-14 e 1.15-23. O
primeiro representa um profundo hino de
louvor pelas bênçãos redentoras de Deus
em Cristo; o último é uma o ra çã o d e in
tercessão para que os olhos espirituais dos
crentes se abram para, através da experi
ência, alcançarem a compreensão da ple
nitude dessas bênçãos. Dessa forma, Paulo
faz a junção do louvor com a oração, da
adoração com a intercessão, como dois
componentes necessários ao verdadeiro
conhecimento de Deus.
Alguns crentes são dedicados ao lou
vor, porém são complacentes em relação
àoração. Eles amam adorar a Deus e afirmam
que todas as bênçãos espirituais já lhes
pertencem, porém mostram pequeno anseio
espiritual em conhecê-lo melhor ou em
0 Teatro, em Éfeso, foi o local da rebelião descrita em Atos 19.23-41. Paulo havia pregado contra a deu
sa Artemis. Um artesão que trabalhava com prata, receoso de perder seu negócio com a venda das ima
gens da deusa, convocou os outros artesãos para, em conjunto, deterem a Paulo. Os homens gritavam
furiosos: “Grande é a Diana dos efésios!” Capturaram os companheiros de viagem de Paulo e dirigiram-
se rapidamente para o Teatro. Lá chegando, o escrivão da cidade apelou à multidão, dizendo que quais
quer acusações deveriam ser resolvidas nos tribunais e, em seguida, dispersou a multidão.
1207
EFÉSIOS 1
interceder por uma maior revelação do
propósito de Deus e de seu poder para a
Igreja. Outros crentes oram diligentemente
por maiores bênçãos espirituais, mas
parecem se esquecer que Deus já os aben
çoou no reino celestial com todas as bênçãos
espirituais em Cristo. Com seu exemplo
pessoal, nessa carta Paulo resiste à tal
polarização fazendo a junção do louvor
com a oração. Ele louva profundamente
a Deus porque, em Cristo, todas as bên
çãos espirituais já nos foram concedidas,
mas ao mesmo tempo ora fervorosamente
para que o Espírito de sabedoria e reve
lação possa capacitar os crentes e permi
tir-lhes conhecer a plenitude daquilo que
lhes pertence em Cristo.
O que fez com que Paulo se transpor
tasse do louvor a Deus para a oração pelos
seus leitores? A expressão “Pelo que” (1.15)
está relacionada a alguma informação que
havia recebido a respeito deles. Embora
os versos 1.3-14 tivessem sido escritos com
termos mais contemplativos, ele agora se
torna mais pessoal e relacionai com seus
leitores: “Pelo que, ouvindo eu também
a fé que entre vós há no Senhor Jesus e a
vossa caridade para com todos os santos,
não cesso de dar graças a Deus por vós,
lembrando-me de vós nas minhas orações”
(1.15-16). Assim que notícias distantes, a
respeito de sua fé e amor, chegaram a Paulo,
ele encheu-se de alegria e gratidão. Mui
tas vezes, Paulo interliga a fé e o amor em
sua equação de vida cristã (cf. Gl 5.6).
Foulkes (59) observa dois aspectos
característicos na vida de oração de Pau
lo, que ocorrem no verso 16:
1) É persistente: “não cesso de dar graças a
Deus por vós, lembrando-me de vós nas
minhas orações”. Paulo praticava o que
havia pregado quando exortava seus re-
cém-convertidos de Tessalônica a “orar
sem cessar” (1 Ts 5.17; cf. Rm 12.12; Ef
6.18; Cl 4.2).
2) É acompanhada pela gratidão (cf. Ef 5.20).
Em outras partes de suas cartas, Paulo ensinou
que a gratidão deve ser sempre acompa
nhada pela intercessão (Fp 4.6; Cl 3.15-17;
4.2; 1 Ts 5.18). Phillips faz uma paráfrase
de Paulo: “Continuamente agradeço a Deus
por vós e nunca deixo de orar por vós”.
Nesse contexto, a frase “lembrando-me
de vós” significa “pedindo em seu nome”;
a expressão literal “mencionando-vos”
sugere que em sua intercessão, Paulo trouxe
realmente seus leitores à presença de Deus,
mencionando seus nomes. Com certeza,
o objetivo de sua oração em 1.17 é o de
uma séria solicitação, e não uma questão
de recordação. Quando se considera a res
ponsabilidade que Paulo carregava em seu
coração por todas as igrejas, e em alguns
casos por convertidos que nunca havia
conhecido, pode-se apenas exclamar com
Bruce(196l, 38). “Que intercessor ele deve
ter sido!”
Os fundamentos dafé inabalável de Paulo,
e de sua confiança na oração, residem na
expressão: “o Deus de nosso Senhor Je
sus Cristo, o Pai da glória” (1.17 a). A pri
meira frase refere-se à certeza de que: “Se
Deus é por nós... Aquele que nem mes
mo a seu próprio Filho poupou, antes, o
entregou por todos nós, como nos não
dará também com ele todas as coisas?” (Rm
8.31,32). A segunda frase (tradução lite
ral “o Pai da glória”) se refere à perfeição
da Paternidade de Deus (cf. Ef 3-15). Se
nós, como pais imperfeitos que somos,
sabemos como conceder bons presentes
a nossos filhos, diz Jesus, “quanto mais
dará o Pai celestial o Espírito Santo àqueles
que lho pedirem?” (Lc 11.13) Paulo con
tinua a orar para que seus leitores pos
sam receber plenamente o ministério da
revelação do Espírito Santo.
3.2. O Foco da Oração
Apostólica de Paulo
(1.17b-19)
A essência da oração apostólica de Paulo
está personificada na frase duplamente
repetida “para que saibais” (1.17,18). Saber
o quê? Conhecer melhor a Deus e sua
maneira de agir. Embora em outras pas
sagens as orações de Paulo muitas vezes
se estendam de forma mais abrangente,
elas tipicamente incluem o âmago de sua
petição: “poderdes perfeitamente compre
ender... qual seja a largura, e o compri
mento, e a altura, e a profundidade... e
conhecer...” (3.18,19a); “não cessamos de
1208
EFÉSIOS 1
orar por vós e de pedir que sejais cheios
do conhecimento da sua vontade, em toda
a sabedoria e inteligência espiritual” (Cl
1.9); “que a vossa caridade aumente mais
e mais em ciência e em todo o conheci
mento” (Fp 1.9).
O conhecimento pelo qual Paulo ora
com tanta diligência não é apenas um
conhecimento intelectual “a respeito de
Deus”, porém a forma mais vital de todo
o conhecimento e a forma mais elevada
de toda a compreensão: conhecer o pró
prio Deus e compreender sua maneira de
agir. Mas como poderia um finito ser humano
conhecer e compreender o infinito? As
mentes mais brilhantes não conseguem
conhecer e compreender a Deus. Isso seria
impossível sem os fatores envolvidos na
dupla solicitação de Paulo:
1) para que Deus “vos dê em seu conheci
mento o espírito de sabedoria e de reve
lação” (1.17), e
2) “tendo iluminados os olhos do vosso en
tendimento” (1.18).
No verso 17, o “Espírito” (pneum a) não
temnenhum artigo definido na língua grega.
Robinson (39) observa: “Com o artigo [“O”]
a palavra muitas vezes indica pessoalmente
o Espírito Santo; e, sem ele, pode indi
car uma manifestação especial ou a con
cessão do Espírito Santo”. Assim sendo,
“espírito” não está em letras maiúsculas
na maioria das traduções (KJV, NKJV, NASB,
RSV, NRSV). No entanto, como afirma F.
F. Bruce (1984, 269), “um espírito de sa
bedoria e de revelação somente pode
ria ser concedido através dEle, que é pes
soalmenteo Espírito da sabedoria e da
revelação”. Dessa forma, a tradução NIV
está mais de acordo com a intenção de
Paulo e com a profecia de Isaías: “E re
pousará sobre ele o Espírito do Senhor,
e o Espírito de sabedoria e de inteligên
cia, e o Espírito de conselho e de forta
leza, e o Espírito de conhecimento e de
temor do Senhor” (Is 11.2).
Na realidade, Paulo está pedindo que
o mesmo ministério do Espírito Santo que
permanece emjesus desça sobre os crentes,
concedendo “sabedoria e revelação”. O
Espírito Santo desempenha um papel
fundamental na resposta da oração de Paulo
a favor dos efésios, por ser o sujeito do
verbo “dar”, e irá capacitar os crentes a
conhecer “melhor” a Deus e a seu Filho.
Observe que a finalidade da oração não
é fazer com que os pecadores conheçam
a Deus in icialm en te (na salvação), mas
que os santos conheçam a Deus in tim a
m ente (na revelação).
E quem teria chegado a tal ápice de
sua peregrinação espiritual que não ne
cessitasse conhecer melhor a Deus? Não
os convertidos de Paulo. E até o próprio
Paulo, apesar de suas inúmeras revela
ções de Cristo (At 22.14,17-21; 23.11; G1
1.12), jamais alcançou este ponto em sua
própria vida. Vinte e cinco anos ou mais
haviam se passado desde a sua revela
ção inicial, e do encontro com o Cristo
ressuscitado na estrada de Damasco, que
mudou sua vida, e Paulo ainda ansiava
por mais: “para conhecê-lo, e a virtude
da sua ressurreição, e a comunicação de
suas aflições, sendo feito conforme a sua
morte” (Fp 3-10).
A “sabedoria” (sop h ia , 1.17) não está
relacionada ao talento ou à inteligência,
mas é um dom concedido por Deus. É uma
visão divina sobre a verdadeira natureza
das coisas. Paulo a contrasta com a sabe
doria do mundo (1 Co 1.19,20). Cristo é a
“sabedoria de Deus” (1.24, 30), e à medi
da que temos parte com Ele através do
Espírito Santo, tomamo-nos espiritualmente
sábios. “Encontram-se à nossa volta ho
mens que sabem muitas coisas; porém
homens com sabedoria espiritual são tão
raros que valem muito mais do que seu
peso em ouro” (Bruce, 1961, 39). A “re
velação” (apokalypsis) é a manifestação
do próprio Deus, ou de alguma realida
de espiritual para nós, através do Espíri
to Santo”. Paulo descreve essa atividade
do Espírito Santo em 1 Coríntios 2.10,11:
Mas Deus no-las revelou pelo seu Es
pírito; porque o Espírito penetra todas
as coisas, ainda as profundezas de Deus.
Porque qual dos homens sabe as coi
sas do homem, senão o espírito do homem,
que nele está? Assim também ninguém
sabe as coisas de Deus, senão o Espíri
to de Deus.
1209
EFÉSIOS 1
Ao nos transmitir a sabedoria e a re
velação, o propósito de Deus era que
pudéssemos “conhecê-lo melhor”. Existem
duas palavras gregas para conhecimento:
gnosis, que se refere ao conhecimento
abstrato ou aos fatos objetivos a respeito
de Deus; e epignosis, que se refere ao
conhecimento do próprio Deus, expe
rimentalmente e intimamente. Aqui, Paulo
está usando essa última definição. “Se
a teologia, isto é, o conhecimento a respeito
de Deus, será impossível sem a revela
ção divina, quanto mais o relacionamento
com o próprio Deus, aquele epignosis,
ao qual o apóstolo se refere aqui!” (Bruce,
1961, 39)
O segundo fator na dupla petição de
Paulo é “tendo iluminados os olhos do vosso
entendimento” (Ef 1.18). Aqui, a palavra
“entendimento” ou “coração” é, em par
te, o sinônimo da mente, das emoções e
da vontade e até mesmo do “espírito da
mente”. Nossa visão interior tem neces
sidade de ser iluminada pelo Espírito Santo
com a compreensão espiritual, se quisermos
conhecer a maneira de Deus agir e seu
propósito eterno.
Paulo menciona três áreas específicas
em sua oração apostólica onde o escla
recimento espiritual se faz necessário:
1) Ele ora para ser esclarecido a respeito
“da esperança da sua vocação” (1.18b).
Esta esperança e esta chamada têm uma
dimensão passada, presente e futura e
está centrada em Cristo, “a esperança da
glória”. A chamada começou com a ini
ciativa de Deus na eleição, adoção, re
denção e concessão do Espírito Santo (1.3-
14). A dimensão presente da esperança
e da chamada inclui o convite de Deus
para ser conforme a imagem de seu Fi
lho (Rm 8.29), “para que fôssemos san
tos e irrepreensíveis diante dele” (Ef 1.4),
para nos reunirmos aos outros membros
de seu corpo em paz, para vivermos em
harmoniosa comunhão e unidade (2.11-
18; 4.2,3), para que andemos “como é digno
da vocação com que fostes chamados”
(4.1) e para compartilharmos de seus
sofrimentos e de sua glória (Rm 8.17; Fp
1.29). A futura realização da esperança
será nossa participação na gloriosa res
surreição de Cristo Jesus, quando o ve
remos face a face, perfeitamente trans
formados à sua imagem e para sempre
glorificados com Ele. Nessa carta, Paulo
descreve essa realização da esperança em
termos comunitários (Ef 5.27).
2) Paulo ora para que possamos conhecer “as
riquezas da glória da sua herança nos santos”
(1.18c). Será que isso está se referindo à
nossa herança, ou à herança de Deus? Seria
a herança que Deus concederá aos santos
nos tempos vindouros (como em 1.14)? Ou
seria a herança que o próprio Deus rece
be através dos santos (como foi mencio
nado em 1.11)? Alguns intérpretes prefe
rem acreditar na primeira hipótese, porém,
a preposição “nos”, e o contexto de Efésios
em geral indicam a última, isto é, os san
tos constituem a herança de Deus. No Antigo
Testamento, Israel era a porção de Deus;
no Novo Testamento, Cristo e seu corpo
(abrangendo os judeus e os gentios) re
presentam a totalidade da herança de Deus:
“É através dessa herança que Ele mostra
rá a todo o universo as riquezas incalcu
láveis de sua glória [cf. 3.10; também 1.20-
23; 3-21]. Quase nada podemos entender
do que deve representar para Deus ver seu
propósito realizado, ver criaturas de sua
propriedade, isto é, pecadores redimidos
pela sua graça refletindo sua própria gló
ria” (Bruce, 1961,40). Certamente nossos
olhos espirituais necessitam de esclareci
mento para compreender o valor inesti
mável que Deus colocou nas pessoas re
dimidas por Cristo como sua própria he
rança.
3) A oração de Paulo é para que possamos
conhecer, pela revelação e através da ex
periência, a “sobreexcelente grandeza do
seu poder sobre nós, os que cremos”
(1.19a). “Sobreexcelente” ou “incompa
rável” (hyperballon) é uma palavra que
somente Paulo usou no Novo Testamento
(cf. 2.7; 3-19) e reflete seu desejo, quase
irrealizado, de manifestar através das
palavras a inexprimível grandeza do poder
de Deus. Por causa deste poder extre
mo, e da limitação da linguagem huma
na, não conseguimos perceber a plena
revelação daquilo que Paulo procura
transmitir a respeito do poder de Deus,
1210
EFÉSIOS 1
a não ser que nosso entendimento seja
iluminado pelo Espírito Santo.
Em 1.19, Paulo acentua as limitações
da linguagem humana para transmitir um
pouco da magnitude do poder de Deus:
“segundo a operação da força do seu poder”.
Ele usa quatro palavras-chave para des
crever o poder de Deus.
1) “Poder” (clynamis) é a palavra grega da qual
se originou “dinâmico” ou “dínamo”; isso
indica algo do sentido de impulsão da palavra:
“Dynamis”representa o potencial do po
der de Deus que, quando direcionado aos
crentes, se assemelha ao “trabalho” da
poderosa força de Deus.
2) “Trabalho” (energeia) é o termo do qual
se originou a nossa expressão “energia” e
significa um poder “energético” em ope
ração.
3) Apalavra“poderosa”(totos)querdizer“poder
como força magistral, poder demonstrado
em ação” (Salmond, 276), poder que ven
ce a resistência (como nos milagres de Cristo).
4) “Força” (ischys) se refere ao “poder ine
rente”, tal como o poder do braço de um
homem forte; poder que está disponível
sempre que for necessário. Paulo acumu
la sinônimo sobre sinônimo para indicar
a plenitude do poder de Deus e a forma
infinitamente real como esse poder foi
colocado à nossa disposição, pois fazemos
parte daqueles quecrêem. O restante da
oração de Paulo está diretamente relacio
nado a esse reino do “incomparavelmen
te grande” poder de Deus.
3-3- A Exaltação, o Senhorio e a
Autoridade de Cristo como
Cabeça, como a Medida
do Poder de Deus que Estã
Disponível (1 .2 0 -2 3 )
Em 1.20-23, Paulo faz referência à três
realidades em Cristo que demonstram, com
maior evidência, a magnitude do grande
poder de Deus: a ressurreição e ascensão
de Cristo (1.20); a entronização de Cristo
como Senhor “acima de todo principado,
e poder, e potestade, e domínio” (1.21);
e a nomeação de Cristo como a autorida
de suprema para a Igreja (1.22,23).
1) Deus demonstrou seu dinâmico poder e
sua poderosa energia quando o ressusci
tou “dos mortos” e o colocou à “sua direi
ta nos céus” (1.20). Quando o Novo Tes
tamento deseja enfatizara plenitude do amor
de Deus por nós, indica a morte de Cristo
(por exemplo, em Rm 5.8). Porém, quan
do deseja demonstrar a realidade do po
der de Deus indica a ressurreição de Cris
to. Esse acontecimento não só confere aos
crentes a esperança da ressurreição na vida
futura (1 Co 15.20, 23) como também, em
Cristo, leva-os a experimentar agora, através
da fé, o poder do Deus que os eleva da
morte espiritual para a novidade de vida
(cf. Ef 2.4-5). Além disso, como Cristo foi
elevado e assentou-se à mão direita de Deus,
em um lugar de honra e de autoridade, o
poder de Deus também “nos ressuscitou
juntamente com ele, e nos fez assentar nos
lugares celestiais, em Cristojesus” (2.6).
Dessa forma, a “ressurreição e ascensão
de Cristo expressam a medida do poder e
da autoridade do Pai que foram colocados
à nossa disposição” (Foulkes, 63).
2) Deus, o Pai, também demonstrou seu po
der através do lugar para onde elevou Cristo
— para o trono, o lugar de maior honra e
autoridade “acima de todo principado, e
poder, e potestade, e domínio, e de todo
nome que se nomeia” (1.21). Na adminis
tração divina do universo existem diferentes
níveis de autoridade, seja ela humana ou
angelical. Quaisquer que sejam as formas
de autoridade e de poderes governantes
existentes no universo, através do poder
de Deus Cristo foi entronizadcTcomo Se
nhor dos reinos celestiais, muito acima de
todos “não só neste século, mas também
no vindouro” (1.21).
A exaltação de Cristo faz ecoar a promessa
messiânica contida em Salmos 110.1, “Disse
o Senhor ao meu Senhor. Assenta-te à minha
mão direita, até que ponha os teus inimi
gos por escabelo dos teus pés”. Aqui se
notam claramente as referências às fra
ses de Salmos 110.1, como, por exemplo,
a “mão direita” de Deus, Cristo ascendendo
ao céu para “sentar-se” e Deus sujeitan
do “todas as coisas a seus pés” (1.22), o
que corresponde à expressão “por escabelo
dos teus pés”. Dessa forma os “principa
dos”, as “potestades”, os “príncipes das
1211
EFÉSIOS 2
trevas deste século”, as “hostes espiritu
ais da maldade”, que mais tarde Paulo
convoca os fiéis a enfrentar (6.10-12) estão
“sob os pés de Cristo” (1.22) e também
sob os nossos se estivermos assentados
“nos lugares celestiais, em Cristo Jesus”
(2.6). Embora Satanás e seu exército de
moníaco ainda não tivessem reconheci
do a vitória de Cristo, sua exaltação como
Senhor é a prova de que Ele reina com
absoluta supremacia. Embora ainda não
vejamos todas as coisas subjugadas a Ele,
ainda assim vemos a Jesus “coroado de
glória e de honra” (Hb 2.8,9). Sua auto
ridade e poder serão totalmente mani
festados no futuro (Sl 8.6; 1 Co 15.25-27;
Hb 2.6-8).
3) O terceiro reino no qual o poder de Deus
se apresenta como disponível ao seu povo
está na autoridade de Cristo (1.22,23). Cristo
foi nomeado como o soberano acima de
todas as coisas, isto é, o chefe supremo
da criação, a manifestação final do que
nos espera no futuro (cf. 1.10). Ele é, atu
almente, a “cabeça da igreja, que é o seu
corpo”. Esse conceito da Igreja como o
“corpo de Cristo” é exclusivo das cartas
de Paulo, entre os demais escritos do Novo
Testamento. Essa revelação teve início na
vida de Paulo por ocasião de seu encon
tro com Cristo ressuscitado na estrada de
Damasco. “Eu sou Jesus, a quem tu per-
segues” (At 9.5). Paulo estava perseguindo
a Igreja, porém persegui-la era o mesmo
que perseguir a Jesus, pois o corpo e a
cabeça estão inseparavelmente unidos em
um único ser.
Aqui Paulo não fala somente da Igreja
como o corpo de Cristo (Ef 1.23; 4.4; cf.
1 Co 6.15; 12.12-21; Rm 12.4,5), mas tam
bém a respeito de Cristo como cabeça
da Igreja (o que está implícito em 1.10
e explícito em 1.22,23; 4.15,16; 5.23; e
também em Cl 1.18): “A relação orgâ
nica entre a cabeça e o corpo sugere uma
união vital entre Cristo e a Igreja, que
participa de uma vida comum, que é a
sua própria vida ressurreta comunicada
a seu povo: “A igreja aqui mencionada
é a Igreja universal e completa — ma
nifestada visivelmente... nas congregações
locais” (Bruce, 1984, 275).
A Igreja universal, isto é, o corpo de
Cristo constituído por todos os verdadeiros
crentes, é “a plenitude daquele que cumpre
tudo em todos” (1.23). Não se consegue
perceber aquilo que Paulo tinha em mente
quando fez essa surpreendente afirma
ção. A questão está centrada nas pala
vras “a plenitude [pleroma] daquele que
cumpre”. Gramaticalmente, várias pos
sibilidades se apresentam como legítimas2.
Será que p lero m a se refere à Igreja ou a
Cristo? E quem é que “cumpre tudo”? Em
certo sentido, a Igreja representa o total
complemento de Cristo, assim como o
corpo é o necessário complemento da
cabeça na constituição de uma pessoa
completa. A Igreja, seu corpo, representa
o total complemento de Cristo que, sendo
a divindade, “cumpre tudo” — isto é, o
universo inteiro. E o próprio Cristo tam
bém representa a “plenitude”; de acor
do com Colossenses 2.9, a “plenitude”
(p le ro m a ) da divindade reside em Cris
to. Aqui, contudo, a plenitude de Cristo
reside na Igreja. Assim como o p lerom a
da divindade reside em Cristo sob a for
ma de um corpo, da mesma maneira o
p lero m a de Cristo reside na Igreja como
seu corpo. Portanto, a Igreja é “um par
ticipante de tudo que Ele possui e exis
te para o propósito da continuação de
sua obra” (Hanson, 126).
4. Os Resultados da Redenção em
Cristo Jesus (2 .1 — 3.13)
Em 1.3-14, Paulo revela sua adoração e
louvor pelo plano mestre de Deus sobre
a redenção, tal como foi formulado pelo
Pai na eternidade, tornado possível na
história pelo Filho e aplicado pelo Espí
rito Santo na vida dos crentes. Em 1.15-
23, ele ora para que os crentes possam
conhecer melhor a Deus, e para que te
nham seus olhos espirituais iluminados
para melhor entender o poder salvador
de Deus, através de Cristo, que trabalha
em sua vida e na Igreja. No capítulo 2,
Paulo começa a desvendar os verdadei
ros resultados da redenção e do poder
da graça salvadora de Deus, através de
Cristo, tanto para os judeus como para
os gentios.
1212
EFÉSIOS 2
4 .1 . Cristo S a lv a os P e c a d o r e s
d e s u a C o n d iç ã o
I r r e m e d iá v e l (2 .1 -1 0 )
Como em 1.3-14 e em 1.15-23, o tre
cho 2.1-10 se apresenta como uma única
sentença no texto grego. Paulo inicia
descrevendo o primitivo estado pecador
dos gentios (2.1,2) e o dilema de toda a
humanidade, inclusive dos judeus (2.3),
em relação ao seu passado irrecuperável.
Em seguida, mostra o enorme contraste
com a graça salvadora de Deus, em Cris
to Jesus, e a nova vida redimida que os
crentes receberam de Cristo (2.4-10).
4.1.1. A Condição de Desespero da
Humanidade Sem Cristo (2.1-3). Pau
lo menciona cinco fatos trágicos que ca
racterizam os seres humanos sem Cristo.
1) Sua vida está caracterizada pela morte es
piritual (2.1). A morte espiritual é um es
tado de separação de Deus, criado pelas
“ofensas e pecados”. Com a frase “estan
do vós”, (2.1) Paulo está se referindo aos
leitores gentios, enquanto “todos nós” (2.3)
inclui o próprio Paulo e todos os judeus.
Em 2.1, o texto grego começa com uma
frase no particípiopresente, “estando vós
mortos”, que se completa com uma frase
semelhante em 2.5 “estando nós ainda mor
tos”, antecipando o sujeito e o verbo principais
que ocorrem nos versos 4 e 5, “Deus... nos
vivificou”. O tempo presente de “estando
mortos” expressa um estado contínuo da
existência antes de termos nos tomado vivos
com Cristo. Uma existência longe de Cris
to representa uma vida nos reinos do pe
cado e da morte. Observe cuidadosamente
que Paulo não está dizendo que a huma
nidade sem Cristo irá morrer um dia, mas
que já está morta, mesmo estando fisica
mente viva (cf. 1 Tm 5.6). É uma existên
cia vazia de vida espiritual e eterna, um
reino dominado pelo espírito da morte e
da sempre presente expectativa de uma
morte eterna (cf. Ap 20.14,15).
As palavras “ofensas e pecados” (2.1) des
crevem o horizonte da morte para o pe
cador. A palavra “ofensas” (paraptomata)
refere-se a tropeçar no pecado, o que é uni
versalmente verdadeiro para toda a huma
nidade pelo fato de ser descendente de Adão.
“Pecados” (hamartiai) é uma palavra mais
comum no Novo Testamento e está rela
cionada a “pecar como um hábito” ou ao
“pecado como um poder”. De acordo com
Eadie (119), “paraptomata, sob a imagem
de ‘queda’, pode levar consigo uma alu
são aos desejos da carne... enquanto
hamartiai, sob a imagem de ‘errar o alvo’,
pode designar mais os desejos da mente,
os pecados de pensamentos e de idéias,
de propósitos e inclinações”. É a partir desse
pântano de pecado e de morte que Deus
dá início à redenção, como obra de sua graça.
2) Aqueles que estão longe de Cristo seguem
“o curso deste mundo” (2.2). Essa frase se
refere à maneira, caráter e influência de
uma humanidade não regenerada duran
te a presente era de pecado (cf. Gl 1.4; 1
Jo 2.15-17). Se não agirmos de acordo com
Cristo, estamos agindo de acordo com o
mundo, e acompanhando o caráter que
prevalece em nossa geração e a direção
da maré do pecado que nos rodeia.
3) A humanidade não regenerada está sob o
domínio do “príncipe das potestades do
ar” (2.2b). Essa é uma referência óbvia a
Satanás, que através da usurpação, reina
como o deus de sua era. Em 2 Coríntios
4.4, Paulo afirma que Satanás como “deus
deste século cegou os entendimentos dos
incrédulos, para que não lhes resplande
ça a luz do evangelho”. Assim sendo, os
pecadores se encontram completamente
embaraçados e cegos. Em Efésios 6.12 há
referência a uma rede de maus espíritos
imbuídos de autoridade e sob o controle
de Satanás como seu soberano; sua esfe
ra de atuação está descrita como “nos lu
gares celestiais” (isto é, no reino espiritu
al), o equivalente ao “reino do ar”. A esfe
ra de atuação de Satanás está limitada, em
contraste com a soberania universal de Deus.
Embora essa esfera do reino e da autori
dade de Satanás seja limitada e temporal,
não deixa de ser também real e poderosa.
O verso 2 descreve melhor Satanás como
o “espírito que opera nos filhos da deso
bediência” (a tradução literal, “filhos íhuioi]
da desobediência”). Cada pessoa se encontra
relacionada com Deus e fortalecida pelo
seu poder (1.20), ou relacionada com o reino
de Satanás e “energizada” por este (“ope
1213
EFÉSIOS 2
ra” é a tradução da palavra grega energeo,
que literalmente significa “com energia”).
Em outras palavras, se Deus não é nosso
Pai e não somos seus filhos e filhas por meio
da adoção, então Satanás é nosso pai es
piritual e somos os seus filhos por meio
da rebelião. Satanás transmite energia às
pessoas com propósitos pecadores porque
“a desobediência, a resistência conscien
te à vontade de Deus, deixa os homens
expostos à ação de Satanás e de seu exér
cito” (Westcott, 30).
4) Pessoas sem Cristo (judeus e também gentios)
têm uma propensão a andar nos desejos
da carne, fazendo a vontade da carne e dos
pensamentos (2.3). Paulo confessa, e nis
so inclui a si próprio, que a humanidade
isenta da graça de Deus, em Cristo, sente-
se inclinada a ceder à luxúria e aos dese
jos de “nossa natureza pecadora” [no gre
go, sarx, ou carne], de uma forma ou de
outra. Em outra passagem, Paulo admite
que a forma de sua própria indulgência antes
da conversão estava ligada a,“toda a con-
cupiscência” (Rm 7.8). A palavra sarx de
nota a natureza humana, que tem sido
universalmente corrompida pelo pecado;
a vontade da carne e dos pensamentos”
(2.3) produz, inevitavelmente, caso não seja
contida, pecados como “as obras da car
ne” (Gl 5.19,20; cf. 1 Jo 2.16).
5) Todas as pessoas sem Cristo são “por na
tureza, filhos da ira” (2.3d). Esse estado de
coisas existe porque através de Adão “o
pecado veio ao mundo” (Rm 5.12) e to
dos os descendentes de Adão (judeus e
também gentios) herdaram, em conseqü
ência, essa natureza pecadora, com uma
propensão ao pecado e a transformar-se
em transgressores (3.9,10,23). É principal
mente esse último fato que Paulo está
analisando aqui. Ele se refere à ira de Deus,
não porque desde nosso nascimento es
tejamos sob essa condição, como descen
dentes de Adão, mas porque “todos pe
caram” (Rm 3-23). Assim, em Efésios 2.3,
a expressão “filhos da ira” representa uma
idéia paralela ao conceito de transgressores
(2.1) e de “filhos da desobediência” (2.2)
(cf. Robinson, 49-51).
O ponto principal da exposição de Paulo,
em Romanos 1— 3, é que os judeus “reli
giosos” estavam de tal forma sob a sen
tença de pecado e da ira de Deus quanto
os gentios pagãos. Tal é a devastação
universal do pecado e da condição irre
mediável da raça humana para a qual Cristo
veio como Redentor. Nas palavras profé
ticas de Isaías: “Eis que as trevas cobri
ram a terra, e a escuridão, os povos” (Is
60.2). Porém, contra essa situação a luz
já se manifestou” (60.1,3).
4.1.2. A Salvação pela Graça, através
da Fé em Cristo (2.4-10). A ação reden
tora e cheia de amor de Deus é apresenta
da nesta seção com forte contraste emrelação
ao destino desesperado da humanidade
pecadora sob a ira do mesmo Deus em 2.1-
3. Em termos empolgantes e impetuosos,
Paulo faz o contraste da situação em que
seus leitores estavam “antes” (2.3), sem Cristo,
e aquela em que estão agora, em Cristo;
aquilo que “todos nós” (2.3a) somos “por
natureza” (2.3d) e aquilo que somos “pela
graça” (2.5,8); a razão da ira de Deus (2.3)
e a iniciativa do amor de Deus (2.4); a re
alidade espiritual de que “estávamos mortos”
(2.1), mas que Deus “nos vivificou junta
mente com Cristo” (2.5); o fato de estar
mos irremediavelmente atolados na lama
do pecado, como escravos de Satanás (2.2,3),
mas que Deus “nos ressuscitou juntamente
com ele, e nos fez assentar nos lugares
celestiais, em Cristo Jesus” (2.6) em uma
posição de honra e poder. Esses contras
tes irão trazer glória a Deus “nos séculos
vindouros” (2.7).
O verso 4 revela o grande valor que
Deus atribui à humanidade pecadora.
Estando nós ainda mortos em nossas trans
gressões e pecados, Deus ainda assim nos
amava e nos vivificou juntamente com
Cristo. Ele nos observava em nossa morte
(pessoas mortas não podem se levantar);
por ser “riquíssimo em misericórdia” (2.4;
cf. Êx 34.6; SI 103.8; Jn 4.2; Mq 7.18) e
pelo seu muito (pollen ) amor com que
nos amou (2.4). Ele “nos vivificou jun
tamente com Cristo” (2.5). O adjetivo grego
p o llen significa “muito” e não “grande”;
e se refere à infinita abundância do amor
de Deus, e não ao seu tamanho (cf. 3-17-
19). Dessa forma, Paulo corajosamente
afirma nos versos 5 e 8 que “pela graça
1214
EFÉSIOS 2
sois salvos”. Nenhuma pessoa poderia,
por esforço próprio, ou por seu mérito
ou boas obras, esperar escapar da mor
te do pecado (2.1), da armadilha do mundo,
do Diabo, da carne (2.2,3), ou da ira de
Deus (2.3). Ao contrário, somos salvos
pela iniciativa de Deus, que na riqueza
de sua misericórdia e na abundância de
seu amor escolheu justificar-nos “gratui
tamente pela sua graça, pela redenção
que há em Cristo Jesus” (Rm 3.24).
Em 2.4-7, três verbos formam o predicado
composto dessa longa sentença: “nos
vivificou” (2.5),“nos ressuscitou” (2.6) e
“nos fez assentar” (2.6). O sujeito desses
verbos é Deus; suas ações descrevem aquilo
que Ele já fez, e o objeto direto de todos
esses três verbos é o pronome plural “nós”.
Aqui Paulo faz a ligação de nossa salva
ção diretamente com o que Deus fez his
toricamente através de Cristo. Os três verbos
mencionados acima se referem, suces
sivamente, a três eventos históricos da
vida dejesus após sua morte na cruz: res
surreição, ascensão e assentar-se à mão
direita do Pai. Esses eventos da salvação
representam o ponto central do evangelho.
Paulo adiciona o prefixo syn (signifi
cando “em conjunto”) a esses três verbos,
e dessa forma nos une a Cristo nesses
eventos. Assim sendo, por causa da gra
ça de Deus, participamos com Cristo desses
momentos de triunfo sobre a morte e sobre
todo o mal. O fato de que estando mor
tos em pecados, e tendo sido por nature
za filhos da ira de Deus, podermos ser
vivificados ju n tam en te com Cristo, res
suscitados juntam ente com Cristo e assen
tados ao lado d e Cristo no reino celestial
representa certamente uma inimaginável
demonstração da misericórdia, do amor
e da graça de Deus. A salvação aqui, como
no capítulo 1, está na união com Cristo
Jesus. Deus nos abençoou como seu povo
redimido em Cristo (1.3) e “nos fez assentar
nos lugares celestiais, em Cristojesus” (2.6).
Como John Stott (81) observa: “Se estamos
assentados com Cristo no céu, não pode
existir qualquer dúvida de que estamos
assentados sobre tronos”.
Isso não é somente um mero misticis
mo: “Na verdade, em termos temporais,
vivemos na terra enquanto permanece
mos em nossos corpos; porém, “em Cris
to Jesus, estamos assentados com Cristo
onde Ele está” (Bruce, 1961, 50). Essa lin
guagem a respeito do reino espiritual testifica
de “uma experiência viva, qüe Cristo nos
concede: porumlado, uma nova vida (com
um reconhecimento sensível da realida
de de Deus e de seu amor por seu povo),
e por outro, uma nova vitória (com o maligno
cada vez mais subjugado sob nossos pés)”
(Stott, 81). Estávamos mortos, mas agora
nos tornamos vivos em Cristo; estávamos
sob o domínio tenebroso da autoridade
de Satanás, mas agora, em Cristo, fomos
elevados triunfantes sobre o pecado e a
morte; éramos escravos no cativeiro, mas
agora fomos entronizados por Cristo no
reino do céu. Em Cristo, a herança futura
já começou no presente, como uma rea
lidade gloriosa e segura, tornada possí
vel pela presença do Espírito Santo, que
habita dentro de cada um de nós (1.13,14).
O que levou Deus a proporcionar uma
salvação tão grande aos pecadores? Pau
lo utiliza quatro palavras (nessa ordem em
grego): “misericórdia” de Deus (2.4), “amor”
(2.4), “graça” (2.5,8) e “benignidade” (2.7).
Paulo atinge o clímax da compreensão
reveladora quando acrescenta que Deus
nos redimiu em Cristo “para mostrar nos
séculos vindouros as abundantes rique
zas da sua graça” (2.7) a todo o universo,
e por toda a eternidade. Ao ressuscitar a
Cristo dos mortos e ao exaltá-lo à sua mão
direita, Deus Pai demonstrou a “sobreex
celente [jhyperballori\ grandeza de seu poder”
(1.19,20); ao nos elevar da morte espiri
tual para compartilharmos o lugar de
exaltação de Cristo no céu, Deus está
mostrando as “abundantes [hyperbalton]
riquezas da sua graça” (2.7) e continua
rá a fazê-lo através de todas as eras na
eternidade.
Em 2.8-10, um dos grandes resumos
evangélicos do Novo Testamento, Paulo
expressa o âmago de sua mensagem so
bre a “graça”; a redenção, através da união
com Cristo, nos liberta de uma vida de
pecado e de morte, e nos permite parti
cipar da vida de Cristo ressuscitado, que
representa a graça de Deus precisamen
1215
EFÉSIOS 2
te porque se origina totalmente dEle —
de sua iniciativa, misericórdia, amor, bon
dade e intervenção. Existem três palavras
fundamentais no evangelho— “salvação”,
“graça” e “fé”.
1) Salvação (do grego soteria) significa “li
bertação”, e é uma palavra bastante abran
gente, que envolve mais do que absol
vição ou perdão. Aqui, Paulo usa essa
palavra para se referir à libertação da morte
pelo pecado (2.1), pelo curso deste mundo
(2.2), pelo domínio de Satanás (2.2) e pela
ira de Deus (2.3). Positivamente, ela in
clui “a totalidade de nossa nova vida em
Cristo, em conjunto com aquEle que “nos
vivificou, nos ressuscitou e nos fez as
sentar nos lugares celestiais, em Cristo
Jesus” (2.4-7) (Stott, 83). O Novo Testa
mento ensina que a completa salvação
tem três estágios: o passado , que está fun
damentado na obra consumada com a
morte de Cristo na cniz; a realidade presente
para aqueles que estão unidos pela fé a
Cristo Jesus e são habitados pelo Espíri
to Santo; e o estágio futuro, que ocorre
rá por ocasião da segunda vinda (parousia)
de Cristo, inclusive com a ressurreição
de nossos corpos.
2) Graça (cbaris) representa a iniciativa mi
sericordiosa e cheia de amor que Deus nos
oferece para proporcionar a salvação através
de Cristo, como uma dádiva gratuita. Nesse
aspecto, Bruce (1961, 51) fez uma perspi
caz observação a respeito da graça: “Se a
ressurreição de Cristo dentre os mortos,
para assentá-lo à direita de seu Pai repre
senta a suprema demonstração do poder
de Deus [1.19-21], a elevação do povo de
Cristo da morte espiritual para comparti
lhar o lugar de exaltação de Cristo é a suprema
demonstração de sua graça" (itálicos do
autor).
3) Fé (pistis) representa nossa resposta à graça
de Deus, uma resposta que foi possível pela
graça, através da qual recebemos a dádi
va gratuita de Deus, que é a salvação em
Cristo. Fé significa crer firmemente e con
fiar humildemente em Cristo como nosso
Redentor e Libertador. A fé verdadeira inclui
os frutos do arrependimento e se manifesta
visivelmente em uma vida de obediência
a Cristo Jesus como Senhor.
Em seguida, Paulo enfatiza que somos
salvos pela graça de Deus, através da fé
em Cristo, e acrescenta duas negativas e
duas afirmações:
Negativa 1: “E isso não vem de vós”
(tradução literal) (2.8c)
Afirmativa 1: “É dom de Deus” (2.8d)
Negativa 2: “Não vem das obras, para que
ninguém se glorie” (2.9)
Afirmativa 2: “Somos feitura sua” [de Deus]
(2.10a)
Alguns acreditam que o termo “isso”
da primeira negativa se refere à fé — isto
é, que mesmo a fé pela qual somos sal
vos é uma dádiva de Deus (por exemplo,
Agostinho, C. Hodge, E. K. Simpson). Essa
interpretação pode ser teologicamente
verdadeira, porém, não é a questão que
Paulo expõe aqui: “Isso” em grego (touto)
é uma palavra neutra, enquanto “fé” é um
substantivo feminino. Portanto, a palavra
que antecede o termo “isso” não é “fé”;
pelo contrário, todo o evento e toda a
experiência de sermos salvos pela graça,
através da fé, não é uma obra nossa, porém
a dádiva gratuita de Deus para conosco.
Stott (83) faz uma paráfrase do pensamento
de Paulo da seguinte maneira: “A salva
ção não é uma conquista sua (não é uma
obra sua), nem uma recompensa por
qualquer de seus feitos religiosos ou fi
lantrópicos (“Não vem das obras”). Por
tanto, não existe lugar para o mérito hu
mano, e também nenhuma razão para que
alguém se vanglorie”.
A essência da religião legalista é a crença
de que a salvação é alcançada pelas obras,
isto é, ela é o resultado de alguma coisa
que a pessoa faz. Será impossível ser salvo
de outra forma que não seja pela graça
de Deus. Todos aqueles que ainda não
foram salvos estão espiritualmente mortos
(2.1) e sob o domínio de Satanás (2.2);
são escravos do pecado (2.3) e estão sob
a ira de Deus (2.3). Para que as pessoas
possam ser salvas, Deus deve tomar a ini
ciativa de agir a favor do pecador, o que
Ele fez através de Cristo (2.4,5). Por causa
do que Ele fez, e não do que nós faze
mos, os crentes se tornam espiritualmente
1216
EFÉSIOS 2
vivos em Cristo (2.5; Cl 1.13), libertos do
poder de Satanás e do pecado (Ef 2.5,6;
Cl 1.13); tornam-se novas criaturas (Ef
2.10;2C o5.17)e recebem o Espírito Santo
(Ef 1.13,14; cf. Jo 20.22).Nenhuma medida de esforço próprio
ou de devoção religiosa pode realizar o
que está descrito acima. Pelo contrário,
“pela graça sois salvos por meio da fé —
e isso não vem de vós; é dom de Deus”
(2.8). A ação da graça de Deus está centrada
em seu Filho — sua morte, ressurreição
e entronização no céu como Senhor. Em
relação à demonstração de sua graça,
primeiramente vem o chamado ao arre
pendimento e à fé (At 2.38). Através des
sa convocação, o Espírito Santo toma a
pessoa capaz de responder à graça de Deus
através da fé. Aqueles que por meio da
fé respondem ao Senhor Jesus Cristo “são
vivificados juntamente com Cristo” (2.5).
São regenerados ou nascidos de novo por
obra do Espírito Santo (Jo 3-3-8). São res
suscitados e assentados com Cristo no reino
celestial e continuam a receber a graça por
sua união com Ele, que é a fonte do po
der. Isso os toma capazes de resistir ao
pecado e de viver de acordo com o Espí
rito Santo (Rm 8.13,14). Os crentes, en
tão, passam a servir a Deus e a praticar
“boas obras” (Ef 2.10; cf. 2 Co 9-8) por causa
da graça que opera em cada um (1 Co 15-10).
A graça de Deus opera no povo de Cristo
“tanto o querer como o efetuar, segundo
a sua boa vontade” (Fp 2.13). Do início
ao fim, então, a salvação é alcançada através
da graça de Deus que opera nos crentes
através de sua fé.
O verso 10 enfatiza que estamos em
Cristo, em contraste com o fato de an
teriormente estarmos em p ec a d o (2.1-3).
Somos agora a “obra de Deus” (poiem a),
“sua obra de arte, sua obra-prima” (Bruce,
1961, 52). A palavra p o iem a aparece no
vamente apenas em Romanos 1.20, onde
se refere ao “que foi feito” por Deus, na
ocasião da criação original. Aqui, Paulo
se refere à nova criação em Cristo (cf. 2
Co 5.17); somos “criados [ktisthentes] em
Cristo Jesus” para fazer boas obras. Essas
duas palavras gregas estão relacionadas
à criação: “Salvação é criação, recriação,
e nova criação” (Stott, 84) — que somen
te Deus pode fazer. Nunca poderemos ser
salvos apenas por nossas “boas obras”,
assim como não podemos recriar a nós
mesmos. Porém, fomos salvos p a r a “boas
obras” e até “recriados” em Cristo com esse
propósito. A única esperança para os mortos
é a ressurreição, e Jesus Cristo é “a res
surreição e a vida” (Jo 11.25). Ele é tam
bém o Criador: “Porque nele foram cria
das todas as coisas” (Cl 1.16). Tanto a
atividade da ressurreição como a da cri
ação apontam para a indispensabilidade
da iniciativa de Deus e de sua graça.
A salvação, porém, solagratia, so la fide
(somente pela graça, somente pela fé) pode
ser mal interpretada (cf. Rm 6.1). Estare
mos interpretando mal a Paulo se uma vida
de virtudes tiver sido esquecida e a graça
se tomar uma desculpa para pecar, segundo
a falsa concepção de que se os cristãos
descuidadamente pecarem, sua falta so
mente dará maior oportunidade para que
a graça de Deus se manifeste. A resposta
de Paulo a essa interpretação da graça foi:
“De modo nenhum!” (Rm 6.2) F. F. Bruce
afirma que “Aqueles que continuam a ‘andar’
em transgressões e pecados, que carac
terizam um estado de ausência de rege
neração, mostram que não são obra de
Deus, quaisquer que sejam as declarações
que possam fazer” (1961, 52).
Dessa forma, em Efésios 2.10, Paulo se
refere às boas obras como indispensáveis
à salvação — “não como sua razão ou seus
meios, no entanto, mas como sua [neces
sária] conseqüência e evidência” (Stott, 84-
85). Tito 2.14 apresenta o melhor comen
tário: Cristo “se deu a si mesmo por nós, para
nos remir de toda iniqüidade e purificar para
si um povo seu especial, zeloso de boas obras”.
Assim como em Cristo fomos predestina
dos à adoção (1.4), também em Cristo fo
mos predestinados a fazer boas obras.
Em Efésios 2.1-10, o texto grego termi
na com a frase “para que andássemos ne
las” (NASB; NIV, “para fazer”). Esse pará
grafo começa com as pessoas “andando”
(peripateo) na morte das transgressões e do
pecado (2.1-2) e estas terminam “andan
do” (peripateo) nas boas obras que, ante
cipadamente, Deus planejou para todos os
12 17
EFÉSIOS 2
que foram redimidos em Cristo. Assim o forte
contraste entre uma vida sem Cristo e uma
vida em Cristo está completo. É um con
traste entre as duas formas devida (no pecado
ou pela graça), e entre dois senhores (Sa
tanás ou Deus). Stott (85) acrescenta: “O
que poderia ter realizado tamanha mudança?
Apenas isso: uma nova criação pela graça
e pelo poder de Deus. As expressões-cha-
ve desse parágrafo são certamente mas Deus
(verso 4) e p ela g raça (versos 5, 8)”.
4.2. Cristo Reconcilia Grupos
de Pessoas Mutuamente
Hostis a Deus e Entre Si
Mesmas, como uma Nova
Humanidade (2.11-18)
A obra de Efésios 2 está dividida em
duas partes. A primeira (2.1-10) revela
que, pela riqueza da graça de Deus, Ele
está salvando cada um dos pecadores em
Cristo e modelando-os como troféus de
sua obra e de sua graça; a segunda (2.11-
22) vai além, e revela a natureza da gra
ça salvadora de Deus e de sua ação, em
termos de associação, isto é, a forma como
gentios e judeus (que são dois grupos mu
tuamente hostis), que receberam a be
nevolente salvação de Deus em Cristo,
estão sendo moldados em conjunto, em
um único corpo de Cristo, como a obra-
prima de Deus que é a redenção. Fazendo
isso, Deus está criando, em Cristo, uma
“nova humanidade” (2.11-18) euma “nova
comunidade” (2.19-22).
4.2.1. AExclusão dos Gentios daPre-
sença de Deus, e o Povo da Aliança
(2 .11 ,12). O início dos versos 11 e 12 é
muito parecido com o dos versos 2.1,2,
no sentido de que ambos revelam o destino
sem esperança dos gentios, ou do mun
do pagão, que estão fora de Cristo. Em
2.1,2, eles são retratados como “mortos
em ofensas e pecados”; e, em 2.11,12 são
descritos como alienados de Deus e de
seu povo da promessa divina, isto é, Is
rael. Em 2.1,2, “mortos” é a palavra-cha-
ve, enquanto “separados” é a palavra prin
cipal em 2.11,12 (ap a llo tr ioo ; NIV, “ex
cluídos”). No grego, este verbo signifi
ca “distanciar, alienar, excluir”. Ocorre
apenas três vezes no Novo Testamento,
duas vezes em Efésios e uma vez em uma
passagem paralela em Colossenses.
A separação causada pelo pecado é dupla:
separação de Deus, nosso Criador (4.18;
cf. Cl 1.20,21), e separação de nossos
companheiros, os demais seres humanos
(Ef 2.12). A separação de Deus, ao lado
de sua substituição vertical pela reconci
liação em Cristo, é encontrada em 2.1-10,
enquanto que a separação de outras pessoas,
compensada pela reconciliação no sen
tido horizontal, através da ação da cruz,
está enfatizada em 2.11-22.
No verso 11, Paulo lembra aos seus leitores
gentios a condição desvantajosa de seu
estado anterior ao evangelho. Gênesis 1—
2 revela a unidade fundamental da raça
humana em seu início. Após a queda (Gn
3) e o grande dilúvio (Gn 6— 8), ocorreu
a desintegração e a humanidade foi divi
dida em diferentes gaipos étnicos (Gn 11).
Entre as diferentes nações, Deus escolheu
Abraão e seus descendentes judeus para
serem o povo do pacto divino (Gn 12—
50). A circuncisão dos homens judeus tor-
nou-se um sinal exterior para lembrá-los
de sua identidade e das responsabilida
des que tinham neste pacto.
Porém, o propósito de Deus, ao esco
lher Israel para ser a luz dos gentios, per
deu-se ao final, tanto na segregação étni
ca como no exclusivismo. Nos dias de Paulo,
os judeus arrogantemente desprezavam
os gentios pagãos como cães e, desdenho
samente os consideravam como os “incir-
cuncisos”. Paulo não apóia esse título
aviltante, simplesmente anota sua utilização
na época como uma forma de apresentar
o grande cisma religioso e cultural exis
tente entre os judeus e os gentios, antes
de ter sido abolido em Cristo. No verso 12,
Paulo continua a lembrar aos gentios que,
antes de Cristo, eles haviam experimen
tado cinco formas trágicas de privação:
1) Estavam “separados de Cristo” e de todas
as bênçãos de Deus, nEle (cf. 1.3; 2.6). Como
gentios não regenerados,não haviam ainda
recebido a promessa da vinda do Messi
as, não havendo ninguém que iluminasse
sua escuridão trazendo-lhes a esperança
para o futuro.
1218
EFÉSIOS 2
2) “Haviam sido excluídos da cidadania Ipoliteia]
em Israel” por razões ligadas a seu nasci
mento. Politeia é uma palavra derivada de
polites (“cidadão”) que, por sua vez, deri
va de polis (“cidade” ou “estado cidade”).
Em Israel, ser excluído da cidadania sig
nificava que os gentios eram política e
religiosamente estranhos à comunidade da
revelação de Deus. Em outras palavras,
estavam separados do povo da promessa
divina, que constituía uma teocracia viva
e conhecia o único Deus verdadeiro.
3) Os gentios eram “estranhos aos pactos da
promessa”, isto é, estavam eliminados de
toda história espiritual e de todas as pro
messas de uma salvação messiânica con
tidas nos pactos feitos com Abrão, Moisés
e Davi. Como Paulo observa em Romanos,
os judeus haviam recebido o compromis
so de serem os verdadeiros oráculos de Deus
(Rm 3.2). Seus privilégios espirituais eram
muitos: “Dos quais é a adoção de filhos, e
a glória, e os concertos, e a lei, e o culto,
e as promessas; dos quais são os pais, e
dos quais é Cristo, segundo a carne, o qual
é sobre todos, Deus bendito eternamen
te. Amém!” (9-4,5) Os gentios haviam sido
excluídos desse caudal divino de revela
ções e de redenção.
4) e 5) As duas últimas privações estão cru
amente estabelecidas: “sem esperança e
sem Deus nesse mundo”. Em um mundo
de degradação, com todos os seus peca
dos, sofrimentos e morte, a humanidade
precisa de uma esperança infinita que so
mente a fé em Cristo pode proporcionar.
De outra forma, a vida é uma escuridão
tenebrosa, desesperançada e aflita. Os gentios
não tinham a esperança de Israel, nem a
revelação do Deus de Israel. Não estavam
sem “deuses” (tinham muitos), mas seus
deuses haviam se mostrado vazios e cru
éis . Estavam sem o verdadeiro conhecimento
de Deus, tal como havia sido revelado a
Israel.
4.2.2. ALticlusão dos Gentios naúnica
e Nova Humanidade em Cristo (2.13-
18). Paulo continua a descrever como
a obra da redenção torna as pessoas um
só povo em Cristo. O verso 13 começa
com duas frases importantes: “Mas, agora”
que aparece em contraste com “antes”
(v. 11) e “naquele tempo” (v. 12); e “em
C ristojesus”, que aparece em contras
te com “sem Cristo” (v. 12). Essas duas
expressões enfatizam como a situação
dos gentios seria drasticamente modi
ficada, de estarem “longe” para chega
rem “perto”. Essa nova aproximação de
Deus é tanto “em Cristojesus” como “pelo
sangue de Cristo”. Essa última se refere
ao evento histórico da morte de Jesus
na cruz; e a primeira está relacionada à
conversão dos infiéis e sua presente união
com Cristo. Os cinco versos seguintes
explicam o que foi alcançado pela morte
redentora de Cristo na cruz.
Os versos 14-18 revelam o âmago da
mensagem de reconciliação de Paulo, e
como Deus deu início ao seu eterno pla
no de reconciliação cósmica (embora não
universal) (1.10). A palavra principal nessa
passagem ép az , e ela aparece quatro vezes
(w . 14,15, e duas vezes no verso 17).
O verso 14 começa com uma declara
ção enfática: “Porque ele [Cristo] é a nos
sa paz”. Cristo, e somente Cristo, nos deu
a solução para esse problema que infes
ta a raça humana, isto é, a separação de
Deus e de outras pessoas. Ele é a Recon
ciliação do povo com Deus e a Reconci
liação das pessoas, umas com as outras.
Assim, o evangelho torna-se uma men
sagem de reconciliação (2 Co 5.17-21). Por
causa de seu sangue redentor (2.14), nesse
ponto de Efésios Paulo anuncia, em dois
sentidos, o próprio Cristojesus como sendo
a “nossa paz”:
1) Como pecadores, Ele nos reconcilia com
Deus pela cruz (v. 16) e
2) Reconcilia gaipos mutuamente hostis entre
si (tais como judeus e gentios) e “de am
bos os povos faz um” (v. 14b; também w.
15,16, 17 e 18).
A reconciliação é o tema central desta
passagem. Nada, a não ser o evangelho,
poderá nos oferecer, genuinamente, a paz
com Deus (Rm 5.1), “e nada, a não ser o
evangelho, poderá remover as barreiras
que dividem a humanidade em gaipos hostis
em sua própria época” (Bruce, 1961, 54).
A paz entre judeus e gentios exigia a
destruição da “parede de separação que
estava no meio” (v. 14c). Nenhuma dis
1219
EFÉSIO S 2
t in ç ã o p o r c o r , c o n f l i to é t n ic o , s e p a r a ç ã o
p o r c la s s e s o u d iv is ã o p o lí t ic a e r a m a is
ab so lu ta q u e a barreira e n tre ju d eu s e gen tio s
n o p r im e ir o s é c u lo d .C . B r u c e a c r e s c e n
ta ( ib .) . “O m a io r tr iu n fo d o e v a n g e lh o n a
e ra a p o stó lic a fo i q u e e le v e n c e u e ssa an tig a
e lo n g a d e s a v e n ç a e p e r m it iu q u e ju d e u s
e g e n t io s s e to r n a s s e m v e r d a d e ir a m e n te
u m ú n ic o p o v o e m C r is to ”.
Q u a n d o P a u lo e s c r e v e u e s s a s p a la v ra s
e m E fé s io s , “a p a r e d e d e s e p a r a ç ã o ” a in
d a e r a u m a c a r a c te r ís t ic a p r o e m in e n te n o
te m p lo ju d e u d e J e r u s a lé m . S to tt ( 9 1 - 9 2 )
d e s c r e v e g r a f ic a m e n te e s s a p r e o c u p a n te
d is t in ç ã o .
O edifício do tem plo estava construído
so b re um a p latafo rm a e lev ad a. A o seu
red o r estav a o P átio d os S a c erd o tes . A
le ste estav a o P átio de Is ra e l e a inda
m ais a leste, o Pátio das m ulheres. E sses
três p á tio s— para o s sacerd o tes, os h o
m ens leigos e as m ulheres leigas de Israel,
re sp e c tiv a m e n te — estav am to d o s n o
m esm o n ív el d o p ró p rio tem p lo . D e s
se patam ar, c in c o d egrau s d esc ia m até
um a p la ta fo rm a m urad a e , e n tã o , do
ou tro lad o d o m uro , q u ato rze d egrau s
lev av am até ou tro m uro , a lém d o qu al
estava o pátio ex tern o ou Pátio dos G en
tios. E sse p á tio era e s p a ç o s o e se e s
tendia ao redor do tem plo e de seus pátios
in tern o s . D e q u a lq u e r lu gar o s g en ti
o s p o d iam o lh ar e o b serv a r o tem p lo ,
p o rém n ão tin h am p erm issã o d e a p ro
x im ar-se d ele . Estavam im p edidos p elo
m uro q u e o c ircu n d av a, u m a b a rrica
da d e um m etro e m e io d e p ed ra s o
b re a q u al estav am c o lo c a d o s , em s e
guidos intervalos, avisos em grego e latim.
Na v erd ad e , esse s av iso s n ã o diziam :
“O s in tru so s se rã o p ro c e ss a d o s” e sim
“O s in tru sos serã o e x e c u ta d o s ”.
O p ró p rio P a u lo q u a s e fo i m o rto , trê s o u
q u a tr o a n o s a n te s , p o r u m a m u ltid ã o irad a
d e ju d e u s e m je r u s a lé m , q u e a c re d ita v a n o
b o a to d e q u e h a v ia le v a d o u m g e n tio d e
É fe s o , c h a m a d o T ró fim o , p a ra d e n tro d o
te m p lo (A t 2 1 .2 7 - 3 2 ) . N a é p o c a e m q u e
e sc re v e u essa carta, P a u lo estav a litera lm ente
p r is io n e iro “p o r v ó s , o s g e n t io s ” ( E f 3 .1 ) .
E m b o ra o m u ro d iv iso r e o te m p lo tiv e s
s e m p e r m a n e c id o a té a d e s tru iç ã o d e J e r u
s a lé m p e lo s r o m a n o s n o a n o 7 0 d .C ., P a u
lo co ra jo sa m e n te d eclaro u q u e Cristo já havia
d estru íd o e s s e m u ro q u a n d o m o rreu n a cru z
(aproxim ad am en te n o an o 3 0 d.C.). “O sím bolo
a in d a p e r m a n e c ia ; m a s o q u e e le s ig n if ic a
v a e s ta v a d e s tru íd o ” (R o b in s o n , 6 0 ) . A tra
v é s d e C risto , ta n to o s ju d e u s c o m o o s g e n
tio s a g o r a tê m “a c e s s o a o P a i [no te m p lo
d o céu ] e m u m m e s m o E sp ír ito ” (2 .1 8 ) .
A p a z e a u n id a d e e n tr e ju d e u s e g e n
t io s ta m b é m e x ig ia “n a s u a ca r n e [is to é ,
n a m o r te f ís ic a d e je s u s n a c ru z ], d e s fe z a
in im iz a d e , is to é , a le i d o s m a n d a m e n to s ,
q u e c o n s is t ia e m o r d e n a n ç a s ” ( 2 .1 5 ; c f.
Cl 1 .2 2 ; 2 .1 1 ,1 2 ) . P a u lo , a q u i , n ã o s e r e
f e r e à le i c o m o u m a r e v e la ç ã o d o c a r á te r
m o r a l e d a v o n ta d e d e D e u s , q u e fo i e l i
m in a d a p e la m o r te d e C r is to . A tra v é s d a
p re se n ç a p o d e ro sa e cap acitad o ra d o Espírito
d e C risto , s o b o n o v o p a c to , a re tid ã o m o ra l
e x ig id a p o r D e u s n a le i e s tá m a is n it id a
m e n te e n ten d id a , ta n to p a ra o s ju d eu s c o m o
p a r a o s g e n t io s , d o q u e e r a p o s s ív e l s o b
a an tig a a lia n ç a (c f. R m 3 .3 1 ) . P o ré m , C risto
a b o l iu a le i , q u e tra z ia u m c ó d ig o e s c r i to
d e reg u lam en to s so b re sacrifício s d e an im ais,
q u e s t õ e s a l im e n ta r e s , r e g r a s s o b r e a l im
p e z a e im p u r e z a , e tc . — q u e c r ia v a u m a
s é r ia b a r r e ir a e n tr e ju d e u s e g e n t io s e q u e
re s u lta v a e m u m p a r t ic u la r is m o ju d e u e
e m u m a e x c lu s ã o d o s g e n t io s .
C o m o M a x T u r n e r o b s e r v a ( 1 2 3 1 ) , “o
b o m p ro p ó s ito , a q u e a le i d e M o is é s serv ia
[s o b o a n t ig o p a c to ] , p a r a p r e s e iv a r Is r a
e l d a in f lu ê n c ia p a g ã d e o u tr a s n a ç õ e s ,
a b r iu c a m in h o p a r a u m p r o p ó s i to a in d a
m a is e le v a d o [d e D e u s ]”, is to é , “p a r a c r i
a r e m si m e s m o d o s d o is u m n o v o h o m e m ”
(2 .1 5 ). “O n o v o h o m e m ” n ã o será n e m ju d eu
n e m g e n t io , m a s s e r á fo r m a d o p e la s d u a s
p a r te s c o m o u m a n o v a c r ia ç ã o e m C r is
to . A v a r ie d a d e d e d is t in ç õ e s q u e p r e v i
a m e n te h a v ia c a u s a d o a s p r in c ip a is d iv i
s õ e s e b a r r e ir a s n a fa m ília h u m a n a n ã o
s e r á m a is p e r m it id a “e m C r is to ”. S o m o s
to d o s u m s ó n E le , e , ig u a lm e n te h e r d e i
r o s d a g r a ç a d e D e u s (c f . G l 3 - 2 8 ,2 9 ) .
A p a z e a u n id a d e e n tr e ju d e u s e g e n
t io s e x ig ia q u e a m b o s f o s s e m r e c o n c il ia
d o s “p e la c r u z ... c o m D e u s e m u m c o r p o ”
1220
EFÉSIO S 2
O Templo de Herodes
O templo, construído em Jerusalém pelo Rei
Herodes, foi o terceiro templo a ser construído
sobre o mesmo monte, chamado Moriá. O Rei
Herodes, sendo um idumeu, construiu esse
extravagante templo como uma forma de obter o
favor dos judeus. Sua construção se iniciou no
ano 19 a.C. e ainda não havia sido concluída até
o ano 64 d.C.
P átio d os G entios
Herodes mandou nivelar a superfície do monte e,
em seguida, construiu um forte muro de contenção
em volta de seu perímetro com blocos de pedra
maciça, com facetas lisas, empilhadas sem o uso
de argamassa. Ainda hoje, são visíveis o canto
sudeste e uma seção do Muro Ocidental, também
chamada Muro das Lamentações. Essa
“plataforma", cobrindo uma área aproximada de
450 metros de norte a sul e 300 metros de leste a
oeste, é chamada de Monte do Templo.
O templo que havia sido anteriormente construído
pelos exilados da Babilônia fora derrubado e
substituído pelo templo de Herodes.
O templo e seus átrios, ou pátios, foram
construídos sobre uma plataforma elevada. O
templo de Herodes tinha colunas de mármore
branco, com portões de ouro e prata. Uma cortina
separava o Lugar Santo do Lugar Santíssimo.
Um pórtico de colunas circundava todo o Monte do
Templo. A seção correspondente à extremidade sul
tinha quatro fileiras de colunas; os demais pórticos
tinham duas. Na extremidade noroeste do Monte do
Templo situava-se a Fortaleza Antônia. Embora os
gentios pudessem entrar no pátio que circundava o
templo, havia avisos impedindo-os de entrar nos
três pátios centrais, que eram de uso restrito dos
sacerdotes e dos homens e mulheres judeus. O
castigo pela infração era a morte.
O templo e os muros que o circundavam foram
destruídos pelos romanos no ano 70 d.C.
Muro
Ocidental
1221
EFÉSIO S 2
( 2 .1 6 ) . I s s o p r e s s u p õ e q u e ta n to ju d e u s
c o m o g e n t io s e r a m p e c a d o r e s s e p a r a d o s
d e D e u s ( 2 .3 ) e n e c e s s i ta v a m d a m o r te
e x p ia tó r ia d e C ris to a f im d e s e r e m r e c o n
c i l ia d o s c o m D e u s ( 2 .1 7 ,1 8 ) . S u a “in im i
z a d e ” ( 2 . 1 6 ) , q u e fo i c o n d e n a d a à m o rte
n a c ru z , e r a ta n to h o r iz o n ta l c o m o v e r t i
c a l — is to é , u m a h o s t i l id a d e e n tr e p o v o s
n ã o r e g e n e r a d o s e D e u s (R m 5 -1 0 ) , e e n tre
g r u p o s h o s t is , ta is c o m o ju d e u s e g e n t i
o s . O m ila g re d a r e c o n c il ia ç ã o re s u lto u e m
u m a n o v a e n tid a d e esp iritu a l c h a m a d a “u m
c o r p o ” d e C ris to ( 2 .1 6 ) . E s s e a s s u n to to r
n a -s e o f o c o d e P a u lo e m 2 .1 9 - 2 2 .
E m g r e g o , o v e r s o 1 7 c o m e ç a c o m a
c o n ju n ç ã o “e ” ( n ã o tra d u z id a n a N IV ) e
fa z a l ig a ç ã o c o m o v e r s o 1 4 . C r is to n ã o é
s o m e n t e a “n o s s a p a z ” ( 2 .1 4 ) , m a s ta m
b é m “e v a n g e liz o u a p a z ” (2 .1 7 ; cf. Is 5 7 .1 9 ) .
A m e n s a g e m d e p a z fo i p r im e ir a m e n te
a n u n c ia d a p e lo s a n jo s p o r o c a s i ã o d o
n a s c im e n to d e je s u s (L c 2 .1 4 ) ; fo i a lc a n ç a d a
p o r je s u s n a c ru z ( E f 2 .1 3 - 1 6 ) e p r o c la
m a d a p o r J e s u s a o s d is c íp u lo s a p ó s s u a
r e s s u r r e iç ã o ( J o 2 0 .1 9 - 2 1 ) .
P o ré m , C risto p re g o u a p az d e u m a form a
m ais a b r a n g e n te — p a z p a ra “v ó s, q u e a n te s
e s tá v e is lo n g e ” ( is to é , p a ra o s g e n t io s q u e
e s ta v a m s e m e s p e r a n ç a e s e m D e u s —
2 .1 2 ,1 3 ) , e p a z p a r a a q u e le s q u e c h e g a
ra m “p e r to ” ( is to é , o s ju d e u s q u e t in h a m
o s “c o n c e r to s d a p ro m e s s a ”,2 .1 2 ) — atrav és
d a p re g a ç ã o d o e v a n g e lh o p o r P ed ro , P a u lo
e o u tr o s e v a n g e lis ta s d o p r im e ir o s é c u
lo . O b s e r v e q u e o s g e n t io s e s ta v a m in c a
p a c i ta d o s d e v ir a C r is to ; E le t in h a q u e ir
a té e le s a tra v é s d e se u s m e n s a g e ir o s . A lé m
d is s o , o s ju d e u s ta m b é m p r e c is a v a m q u e
o E v a n g e lh o lh e s fo s s e p r e g a d o . E m q u a l
q u e r lu g a r e m q u e a m e n s a g e m d e p a z e
d e r e c o n c i l i a ç ã o ( s o m e n te to r n a d a p o s
s ív e l a tr a v é s d a c r u z ) s e ja p r o c la m a d a n o
m u n d o d e h o je , “é C r is to q u e a p r o c la m a
a tr a v é s d e n ó s ” (S to t t , 1 0 3 ) .
L o g o a p ó s a m o rte e re ssu rre içã o d e je s u s
“p o r e le , a m b o s [c r e n te s ju d e u s e g e n tio s ]
te m o s a c e s s o a o P a i e m u m m e s m o E s p í
r ito ” ( 2 .1 8 ) . A p a la v ra a c e s s o (prosagoge)
p o d e s ig n if ic a r “a p r e s e n ta ç ã o ” n o s e n t id o
d e s e r m o s , a tra v é s d e C ris to , in tro d u z id o s
à p r e s e n ç a d e D e u s , c o m o n o s s o P a i. P o
ré m , é m a is p r o v á v e l q u e e s s a p a la v ra tra
g a à m e n te a c e n ad e u m a c o r te re a l, e m
u m a n t ig o r e in o d o O r ie n te M é d io , o n d e
u m o f ic ia l d e s ig n a d o c o m o prosagogeus
facilita a ad m issão à p resen ça d o rei. O Espírito
San to facilita o a ce s so a u m a íntim a co m u n h ã o
c o m o P a i, q u e s e to rn o u p o s s ív e l p e la “r e
d e n ç ã o p e lo s e u s a n g u e ” ( 1 .7 ) . E s s e s ig
n if ic a d o é o m e s m o e m 3 .1 2 e n o s e n s in a
m e n to s p a r a le lo s e m H e b r e u s 1 0 .1 9 -2 2 .
T e m o s o d ir e ito d e , c o m c o n f ia n ç a , n o s
a p r o x im a r m o s d e n o s s o P a i c e le s t ia l, s a
b e n d o q u e se re m o s a c e ito s , a m a d o s e b e m -
v in d o s p o r c a u s a d e C ris to .
P o d e m o s fa z e r a in d a m a is d u a s im p o r
ta n te s o b s e r v a ç õ e s a r e s p e ito d o v e r s o 18 .
1) E xiste n e le u m claro a sp e cto da Trindade,
p o is tem o s livre a ce sso ao Pai, p o r cau sa
do san gu e d o Filho, co m a a juda d o Espí
rito Santo. Isso co rresp o n d e à d eclaração
q u e P au lo faz n e sta carta a re s p e ito da
red en çã o , em 1.3-14.
2) A fra se “Ambos te m o s a c e s s o ao P a i” r e
a firm a o te m a d e P a u lo s o b r e a u n id a
d e d e n tro da Ig re ja , q u e o E sp ír ito S a n
to a ju d a a to rn a r p o ss ív e l. O único p o v o
de D eu s (o s d ois torn aram -se a p en as um ,
um c o rp o , um n o v o h o m e m ) tem a c e s
so “p o r m eio d e um E sp ír ito ” ao um D eu s
e P a i (c f . 4 .3 -6 ) .
4.3■ Cristo Une Povos
Separados em uma Única
e Nova Comunidade
(2 .1 9 -2 2 )
O te r m o “c o n s e q ü e n t e m e n t e ” in d ic a
q u e 2 .1 9 - 2 2 é a c o n c lu s ã o ló g ic a im e d i
a ta d o q u e h a v ia s id o p r e v ia m e n te d ito
e m 2 .1 1 - 1 8 . E m u m s e n t id o m a is a m p lo ,
e s ta p a s s a g e m r e p r e s e n ta o fru to d e tu d o
q u e P a u lo já h a v ia e s c r i to a té e s s e m o
m e n to n o l iv ro d e E fé s io s a r e s p e i to d a
r e d e n ç ã o e m C r is to . O o b je t iv o p la n e ja
d o p e lo P a i, e c o n q u is ta d o p o r C ris to c o m
s u a m o r te , r e s s u r r e iç ã o e a s c e n s ã o , e r a
cr ia r , a t r a v é s d a r e d e n ç ã o , a lg o in te ir a
m e n te n o v o — a lg o q u e r e s u lta r ia “e m
lo u v o r à s u a g ló r ia ” ( 1 .6 ,1 2 ,1 4 ) e r e v e la
r ia à s g e r a ç õ e s fu tu r a s “a s a b u n d a n t e s
r iq u e z a s d a s u a g r a ç a ” ( 2 .7 ) . E s s e a lg o
in te ir a m e n te n o v o e r a u m p o v o r e d im id o
p e la g ra ç a d e D e u s , c o m o “fe itu ra ” d e D e u s
1222
EFÉSIO S 2
( 2 .1 0 ) , q u e s e t o m a r ia u m a n o v a c r ia ç ã o
e u m a n o v a h u m a n id a d e .
E m C r is to , D e u s r e fe z o u r e c r io u u m a
p a r te d a a n t ig a h u m a n id a d e ( ju d e u s e
g e n t io s ) e , v e n c e n d o o s p o d e r e s d a d iv i
s ã o , “d e a m b o s o s p o v o s fe z u m ” (2.14),
e d e s s a fo rm a c r io u “e m si m e s m o d o s d o is
u m n o v o h o m e m ” (2.15); “e m u m c o r p o ”
(2 .1 6 ) “p e la c ru z ”, r e c o n c ilio u “a m b o s c o m
D e u s ” e o s d o is p o v o s e n tr e s i (2.16). U m
im p o r ta n te o b je t iv o d a r e d e n ç ã o e r a u n ir
p o v o s d iv id id o s e m u m a ú n ic a c o m u n i
d a d e (2.19). P a u lo e m p r e g a t r ê s a n a lo g i
a s p a r a d e s c r e v e r a n a tu r e z a c o r p o r a tiv a
d a r e d e n ç ã o ( c id a d a n ia , f a m íl ia e u m
e d if íc io ) , c a d a u m a d e la s e n fa t iz a n d o q u e
o lu g a r d o s g e n t io s c r is tã o s n a n o v a c o
m u n id a d e n ã o é a b s o lu ta m e n te in fe r io r
a o d o s ju d e u s c r is tã o s .
4.3.1. A Analogia com a Cidadania
(2.19a). “A ssim q u e já n ã o so is estra n g e iro s
n e m fo ra s te iro s [c o m o a n te r io rm e n te , a n te s
d a fé e m Cristo, cf. 2 .11-13], m a s c o n c id a d ã o s
d o s S a n to s e d a fa m ília d e D e u s ” (c f . 2 .1 9 ) .
S e a Ig r e ja fo r c o n s id e r a d a c o m o o r e in o
d e D e u s , o u c o m o u m a “n a ç ã o s a n ta ” (1
P e 2 .9 ) , o s c r e n te s g e n t io s s ã o c id a d ã o s
p le n o s e n ã o m o r a d o r e s e s tr a n g e ir o s . E m
C r is to , r e c e b e r a m to d o s o s d ir e ito s e p r i
v ilé g io s d o s q u a is e s ta v a m e x c lu íd o s a n te
r io r m e n te ( 2 .1 2 ) . O te r m o “e s t r a n g e ir o s ”
(paroikoi) r e f e r e - s e a m o r a d o r e s e s t r a n
g e ir o s q u e s e f ix a r a m o f ic ia lm e n te e m u m
p a ís e s t r a n g e ir o , m a s q u e n ã o g o z a m d e
s e u s d ir e ito s in t r ín s e c o s . O te r m o “f o r a s
te iro s” {xenoi) sig n ifica v isitan tes c o m b re v e
e s ta d ia e m u m p a ís . S o b o a n t ig o p a c to ,
e s s a e r a a s i t u a ç ã o d o s g e n t io s q u e s e
c o n v e r te r a m à f é ju d a ic a . A g o r a , p o r é m ,
p o r c a u s a d e C r is to , o s g e n t io s c o n v e r t i
d o s p a s s a r a m a g o z a r d e p le n a c id a d a n ia
e d e t o d o s o s d ir e ito s c o r r e s p o n d e n te s .
S ã o “c o n c id a d ã o s ” d a q u e le s “q u e p rim e iro ”
e sp e ra ra m “e m C risto” (1 .1 2 ). T e n d o o u v id o
a p a la v r a , c r e r a m e m C r is to e fo r a m s e la
d o s c o m o E spírito San to (1 .1 3 ). D e ssa form a,
s ã o h e r d e ir o s le g ít im o s d a g r a ç a d iv in a e
d a h e r a n ç a q u e D e u s g u a r d o u p a r a s e u
p o v o r e d im id o , d a m e s m a m a n e ir a q u e
o s c r e n te s ju d e u s ( 1 .1 4 ) .
4.3.2. A Analogia com a Família
(2.19b). U tiliz a n d o a a n a lo g ia c o m a Ig re ja ,
c o m o s e n d o a fa m íl ia d e D e u s , P a u lo
a ss e g u ra a o s s e u s le ito re s g e n tio s q u e se rã o
“c o n c id a d ã o s d o s S a n to s e d a fa m ília d e
D e u s ” . N ã o s e r ã o c id a d ã o s d e s e g u n d a
c la s s e o u s e r v o s d o la r ; g o z a r ã o d e to d o s
o s p r iv i lé g io s d e q u e g o z a m o s f ilh o s e
a s f i lh a s e , e m C r is to , t e r ã o to d o o d ir e ito
à s b ê n ç ã o s e à h e r a n ç a d o P a i ( c f . 1 .1 3 ,1 4 ) .
A tra v é s d a Ig r e ja , o m e s m o P a i to r n a ju
d e u s e g e n t io s e m ir m ã o s e irm ã s , m e m
b r o s d e u m a ú n ic a fa m ília . E s s a a n a lo g ia
s u g e r e u m a r e la ç ã o ín tim a e a m o r o s a c o m
D e u s e c o m o p r ó x im o .
4.3.3. A Analogia com um Edifício
(2 .2 0 -2 2 ) . “E s s e n c ia lm e n te , a ig r e ja r e
p r e s e n ta u m a c o m u n id a d e d e p e s s o a s . N o
e n ta n to , e m m u ito s a s p e c t o s p o d e s e r
c o m p a r a d a a u m e d if íc io e , e s p e c ia lm e n te ,
a u m te m p lo ” (Stott, 1 0 6 ). A fra s e “ed ifica d o s
s o b r e o f u n d a m e n to ” é a t r a n s iç ã o p a ra
e s s a a n a lo g ia d a Ig r e ja c o m o u m e d if íc io
e m p r o c e s s o d e c o n s t r u ç ã o . E m 2 .2 0 - 2 2 ,
P a u lo n o v a m e n te a ss e g u ra a o s g e n tio s q u e
fo r m a r ã o p a r te in te g ra l d a Ig re ja q u e D e u s
e s tá c o n s tr u in d o .
N e s s e t r e c h o s ã o e n fa t iz a d o s q u a tr o
a s p e c to s d e s s e e d if íc io e m c o n s t r uç ã o :
1) O prim eiro trata d o ‘fundamento” (2 .2 0 ).
Nada é m ais b á s ic o para q u e um a estru tu
ra se ja segu ra d o q u e um só lid o a licerce .
Na parábola so b re o s dois constru tores, n o
final do Serm ão do M onte J e s u s enfatizou
a im p ortância de um a licerce só lid o . Afi
nal de contas, som ente um a casa constm ída
so b re um a licerce só lid o , em ro ch as, p o
d erá p erm an ecer. Na p aráb o la de Je su s ,
e sse só lid o alicerce , o u fu n d am ento , nada
m ais é do qu e E le p róp rio e su as palavras
(M t 7 .2 4 -2 7 ).
M as o q u e q u er d izer essa ro ch a so b re a
qu al a Igre ja está ed ificada? P au lo asseg u
rou aos gentios qu e a Igreja seria ed ificada
“so b re o fu n d am ento d os ap ó sto lo s e dos
p ro fe tas” (2 .2 0 ). Essa frase p o d e ser inter
pretada de três form as diferentes: (a ) O fun
dam ento é constituído pelos próprios ap ó s
to los e p ro fetas; (b ) O fu n d am ento se re
fere àq u ilo so b re o q u e o s p róp rio s a p ó s
to lo s e p ro fetas foram ed ificad o s (is to é,
Cristo) ou (c ) O fundam ento se refere àquilo
qu e foi estab elec id o p elo s ap ó sto los e pro
fetas . A resposta a essa questão vai depender,
1223
EFÉSIO S 2
em parte, da identidade dos “p rofetas” aqui
m en cio n ad o s. L enski (4 5 2 -5 3 ) afirm a qu e
estes são os profetas do Antigo Testam ento.
E le argu m enta qu e, p o r existir a p en as um
artigo d efin id o an tes d e “ap ó sto lo s e p ro
fetas”, Paulo considera essas duas categorias
com o uma única classe. Os profetas do Antigo
T estam en to , assim co m o os a p ó sto los do
Novo Testamento, compartilham uma mesma
responsabilidade de serem os primeiros vasos
da rev e la çã o divina, co n fo rm e registrado
nas Escrituras sob as duas alianças. D e acordo
co m esta v isão , “o fu n d am en to" so b re o
qu al a Igre ja é ed ificada é o testem u nh o
de a p ó sto los e p ro fetas , investid o em au
torid ade, tal co m o en co n tram o s n o A nti
g o e n o N ovo T estam en to .
Seria, contudo, improvável qu e esse aspecto
rep resen tasse a in tenção de Paulo, p o rqu e
(a) a palavra de ordem é “os ap óstolos e os
p ro fetas” e não “os p rofetas e os ap ó sto
lo s”; e (b ) em Efésios, as duas ocorrências
on d e ap ó sto los e p rofetas foram m en cio
nad os em co n ju n to (3 .5 ; 4 .1 1 ), a referên
cia é claram ente aos p rofetas cristãos co m o
líderes da Igreja. O s ap ó sto los e o s profe
tas do Novo T estam ento constituem os dois
ministérios fundamentais da Igreja, não apenas
em 2 .20 e 3-5, m as tam bém em 1 Coríntios
12 .28; “E a uns p ô s D eu s na igreja, prim ei
ra m en te , a p ó sto lo s , em se g u n d o lugar,
p ro fetas ...” Em E fésios 3 .5 ,6 , Paulo afirma
claram ente qu e o m istério de Cristo, qu e
havia p erm an ecid o d esco n h e cid o das an
tigas g e ra çõ e s , “n o u tros sécu lo s , não foi
m anifestado aos filhos dos hom ens, com o,
agora, tem sido revelad o p elo Espírito aos
seus santos ap ósto los e profetas, a saber,
qu e os gentios são co-h erd eiros, e de um
m esm o corp o , e participantes da p rom es
sa em Cristo p elo ev an g e lh o ”. Essa revela
ção crucial foi feita primeiramente aos “santos
ap ó sto los e p ro fetas” n o prim eiro século.
D essa form a, a Igre ja é “ed ificad a” so b re
a rev elação original e infalível de Cristo aos
prim eiros ap ó sto lo s e profetas. N o en tan
to , d ev e-se acre scen ta r q u e líd eres v is io
nários e santos, p e sso a s ch e ia s da Palavra
e do “esp írito de sabedoria e de rev e lação ”
(1 .1 7 ), co n tin u am a ser n e cessárias para
lid erar a Igre ja “até q u e to d o s ch eg u em o s
à unidade da fé è ao co n h ecim en to do Filho
de Deus, a varão perfeito, à medida da estatura
co m p leta d e C risto” (4 .1 3 ).
2) A Igreja qu e D eus está ed ificand o tem um a
“pedra da esquina” (o u pedra angular) que
é o próprio Sen h orjesu s Cristo (2 .20b). Qual
é a im p o rtância desta ped ra angular? Esta
palavra, tan to aq u i co m o em 1 P ed ro 2.6 ,
fo i extraíd a de Isaías 2 8 .1 6 , “P ortan to , as
sim diz o Se n h o r Je o v á . Eis q u e eu a sse n
tei em Sião um a pedra, um a pedra já p ro
vada, pedra p recio sa de esq u in a , q u e está
b e m firm e e fu n d ad a...” Essa ped ra é “um a
parte essen cia l da fu n d a çã o ” (Stott, 107)
e serve p ara m anter tod a a estrutura u n i
da (2 .2 1 a ). A partir daí, tod o o restante da
fu n d ação será c o lo ca d o a o lo n g o da linha
dos m uros futuros; e a partir d ela , co m o
u m p o n to fix o de re ferên cia , os m u ro s se
levantarão em linha reta, co m o ângulo e x
terior da fundação assegurando que os demais
âng u los se jam verd adeiros.
A p ed ra de esq u in a o c u p a um lu g ar p ro
em inente em toda a estm tura. Antigam ente,
m uitas v e z e s o n o m e d o rei era inscrito
nesta. A Igreja, co m o tem p lo d e D eu s, está
se n d o co m p le ta m e n te ed ificad a a partir
d a re v e la çã o de C risto , e la b o ra d a e c o
m u n icad a atrav és d o m in istério d e a p ó s
to lo s e p ro fetas .
3 ) U m terceiro aspecto do edifício corresponde
à cada uma das pedras individualmente
e q u e , c o le t iv a m e n te , fo rm a m “to d o o
ed ifíc io ”. Em Cristo, cad a pedra é in co r
p orad a ao co n ju n to p ara qu e este cresça
torn an d o -se um tem p lo san to n o Sen h o r
(2 .21). A passagem em 1 Pedro 2.5 expressa
o m esm o pensam ento: “V ós tam bém , com o
p ed ras vivas, so is ed ificad o s casa esp iri
tual”. A frase “tod o o ed ifíc io ” se re fere à
Igre ja universal, e n ão a um a co n g reg a çã o
lo ca l (B ru ce , 198 4 , 3 0 7 ). Ser incorp o rada
a o co n ju n to (2 .2 1 ) d escrev e um “p ro ce s
so co m p licad o de alvenaria p e lo qu al as
pedras são ajustadas um as às outras” (W ood,
4 2 ). N o grego , as frases “estar sen d o in
co rp orad o ao co n ju n to ” e “ser e lev ad o” (li
tera lm en te , “c re sce r”, lem b ran d o -n o s qu e
a Igre ja é um organ ism o v iv o) p erten cem
ao tem p o p re sen te ; esse tem p o ind ica um
p ro ce sso co n tín u o de co n stru ção e c re s
c im ento (cf. 2 .22 , “tam bém vós juntam ente
so is ed ificad o s”).
1224
EFÉSIO S 2
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As ruínas das colunas
que contornavam a
Rua Curetes, em
Éfeso, dão uma
indicação da grandeza
dessa cidade que
estava localizada em
uma das principais
rotas comerciais. À
esquerda, outra
imagem mostra a
extensão da Rua
Harbor, que dava
acesso à cidade. Paulo
retornou a Éfeso ao
final de sua segunda
viagem missionária.
1MI— I M K M
........ ...
« v - b í : ■
A ex p ressã o “to rn a r-se” está n o p assivo e
ind ica o p ap el d e D eu s a o fazer co m qu e
cada parte se ajuste a o todo: “T am b ém v ó s”
(2 .22a) se refere à inclusão dos crentes gentios
n o “tem p lo san to n o Senh or” (2 .2 1 b ). Aqui,
a palavra grega para “tem p lo” nã o é hieron,
que é usada para os limites do templo, porém
naos, q u e se re fere ao san tu ário in terior
que inclui o Lugar Santo e o Lugar Santíssimo
(R o b in son , 7 1 ).
4 ) Paulo co n clu i co m o pro p ósito para o qual
o tem plo está sen d o construído, o qual já
fo i su gerido qu an d o u sou o term o g reg o
naos, isto é, “morada de Deus no Espírito”
(2 .2 2 ). Na antiga alian ça, o tabern ácu lo e o
tem plo eram a h ab itação d o D eu s d e Isra
el. No Novo Testamento, Paulo anteriormente
cham ou cada u m dos crentes d e “tem plo
de D eu s” e m orada do Espírito Santo (1 Co
3 .16 ). Agora, porém , e em um sentido m ais
amplo, P au lo se refere aos crentes co leti
vam ente, tanto judeus co m o gentios, com o
o tem plo e a m orada de D eus na terra (2 .22).
E n tr e ta n to , D e u s n ã o e s tá e s p e r a n d o
a té q u e a Ig r e ja s e ja u m e d if íc io t e r m in a
d o p a r a v iv e r nele-, e s tá r e s id in d o d e n tr o
d e ca d a cr is tã o e m c a d a p a s s o d o p r o c e s s o .
O b se rv e q u e e m 2 .2 2 te m o s ou tra d as m u itas
r e f e r ê n c ia s in d ir e ta s à T r in d a d e q u e a p a
r e c e m e m E f é s io s : a I g r e ja e s t á s e n d o
e d if ic a d a em Cristo, c o m o a m o r a d a d e
Deus ( o P a i) no Espírito.
1225
EFÉSIO S 3
4.4. Paulo e a Igreja como o
Meio de Revelação da
Multiforme Sabedoria de
Deus na Redenção
(3-1-13)
O c a p ítu lo 3 c o m e ç a c o m P a u lo o r a n
d o a fa v o r d a c o m p le ta r e a l iz a ç ã o d a o b r a
d e C r is to n a Ig r e ja e n o s c r e n te s . S u a fra
s e d e a b e r tu r a : “P o r e s ta c a u s a ”, r e p e tid a
e m 3 .1 4 , v o lta a s e r e f e r i r ã o g r a tu ito p la
n o d e D e u s da red en çã o , q u e inclu i o s gen tios
( e s p e c ia lm e n t e 2 .1 3 - 2 2 , o n d e o s g e n t io s
r e d im id o s s ã o , a o la d o d o s ju d e u s , ig u a l
m e n te m e m b r o s d o c o r p o ú n ic o d e C r is
t o ) . P o r e m , e n tr e a s o c o r r ê n c ia s d e s s a s
f r a s e s , n o s v e r s o s 1 e 1 4 , P a u lo a fa s ta -s e
d o te m a p r in c ip a l c o m o e m u m a in s p ir a
d a e x c u r s ã o , p a r a b r e v e m e n t e e x p a n d ir
o t e m a c e n tr a l d e E fé s io s — is to é , s o b r e
a c o n ju n ç ã o d e to d a s a s c o is a s s o b u m a
ú n ic a c a b e ç a : C r is to ( 1 .9 ,1 0 ) — e a in c u m
b ê n c ia q u e r e c e b e u d e D e u s p a ra s e r o
a p ó s t o lo p a r a o s g e n t io s .
A p ó s e s s a b r e v e , p o r é m im p o r ta n te
o b s e r v a ç ã o , P a u lo p r o f e r e s u a s e g u n d a
m a is im p o r ta n te o r a ç ã o n e s s a c a r ta , u m a
o r a ç ã o a p o s t ó l ic a a fa v o r d a p le n i tu d e
e s p ir itu a l d o s c r e n te s ( 3 .1 4 - 2 1 ) , a f im d e
q u e D e u s p o s s a s e r g lo r i f ic a d o n a Ig r e ja
( q u e é o c o r p o d e C r is to ) , a s s im c o m o o
é e m C r is to J e s u s .
4.4.1. Paulo como um Poderoso Ins
trumento de Deus (3.1-9). A n tes d e in iciar
s u a s e g u n d a o r a ç ã o a p o s t ó l ic a , P a u lo
rep en tin a m en te faz u m a p au sa. T alv ez te n d o
a lc a n ç a d o “u m lu g a r d e r e p o u s o e m s e u s
p e n s a m e n t o s . . . e le s e le m b r e o n d e e s tá
e p o r q u e ” ( R o b in s o n , 7 4 ) . À m e d id a q u e
r e f le te s o b r e s u a p r e s e n t e c ir c u n s tâ n c ia
c o m o u m p r is io n e ir o d e C r is to , p o r a m o r
a o s g e n t i o s , d e l i b e r a d a m e n t e p a s s a a
d is c o r r e r s o b r e o m is té r io d o e v a n g e lh o
n o q u e d iz re s p e ito a e s s e p o v o . E m R o m a ,
P a u lo e r a u m p r is io n e ir o d o im p e r a d o r
r o m a n o N e r o , m a s fa la d e s i m e s m o c o m o
“p r is io n e ir o d e je s u s C r is to ”. R e c u s a c o n
s id e ra r-se u m a v ítim a d a in ju s tiça n a s m ã o s
d o s ju d e u s o u d o s r o m a n o s .
A cred ita n d o n a so b e ra n ia d e C risto so b re
s u a v id a , d e c la r a s e r u m “p r is io n e ir o d e
J e s u s C is to ” ( c f . 4 .1 ; 6 .2 0 ) “p o r v ó s , o s
g e n t io s ”. E s s a a f ir m a ç ã o d e m o n s tr a u m
fa to v e r d a d e ir o , c u ja s c ir c u n s tâ n c ia s h is
tó r ic a s e s tã o r e g is tr a d a s e m A to s 2 1 .1 7 —
2 2 .2 1 . O e n c o n tr o d e P a u lo c o m ju d e u s
h o s t is e m Je r u s a lé m , q u e q u a s e c u s to u -
lh e a v id a e r e s u lto u e m q u a tr o a n o s s u b
s e q ü e n te s d e p r is ã o e m C e s a r é ia e R o m a ,
“o r ig in o u -s e d ir e ta m e n te d e s e u m in is té rio
a o s g e n t io s ” ( B r u c e , 1 9 8 4 , 3 0 9 - 1 0 ) . P o r
ta n to , n o m e io d e u m a s e n t e n ç a , o c o r r e
a P au lo a n e ce ss id a d e d e ex p lica r u m a sp e cto
d o m is té r io d e D e u s , a n te s q u e s e u s l e i
to r e s g e n t io s e s t e ja m to ta lm e n te p r e p a
ra d o s p a r a d iz e r “a m é m ” à s u a o r a ç ã o a
f a v o r d e le s .
O s v e r s o s 2 -6 m o s tr a m a c h a m a d a d e
P a u lo , r e c e b id a d o p r ó p r io S e n h o r J e s u s
C risto , p a ra s e r v ir a o s g e n t io s (c f. A t 2 2 .1 4 ,
2 1 ; 2 6 .1 5 -1 8 ; G l 1 .1 5 ,1 6 ; 2 .7 -9 ) . E le c o m e ç a
le m b r a n d o s e u s le i to r e s d a “d is p e n s a ç â o
d a g r a ç a d e D e u s , q u e p a r a c o n v o s c o m e
fo i d a d a ” (3 .2 ) . A g ra ça a q u e P a u lo s e re fe re
a q u i n ã o é a “g r a ç a s a lv a d o r a ” ( c o m o e m
2 . 5 , 8 ) , p o r é m a m e n s a g e m d a r e v e la ç ã o
e o d iv in o e n c a r g o q u e e s ta v a m e n v o lv i
d o s e m s u a id a a o s g e n t io s (c f . 3 .7 ,8 ) . “A
g ra ç a im p lic a ‘e n tr e g a ’ e P a u lo re ssa lta e s s e
f a to r ” (W o o d , 4 5 ) n o s e n t id o d e q u e e s ta
lh e f o i c o n c e d i d a s o b a f o r m a d e u m
b e n e f í c io a o s g e n t io s .
A p a la v r a g r e g a p a r a “d is p e n s a ç â o ”
íoikonomia) s ig n if ic a , l i te r a lm e n te , “a d
m in is tr a d o r d a c a s a ”, o u c u r a d o r -c h e fe .
P a u lo e r a o a d m in is t r a d o r -c h e fe d a c a s a
d e D e u s d o p r im e ir o s é c u lo , p a r a s e r o
d is p e n s e ir o d a g r a ç a d e D e u s a o s g e n t i
o s (c f . 1 C o 9 -1 7 ; C l 1 .2 5 ) . E le fo i e n c a r r e
g a d o p o r C r is to d e le v a r o c o n h e c im e n to
d o e v a n g e lh o a o s g e n t io s , a s s im c o m o as
im p l ic a ç õ e s d a m e n s a g e m p a r a a in c lu
s ã o d o s g e n t io s n a Ig r e ja c o m o m e m b r o s
p le n o s d e s s e c o r p o b a s e a d o n a g r a ç a e
n ã o n a le i.
A a d m in is t r a ç ã o d a g r a ç a d e D e u s a o s
g e n t io s e n v o lv ia ta n to a s a b e d o r ia c o m o
a r e v e la ç ã o (v . 3 ) : sabedoria p a ra e d if ic a r
c o r r e ta m e n te a Ig r e ja d e D e u s (1 C o 3 -1 0 )
e r e v e l a ç ã o a r e s p e i t o d o “m i s t é r io ”
( mysterion) d o e v a n g e lh o ( 3 - 3 ,4 ,6 ,9 ; so b re
e s s a p a la v ra , v e ja o s c o m e n tá r io s e m 1 .9 ) .
P a u lo m e n c io n a c in c o c a r a c te r ís t ic a s r e
la c io n a d a s a o “m is té r io ”.
1226
EFÉSIO S 3
1) O m istério torn o u -se co n h e c id o “p ela re
v e la ç ã o ” (3 .3 ; cf. v. 5). Em outras p assa
gens, Paulo enfatiza o caráter rev elad or de
sua cham ada, d eleg ação e m ensagem (p or
ex e m p lo , 1 C o 15-8; G l 1 .1 2 ,1 5 ,1 6 ). N ão
co n ce b e u e sse p lan o rad ical d o e v a n g e
lh o p o r sua p rópria iniciativa, e n ão for
m ulou um a nova doutrina através d e sua
própria insp iração . P e lo co ntrário , o m is
tério lhe v eio d iretam ente d e D eu s. A lém
d isso, a ad m inistração da graça de D eu s
lhe foi dada a fim de que pudesse “demonstrar
a tod o s qu al se ja a d isp en sação do m isté
rio, qu e, d esd e o s sécu lo s, estev e ocu lto
em D eu s, que tudo crio u ” (3-9). Isto é, o
m istério n ão se torn ou a p en as co n h e c id o
a P au lo através da rev e lação ; tinha tam
b é m a responsabilidad e de tom á-lo co n h e
cid o aos outros.
2) P aulo identifica o n ú cleo d o m istério co m o
sen d o o “m istério de C risto” (3 .4 ) n o se n
tido d e q u e E le é a o m esm o tem p o a fo n te
e a essên cia (H en d rik sen , 153). O próp rio
Cristo é ch am ad o de “m istério d e D e u s”
(Cl 2 .2 ; cf. 1 .2 6 ,2 7 ) p o rq u e nE le “o D eu s
invisível fo i to ta lm en te rev e lad o ; ‘o m is
tério de C risto’ p o d e ser m elh or co m p re
en d id o co m o o m istério q u e co n siste em
C risto ... [e] q u e é d e sco b e rto n e le ” (B ru ce ,
1984, 3 1 3 ). O ev an g e lh o q u e P au lo p re
gava era “p ela rev e lação d e Je s u s C risto”
(G l 1 .1 2 ) — qu e os gen tios p od eriam ser
salvos p e la graça através da fé em Cristo,
sem que precisassem observar as ordenanças
da le i ju d aica (G l 2 .1 5 -2 1 ; 3 .1 0 -1 4 ,1 7 -2 5 ) .
Precisamente por ser, de acordo com o sentido
acim a, um ev an ge lh o in d ep en d en te da lei,
“Era aplicável tanto aos gentios com o
ao s ju d eu s (se n d o a le i u m a b arre ira
qu e an terio rm ente os havia m antido se
p arad o s). A in co rp o ra çã o d os g en tio s
(e m b a s e s ig u ais) ju n ta m en te co m os
ju d eu s ao n o v o p o v o d e D e u s ... e s ta
va im p líc ita n e sse e v a n g e lh o . E ssa in
c o rp o r a ç ã o re p re se n ta o a s p e c to d o
‘m istério cie Cristo’ qu e estava agora sendo
en fa tiz a d o ” (B ru c e , 1984 , 313 ).
3 ) O fa to de D eu s p re te n d e r q u e as b ê n ç ã o s
d e A b ra ã o e as p ro m e ssa s da sa lv a çã o
m e ssiâ n ica , a trav és da te o c r a c ia ju d a ica ,
in clu íssem o s g en tio s , não estavam an
terio rm en te o cu ltas (v . 5 ). E las foram c la
ra m en te rev e lad as n o s livros d o A ntigo
Testam ento da Lei, dos Profetas e dos Escritos
(p o r e x e m p lo , em G n 1 2 .1 -3 ; D t 3 2 .4 3 ; SI
18 .49 ; 117.1 ; Is 11 .10). O q u e estava ocu lto
nas antigas gerações e não havia sido previsto
n e m m e sm o p e lo s p ro fe ta s d o A n tig o
Testam ento era o seguinte: o p lano de Deus
p ara a re d e n ç ã o em C risto (o M essias)
en v olv ia a d estru ição da antiga linha de
dem arcação qu e separava judeus de gentios
(2 .1 4 ,1 5 ) . O a n tig o p a c to d as p ro m e ssa s
divinas, a teo cracia nac io n a l jud aica , devia
se r su b stitu íd o p o r um a n o v a ra ça e s p i
ritual (o s c r is tã o s ) , e p o r um a n o v a c o
m unidade internacional (a Igreja) nas quais,
e m C risto , ju d e u s e g e n tio s se r ia m a d
m itid o s em b a s e s igu ais, sem n e n h u m a
d is tin ç ã o .
E sse p lan o e tern o do Pai (1 .4 ) d e criar em
Cristo “dos d ois um n o v o h o m em ” (2 .1 5 ),
e de unir ju d eu s e gen tio s co m o “um co r
p o” (2 .16), anteriormente desconhecido “nou
tros sécu los” (3 .5 ), “esteve oculto em D eu s”
(3 -9 ) co m o o “m istério de C risto” (3 .4 ) . A
rev e la çã o d esse m istério foi confiad a por
C risto a P aulo , p ara q u e o fizesse c o n h e
cid o aos gentios.
4 ) A lém d isso , e sse era o m istério agora “re
velado pelo Espírito aos seus santos apóstolos
e p ro fe tas” (3 -5 ) co m o o a licerce so b re o
qu al a Igreja seria ed ificada (2 .2 0 -2 2 ).
5 ) No verso 6, Paulo continua a descrever esse
m istério, utilizando um a tríade d e palavras
co m p o stas, cad a um a d elas co m o prefi
x o g reg o syn (sig n ifican d o “em co n ju n to
c o m ”). O s g en tios n ão serão salvos atra
vés d e um a sa lv ação p ro jetad a e sp e c ia l
m ente para eles com o exilados (com o gentios
c o n v e rtid o s ao ju d a ísm o ). A ntes, se rã o
“herdeirosjuntamente com" os ju d eu s das
b ê n ç ã o s pro m etidas a A braão e seu s d es
c e n d e n te s — “h e rd e iro s d e D eu s e co -
h erd eiro s de C risto” (R m 8 .1 7 ).
O s g e n t io s e r a m t a m b é m “membros
em conjunto" c o m o s ju d e u s d o c o r p o
ú n ic o d e C risto . A p a la v ra g re g a (synsoma)
q u e fo i u s a d a n e s s e m o m e n t o n ã o o c o r
re n o s e s c r i to s c lá s s ic o s g r e g o s , a p e n a s
a q u i n o N o v o T e s t a m e n t o . E m o u t r a s
p a la v ra s , P a u lo c ria u m a n o v a p a la v ra p a ra
1227
EFÉSIO S 3
e n fa tiz a r q u e , c o m o p a rtic ip a n te s d o c o r p o
d e C r is to , o s g e n t io s tê m d ir e ito s ig u a is
a o s d o s ju d e u s .
F in a lm e n te , o s g e n t io s “participam em
conjunto” c o m o s ju d e u s d e to d o s o s p a c to s
h is tó r ic o s d a s p r o m e s s a s d iv in a s q u e f o
ra m c o n c e d id a s a Is r a e l e a g o r a r e a l iz a
d a s e m C r is to J e s u s . J u d e u s e g e n t io s
p a r t ic ip a m ig u a lm e n te d a v id a e d a s a l
v a ç ã o q u e e x is t e m e m C r is to , a tr a v é s d o
e v a n g e lh o (c f . G 1 3 .6 - 2 9 ) . C o m o P a u lo já
o b s e r v a r a a n te r io r m e n te , “N is to n ã o h á
ju d e u n e m g r e g o ; n ã o h á s e r v o n e m li
v r e ; n ã o h á m a c h o n e m fê m e a ; p o r q u e
t o d o s v ó s s o is u m e m C r is to J e s u s . E , s e
s o is d e C r is to , e n tã o , s o is d e s c e n d ê n c ia
d e A b r a ã o e h e r d e ir o s c o n f o r m e a p r o
m e s s a " (G1 3 .2 8 ,2 9 ) .
P a u lo d e c la r a q u e fo i c h a m a d o p a ra se r
u m s e r v o d e s s e “e v a n g e lh o ” (3 -6 ,7 ) e d esta
“g r a ç a ” ( 3 .8 ) . Q u a n d o P a u lo fa la d e s s e
“e v a n g e lh o ” e s tá s e r e fe r in d o à r e v e la ç ã o
d e J e s u s C r is to e ta m b é m a tu d o a q u i lo
q u e fo i e n c a r r e g a d o d e a n u n c ia r e m C risto ;
“e s ta g r a ç a ” r e p r e s e n ta s u a m is s ã o e s p e
c íf ic a d e to r n a r c o n h e c id a s “a s r iq u e z a s
in co m p reen sív eis d e Cristo” (3 .8 ) a o s gentios.
P a u lo c o n t in u a a e x p l ic a r q u e s e to r
n o u u m s e r v o ( diakonos) o u u m “m in is
t r o ” (N A S B , N K JV ) d e s s e e v a n g e lh o “p e lo
d o m d a g r a ç a d e D e u s , q u e m e fo i d a d o
s e g u n d o a o p e r a ç ã o d o s e u p o d e r ” (3 -7 ) .
P a u lo n ã o d e c id iu s e r u m m in is t r o d o
e v a n g e lh o s e g u n d o u m a s im p le s e s c o lh a
v o c a c io n a l . A v o c a ç ã o q u e e s c o lh e r a e r a
s e r u m r a b in o ju d e u . D e u s , a o c o n tr á r io ,
to m o u a in ic ia t iv a , s u r p r e e n d e n d o P a u
lo n a e s tr a d a d e D a m a s c o , e s c o lh e n d o - o
p a r a r e c e b e r a r e v e la ç ã o d e s e u F i lh o e
c o n v o c a n d o - o p a ra o s e r v iç o c o m o u m
a p ó s t o lo d o s g e n t io s — tu d o is s o c o m o
u m a d á d iv a d a g r a ç a .
O s u b s e q ü e n t e m in is t é r io d e P a u lo
ta m b é m n ã o fo i s im p le s m e n t e o u s o e f i
c i e n t e d e s u a s h a b i l id a d e s n a tu r a is . A n
te s , fo i o re s u lta d o d ire to d o p o d e r d e D e u s
tra b a lh a n d o a trav és d ele . A s p alav ras u sad as
a q u i p a ra “t r a b a lh a n d o ” ( energeia) e “p o
d e r ” ( dynamis) s ã o ig u a is à q u e la s u s a
d a s e m 1 .1 9 ,2 0 p a r a d e s c r e v e r o p o d e r
d e D e u s d e r e s s u s c i ta r a C r is to d o s m o r
to s . “E fo i e x a t a m e n t e a s s im : e s s e p o d e r
de r e s s u s c ita r , o p e r a n d o e m P a u lo , p e r
m it iu - lh e f a z e r c o m q u e o b o n d o s o p r o
p ó s i to d e D e u s f r u t i f ic a s s e e n tr e o s g e n
t io s ” ( B r u c e , 1 9 6 1 , 6 3 ) .
A f im d e n ã o s e c o n s id e r a r d e m a s i
a d a m e n te im p o r ta n te , p o r t e r s id o c o n
v o c a d o c o m o u m in s tr u m e n to s o b e r a n a
m e n t e e s c o lh id o , c o n f e s s a s in c e r a m e n
te : “A m im o mínimo [o m enor dos me
nores] d e to d o s o s s a n to s ” (3 -8 ) . O a p ó s to lo
cria u m a e x p r e s s ã o e s p e c ia l p a ra d e sc re v e r
a r e a l id a d e d e s u a s i t u a ç ã o . E s s e d im i-
n u tiv o d u p lo n ã o é u m a a f ir m a ç ã o d e e x a
g e r a d a h u m ild a d e . E x p r e s s a s u a p e r f e i
ta c o n s c iê n c i a d e q u e , c o m o u m a n t ig o
in im ig o d e C r is to e v io le n to p e r s e g u id o r
d a I g r e ja , e r a o m a is in d ig n o d e t o d o s
o s m in is tro s d o e v a n g e lh o (c f. 1 C o 1 5 .9 ,1 0 ;
1 T m 1 .1 2 - 1 7 ) .
N o e n ta n to , d e v e m o s n o s le m b r a r d e
q u e , n o in íc io d e s s a c a r ta ( 1 .1 ) , P a u lo fa la
d e s u a a u to r id a d e c o m o a d e u m a p ó s t o
lo — p o r c a u s a d a m a r a v ilh o s a g r a ç a d e
D e u s , d e s u a p r ó p r ia e s c o lh a e c o m is s io
n a m e n to e d o p o d e r in c o m p a r a v e lm e n
te g r a n d e d e D e u s o p e r a n d o n e le p a ra
“a n u n c ia r e n tr e o s g e n t io s ” ( 3 8 ) . A p a la
v ra “a n u n c ia r ” o u “p r e g a r ” ( euangelizo)
s ig n if ic a “a n u n c ia r a s b o a s n o v a s ”, a s b o a s
n o v a s d a s “r iq u e z a s in c o m p r e e n s ív e is d e
C r is to ” ( 3 .8 ) . P a u lo já h a v ia d e s c r i to a l
g u m a s d e s s a s r iq u e z a s n o s d o is p r im e i
ro s c a p ítu lo s d e E fé s io s .
A p a la v r a “in c o m p r e e n s ív e l” o u “in e s -
c r u tá v e l” ( anexichniastos) s ig n if ic a , l ite
r a lm e n te , “im p o s s ív e l d e s e r d e s c o b e r
t o ” . N a v e r s ã o d a S e p tu a g in ta , n o liv ro
d e J ó , e s s a p a la v r a é u s a d a e m c o n e x ã o
c o m a c r ia ç ã o d e D e u s e o s p ro c e d im e n to s
d a p r o v id ê n c ia , a s s u n to s q u e e s t ã o a lé m
d e n o s s a lim itad a c o m p r e e n s ã o . P a u lo u so u
e s s a p a la v r a e m R o m a n o s 1 1 .3 3 q u a n d o
s e r e fe r iu a o s p r o c e d im e n to s d e D e u s e m
r e la ç ã o a o s ju d e u s e a o s g e n t io s n a h is
tó r ia d a s a lv a ç ã o . O s t r a d u to r e s t ê m s e
e m p e n h a d o p a r a e n c o n tr a r u m e q u iv a
le n te e m in g lê s p a ra e s s a p a la v ra d e in e x
p r im ív e l a b u n d â n c ia . In c lu íd a s n o c o m is
s io n a m e n t o d e P a u lo , p a r a p r e g a r a o s
g e n tio s , e s tã o a s “in c o m p r e e n s ív e is ” (N IV ,
N K JV ), “im p e n e t r á v e is ” (N A S B ), “i lim i
ta d a s” (N R SV ), “in ca lcu lá v e is” (J. B . Phillip s),
1228
EFÉSIO S 3
“in s o n d á v e is ” (N T e n f á t i c o ) e “in f in i ta s ”
( B íb l ia d e je r u s a l é m ) r iq u e z a s d e C r is to ,
e a re sp o n sa b ilid a d e d e “d e m o n stra ra to d o s
q u a l s e ja a d is p e n s a ç ã o d o m is té r io ” (3 .9 ) .
P a u lo e s c r e v e o s c a p ítu lo s 1 a 3 d a C a r ta
a o s E fé s io s t e n d o , e m p a r te , e s s e m e s
m o p r o p ó s i to n a m e n t e e n o c o r a ç ã o .
4.4.2. Algrejacomoumlnstrumento
Coletivo (3.10-13). A re v e la ç ã o d e P a u lo
s o b r e o “m is té r io ” d o e v a n g e lh o , ta l c o m o
fo i fe ita e m E fé s io s , c o n t in u a a s e e x p a n
d ir : c o m e ç a n d o n a e te r n id a d e , o n d e fo i
c o n c e b id o n o c o r a ç ã o d o P a i ( 1 .4 ; 3 -1 1 ) ,
s e g u e -s e a e n c a r n a ç ã o d e C r is to , c o m o
b a s e p a ra su a r e a liz a ç ã o h is tó rica (1 .7 ; 3 .1 1 ;
c f . J o 1 .1 4 ) , a c o m u n ic a ç ã o d a r e v e la ç ã o
a P a u lo e o u tro s a p ó s to lo s e p ro fe ta s c o m o
in s tr u m e n to s h u m a n o s d e e n te n d im e n
to e d iv u lg a ç ã o ( 3 - 3 ,5 ) , a d e m o n s t r a ç ã o
p ú b l ic a d o m is té r io e m u m a n o v a h u m a
n id a d e r e d im id a ( 2 .1 - 1 0 ) a u m a n o v a e
a b r a n g e n te c o m u n id a d e d e re d im id o s (a
I g r e ja ) c o m o a fa m ília d e D e u s e o c o r p o
d e C r is to s o b r e a te rra ( 2 .1 1 - 2 2 ; 3 -6 ).
F m 3 .1 0 , P a u lo d á m ais u m p a ss o à fren te.
D e u s p r e te n d e “a g o r a , p e la ig r e ja ” q u e “a
m u ltiform e sab ed o ria d e D e u s se ja co n h e c id a
d o s p r in c ip a d o s e p o te s ta d e s n o s c é u s ”.
“A g ora” in d ica u m a n o v a p len itu d e d e te m p o
e cie p ro p ó s ito n o p la n o d e D e u s (W estco tt,
4 8 ) . “M u lt i fo r m e ” s ig n if ic a m u lt ic o lo r id a
o u m u ltiv a r ia d a . E s s a p a la v ra e r a u s a d a
p a r a d e s c r e v e r a v a r ie d a d e d e c o r e s n a s
f lo re s , n o s b o rd a d o s d o s te c id o s e n a s b e la s
ta p e ç a r ia s . A “m u lt i fo r m e s a b e d o r ia ” d e
D e u s e s tá e x p o s ta n a c r ia ç ã o , e m s e u F i
lh o c o m o e n c a r n a ç ã o d e s s a s a b e d o r ia , e
a g o r a ta m b é m n a Ig r e ja . C e r ta m e n te , a
m u ltiform e sa b ed o ria d e D e u s é re c o n h e c id a
n a s c o is a s c r ia d a s s e n d o p e r s o n if ic a d a e m
C r is to c o m o a lg o “m u ito e s p le n d o r o s o ,
ir id escen te , q u e co n tin u a m e n te se d esd o b ra
e m b e le z a s ” (W o o d , 4 8 ) .
M as , e a r e s p e i to d a Ig re ja ? C e r ta m e n
te q u e , d e n tro d o p ro p ó s ito e te rn o d e D e u s,
a Ig r e ja n ã o fo i c o n c e b id a c o m o s e n d o
u m a o r g a n iz a ç ã o h o m o g ê n e a e m o n ó to n a ,
o u m e s m o u m c o n g lo m e r a d o d e in s titu i
ç õ e s e c le s iá s t ic a s fra g m e n ta d a s . P e lo c o n
trá r io , o “c o r p o ú n i c o ” d e C r is to , s e n d o a
e x p o s iç ã o d a “m u lt ifo r m e s a b e d o r ia d e
D e u s ”, te m o p r o p ó s ito d e p a r e c e r -s e c o m
u m a lin d a ta p e ç a r ia e m s u a d iv e r s id a d e
( c o m m ú ltip la s e tn ia s e c u ltu r a s ) e e m su a
h a r m o n ia (u m s ó c o r p o e u m s ó E s p ír i
to .. . u m s ó S e n h o r , u m a s ó fé , u m s ó b a
t is m o ; u m s ó D e u s e P a i d e t o d o s ; c f . 4 .4 -
6 ) . N ã o e x is te n e n h u m a o u tra c o m u n id a d e
n o m u n d o q u e p o s s a s e ig u a la r à v e r d a
d e ir a Ig r e ja d e je s u s C ris to .
D a m e s m a fo r m a q u e P a u lo s e t r a n s
fo r m o u n o in s tr u m e n to c o n d u to r d a r e
v e la ç ã o a o s g e n t io s , n o q u e s e r e f e r e à
“m u ltifo rm e sa b e d o ria d e D e u s ” (3 -8 ), assim
ta m b é m a Ig r e ja s e r á u m c o n d u to r d a r e
v e la ç ã o n o s re in o s ce lestia is n o q u e s e re fere
à “m u lt ifo r m e s a b e d o r ia cie D e u s ” ( 3 .1 0 ) .
A r e v e la ç ã o a o s p r in c ip a d o s e p o te s ta d e s
c e le s t ia is n ã o r e p r e s e n ta u m a p r o c la m a
ç ã o r e d e n to r a d a g r aç a d e D e u s e m C ris
to , m a s u m a e x p o s iç ã o r e d e n to r a d a s a
b e d o r ia d e D e u s a tra v é s d a Ig re ja .
M as q u e m s ã o e s te s p r in c ip a d o s e p o te s
ta d es? A lg u n s s u g e r e m q u e “r e p r e s e n ta m ”
e stru tu ra s p o lít ic a s , s o c ia is , e c o n ô m ic a s ,
religiosas e culturais q u e D eu s esp era m odificar
n o m u n d o a tra v é s d a Ig re ja (Caird., 6 6 -6 7 ;
B a r th , 1 .3 6 5 ) . E n tr e ta n to , a m a io r ia d o s
e s tu d io s o s e v a n g é lic o s e p e n te c o s ta is c o n
c o rd a q u e a e x p r e s s ã o s e r e fe re “a o s r e i
n o s c e le s t ia is ”. O s te r m o s p r in c ip a d o s e
p o testad es p o d e m estar se referin d o a o s an jo s
b o n s (c f . C l 1 .1 6) q u e a n s e ia m p o r c o n h e
c e r a s a b e d o r ia d e D e u s n a r e d e n ç ã o (1 P e
1 .1 2 ) . O u p o d e s e r e fe r ir a g o v e r n a n te s
d e m o n ía c o s (c f . E f 6 .1 2 -1 8 ; c f. D n 9 .2 -2 3 ;
1 0 .1 2 ,1 3 ; 2 C o 1 0 .4 ,5 ) , q u e h á m u ito te m
p o s e o p õ e m a o “e te m o p ro p ó s ito ” d e D e u s
e m C ris to ( E f 3 -1 1 ). O u , c o m o p a r e c e s e r
m ais p ro v áv el, p o d e a b ra n g e r tan to o s a n jo s
d e D e u s c o m o a s fo rç a s d e S a ta n á s , q u e
te s te m u n h a m c o m o e s p e c ta d o r e s a d e fe
sa d a s a b e d o r ia d e D e u s , ta l c o m o fo i d e
m o n stra d a n a cru z (1 C o 1 .2 3 ,2 4 ,3 0 ; C l 2 .1 5 )
e m a n ife s ta d a a tra v é s d a Ig re ja .
N a e f e t iv a ç ã o e x t e r io r d o e te r n o p r o
p ó s i to d e D e u s e m C r is to , a Ig r e ja o c u p a
u m lu g a r c e n tr a l p o r c a u s a d e s u a u n iã o
c o m C r is to , q u e é a c a b e ç a . A u n iã o d e
ju d e u s e g e n t io s r e d im id o s , q u e p a s s a m
a c o n s t i tu ir u m ú n ic o p o v o , e m u m ú n i
c o c o r p o , fo r m a u m a p a r te in te g ra l e u m a
q u e s tã o c e n tr a l n o e te r n o p r o p ó s i to d e
D e u s . N a ú lt im a o r a ç ã o d e je s u s a n te s d a
1229
EFÉSIO S 3
c ru c ific a ç ã o ( Jo 1 7 ), E le p e d e p a ra q u e se u s
d is c íp u lo s e a Ig r e ja “s e ja m p e r fe i to s e m
u n id a d e ” ( 1 7 .2 3 ) , n o a m o r , c o m o t e s t e
m u n h a o c u la r d o a m o r e d a u n id a d e q u e
e x is te m e n tr e o P a i e o F i lh o ( 1 7 .2 0 - 2 6 ) .
A fim d e q u e is s o s e t o m e u m a r e a lid a
d e , o p o v o d e D e u s , e m u n iã o c o m C risto ,
d e v e s e r c a p a z d e s e a p ro x im a r d o P a i “e m
u m m e s m o E s p ír ito ” ( E f 2 .1 8 ) c o m “o u s a
d ia e a c e s s o c o m c o n fia n ç a ” (3 -1 2 ). E m Cristo
n ã o m a is e x is te a “p a r e d e d e s e p a r a ç ã o ”
( 2 .1 4 ) q u e , s o b o a n t ig o p a c to , m a n tin h a
o s g e n t io s d is ta n te s d e D e u s e o s s e p a r a
v a d o s ju d e u s . T a m b é m n ã o m a is e x is te o
v é u q u e m a n tin h a o s a d o r a d o r e s s e p a r a
d o s d a p re se n ç a d e D e u s n o Lugar Santíssim o.
A “c o n f ia n ç a ” o u a “l ib e r d a d e ” à q u a l P a u lo
s e r e fe r e e m 3 -1 2 é a m e s m a q u e a p a r e c e
e m H e b r e u s q u a n d o o s c r e n te s s ã o e n c o
r a ja d o s a c h e g a r “c o m c o n f ia n ç a a o t r o n o
d a g r a ç a ” (H b 4 .1 6 ) e “o u s a d ia p a ra e n tra r
n o San tu ário , p e lo sa n g u e d e je s u s ” (1 0 .1 9 ).
P a u lo c o n c lu i e s s a s e ç ã o ( in ic ia d a e m
3 .2 ) r e f e r i n d o - s e n o v a m e n t e a o s s e u s
s o fr im e n to s p e lo s g e n t io s (v . 1 3 ; c f. v . 1 ).
D e s s a v e z , n o e n ta n to , o s e x o r ta a n ã o se
s e n t ir e m d e s e n c o r a ja d o s p e la s u a p r is ã o ;
c o m o s e u d e fe n s o r , e in c lu i o s te m a s d o s
“s o f r im e n to s ” e d a “g ló r ia ” ( p r e v a le c e n -
t e s e m to d o o N o v o T e s ta m e n to ) .
A p e r s p e c t i v a d e P a u lo s o b r e s e u s
s o f r im e n to s e s tá c la r a m e n t e m a n i fe s t a
d a e m u m a p a s s a g e m s e m e l h a n t e e m
C o lo s s e n s e s .
R ego zijo -m e, agora, n o q u e p a d eço
por vós [gentios] e na minha carne cumpro
o resto das a fliçõ es de Cristo, p e lo seu
co rp o , q u e é a igreja; da qu al eu estou
fe ito m in istro [servo] se g u n d o a dis-
p e n sa çã o d e D eu s, qu e m e fo i c o n c e
dida para convosco, para cumprir a palavra
d e D eu s (Cl 1.24,25).
P a u lo s a b ia q u e s e u s s o fr im e n to s p o r
C r is to e s ta v a m a c u m u la n d o p a r a e le “u m
p e s o e t e r n o d e g ló r ia ” (2 C o 4 .1 7 ) , e e s
tav am , ig u a lm e n te , p re p a ra n d o -o p a ra p a r
tic ip ar d a g lória d e C risto (R m 8 .1 7 ) . T a m b é m
s a b ia q u e e s s a g ló r ia “s e r ia ta m b é m p a r
tilhada c o m a q u eles e m cu jo n o m e a p re sen te
a f l iç ã o e r a s u p o r ta d a ” ( B r u c e , 1 9 8 4 ,3 2 3 ) .
5. A Oração Apostólica pelo
Esclarecimento Espiritual dos
Crentes (3 .1 4 -2 1 )
N o c a p ítu lo 1 , o in s p ir a d o h in o d e P a u
lo , e m lo u v o r a o g lo r io s o p la n o d e D e u s
d a r e d e n ç ã o e m C r is to ( 1 .3 - 1 4 ) , é a c o m
p a n h a d o p o r u m a a rd e n te in te rc e s sã o p e lo s
s a n to s p a r a q u e c o n h e ç a m m e lh o r a s e u
D e u s , p o r m e io d a e x p e r iê n c ia e d a c o m
p r e e n s ã o d a r e v e la ç ã o ( 1 .1 7 - 2 3 ) . N o s
c a p ítu lo s 2— 3 , a in s p ir a d a e x p o s iç ã o d e
P a u lo a re s p e ito d a g ra ç a p o d e ro s a d e D e u s
n a r e d e n ç ã o d e c a d a u m d o s p e c a d o r e s
(2 .1 -1 0 ) e d a c o m u n id a d e d o c o rp o d e Cristo
( 2 .1 1 — 3 .1 3 ) e s tá a c o m p a n h a d a d e u m a
fe r v o r o s a in te r c e s s ã o p e la p le n i tu d e e s
p ir itu a l d e tu d o q u e D e u s p la n e jo u p a r a
se u p o v o . E m r e la ç ã o a e s s e m o d e lo , o n d e
a re v e la çã o é a co m p a n h a d a p e la in tercessão ,
J o h n Sto tt (1 3 2 ) ob se rv a : “A ssim c o m o Je s u s
m o lh o u c o m s u a o r a ç ã o a s s e m e n te s d o s
e n s i n a m e n t o s q u e h a v ia p l a n t a d o n o
c e n á c u lo 0 o 13— 1 7 ), P a u lo ta m b é m a c o m
p a n h a s e u s e n s in a m e n to s c o m u m a o r a
ç ã o f e r v o r o s a . . .”
5.1. A Fervorosa Súplica de
Paulo (3-14-19)
A o r a ç ã o d e P a u lo in ic ia c o m a f r a s e
“P o r c a u s a d is s o ” (3 -1 4 ) , q u e a p a r e c e p e la
p r im e ir a v e z e m 3 .1 , e q u e v o lta a m e n c i
o n a r a re v e la ç ã o d a m is e r ic ó rd ia e d a g ra ç a
d e D e u s in c lu in d o o s g e n t io s , e m b a s e s
ig u a is , e a t r a v é s d a fé e m C r is to , e m s e u
c o r p o ú n ic o ( 2 .1 3 - 2 2 ; 3 .2 - 1 3 ) . D e s s a fo r
m a , v o lta a u m a o r a ç ã o q u e h a v ia q u a s e
in ic ia d o , p o r é m p o s te r g a d o e m 3-1 .
A f r a s e “m e p o n h o d e jo e l h o s ” ( 3 - 1 4 )
s ig n if ic a , l i t e r a lm e n te , “d o b r o m e u s jo
e l h o s ” . A p o s tu r a n o r m a l d o s ju d e u s a o
o r a r e r a e m p é c o m o s b r a ç o s e s t e n d i
d o s e m d i r e ç ã o a o c é u ( c f . M t 6 .5 ; L c
1 8.1 1 ,1 8 ) . O f a to d e P a u lo d o b r a r o s jo
e l h o s , s e m d e ix á - l o s n e m m e s m o e m
p o s iç ã o e r e t a e r a , p e lo c o n t r á r io , u m a
p o s i ç ã o d e p r o s t r a ç ã o , c o m a c a b e ç a
t o c a n d o o s o lo ( d e m o n s t r a n d o “h u m il
d a d e ”, “s o le n id a d e ” e “a d o r a ç ã o ” [H e n -
d r ik s e n , 1 6 6 ] ) . B a r c la y ( 1 5 0 ) c o m p le t a :
“A o r a ç ã o d e P a u lo p e la I g r e ja é t ã o in
1230
EFÉSIO S 3
t e n s a q u e e le s e p r o s t r a p e r a n te D e u s n a
a g o n ia d e u m a s ú p l ic a ”.
A fr a s e “P e r a n te o P a i” r e p r e s e n ta u m
a ce s so fren te a fren te c o m E le , q u e foi to m a d o
p o s s ív e l p o r c a u s a d o s a n g u e r e d e n to r d e
C r is to e p e lo E s p ír ito S a n to ( 2 .1 8 ; 3 .1 2 ) .
E m b o ra P a u lo s e a p r o x im e d e D e u s c o m o
s e n d o s e u “P a i” is s o n ã o tra d u z s o m e n te
u m a in tim id ad e fam iliar, m a s ta m b é m h o n ra ,
r e s p e i to e r e v e r ê n c ia . C o m o M a x T u r n e r
n o s le m b r a ( 1 2 3 5 ) “n o o r ie n te o p a i é o
d ir ig e n te d a fa m ília , a q u e le p a r a o q u a l
t o d a s a s q u e s t õ e s d e im p o r t â n c ia s ã o
c o m u n ic a d a s , e a q u e m o s f i lh o s ( in d e
p e n d e n te d e s u a id a d e ) d e v e m s u b m e
te r -s e e m o b e d i ê n c i a ”.
E sse se n tid o d o p a p e l p a triarca l d e D e u s
e s tá a c e n tu a d o p e la fr a s e s e g u in te : “d o
q u a l to d a a fa m ília [pasapatria] n o s c é u s
e n a te rra to m a o n o m e ”. E x is te m trê s tr a
d u ç õ e s p o ss ív e is d a fra se pasapatria: “ca d a
fa m íl ia ” (R S V , N E B , N A S B , N R S V ), “to d a
a f a m íl ia ” (K JV , N K JV , N IV ) o u “to d a a
p a te rn id a d e ” (JBP, N IV m arg em , F. F. B ru ce ).
A p rim eira v e rs ã o p o d e s e r e n te n d id a c o m o
s e r e fe r in d o à fa m ília d o s a n jo s c e le s t e s
e à s fa m íl ia s re d im id a s d a te r r a ( ta n to d e
ju d e u s c o m o d e g e n t io s ) q u e c o n s t i tu e m
a fa m ília ú n ic a d e D e u s . A s e g u n d a v e r
s ã o m a n té m a ê n fa s e d e P a u lo , p r e s e n te
e m to d o o livro d e E fésio s, so b re o s red im idos
c o m o u m a ú n ic a fa m ília e s o b r e a u n id a
d e d o s c r e n te s c o m o u m a n o v a h u m a n i
d a d e e u m ú n ic o c o r p o d e C risto . D e a c o rd o
c o m e s s a o p in iã o a s p a la v r a s “n o s c é u s e
n a te r r a ” s e r e f e r e m à Ig r e ja tr iu n fa n te n o
c é u e à Ig r e ja m il i ta n te n a te rra . A t e r c e i
ra v e rs ã o en fa tiz a u m jo g o d e palav ras e n tre
pater ( “P a i”, 3 -1 4 ) apatria ( “p a te r n id a d e ”,
3 .1 5 ) . B r u c e ( 1 9 6 1 , 6 7 ) d e fe n d e e s s a ú lt i
m a v is ã o t r a d u z in d o e in te r p r e ta n d o a s
p a la v r a s d e P a u lo cia s e g u in te m a n e ir a :
“M e p o n h o de jo e lh o s p eran te o Pai
d e n o sso Se n h o r Je s u s Cristo, d o qual
toda a fam ília n o s céu s e na terra tom a
o n o m e ”. Isto q u er dizer, tod as as e sp é
c ies de p atern id ad e n o un iverso se d e
rivam d o a rq u étip o orig inal da Paterni
d ade d e D eu s, p o is E le é o Ú n ico Pai
q u e n ão d e scen d e de n enh u m outro. E
quanto mais qualquer paternidade, natural
ou esp iritual, se ap ro x im ar em caráter
da p erfeita P atern id ad e d e D eu s, m ais
se m anifestará a v erd ad eira p atern id a
de q u e está d e aco rd o co m a v o n tad e e
p ro p ósito d e D eus.
A o r a ç ã o d e P a u lo q u e s e s e g u e é c o m
p o s ta p o r trê s g r a n d e s s ú p lic a s ( 3 .1 6 ,1 7 a ;
3 .1 7 b -1 9 a ; 3 -1 9 b ) . C a d a s ú p lic a in c lu i u m a
c lá u s u la g r e g a d e p r o p ó s i to , hina, c u ja
t r a d u ç ã o l ite r a l é “a f im d e q u e ” ( 3 .1 6 ,1 8 ,
1 9 b ) . E s s a c lá u s u la hina a c e n tu a m a is
d is t in ta m e n te a s trê s q u e s t õ e s e m g r e g o ,
d o q u e e m in g lê s o u p o r tu g u ê s :
1) A prim eira sú p lica (3 .1 6 ,1 7 a ) está dirigida
a um p ed id o co m um sen tid o d up lo e cu ja
d u p licid ade p o d e ser a riqu eza a bu n d an
te da glória d e D eu s (N A SB, NKJV, NRSV)
ou talvez a ab u n d ân cia da g lorio sa riq u e
za d e D eu s (N IV). C o m o D eu s é e tern o e
infinito , assim tam b ém é a m edida d e sua
generosidade ao responder às orações. Paulo
p ed e (a) a presença poderosa e capacitadora
d e D eu s a trav és d o E sp ír ito San to para
“fo rta lecer” (a m esm a palavra em 1 .1 9 ) os
cren tes em seu “h o m em in terior” (3 .1 6 ), e
(b ) p ela p re sen ça in terior de Cristo para
que, pela fé, habite no “co ração” dos crentes
(3 .1 7 a ).
P a ra in té rp re te s q u e tê m u m a d ic o to m ia
d e e n te n d im e n to s o b r e a p e r s o n a l id a d e
h u m a n a ( in te r io r e e x t e r io r ) , o “h o m e m
in te r io r ” e o “c o r a ç ã o ” s ã o m e tá fo r a s s i
n ô n im a s d o ú n ic o “v e r d a d e ir o e p e r m a
n e n te s e r ” ( B r u c e , 1 9 6 1 ,6 7 ) , q u e p o d e s e r
d ia r ia m e n te r e n o v a d o , m e s m o q u a n d o a
p e rso n a lid a d e e x te r io r e s tá se c o n s u m in d o
(2 C o 4 .1 6 ) . D a m e s m a fo r m a , o E s p ír ito
S a n to e o E s p ír ito d e C r is to s ã o c o n s id e
r a d o s c o m o te r m o s in te r c a m b iá v e is ( c f .
R m 8 .9 -1 1 ). “O fa to d e te m io s Cristo m o ra n d o
e m n ó s o u d e t e r m o s o E s p ír i to S a n to
m o ra n d o e m n ó s , rep re se n ta a m e sm a co isa .
N a v e rd a d e , é p r e c is a m e n te p e la p r e s e n ç a
d o E sp írito S a n to q u e C risto re s id e e m n o s s o
c o r a ç ã o ” (S to tt , 1 3 5 ) .
A q u e le s q u e v ê e m a p e r s o n a l id a d e
h u m a n a c o m o u m a tr ic o to m ia ( e s p ír ito ,
a lm a e c o r p o ; c f . 1 T s 5 .2 3 ; H b 4 .1 2 ) c o n
s id e ra m a s in te n ç õ e s d e P a u lo c o m o se n d o
a s m a is c la r a m e n te d e fin id a s . E le o r a p a ra
q u e o s c r e n te s s e ja m fo r ta le c id o s e r e n o -
1231
EFÉSIO S 3
v a c lo s p e lo E s p ír ito e m s e u “h o m e m in
te rio r” (e sp ír ito h u m a n o ) a fim d e q u e C risto
p o s s a r e s id ir c o m o S e n h o r e m s e u s c o r a
ç õ e s ( is to é , “a lm a ”, q u e in c lu i a m e n te
o u o p e n s a m e n to , a s e m o ç õ e s e a v o n ta
d e ) a t r a v é s d a fé . D e a c o r d o c o m e s s a
in terp retação , Cristo h ab ita a tiv am en te c o m o
S e n h o r d o c o r a ç ã o o u d a s e d e d a p e r s o
nalid ad e d o cre n te e d e su a ativ id ade volitiva,
à m e d id a q u e s o m o s f o r t a le c id o s p e lo
p o d e r o s o E s p ír ito d e D e u s n o m a is ín ti
m o d e n o s s o ser. O te m p o a o r is to d o v e r b o
“r e s id ir ” ( 3 . 1 7 a ) tra z c o n s ig o o s e n t id o d e
“e s t a b e l e c e r s u a p e r m a n ê n c i a ” o u d e
“e s ta b e le c e r su a r e s id ê n c ia ” c o m o S e n h o r
“a tra v é s d e [u m a vid a] d e f é ”. B r u c e a c r e s
c e n ta q u e “o a to in ic ia l d a fé , p e lo q u a l o
c r e n te s e u n e a C r is to , é s e g u id o p o r u m a
v id a d e fé d u r a n te a qu a l e s ta u n iã o s e r á
m a n t id a ” ( 1 9 8 4 , 3 2 7 ) . H . C . G . M o u le s e
a lo n g a n a s im p lic a ç õ e s :
A p alav ra q u e [Paulo] e sc o lh e u
(katoikein) é um a palavra com posta para
exp ressam en te d en otar resid ência , em
contraste a um sim ples a lo jam ento, isto
é , a resid ência d e um sen h o r dentro de
sua p rópria casa, e não a co n d içã o de
sim ples p ernoite de um viajante tem p o
rário qu e terá partido n o dia segu inte...
Ela é a residência permanente de seu Mestre
e Senhor, no co ração , q u e d eve reinar
on d e reside; q u e entra n ão ap en as para
alegrar e confortar, m as p ara reinar so
bre todas as coisas (Citado p or Stott, 136).
N o v a m e n te d e v e m o s o b s e r v a r a t r in
d a d e n o c o n te ú d o d o p e n s a m e n to d e P a u lo
e m 3 - l4 - 1 7 a . E le o r a a o Pai ( v .1 4 ) p a ra
q u e fo r ta le ç a o s c r e n t e s a tr a v é s d o Espí
rito, p a r a q u e Cristo p o s s a m o r a r e m s e u s
c o r a ç õ e s c o m o S e n h o r .
2) A segunda m aior súplica (3 .17b-19a) é para
q u e o s cren tes se jam cap acitad o s a abra
çar o am or de Cristo. Crentes em cujo coração
C risto resid a c o m o Senh or, e q u e se jam
“arraigad os e fun dad os em am o r” (3 .1 7 b ).
“Estar anaigado” no am or é com o um a árvore
ou p lanta cu jas raízes se ap ro fu nd am n o
so lo ; “estar fu n d ad o ” so b re o am or se as
sem elh a a um ed ifício co m p o d ero so s ali
ce rce s e sta b e lec id o s so b re só lid as rochas,
Segu nd o Stott (1 3 6 ), am bas as m etáforas
“enfatizam a pro fun d id ad e em o p o siçã o
à su p erfic ia lid ad e”. D en otam um re la c io
nam ento crescen te e seguro co m Cristo que
frutificará e será p erm an en te . A lém disso,
as d uas m etáforas são p articíp io s d o tem
p o perfeito grego e, portanto, d enotam um
re la c io n a m e n to e sta b e le c id o co m Cristo
— n ã o no sen tid o está tico , m as, p e lo c o n
trário, envolvendo o crescim ento nEle. Dessa
form a, as m etáforas transm item u m re la
c io n a m en to só lid o , a q u e le q u e cre sce em
frutos e vida.
T e n d o p e d id o a o P a i a p r e s e n ç a p o d e
ro sa d o E sp írito a fim d e fo rta le ce r o s c re n te s
p a ra q u e C ris to p o s s a h a b ita r n e le s c o m o
S e n h o r d e su a s v id a s , e t e n d o o b s e r v a d o
as r a íz e s e o s a l ic e r c e s n o a m o r d e D e u s ,
P a u lo a g o r a p a s s a a o r a r p a r a q u e o E s p í
rito c o n c e d a a o s se u s le ito re s g e n tio s “c o m
to d o s o s s a n to s ” ( e m h a r m o n ia c o m s e u
te m a d a u n id a d e ) a p o s s e d a r e v e la ç ã o d o
a m o r d e Cristo, q u e p o d e se r v isto e m q u a tro
d im en sõ es : “P o ssu ir” significa “m a n ter c o m o
p r o p r ie d a d e s u a ” s u a re a lid a d e a tra v é s d o
c o n h e c im e n to p e s s o a l . “P o s s u ir e s s a r e
v e la ç ã o e m s u a to ta lid a d e n ã o é u m a r e a
liz a ç ã o m o m e n tâ n e a ” ( B r u c e , 1 9 8 4 , 3 2 8 ) ,
c o m o o p r ó p r io P a u lo t e s t e m u n h a e m
F ilip e n s e s 3 -1 2 -1 6 . E ssa e ra a a m b iç ã o d e
su a v id a : e le a g o r a e x p r e s s a e s s e f e r v o r o
s o d e s e jo e m r e la ç ã o a to d o s o s c r e n te s .
C o n h e c e r a la r g u r a , e o c o m p r im e n
to , e a a l tu r a , e a p r o f u n d id a d e d o a m o r
d e C r is to é c o n h e c e r a lg o “q u e e x c e d e
to d o e n te n d im e n to ” (3- 1 9 a ) . O te x to g re g o
n ã o é b a s ta n t e c la r o s o b r e a q u e s e r e f e
re e s s a lin g u a g e m c o m q u a tr o d im e n s õ e s ,
e p o r e s t a r a z ã o t e m s id o te m a d e in ú
m e ra s d is c u s s õ e s 3. A lg u n s in té rp r e te s a fir
m a m q u e e s s a l in g u a g e m é m e r a m e n t e
u m a h ip é r b o le p o é t ic a p a ra o a b r a n g e n te
a m o r d e C r is to ; p o r t a n t o , a s q u a tr o d i
m e n s õ e s n ã o tê m u m a im p o r tâ n c ia e s
p e c íf ic a e m s e p a r a d o o u in d iv id u a lm e n te .
E n t r e ta n to , e x i s t e u m a p r o c e d ê n c ia b í
b l ic a p a ra a im p o rtâ n c ia d o e m p r e g o d e ssa
l in g u a g e m c o m q u a tr o s ig n i f ic a d o s in
d iv id u a is d a s d im e n s õ e s ( n ã o a p e n a s c u
m u la t iv o ) . O b s e r v e o d is c u r s o d e Z o fa r
a r e s p e i to d o s m is té r io s d a s a b e d o r ia d e
D e u s e m J ó 1 1 .8 ,9 .
1232
EFÉSIO S 3
“É c o m o as a ltu ra s d o s cé u s —
q u e p o d erás tu fazer?
M ais profund a é ela do q u e o in ferno
(S h e o l)— qu e poderás tu saber?
M ais co m p rid a é a su a m edida do q u e
a terra; e m ais larga d o qu e o m ar”
U m d o s in té r p r e te s c h e g o u a e n c o n
tra r u m p a r a le lo c o m R o m a n o s 8 .3 7 -3 9 -
“P o d e m o s c a m in h a r e m f r e n te o u r e t r o
c e d e r , s u b ir a té a s a ltu r a s o u d e s c e r à s
p r o fu n d e z a s ; n a d a n o s s e p a r a r á d o a m o r
d e C r is to ” (M itto n , 1 3 4 ) .
N o c o n t e x t o d e E fé s io s , o n d e o m is té
r io d o a m o r d e C r is to p e lo s g e n t io s é in -
c o m e n su rá v e l e e x c e d e to d o e n te n d im e n to ,
P a u lo a c e n tu a q u e : E le é s u f ic ie n te m e n
te a b r a n g e n te p a ra a lc a n ç a r a to d o o m u n d o
e a in d a m a is d o q u e is to ( 1 .9 ,1 0 ,2 0 ) . É
s u fic ie n te m e n te lo n g o p a ra s e e s te n d e r d e
e te r n id a d e a e te r n id a d e ( 1 .4 - 6 ,1 8 ; 3 -9 ) . É
s u f ic ie n te m e n te a lto p a r a e le v a r , ta n to o s
g e n tio s c o m o o s ju d eu s, ao s lu g ares ce lestia is
e m C r is to J e s u s ( 1 .1 3 ; 2 .6 ) . É s u f ic ie n te
m e n te p r o fu n d o p a r a r e s g a ta r a s p e s s o
as d a d e g r a d a ç ã o d o p e c a d o e a té d as garras
d o p ró p rio Sa ta n á s (2 .1 -5 ; 6 .1 1 ,1 2 ) . O a m o r
d e C r is to é o a m o r q u e E le te m p e la Ig r e
ja c o m o u m c o r p o ú n ic o ( 5 .2 5 , 2 9 ,3 0 ) e
p o r a q u e le s q u e in d iv id u a lm e n te c o n f i
a m n E le ( 3 -1 7 ) (W o o d , 5 2 ) .
C o n h e c e r e x p e r im e n ta lm e n te o a m o r
d e C ris to é “c o n h e c e r o p r ó p r io C ris to , e m
u m a e x p e r iê n c ia ca d a v e z m a is a b ra n g e n te ,
e te r s e u p e r m a n e n t e e a b n e g a d o a m o r
re p ro d u z id o e m n ó s m e s m o s ” (B ru c e , 1 9 8 4 ,
3 2 9 ) . P a u lo e s tá s e r e fe r in d o a u m e n t e n
d im e n to e x p e r im e n ta l d o a m o r d e C r is
to , c o n f o r m e s e to r n a a p a r e n te e m 3 -1 9 a ,
o n d e a f ir m a q u e e s s e a m o r “e x c e d e to d o
e n te n d im e n to ”. A lé m d is so , in d e p e n d e n te
d e tu d o q u e p o s s a m o s c o n h e c e r a r e s p e ito
d o a m o r d e C r is to , s e m p r e e x is t ir á m u ito
m a is p a r a c o n h e c e r p o r q u e e le é in f in ito
e in e x a u r ív e l .
3 ) A ssim c o m o as d uas a n terio res , su a ú lti
m a súplica (3 .19b ) é introduzida por "bina ”,
(lite ra lm e n te , “p ara q u e ”). E ssa sú p lica
re p resen ta o c lím ax da p ro g re ssã o d e sua
oração ap ostó lica : “para q u e Cristo habite,
p e la fé , n o v o sso c o r a ç ã o ” c o m o S e n h o r
(3 .1 7 ) a fim d e p od erm o s “c o m p re e n d e r”
as q u atro d im e n sõ e s d e seu am or (3 -1 8 )
e estarm os c h e io s de tod a a p len itu d e de
D e u s” (3 .1 9 ).
O te m a d a “p le n itu d e ” (pleroma) o c o rr e
e m C o lo s s e n s e s e e m E fé s io s . E m C o lo s
s e n s e s , e s tá s e r e fe r in d o à p le n itu d e d e
C r is to J e s u s c o m o a e n c a r n a ç ã o d e D e u s
(C l 1 .1 9 ; 2 .9 ) e f o n te d e n o s s a p r ó p r ia
p le n i tu d e (C l 2 .1 0 ) . E m E fé s io s , o f o c o é
a p le n itu d e d a Ig re ja c o m o c o r p o d e C risto
( 1 .2 3 ; 4 .1 3 ) e a p a r t ic ip a ç ã o d o s c r e n te s
n e s s a p le n itu d e (3 -1 9 ; 5 .1 8 ) . N a fra s e “p a ra
q u e s e ja is c h e io s d e to d a a p le n i tu d e ”, a
p re p o s iç ã o “p a ra ” (d o g re g o , eis) q u e r d iz er
q u e o s c re n te s d e v e m s e r p ro g re ss iv a m e n te
c h e io s c o m a m e d id a d a p le n itu d e d e D e u s ,
a ss im c o m o a Ig re ja d e v e p ro g re ss iv a m e n te
“c r e s c e r e m [C ris to ]” ( 4 .1 5 ) a té q u e p o s
s a m o s a lc a n ç a r a “m e d id a d a e sta tu ra c o m
p le ta d e C r is to ” ( 4 .1 3 ) .
P o r é m , c o m o o f in i to p o d e r á a l c a n
ç a r a p le n i t u d e d o in f in ito ? P o d e r á a h u
m a n id a d e s e to r n a r D e u s ? O b v ia m e n t e
e s s e t ip o d e r a c io c ín io e s tá lo n g e d o a r
g u m e n t o q u e P a u lo e s tá d e fe n d e n d o . A
p le n i tu d e q u e D e u s p r e te n d e , in d iv id u
a lm e n t e , p a r a c a d a c r e n t e e p a r a a I g r e
ja , é a p l e n i t u d e d e C r is to e m q u e m ,
exclusivamente, r e s id e to d a a p le n i tu d e
d e D e u s e m s u a fo r m a c o r p ó r e a . A s s im
s e n d o , e m C o lo s s e n s e s 2 .1 0 , P a u lo a c r e s
c e n ta : “E e s ta is p e r fe i t o s n e l e ” . P e lo fa to
d e c o n h e c e r m o s a C r is to a t r a v é s d a fé
c o m o u m S e n h o r q u e r e s id e e m n ó s , e
p o r n o s d e d ic a r m o s a c o n h e c e r p r o g r e s
s iv a m e n t e o s e u a m o r a t r a v é s d e s u a
r e v e la ç ã o , p o d e r e m o s a o f in a l s e r in t e
g r a d o s e m to d a a p le n i t u d e d e D e u s e m
C risto . C e r ta m e n te a in te rc e s s ã o a p o s tó lic a
n ã o p o d e r ia ir m a is lo n g e d o q u e is s o .
5.2. A Gloriosa Doxologia de
Paulo (3-20,21)
E s s a d o x o lo g ia n ã o r e p r e s e n ta a p e n a s
a co n c lu s ã o d a o ra çã o d e P au lo , m a s ta m b é m
o c l ím a x d a p r im e ir a p a r te d e E fé s io s , e
u m a t r a n s iç ã o p a r a a s e g u n d a . E la p o d e
s e r c o n s id e r a d a o a p o g e u d e to d a a c a r
ta , c o m o s c a p ítu lo s 1— 3 a s c e n d e n d o a té
o “á p ic e e s p ir itu a l” d a d o x o lo g ia , e c o m
o s c a p ítu lo s 4— 6 d e s c e n d o p a r a fo c a l i
1233
EFÉSIO S 3
z a r im p o r ta n te s a s p e c to s d a r e d e n ç ã o d a
Ig re ja e d e ca d a u m d o s cre n tes . N o v am e n te ,
a d o x o lo g ia le m b r a a o s le i to r e s d e P a u lo
a s o b r e e x c e le n t e g r a n d e z a d o p o d e r d e
D e u s e as a b u n d a n te s riq u e z a s d a su a g ra ça
q u e o p e r a n e le s ( 1 .1 9 — 2 . 7 ) — “n ã o p a r a
e n c o r a ja r p e d id o s e g o ís ta s , m a s p a ra p r o
m o v e r u m a c o n f ia n te e s p e r a n ç a e m su a
n o v a cr ia ç ã o , e sú p lic a s q u e c o rre s p o n d a m
a o p ro p ó s ito d e D e u s p a ra a Ig re ja e m n o ss a
e r a p r e s e n t e ” (T u rn e r , 1 2 3 6 ) .
P a ra q u e s e u s le ito r e s n ã o p e n s e m q u e
e x a g e r o u e m su a in te rc e s sã o , P a u lo d e c la ra
q u e D e u s é c a p a z d e fa z e r “m u ito m a is
a b u n d a n te m e n te a lé m d a q u ilo q u e p e d i
m o s o u p e n s a m o s ” (v . 2 0 ) . C o m o B r u c e
o b s e r v a ( 1 9 8 4 , 3 3 0 ) , “É im p o s s ív e l p e d ir
d e m a is a D e u s , p o is su a c a p a c id a d e d e d ar
e x c e d e e m m u ito a n o s s a c a p a c id a d e d e
p e d ir — o u m e s m o d e im a g in a r ”. P a u lo
e s c r e v e “m u ito m a is a b u n d a n t e m e n t e ”
(hyperekperissou) , u m d o s in ú m e ro s su p e r
la tiv o s q u e c r io u e q u e o c o r r e s o m e n te aq u i
e e m 1 T e s s a lo n ic e n s e s 3 -1 0 ; 5 .1 3 . Hypert
o e q u iv a le n te d e “s u p e r ’* e m la tim , ek s ig
n if ic a “a p a rtir d e ” e perissos s ig n if ic a “m a is
d o q u e s u f ic ie n te , a lé m d e , a b u n d a n t e ”
(A b b o tt , 3 5 7 ) . A ss im , hyperekperissou e x
p r e s s a a s u p e r a b u n d â n c ia d a c a p a c id a d e
d e D e u s e m r e s p o n d e r à s o r a ç õ e s , a c im a
e a lé m d e n o s s a s m a is n o b r e s a s p ir a ç õ e s .
P a u lo fa z c in c o e n é r g ic a s a f ir m a ç õ e s
a r e s p e i to d a c a p a c id a d e q u e D e u s te m
d e r e s p o n d e r à s o r a ç õ e s :
1) E le é capaz de fazer o q u e p ed im os p or
qu e, co m o D eu s, tem o p o d er de resp o n
der.
2) E le é cap az de fazer o que pedimos porque,
através de Cristo e p e lo Espírito, tem os li
vre a ce sso a E le co m o n o sso Pai.
3 ) E le é cap az d e fazer tudo q u e p ed im o s ou
p en sa m o s p o rq u e co n h e c e n o sso s p en sa
m entos e é infinitamente sábio sobre quando
e co m o resp on der.
4 ) E le é capaz de fazer mais do qiie tudo aquilo
que pedimos p o rq u e seu s p lan o s sã o m ai
ores q u e os n ossos.
5) E le é ca p a z d e fa z e r infinitamente m ais
d o q u e tud o a q u ilo q u e p ed im o s ou p e n
sam os po rqu e, co m o D eu s, E le dá de aco r
d o c o m as a b u n d a n te s riq u e z a s da sua
g raça .
A c a p a c id a d e infin ita d e D e u s re s p o n d e r
à s o r a ç õ e s , a lé m d e n o s s a l im ita d a c a
p a c id a d e d e p e d ir , e s tá “s e g u n d o o p o
d e r [dynamis] q u e e m n ó s o p e r a ” (3 -2 0 b ) .
E m 1 .1 9 -2 1 , P a u lo d e s c r e v e e s s e dynamis
c o m o o p o d e r q u e r e s s u s c i to u a C r is to
J e s u s d o s m o r to s e o e n tr o n iz o u c o m o
S e n h o r d e to d a s as c o is a s n o re in o ce le stia l,
e q u e ta m b é m n o s r e s s u s c i to u d a m o r te
e s p ir itu a l e n o s f e z a s s e n t a r a o s e u la d o
n e s s e m e s m o r e in o . E sse p o d e r n ã o é m e n o r
d o q u e a q u e le q u e o p e r a in d iv id u a lm e n te
d e n tr o d e n ó s ( q u e s o m o s h a b ita d o s p o r
s u a p o d e r o s a p r e s e n ç a ) e e m n ó s c o r p o -
r e a m e n te ( q u e é o lu g a r d a m o r a d a d e
D e u s , p e l o s e u E s p ír i to ) . O b s e r v e q u e a
v id a c r is tã , a r e s p e i t o d a q u a l P a u lo e l e
v a s u a o r a ç ã o , a b r a n g e ta n t o a t r a n s c e n
d ê n c ia d e D e u s , q u e e s tá acima de nós
c o m o n o s s o P a i c e le s t ia l ( 3 .1 4 ,1 5 ) c o m o
a im a n ê n c ia d e D e u s , q u e o p e r a p o d e
r o s a e g lo r io s a m e n te dentro de nós c o m o
s e u p o v o r e d im id o ( 3 - 2 0 ,2 1 ) .
Q u a n d o , d e jo e lh o s p e r a n te o P a i (v .
2 1 ) , P a u lo c o n c lu i s u a in s p ir a d a o r a ç ã o ,
r e p e n t in a m e n t e p r o f e r e u m a p od e r o s a
e x c la m a ç ã o : “a e s s e g ló r ia ” ( t r a d u ç ã o li
t e r a l) . C o m o o p o d e r v e m d e D e u s ( 3 -2 0 )
a g ló r ia d e v e v o lta r a E le ( 3 -2 1 ) . S u a g ló
r ia é a s o m a d e t o d o s o s s e u s a tr ib u to s , e
é m a is c la r a m e n te r e c o n h e c id a n a Ig r e ja
e e m C r is to J e s u s . D e u s d e v e s e r g lo í i f i -
c a d o n a Ig r e ja p o r q u e e la , q u e a b r a n g e
ju d e u s e g e n t io s , é a o b r a -p r im a d a g r a
ç a ” ( B r u c e , 1 9 8 4 , 3 3 1 ) .
A tra v é s d e Ig r e ja , D e u s d e c id iu to r n a r
c o n h e c id a s u a s a b e d o r ia a o s p r in c ip a d o s
e p o te s ta d e s n a s r e g iõ e s c e le s t ia is . E m
b o r a o s c é u s p r o c la m e m a g ló r ia d e D e u s ,
u m a glória a in d a m a io r é re c o n h e c id a através
d a o b r a d e s u a g r a ç a e d a r e c o n c i l ia ç ã o
d a Ig r e ja . A lé m d is s o , p e lo fa to d e a I g r e
ja s e r c o n s t i tu íd a p o r a q u e le s q u e e s tã o
u n id o s e m C r is to c o m o m e m b r o s d e s e u
co rp o , e e m q u e m Cristo resid e c o m o Senh or,
a g ló r ia d e D e u s “n a ig r e ja ” n ã o p o d e s e r
sep a ra d a d a g lória d e D e u s “e m C r is to je s u s ”
(B ru c e , 1 9 8 4 ,3 3 1 ) . C o m o sa b ia m e n te afirm a
F o u lk e s ( 1 0 7 ) : “A g ló r ia d e D e u s é m a is
g lo r io s a m e n te v ista p o r su a g ra ç a , n a u n iã o
d e s u a s c r ia tu r a s p e c a d o r a s [re d im id a s] a
s e u e t e r n o e im p e c á v e l F i lh o ”.
1234
EFÉSIO S 4
O e lo d a r e d e n ç ã o , p r e c io s a m e n te e la
b o r a d o , q u e c o n g r e g a a Ig r e ja d e C ris to
a tr a v é s d e s e u r e la c io n a m e n t o , d e v e s e r
“p a ra lo u v o r d a su a g ló r ia ” ( 1 .6 ,1 2 ,1 4 ) “e m
to d a s a s g e r a ç õ e s [n a h is tó r ia ] , p a r a to d o
o s e m p r e [n a e te r n id a d e ] . A m é m ! [is to é ,
‘a s s im s e ja ’]” ( 3 .2 1 ) . A p r im e ir a p a r te d a
c a r ta d e P a u lo s e e n c e r r a n e s s e á p ic e d a
m o n ta n h a d a in s p ir a ç ã o e d a r e v e la ç ã o .
A g o ra , P a u lo está p ro n to p ara an alisar a lgu n s
a s s u n to s p r á t ic o s , n e c e s s á r io s p a r a q u e
a m a n i f e s t a ç ã o d a g ló r ia d e D e u s s e ja
r e c o n h e c id a n o s s a n to s .
Parte II. Instruções Práticas para
a Igreja e para os Crentes
(capítulos 4—6)
N o s c a p ítu lo s 1— 3 d e E fé s io s , P a u lo e s
c r e v e u a r e s p e i to d o p r o p ó s i to e t e r n o d a
r e d e n ç ã o d e D e u s , e m C risto , e d e su a o b ra
n a h is tó r ia . D e s c r e v e u c o m o D e u s e s tá
c r ia n d o u m a n o v a h u m a n id a d e e u m a n o v a
c o m u n id a d e (a I g r e ja ) s o b r e a te rra . N o s
cap ítu lo s 4— 6, P au lo analisa d e fo n n a prática
a o b r a e x t e r n a d a s a lv a ç ã o n a v id a d iá r ia
d o p o v o r e d im id o d e D e u s , ta n to e m n í
v e l p e s s o a l c o m o n o c o r p o d e C r is to . E m
e s p e c ia l , a b o r d a q u e s t õ e s q u e e n v o lv e m
a u n id a d e d a Ig r e ja c o m o o “c o r p o ú n i
c o ”, e a p u r e z a d a Ig r e ja c o m o o t e m p lo
s a n to d e D e u s , e a n o iv a s a n ta d e C ris to .
P a u lo in s tr u iu e o r o u p o r s e u s le i to r e s
n a p r im e ir a m e ta d e d a c a r ta ; a g o r a , p a s
sa a e x o r tá - lo s . In s tr u ç ã o , in te r c e s s ã o e
e x o r t a ç ã o r e p r e s e n ta m s e u “fo r m id á v e l
t r io ” (S to t t , 1 4 6 ) e m E fé s io s . E m o u tr a s
p a la v ra s , P a u lo a b a n d o n a a s u a “te o lo g ia
m e n ta lm e n te e s t r e s s a n te ” ( ib . ) d o s c a p í
tu lo s 1— 3, a r e s p e ito d o q u e D e u s já h a v ia
f e i to e m C r is to ( is to é , o in d ic a t iv o ) p a r a
fo c a l iz a r a q u i lo q u e o s c r e n te s d e v e m s e r
e f a z e r c o m o c o n s e q ü ê n c i a ( i s t o é , o
im p e r a t iv o ; s ã o f o r n e c id a s tr in ta e c in c o
d ir e tr iz e s r e la c io n a d a s a o m o d o d e v id a
d o s r e d im id o s ) . E s ta d iv is ã o , n o e n ta n to ,
n ã o d e v e se r co n sid era d a c o m o a b ra n g e n d o
s o m e n t e a s d ir e tr iz e s , p o r q u e a te o lo g ia
c o n t in u a a e s ta r e n tr e la ç a d a c o m e x o r t a
ç õ e s p r á t ic a s .
O v e rso 1 introduz n ã o a p e n a s as q u estõ es
a n a lisa d a s n o c a p ítu lo 4 , m a s ta m b é m to d a
a s e g u n d a d iv is ã o d a c a r ta . E le c o m e ç a
c o m u m a e x o r t a ç ã o “R o g o - v o s ” [ im p lo
ro (K JV , N K JV ), v o s s u p l ic o (N R S V )] q u e
a n d e is c o m o é d ig n o d a v o c a ç ã o c o m q u e
fo s te s c h a m a d o s ”. O v e rb o “v iv er” e m g re g o
é “a n d a r” (peripateo) q u e a p a re c e o ito v e z e s
e m E fé s io s ( c in c o v e z e s n o s c a p ítu lo s 4—
5 ) . C o m o u m a m e tá fo r a , e le s e r e f e r e a o
c o m p o r ta m e n to o u à c o n d u ta . O s c r e n
te s d e v e m “a n d a r c o m o é d ig n o ” ( 4 .1 ) e
n ã o m a is “c o m o a n d a m ta m b é m o s o u
tro s g e n t io s ” ( 4 .1 7 ) , “a n d a r e m a m o r ” (5 .2 ) ,
“a n d a r c o m o f i lh o s d a lu z ” ( 5 .8 ) e c a m i
n h a r s á b ia e p r u d e n t e m é n te T 5 .1 5 ) . E s s e
v e r b o r e v e la u m a d ife r e n te fo r m a d e v i
v e r q u e d e v e r ia c a r a c te r iz a r o s c r e n te s ,
p o r c a u s a d e s u a n o v a v id a e m C r is to , e
e m todos o s r e la c io n a m e n t o s — p a r t ic u
la r e s , p ú b l ic o s e d o m é s t ic o s .
O v e r b o “a n d a r” ta m b é m c o n té m a id é ia
d e p ro g re d ir , m o v im e n ta r - s e e m d ir e ç ã o
a o o b je tiv o d a p le n a m a tu rid a d e e m C risto .
E m 4 .1 , o s c r e n te s s ã o e x o r t a d o s a a n d a r
o u v iv e r d e m o d o d ig n o d a v o c a ç ã o c o m
q u e fo r a m c h a m a d o s . “D i g n o ” ( axios')
s ig n if ic a l ite r a lm e n te “e le v a r o o u tr o la d o
d a b a la n ç a ” ( TDNT.\ 1 .3 7 9 ) ■ P a u lo e stá ass im
d e c la r a n d o q u e d e v e h a v e r u m e q u ilíb r io
e n tr e a q u ilo q u e o s c re n te s p ro fe s s a m p e la
fé , e a fé q u e p ra tic a m . A “c h a m a d a ” c o m
p r e e n d e a in ic ia t iv a e a in t e n ç ã o d e D e u s
e m su a c o n v e r sã o (cf. F p 3 .1 4 ) ; “a n d a r c o m o
é d ig n o ” é a s u a r e s p o n s a b il id a d e n a v id a
d iá r ia ( c f . F p 1 .2 7 ) . A q u e le s q u e c o m p a r
t ilh a m a c h a m a d a d iv in a s ã o “o s c h a m a
d o s ” ( ekklesia, a Ig r e ja ) .
6. Implementando o Propósito de
Deus para a Igreja (4.1-16)
N e s sa p a s s a g e m , P a u lo c o n v o c a o s cre n te s
a s e r e m f ié is a o s e u d e s t in o e à s u a c h a
m a d a c o m o o c o r p o d e C r is to . P o r d e f i
n iç ã o , o c o r p o r e p r e s e n ta u m a u n id a d e
q u e r e q u e r s in g u la r id a d e ( 4 .2 - 6 ) . A Ig r e
ja , p o r é m , te m ta m b é m a m u ltip l ic id a d e
e a d iv e r s id a d e c o m o p a r te s in te g r a n te s
d e s u a u n id a d e ; “a c a d a u m ” C r is to d is
tr ib u iu a gr a ç a e o s d o n s c o m o p a r te s d e
u m to d o ( 4 .7 ) . A lé m d is so , c o n c e d e u d o n s
d e l id e r a n ç a p a r a a ju d a r a Ig r e ja a c r e s
c e r c o m o u m t o d o e a p r o g r e d ir e m d ir e
ç ã o à v e r d a d e ir a m a tu r id a d e e s p ir itu a l, e
à m e d id a d a p le n i tu d e d e C r is to ( 4 .8 - 1 6 ) .
1235
EFÉSIO S 4
6.1. Preservara Unidade do
Espírito (4.1-6)
O N o v o T e s ta m e n to te m d u a s p a s s a
g e n s c lá s s ic a s s o b r e o t e m a d a u n id a d e
c r is tã . E fé s io s 4 .1 - 1 6 e J o ã o 1 7 . E m J o ã o
1 7 , J e s u s r o g a a o P a i a r e s p e i to d e s u a
in ic ia t iv a e fu n ç ã o p a ra q u e a Ig r e ja s e ja
u m s ó c o r p o . E m E fé s io s 4 , P a u lo e x o r ta
o s c r e n te s a r e s p e i to d e s u a r e s p o n s a b i
l id a d e d e p r o te g e r e c u id a r d a u n id a d e
d o E s p ír ito q u e D e u s lh e s c o n c e d e u , e d e
d i l ig e n te m e n te p r o c u r a r e m a m e d id a d a
p le n itu d e d a v o n ta d e d e D e u s . A r e s p o n
s a b ilid a d e d o s c r e n t e s é a o m e s m o t e m
p o in d iv id u a l e c o le t iv a .
6.1.1. AResponsabilidade Individual
(4.1,2). A p r in c ip a l fo r m a d e n ó s , c r e n
tes, an d arm os d ig n am en te , c o n fo n n e a n o ssa
v o c a ç ã o , é n o s r e la c io n a r m o s a d e q u a d a
m e n te u n s c o m o s o u tr o s c o m o m e m b r o s
d o c o r p o d e C r is to — c o m to d a a h u m il
d a d e e m a n s id ã o , c o m lo n g a n im id a d e ,
s u p o r ta n d o -n o s u n s a o s o u tr o s e m a m o r.
“C o m to d a a h u m ild a d e e m a n s id ã o ” (v .
2 ) é u m a e x p r e s s ã o c o m p o s ta q u e s ig n i
f ic a “h u m ild a d e d e m e n t e ”, o u o h u m il
d e r e c o n h e c im e n to d a d ig n id a d e e d o v a lo r
d a s o u tr a s p e s s o a s , ta l q u a l a m e n t e h u
m ild e q u e e x is t ia e m C r is to e q u e o le v o u
a s e e s v a z ia r e s e to r n a r u m s e r v o ” (S to tt ,
1 4 8 ) . P o r trá s d e to d a a d is c ó r d ia e x is te o
orgu lho ; p o r trás d e to d a h arm o n ia e u n idad e,
e x is t e a h u m ild a d e . E la é e s s e n c ia l à u n i
d a d e e à p a z d a Ig re ja c o m o c o ip o d e Cristo.
“B o n d a d e ” ta m b é m p o d e s e r tra d u z id a
c o m o “m a n s id ã o ”. A m a n s id ã o n ã o é fra
qu eza , m as sim u m a força reprim ida. A palavra
g r e g a tra z à m e n te a im a g e m d e u m c a v a
lo p u r o -s a n g u e , fo r te e f o g o s o , q u e q u a n
d o d o m esticad o o b e d e c e à m ã o co ntro lad ora
d e s e u m e s tr e . C o m o u m a v ir tu d e cr is tã ,
e la s im b o liz a u m a f o r ç a b o n d o s a e q u e
e s tá s o b c o n t r o le , a q u e le q u e é “s e n h o r
d e s i m e s m o e s e r v o d o s o u t r o s ” (S to tt ,
1 4 9 ) . C o m o a c o n t e c ia n o m u n d o d e l ín
g u a g r e g a d a é p o c a d e P a u lo , ta m b é m e m
n o s s o s d ia s “h u m ild a d e ” e “m a n s id ã o ” s ã o
e m g e r a l q u a l id a d e s c o n s id e r a d a s c o m o
r e p u g n a n te s n o m u n d o s e c u la r . P o r é m
a m b a s r e f le te m o c a r á te r d e je s u s , e s ã o
e s s e n c ia is à h a r m o n ia n a Ig r e ja .
“L o n g a n im id a d e ” e “to le r â n c ia m ú tu a ”
s ã o v ir tu d e s e s s e n c ia is p a r a s u p o r ta r e r
ro s , f r a q u e z a s e p r o v o c a ç õ e s m ú tu a s , e
c u ja a u s ê n c ia im p e d e q u e q u a lq u e r c o
m u n id a d e v iv a p a c i f ic a m e n te .
“A m o r ” (agape) é a ú lt im a q u a l id a d e
m e n c io n a d a e a b r a n g e a s q u a tr o v ir tu
d e s p r e c e d e n t e s ; n a v e r d a d e , e s t e é “a
c o r o a e a s o m a d e to d a s a s v irtu d es [cristãs]”
(S to t t , 1 4 9 ) . P e lo f a to d e o a m o r p r o c u
ra r o b e m - e s t a r d o s o u t r o s e o b e m d o
c o r p o d e C ris to , P a u lo o re c o m e n d a c o m o
a v ir tu d e q u e “é o v ín c u lo d a p e r f e i ç ã o ”
(C l 3 - 1 4 ) . E m e s s ê n c ia , P a u lo e s tá e x o r
ta n d o o s c r e n t e s a c u lt iv a r e m o fr u to d o
E s p í r i t o e m s u a v id a ( c f . G l 5 . 2 2 , 2 3 ) ,
e s p e c ia lm e n t e a q u e le s a s p e c t o s q u e s e
a p l i c a m à p r e s e r v a ç ã o d a u n id a d e d o
E s p ír ito n o c o r p o d e C r is to . E m E fé s io s
4 ,2 , a a u s ê n c ia d e s ta s c i n c o q u a l id a d e s
c o m p r o m e te r á e s s a u n id a d e .
6.1.2. A Responsabilidade Coletiva
(4.3-6). O v e r s o 3 a p r e s e n ta d u a s im p o r
ta n te s q u e s t õ e s a r e s p e i to d a u n id a d e e
d a c o m u n h ã o n a Ig r e ja :
1) O s cre n tes n ão são resp o n sáv eis p o r a l
can çar essa u n idad e, co m o se esta fo sse
um p rodu to hu m ano; an tes, ela já ex iste
co m o um a c o n c e s sã o do Espírito à Igreja.
C o m o o E spírito q u e resid e no co ra çã o de
cad a cre n te é “um só E sp írito ”, da m esm a
form a sua p re sen ça torn a tod os os seres
hu m an o s em q u e hab ita um único povo
em Cristo. Em bora estejam os divididos por
grandes d iferenças— de cultura, etnia, sexo,
idade, p o siçã o so c ia l, e d u ca ça o , tem p e
ram en to e g eo g ra fia — se to d o s so m o s
habitados pelo único Espírito de Cristo, som os
to d o s u m só p o v o e p erten cem o s à m es
m a Igreja . Essa “un idad e d o E spírito” é um
d om so brenatu ral de D eu s.
2) Porém , P aulo co n tin u a d izen d o q u e ex is
te uma responsabilidade hum ana que acom
p a n h a e s s e d om d o E sp ír ito . D e v e m o s
“p ro cu rar” ou fazer to d o s o s esfo rço s para
m antê-lo , cu idar d ele e pro tegê-lo . M arkus
B arth (2 .4 2 8 ) ch am a a a te n çã o para o tom
de u rgência p o r P aulo em p reg ar o v erb o
g reg o spoudazo nesta p assagem . E le e x
clu i tod as as atitudes d e passiv id ade e de
“esp erar para v er”. C om resolu ta d eterm i
n a çã o e d iligência , os cre n tes d ev em to
1236
EFÉSIO S 4
m ar a in iciativa de p reservar a u n idad e do
Espírito. “O v íncu lo da p az” d escrev e a paz
de D eu s o p eran d o co m o um a cad eia qu e
un e o p o v o de D eu s e q u e p reserva sua
un idad e ou singularidade.
O d o m d a u n id a d e , d a d o à Ig r e ja p e lo
E s p ír ito S a n to , é m a is d e ta lh a d a m e n t e
d e f in id o e m 4 .4 - 6 , e m s e t e a f ir m a ç õ e s ; e
s o b a fo r m a d o e n u n c ia d o d e u m a d e c la
r a ç ã o s o le n e , e s t ã o a g r u p a d o s e m to r n o
d a s trê s P e s s o a s d a T r in d a d e : “u m E s p ír i
t o ” (v . 4 ) , “u m S e n h o r ” (v . 5 ) e “u m D e u s
e P a i” (v . 6 ) . A r e p e t iç ã o d a p a la v r a “u m ”
o c o rre se te v e z e s n e sse s v erso s , su b lin h an d o
o t e m a d a u n id a d e .
N e s sa p rim e ira tr ía d e d e n ú m e ro s “u m ”,
e x is te “u m c o r p o ”, is to é , a Ig r e ja , c o n s
titu íd a p o r to d o s o s q u e fo r a m re d im id o s .
Q u a lq u e r u m q u e te n h a s id o r e d im id o
a tr a v é s d a fé e m C r is to p e r te n c e a e s s e
c o r p o . N ó s e a s d e m a is p e s s o a s fo r m a
m o s u m a s ó p e s s o a , p o r q u e e x is te a p e
n a s “u m E s p ír ito ”,a q u e m t o d o s n ó s d e
v e m o s n o s s a v id a e n o s s a e x is t ê n c ia e s
p iritu al: “A ssim c o m o o c o r p o h u m a n o te m
o e s p ír i to a n im a d o r q u e lh e d á v id a , a s
s im ta m b é m e s s e c o r p o ú n ic o te m o E s
p ír i to S a n t o q u e lh e d á â n im o e v id a ”
(S u m m e r s , 7 6 ) .
O E s p ír ito S a n to , c o m o o p o d e r q u e
c o n c e d e e m a n té m a v id a e a e n e rg ia d e s s e
ú n ic o c o r p o , t r a n s m ite à I g r e ja “u m a e s
p e r a n ç a ” ( is to é , “a e s p e r a n ç a d o e v a n
g e l h o ” c o m s u a m e n s a g e m s a lv a d o r a , Cl
1 .2 3 ) , e c o n d u z a Ig r e ja e m d ir e ç ã o a o
o b je t iv o d a “e s p e r a n ç a d a g ló r ia ” (C l 1 .2 7 )
q u e c o n te m p la a c o n s u m a ç ã o d e to d a a
re d e n ç ã o n a v ind a futura d e Cristo. O E spírito
S a n to é o p e n h o r e a g a r a n tia d e s s a e s
p e r a n ç a ( 1 .1 3 ,1 4 ) .
A s e g u n d a tr ía d e fa la d e “u m S e n h o r ”
(v . 5 ) e m c o n tr a s te c o m o p o li t e ís m o d o
m u n d o p a g ã o , a o q u a l o s r e c é m - c o n v e r -
t id o s r e n u n c ia r a m (c f . 1 C o 8 .6 ; 1 2 .3 ,5 ) .
E s s e S e n h o r é o S e n h o r J e s u s C r is to , q u e
é a c a b e ç a d e s e u ú n ic o c o r p o , a Ig r e ja :
“N in g u é m p o d e s e r v ir a d o is s e n h o r e s ”
(M t 6 .2 4 ) . O p r ó p r io S e n h o r J e s u s C r is to
é o s a n to f o c o d a “ú n ic a f é ”, a tr a v é s d a
q u a l to d a s a p e s s o a s s ã o s a lv a s e r e c o n
c i l ia d a s c o m D e u s , q u e r s e ja m ju d e u s o u
g e n t io s .
O s c r e n te s d ã o u m t e s te m u n h o p ú b l i
c o d e su a ú n ic a f é , e m u m s ó Se n h o r, a trav és
d e u m “ú n ic o b a t i s m o ” — o b a t is m o “e m
n o m e d o S e n h o r J e s u s ” (A t 8 .1 6 ; 1 9 -5 ; c f.
1 C o 1 .1 3 - 1 5 ) . O b a t is m o d o s p r im e ir o s
c r is tã o s e n v o lv ia a im e r s ã o e m á g u a c o m o
u m a fig u ra d a id e n tif ic a ç ã o c o m C ris to e m
s u a m o r te , s e p u lta m e n to e r e s s u r r e iç ã o
(R m 6 .3 - 5 ) , e m a r c a v a a o c a s iã o p a r a a
in c o r p o r a ç ã o d e n o v o s c r e n te s a o c o r p o
d e C r is to . O b a t is m o n o , o u c o m o E s p í
r ito , g e r a lm e n te a c o m p a n h a v a o b a t is m o
n a s á g u a s (A t 2 .3 8 ; 8 .1 4 - 1 7 ; 1 9 -5 ,6 ; e m
b o r a p e lo m e n o s u m a v e z o t e n h a p r e c e
d id o , 1 0 .4 4 - 4 8 ) , e e s ta v a m a is d ir e ta m e n te
r e la c io n a d o à c a p a c i t a ç ã o p e lo E s p ír ito
S a n to , a t e s te m u n h a r e m in is tra r .
S e rá q u e o “ú n ic o b a tism o ” a q u i s e re fe re
a o b a t is m o e m á g u a s o u a o b a t is m o n o
E sp ír ito ? B r u c e ( 1 9 8 4 , 3 3 7 ) a f ir m a q u e se
tra ta d o b a t is m o c r is tã o ( e s p e c ia lm e n t e
e m á g u a s , p o r é m e s tá b a s ta n t e a s s o c ia
d o à d á d iv a d o E sp ír ito ; c f . A t 2 .3 8 ) . W o o d
( 5 6 ) fa z u m a ú til o b s e r v a ç ã o : “F a z e n d o
p arte d a seg u n d a tríade (re la c io n a d a a Cristo)
e n ã o d a p r im e ir a ( r e la c io n a d a a o E s p ír i
t o ) , e s s a r e f e r ê n c ia e m 4 .5 p a r e c e in d ic a r
b a t is m o e m á g u a s e n ã o , e m p r in c íp io , o
b a t is m o n o E s p ír ito ” .
A ú ltim a p e s s o a d e s s a p a s s a g e m s o b r e
a T r in d a d e é D e u s : “u m s ó D e u s e P a i d e
to d o s , o q u a l é s o b r e to d o s , e p o r to d o s ,
e e m t o d o s ” . D e u s é o P a i d e t o d o s o s
r e d im id o s e m C ris to . A q u i, P a u lo n ã o e s tá
p e n s a n d o n a p a te r n id a d e h u m a n a e u n i
v e rs a l d e D e u s c o m o C riad or. A n te s , e x is te
u m c o n te x to e sp e c íf ic o . T o d o s o s red im id o s
e m C risto s ã o m e m b r o s d e u m ú n ic o c o r p o
e s u b m is s o s a o ú n ic o S e n h o r e , p e la v ir
tu d e d e u m r e la c io n a m e n to s a lv a d o r c o m
o F i lh o , t ê m D e u s c o m o s e u P a i a d o t iv o .
“U m s ó ” D e u s en fatiza a u n id a d e m o n o te ís ta
d e D e u s , ta l c o m o n o A n tig o T e s ta m e n to
(c f . D t 6 .6 ) , p o r é m P a u lo a in d a a c r e s c e n ta
a c o n f is s ã o d o N o v o T e s ta m e n to , “e P a i”.
A d e s ig n a ç ã o tr ip la , e m c o n e x ã o c o m
o P a i, é d ife re n te d a q u e la q u e o c o r r e u c o m
o ú n ic o E s p ír ito e o ú n ic o S e n h o r , e n ã o
é fá c i l d e s e r in te r p r e ta d a . A s t r ê s f r a s e s
a c o m p a n h a d a s d e p r e p o s iç ã o p o d e m se
r e fe r ir à t r a n s c e n d ê n c ia d e D e u s ( a c im a
d e tu d o ) , su a im a n ê n c ia (a tr a v é s d e tu d o )
1237
OS DONS MINISTERIAIS DO ESPIRITO SANTO
Dons Definição Referências Gerais Exemplos Específicos
Apóstolos
(Específicos)
Aqueles que foram especificamente in
cumbidos pelo Senhor ressuscitado, de
estabelecera Igreja e a mensagem origi
nal do evangelho.
At 4.33-37; 5.12; 18-42: 6.6; 8.14,18;
9.27; 11.1; 15.1-6, 22,23; 16.4; 1 Co
9.5; 12.28,29; Gl 1.17; Ef 2.20; 4.11;
Jd 17
Os 12apóstolos: Mt 10.2; Mc 3.14;
Le 6 .13;At 1.15-26; Ap 21.14
Paulo: Rm 1.1; 11.13; 1 Co 1.1; 9.1,5;
15.9,10; 2 Co 1.1; Gl 1.1; 1 Tm 2.7
Petíro: 1 Pe 1.1; 2 Pe :1.1
Apóstolos
(Gerais)
Qualquer mensageiro comissionado para
ser missionário ou desempenhar outras
responsabilidades especiais.
At 13.1-3; 1 Co 12.28,29; Ef 4.11 Barnabé: At 14.4,14
Andrônicoe Júnia: Rm 16.7
Tito e outros: 2 Co 8.23
Epafrodito: Fp2.25
Tiago, irmão de Jesus: Gl 1.19
Profetas Aqueles que falavam sob a inspiração do
Espírito Santo transmitindo a mensagem
de Deus à Igreja, cuja principal motivação
e preocupação estavam voltadas à vida
espiritual e á pureza desta.
Rm 12.6; 1 Co.12.1G; 14.1-33; Ef 4.11;
1 Ts 5.20,21:1 Tm 1.18; 1 Pe 4.11;
1J0 4.1-3
Pedro; A t 2.14-40; 3.12-26; At 4.8-
12; 10.34-44
Paulo: At 13.1,16-41
Várias pessoas: At 13.1
Judas e Silas: At 5 ;32
João: Ap 1.1, 3; 10.8-11; 11.18
Evangelistas Aqueles que são capacitados por Deus para
proclamar o evangelho aos não-salvos.
Ef4.11 Filipe: At 8.5-8; 26-40; 21.8
Paulo: At 26.16-18
Pastores
(Presbíteros
ou Anciãos)
Aqueles que são escolhidos e capacitados
para supervisionara igreja e cuidar de suas
necessidades espirituais.
At 14.23; 15.1-6,22,23; 16.4; 20.17-38;
Rm 12.8; Ef 4.11-12; Fp 1.1;
1 T m 3.1 -7 ;5 .17-20; Tt 1.5-9;
Hb 13.17; 1 Pe 5.1-5
Timóteo: 1 Tm 1.1-4; 4.12-16;
; 2 Tm 1.1-6; 4.2,5
Tito: Tt 1.4,5
Pedro: 1 Pe 5.1
João; 1 Jo 2.1,12-14
Gaio: 3 Jo 1-7
Diáconos
Aqueles que são escolhidos e capacitados
para prestar assistência prática aos mem
bros da igreja.
At 6.1-6; Rm 12.7; Fp 1.1; 1 Tm 3.8-13;
1 Pe 4.11
Os sete diáconos: At 6.5
Febe: Rm 16,1,2
EFÉSIO
S
4
OS DONS MINISTERIAIS DO ESPÍRITO SANTO (cont)
Dons Definição Referências Gerais Exemplos Específicos
Professores
(Mestres ou
Ensinadores)
Aqueles que são capacitados a esclarecer
e explicar a Palavra de Deus a fim de
edificara Igreja.
Rm 12 7, Ef 4.11,12; Cl 3.-16;
1 Tm 3 .2;5 17 2 Tm 2 2,3
Pau Io: At 15,35; 20.20; 28.31; Rm 12.19-21;
13.8-10; iC o 4 . 17; 1 Tm 1.5;4.16;
2Tm 1.11
Barnabé; At 15.35
Apoio: At 18.25-28
Timóteo:1 Co4.17; 1Tm 1,3-5;4.11-13; 6.2;
2 Tm 4.2
Tito: Tt 2.1-3,9.10
Ajudantes Aqueles que são çâpacitados para o de
sempenho de várias atividades auxiliares.
At 13.1-3; 1 Co12,28,29; Ef 4.11 Paulo: At 20.35
Lídia: At 16.14,15
Gaio: 3 Jo 5-8
Administradores Aqueles que são capacitados a orientar e
supervisionar as várias atividades da
igreja.
Rm 12.8; 1 Co 14.3; 1 Ts 5.11,14-
22; Hb 10.24,25
Barnabé: At 1.23,24; 14.22
Paulo: At 14.22; 16.40; 20.1; Rm 8.26-39;
Rm 12.1,2; 2 Co 6.14— 7 1; Gl 5.16-26
Judas e Silas: A t 15.32; 16.40
Timóteo: 1 T s3 .2 ;2T m 4.2
Tito: T t2.6,13 ..
Pedro: 1 Pe 5.1,2
João: 1 Jo 2 15-17 3 1-3
Doadores Aqueles que são capacitados para livre
mente doar seus recursos para suprir as
necessidades do povo de Deus.
At 2.44,45; 4.34,35; 11,29,30;
1 Co 16.1-4; 2 Co 8,9; Ef 4.28;
1 Tm 6.17-19; Hb 13.16;
1Jo 3.16-18
Barnabé:At 4.36,37 '
Os cristãos na Macedônia: Rm 15.26,27;
2 Co 8.1-5
Os cristãos na Acaia: Rm 15.26,27; 2 Co 9.2
Consoladores Aqueles que são capacitados a oferecer
conforto, através de seus atos de miseri
córdia, àqueles que se encontram em
situações de desespero.
Rm 12.8; 2 Co 1.3-7
Paulo: 2 Co 1.4
Os cristãos hebreus; Hb 10.34
Vários cristãos: Cl 4.10.11
Dorcas: A t 9.36-39
EFÉSIO
S
4
EFÉSIO S 4
e à p r e s e n ç a d o E s p ír ito h a b ita n d o n o s
cre n tes (e m to d o s). Ralp h M artin (1 5 4 ) su g ere
q u e e la c o n té m u m a a lu s ã o típ ic a d a T r in
d a d e a o único Deus “q u e s e fa z c o n h e c i
d o e m su a p ró p ria re v e la çã o c o m o P ai ‘a cim a
d e tu d o ’, c o m o F ilh o ‘a tr a v é s d e tu d o ’ ( o
u s o d a p r e p o s iç ã o a q u i c o r r e s p o n d e à
m e s m a id é ia d a m e d ia ç ã o e m 2 .1 8 ) e c o m o
o E s p ír ito q u e e s tá ‘e m t o d o s ’ o s m e m
b r o s d a fa m ília d e D e u s ” .
F inalm en te, p o d e -se im ag in aru m a o rd em
r e v e r s a d a q u e la e m q u e o s m e m b r o s d a
T r in d a d e s ã o m e n c io n a d o s a q u i: “u m s ó
E s p ír ito .. . u m s ó S e n h o r . . . u m s ó D e u s e
P a i d e t o d o s ”. A r a z ã o d is s o e s tá r e la c io
n a d a a o te m a g e r a l d a p a s s a g e m , is to é ,
“a u n id a d e d o E s p ír ito ” n o c o r p o d e C risto .
A u n id a d e a q u e P a u lo s e r e f e r e e s tá r e
la c io n a d a tan to às c o n g re g a ç õ e s lo ca is c o m o
à Ig r e ja u n iv e r s a l . R a y S u m m e r s ( 7 9 - 8 0 ) ,
c o m e lo q ü ê n c ia , c o n c lu i :
F icam os em reverente adm iração p e
ran te a idéia d essa u n idad e — u m co r
p o , um E sp ír ito , um a e sp e ra n ç a , um
Senh or, um a fé, um batism o , u m Pai.
Q u an tas a firm açõ es ex istem aq u i para
unir to d o s o s cren tes em ... um a única
singu laridade! A o m esm o tem p o , cur
v am o s n o ssa c a b e ç a em v e rg o n h o sa
confissão p elo fracasso d o p o v o de D eus
em lev ar avan te a ex o rta çã o d e Paulo:
“P rocu ran d o guardar a u n id ad e d o Es
p írito p e lo v ín cu lo da p az” (E f 4 .3 ).
6.2. Crescer em Direção à
Plena Maturidade do
Corpo de Cristo (4.7-16)
E n q u a n t o e m 4 .1 - 6 P a u lo f o c a l iz a a
u n id a d e d a Ig r e ja c o m o u m ú n ic o c o r p o ,
n e s s a s e ç ã o v o lta su a a te n ç ã o p a ra a q u e stã o
d o c r e s c im e n to d e s s e c o r p o a té q u e a tin ja
a p le n a m a tu r id a d e .
6.2.1. A Provisão de Cristo Quan
to aos Dons da Graça (4.7). N o v e r s o
7 , n o t a - s e u m a im p r e s s io n a n t e m u d a n
ç a d e f o c o . E m 4 .6 , P a u lo e n fa t iz o u a
u n id a d e d a f a m íl ia d e D e u s a f ir m a n d o
q u e D e u s é P a i d e todos nós. N o e n t a n
to , a g o r a m u d a e s s e e n fo q u e p a ra : “a g ra ç a
fo i d a d a a cada um de nós". D e s s a f o r
m a, P a u lo s e tra n sp o rta d o te m a d a u n id a d e
p a r a o c o n c e i t o d a d iv e r s id a d e q u e e x is te
d e n t r o d e s s a u n id a d e . A “g r a ç a ” d e q u e
fa la a q u i n ã o é a g r a ç a s a lv a d o r a d e 2 .8 ,
p o r é m a g r a ç a p a r a u m m in is t é r io d e
a c o i 'd o c o m c a d a p o r ç ã o in d iv id u a l d o
d o m d e C r is to . N in g u é m , n o c o r p o d e
C risto , p o s s u i a p le n itu d e d o d o m d e C risto ,
o u s u a t o ta l u n ç ã o , p o is C r is to r e p a r t iu
a p e n a s u m a f r a ç ã o d e s s e d o m a c a d a
m e m b r o d e s e u c o r p o . E m b o r a P a u lo n ã o
e m p r e g u e a p a la v ra cbarismata ( “d ád iv as,
o u d o n s d a g r a ç a ”) , c o rn o fa z e m R o m a n o s
1 2 .6 e e m 1 C o rín tio s 1 2 .4 (c f. 1 P e 4 .1 0 ,1 1 ) ,
c la r a m e n te te m e m m e n te e s s e s m e s m o s
d o n s q u e f o r a m c o n c e d i d o s a o s m e m
b r o s d o c o r p o d e C r is to ( c f . R m 1 2 .7 ,8 ;
1 C o 1 2 .8 - 1 0 ) .
6.2.2. A Posição de Cristo como
AquEle que Dá os Dons (4.8-10). C ris
to c o n c e d e o s d o n s d a g r a ç a e m s u a c o n
d iç ã o d e S e n h o r J e s u s C r is to , e x a l ta d o e
ressu sc ita d o , a q u E le q u e a s c e n d e u a o s c é u s
(c f . A t 2 .3 3 - 3 6 ) . C o n s id e r a n d o q u e é E le
q u e m b a tiz a s e u p o v o c o m o E sp ír ito S a n to ,
s e g u e -s e q u e E le c o n c e d e a o s e u p o v o
o s d o n s d o E sp írito . N o v e rs o 8 , P a u lo ilustra
e ss e p e n sa m e n to q u a n d o se re fere a o e v e n to
r e la ta d o e m S a lm o s 6 8 .1 8 , o n d e u m re i
t e o c r á t ic o a s c e n d e a o t r o n o e r e c e b e u m a
m u ltid ã o d e p r is io n e ir o s ( “p r is io n e ir o s d e
g u erra”) c o m o p rov a d e su a vitória, e ta m b é m
o s d e s p o jo s o u a s p r e s a s d e g u e r r a q u e
d is tr ib u i e n tr e s e u s h o m e n s . P a u lo d e s
c r e v e a q u i o C r is to v e n c e d o r , a s c e n d e n
d o a s e u t r o n o c o m s e u s p r is io n e ir o s ( n o
s e n t id o d e C l 2 .1 5 ) e d is tr ib u in d o d o n s
d e g r a ç a a o s e u p o v o p o r t e r d e s e m p e
n h a d o o m in is té r io d e s e u r e in o .
P a u lo c o n tin u a e s s e te x to a c re s c e n ta n d o
u m a d e n d o ( e n t r e p a r ê n t e s i s ) , o n d e a
a s c e n s ã o d e C ris to ta m b é m e n v o lv e u u m a
d e s c id a “à s p a r te s m a is b a ix a s d a te r r a ”
(4 .9 ; l ite ra lm e n te , “à s m a is in fe r io re s p a rte s
d a te r r a ”) . E s s a e x p r e s s ã o fo r a d o c o m u m
te m p r o v o c a d o u m a v a r ie d a d e d e in te r
p r e ta ç õ e s , d a s q u a is a s p r ó x im a s q u a tr o
s ã o a s m a is im p o r ta n te s :
1) C om o m ostrad o n o E v an g elh o de Jo ã o , a
a sce n sã o d e je s u s da terra d e volta ao céu
(p o r ex e m p lo , J o 1 3 .1 ,3 ; 1 4 .2 -4 ) fo i p re
ced id a p o r sua vinda d o céu à terra. D es
1240
EFÉSIO S 4
sa form a, a ex p ressã o “às partes m ais b a i
xas da terra” significa sim plesm ente “a terra
qu e estava e m b a ix o ” (B ru ce , 1 9 8 4 ,3 4 3 ) e
se refere à descida de Cristo na en carn ação
e à sua h u m ilh ação na cruz.
2) A frase: “As partes m ais b a ix a s da terra”
re fere -se à sep ultu ra. Je su s n ão só d esceu
do céu à terra co m o tam b ém , co m o parte
de sua m orte exp iatória p e lo p eca d o , foi
co lo ca d o n o in terior da p rópria terra, da
qual ressu scitou .
3 ) A fra se : “As p a rte s m ais b a ix a s da te r
ra ” r e fe r e -s e a o H a d e s , o u à re g iã o d o s
e s p ír ito s q u e p artiram p a ra a lé m da s e
p u ltu ra .
4) G. B . Caird (7 3 -7 4 ) p ro p ô s um a in terpre
tação com p letam en te nova. P elo fato deste
co n tex to estar re lacion ad o à c o n ce s sã o de
d ons à Igreja , p o r Cristo, ap ó s sua a sce n
são , acred ita q u e a d escid a m en cio n ad a
n o v erso 9, ap ó s sua asce n sã o , se refira ao
re torn o de Cristo à terra p e lo Espírito , por
o ca siã o d o P en teco stes , trazen d o m uitos
d ons à sua Igre ja . D essa form a, a se q ü ê n
cia seria prim eiram ente a ascensão , seguida
p ela d escid a n o P en teco stes , para a d is
trib u ição d e d on s4.
E m b o r a a in te r p r e ta ç ã o d e C a ird n ã o
s e ja d e to d o im p o s s ív e l , o v e r s o 1 0 a to r
n a p o u c o p r o v á v e l , p o is C r is to é d e s c r i
to c o m o t e n d o s u b id o a c im a d e to d o s o s
c é u s “p a r a c u m p r ir to d a s a s c o is a s ”, a o
in v é s d e d e s c e r d e le p a r a d is tr ib u ir d o n s .
E m b o r a a lg u n s d o s a n t ig o s p a tr ia r c a s d a
Ig re ja a d o ta sse m a terce ira o p in iã o , a g ra n d e
m a io r ia d o s e s tu d io s o s d a B íb l ia , d e s d e
a R e fo r m a , s u s te n to u a p r im e ir a p o s iç ã o
q u e s e a s s e m e lh a a o p e n s a m e n to d e P a u lo
n a p a s s a g e m kenosis(F p 2 .6 -9 ) , e s e a ju s ta
m u ito b e m a o c o n c e i t o g e ra l e x is te n te e m
E fé s io s .
6.2.3.0 Propósito de Cristo ao Con
ceder os Cinco Tipos de Liderança
Ministerial (4.11-13). E m s e u lu g a r d e
e x a l ta ç ã o c o m o S e n h o r e C ris to (A t 2 .3 6 ) ,
J e s u s e n c o n tr a -s e e n tr o n iz a d o s o b r e to d o
o u n iv e r s o ( E f 1 .1 0 , 2 0 - 3 0 ) . “E e le m e s m o
[autos, u m p r o n o m e en fá tico ] d e u u n s p a ra
a p ó s to lo s , e o u tr o s p a r a p r o fe ta s , e o u
tr o s p a r a e v a n g e lis ta s , e o u tr o s p a ra p a s
to re s e d o u to re s” c o m o líd e res c o m p e te n te s
p a r a s u a Ig r e ja ( 4 .1 0 ) . P a u lo fa z a q u i u m a
d is tin ç ã o ( e ta m b é m e m o u tra s p a s s a g e n s )
e n tr e os dons da graça c o n c e d id o s p e lo
E sp ír ito a o s c re n te s in d iv id u a lm e n te (4 .7 ,8 ;
c f . 1 C o 1 2 .4 - 1 1 ) e a q u e la s c in c o c a t e g o
rias d e pessoas competentes e s c o lh id a s p e lo
p r ó p r io S e n h o r “p a ra p r o c la m a r a P a la
v ra e lid e r a r ” (L in c o ln , 2 4 9 ) s u a Ig r e ja u n i
v e r s a lm e n te ( E f 4 .1 1 ; c f . 1 C o 1 2 .2 8 ) .
R e s u m id a m e n te , a p a la v r a “a p ó s t o lo s ”
(lite ra lm e n te , “e n v ia d o s ”) re fe re -s e à q u e le s
in d iv íd u o s e s p e c i f i c a m e n t e c h a m a d o s ,
c o m is s io n a d o s e a u to r iz a d o s p e lo p ró p r io
S e n h o r J e s u s C r is to p a r a s e r e m s e u s r e
p re se n ta n te s n a p ro c la m a ç ã o d o e v a n g e lh o
e n o e s t a b e le c im e n t o d a Ig r e ja ( c f . 2 .2 0 ;
3 .5 ) . O s “p r o f e ta s ” d o N o v o T e s ta m e n to
e r a m a q u e le s in d iv íd u o s e s p e c ia lm e n t e
d o ta d o s e m r e c e b e r e m e d ia r d ir e ta m e n
te a re v e la ç ã o re c e b id a d e D e u s. E m E fés io s ,
o s p r o fe ta s s ã o m e n c io n a d o s trê s v e z e s ,
ju n ta m e n te c o m o s a p ó s t o lo s ( 2 .2 0 ; 3 .5 ;
4 .1 1 ) . N a é p o c a d o N o v o te s ta m e n to , o s
“e v a n g e li s t a s ” e r a m a q u e le s in d iv íd u o s
( c o m o F e l ip e e m A to s 8 ) e s p e c ia lm e n t e
u n g id o s p a ra p re g a r a s b o a s n o v a s d e C risto
e d e s e u r e in o à s p e s s o a s e à s c id a d e s , a
f im d e d e s p e r ta r a fé . A p a la v r a , “p a s t o
r e s ” d e n o ta a q u e le s in d iv íd u o s e s c o lh i
d o s p o r D e u s c u jo s d o n s esp iritu ais lev aram -
n o s a d ed icarem -se a o p asto re io e a o cu id ad o
d o r e b a n h o d e D e u s . “P r o f e s s o r e s ” o u
“d o u to r e s ”, e r a m a q u e le s in d iv íd u o s e s
p e c ia lm e n t e c a p a c i ta d o s p a r a a e x p o s i
ç ã o d a P a la v r a d e D e u s c o m e f ic iê n c ia e
p o d e r. (P a ra u m a d is c u ss à o m a is d e ta lh a d a
s o b r e c a d a u m d o s c in c o m in is té r io s a c i
m a, v e ja o e x c e le n te artigo escrito p o r D o n a ld
S ta m p s , “ TheMinistry Gifts ofthe Ch u rch ”,
q u e p o d e r ia s e r tra d u z id o c o m o “O s D o n s
d o M in is té r io d a I g r e ja ”) [N a TheNIVFull
Life Study Bible, 1 8 3 0 -3 2 ] ,
D o is tó p ic o s d e e sp e c ia l in te re sse p o d e m
se r p e r c e b id o s e m c o n e x ã o c o m o v e rs o 11:
1) Em re la çã o à estrutura da frase (e sp e c ia l
m en te clara na v ersão greg a), ap ó sto los ,
pro fetas e ev an gelistas são m en cion ad o s
sep a ra d a m en te (p re ce d id o s p e lo artigo
d efin id o), en q u an to p asto res e p ro fesso
res (o u d o u to re s) sã o m e n c io n a d o s em
co n ju n to . K. H. R eng storf afirm a q u e , de
a co rd o co m o p en sa m en to d e P au lo , es
tes d o is ú ltim o s e s tã o tã o in tim a m en te
1241
EFÉSIO S 4
re lacio n ad o s q u e seria im p o ssív el sep arã-
los no m inistério responsável po ru m a igreja
local (TDNT, 2 1 5 8 ) . A queles qu e pastoreiam
o re b a n h o ta m b é m e s tã o e n s in a n d o , e
aq u eles qu e en sinam tam bém estão p asto
rean d o . L incoln (2 5 0 ), p o r ou tro lado, ar
gu m enta q u e a o m issão d o artigo d efin i
do, an tes da palavra p ro fesso res (ou d ou
tores), n ão significa n ecessa ria m en te qu e
pastores e professores estejam sem pre unidos
na m esm a p esso a . Afirm a: “É m ais prová
v el q u e se jam fu n çõ e s so b rep ostas, p o is
e m b o ra q u a se to d o s o s p a s to re s se jam
ensinadores, nem todos os ensinadores são
tam b ém p a sto res”.
Em 1 C orín tios 1 2 .28 , n o ta -se q u e os p ro
fessores form avam um a categoria separada
de m inistério nos prim órdios da Igreja, pois
fo i d ito qu e D eu s n o m eo u p ara sua Igreja
“primeiramente, apóstolos, em segundo lugar,
p ro fetas, em terce iro , d ou to res”. U m a d is
tin çã o b astan te útil d o N ovo T estam ento ,
q u e se d eve ter em m ente, é a d iferen ça
entre “o p ap el de en sinar”, qu e geralm ente
ca ra c te r iz a v a to d o s o s m in istro s c o m o
d ivulgadores da Palavra, e “p ro fesso res”
o u “d o u to res”, um term o q u e e sp e c ifica
m en te se referia a um a das c in c o co n v o
ca çõ e s e un ções q u e Cristo co n ced eu à sua
Ig re ja 5.
2) Q u al seria a im p o rtância de ap ó sto lo s e
p ro fetas atualm ente? D e form a q u ase u n i
versal, com entaristas têm co n co rd ad o qu e
ap ó sto lo s e p ro fetas eram m in istérios e s
p eciais do prim eiro século, qu e su bseqü en
tem en te foram extintos e substituídos pelas
palavras apostólicas e proféticas do cân on e
do N ovo T estam en to . T em sid o tam b ém
a ssu m id o q u e e v a n g e lis ta s , p a s to re s e
p ro fesso res co ntin u am a ser líderes n e c e s
sários da Igre ja em tod as as g eraçõ es. E sse
co n c e ito am p lam en te d ifundido fo i a n a
lisado e co n sid erad o fa lh o p o r Ja c k D eere
em seu in teressan te livro Surprised by the
Power of the Spirit (2 4 1 -5 1 ). A ssim co m o
D eu s restau rou u n iversa lm ente, n o sé c u
lo X X , a co m p reen sã o prática do batism o
n o E spírito San to e dos d on s carism áticos
para a Igreja, será que estaria além dos limites
do p o ssív el que D eu s tam b ém tivesse re s
taurado o m in istério d os ap ó sto lo s e p ro
fetas, n ão para assentar n o v am ente os fu n
d am en tos da Igreja ou para escrev er as E s
crituras (um a vez qu e o cân o n e já está co n
clu íd o), m as p ara levar a Igre ja à p len itu
de de sua m atu ridade — a p rin cip al ê n fa
se de P aulo em 4 .11-13? C om um p en sa
m ento extrem am ente aberto, D eere explora
só lid a s ra z õ e s b íb lic a s e te o ló g ic a s na
reav a liação d essa possib ilid ad e.
N o s v e r s o s 1 2 e 1 3 , P a u lo a f ir m a ta n to
o p r o p ó s i to c o m o a d u r a ç ã o d o m in is té
r io q u ín tu p lo , d e n tr o d e s s e c o n t e x t o d e
le v a r a ig r e ja à s u a p le n a m a tu r id a d e . E m
r e la ç ã o a o propósito, e le d e s c r e v e a I g r e
ja c o m o u m o r g a n is m o v iv o ( o c o r p o d e
C r is to ) q u e d e v e c r e s c e r a té a lc a n ç a r a
estatu ra p la n e ja d a p o r D e u s . A n terio rm en te ,
e le h a v ia s e r e fe r id o à Ig r e ja c o m o u m a
n o v a h u m a n id a d e q u e D e u s e s tá c r ia n
d o ( is to é , d e a m b o s o s p o v o s fe z u m ; u m
n o v o h o m e m , 2 .1 5 ) . S to tt ( 1 7 0 ) d e s c r e v e
a p r o g r e s s ã o d o p e n s a m e n t o d e P a u lo .
“N a s in g u la r id a d e e n o v id a d e d e s s e n o v o
‘h o m e m ’, e le a g o r a e s tá a c r e s c e n ta n d o a
m a tu r id a d e . O novo homem, q u e é ú n i
c o , d e v e a lc a n ç a r u m a maturidade, q u e
n ã o s e r á m e n o r q u e a medida da estatu
ra da plenitude de Cristo, a p le n itu d e q u e
o p r ó p r io C ris to p o s s u i e c o n c e d e ”. O fa to
d e 4 .1 1 - 1 6 e s ta r e x p r e s s o e m u m a ú n ic a
fra se e m g r e g o re a lç a o p ro p ó s ito e o p a p e l
d o m in is té r io q u ín tu p lo d o s l íd e r e s a ju
d a n d o o c o r p o d e C r is to a c r e s c e r a té su a
p le n a m a tu r id a d e .
A tra v é s d o m in is té r io d a P a la v r a ( r e
v e la n d o , d e c la r a n d o e e n s in a n d o o e v a n
g e lh o ) , e d e a c o r d o c o m s e u s d o n s e s p e
c ia is , o s a p ó s to lo s , p r o fe ta s , e v a n g e lis ta s ,
p a s to r e s e p r o f e s s o r e s p r e p a r a m o p o v o
d e D e u s “p a r a a o b r a d o m in is té r io , p a ra
e d if ic a ç ã o d o c o r p o d e C r is to ”. E s s e v e r
s o e x p r e s s a trê s p r o p ó s ito s c o o r d e n a d o s :
c a p a c i ta r o s s a n to s , s e r v ir à s n e c e s s id a
d e s d a Ig r e ja e e d if ic a r o c o r p o d e C ris to .
G e r a lm e n t e o s in t é r p r e te s e n te n d e m a
fu n ç ã o d o s c in c o l íd e r e s c o m o p e r s o n i
ficad a n a p rim eira c lá u su la — isto é , a fu n çã o
d e p r e p a r a r o u e q u ip a r o p o v o d e D e u s
— e n q u a n to o s s a n to s s ã o a s e g u ir p r e
p a r a d o s p a r a fa z e r a o b r a d o m in is té r io ,
p a r a e d if i c a ç ã o d a Ig r e ja 6.
N o a m p lo s e n tid o d o N o v o T e s ta m e n to ,
p a r e c e s e r u m a a p l ic a ç ã o ó b v ia q u e o s
1242
EFÉSIO S 4
s a n to s a s s im p r e p a r a d o s d e v a m s e to r n a r
m in is tro s , p a ra q u e to d o s o s m e m b r o s d o
c o r p o fu n c io n e m d e a c o r d o c o m se u s d o n s
e m b e n e f í c io d o b e m c o m u m (R m 1 2 .4 -
8 ; 1 C o 1 2 .4 - 3 1 ) . E n tr e ta n to , n o c o n t e x t o
d e s s a p a s s a g e m , p a r e c e q u e o m in is té r io
d o s c in c o l íd e r e s a in d a e s tá p r e s e n t e e m
to d o o v e r s o 1 2 , p o is e m v ir tu d e d e s e
re m sa n to s e líd eres (cf. 1 C o 1 2 .2 8 ), e q u ip a m
o s sa n to s , s e r v e m à s n e c e s s id a d e s da ig re ja
e a ju d a m a e d if ic a r o c o r p o d e C r is to . P o r
o u tr o la d o , u m m in is té r io d e s e m p e n h a
d o a p e n a s p o r s e u s m in is tro s o f ic ia is , q u e
e x c lu i o m in is té r io le ig o , é e m si c o n t r á
r io a o q u e P a u lo e n s in a e m 4 .7 ,1 6 , o n d e
to d o s o s m e m b r o s d o c o r p o p a r t ic ip a m
a tiv a m en te , d e a lg u m a fo rm a , n a e d if ic a ç ã o
d o c o r p o d e C ris to .
A c o n ju n ç ã o “a té ” (4 .1 3 ) tran sm ite a id éia
da duração do tempo q u e D e u s c o n c e
d e u a o q u ín tu p lo m in is té r io . J a c k D e e r e
(2 4 8 ) ob se rv a : “S e co n s id e ra d o litera lm en te ,
is so s ig n ifica ria q u e a Ig re ja te rá a p r e s e n ç a
d e a p ó s t o lo s [e p r o fe ta s ] a té a lc a n ç a r a
m a tu r id a d e d e s c r ita n o v e r s o 13- A tu a l
m e n te , é d if íc il c o n s id e r a r a Ig r e ja c o m o
t e n d o a lc a n ç a d o o n ív e l d e m a tu r id a d e
d e s c r ita n o v e r s o 1 3 ”.
O p r o p ó s i to m a is e le v a d o q u e C r is to
d e u a o s l íd e r e s d o q u ín tu p lo m in is té r io ,
e m r e la ç ã o à Ig r e ja , fo i o d e le v a r o c o r
p o d e C r is to a a lc a n ç a r a p le n a m a tu r id a
d e , q u e está d efin id a d e três m a n eira s (4 .1 3 ):
1) Q u e tod os os crentes possam alcan çar n ão
ap en as a fé em Cristo, m as “a un idad e da
fé ”;
2) Q u e e les p o ssam n ã o a p en as ter um c o
n h ecim en to a resp e ito d e Cristo, m as ter
“o co n h e c im e n to [epignosis, ou total c o
nh ecim en to] do F ilh o de D e u s”; e
3) Q u e p o ssam n ão a p en as c o n h e c e r a Cris
to, mas chegar “à medida da estatura completa
d e C ris to ”. S o m e n te e n tã o se “torn a rã o
m ad u ros” (literalm ente , “se torn arão p e s
soas perfeitas e totalm ente am adurecidas”).
O u tro s trê s a s s u n to s d ig n o s d e n o ta d e
v e m s e r o b s e r v a d o s n o v e r s o 1 3 ;
1) A frase “até qu e todos" se re fere claram ente
a toda a Igreja , n o sen tid o co letiv o , e n ão
sim plesm ente a todos nós, individualmente.
2 ) E nq u anto P aulo exo rta o s cren tes a guar
d a rem cu id a d o sa m e n te “a u n id a d e d o
E spírito" (4 .3 ) , aqu i e le afirm a q u e a “uni
d ade da fé ” rep resen ta um o b je tiv o a ser
a lca n ça d o (W ood, 59). A rea lização d esta
unidade se tom ará verdadeira porque a Igreja
a lcan çará um a total co m p reen sã o e x p e ri
m ental d e Cristo c o m o F ilh o d e D eus.
3) Paulo descreve a plena m aturidade da Igreja
co m o , literalm ente, a “m edida da estatura
com pleta de Cristo”. O corpo de Cristo, com o
um tod o, d everá a lcan çar a p len a estatura
da p esso a de Cristo (q u e é a c a b e ç a d este
co rp o ).
L u c a s m e n c io n a e s s e o b je t iv o n o liv ro
d e A to s . E m A to s 1 .1 , e le a f ir m a q u e s e u
p rim eiro livro (o E v a n g e lh o d e L u cas) registra
“tu d o q u e J e s u s começou, n ã o s ó a fa z e r ,
m a s a e n s in a r”. C o m e fe ito , o se g u n d o liv ro
e s c r i to p o r L u c a s , A to s , r e g is tr a tu d o q u e
Je s u s continuou a fa z e r e p ro c la m a r atrav és
d a Ig r e ja e p e lo p o d e r d o E s p ír ito S a n to ,
a p ó s a s u a a s c e n s ã o . O fa to d e o E s p ír ito
S a n to r e p r o d u z ir a v id a e o m in is té r io d e
Je s u s a tra v é s d a Ig re ja re p re s e n ta , e m A to s,
u m a d a s p r in c ip a is id é ia s b á s ic a s d a t e o
lo g ia . A Ig r e ja d e v e r á p r o c la m a r om e s
m o e v a n g e lh o q u e Je s u s p ro c la m o u ; d ev erá
ta m b é m r e a liz a r o s m e s m o s m ila g r e s q u e
Je s u s rea lizo u , e m in istrar a trav és d o m e s m o
p o d e r d o E s p ír ito , p e lo q u a l J e s u s e x e r
c e u o s e u m in is té r io .
P a u lo já e m p r e g o u a p a la v ra “p le n itu
d e ” (pleroma) e m 1 .2 3 , e m re la ç ã o à Ig re ja .
A Ig r e ja d e v e r á c r e s c e r d e a c o r d o c o m a
m e d id a -p a d r à o d a p le n itu d e d e C risto , e m
to d o s o s a s p e c to s cia v icia e d o m in is té
r io . B r u c e ( 1 9 6 1 , 8 8 ) e s c r e v e : “Q u a n d o o
o b je tiv o fo r fin a lm e n te a lc a n ç a d o , e o c o ip o
d e C r is to t iv e r c r e s c id o o s u f ic ie n te p a ra
s e ig u a la rá p ró p ria C a b e ç a , e n tã o se r á v isto
o H o m e m p le n a m e n te a m a d u r e c id o , q u e
é C r is to ju n to c o m t o d o s o s s e u s m e m
b r o s ”. E m b o ra e s s a u n iã o n ã o s e c o m p le te
a té q u e a c o n t e ç a o m o m e n t o e m q u e a
Ig re ja será glorificada ju n ta m en te c o m Cristo,
e s s a e s p e r a n ç a fu tu ra d e v e r á a g ir a g o r a
c o m o u m p o d e r o s o in c e n t iv o p a ra o c r e s
c im e n t o d a Ig r e ja , a té q u e e s ta a t in ja su a
c o m p le ta m a tu r id a d e .
6.2.4.0 Plano de Cristo para o Cres
cimento da Igreja (4.14-16). O s v e r s o s
1 4 -1 6 a in d a fa z e m p a rte d a ú n ic a s e n te n ç a
g r e g a q u e s e in ic io u e m 4 .1 1 . A o in ic ia r o
1243
EFÉSIO S 4
v e r s o 1 4 c o m o u m n o v o p a r á g r a fo , u ti l i
z a n d o a s p a lav ras “p a ra q u e n ã o ” (n o g re g o ,
hina; l i te r a lm e n te , “a f im d e q u e ”) , a N IV
to r n a d e c e r ta fo r m a c o n f u s o o v e r d a d e i
r o r e la c io n a m e n t o c o m a l in h a d e p e n s a
m e n to p r e c e d e n te . O C r is to r e s s u r r e c to
q u e s u b iu a o c é u c o n c e d e u o q u ín tu p lo
m in is té rio à Ig re ja c o m o p ro p ó s ito d e g u iá -
la e m d ire çã o a o se u fu tu ro d e stin o d e p le n a
m a tu r id a d e . C o n c e d e u - lh e e s t e m in is té
r io “a f im d e q u e ” n ã o f ic á s s e m o s p r e s o s
n a “im a tu r id a d e d a in fâ n c ia ( c o m o p r e
s a s d e to d a s a s a f l i ç õ e s ) , m a s c o m e ç á s
s e m o s a c r e s c e r e m d ir e ç ã o à e s p e r a d a
m atu rid ad e, is to é , à v erd a d e ira se m e lh a n ç a
c o m C r is to ” (T u m e r , 1 2 3 9 ) .
P a u lo m e n c io n a , e m p rim e iro lugar, q u e
q u a n d o a I g r e ja a m a d u r e c e d e s u a in fâ n
c ia e s p ir itu a l, d e ix a p a ra trá s a s u a c o r
r e s p o n d e n te in s ta b ilid a d e (v . 1 4 ) . P e r m a
n e c e r c o m o m e n in o s e s p ir itu a is ( c f . 1 P e
2 .2 , o n d e a p a la v ra ‘m e n in o s ’ r e fe r e -s e a o s
r e c é m - c o n v e r t id o s ) d e p o is q u e o t e m p o
s u f ic ie n te a o a m a d u r e c im e n to já te n h a s e
e s g o ta d o (1 C o 3 .1 ,2 ; H b 5 .1 3 ) , é o m e s
m o q u e s e r e s p ir i t u a lm e n t e in s tá v e l e
v u ln e r á v e l à s d e c e p ç õ e s : “A s c r ia n ç a s s ã o
in d e fe s a s , in c a p a z e s d e s e p r o te g e r ; n a
v id a e s p ir itu a l s e to m a m p r e s a s fá c e is d o s
fa ls o s e n s in a d o r e s e d o s d e m a is q u e g o s
ta r ia m d e d e s v iá - la s d o v e r d a d e ir o c a m i
n h o ” ( B r u c e , 1 9 8 4 , 3 5 1 ) .
P a u lo re p ro d u z g r a f ic a m e n te o q u a d r o
d a in s ta b ilid a d e d o s c r e n te s im a tu ro s . S ã o
c o m o p e q u e n o s b a r c o s e m u m m a r te m
p e s tu o s o , to ta lm e n te v u ln e rá v e is a o s p e
r ig o s d o v e n to e d a s o n d a s . S ã o in e v ita v e l
m e n te “le v a d o s e m ro d a p o r to d o v e n to
d e d o u tr in a ”. S ã o c a rr e g a d o s p o r q u a lq u e r
n o v o v e n d a v a l d e e n s in o q u e p o s s a p a r e
c e r e s ta r s o p r a n d o c o m o m a io r in te n s id a
d e n a q u e le m o m e n to . S ã o fa c i lm e n te “le
v a d o s e m r o d a p o r to d o v e n to d e d o u tr i
na, p e lo en g a n o d os h o m e n s qu e, c o m astúcia,
en g a n a m fraudulosam ente”. Crentes im aturos,
d e s p r o v id o s d a s b a s e s d e u m e v a n g e lh o
ap o stó lico (2 .2 0 ) sã o ingên u os: “Suas op in iões
t e n d e m a s e r a q u e la s q u e o u v ira m d o ú l
t im o p re g a d o r , o u d o ú lt im o liv ro q u e le -
ram , e se to rn a m p re s a s fá c e is d e ca d a n o v a
m a n ia te o ló g ic a ” (S to tt , 1 7 0 ) . T a l im a tu ri
d a d e s e to r n a r á c a d a v e z m a is p e r ig o s a à
m e d id a q u e fa ls o s c r is to s , fa ls o s p ro fe ta s
e fa ls o s e n s in a d o r e s s e m u ltip lic a re m “n o s
ú lt im o s d ia s ” (c f . M t 2 4 .4 - 1 4 ,2 3 -2 5 ) .
A s r o c h a s s ó l id a s d a s e g u r a n ç a e d a
in te g r id a d e d o e v a n g e lh o e s t ã o e m f o r
te c o n t r a s t e c o m a in s ta b il id a d e d a im a
tu r id a d e e s p ir itu a l , e c o m a d u p l ic id a d e
d a s fa ls a s d o u tr in a s ( 4 .1 5 ) . O e v a n g e lh o
a p o s t ó l ic o é c a r a c te r iz a d o p e la verdade
e p e l o amor. F a la r a v e r d a d e “e m c a r i
d a d e ” o u c o m “a m o r ”, s ig n if ic a “v iv e r a
v e r d a d e e m a m o r ” (W e s tc o t t , 6 4 ) , e n ã o
a p e n a s p ro fe rir su tile z a s v e rb a is . Is to in c lu i
a v e rd a d e m o ra lm e n te e x p re ss a p e lo cará ter
e p e la s a ç õ e s : “A q u e le s q u e c e g a m e n t e
s e g u e m o s c a m in h o s d o e r r o c h e g a m a o
d e s a s t r e e s p ir itu a l ; a q u e le s q u e a c e i t a m
a v e r d a d e to r n a m - s e h o m e n s d a v e r d a
d e ” ( B r u c e , 1 9 6 1 , 8 8 - 8 9 ) .
A v e r d a d e , d e a c o r d o c o m a r e v e la ç ã o
d o N o v o T e s ta m e n to , e s tá se m p re in se p a ra -
v e lm e n te lig a d a a o a m o r. N ã o e x is te u m a
s i tu a ç ã o e m q u e s e t e n h a “to d a a v e r d a
d e e n e n h u m a m o r ”, a s s im c o m o ta m b é m
n ã o s e p o d e te r “to d o o a m o r, p o r é m s e m
n e n h u m a v e r d a d e ” . O e q u ilíb r io é im p o r
ta n te , c o m o S to tt ( 1 7 2 ) o b s e r v a : “A v e r
d a d e s e to r n a s e v e r a s e n ã o fo r a b r a n d a
d a p e lo a m o r ; e o a m o r, p o r s u a v e z , to r
n a - s e e x c e s s iv a m e n t e b r a n d o s e n ã o fo r
fo rta lecid o p ela v e rd a d e ”. Q u a n d o a v e rd a d e
d o e v a n g e lh o é m a n tid a e m a m o r, a p r e
s e n ta d a e m a m o r , e q u a n d o s e lu ta p o r
e s ta c o m u m e s p ír i to a m o r o s o , o c o r p o
d e C r is to c r e s c e “e m tu d o n a q u e le q u e é
a c a b e ç a , C r is to ”. N a f ir m e p r o g r e s s ã o d a
in fâ n c ia à m a tu r id a d e , a Ig r e ja s e to r n a
m a is e m a is c o n f o r m e à s u a C a b e ç a , q u e
é o p r ó p r io C ris to .
E m ú lt im a a n á l is e , t o d o c r e s c im e n t o
o c o r r id o n o c o r p o d e C r is to e s tá r e la c i
o n a d o à C a b e ç a ( 4 .1 5 ,1 6 ) . P o r é m , r e la
c io n a m e n t o s s a u d á v e ise n tr e m e m b r o s
d e u m m e s m o c o r p o sã o ta m b é m e ss e n c ia is
p a r a q u e e s t e s e ja s a u d á v e l e d e v o ta d o
e m s u a fa s e d e c r e s c im e n t o . D o is p a r t i -
c íp io s c o m p o s t o s , fo r m a d o s p e lo p r e f i
x o syn ( “c o m ” o u “ju n to ”) d e s c re v e m c o m o
o “c o r p o in te ir o ” e c a d a u m a d e su a s p a rtes
in te r-re la c io n a d a s s e e n c o n tr a m in teg ra d a s
a o c o n ju n to . O p r im e iro fo i u s a d o n o v e rs o
2 .2 1 r e f e r in d o - s e à I g r e ja , o n d e e la é u m
1244
EFÉSIO S 4
t e m p lo q u e e s tá “b e m a ju s ta d o ” (N IV ) ,
o u “e n c a ix a d o ” (N A S B ). O s e g u n d o v e rb o ,
t r a d u z id o c o m o “m a n t id o ju n t o ” (N IV ) ,
o u “ju n ta m e n te e n tre la ç a d o ” (N KJV, N RSV ),
e s tá re la c io n a d o a o p a p e l d o s “lig a m e n to s
d e s u p o r t e ”. S a lm o n d ( 3 3 7 ) fa z u m r e
s u m o b a s ta n te p r o v e ito s o d o p e n s a m e n to
d e P a u lo n e s t e v e r s o .
T od o o co rp o , b e m a ju stad o e liga
do p e lo au xílio de tod as as ju n tas [liga
m entos], cad a um d estes em seu p ró
p rio lugar e d esem p en h a d o a sua p ró
pria fu n ção , são os p o n to s de co n e x ã o
en tre m em b ro e m em b ro , e o s p on tos
de com unicação entre as diferentes partes
e o su p rim ento q u e v em da ca b e ça .
R . M a rtin ( 1 5 8 - 5 9 ) a c r e d ita q u e o s l i
g a m e n to s d e su p o rte s e r e fe re m a u m v e rs o
p r e c e d e n te ( 4 .1 1 ) e , d e s s a fo r m a , c o m
p a r a -o s à d á d iv a d e C r is to d o q u ín tu p lo
m in is té r io .
A través dessa reação em cad eia, em
Cristo, seu s m inistros e seu p ovo, isto é,
todo o corpo, passa aser edificado à medida
que o amor se torna a “atm osfera” na qual
esse p ro cesso de m útuo en cora jam ento
e responsabilidade é exercitado, com cada
parte da Igreja d esem p enh and o o p ap el
qu e lhe foi determ inado. Cristo, qu e é a
ca b eça , transm ite sua vida ressurreta, e
co n ced e os seus dons m inisteriais atra
vés do Espírito. Seus m inistros cum prem
a m issão de preparar os santos (v. 12) e
d e ser os ligam entos da co e sã o da Igreja
para Cristo e en tre si. O p o v o de Cristo
dá a sua contribu ição ... n ecessária para
qu e os d esígnios de Cristo sejam reali
zados na ed ificação do co rp o , e em seu
crescim en to para Ele.
7. Reproduzindo a Vida de Cristo
nos Crentes (4.17—5.21)
A m e n sa g e m d e P a u lo a o s g en tio s e m E fésios
1— 3 fo c a l iz a o p la n o d e D e u s p a ra a r e
d e n ç ã o , q u e é c o n c e d id a c o m o u m d o m
a tra v é s d a fé e m C r is to , e n ã o c o m o r e
s u lta d o d e m é r ito s o u e s f o r ç o s p r ó p r io s .
N o s c a p ítu lo s 4— 6 e le r e f o r ç a e s s a s p a
la v ra s d iz e n d o q u e a m e n s a g e m d a g r a
ç a tra z c o n s ig o c o n s e q ü ê n c ia s m o r a is e
é t ic a s , à s q u a is s e r e fe r e d e v á r ia s fo r m a s
c o m o f r u to s d a lu z ( 5 .8 ,9 ) , “f r u to s d e ju s
t i ç a ” (F p 1 .1 1 ; c f . H b 1 2 .1 1 ) , e “fr u to d o
E s p ír ito ” (G l 5 .2 2 ,2 3 ) . A q u i, ( c o m o e m G l
5 — 6 ) P a u lo e n fa t iz a q u e o e v a n g e lh o d a
g r a ç a q u e p r e g a n ã o s ó l ib e r ta d a s le is
ju d a ic a s c o m o ta m b é m d a a n t ig a v id a d e
p e c a d o e d e a to s d e n a tu r e z a p e c a m in o
sa . D e s s a fo r m a , P a u lo c o m e ç a a s e g u n
d a m e ta d e d a c a r ta e x o r t a n d o s e u s le i to
r e s g e n t io s a “a n d a r c o m o é d ig n o ” ( 4 .1 ;
v e ja co m e n tá r io s) d e su a ch a m a d a e m Cristo.
N a s e ç ã o q u e e s ta m o s c o n s id e r a n d o
( 4 .1 7 — 5 .2 1 ) , P a u lo a d o ta a m e tá fo r a “a n
d a r ” (peripateo) c o n s id e r a n d o -a c o m o e s
s e n c ia l à u m a v id a cris tã . E le e m p r e g a e s s a
p a la v ra d e fo r m a n e g a t iv a e m 4 .1 7 (d u a s
v e z e s ) — “n ã o a n d e is m a is c o m o a n d a m
ta m b é m o s o u tro s g e n t io s ” e , e m se g u id a ,
d e fo rm a p o s itiv a (trê s v e z e s ) — “a n d a i e m
a m o r” (5 .2 ) , “a n d a i c o m o filh o s d a lu z ” (5 .8 )
e “a n d a r c o m o s á b io s ” ( 5 .1 5 ) . P a u lo ta m
b é m a d o ta o c o n tr a s te e n tr e “e n tã o e a g o
r a ” d e 2 .1 -2 2 , is to é , e n tr e o q u e o s g e n t io s
e r a m e c o m o v iv ia m a n te s d a c o n v e r s ã o ,
e m c o n tr a s te c o m su a fo rm a d e v id a to ta l
m e n te n o v a , e m C ris to , a p ó s a c o n v e r s ã o .
E s s e c o n t r a s te e n tr e “a n te s e d e p o is ”
à s v e z e s s e s o b r e p õ e , m a s é a m p la m e n
te d e s c r i to d e q u a tr o m a n e ir a s : v iv e r n o
e n g a n o v e r s u s v iv e r d e a c o r d o c o m a
“v e r d a d e q u e e s tá e m J e s u s ” ( 4 .2 1 ; is to é ,
4 .1 7 - 1 9 ,2 1 - 2 5 , 2 8 ) ; v iv e r u m e s t i lo d e v id a
p e c a m in o s o v e r s u s te r u m a n o v a h u m a
n id a d e c r ia d a à s e m e lh a n ç a d e D e u s e m
ju s t iç a e s a n t id a d e ( 4 .2 0 — 5 .7 ) ; c a m in h a r
n a e s c u r id ã o m o r a l e e s p ir itu a l d o m a n
d o a o s e u r e d o r v e r s u s v iv e r c o m o f ilh o s
d a lu z (5 .8 -1 4 ) ; e f in a lm en te , v iv er d e a c o rd o
c o m a in s e n s a te z d o m u n d o o u v iv e r d e
a c o r d o c o m o s c a m in h o s d a s a b e d o r ia d e
D e u s ( 5 .1 5 - 2 1 ) .
7.1. Deixar de Viver de Acordo
com a Personalidade
Anterior (Natureza
Pecaminosa) (4.17-19)
P a u lo in s is te c o m s e u s le i to r e s g e n t i
o s : “n ã o a n d e is m a is c o m o a n d a m ta m
1245
EFÉSIO S 4
b é m o s o u t r o s [n ã o r e g e n e r a d o s ] g e n t i
o s ” ( 4 .1 7 ) , c o m s e u e s t i lo d e v id a p a g ã o .
O m a is n o t á v e l a q u i é a ê n f a s e q u e P a u
lo c o lo c a n o p e n s a m e n to d o s g en tio s . A q u e
le s q u e n ã o fo r a m s a lv o s s e c a r a c te r iz a m
p o r t e r p e n s a m e n t o s fú te is , in t e l ig ê n c ia
o b s c u r e c id a e ig n o r â n c ia e s p ir itu a l . E m
c o n t r a s t e c o m a e s c u r id ã o e a ig n o r â n
c ia d o s p a g ã o s in c r é d u lo s , “a v e r d a d e e m
J e s u s ” ( 4 .2 1 ) fo i e n s in a d a a o s c r e n t e s ; e
e m c o n t r a s t e c o m a f u t i l id a d e d e s e u
p e n s a m e n t o , a s m e n t e s d o s c r e n t e s f o
r a m “r e n o v a d a s ” ( 4 .2 3 ) .
P e s s o a s n ã o r e g e n e r a d a s , q u e v iv e m
d e a c o r d o c o m su a n a tu r e z a p e c a m i n o
s a , s ã o c a r a c te r iz a d a s p e la “f u t i l id a d e ”
d e s e u “p e n s a m e n to ” o u “m e n te s ” (N A SB ;
N K JV ; N R S V ). E m b o r a a “fu t i l id a d e ” à s
v e z e s e s te ja a s s o c ia d a à id o la tr ia n o N o v o
T e s t a m e n t o , “a r e f e r ê n c ia p r in c ip a l a q u i
é a n o ç ã o d e ‘n ã o s e r v ir p a r a n a d a ’ (N E B )
s u b ja c e n t e a u m c o m p o r t a m e n t o ir r e s
p o n s á v e l” (W o o d , 6 1 ) . P e n s a m e n to s fú
t e is , u m a in t e l ig ê n c ia o b s c u r e c id a ( e m
b o r a à s v e z e s b r i lh a n t e e m s e u Q u o c i -
e n t e d e I n te l igê n c ia [Q I] o u n a a p r e n d i
z a g e m ) , e ig n o r â n c ia e s p ir i tu a l , c o m e
ç a m c o m u m a r e je i ç ã o d e l ib e r a d a d a lu z
m o r a l e d a v e r d a d e c o n h e c id a a r e s p e i
to d e D e u s ( c f . R m 1 .1 8 - 2 3 ) .
D e n tr o d a e s p ir a l d e s c e n d e n te d e u m a
v id a d ep ra v a d a as e ta p a s m e n c io n a d a s a q u i
s ã o a s s e g u in te s : P r im e ir o v e m a “d u r e z a
d o c o r a ç ã o ” ( 4 .1 8 c ) , q u e r e s u lta e m u m a
“ig n o râ n c ia ” arra ig ad a (4 .1 8 b ) . E m seg u id a ,
g e n t io s d e p r a v a d o s s ã o “e n t e n e b r e c id o s
n o e n t e n d i m e n t o ” [ in t e le c t o , N A S B ] e
“s e p a r a d o s d a v id a d e D e u s ” ( 4 .1 8 a ) . F i
n a lm e n te , p e r d e m “to d o o s e n t im e n to ” (o u
s e n s ib i l id a d e ) m o r a l ( 4 .1 9 a ) e “s e e n tr e
g a m à d is s o lu ç ã o , p a r a , c o m a v id e z , c o
m e te re m to d a im p u rez a ” (4 .1 9 ). N ad a jam ais
s a t is fa z s u a a lm a e s e u s p e r v e r s o s d e s e
jo s . S to tt r e s u m e a s p a la v ra s d e P a u lo (1 7 7 ) :
“A d u re z a d o c o r a ç ã o le v a , p r im e ira m e n te ,
à e s c u r id ã o d a m e n te , d e p o is à m o r te d a
a lm a s o b o ju lg a m e n to d e D e u s , e f in a l
m e n te à in d iferen ça p e la vida. T e n d o p erd id o
to d a s e n s ib i l id a d e , a s p e s s o a s p e r d e m
ta m b é m to d o o a u to c o n tr o le . E s s a é e x a
ta m e n te a s e q ü ê n c ia d e s c r ita p o r P a u lo
e m R o m a n o s 1 .1 8 - 3 2 ”.
7.2. Começara Viver de
Acordo com a Nova
Personalidade em Cristo
(4.20-24)
P a u lo fa z a g o r a u m c o n tr a s te e n tr e a
a n t ig a p e r s o n a l id a d e p e c a m in o s a d o e s
t ilo d e v id a d o s g e n t io s ( 4 .2 2 ) e s e u “n o v o
h o m e m ” q u e , e m C r is to , fo i c r ia d o e s p i
ritu al e m o r a lm e n te à s e m e lh a n ç a d e D e u s
“e m v e rd a d e ir a ju s tiç a e sa n tid a d e ” ( 4 .2 4 ) .
E n q u a n to o s g e n t io s n ã o r e g e n e r a d o s s ã o
c a r a c te r iz a d o s p e la s tre v a s d a ig n o r â n c ia ,
in s e n s ib il id a d e e u m n e g l ig e n te e s t i lo d e
v id a ( 4 .1 7 - 1 9 ) , o s c r e n t e s g e n t io s “n ã o
a p r e n d e r a m a s s im a C r is to ” ( 4 .2 0 ) . P o r
tan to , se u c o ra ç ã o n ã o está m ais o b scu re c id o
e s u a v id a n ã o m a is s e c a r a c te r iz a p e la
a l ie n a ç ã o , im p u r e z a e s e n s u a lid a d e .
E s s a d ra m á tic a t r a n s fo r m a ç ã o o c o r r e u
p e lo fa to d e t e r e m “c o n h e c id o a C r is to ”
(N A S B , N K JV , N R S V ), “o u v id o a C r is to ” e
s id o “e n s in a d o s p o r C r is to ” ( 4 .2 0 ,2 1 ) .
1) A exp ressão “co nh ecid o [emathete] a Cristo”
significa ter sido d iscipulado ( mathetes) em
Cristo, em seu s p ad rões de pureza m oral,
ten d o -o co m o Senhor.
2) A ex p re ssã o seg u in te (litera lm ente , “o u
v id o a C risto”) sig n ifica q u e , através da
p re g a çã o d o E v angelho , os g en tios c o n
vertidos ouviram a voz de Cristo.
3 ) Foram “en sin ad o s p o r C risto” para a nova
esfera d e sua vida. Stott (1 7 9 ) ob serv a qu e
“qu an d o Je s u s Cristo é ao m esm o tem p o
o su je ito e o o b je to , e o am bien te d e en si
n am en to s m orais já fo i co n ced id o , p o d e
m os co n fia r q u e este é verd ad eiram en te
cris tão ”.
O v e rs o 21 a c re s c e n ta q u e a v e rd a d e está
e m je s u s . G e r a lm e n te , P a u lo n ã o s e r e f e
re a C ris to p o r s e u n o m e h is tó r ic o , e o fa to
d e fa z ê - lo a q u i a f ir m a fo r te m e n te q u e o
C ris to d a fé é o p r ó p r io J e s u s d a h is tó r ia ,
q u e é a p e r s o n if ic a ç ã o d a v e rd a d e 0 o 1 4 .6 ) .
E x is te m d u a s v e r d a d e s fu n d a m e n ta is
e m r e la ç ã o a o q u e o s g e n t io s c o n v e r t id o s
a p re n d e ra m e fo ra m d iscip lin ad o s e m C risto
(m u ito s d e le s p e lo p r ó p r io P a u lo m u ito s
a n o s a n te s d e s ta e p ís to la ) :
1) Na conversão, o crente se despoja “do velho
h o m em , q u e se co rro m p e p elas co n cu p is-
cê n c ia s d o e n g a n o ” (v. 22). Essa transfor-
1246
EFÉSIO S 4
b é m o s o u t r o s [n ã o r e g e n e r a d o s ] g e n t i
o s ” ( 4 .1 7 ) , c o m s e u e s t i lo d e v id a p a g ã o .
O m a is n o t á v e l a q u i é a ê n f a s e q u e P a u
lo c o lo c a n o p e n sa m e n to d o s g en tio s . A q u e
le s q u e n ã o fo r a m s a lv o s s e c a r a c te r iz a m
p o r te r p e n s a m e n t o s fú te is , in t e l ig ê n c ia
o b s c u r e c id a e ig n o r â n c ia e s p ir itu a l . E m
c o n t r a s t e c o m a e s c u r id ã o e a ig n o r â n
c ia d o s p a g ã o s in c r é d u lo s , “a v e r d a d e e m
J e s u s ” ( 4 .2 1 ) f o i e n s in a d a a o s c r e n t e s ; e
e m c o n t r a s t e c o m a f u t i l id a d e d e s e u
p e n s a m e n t o , a s m e n t e s d o s c r e n t e s f o
ra m “r e n o v a d a s ” ( 4 .2 3 ) .
P e s s o a s n ã o r e g e n e r a d a s , q u e v iv e m
d e a c o r d o c o m s u a n a tu r e z a p e c a m i n o
s a , s ã o c a r a c te r iz a d a s p e la “fu t i l id a d e ”
d e s e u “p e n s a m e n to ” o u “m e n te s ” (N A SB ;
N K JV ; N R S V ). E m b o r a a “f u t i l id a d e ” à s
v e z e s e s te ja a s s o c ia d a à id o la tr ia n o N o v o
T e s t a m e n t o , “a r e f e r ê n c ia p r in c ip a l a q u i
é a n o ç ã o d e ‘n ã o s e r v ir p a ra n a d a ’ (N E B )
s u b ja c e n t e a u m c o m p o r t a m e n t o ir r e s
p o n s á v e l” (W o o d , 6 1 ) . P e n s a m e n to s fú
t e is , u m a in t e l ig ê n c ia o b s c u r e c id a ( e m
b o r a à s v e z e s b r i lh a n te e m s e u Q u o c i -
e n t e d e I n te l ig ê n c ia [Q I] o u n a a p r e n d i
z a g e m ) , e ig n o r â n c ia e s p ir i tu a l , c o m e
ç a m c o m u m a r e je i ç ã o d e l ib e r a d a d a lu z
m o r a l e d a v e r d a d e c o n h e c id a a r e s p e i
to d e D e u s ( c f . R m 1 .1 8 - 2 3 ) .
D e n tr o d a e s p ir a l d e s c e n d e n te d e u m a
v id a d e p ra v a d a a s e ta p a s m e n c io n a d a s aq u i
s ã o a s s e g u in te s : P r im e ir o v e m a “d u r e z a
d o c o r a ç ã o ” ( 4 .1 8 c ) , q u e r e s u lta e m u m a
“ig n o râ n c ia ” arra ig ad a ( 4 .1 8 b ) . E m seg u id a ,
g e n t io s d e p r a v a d o s s ã o “e n t e n e b r e c id o s
n o e n t e n d i m e n t o ” [ in t e le c t o , N A S B ] e
“s e p a r a d o s d a v id a d e D e u s ” ( 4 .1 8 a ) . F i
n a lm e n te , p e r d e m “to d o o s e n t im e n to ” (o u
s e n s ib i l id a d e ) m o r a l ( 4 .1 9 a ) e “s e e n tr e
g a m à d is s o lu ç ã o , p a r a , c o m a v id e z , c o
m e te re m to d a im p u rez a ” (4 .1 9 ). N ad a jam ais
s a t is fa z s u a a lm a e s e u s p e r v e r s o s d e s e
jo s . S to tt re s u m e as p a la v ra s d e P a u lo (1 7 7 ) :
“A d u re z a d o c o r a ç ã o le v a , p r im e ira m e n te ,
à e s c u r id ã o d a m e n te , d e p o is à m o r te d a
a lm a s o b o ju lg a m e n to d e D e u s , e f in a l
m e n te à in d iferen ça p ela vida. T e n d o p erd ido
to d a s e n s ib i l id a d e , a s p e s s o a s p e r d e m
ta m b é m to d oo a u to c o n tr o le . E s s a é e x a
ta m e n te a s e q ü ê n c ia d e s c r ita p o r P a u lo
e m R o m a n o s 1 .1 8 - 3 2 ”.
7.2. Começara Viver de
Acordo com a Nova
Personalidade em Cristo
(4.20-24)
P a u lo fa z a g o r a u m c o n tr a s te e n tr e a
a n t ig a p e r s o n a l id a d e p e c a m in o s a d o e s
t ilo d e v id a d o s g e n t io s ( 4 .2 2 ) e s e u “n o v o
h o m e m ” q u e , e m C r is to , fo i c r ia d o e s p i
ritu al e m o r a lm e n te à s e m e lh a n ç a d e D e u s
“e m v e rd a d e ir a ju s tiç a e s a n tid a d e ” ( 4 .2 4 ) .
E n q u a n to o s g e n t io s n ã o r e g e n e r a d o s s ã o
c a r a c te r iz a d o s p e la s tre v a s d a ig n o r â n c ia ,
in s e n s ib il id a d e e u m n e g l ig e n te e s t i lo d e
v id a ( 4 .1 7 - 1 9 ) , o s c r e n t e s g e n t io s “n ã o
a p r e n d e r a m a s s im a C r is to ” ( 4 .2 0 ) . P o r
tanto , se u c o ra ç ã o n ã o está m ais o b scu re c id o
e s u a v id a n ã o m a is s e c a r a c te r iz a p e la
a l ie n a ç ã o , im p u r e z a e s e n s u a lid a d e .
E s s a d ra m á tic a tr a n s fo r m a ç ã o o c o r r e u
p e lo fa to d e t e r e m “c o n h e c id o a C r is to ”
(N A S B , N K JV , N R S V ), “o u v id o a C r is to ” e
s id o “e n s in a d o s p o r C r is to ” ( 4 .2 0 ,2 1 ) .
1) A exp ressão “con h ecid o [emathete] a Cristo”
significa ter sido d iscipulado (mathetes) em
Cristo, em seu s p ad rõ es de p u reza m oral,
ten d o -o co m o Senhor.
2) A ex p re ssã o segu in te (litera lm ente , “o u
v id o a C risto”) sig n ifica q u e , através da
p re g a ç ã o d o E v an gelho , o s gen tios c o n
vertidos ouviram a voz de Cristo.
3 ) Foram “en sin ad os p o r C risto” para a nova
esfera d e sua vida. Stott (1 7 9 ) ob serv a qu e
“qu an d o Je su s Cristo é ao m esm o tem p o
o su je ito e o o b je to , e o am b ien te de en si
nam en to s m orais já fo i co n ced id o , p o d e
m os co n fiar q u e este é v erd ad eiram en te
cris tã o ”,
O v e rs o 21 a c re s c e n ta q u e a v e rd a d e está
e m J e s u s . G e r a lm e n te , P a u lo n ã o s e r e f e
r e a C ris to p o r s e u n o m e h is tó r ic o , e o fa to
d e fa z ê - lo a q u i a f ir m a fo r te m e n te q u e o
C ris to d a f é é o p r ó p r io J e s u s d a h is tó r ia ,
q u e é a p e r s o n ific a ç ã o d a v e rd a d e 0 o 1 4 .6 ) .
E x is te m d u a s v e r d a d e s fu n d a m e n ta is
e m r e la ç ã o a o q u e o s g e n t io s c o n v e r t id o s
a p re n d e ra m e fo ra m d iscip lin ad o s e m C risto
(m u ito s d e le s p e l o p r ó p r io P a u lo m u ito s
a n o s a n te s d e s ta e p ís to la ) :
1) Na conversão, o crente se despoja “do velho
h o m em , q u e se co rro m p e p elas co n cu p is-
cên cia s do e n g a n o ” (v. 22). Essa transfor
1246
EFÉSIO S 4
m ação o co rre através d e um a id en tifica
ção p o r fé co m a m orte, sep u ltam en to e
ressu rre ição de Cristo, testem u nh ad a p e
las águas do batism o (cf. R m 6.2-7 ; C13.9.10).
A “v elh a p erso n a lid a d e” n ão será m elh o
rada ou ap erfeiço ad a. D ev erá m orrer e ser
sep ultad a p ara q u e um a vida to ta lm en te
nova possa emergir. D e acordo com a ordem
de D eu s, a m orte p re ce d e a vida, e a cru
c ifica çã o p re ced e a ressurreição .
2) Na co n v ersão , o cre n te d eve se “revestir
do n o v o h o m em , q u e , seg u n d o D eu s, é
criad o em verd adeira ju stiça e santidade
(v. 24). O ab an d o n o de no ssa natureza p e-
cad ora e corru p ta se a ssem elh a à rem o
çã o d e um a vestim enta im u nda q u e n ão
serve p ara nada a n ão ser p ara a d estrui
ção . A a d o çã o de um a nova natu reza, em
Cristo (a vida da ressurreição), se assem elha
a co locar uma vestimenta inteiram ente no va.
P au lo se re fere , literalm ente , ao q u e éra
mos antes e depois da conversão com o “velho
h o m em ” e “n o v o h o m em ”, sen d o q u e o
prim eiro é “d ecrép ito , d efo rm ad o e in cli
nad o à co rru p çã o ”, e n q u an to o ú ltim o é
“um no v o h o m em , ren o v ad o , b e lo e v ig o
ro so ” (Stott, 181). O antigo era d om inado
p o r lascív ia p ecam in o sa , en qu an to o no v o
fo i criad o de aco rd o co m a “ju stiça e san
tid a d e”.
E s s a é a fo r m a c o m o o s le i to r e s g e n t i
o s d e P a u lo “c o n h e c e r a m a C r is to ” e f o
r a m “e n s in a d o s n E le ” . A l in h a d e d e m a r
c a ç ã o e n tr e a a n t ig a v id a d e p e c a d o e a
n o v a v id a e m C ris to d e v e se r b a s ta n te c la ra
e d e c is iv a . N o e n ta n to , e s s e p r o c e s s o ta m
b é m e n v o lv ia , c o n f o r m e in d ic a d o p e lo
t e m p o p r e s e n t e d e “d e s p o ja r ” e “r e v e s
t ir ”, o q u e P a u lo d e s c r e v e c o m o s e n d o a
r e n o v a ç ã o n o “e s p ír i to [pneum a , e s p ír i
t o 7] d o s e n t id o ”, o u d o e n te n d im e n to (v .
2 3 ) . A r e n o v a ç ã o d a m e n te é u m a o b r a
d o E s p ír ito S a n to , p e la q u a l n o s s o fú til
p e n s a m e n t o a n te r io r e n o s s o o b s c u r e c i -
d o in t e le c t o s ã o t r a n s fo r m a d o s p a r a q u e
p o s s a m o s s e r e n v o lv id o s p e la fo r m a d e
p e n s a r d e C r is to . U m a c o n t ín u a e d iá r ia
“r e n o v a ç ã o in te r io r d e n o s s a s m a n e ir a s
o c o r r e a o n o s to r n a r m o s c r is tã o s ” (S to tt ,
1 8 2 ) . P e lo fa to d e o s c r e n t e s s e r e m n o
v a s c r ia tu r a s e m C r is to , n ã o p o d e m m a is
“v iv e r c o m o o s g e n t io s [n ã o r e g e n e r a d o s ]”
( 4 .1 7 ) , s o b r e o s q u a is P a u lo s e a lo n g a n a
e x p o s iç ã o q u e s e s e g u e .
7.3■ Viverem Justiça como
uma Nova Criatura
(4 .2 5 -3 2 )
T e n d o fe ito o c o n tr a s te e n tr e a a n tig a
p e r s o n a lid a d e s o b a in flu ê n c ia d e su a n a
tu re z a p e c a m in o s a , e a n o v a q u e fo i cria d a
à se m e lh a n ç a d e D e u s , P a u lo c o m e ç a a g o ra
a d escrev er n a prática as a ç õ e s d a n o v a criatura
e m C ris to , e m te r m o s d e u m a v id a ju sta :
“P e lo q u e ” ( 4 .2 5 ) e x is te u m a p o n te “e n tr e
o s p r in c íp io s e a p r á t ic a ” (W o o d , 6 4 ) . A o
o b serv ar o s c in c o e x e m p lo s p ráticos d e P au lo
a r e s p e ito d e u m a v id a ju s ta , v e m o s q u e
to d o s co m p a rtilh a m d o is a s p e c to s c o m u n s :
e s tã o d ir ig id o s a o n o s s o r e la c io n a m e n to
c o m o u tra s p e s s o a s e c a d a u m d e le s e n
v o lv e p r o ib iç õ e s n e g a tiv a s q u e s ã o c o n tra
b a la n ç a d a s p o r m a n d a m e n to s p o s itiv o s .
7.3-1. Deixar a Mentira e Falar a Ver
dade (4.25). D e ix a r a “m e n t ir a ” e “fa la r
a v e r d a d e ” e s tá d e a c o r d o c o m o q u e s o
m o s e m C r is to , p o is a “v e r d a d e .. . e s tá e m
J e s u s ” ( 4 .2 1 ) . O s c r e n te s d e v e m r e n u n c i
a r “à s m e n t ir a s ” d e S a ta n á s (c f . R m 1 .2 5 )
e a to d a s a s m e n tir a s m e n o r e s d a a n t ig a
p erso n a lid ad e, e seu fa lar d e v e co rre sp o n d e r
“à v e r d a d e ” d e C r is to . E s s e m a n d a m e n to
s ig n if ic a , e m p rim e iro lu g ar, q u e d e v e m o s
fa la r a v e r d a d e c o m n o s s o s s e m e lh a n te s
a q u e m D e u s n o s de te r m in o u q u e a m e
m o s . E m a is a in d a , d e v e m o s n o s r e la c io
n a r d e m o d o v e r d a d e ir o e c o n f iá v e l “c o m
to d o s o s m e m b ro s d o c o rp o ú n ico [de Cristo]”
c o m o a fa m ília d a fé . S e n ã o fo r a ss im , se rá
im p o s s ív e l e s t a b e le c e r a c o n f ia n ç a , e o
v e rd a d e iro re la c io n a m e n to da co m u n id a d e
s e r o m p e r á .
“E n g a n o s frau d u len to s” (4 .1 4 ) e “ca lú n ias”
(o u fa ls id a d e ) s ã o o b r a s d o in im ig o p a ra
m in a r a u n id a d e d o E s p ír ito n o c o r p o d e
C r is to e , p o r ta n to , n ã o d e v e m s e r p e r m i
tid as d e n tro d a c o m u n h ã o d a Ig re ja . C o m o
fo i o b s e r v a d o p o r S to tt ( 1 8 5 ) : “A c o m u
n h ã o é c o n s tr u íd a s o b r e a c o n f ia n ç a , e a
c o n f ia n ç a é c o n s tr u íd a s o b r e a v e r d a d e .
P o r ta n to , a c a lú n ia o u a fa ls id a d e c o r r o
e m a c o m u n h ã o e n q u a n t o a v e r d a d e a
f o r ta le c e ”. E s s e v e r s o n ã o r e c o m e n d a q u e
1247
EFÉSIO S 4
a s p e s s o a s s e ja m r u d e s n o fa la r , p o is ta l
fo r m a d e e x p r e s s ã o t a m b é m p o d e s e r
p re ju d ic ia l a o s r e la c io n a m e n to s d e n tr o d a
c o m u n id a d e c r is tã .
7.3.2. Não Pecar pela Ira (4.26-27).
M u ita s t r a d u ç õ e s in te r p r e ta m e s s a f r a
s e c o m o u m m a n d a m e n to — “I r a i - v o s e
n ã o p e q u e is ” (N K JV , N A SB, N R S V )— c o m o
s e P a u lo e s t iv e s s e e n c o r a ja n d o u m a ira
ju s ta , o q u e e s ta r ia m u ito d is ta n te d e s e u
p e n s a m e n t o n e s s e c o n t e x t o o n d e , n a
v e r d a d e , e x i s t e u m a a d v e r t ê n c ia a r e s
p e i t o d o p e c a d o d a ira ( c f . 4 .3 1 ) . O p e n
s a m e n to d e P a u lo é : “S e v o c ê s e irar, to m e
c u id a d o ! V o c ê e s tá à s p o r ta s d o p e c a d o !”
T u r n e r a c r e s c e n ta ( 1 2 4 0 ) : “S e n o o c id e n te
a ir a é c o n s id e r a d a u m s in a l d e m a s c u
lin id a d e , a tra d iç ã o ju d a ic a e s tá m a is c o n s
c i e n t e d e s e u p o d e r d e m o n ía c o , d iv is o r
e c o r r u p to r . .. A ira , e s e u s p e c a d o s c o r r e -
la to s n o s v e r s o s 2 9 e 3 1 , r e p r e s e n ta m o
e x e m p l o d e p e c a d o s s o c ia lm e n t e d e s
t r u id o r e s e a l ie n a d o r e s , t ã o c a r a c t e r í s
t i c o s d a a n t ig a c r i a ç ã o ” .
D e s s a fo r m a , P a u lo c o lo c a trê s r e s tr i
ç õ e s à ira, ca d a u m a d elas ch a m a n d o a te n çã o
a s e u p e r ig o p o te n c ia l :
1) “N âo p eq u eis” (4 .26a) indica qu e a ira leva
facilm ente a p ecar em outras áreas tais com o
orgu lho egoísta , m aldade, v ingan ça, ódio,
v io lên cia e até m esm o aos assassinatos (cf.
Mt 5 .2 1 ,2 2 ).
2 ) “Não se ponha 0 sol sobre a vossa ira” (4 .26b)
su g ere q u e se ‘as co n ta s n ão forem rap i
d am en te a ju stad as’, a ira levará à am argu
ra e à d estru ição d os re lacion am en to s.
3) “N ão deis lugar ao d iab o" (4 .2 7 ) p rev ine
ind iretam en te q u e a ira p o d e facilm en te
abrir um a porta d e op ortu n id ad e para o
D iab o , d an d o -lh e lu gar p ara op erar. O s
co m e n tá r io s d e J . A. B e n g e l fa z em um
ex c e le n te resu m o d essa p assag em : “A ira
n ão é nem ord en ad a, nem totalm ente proi
bida; porém , e isto é uma ordem: Não permita
q u e o p e ca d o se introdu za na ira; esta é
co m o o v en en o qu e às vezes é u sado co m o
rem édio, m as qu e deve ser controlad o com
o m aio r cu id ad o ” (c itad o p o r E arle, 317).
O m aior an tíd oto contra o v e n e n o de um
co m p o rtam en to qu e é to leran te qu anto à
p ró p ria ira, é e x e rc ita r -se na p rá tica da
m isericórd ia (4 .3 2 ).
7.3.3. Abandonar o Roubo e Traba
lhar Diligentemente (4.28). U m d o s
p r in c íp io s é t ic o s m a is e le m e n t a r e s é o
m a n d a m e n to d e n ã o r o u b a r ( Ê x 2 0 .1 5 ;
M c 1 0 .1 9 ; R m 1 3 -9 ) . P a u lo m e n c io n a o s
l a d r õ e s e n tr e a q u e le s t r a n s g r e s s o r e s q u e
n ã o “h e r d a r ã o o r e in o d e D e u s ” (1 C o
6 .1 0 ) . Q u a n d o u m la d r ã o s e c o n v e r te ,
a t r a v é s d a f é e m C r is to , n ã o d e v e a p e
n a s a b a n d o n a r o r o u b o , m a s t a m b é m
a p r e n d e r a t r a b a lh a r c o m d il ig ê n c ia “fa
z e n d o c o m a s m ã o s o q u e é b o m ”, o u
b e n é f ic o (c f . 4 .2 9 ) a f im d e s e to r n a r c a p a z
d e “r e p a r t ir c o m o q u e t iv e r n e c e s s i d a
d e ” . O s v e r d a d e ir o s c r e n t e s d e d ic a m -s e
a o t r a b a lh o h o n e s to e n ã o e n g a n a m s e u s
e m p r e g a d o r e s o u e m p r e g a d o s ; c o m p a r
t i lh a m a o in v é s d e a c u m u la r e m b e n s à s
o c u lta s , e d e m o n s t r a m u m e s p ír i to g e
n e r o s o e n ã o g a n a n c io s o .
N a c o n v e r s ã o , a b a n d o n a r o “v e l h o ” e
n ã o r e g e n e r a d o e s t i lo d e v id a , q u e s e
a p r o v e ita d o s o u tr o s e m b e n e f í c io p r ó
p r io ( 4 .2 2 ) , s ig n if ic a v e s t ir - s e d a “n o v a ”
v id a r e g e n e r a d a e m C r is to , o n d e d is tr i
b u ím o s g e n e r o s a e a le g re m e n te a q u ilo q u e
e s tá fa lta n d o n a v id a d o s s e m e lh a n te s (c f .
2 C o 8 .1 4 ) . A t r a n s fo r m a ç ã o d a c o n d u ta
e x te r io r é d e m o n s tr a d a p o r u m a t r a n s fo r
m a ç ã o n o c o r a ç ã o . S o m e n te C ris to “p o d e
tra n sfo rm a r u m a ssa ltan te e m u m b e n fe ito r”
(S to tt , 1 8 8 ) .
7-3.4. Deixar a Linguagem e as Con
versas Imorais e Falar Palavras Edi
ficantes (4.29-30). P a u lo p a s s a d a fo rm a
c o m o u s a m o s n o s s a s m ã o s p a r a a f o r
m a c o m o u s a m o s n o s s o s lá b io s . P a la
v r a s o u c o n v e r s a s im o r a is , p o u c o e d i f i
c a n t e s o u p e c a m i n o s a s n ã o d e v e m s a ir
d a b o c a d e a lg u é m q u e p r o c la m a C r is
to J e s u s c o m o S e n h o r . “P a la v r a t o r p e ”
in c lu i q u a lq u e r t ip o d e c o n v e r s a ç ã o q u e
se ja p re ju d ic ia l o u q u e tra g a d a n o a o u tra s
p e s s o a s . O l iv r o d e P r o v é r b io s a f ir m a
q u e p e s s o a s c o m d is c e r n im e n t o “r e tê m
a s s u a s p a la v r a s ” ( P v 1 7 .2 7 ) , m a s q u e
“a b o c a d o t o lo é a s u a p r ó p r ia d e s t r u i
ç ã o ” ( 1 8 .7 ) . A f o r m a c o m o f a la m o s r e
p r e s e n t a u m a s o l e n e r e s p o n s a b i l id a d e
p o r q u e :
1) “A m orte e a vida estão no p o d er da lín
g u a” (Pv 1 8 .2 1 ) e
1248
EFÉSIO S 4
2) de “tod a p alavra o c io sa q u e o s h o m en s
d isserem h ão de dar co nta no D ia do Ju íz o ”
(Mt 12 .36 ).
P ortanto , P au lo c o n c la m a to d o s o s cren tes
a fa la r e m “s ó a [p a la v ra ] q u e f o r b o a p a r a
p r o m o v e r a e d if i c a ç ã o , p a r a q u e d ê g r a
ç a a o s q u e a o u v e m ” (4 .2 9 ) . E n q u a n to u m a
fala n ã o san tificad a te n d e a d estruir o u infligir
a m o r te a o s d e m a is , p a la v r a s e d if ic a n te s
s ã o b e n é f ic a s ( l i t e r a lm e n te , d ã o g r a ç a )
à q u e le sq u e a s o u v e m . E m C o lo s s e n s e s
4 .6 , P a u lo ig u a lm e n te e x o r ta a o s c r e n te s
d iz e n d o : “A v o s s a p a la v r a s e ja s e m p r e
a g r a d á v e l , te m p e r a d a c o m sa l, p a r a q u e
sa ib a is c o m o v o s c o n v é m r e s p o n d e r a ca d a
u m ”. N ã o s e p o d e fu g ir à e s s a o b s e r v a
ç ã o d e P a u lo : “S e s o m o s n o v a s c r ia tu r a s
e m C r is to , d e v e m o s d e s e n v o lv e r u m p a
d rã o d e c o n v e r s a ç ã o c o m p le ta m e n te n o v o ”
(S to t t , 1 8 8 ) .
O v e r s o 3 0 a p r e s e n ta u m a s o le n e in
t e r r u p ç ã o . N o in íc io d o c a p ítu lo 4 , P a u lo
c o n c la m o u o s c r e n t e s a a n d a r e m “c o m o
é d ig n o d a v o c a ç ã o c o m q u e fo r a m c h a
m a d o s ” ( 4 .1 ) e a p r o c u r a r e m “g u a r d a r a
u n id a d e d o E s p ír ito ” ( 4 .3 ) c o m o o ú n ic o
c o r p o d e C risto . P e lo fa to d o s p e c a d o s q u e
P a u lo v e m d e s c r e v e n d o d e s d e 4 .2 5 s e r e m
in c o m p a tív e is c o m a n o s s a c h a m a d a e m
C r is to , e d e s tr u ír e m o s r e la c io n a m e n t o s
e a u n id a d e d o c o r p o d e C r is to , p e r m a
n e c e r n e le s d e lib e r a d a m e n te “e n tr is te c e rá
o S a n to E s p ír ito d e D e u s ” ( F e e , 7 1 4 ) . E s s a
p e r m a n ê n c ia v o lu n tá r ia n o p e c a d o p o c le
s e r r e la c io n a d a a o p e c a d o d e Is r a e l d e s
crito e m Isaías 6 3 .1 0 , e à c o n s e q ü e n te tristeza
s e n t id a p e lo E s p ír ito S a n to p o r s e u c a r á
te r e s p e c í f ic o , u m a v e z q u e E le é “a q u e le
E sp ír ito q u e é ca ra c te r iz a d o p e la sa n tid a d e
e q u e é o p r ó p r io D e u s o p e r a n d o n o s
c r e n t e s ” (L in c o ln , 3 0 7 ) .
B a r th ( 2 .5 5 0 ) v ê e x p r e s s a a q u i a s u b ja
c e n te p o s s ib i l id a d e d a q u e le s q u e e n tr is
t e c e r a m o E s p ír ito S a n to s e to r n a r e m p r i
v a d o s d a fu tu ra re d e n ç ã o p e lo fa to d e te re m
p e r m a n e c id o n o p e c a d o .
E m 4 .3 0 , o b s e r v e a ê n fa s e q u e é d a d a
a o p a p e l d o E s p ír ito S a n to c o m o u m s e lo
d a a u te n tic a ç ã o d e D e u s , c o m o q u a l s o m o s
s e la d o s “p a r a o D ia d a r e d e n ç ã o [fin a l]”
(c f . 1 .1 3 ,1 4 ) . D e v e m o s o b s e r v a r ta m b é m
q u e e n tr is te c e r o E s p ír ito S a n to p o d e (à
lu z d e o u tr a s p a s s a g e n s d o N o v o T e s ta
m e n t o ) le v a r p r o g r e s s iv a m e n te a o e n d u
r e c im e n t o d o c o r a ç ã o (H b 3 -8 , 1 3 ,1 4 ) , à
r e s is tê n c ia a o S a n to E s p ír ito (A t .7 .5 1 ) , à
e x t in ç ã o d o E s p ír ito (1 T s 5 .1 9 ) e a té a o
a g r a v o a o E s p ír ito d a g r a ç a (H b 1 0 .2 9 ) e
à b la s fê m ia c o n tr a E le (M t 1 2 .3 1 ) . A s c o n
s e q ü ê n c ia s e t e r n a s d e s s e ú l t im o e s t ã o
e s p e c ia lm e n t e c la r a s n a s E s c r itu ra s . P a ra
e v ita r o s p r im e ir o s p a s s o s n e s s e p r o c e s
s o d e e n d u r e c im e n to , n ó s , c o m o c r e n te s
t e m e n te s a D e u s , d e v e m o s n o s d is ta n c i
a r d e to d o s o s p e c a d o s q u e p o s s a m e n
t r is te c e r o s e u S a n to E s p ír ito .
7-3.5- Deixar a Malícia e Perdoar
(4.31,32). P a u lo c o n c lu i s e u c o n ju n to d e
c in c o a t itu d e s e c o m p o r ta m e n to s n e g a
t iv o s (a t i tu d e s e c o m p o r ta m e n to s p e c a
m in o s o s ) , e p o s it iv o s , in ic ia d o e m 4 .2 5 .
O s n e g a t iv o s in d ic a m u m a fo r m a d e v id a
d a q u a l o s c r e n te s d e v e m s e “d e s p o ja r ”
p o r p e r te n c e r e m a u m a n o v a h u m a n id a
d e e m C ris to (4 .2 2 ) , e n q u a n to a s r e c o m e n
d a ç õ e s p o s it iv a s e n v o lv e m u m a t r a n s fo r
m a ç ã o d o c o r a ç ã o e d o p a d r ã o d e c o m
p o r ta m e n to q u e c a r a c te r iz a m o s c r e n te s
q u e “s e rev e stira m ” d a n o v a n a tu re z a (4 .2 4 ).
A s s e is a t itu d e s e c o m p o r ta m e n to s p e c a
m in o s o s m e n c io n a d o s e m 4 .3 1 s e o r ig i
n a m d a ra iz d a “m a ld a d e ” o u “m a líc ia ”.
R . M a rtin ( 1 6 2 ) s e r e f e r e à m a ld a d e c o m o
“a g e r a d o r a d a in fe l iz p r o g ê n ie d a s p r i
m e ir a s é p o c a s ”. A m a ld a d e é “u m a tiv o
d e s e jo m a lé f ic o ” (W e b s te r ) e m d ir e ç ã o a o s
s e m e lh a n te s , u m a fo n te v e n e n o s a d a q u a l
s e o r ig in a “to d a a m a rg u ra , e ira , e c ó le r a ,
e g r ita r ia , e b la s fê m ia s , e to d a m a líc ia ”.
B r u c e ( 1 9 8 4 , 3 6 4 ) s u g e r e q u e a m a ld a d e
s e ja a fo n te in te r io r d a q u a l b r o ta m to d a s
a s p a la v r a s in d ig n a s m e n c io n a d a s a n t e
r io r m e n te ( 4 .2 9 ) .
A “a m a rg u ra ” (c f. Cl 3 .1 9 ) d e n o ta a q u e le
“e s ta d o ir r ita d iç o d a m e n te q u e m a n té m
u m h o m e m e m p e r p é tu a a n im o s id a d e —
q u e o in c l in a à o p in iõ e s á s p e r a s e p o u c o
c a r id o s a s s o b r e h o m e n s e c o is a s — q u e
o d e ix a c a r r a n c u d o e c o m o s e m b la n te
c a r r e g a d o , e a o m e s m o te m p o in fu n d e
v e n e n o à s p a la v r a s d e s u a b o c a ” (E a d ie ,
3 5 7 ) . R o b in s o n ( 1 9 4 ) d e f in e -a c o m o “u m
e s p ír i to r e s s e n t id o q u e r e c u s a r e c o n c il i -
a r - s e ”. “Ira e c ó le r a ” c a u s a m e x p lo s õ e s
1249
EFÉSIO S 4
COMPARAÇÃO ENTRE EFÉSIOS E COLOSSENSES
Durante o período em que esteve na prisão em Roma, Paulo escreveu Efésios e Colossenses
mais ou menos na mesma época, e existe um número surpreendente de semelhanças entre os
contextos desses dois livros.
Tema Efésios Colossenses
A saudação de Paulo Ef 1.1,2 C t1.1,2
Ser santo e imaculado aos olhos de Deus Ef 1.4; 5.27 Cl 1.22
A Redenção através do sangue de Cristo Ef 1.7 Cl 1.14,20
A sabedoria, o conhecimento e a compreensão de Deus Ef 1.8,17 Cl 1.9,10
O conhecimento da vontade de Deus Ef 1.9 Cl 1.9
Todas as coisas (re) criadas através de Cristo Ef 1.10 Cl 1.16
Paulo ouviu sobre a fé que possuíam e agradeceu ao Senhor Ef 1.15,16 Cl 1.3,4
A oração contínua de Paulo a favor dos efésios
e dos colossenses Ef 1.16 Cl 1.9
A esperança do crente Ef 1.18 Cl 1.5,27
Uma herança para os santos E f1.18 Cl 3.24
Fortalecidos pelo poder de Deus Ef 1.19; 3.16; 6.10 Cl 1.11
O poder de Cristo é superior a todo principado, e poder,
e potestade, e domínio E f1.21 Cl 1.13,16; 2.10,15
Cristo como Cabeça de seu corpo, a fgreja Ef 1.22:4.15,16 Cl 1.18,24
Cristo como a plenitude de Deus Ef 1.23: 3.19 Cl 1.19; 2.9
Cristo cumpre tudo em todos Ef 1.23 Cl 3.11
Longe de Cristo, as pessoas estão mortas no pecado Ef 2.13 Cl 2.13; 3.7
Deus nos vivificou através de Cristo e sua ressurreição Ef 2.5,6 Cl 2.12,13
A reconciliação através do sangue de Cristo Ef 2.13 Cl 1.20
Os cristãos são chamados à paz Ef 2.14,15 Cl 3.15
Cristo aboliu a lei e seus mandamentos Ef 2.14,15 Cl 2.14
Crescer em Cristo Ef 2.20-22 Cl 2.7
A chamada de Paulo pela graça de Deus, para revelar
o mistério de Deus Ef 3.2-4 Cl 1.25-27; 2.2
A graça de Deus opera em Paulo Ef 3.7, 20 Cl 1,29
O mistério de Deus oculto durante séculos Ef 3.9 Cl 1.26
Arraigados em Cristo e em seu amor Ef 3.17 Cl 2.7
A humildade, a mansidão,a paciência e o amor Ef 4.20, 31; 5.1 Cl 3.12-14
0 encorajamento à unidade Ef 4.3 Cl 3.14
Tornar-se maduro/perfeito em Cristo Ef4.13 Cl 1.28
Alcançando a plenitude em Cristo Ef 4.13 Cl 2.10
O crescimento em Cristo Ef 4.16 Cl 2.19
Longe de Cristo, separado de Deus Ef 4.18 Cl 1.21
O pecado e a lascívia nos infiéis Ef 4.19 Cl 3.5
Despojar-se do velho homem e revestir-se do novo homem Ef 4.22-24 Cl 3.9-10
Abandonar a falsidade e as mentiras, e falar a verdade Ef 4.25 Cl 3.9
Deixara linguagem impura Ef 4.29; 5.4 Cl 3.8
Falar a fim de ajudar os outros Ef 4.29 Cl 4.6
Libertar-se do ódio, da maldade e da calúnia Ef 4.30 Cl 3.8
Ser perdoador Ef 4.31 Cl 3.13
Os crentes não devem deixar-se enganar Ef 5.6 Cl 2.4,8
A ira futura de Deus Ef 5.6 Cl 3.6
Fazer o que agrada ao Senhor Ef 5.10 Cl 3.20
1250
EFÉSIO S 4
COMPARAÇÃO ENTRE EfÉSÍOS E COLOSSENSES' (cont.)
Tema .............................
Caminhar cuidadosamente e aproveitar ao máximo
Cantar salmos, hinos e cânticos espirituais
Dar graças a Dous, o Pai
Instruções às esposas
Instruções aos esposos
Instruções aos filhos
Instruções aos pais
Instruções aos escravos (ou servos)
Instruções aos professores
Orar e manter a vigilância
Orar por Paulo, o missionário
Tiquico como mensageiro de Paulo
A bênção final
t e m p e r a m e n ta is e r e s s e n t im e n to e m o c i
o n a l c o n t r a o u tr a s p e s s o a s . “G r ita r ia ” s e
r e fe r e a to d a e s p é c ie d e e x p lo s õ e s a c o m
p a n h a d a s d e “g ritos d e litíg io ” (B r u c e , 1 9 8 4 ,
3 6 4 ). “B la sfêm ia ” é a q u e la e s p é c ie d e p alavra
o fe n s iv a q u e p r o c u r a d ifa m a r e d e s tr u ir
a r e p u t a ç ã o d e o u tr e m .
E m 4 .3 1 , o r e v e r s o d e s s a r e p r o v á v e l
c o n d u ta , d a q u a l o s c r e n te s d e v e m liv rar-
s e , s e a p r e s e n ta c o m o a q u e le c o m p o r t a
m e n to a m á v e l, c a r a c te r iz a d o p o r u m e s
p írito b e n ig n o , m is e r ic o r d io s o e p e r d o a d o r
(4 .3 2 ) . “S e r” ( s e d e ) q u e r d izer, lite ra lm e n te ,
“t o r n a r - s e ”. P a u lo r e c o n h e c e u q u e s e u s
le ito r e s a in d a n ã o h a v ia m a tin g id o a m a tu
rid ad e n e s s a á re a d a g ra ça cristã. P a ra torn ar-
s e “b e n i g n o ” é p r e c is o a p r e n d e r a p r a t i
c a r u m a s o l íc i ta c o n s id e r a ç ã o e m r e la ç ã o
a o s o u t r o s . T o r n a r - s e “m is e r i c o r d io s o ”
(èusplanchnoíJ s ig n if ic a te r u m “c o r a ç ã o
b o n d o s o o u c o m p a s s iv o ”. E ssa e x p r e s s ã o
p o u c o c o m u m s e re fe r e “a o m a is p ro fu n d o
s e n t im e n t o e p r e o c u p a ç ã o c o m n o s s o
s e m e lh a n te n e c e s s i ta d o ” (S u m m e rs , 1 0 5 ) .
É u m a q u a l id a d e q u e J e s u s d e m o n s tr o u
q u a n d o v iu m u lt id õ e s s e m u m p a s to r , o u
u m in d iv íd u o e m d e se sp e ra d a n e ce ss id a d e .
A m is e r ic ó r d ia ta m b é m fa z p a r te d o p r o
c e s s o d e to r n a r n o s s o s e r à s e m e lh a n ç a
d e C ris to .
“P e r d ã o ” (charizomenoi) v e m d a p a
la v ra charis ( “g r a ç a ”) . A ss im , p e r d o a r a
Efésios C olossenses
Ef 5.15 Ci 4.5
Ef 5.19 Cl 3.16
Ef 5.20 Cl 3.17
Ef 5.22 Cl 3.18
Ef 5.25 Cl 3.19
Ef 6.1 Cl 3.20
Ef 6.4 Cl 3.21
Ef 6.5-8 Cl 3.22-25
Ef6.9,10 Cl 4.1
Ef 6.18 Cl 4.2
Ef 6.19,20 Cl 4.3,4
Ef 6.21,22 Cl 4.7,8
Ef 6.24 Cl 4.18
a lg u é m s ig n if ic a m o s tr a r - lh e g r a ç a , is to é ,
p e r d o a r liv re e b o n d o s a m e n te e s e m r e
lu tâ n c ia o u ra n co r . P a u lo re fo r ç a o a s p e c to
d a g r a ç a e x is t e n te n o p e r d ã o , a c r e s c e n
ta n d o q u e p e r d o a r a o s o u tr o s é a g ir e x a
ta m e n te c o m o D e u s q u e n o s “p e r d o o u e m
C r is to ”. A s s im c o m o o p e r d ã o d e D e u s s e
o r ig in a d a g r a ç a , p e r d o a r a o s o u tr o s d e v e
ta m b é m f lu ir l iv r e m e n te d a g r a ç a .
F in a lm e n te , P a u lo e x p r e s s a u m a ín ti
m a a s s o c ia ç ã o d e C risto e d o P a i c o m n o s s o
p e r d ã o (c f . 4 .3 2 e C l 3 -1 3 ) . C o m o B r u c e
a f ir m a ( 1 9 8 4 , 3 6 5 ) , “e m to d a a o b r a d a
r e d e n ç ã o , o P a i e o F i lh o a g e m c o m o u m
s ó ”. É “e m C r is to ” q u e te m o s “a r e d e n ç ã o
p e lo s e u s a n g u e , a r e m is s ã o d a s o f e n s a s ,
s e g u n d o a s r iq u e z a s d a s u a g r a ç a ” ( 1 .7 ) .
E x is te u m s e n t id o n o q u a l n ó s ta m b é m
“e m C risto ” p e r d o a m o s o s o u tro s d e a c o rd o
c o m a s r iq u e z a s d a g r a ç a q u e r e c e b e m o s
d e D e u s .
7.4. V iv e re m S a n tid a d e com o
F ilh o s d a L u z (5 .1 - 1 4 )
C o m e ç a n d o e m 4 .1 7 , P a u lo d ir e c io n a
s u a a te n ç ã o p a ra o a s p e c to p rá t ic o d a o b ra
d e C r is to n a v id a d o c r e n te , p r im e ir o e m
te r m o s d e t r a n s fo r m a ç ã o p e s s o a l , d e u m a
v id a c o n f o r m e a n a tu r e z a p e c a d o r a p a ra
u m a v id a e m h a r m o n ia c o m C r is to ( 4 .1 7 -
2 4 ) . E m s e g u id a , a p l ic a a d in â m ic a d e s s a
1251
EFÉSIO S 5
n o v a v id a a u m a d e q u a d o c o m p o r ta m e n to
cr is tã o , d e n tr o d a c o m u n h ã o d a Ig re ja , e m
term o s positivos e negativ os (4 .2 5 -3 2 ). A gora,
P a u lo a p e la a o s c r e n t e s p a r a q u e v iv a m
su a c h a m a d a c o m o f i lh o s d a lu z e m r e la
ç ã o a o m u n d o a o s e u r e d o r ( 5 .1 - 1 4 ) . S e u s
le i to r e s , a q u e m c h a m a d e “f ilh o s a m a
d o s ” ( 5 .1 ) , “s a n to s ” ( 5 -3 ) e “f i lh o s d a lu z ”
( 5 .8 ) d e v e r ã o r e f le t i r a v id a d e s e u P a i
c e le s t ia l , e a o fa z ê - lo “s e r ã o u m d e s a f io à
s o c ie d a d e c o n t e m p o r â n e a e u m a r e p r o
v a ç ã o a e la ” (R . M artin , 1 6 2 ) . P a ra q u e is s o
a c o n te ç a , d e v e rá ex istir u m c o n tra s te m u ito
c la r o e n tr e o s c r e n t e s e o m u n d o . A q u i
P a u lo d e s c r e v e e s s e c o n t r a s te e m te r m o s
d e a m o r e lu z .
7.4.1. Andar em Amor (5.1-7). V iv e r
c o m o f i lh o s d e D e u s , e c o m o p o v o s a n to
d e D e u s , e n v o lv e a a t itu d e d e a n d a r e m
a m o r . P e la t e r c e ir a v e z , P a u lo u s a a p a la
v ra peripateo ( tr a d u z id o c o m o “v iv e r ” e m
5 .2 ; v e ja c o m e n tá r io s e m 4 .1 ; 4 .1 7 - 5 .2 1 )
a o d is c u tir a c o n d u ta d o s c r e n te s d e É fe s o
( c f . ta m b é m 5 . 8 , 1 5 ) . “V iv e r o u a n d a r e m
a m o r ” ( 5 .2 ) r e q u e r s e r “im ita d o r d e D e u s ”
( 5 .1 ) . Im ita r a D e u s é a c o n s e q ü ê n c ia l ó
g ic a d e c o n h e c ê - lo c o m o P ai. A ss im c o m o
o s f i lh o s im ita m u m a m o r o s o p a i t e r r e s
tre , o s c r e n te s d e v e r ã o im ita r s e u a m o r o
s o P a i ce le s t ia l. P a u lo d iz e m R o m a n o s 5 .8 :
“M a s D e u s p ro v a o s e u a m o r p a ra c o n o s c o
e m q u e C r is to m o r r e u p o r n ó s , s e n d o n ó s
a in d a p e c a d o r e s ”.
P a u lo já h a v ia o r a d o p a ra q u e fo s s e m o s
“a r r a ig a d o s e fu n d a d o s e m a m o r ” ( 3 .1 7 ) .
A g o ra n o s e x o r ta a v iv e r “e m a m o r , c o m o
ta m b é m C r is to v o s a m o u e s e e n tr e g o u a
si m e s m o p o r n ó s ” ( 5.2 ) . A q u i, a p a la v ra
g r e g a p a ra a m o r é agape(a m o r d e D e u s ) ,
q u e é a m a r c o m u m a g e n u ín a d o a ç ã o d e
si m e s m o p a ra o b e m -e s ta r d a q u e le a q u e m
o a m o r é d e d ic a d o . Agape n ã o s e b a s e ia
e m m é r ito s . C r is to d e m o n s tr o u e s s e a m o r
p u r o e d e s in t e r e s s a d o p o r n ó s q u a n d o
o f e r e c e u s u a v id a n a c r u z c o m o “o fe r ta e
s a c r if íc io a D e u s , e m c h e ir o s u a v e ”. A fra se
“e m c h e ir o s u a v e ” l e m b r a o o d o r d o s
s a c r i f í c io s d o A n t ig o T e s t a m e n t o , q u e
a s c e n d ia a o s c é u s e a g r a d a v a a D e u s . A
m o r t e d e J e s u s , c o m o s a c r i f í c i o p e lo s
p e c a d o s , e r a a g r a d á v e l a o P a i p o r s e r e m
n o m e d e n o s s a s a lv a ç ã o .
P a u lo m u d a d o te m a d o a u to -s a c r if í -
c io d e C risto p ara o a s p e c to o p o s to , a q u e le
d a a u to - in d u lg ê n c ia d o p e c a d o r ( 5 .3 ,4 ) ,
d o a m o r agape p a r a s u a p e r v e r s ã o , a la s
c ív ia ; e le m e n c io n a trê s m a n ife s ta ç õ e s d e
a u to -in d u lg ê n c ia e d e p e r v e r s ã o d o a m o r:
“P ro s titu içã o ” e “im p u re z a ” a b ra n g e m to d a s
a s fo r m a s p o s s ív e is d e p e c a d o h e te r o s
s e x u a l (p r é -m a r ita l e e x tr a m a r ita l) , b e m
c o m o d e to d o s o s p o s s ív e is p e c a d o s h o
m o s s e x u a is , p o is to d o s a v ilta m a c o n s c i
ê n c ia e d e s t r o e m o a m o r. A “a v a r e z a ”, o u
“c o b i ç a ”, d e s c r e v e o d e s e jo ín t im o d o
c o r a ç ã o p o r a q u i lo q u e n ã o é le g it im a
m e n te p o s s u íd o . P o d e ta m b é m s e r e fe r ir
a o p e c a d o , d en tro d o â m b ito sex u a l, q u a n d o
se re fe re a c o b iç a r a m u lh e r d e o u tro h o m e m
o u o c o r p o d e a lg u é m p a r a s a t is fa z e r u m
d e s e jo p r ó p r io ( Ê x 2 0 .1 7 ; c f . 1 T s 4 .6 ) .
E s s e s trê s p e c a d o s n ã o d e v e m s e r m e n
c io n a d o s , e n e m s e q u e r c o m e n ta d o s e n tr e
o “p o v o s a n to d e D e u s ”; “d e v e m s e r c o m
p le ta m e n te b a n id o s d a c o m u n id a d e cr is tã ”
(S to tt , 1 9 2 ) . E s te s p e c a d o s e r a m u m p a
d r ã o n a p r o v ín c ia d a Á s ia , o n d e o r g ia s
s e x u a is e r a m re g u la r m e n te p ra tic a d a s e m
c o n e x ã o c o m a a d o r a ç ã o d a d e u s a g r e g a
d o s e f é s io s , A r te m is (c f . A t 1 9 .2 3 ) .
N o v e r s o 4 , P a u lo fa z u m c o n tra s te e n tre
a v u lg a r id a d e s e x u a l n o f a la r e a a ç ã o d e
g r a ç a s , p o s s iv e lm e n t e c o m p a r a n d o “a
a t itu d e p a g â , e o c o m p o r t a m e n t o c r i s
tã o e m r e la ç ã o a o s e x o ” (S to t t , 1 9 2 ) . E n
t r e ta n to , u m a p a s s a g e m s e m e lh a n te e m
C o lo s s e n s e s s u g e r e q u e P a u lo t in h a e m
m e n te u m co n tra ste m ais a b ra n g e n te . N e sse
c a s o o c o n t r a s t e s o c ia l é e n tr e p e s s o a s
c o m p e n s a m e n t o s m u n d a n o s , q u e c o n s
t a n t e m e n t e t ê m o s e x o p r e s e n t e e m s e u
p e n s a m e n to e e m su a fa la , e o p o v o s a n to
d e D e u s q u e p e r m ite q u e a p a z d e D e u s ,
p a r a a q u a l t a m b é m fo r a m c h a m a d o s e m
u m c o r p o , d o m in e o s s e u s c o r a ç õ e s ( in
c lu s iv e o p e n s a m e n to e a fa la ) c o m a ç õ e s
d e g r a ç a s (C l 3 .1 5 - 1 7 ) .
O v e r s o 5 c o n té m u m p r o n u n c ia m e n
to e u m a a d v e rtê n c ia s o le n e . N in g u é m q u e
s e d e d ic a à p rá tic a d o s m e n c io n a d o s p e
c a d o s s e x u a is te rá q u a lq u e r “h e r a n ç a n o
R e in o d e C ris to e d e D e u s ”, in d e p e n d e n
te d e q u a lq u e r d e c la r a ç ã o q u e p o s s a fa
z e r a r e s p e i to d e s e r c r is tã o . B r u c e (1 9 6 1 ,
1252
EFÉSIO S 5
1 0 3 ) d e s c o n s id e r a q u a lq u e r r a c io n a liz a
ç ã o c o m u m a r e s p e ito d e s s e v e r s o , q u e in
te r p r e te e r r o n e a m e n te o a r g u m e n to q u e
P a u lo e s tá d e fe n d e n d o : “A id é ia d e q u e
P a u lo e s te ja a f ir m a n d o q u e ta is in d iv íd u
o s p o s s a m , m e s m o a s s im , s e r c r i s tã o s
v erd ad eiros, p o ré m q u e seu co m p o rta m e n to
o s p r iv a rá d e q u a lq u e r p a r te o u q u in h ã o
n o fu tu ro r e in o m ile n a r d e C ris to , é to ta l
m e n te in ju s tif ic a d a p e lo c o n t e x t o e p e lo s
en sin am en to s d o N o v o T estam en to e m geral”.
P a u lo c o n t in u a a a firm a r q u e u m a “p e s
s o a a v a re n ta ... é id ó la tra ” p o r q u e su a a fe i
ç ã o e s tá d ir ig id a à s c o is a s te rre n a s e n ã o às
d o c é u , d e fo rm a q u e a lg u m o b je to te r r e
n o d e d e se jo p a sse a o c u p a r u m “lu gar cen tra l
q u e s o m e n te D e u s d e v e r ia te r n o c o r a ç ã o
h u m a n o ” ( B r u c e , 1 9 6 1 , 1 0 4 ) . P a u lo s a b ia
q u e s u a m e n s a g e m d e l ib e r ta ç ã o d a le i e
d e e x o r ta ç ã o a o a m o r p o d e ria s e r fa c ilm en te
u s a d a c o m o d e s c u lp a p e lo p e c a d o s e x u
al. P ortanto acrescenta : “N ingu ém v o s e n g a n e”
(5 -6 ) , n e m s e ja is le v a d o s a a c r e d ita r q u e
p e s so a s im o rais, im p u ras o u c o b iç o s a s te rã o
u m a h e ra n ç a a sse g u ra d a n o re in o d e C risto.
T a l c e r te z a e fa lsa s e g u r a n ç a re d u n d a m e m
d e c e p ç ã o e “p alav ras v az ias”. A “ira d e D e u s ”
se rá d e n a m a d a s o b r e e ss a s p e s so a s . O risco
d e s e r e m p r iv a d o s d a h e r a n ç a n o r e in o
d e D e u s é m u ito g ra n d e p a ra “a q u e le s q u e
s ã o d e s o b e d ie n t e s ”, is to é , a q u e le s q u e
c o n h e c e m a le i m o r a l d e D e u s e in te n c i
o n a lm e n te a d e s o b e d e c e m . “P o rta n to , n ã o
s e ja is s e u s c o m p a n h e ir o s ” ( 5 .7 ) . A q u e le s
q u e n ã o o b e d e c e r e m , p a r t ic ip a r ã o d e su a
c o n d e n a ç ã o .
7.4.2. Andar na Luz (5.8-14). E m 2
C o r ín t io s 6 .1 4 , P a u lo p e r g u n t a : “Q u e
c o m u n h ã o t e m a lu z c o m a s t r e v a s ? ”
O b v ia m e n te , a r e p o s ta é “n e n h u m a !” E m
C o lo s s e n s e s , P a u lo le m b r a a o s c r e n t e s
q u e D e u s P a i “n o s t ir o u d a p o te s ta d e d a s
t r e v a s e n o s t r a n s p o r to u p a r a o R e in o d o
F i lh o d o s e u a m o r ” (C l. 1 .1 2 - 1 3 ) . A q u i,
e m E fé s io s 5 .8 , P a u lo d e c la r a a o s s e u s
le ito r e s : “N o u tro te m p o , é r e is tre v a s , m a s ,
ag o ra , so is luz n o S e n h o r”. E star “e m C risto”,
q u e é “a lu z d o m u n d o ” ( J o 8 .1 2 ) , s ig n i
f ic a s e r lu z a s s im c o m o E le o é .
O c o n t r a s t e e n tr e lu z e t r e v a s e m 5 -8 -
1 4 é s e m e lh a n te à q u e le e n c o n tr a d o e m
o u tr a s p a s s a g e n s d o N o v o T e s ta m e n to .
“T r e v a s ” r e p r e s e n ta m ig n o r â n c ia , p e c a
d o , o m is s ã o e d e c a d ê n c ia m o r a l ,d e c e p
ç ã o , m o r te e s p ir itu a l e to d o o r e in o d e S a
tanás; “lu z”, a o contrário , rep resen ta v erd ad e,
ju s tiça , re t id ã o m o ra l, v id a esp ir itu a l e to d o
o re in o d e C risto . A n te rio rm e n te , o s c re n te s
e s ta v a m n ã o a p e n a s em t r e v a s ( is to é , e m
u m a m b ie n t e d e ig n o r â n c ia e s o b s u a
in f lu ê n c ia ) , m a s ta m b é m e le s p r ó p r io s
r e p r e s e n ta v a m a s tre v a s . A g o ra , p o r c a u s a
d e s u a u n iã o c o m C r is to a tr a v é s d a fé , se
to r n a r a m lu z : “S u a v id a , e n ã o a p e n a s s e u
a m b ie n te , s e tr a n s fo r m a r a m d e tre v a s e m
lu z ” (S to tt , 1 9 9 ) . A ss im , P a u lo a c r e s c e n
ta : A n d a r o u “v iv e r c o m o f ilh o s d a lu z ”,
is to é , m o ld a r a c o n d u ta c o n f o r m e a n o v a
id e n tid a d e . O fa to d e s e r m o s “lu z n o S e
n h o r ” in d ic a q u e s u a g r a ç a e s e u p o d e r
e s t ã o h a b ita n d o e m n ó s , p a r a q u e te n h a
m o s u m a v id a s a n tif ic a d a .
P a te r n a lm e n te , P a u lo e x p l ic a q u e “o
f ru to d a lu z ”, o u a n o v a m a n e ir a d e v iv e r
A deusa da fertilidade, Artemis, era adorada em
Éfeso,
1253
EFÉSIO S 5
q u e s e r e a l iz o u n o c r e n te , s e c a r a c te r iz a
p o r “b o n d a d e , ju s t iç a e v e r d a d e ” ( 5 .9 ) . A s
o b r a s d a s tre v a s s ã o o o p o s t o d e s s e f r u
to : m a ld a d e , in iq ü id a d e e f a ls id a d e . O
c o n c e i t o e x is t e n te e m 5 .1 0 é o d e s e n v o l
v im e n to d a ú lt im a a f ir m a ç ã o d e 5 -8 . O s
F i lh o s d a lu z s e “tr a n s fo r m a m p e la r e n o
v a ç ã o d o e n te n d im e n to , p a ra e x p e r im e n
ta r e m [dokimazo] q u a l s e ja a b o a , a g r a
d á v e l e p e r fe ita v o n ta d e d e D e u s ” (c f . R m
1 2 .2 ) . Dokimazo q u e r d iz e r e x p e r im e n
tar, d is c e r n ir e a p r o v a r a v e r a c id a d e d e
tu d o a q u i lo q u e a g r a d a a D e u s .
O c o n tr a s te e n tr e “a s o b r a s in fru tu o s a s
d a s t r e v a s ” ( 5 .1 1 ) e o fru to d a lu z ( 5 .9 ) é
s e m e lh a n te à q u e le e s t a b e le c id o e n tr e a s
“o b r a s d a n a tu r e z a p e c a d o r a ” e “o fru to
d e E s p ír ito ” ( e m G 1 5 .1 9 ,2 2 ) . A s “o b r a s d a
n a tu r e z a p e c a d o r a ” o u a s “o b r a s d a s t r e
v a s ” n ã o p o d e m s e r d e s c r ita s c o m o “fru
to s ” p o r q u e n ã o c o n tê m a s e m e n te d a v id a ;
a o co n trário , s ã o e stére is e o rig in a m a m orte .
A lu z, in v a r ia v e lm e n te , e x p õ e o v e rd a d e iro
c a r á te r d a s o b r a s d a s tr e v a s ( 5 .1 1 ) . A ss im
s e n d o , o s m a lfe ito r e s o d e ia m a lu z p e lo
r e c e io d e s e r e m e x p o s t o s ( J o 3 .2 0 ) . P o
r é m , s o m e n t e q u a n d o o c o r r e e s s a e x p o
s iç ã o h a v erá a c o n v ic ç ã o p e lo E sp írito S a n to
e a p o s s ib i l id a d e d a s a lv a ç ã o ( 1 6 .8 ) .
O v e r s o 1 2 s u g e r e q u e a s im p le s m e n
ç ã o d o s v íc io s v e r g o n h o s o s d e u m d e s o
b e d ie n t e d e v e s e r u m a o f e n s a a o p o v o
d e D e u s , q u e é m o r a lm e n te s e n s ív e l . O
p o d e r d a lu z , n o e n ta n to , n ã o s ó e x p õ e e
“e s c l a r e c e ” tu d o ( 5 .1 4 ) , c o m o ta m b é m
t r a n s fo r m a e m lu z tu d o q u e i lu m in a . P r o
v a v e lm e n te o v e r s o 1 4 b s e o r ig in o u d e u m
h in o d e b a t is m o d o s p r im e ir o s c r is tã o s ,
q u e in c lu i v á r ia s p a s s a g e n s d o A n tig o
T e s ta m e n to (c f . Is 2 6 .1 9 ; 5 2 .1 ,2 ; 6 0 .1 ,2 ) .
E le m o stra q u e a “c o n v e rsã o é c o m o aco rd a r
d e u m s o n o , r e s s u s c i ta r d o s m o r to s e s e r
c o n d u z id o p a r a fo r a d a s tr e v a s à lu z d e
C r is to ” (S to t t ,-2 0 1 ) .
7 .5 . Viver Sabiam ente, como
um Povo Cheio do Espírito
Santo (5 .1 5 -2 1 )
P e la q u in ta v e z , d e s d e 4 .1 , P a u lo e m
p re g a a p alavra “an d ar” (peripateo) , traduzida
c o m o “v iv e r ” ( v e ja c o m e n tá r io s e m 4 .1 ,
4 .1 7 — 5 .2 1 ) . P a u lo e x o rta o s c re n te s a se re m
“p r u d e n te s ” e a v iv e re m s a b ia m e n te c o m o
u m p o v o c h e io d o E sp ír ito d e D e u s (5 .1 5 ) .
“P r u d e n te s ” in c lu i o s ig n if ic a d o d a e x a t i
d ã o o u d a p r e c is ã o , “q u e é o r e s u lta d o
d o d e s v e lo ” (V in e , 1 .2 5 ) . P a u lo , e n tã o , faz
u m jo g o d e palavras. V iver n ã o c o m o asophoi
( “n é s c i o s ”) , m a s c o m o sophoi ( “s á b io s ”) .
E le co n tin u a a m e n c io n a r três form as práticas
d e v iv e r c o m s a b e d o r ia .
7.5.1. Aproveitar ao Máximo cada
Oportunidade (5.16). E m u m a p a s s a g e m
p aralela e m C o lo sse n se s 4 .5 , P au lo co n cla m a
o s c r e n t e s a s e c o m p o r ta r e m c o m s a b e
d o r ia e m r e l a ç ã o a o s n ã o - c r e n t e s , e a
a p r o v e i ta r e m a o m á x im o c a d a o p o r tu n i
d a d e d e d a r s e u te s te m u n h o . S u a a t e n
ç ã o , a q u i , e s tá d ir ig id a a o a p r o v e i ta m e n
to d e c a d a o p o r tu n id a d e e m r e la ç ã o à v id a ,
d e u m m o d o g e r a l , “p o r q u e o s d ia s s ã o
m a u s ” . P e s s o a s s á b ia s a p r o v e i ta m c a d a
o p o r tu n id a d e , p o r m a is fu g a z q u e s e ja ,
p a r a f a z e r e m o b e m ; u m a v e z q u e e s s e
m o m e n t o te n h a p a s s a d o , a o p o r tu n id a
d e e s ta r á p e r d id a p a r a s e m p r e . E m c e r ta
o c a s i ã o a lg u é m c o l o c o u u m a n ú n c io :
“P E R D ID A S , o n te m , e n tr e o a m a n h e c e r
e o a n o ite c e r , e e m a lg u m lu g a r, fo r a m
p e r d id a s d u a s h o r a s d o u r a d a s , c a d a u m a
c o m s e s s e n ta m in u to s d e d ia m a n te . N ã o
s e o fe r e c e q u a lq u e r re c o m p e n s a , p o is e s tã o
p e r d id a s p a ra s e m p r e ” ( c i ta d o p o r S to tt,
2 0 2 ) . U m a p r o v a s e g u r a d e s a b e d o r ia é
a p r o v e ita r o m á x im o d e n o s s o te m p o , n o
d e c o rr e r d e s s a é p o c a frív o la e p e c a m in o s a .
N ã o fa z ê - lo s e r á s in a l d e im p r u d ê n c ia .
7.5-2. Compreender a Vontade do
Senhor (5.17). E n q u a n to fa z e r o m e lh o r
u s o d a s o p o r tu n id a d e s e s tá r e la c io n a d o
à d il ig ê n c ia o u à s a b e d o r ia , c o m p r e e n
d e r a v o n ta d e d o S e n h o r e s tá r e la c io n a
d o a o d is c e r n im e n to . A s a b e d o r ia n a v id a
d iá r ia r e s id e n a v o n ta d e d e D e u s ; e a o
p r o c u r a r d is c e r n ir e s ta v o n ta d e , d e v e m o s
s e m p r e d is tin g u ir e n tr e o q u e e s tá r e la c i
o n a d o a o g e r a l e a o p a r t ic u la r . O p r im e i
ro é e n c o n tra d o n a s Escrituras, p o r e x e m p lo ,
D e u s n ã o q u e r “q u e a lg u n s s e p erca m , se n ã o
q u e to d o s v e n h a m a a r r e p e n d e r - s e ” (2 P e
3 .9 ) . E s s e s e u d e s e jo p a r t ic u la r p e la v id a
d e c a d a p e s s o a p o d e s e r c o n h e c id o a tra
v é s d o s p r in c íp io s d a s E s c r i t ur a s , d o s
1254
EFÉSIO S 5
c o n s e lh o s c o m u n itá r io s o u d a s a b e d o r ia ,
d a o r a ç ã o e d a o r ie n t a ç ã o q u e n o s fo r a m
r e v e la d o s p e lo E s p ír ito S a n to .
“C onfia n o Se n h o r de tod o o teu co ra
ção e n ão te estrib es n o teu p róp rio e n
ten d im en to .
R econ h ece-o em todos os teus cam in hos,
e ele endireitará as tuas veredas” (Pv 3.5,6)
Q u a n d o to d a n o s s a v id a e s tá r e la c io
n a d a à v o n ta d e d e D e u s , e m s u a s d im e n
s õ e s g e r a l e p a r t ic u la r , e n tã o e s ta r e m o s
v iv e n d o d e fo r m a p r u d e n te e s á b ia .
7.5.3. Ser Cheio do Espírito Santo
(5.18-21). A e s tru tu ra v e r b a l d e s s a p a s
s a g e m , c o n s is t in d o d e d o is im p e r a t iv o s
(5 .1 8 ) se g u id o s p o r q u a tro p a rtic íp io s (5 .1 9 -
21 ), rev ela q u e e ss e s q u atro v e rso s ab ra n g em
u m a só u n id a d e d e p e n s a m e n to . O s q u a tro
p a r t ic íp io s m o d if ic a m o im p e r a t iv o p r in
c ip a l e m 5 .1 8 ( “e n c h e i - v o s ”) e d e s c r e v e m
a s q u a tr o c o n s e q ü ê n c ia s d e e s ta r c h e io
d o E s p ír ito S a n to ; c a n ta n d o ( 5 .1 9 a ) , s e n
d o a le g r e ( 5 . 1 9 b ) , a g r a d e c e n d o ( 5 .2 0 ) e
s u je ita n d o - n o s u n s a o s o u tr o s ( 5 .2 1 ) .
T o d a e s s a s e ç ã o ( 4 .1 7 — 5 .2 1 ) c o n té m
u m a s é r ie d e c o n tr a s te s , c o m e ç a n d o c o m
“a n t e s ” e “d e p o is ”, c o n t r a p o n d o o s g e n
t io s q u e , c o n v e r t id o s , v ie r a m a c o n h e c e r
a C risto . O u tro c o n tra s te o c o rr e n o v a m e n te
e m 5 .1 8 , e m b r ia g u e z v e r s u s p le n i t u d e
e s p ir itu a l. A e m b r ia g u e z é u m a o b r a d a s
tr e v a s e c o n s e q ü ê n c ia d a n a tu r e z a p e c a
m in o s a ( n ã o é u m a d o e n ç a ) q u e “m e lh o r
r e s p o n d e p o r e s s a a p a r ê n c ia a q u i” ( F e e ,
7 2 0 ; c f . L in c o ln , 3 4 5 - 4 6 ) .
O s te m p o s d o s d o is im p e ra tiv o s e m 5 .1 8
in d ic a m a s s e g u in te s m e n s a g e n s : “n u n
c a fa ç a m a s s im ”, r e f e r in d o -s e à t o le r â n
c ia p ara c o m a e m b ria g u e z , e “se m p re fa ça m
a s s im ” e m r e la ç ã o a e n c h e r - s e d o E s p ír i
to S a n to . G o r d o n F e e ( 7 2 1 -2 2 ) o b s e r v a q u e
o v e r d a d e ir o s ig n if ic a d o d o s e g u n d o im
p e r a tiv o n ã o é u su a l: “P a u lo n ã o d iz ‘se ja is
c h e io s d o E s p ír ito ’ [g e n itiv o ] c o m o s e a l
g u é m e s t iv e ss e c h e io d o E sp ír ito d a m e sm a
fo rm a q u e o u tr o e s t iv e s s e c h e io d e v in h o ,
m a s 'e n c h e i - v o s d o E s p ír ito ’ c o m ê n fa s e
e m e s ta r to ta lm e n te c h e io d a p r e s e n ç a d o
E sp ír ito ” (o u d a “p le n itu d e c o n c e d id a p e lo
E s p ír ito ” [M a s s o n e m M a rtin , 1 6 6 ]) .
A fo rm a p r e c is a d o v e r b o “e n c h e i - v o s ”
(plerousthé) é b a s ta n te s ig n if ic a t iv a p o r
q u a tr o r a z õ e s :
1) É um imperativo e, p ortanto , um a ordem .
Estar ch e io d o E spírito n ão é um a o p çã o
ou um a su g estão tentadora, co m o se esti
v éssem o s livres p ara ace itá -la ou não . Ela
traz co n sig o u m ôn u s u rgente de grande
im p ortância .
2) Está no plural e, portanto, se aplica ao corpo
de Cristo co letiv am en te . O p o v o d e D eus,
co le tiv am en te , “d everá estar tão ‘ch e io de
D e u s’, através d e seu Espírito , q u e nossa
a d o ração e n o ssa casa d ev erão dar um a
prova cab al da p re se n ç a d o Espírito : p e
los cân ticos, o raçõ es e a çõ es de graças que
ao m esm o tem p o louvam , ad oram a D eus
e en sin am a co m u n id ad e” (F e e , 7 2 2 ).
3 ) É um passivo e d esse m o d o p o d eria ser
traduzido co m o “D eix e qu e o E spírito lh e
e n c h a ” (N EB ). D ev eria hav er tal abertu ra
e o b e d iê n cia ao Esp írito Santo , q u e nada
p u d esse im pedir q u e E le n o s e n ch esse .
4 ) É um tem p o presente e, portanto, transm ite
a idéia de um a a çã o contínu a. A ssim co m o
no sso corp o físico necessita um a constante
renovação, qu e é proporcionada pelo sono,
da m esm a form a o co rp o de Cristo n e c e s
sita um a co n stan te ren o v ação q u e se tor
na p o ssív el p e lo E spírito Santo.
P a u lo e m s e g u id a m e n c io n a q u a tr o
c o n s e q ü ê n c ia s q u e o c o r r e m q u a n d o n ó s ,
c o m o c o r p o d e C r is to , s o m o s c h e io s e
r e n o v a d o s p e la p o d e r o s a p r e s e n ç a d o
E s p ír ito S a n to ( w . 1 9 - 2 1 ) .
1) Existem vários tip os d e cânticos (5 .1 9 ) qu e
“têm tanto a fu n çã o de instruir a co m u n i
d ade d os cren tes, co m o de lou var e a d o
rar a D e u s” (F e e , 7 2 2 ). U m p o v o ch e io do
E spírito d ed ica -se a três tip os de cân tico s:
O s “Sa lm os” referem -se a o livro d os Sal
m os n o A ntigo T estam en to , q u e é um li
vro de h in os d o ju d aísm o e do in íc io da
Igre ja e, em geral, rep resen ta o cân tico nas
Escrituras. “H in o s” referem -se às p rim ei
ras co m p o siçõ e s cristãs, e algum as de suas
estro fes foram rep rod uzidas n o N ovo T e s
tam en to . O s h in o s do in íc io do cristian is
m o eram típ icas co n fissõ es de fé re la c io
n ad as à p esso a d e D eu s e à v erd ad e do
e v a n g e lh o . “C â n tico s e sp ir itu a is” eram
e x p re ssõ e s m ais esp o n tâ n ea s resultantes
1255
EFÉSIO S 5
da p re sen ça do Espírito d entro d o cren te
e da co m u n id ad e (p o r ex em p lo , o cân tico
p ro fé tico em 1 Sm 2 .1 -1 1 ; Lc 1 .4 6 -5 5 ,6 8 -
79). F. F. Bruce (1961,111) sugere que cânticos
esp irituais eram p ro v av elm en te “palavras
n ão p rem ed itad as can tad as ‘n o Espírito '
exp rim in d o lo u v or e san tas a sp ira çõ e s”.
P o r o ca siã o do final do seg u n d o sécu lo ,
T ertu liano d escrev e a festa d o am or cris
tão , q u an d o “cad a p esso a era convidad a
a louvar a D eu s, na p re sen ça d os outros,
a p artir d e tu d o q u e c o n h e c ia so b re as
Sagradas Escrituras ou q u e sen tia em seu
p ró p rio c o ra ç ã o ” (.Apology, 39).
2 ) O utra co n seq ü ên cia de ser um p o v o ch e io
d o E spírito é a q u e le tran sbord am en to de
a le g ria q u e é e x p r e s s o “ca n ta n d o e
salm odiando ao Senhor no coração” (5 .19b).
Isso co rresp o n d e a o testem u n h o p essoal
d e P au lo em 1 C orín tios 1 4 .15 : “cantarei
co m o esp írito , m as tam b ém can tarei co m
o en ten d im en to ”. E sse can to , co m o co ra
çã o ou c o m a m en te d e cad a um , rep re
senta a d im ensão p essoal da vida d o crente
e da alegria d o E spírito , d irigidas ex c lu si
vam en te “a o Se n h o r”.
3 ) U m a terce ira c o n se q ü ê n c ia d e estarm os
ch e io s d o E spírito é d arm os “sem p re g ra
ças p o r tudo a n o sso D eu s e P a i” (5 .2 0 ).
U m co m p o rtam en to ch e io de q u eixas ou
m u rm u rações é in co m p atív e l co m o E sp í
rito Santo, qu e n o s en sin a q u e D eu s faz
co m q u e tod as as co isa s con tribu am “ju n
tam en te p ara o b e m d aq u eles q u e am am
a Deus (Rm 8.28), e isso nos permite agradecer
co m tod o n o sso co ra çã o em tod o s o s m o
m entos. “Em n o m e de n o sso Sen h o r Je su s
Cristo” nos lem bra da centralidade de Cristo,
assim com o da Trindade, em nossa fé . Estando
ch e io s d o Espírito, dam os g raças a o Pai,
em n o m e d o SenhorJesus Cristo.
4 ) A co n se q ü ê n cia final de estarm os ch e io s
do E spírito é a graça d o resp e ito m útuo e
da su b m issão n o co rp o d e C risto (5 .2 1 ).
N ão é co n v en ien te q u e cre n tes se jam ar
rogantes, m an ip u lem ou co n tro lem seu s
sem elh an tes o u m esm o q u e insistam em
agir por conta p jóp ria . Ao contrário, crentes
foram ch am ad o s p ara se hu m ilhar e para
su jeitarem -se “u n s ao s ou tros n o tem or de
D e u s” (5 -21 ). Até o s líderes q u e ex istem
en tre o p o v o de D eu s, a q u em os co m p a
n h eiro s do co rp o de Cristo foram e n sin a
d os a ho nrar e o b e d e ce r co m am ável res
p eito (1 Co 1 6 .16 ; 1 Ts 5 .1 2 ,1 3 ; H b 13 .17 )
a lcan çaram esse reco n h ecim en to p o r s e
rem servos e n ão sen h o res (Lc 2 2 .2 4 -2 7 ; 1
P e 5 .3).
D a m e s m a fo r m a , e c o m o p r in c íp io s
esp ir ia ia is , su b m issã o , h u m ild ad e, b o n d a d e
e p a c iê n c ia s ã o v ir tu d e s q u e d e v e m s e r
m u t u a m e n t e p r a t ic a d a s d e n t r o d a fa m í
lia c r is tã . A e s p o s a d e v e s e s u je ita r ( is to
é , c e d e r a t r a v é s d o a m o r ) à r e s p o n s a b i
l id a d e d o e s p o s o d e l id e r a r a fa m íl ia . O
e s p o s o d e v e s e s u b m e t e r à s n e c e s s id a
d e s d a e s p o s a , e m u m a a t itu d e d e a m o r
e a b n e g a ç ã o . O s filh o s d e v e m se s u b m e te r
à a u to r id a d e d o s p a is c o m o b e d iê n c ia ,
e o s p a is d e v e m s e s u b m e t e r à s n e c e s s i
d a d e s d e s e u s f i lh o s , e c r iá - lo s d e a c o r
d o c o m o s e n s in a m e n t o s d o S e n h o r . A
r e v e r ê n c ia e a s u b m is s ã o a C r is to to r n a m
p o s s ív e l a p r e s e n ç a d a p a z n a ig r e ja e n o
la r c r is tã o . P a u lo a n a l is a e s s a s q u e s t õ e s
m a is d e ta lh a d a m e n t e e m 5 .2 2 — 6 .9 -
8. Aplicando a Autoridade de Cristo
aos Relacionamentos do Lar
( 5 . 2 2 - 6 . 9 )
D e u s d e s e ja q u e o re la c io n a m e n to sa lv a d o r
c o m C r is to , a s s im c o m o a o b e d iê n c ia a
E le c o m o S e n h o r , in flu a p o s itiv a m e n te e m
c a d a u m d o s r e la c io n a m e n t o s e e m c a d a
u m a d a s á r e a s d a c o m u n id a d e c r is tã , e d e
n o s s a v id a in d iv id u a l. U m a v e z q u e D e u s
e s ta b e le c e u a fam ília c o m o a u n id a d e b á s ica
d a so c ie d a d e , n ã o é d e s e ad m irar q u e P a u lo
e n fa t iz e q u e e s ta r a d e q u a d a m e n te r e la
c io n a d o a C ris to d e te r m in e a fo r m a c o m o
e s p o s o s e e s p o s a s , p a is e f i lh o s , e a té
se n h o re s e e scra v o s (o u serv o s) d o lar d ev em
r e la c io n a r - s e u n s c o m o s o u tr o s .
A lg u m a s p o u c a s o b s e r v a ç õ e s p r e lim i
n a re s a re sp e ito d e 5 .2 2 — 6 .9 p o d e rã o a jud ar
a e s c la r e c e r e s s a p a s s a g e m :
1) O artigo d efin id o em greg o p re ced e a ca
tegoria da p esso a à qual está se d irigindo,
isto é : “às e sp o sa s” (5 .2 2 ), “aos e sp o so s”
(5 .2 5 ), “ao s filh o s” (6 .1 ) , “ao s p a is” (6 .4 ),
“ao s serv o s” (6 .5 ) , e “aos se n h o re s” (6 .9 ).
Esta c o n stm çã o é cham ad a de u so g e n é
rico d o artigo d efin id o. “D e aco rd o co m
e sse u so, o artigo co n g reg a tod os o s ind i
1256
EFÉSIO S 5
víd uos em um a só cla sse” (Su m m ers, 120).
D essa form a, P aulo está se d irigindo, de
fo rm a a b r a n g e n te , a to d a s as e sp o sa s ,
esp o so s , filh os, pais, serv o s e se n h o re s
cristãos.
2 ) O s v erb os qu e aco m p an h am esse s su b s
tan tiv os co le tiv o s e s tã o n o p re se n te d o
im perativo ; isto é , são a firm açõ es q u e in
d icam algo qu e d everia rep resen tar um a
v erd ade p erm an en te em no ssa cond uta.
P or ex em p lo , “o s e sp o so s” d ev em “am ar”
e “co n tin u ar am a n d o ” sua esp o sa (5 .2 5 ).
O s tradu tores e o s in térp retes co n co rd am
qu e, segundo o propósito de Paulo, o verbo
“su jeitar” em 5.21 (n o p articíp io ) deveria
fu n cio n ar co m o o v erb o d o 5 .22 . Em g re
go, o p articíp io às v e z e s tem a força d e um
im p erativ o (o rd e m ). O q u e está a p en as
im p líc ito n o v erso 22, e d ep o is su gerido
n o v e rso 2 4 , e s tá a g o ra e x p lic ita m e n te
o rd en ad o em um a p assag em p aralela em
C o lossenses 3 -18. Em outras passagens em
5 .2 2 — 6 .9 , o tem p o im perativo d esse ver
b o é em p regad o de form a consisten te; por
tand o, em E fésio s 5 .21 p o d e ser in terp re
tado co m o sen d o um v erb o d e transição
em toda essa passagem .
3) As co n sid era çõ es so cia is e cu lturais tam
b é m n o s a ju d am a co m p reen d er a c o n s
tru çã o e a ê n fa s e q u e P au lo d eu a essa
passag em . P o r e x em p lo , o g re g o e o la
tim d o p rim eiro sé c u lo , assim c o m o os
p ro fesso res rab ín ico s de ética , so m en te se
dirigiam a m em bros da sociedade que fossem
livres e d o s e x o m ascu lino . No en tan to , o
Evangelho conduziu esposas, filhos e servos
a lugares de ho nra e d e resp on sab ilid ad e
na Igreja e em sua ordem social. A lém disso,
esp osas, filhos e servos n ã o só e n co n tra
vam lib erd ad e e resp e ito na Igre ja ; d eles
se esp erav a q u e se co n d u zissem co m re s
ponsabilidade nessa nova posição e de forma
a ho nrar ao seu Senhor. P ortanto , a ordem
da seq üência de Paulo está dirigida primeiro
às esp o sa s e d ep o is ao s esp o so s ; prim ei
ro a o s filh os e d ep o is ao s pais; p rim eiro
aos servos e depois aos seus sen hores. Essa
revolucionária elevação de posição dos opri
m id os a um a p o siçã o de honra e resp o n
sabilidade exp lica , inclusive, p or que Paulo
d ed ica três v ersos à ed u ca çã o d os filhos
(6.1-3), mas som ente um aospais (6.4); quatro
v erso s ao s serv os (6 .5 -8 ) , e so m en te um
verso aos seu s sen h o res (6 .9 ).
4 ) F re q ü e n te s re fe rê n c ia s “a o S e n h o r” são
en co n trad as a o lo n g o de tod a essa p assa
gem . A co nd u ta exig id a d e cad a categoria
de p esso as “d ep en d e to ta lm en te , e p asso
a p asso , da realidad e e da validade da obra
de Cristo e de sua p re sen ça ” (Barth , 2 .758).
8.1. Esposos e Esposas
(5.22,23)
N o N o v o T e s ta m e n to , e s s a p a s s a g e m
s e a p r e s e n ta c o m o a e x p o s iç ã o m a is e x
te n sa so b r e o re la c io n a m e n to e n tre e s p o s o s
e e s p o s a s (c f . C l 3 - 1 8 ,1 9 ; 1 P e 3 .1 - 7 ) . E m
1 P e d r o 3 , P e d r o s e d ir ig e lo n g a m e n te à s
e s p o s a s a r e s p e i to d a s u b m is s ã o a o s s e u s
e s p o s o s ; a q u i, e m E fé s io s , P a u lo d e d ic a
m a io r a t e n ç ã o à r e s p o n s a b i l id a d e d o s
e s p o s o s d e a m a r s u a e s p o s a c o m o C ris to
a m a a Ig r e ja . E m r e la ç ã o a o a s p e c to da
“s u je iç ã o ” e m 5 .2 2 — 6 .9 , F. F. B r u c e e s
c r e v e ( 1 9 8 4 , 3 8 3 ) .
E m bora o có d ig o d om éstico se ja in
troduzido através de um a p e lo à su je i
çã o mútua [v. 21], a su jeição im posta p elo
própriocódigonãoém útua. Istoé, embora,
n o código paralelo em Colossenses 3.18—
4.1 , as esp o sas se jam instruídas a su jei
tarem -se aos esp o so s, o s filhos a o b e
d ecerem aos pais e o s servos ao s seus
senhores, essa subm issão não érecíproca:
esp o so s são aco n selh ad o s a am ar suas
esp osas, os pais a educar seu s filhos com
sabedoria e os senhores a tratar seus servos
co m b o n d ad e. Em re la çã o à se ç ã o qu e
trata das esp o sa s e dos esp o so s, sua e s
p ecia l característica em E fésios é qu e o
re lacio n am en to entre e les é tratado de
form a idên tica àqu ele q u e ex iste en tre
Cristo e a Igreja.
A p ó s u m a e x o r t a ç ã o à m ú tu a s u je iç ã o
n o c o r p o d e C r is to ( 5 .2 1 ) , P a u lo tr a ta
e s p e c i f i c a m e n t e d o a s s u n to d a s e s p o s a s
(5 .2 2 -2 4 ) e d o s e s p o s o s (5 .2 5 -3 1 ) . A d m o esta
as e s p o s a s a s e s u je ita re m a o e s p o s o c o m o
s e n d o a su a “c a b e ç a ” , d a m e s m a fo r m a
q u e a Ig r e ja s e s u je ita a C r is to c o m o su a
“c a b e ç a ”. E m s e g u id a , o r d e n a a o s e s p o
1257
EFÉSIO S 5
s o s q u e a m e m s u a e s p o s a , a s s im c o m o
C r is to a m a s u a Ig r e ja . P a u lo c o m p a r a c u i
d a d o s a m e n te o r e la c io n a m e n t o e s p o s o -
e s p o s a a o re la c io n a m e n to C risto -Igre ja (o b
serv e o u s o fre q ü e n te d o co m p a ra tiv o “assim
c o m o ” e “c o m o ta m b é m ” e m 5 .2 2 ,2 3 ,2 4 ,2 5 .) .
A partir daí, P au lo am p lia a an a lo g ia e focaliza
su a a t e n ç ã o q u a s e in te ir a m e n te e m C ris
to e a Ig re ja (5 .2 6 -2 7 ) . A p ó s a lg u m a s ou tra s
in s t r u ç õ e s , e m 5 .3 1 c ita G ê n e s is 2 .2 4 a
re s p e ito d a u n id a d e n o c a s a m e n to ; e m 5 .3 2
fa z u m a r e fe r ê n c ia a C r is to e à Ig r e ja , e
e m 5 .3 3 fa z u m r e s u m o d e to d a a p a s s a
g e m . O e s p o s o d e v e “a m a r s u a e s p o s a ” e
a “e s p o s a d e v e r e v e r e n c ia r s e u e s p o s o ”.
8.1.1. Esposas, Sujeitai-vos a vosso
Esposo (5.22-24). D e q u e fo rm a a su je iç ã o
e x ig id a d e to d o s e m 5 .2 1 e s tá r e la c io n a
d a ã s u je iç ã o d a s e s p o s a s , s u g e r id a e m
5 .2 2 , e c la r a m e n te a f ir m a d a e m 5 -2 4 ? O
v e r s o 21 e s ta b e le c e u m p r in c íp io b a s ta n te
a b r a n g e n te , a n te s d e P a u lo a n a lis a r e s p e
c i f ic a m e n te o p a p e l d o e s p o s o e d a e s
p o s a , d o s f ilh o s e d o s p a is e d o s s e r v o s e
d o s s e n h o r e s . A ss im , P a u lo le m b r a a to
d o s o s cris tã o s, h o m e n s e m u lh e re s , o a p e lo
a q u e s e s u je ite m m u tu a m e n te , a n te s d e
le m b r a r à s e s p o s a s su a p a r t ic u la r r e s p o n
s a b ilid a d e d e s u je ita r -s e a s e u e s p o s o , e m
v is ta d a o r d e m d e D e u s e d o s d ife r e n te s
p a p é is n o c a s a m e n to .
O v e r b o “s u je i t a r ” ( hypotasso) r e a p a
r e c e e m 5 .2 4 , o n d e P a u lo d iz q u e a s e s
p o s a s d e v e m s e s u je ita r a s e u m a r id o e m
tu d o , ass im c o m o a Ig re ja s e su je ita a C risto .
A s u je iç ã o d a I g r e ja a C r is to e n v o lv e l e
a ld a d e , f id e l id a d e , d e v o ç ã o , s in c e r id a
d e , p u r e z a e a m o r . E s s a q u e s t ã o d a s u
je i ç ã o r e p r e s e n ta a e s s ê n c i a d o s e n s in a
m e n t o s d e P a u lo à s e s p o s a s , p o is s e t r a
ta d o f o c o c e n tr a l d e s u a e x o r t a ç ã o e m
C o lo s s e n s e s 3 -1 8 : “V ó s , m u lh e r e s , e s ta i
s u je ita s a v o s s o p r ó p r io m a r id o , c o m o
c o n v é m n o S e n h o r ”. T o d a s a s p a s s a g e n s
d o N o v o T e s t a m e n t o a e s s e r e s p e i t o
e m p r e g a m o m e s m o v e r b o hypotasso ( E f
5 .2 2 , 2 4 ; Cl 3 -1 8 ; T t 2 .4 ,5 ; 1 P e 3 .1 ) . P a u
lo u s a a v o z m é d ia e m g r e g o p a ra e n fa tiz a r
o a s p e c t o v o lu n t á r i o d a s u je i ç ã o d a s
e s p o s a s . Hypotasso d e n o t a “s u je iç ã o n o
s e n t id o d e s u b m e t e r - s e v o lu n t a r ia m e n
te e m a m o r ” (B A G D , 8 4 8 ) . S u b m e t e r - s e
a o s o u t r o s , a o in v é s d e s e im p o r , d e v e
r ia s e r u m a c a r a c te r ís t i c a g e r a l d o p o v o
d e D e u s ( c f . F p 2 .3 - 8 ) .
N o s v e r s o s 2 2 - 2 4 , P a u lo d e f in e a n a tu
r e z a d a s u je iç ã o d a s e s p o s a s d e q u a tr o
m a n e ir a s : “A v o s s o [p ró p rio , idiois] m a
r id o ” ( 5 .2 2 ; idiois e s tá e m g r e g o e n ã o fo i
t r a d u z id o n a N IV ); “c o m o a o S e n h o r ” (c f .
C l 3 -1 8 , “c o m o é a p r o p r ia d o n o S e n h o r ”) ;
“p o r q u e o m a r id o é a c a b e ç a d a m u lh e r ”
e “c o m o a ig re ja e s tá su je ita a C ris to ” (5 .2 4 ) .
E m 5 .2 3 , P a u lo e x p l ic a p o r q u e a s e s
p o s a s d e v e m s e s u je ita r a s e u s e s p o s o s :
“p o r q u e o m a r id o é a c a b e ç a [kephale] d a
m u lh e r”. A lgu ns in terp retam “c a b e ç a ” c o m o
s ig n if ic a n d o “fo n te ”, o q u e d e n o ta o r ig e m
e n ã o a u t o r id a d e . N e s s e c o n t e x t o , n o
e n ta n to , P a u lo d e fin e o q u e q u e r d iz e r p o r
“c a b e ç a ” q u a n d o a c r e s c e n ta : “p o r q u e o
m a r id o é a c a b e ç a d a m u lh e r , c o m o ta m
b é m C r is to é a c a b e ç a d a ig r e ja ” ( 5 .2 3 ) . É
e v id e n te q u e C r is to é a c a b e ç a d a Ig re ja
p o r q u e é a a u to r id a d e n o m e a d a p o r D e u s
p ara reg ê-la e , d essa form a, a e la d ev e sujeitar-
s e a E le e m tu d o ( 5 .2 4 ) . O s d o is c o n c e i
to s d e s u b m is s ã o e d e “s e r c a b e ç a ” s ã o
m u t u a m e n t e e lu c id a t iv o s : “A I g r e ja s e
s u b m e te à a u to r id a d e d e C r is to p o r q u e
E le é a c a b e ç a o u a a u to r id a d e s o b r e e l a ”
( c f . 1 .2 2 ; 4 .1 5 ) ( K n ig h t , l6 9 ) .
O s c o m e n tá r io s g e r a is d e P a u lo e m 1
C o r ín t io s 1 1 .3 a r e s p e i t o d e h o m e n s e
m u lh e r e s s ã o b a s ta n te in s tr u tiv o s , p o is s e
r e f e r e m à q u e s t ã o d a o r d e m d iv in a n o
re la c io n a m e n to e s p o s o -e s p o s a : “M as q u e ro
q u e s a ib a is q u e C r is to é a c a b e ç a d e to d o
v a r ã o , e o v a r à o , a c a b e ç a d a m u lh e r ; e
D e u s , a c a b e ç a d e C r is to ”. A s q u e s t õ e s a
s e g u ir fo r a m le v a n ta d a s p o r P a u lo e m 1
C o r ín tio s 1 1 .3 ,8 ,9 e E fé s io s 5 .2 2 - 3 3 :
1) P aulo deixa claro qu e ex iste em Cristo uma
perfeita igualdade espiritual entre hom ens-
esp osos e m ulheres-esposas com o herdeiros
da graça d e D eu s; no en tan to , trata-se de
um a igualdad e q u e en v olv e ordem e su
bordinação com respeito à autoridade. Como
D eu s é a ca b e ça de Cristo, Cristo é a c a b e
ça d o hom em , e o h o m em é a c a b e ç a da
m ulher. A palavra “c a b e ç a ” exp ressa tan
to a au toridad e co m o a ord em divina (cf.
Jz 10.18; 1 Co 3.23; 11 .8 ,1 0 ; 15.28; E f 1.21,22;
5 .2 3 ,2 4 ; Cl 1 .18 ; 2 .10 ).
1258
EFÉSIO S 5
2) D essa form a, Paulo baseia a autoridade do
e sp o so n ão em co n sid e ra çõ e s de ordem
cultural, m as n o p ro p ó sito e na ord em de
D eu s na criação (1 C o 1 1 .8 ,9 ) e na a n a lo
gia p aralela da au toridad e d e Cristo so b re
a Igreja (E f 5 .23 ).
3 ) A su b o rd in ação n ão é hu m ilhante p o rq u e
não implica inferioridade ou supressão. Assim
co m o Cristo n ão é in ferior ou secu n d ário
p e lo P ai ser sua c a b e ça , da m esm a form a
a esp osa não é um a p essoa secundária pelo
e sp o so ser sua ca b e ça (5 .2 3 ; cf. 1 Co 11.3).
4 ) A lém d isso , no re in o de D eu s, lid eran ça
n u nca im plica ser “m aio r”. O ato de servir
e a o b e d iê n c ia são a ch av e para a g ran d e
za em seu rein o (Mt 2 0 .2 5 -2 8 ; Fp 2 .5 -9 ).
5) C o m o a au to rid a d e d o e s p o s o d en tro d o
m atr im ô n io está re la c io n a d a à d e c la r a
çã o d e P a u lo em G á la ta s 3 .2 8 , o n d e a fir
m and o a essencial natureza social do evan
gelh o declara qu e, em Cristo, “não há judeu
n e m g re g o ; n ã o há se rv o n e m liv re ; n ão
há m a ch o n e m fê m e a ; p o rq u e to d o s v ó s
so is u m em C risto J e s u s ”? N esse p o n to
P a u lo d e c la ra q u e , em C risto , o e v a n g e
lh o re m o v e to d a s as b a rre ira s é tn ic a s ,
ra c ia is , n a c io n a lis ta s , so c ia is , e c o n ô m i
ca s e se x u a is na Ig re ja . Em C risto , to d o s
sã o ig u a lm e n te c o -h e rd e ir o s da “g raça
da v id a ” (1 Pe 3 -7 ), d o p ro m e tid o E sp í
rito (G l 3 .1 4 ; 4 .6 ) e da re n o v a ç ã o à im a
g em d e D eu s (C l 3 .1 0 ,1 1 ) . N o e n ta n to ,
d en tro d e s te c o n te x to de ig u a ld a d e e s
p iritu al, h o m e n s p e rm a n e c e m h o m e n s,
e m u lh e re s p e rm a n e c e m m u lh eres (G n
1 .2 7 ) . O p a p e l q u e D e u s lh e s d estin o u
n o m atr im ô n io e n a s o c ie d a d e p e rm a
n e c e in a lte ra d o (1 P e 3 .1 -4 ).
8.1.2. Esposos, Amem a sua Espo
sa (5.25-33). O p r o p ó s i to d e D e u s , d e
q u e a e s p o s a d e v e s u je it a r - s e a s e u e s
p o s o d a m e s m a fo rm a q u e a Ig re ja s e su je ita
a C risto , e x ig e u m a g ra ç a a tu a n te . N o v e rs o
2 5 , P a u lo c o n f r o n t a o e s p o s o c o m u m
e n c a r g o m u ito m a is d ifíc il, q u e e x ig e u m a
q u a l i f i c a ç ã o s o b r e n a t u r a l a in d a m a io r :
“V ó s m a r id o s , a m a i v o s s a m u lh e r , como
também C r is to a m o u a ig r e ja e a s i m e s
m o s e e n t r e g o u p o r e l a ”. O b s e r v e q u e
P a u lo n ã o a c e n tu a a “a u to r id a d e d o e s
p o s o s o b r e a e s p o s a , p o r é m o s e u a m o r
p o r e l a ” (S to t t , 2 3 1 ) . A c o n d iç ã o d e “c a
b e ç a ” d e s e m p e n h a d a p e lo e s p o s o , o u su a
a u to r id a d e , n ã o é a q u e la d e u m h o m e m
d o m in a d o r q u e to m a to d a s a s d e c is õ e s
e e x i g e a s u b m i s s ã o d a e s p o s a . P e lo
c o n tr á r io , P a u lo c u id a d o s a m e n te p r o te g e
a d ig n id a d e e o b e m - e s t a r d e u m a e s p o
s a a o d e f in ir a a u to r id a d e d o e s p o s o e m
te r m o s d o p o d e r e d a p r o f u n d id a d e d e
s e u a m o r s a c r i f i c ia l p o r e la .
A lé m d is s o , P a u lo e m p r e g a o p r e s e n
te d o im p e ra tiv o p a ra e n fa t iz a r q u e o a m o r
a b n e g a d o d o e s p o s o p o r s u a e s p o s a d e v e
s e r p e r m a n e n te e in in te r r u p to . O te r m o
q u e P a u lo u s a p a r a a m o r é agapao, q u e
é m a is d o q u e a e x p r e s s ã o e s p a s m ó d ic a
d e u m a m o r r o m â n tic o , q u e s e o r ig in a d a
a tr a ç ã o f ís ic a o u d o d e s e jo , e q ü e v a i a lé m
d a d im e n s ã o d o a m o r a m ig o o u d e u m a
a f e iç ã o p e r m a n e n te . O t ip o d e a m o r q u e
u m e s p o s o d e v e s e n t ir p e la e s p o s a é u m
a m o r g e n e r o s o q u e p r o c u r a a t iv a m e n te
o m a is e le v a d o b e m - e s t a r d e s u a e s p o s a .
É o a m o r d o c o m p r o m is s o q u e p e r m a n e c e
f ir m e e c o n s t a n te e m m e io a to d a s a s c ir
c u n s tâ n c ia s o u a d v e r s id a d e s . É u m a m o r
q u e s e m a n té m r e s o lu to p e r a n te o s f lu
x o s e m o cio n a is a sce n d e n te s e d e sce n d e n te s
d a v id a . E s s e é o ú n ic o t ip o d e a m o r q u e
p e r m ite a u m m a tr im ô n io m a n te r - s e u n i
d o “e n q u a n to a m b o s v iv e r e m ”.
O p a d rã o d o a m o r d o e s p o s o p e la e sp o sa
é o m e s m o d o a m o r d e C r is to p e la I g r e
ja . P a u lo d e s c r e v e e s s e a m o r d e q u a tr o
m a n e ir a s :
1) É um amor abnegado (5 .2 5 ), o am or qu e
Cristo d em o nstrou na cruz. N enhu m o u
tro p a d rã o m ais e le v a d o d e a m o r seria
concebível. C. S. Lewis(em“TheFourLoves”,
1 9 6 0 ,1 4 8 ) afirm a qu e esse é o tip o de am or
de Cristo.
Não está totalm ente personificado nos
esp o so s, co m o tod os gostaríam os qu e
estivesse, m as naq u ele cu jo m atrim ônio
p a re ce m ais u m a cru cificação ; cu ja e s
p o sa re c e b e o m áxim o, p o rém d ev o l
ve o m ínim o, é a m ais ind igna d ele , é
— • co n fo rm e sua p rópria natu reza — a
m en o s am ável...
[Esse am or] n ão é en co n tra d o nas a le
grias do casam ento de qu alquer hom em ,
p o rém na tristeza, d o e n ç a e so frim en
1259
EFÉSIO S 5
to de um a b o a esp o sa , ou n o s erros de
outra qu e n ã o o se ja , em seu cu id ado
in cessan te (n u n ca igu alad o ) ou em sua
inexaurível m isericórdia: em seu perdão,
e n ão na sua aq u iescên cia .
2 ) O am or do esp oso , sem elhante ao de Cristo,
é um amor santificador (5 .2 6 -2 7 ). Paulo
usa c in c o v erb os p ara d escrev er a im ensa
d im en são d o am or de Cristo p o r sua n o i
va, a Igreja . E le “a amou” (5 .2 5 b ) , “sacri
ficou-se p or e la ” o u “se en trego u p o r e la ”
(5 .2 5 c ), para “santificá-la” (5 .2 6 a ) e “para
a apresentar a si m esm o igreja g loriosa,
sem mácula, nem ruga" (5 .2 7 ). O am or
abn egado de Cristo p ela igreja ex erce sobre
ela um e fe ito d e san tificação e d e e m b e
lezam en to . D a m esm a form a, q u an d o um
esp o so am a sua esp osa “co m o Cristo am ou
a Igreja”, esse am or a santificará e em belezará.
O b serv e q u e Cristo torn a a Igre ja santifi
cada “purificando-a com a lavagem da água”
(n ã o a re g e n e ra çã o p e lo b atism o, p orém
a p u reza da re g e n e ra çã o em T t 3 .5 , a qu al
é testem u nh ad a p e lo batism o ) “p ela p a
lavra” (o u p or um a co n fissã o d e fé ou da
palavra exp ressa p elo Espírito de D eus que
lib era a fé).
3 ) O am or do esp oso , sem elhan te ao de Cristo
p ela Igreja , é um amorprovedor (5 .2 8 -3 0 ).
P au lo torn a a fo ca liz a r o am o r d o e sp o so
p ela e sp o sa e m en cio n a duas co isa s a res
p e ito d esse am or, c o m o um a m or p ro v e
dor: (a ) O s m arid o s d ev em am ar a sua
p ró p ria m u lh er “c o m o a seu p ró p rio co r
p o ” (5 .28a). Assim co m o a Igreja é o “co rp o ”
d e C risto so b re a terra , tam b ém a e sp o sa
é a “e x te n s ã o ” de seu e sp o so . Em c o n
ju n to , e sp o so e e sp o sa sã o p artes co m -
p le m e n ta re s d e um a ú n ica p e rso n a lid a
de. Portanto, quando um esp oso cuida am o
ro sa m e n te de su a e s p o s a , “a m a -se a si
m e sm o ” (5 .2 8 b ) ; (b ) Q u a n d o u m e sp o so
considera a esp osa co m o parte de si m esm o,
p ro te g e -a e cu id a d ela a d e q u a d a m e n te
“com o tam bém o Senhor [faz] à igreja” (5.29).
“Alim enta” e “sustenta” (literalm ente “nutre”
e “protege”)se refere a um a provisão prática
e tan g ív el d e a fe to .
4) O am or do esp oso , sem elhante ao de Cristo
pela Igreja, é um amor permanente, ou se
guro (5.31-32), uma união santificada e vincu-
ladora, que dura toda a vida. Em 5.31, Pau
lo se refere a G ênesis 2 .24 co m o b ase para
esse argum ento (co m o Jesu s, cf. Mt 19.5,6).
É parte do “m istério” do m atrim ônio qu e o
esp oso e a esp osa se tornem “um a só car
n e ”, através do m atrim ônio (F i 5 .31b,32a).
Suas vidas estão tão intim am ente ligadas que
podem ser considerados um a única pessoa.
N essa unidade, a esp osa p od e sujeitar-se a
seu esp oso , e o esp oso p ode am ar e prote
ger sua esposa, de form a a até m esm o d e
sistir dos próprios interesses em troca de seu
bem-estar. D essa form a, Paulo encontra “um
grande m istério" n o relacionam ento entre
Cristo e a Igreja, rep resentado p elo vínculo
do m atrim ônio. A o longo dos versos 5.22-
33, P aulo interpreta o relacion am en to do
m atrim ônio à luz da união de Cristo com a
Igreja e, p o r m eio dessa interpretação, trans-
forcna o conceito do matrimônio no ideal mais
elevado que o m undo p o d e conhecer.
O v e r s o 3 3 fa z u m r e s u m o d a s r e s p o n
s a b ilid a d e s m ú tu a s q u e o e s p o s o e a e s
p o s a t ê m u m p a ra c o m o o u tr o . A r e s p o n
sab ilid ad e da e sp o sa é reafirm ad a e m term o s
d e “r e s p e i to ” ( li te r a lm e n te , “r e v e r ê n c ia ”) .
N o e n ta n to , é u m a r e v e r ê n c ia n o “s e n t i
d o d e a d m ir a ç ã o q u e tra d u z u m r e s p e i to
a p r o p r ia d o p e lo e s p o s o ” (S u m m e rs , 1 2 7 ) .
8 .2 . P a is e F ilh o s (6 .1 -4 )
8.2.1. Filhos, Obedeçam a seus Pais
(6.1-3) . O p o d e r sa lv a d o r d e C risto a o la d o
d a p o d e r o s a p r e s e n ç a d o E s p ír ito S a n to
to r n a m p o s s ív e l u m r e la c io n a m e n to h a r
m o n io so d en tro da fam ília. P a u lo agora p assa
a d iscutir o re la c io n a m e n to en tre pais e filhos.
E n q u a n to a ru p tu ra d o r e la c io n a m e n t o
m a tr im o n ia l e a d e s o b e d iê n c ia d o s f ilh o s
s ã o s in a is d e u m a s o c ie d a d e e m d e s in te
g ra ç ã o , u m r e la c io n a m e n to sa n to e h a r m o
n io s o n a fa m ília s ã o u m te s te m u n h o v iv o
d a p r e s e n ç a d e C ris to n a s o c ie d a d e .
E s c r e v e n d o a o c o r p o d e C r is to c o m o
u m t o d o , P a u lo o r d e n a a o s f i lh o s q u e
“o b e d e ç a m a s e u s p a is ” ( 6 .1 ) . O p r e s e n
te d o im p e ra tiv o d o v e r b o “o b e d e c e r ” fa la
d a o b e d iê n c ia c o m o u m c o m p o r t a m e n
to h a b itu a l e p e r m a n e n te , o u c o n t ín u o .
E m s e g u id a , P a u lo a p r e s e n ta q u a tr o ra
z õ e s q u e ju s t i f ic a m e s s a a f ir m a ç ã o :
1260
EFÉSIO S 6
1) “Sede o b ed ien tes a vossos pais no Senhor".
Essa frase p o d e ser in terpretad a de duas
m aneiras: (a ) ela d efin e o s lim ites da o b e
d iên cia co m o sen d o devida ao s pais cris
tãos; vista d essa form a, a ex p ressã o “no
Senh or” m odifica “pais” (B ru ce , 1 9 6 1 ,1 2 1 );
(b ) alguns consideram essa expressão com o
qualificadora do v erb o “o b e d e ce r”. Se essa
for a in terp retação correta, a exp ressão “no
Senhor” mostra sim plesm ente o espírito pelo
q u al a o b e d iê n c ia d ev e se r p re sta d a : a
o b e d iê n c ia cristã “assim co m o ao Se n h o r”
(A bbott, 176; L incoln , 402).
2) O s filh os d ev em o b e d e c e r ao s pais “p or
q u e isto é ju s to ” (cf. a p assag em p aralela
em C o lo ssen ses 3 .2 0 , “p o rq u e isto é agra
dável ao Se n h o r”). O sentid o aqui é de qu e
isso é co rreto , justo . “Ju s to ” ( dikaion) em
g reg o tem a m esm a raiz da palavra “co r
reto” (dikaiosyne). Stott (238-39) argum enta
q u e a o b ed iên cia à autoridad e p atern a é
um a “lei n atu ral” ou um a “rev e la çã o g e
ral” q u e é justa e verdadeira em tod as as
cu lturas através d os sécu lo s.
3) O s filh os d evem o b e d e c e r a seu s pais por
se tratar de um “m andam ento” de D eus (6 .2)
— aq u ele g u e diz “H onra a teu pai e a tua
m ã e” (cf. Ê x 2 0 .f 2; D t 5 .1 6 ). N ovam ente,
o v erb o “h o n rar” está n o p re sen te do im
perativo ( tima) , e transm ite a n e ce ss id a
de de uma contínua honra aos pais (Summers,
129). Salm on d afirm a (3 7 5 ): “A o b e d iê n
cia é um dever; a h o n ra é a atitude da qual
n a sce a o b e d iê n c ia ”. A h o n ra está re la c i
on ad a ao resp e ito p e lo s pais e é d iferente
de um a total conform id ad e.
4 ) A razão final de P au lo so b re a o b ed iên cia
ao s pais é q u e os cre n tes rec e b e ra m um a
p rom essa de D eu s para assim fazer: “Para
q u e te vá b e m , e vivas m uito tem p o so b re
a terra” (6 .2 ,3 ) . B ru ce (1 9 6 1 ,1 2 1 ) observa
q u e e s s e é o q u in to m a n d a m e n to d o
D ecá lo g o , p o rém o p rim eiro e ú n ico on d e
está inserida um a prom essa. E é o “prim eiro”
n ão só em re la çã o a o D ecá lo g o , m as tam
b é m a tod a a le i do P en ta teu co . O resp e i
to ad eq u ad o ao s pais d em onstra o p rin cí
p io de um a co rreta m aneira d e viver, qu e
traz co n sig o a reco m p en sa do bem -estar
e da co ntin u id ad e da vida.
8.2.2. Pais, não Provoqueis vossos
Filhos à Ira (6.4). A s s im c o m o a r e s
p o n s a b i l id a d e d a e s p o s a d e s e s u je ita r é
a c o m p a n h a d a p e la r e s p o n s a b il id a d e d o
e s p o s o d e a m a r ( 5 .2 2 - 3 3 ) , a q u i a o b r ig a
ç ã o q u e o s f ilh o s tê m d e o b e d e c e r é a c o m
p a n h a d a p e la r e s p o n s a b il id a d e d o s p a is
e m r e l a ç ã o a s e u s f i lh o s . O s p a is s ã o
m e n c i o n a d o s p o r c a u s a d e s e u p a p e l
reg u lad o r c o m o c a b e ç a s o u líd eres d a fam ília
( a r e s p o n s a b il id a d e d a m ã e e s tá in c lu íd a
n e s ta c la s s if ic a ç ã o ) ,
A r e s p o n s a b il id a d e d o s p a is e s tá d e f i
n id a e m te r m o s d e c o m a n d o s p o s i t iv o s e
n e g a t iv o s :
1) N o co m an d o negativ o , o s pais n ã o d evem
“p ro v o car a ira a seu s filh o s” (6 .4 ). O s pais
terrenos são extrem am ente im portantes na
fo rm ação d o c o n ce ito d os filhos a resp e i
to do Pai ce lestia l. D ev em se lem b rar qu e
um re la c io n a m e n to ad eq u ad o co m seu s
filh o s é m ais im p o rta n te q u e o co rre to
desem penho dos filhos. O s pais devem evitar
irar, incitar ressen tim en to s ou d esanim ar
seu s filhos através da im p o sição d e e x p e c
tativas exageradas, ou de um severo ou injusto
tratam en to ou d iscip lina, e assim p o r di
ante. Isso n ão im plica q u e os pais devam
ad otar um a p o lítica de n ã o corrig ir o s seus
filh os. Sign ifica sim p lesm ente q u e d evem
se co nd uzir de form a a n ã o p red isp o r seus
filh os à d eso b e d iê n cia ou reb elião .
2) P a u lo dá a o s p ais um a ord em p ositiva:
“E d u q u em -n o s” ou “cria i-o s n a doutrina
e a d m o esta çã o d o S e n h o r”. O s p ais são
resp on sáv eis p o r tom ar a in iciativa n o lar
de treinar e ensinar os filhos no que concerne
a o Senhor. “C riar” significa su stentar ter
nam en te ou d isp en sar am oro so cu id ado
e p ro te ç ã o . E ssa ta re fa é d e scrita m ais
detalhadamente de duas formas: (a) “Treinar”
(paideia) significa criar e en sinar “p rin ci
p alm en te p o rq u e se co n se g u e p ela d isci
plina e ca stigo ” (BA G D , 6 0 8 ). D essa for
m a, a exp ressão “criar” está relacion ad a ao
d esen v olv im en to do caráter, en q u an to (b )
“e n s in a r” ou “in stru ir” ( nouthesia) está
re la c io n a d o a q u estõ es q u e en v o lv em o
cam in h o da justiça.
N o f in a l d o v e r s o 4 , a f r a s e d e P a u lo ,
a c o m p a n h a d a d e p r e p o s iç ã o “d o S e n h o r ”,
p o d e s e r in te r p r e ta d a d e u m a d a s d u a s
s e g u in te s m a n e ira s . N o c a s o d o a b la t iv o
g reg o , e la sign ifica “c o n c e r n e n te a o S e n h o r”;
1261
EFÉSIO S 6
n o c a s o d o g e n it iv o , in d ic a “o S e n h o r é o
p a d r ã o o u a fo n te q u e c o n d u z ”. A m b a s as
p o s s ib il id a d e s s ã o v e rd a d e ir a s . P o r q u e o s
filhos sã o u m a “h e ra n ça d o Se n h o r” (S l 127 .3 ),
“tre in a r” e “e n s in a r ” s ã o re s p o n s a b ilid a d e s
e x t r e m a m e n te im p o r ta n te s d o s p a is e d a s
m ã e s . E m b o r a o tr e in a m e n to d o s p a is e a
co n d u ta d o s filh os se ja m m u itas v e z e s m e n o s
q u e p e r fe ito s , o n d e o r e la c io n a m e n to p a i-
f ilh o é s a n to e c o r r e to , o re s u lta d o g e r a l
m e n te s e r á c o r r e to e s a lu ta r ( c f . P v 2 2 .6 ) .
8.3- Senhores e Servos (6 .5-9)
8.3.1. Servos, Obedeçam a seus Se
nhores Terrenos (6.5-8). D a m e sm a form a
c o m o a e s p o s a e o s f i lh o s , o s s e r v o s ta m
b é m fo r a m e le v a d o s p e lo e v a n g e lh o a u m
lu g a r d e h o n r a e re s p e ito n a Ig re ja , e P a u lo
o s m e n c io n a p r im e ir a m e n te e m q u a tr o
v e r s o s r e la t iv o s à r e s p o n s a b il id a d e q u e
a c o m p a n h a e s s a s u a n o v a p o s iç ã o . O fa to
d e P a u lo m e n c io n a r p r im e ir o o s s e r v o s
in d ic a q u e e s te s fo ra m a c e ito s c o m o m e m
b r o s r e s p e i ta d o s d a Ig r e ja , q u e p o d e r ã o
h o n r a r s e u M e s tr e c e l e s t i a l d a m e s m a
m a n e i r a c o m o s e r v ia m s e u s s e n h o r e s
te r r e n o s . E m c a d a u m d o s q u a tr o v e r s o s
d ir ig id o s a o s s e r v o s , J e s u s C r is to é o f o c o
e o m o t iv o p r in c ip a l d e s e u s e r v iç o , p o is
d e v e m s e r v ir “fa z e n d o d e c o r a ç ã o a v o n
ta d e d e D e u s ” (6 .6 ) , “c o m o serv o s d e C risto”
( 6 .6 ) , “s e r v in d o d e b o a v o n ta d e c o m o a o
S e n h o r e n ã o c o m o a o s h o m e n s ” ( 6 .7 ) ,
s a b e n d o q u e “c a d a u m r e c e b e r á d o S e
n h o r to d o o b e m q u e f iz e r ” ( 6 .8 ) .
A lg u é m p o d e r ia p e r g u n ta r : “P o r q u e
o N o v o T e s ta m e n to n ã o c o n d e n a e x p l i
c i ta m e n te a e s c r a v id ã o c o m o s e n d o u m
m a l, a o in v é s d e c o n f o r m a r o r e la c io n a
m e n to d o s c r e n te s c o m e la ? ” N o p r im e i
r o s é c u l o d o m u n d o r o m a n o , a ig r e ja
p rim itiv a e r a p o li t ic a m e n te im p o te n te . S e
t iv e s s e a ta c a d o d ir e ta m e n te a in s t i tu iç ã o
ro m a n a d a e s c ra v id ã o , e p r o c u r a d o e m a n
c ip a r e m g r a n d e e s c a la o s e s c r a v o s , te r ia
c o n f ir m a d o “a s u s p e ita d e m u ito s m e m
b r o s d e s ta a u to r id a d e d e q u e o e v a n g e
lh o t in h a c o m o o b je t iv o a s u b v e r s ã o d a
s o c ie d a d e . A m e lh o r a t itu d e e r a e s t a b e
le c e r c la r a m e n te o s p r in c íp io s d o e v a n
g e lh o e d e ix a r q u e e s te s a g is s e m n o te m
p o o p o r tu n o s o b r e e s s a in íq u a in s titu iç ã o ”
(B r u c e , 1 9 6 1 , 1 2 5 ) . N o e n ta n to , o e v a n
g e lh o cie C ris to r e a lm e n te c o n c e d e u lib e r
d a d e e s p ir itu a l e d ig n id a d e p e s s o a l a o s
e sc ra v o s . T a m b é m c o lo c o u e m m o v im e n to
o s p r in c íp io s q u e a ju d a r a m a r e m o v e r a
c r u e ld a d e d a e s c r a v id ã o r o m a n a , o q u e ,
a o f in a l , le v o u à s u a e x t in ç ã o n a c o m u n i
d a d e cristã (v e ja a carta d e P a u lo a F ilem o m ).
P a u lo e n s in a a o s e s c r a v o s c r is tã o s p o r
m e io d e d u a s f ra s e s .
1) Ele os aconselha a “obedecer a seus senhores
seg u n d o a c a rn e ” (6 .5 ). A liberd ad e esp i
ritual não deve levá-los a se revoltarem contra
seu s sen h o res. P e lo contrário , agora co m o
um crente , o escrav o d everá prestar um a
o b e d iê n cia e um a lea ld ad e ainda m aio res
“p o rq u e a h onra de Cristo, e do e v a n g e
lho , estava vincu lad a à qu alid ade de seu
se rv iço ” (B ru ce , 1961, 123). P au lo exorta
os escrav os a o b e d e ce re m sa eu s se n h o
res (a ) “co m tem o r e trem or” (litera lm en
te, tem o r e m ed o ), p ara q u e sua cond u ta
n ão traga o p rób rio ao n o m e de Cristo; (b )
“na s in cerid ad e de v o sso c o ra ç ã o ”, isto é,
“sem in te n ç õ e s secu n d árias ou p o sterio
re s ” (Su m m ers, 132), “n ã o servind o à v is
ta, co m o p ara agradar ao s h o m e n s”; m as
(c ) “fazendo de coração a vontade de D eu s”
(literalm ente, “com toda sua alm a”, o oposto
à relu tân cia e in d iferença).
2 ) P a u lo a c o n s e lh a o s e sc ra v o s cr is tã o s a
serv irem seu s s e n h o re s te rre n o s (a ) co m
“s in c e r id a d e ” (6 .7 ; lite ra lm e n te , “d e b o a
v o n ta d e ”), o q u e su g e re u m a p ro n ta d is
p o s iç ã o q u e “n ã o e sp e ra p ara se r o b r i
g a d a ” (R o b in s o n , 2 1 1 ) e (b ) “serv in d o de
b o a v o n tad e c o m o ao Se n h o r e n ã o co m o
ao s h o m e n s”. A razão de tal serv iço é “qu e
cad a u m re c e b e rá d o S e n h o r to d o o b e m
q u e f iz e r” (6 .8 ) . A fra se “B e m e s tá ”, p ro
n u n c ia d a p o r C risto n o ju lg a m e n to (M t
2 5 .2 1 , 2 3 ) , é m u ito m ais im p o rta n te d o
q u e o s b e n e f íc io s te m p o ra is o u a fa lta
d e le s . A ssim , o s serv o s cris tã o s p o d e m
serv ir c o m a leg ria , m e sm o a o s s e n h o re s
m ais cru éis, sab en d o qu e sua recom p en sa
virá d e C risto .
8.3.2. Senhores, Tratem seus Escra
vos — ou Servos — com Justiça (6.9).
P a u lo a c o n s e lh a o s s e n h o r e s a “tratar [seus]
e s c r a v o s [ou serv o s] d a m e s m a fo r m a ”, is to
1262
EFÉSIO S 6
é , c o m r e s p e i to e d e a c o r d o c o m a R e g r a
Á u r e a . D e v e r ã o d e d ic a r a s e u s e s c r a v o s
( o u s e r v o s ) to d a a c o r te s ia q u e d e s e ja m
r e c e b e r . P a u lo p r o íb e a o s s e n h o r e s c r is
t ã o s o u s o d e a m e a ç a s o u q u a lq u e r fo r
m a d e c r u e ld a d e a f im d e a s s e g u r a r a
o b e d iê n c ia d o s e sc ra v o s , c o m o e ra c o m u m
e n tr e o s s e n h o r e s r o m a n o s .
A f r a s e “O S e n h o r d e le s e v o s s o ” in
d ic a q u e P a u lo e s t á s e d ir ig in d o a o r e la
c io n a m e n t o s e n h o r - e s c r a v o o u s e n h o r -
s e r v o ( e x a t a m e n t e c o m o a c o n t e c ia e n
tre F ile m o m e O n é s im o ). “N ã o h á a c e p ç ã o ”
e m s e u S e n h o r c e le s t ia l ; D e u s c o n s i d e
ra ig u a lm e n t e s e n h o r e s e e s c r a v o s , o u
s e r v o s , e n ã o m o s tr a q u a lq u e r p a r c ia l i
d a d e . “A c e p ç ã o ” (N IV ) o u “p ar c ia l id a d e ”
(K JV , N A S B , N R S V ) é u m a p a la v r a c o m
p o s t a q u e c o n s i s t e d e d u a s o u tr a s q u e
s ig n i f ic a m “f a c e ” e “r e c e b e r ”. O S e n h o r
n o c é u n ã o r e c e b e o u a v a lia u m a p e s
s o a c o m b a s e e m su a a p a r ê n c ia f ís ic a , n a s
c ircu n stâ n c ia s ex te r io re s o u e m su a p o s iç ã o
n a v id a ; p e l o c o n t r á r io , E le r e c e b e u m a
p e s s o a d e a c o r d o c o m a r e s p o s ta à s u a
g r a ç a e a c o n d iç ã o ín t im a d e s e u c o r a
ç ã o . T ra tar u m s e r h u m a n o d e fo rm a m e n o s
ju s ta o u c o r r e t a é c o n t e s t a r a q u e le q u e
n ã o m o s t r a q u a lq u e r p a r c ia l id a d e .
S e rá q u e e ss a s p a lav ras se r ia m re lev a n tes
h o je e m d ia? E m b o r a o r e la c io n a m e n to
s e n h o r -e s c r a v o n ã o s e ja e x a ta m e n te ig u a l
a o r e la c io n a m e n to p a tr ã o -e m p r e g a d o , o s
p r in c íp io s q u e P a u lo e x p õ e e m 6 .5 - 9 s e
a p lic a m a e m p r e g a d o s e p a tr õ e s c r is tã o s .
O b s e rv e c o m o P a u lo re to rn a à ê n fa s e so b r e
a s d isp u tas atu ais en tre as d u a s c la ss e s o n d e
“c a d a la d o s e c o n c e n tr a e m a s s e g u ra r se u s
p r ó p r io s d ir e ito s e e m in d u z ir o o u tr o a
c u m p r ir o s s e u s d e v e r e s . . . P a u lo in s is te
e m q u e c a d a la d o s e c o n c e n t r e e m s u a s
r e s p o n s a b il id a d e s e n ã o e m s e u s d ir e ito s ”
(S to t t , 2 5 8 - 2 5 9 ) . A a p l ic a ç ã o d e s s a ê n fa
s e é a m e lh o r a b o r d a g e m p a r a a s o lu ç ã o
d e p r o b le m a s m ú tu o s , e m q u a lq u e r n í
v e l d a v id a .
9. Estar Capacitado e Equipado para
a Batalha Espiritual (6.10-20)
É co m u m q u e a u to re s d o N o v o T e s ta m e n to
te r m in e m s u a s c a r ta s f a z e n d o u m a p e lo
b a s e a d o n a m e n s a g e m m a is im p o r ta n te
q u e e s tá a li c o n t id a . I s s o é o q u e P a u lo
fa z e m 6 .1 0 - 2 0 ; e m o u tr a s p a la v r a s , e s s e s
v e r s o s d e v e m s e r e n te n d id o s n o c o n t e x
to d e to d o o liv ro d e E fé s io s . E s s a p a s s a
g e m n ã o é u m a v a r ia ç ã o o u u m a p ê n d i
c e p a r a p e s s o a s q u e tê m “u m in te r e s s e
e s p e c ia l p e lo e s tu d o d o s d e m ô n io s e d o
c o m b a te e s p ir i tu a l” (T u r n e r , 1 2 4 2 ) . A n
te s , e s tá re la c io n a d a a o p la n o d e D e u s p a ra
a r e d e n ç ã o , e p a r a a r e c o n c i l i a ç ã o c ó s
m ica q u e é o o b je tiv o d a m o rte -ressu rre içã o -
e x a l t a ç ã o d e C ris to .
E s s e s v e r s o s d e s c r e v e m a m a n e ir a p e la
q u a l, p o r m e io d a g ra ç a s a lv a d o ra d e D e u s
e e m C r is to , f o m o s l ib e r to s d o p e c a d o e
d a s g a rra s d e S a ta n á s . D e s c r e v e m , ta m
b é m , c o m o d e v e m o s v iv e r a g o r a c o m o
ju d e u s e g e n t io s r e d im id o s , e s p o s a s e
e s p o s o s , f i lh o s e p a is , e s c r a v o s (o u s e r
v o s ) e s e n h o r e s , c o n s id e r a n d o q u e n e s
s e m u n d o v iv e m o s e m u m a z o n a d e g u erra
q u e e s tá s e m p r e s e n d o a ta c a d a e d e s a f i
a d a p e lo m a lic io s o in im ig o d e D e u s —
S a ta n á s e s u a r e d e d e m a u s e p o d e r o s o s
e s p ír i to s . “D e s s a fo r m a , P a u lo p r e fe r iu
r e c o n s tr u ir su a m e n s a g e m s o b a fo rm a d e
u m te m a d e g u e r ra ” (T u rn e r , 1 2 4 2 ) n o q u a l
to d a a Igre ja é co n sid erad a co rp o rativ am en te
c o m o p a r t ic ip a n d o d e “u m a b a ta lh a c u jo s
p r in c ip a is a n ta g o n is ta s s ã o D e u s e o D i
a b o ” (L in c o ln , 4 4 2 ) .
F r e q ü e n te m e n t e o N o v o T e s ta m e n to
e m p re g a a lin g u a g e m m ilitar p ara d e scre v e r
a re a lid a d e d a g u e r ra e sp ir itu a l q u e a c o m
p a n h a ta n to a b a ta lh a esp ir itu a l e n tr e D e u s
e S a ta n á s ( b a ta lh a v e r t ic a l ) , c o m o o c o n
f lito te r r e n o e n tr e c r e n te s e m a u s e s p ír i
t o s d e s s a e r a d e tr e v a s ( b a ta lh a h o r iz o n
ta l) . P a u lo a c o n s e lh a s e u s le i to r e s d iz e n
d o : “fo r t a le c e i -v o s n o S e n h o r e n a fo r ç a
d o s e u p o d e r ” ( 6 .1 0 ) , “R e v e s ti-v o s d e to d a
a a rm a d u ra d e D e u s ” “p a r a q u e p o s s a is
e s ta r f ir m e s c o n tr a a s a s tu ta s c i la d a s d o
d ia b o ” ( 6 .1 1 ) e “p a r a q u e p o s s a is r e s is tir
[lite ra lm e n te e m greg o ] n o d ia m a u ” ( 6 . 1 3 ) .
E le in s is te q u e n o s s a lu ta n ã o é c o n tra ca rn e
e s a n g u e , m a s c o n t r a o s e s p ír i to s m a lig
n o s q u e d e s c r e v e s e g u n d o q u a tr o c a t e
g o r ia s : “p r in c ip a d o s ”, “p o te s ta d e s ”, “p r ín
c ip e s d a s t r e v a s ” e “h o s t e s e s p ir itu a is d a
m a ld a d e , n o s lu g a re s c e le s t ia is ” ( 6 .1 2 ) . D a
m e s m a fo r m a , n o s s a s a r m a s n ã o s ã o c a r
1263
EFÉSIO S 6
n a is o u te rre n a s , m a s esp ir itu a is (2 C o 1 0 .4 ).
A ss im , P a u lo a f ir m a q u e n o s s o e q u ip a
m e n to p a r a e s s a b a ta lh a é to d a a a r m a
d u ra d e D e u s ( 6 .1 4 - 1 8 ) .
E ssa lin g u a g em re p resen ta u m a m u d a n ça
a b r u p ta d o c e n á r io d e 5 .2 2 — 6 .9 . G o s ta
r ía m o s d e p o d e r v iv e r to d a n o s s a v id a e m
p a z e tr a n q ü il id a d e , m a s o fa to é q u e o
in im ig o d e D e u s ta m b é m é n o s s o in im i
g o , e é b a s ta n te c o m b a tiv o . “A lé m d is s o ,
n ã o h av erá u m a in terru p çã o d e h ostilid ad es,
n e m m e s m o u m a tr é g u a te m p o r á r ia o u
u m c e s s a r - fo g o , a té o f im d e n o s s a v id a
o u d a h is tó r ia , q u a n d o a p a z c e le s t ia l se r á
a lc a n ç a d a ” (S to tt , 2 6 2 ) .
O v e r s o 1 0 c o m e ç a c o m a fr a s e : “N o
d e m a is ”, o u “f in a lm e n te ” . E s s a f r a s e n ã o
s ig n if ic a q u e P a u lo t e n h a c h e g a d o a o fim
d e su a carta ; p e lo co n trá rio , s ig n ifica “d aq u i
a d ia n te , o u a p a r t ir d a q u i” , e e s tá in d i
c a n d o , d e s s a fo r m a , “o t e m p o r e s ta n t e ”.
P o rta n to , P a u lo e s tá e n fa tiz a n d o q u e “to d o
o p e r ío d o c o n t id o e n tr e a s d u a s v in d a s
d o S e n h o r se rá c a ra c te r iz a d o p e la p re s e n ç a
d e c o n f li to s . A p a z q u e o S e n h o r e s t a b e
l e c e u a tr a v é s d a c r u z d e C r is to s o m e n te
s e r á e x p e r im e n ta d a n o m e io d e u m a lu ta
s e m tr é g u a s c o n t r a o m a l. E p a r a is s o , o
p o d e r d o S e n h o r e a s u a a r m a d u r a s e r ã o
in d is p e n s á v e is ” (S to t t , 2 6 2 - 6 3 ) .
A g u e rra e sp ir itu a l d e q u e p a r t ic ip a m o s
t e m u m a c a r a c te r ís t ic a ú n ic a . N ã o p e r s e
g u im o s o in im ig o , n e m a d o ta m o s a ç õ e s
d e a ta q u e c o n tr a e le (d e s s a fo rm a , a s p r in
c ip a is a rm a s d o s o ld a d o r o m a n o , a s la n
ça s c lu p la s , e s tã o a u s e n te s d a r e la ç ã o d e
P a u lo ) . A o c o n tr á r io d is s o , “p e r m a n e c e
m o s f ir m e s c o n tr a o in im ig o ” ( 6 .1 1 ) , d e
fen d em o s n o ss o terren o (6 .1 3 ) e co n tin u am o s
“fu m es” (6 .1 4 ). D e v e m o s m an ter u m a p o sição
f ir m e , “n o á p ic e d a m o n ta n h a . , . e o in im i
g o d e v e s e c a n s a r e m s e u c o n s ta n te a ta
q u e d irigido a o a lto” (Tu m er, 1243). A p o s iç ã o
firm e q u e P a u lo te m e m m e n te é q u e estam os
s e n ta d o s a o la d o d e C risto n o re in o ce le stia l
( 1 .2 0 ; 2 .6 ) , o n d e C risto e s tá c o lo c a d o m u ito
a c im a d e “p rin c ip a d o , e p o d e r, e p o te s ta d e ,
e d o m ín io ” ( 1 .2 1 ) , t e n d o s u je ita d o “to d a s
a s c o is a s a s e u s p é s ” ( 1 .2 2 ) . A v itó r ia d o
c r e n te já fo i a ss e g u ra d a p e lo p ró p r io C risto ,
a tra v é s d e s u a m o r te n a c ru z , e d e v e m o s
n o s a p o ia r n e s s a v itó r ia .
N a c ru z , J e s u s tr a v o u a b a ta lh a c r u c ia l
c o n tr a S a ta n á s : “E , d e s p o ja n d o o s p r in
c ip a d o s e p o te s ta d e s , o s e x p ô s p u b l ic a
m e n te e d e le s tr iu n fo u e m si m e s m o ” (C l
2 .1 5 ; cf. M t 1 2 .2 9 ; Lc 1 0 .1 8 ;J o 1 2 .3 1 ; 1 9 .3 0 ) .
D e s sa fo rm a , “O D ia D ” a c o n te c e u n a m o rte
e r e s s u r r e iç ã o d e je s u s , m o m e n to e m q u e
D e u s f in c o u s u a b a n d e ir a n a te r r a s o b a
fo r m a d e u m a c ru z . O in im ig o s o fr e u u m
g o lp e fa ta l e a v itó r ia fo i g a r a n tid a , p o
r é m , a g u e r r a n ã o t e r m in o u . A v i tó r ia
c o m p le ta , “O D ia V ”, a in d a e s tá p o r c h e
g a r q u a n d o C r is to r e to r n a r à te r ra . N e s s e
ín te r im e x is t e u m “d ia d o p e c a d o ” e d e
v e m o s d e fe n d e r n o s s a p o s iç ã o q u e fo i
c o n q u is ta d a p o r J e s u s C r is to .
C o m o b o n s s o ld a d o s d e C r is to , d e v e
m o s s u p o r ta r o s s o fr im e n to s (2 T m 2 .3 ) ,
so fre r p e lo E v a n g e lh o (M t 5 .1 0 -1 2 ; R m 8 .1 7 ;
2 C o 1 1 .2 3 ; 2 T m 1 .8 ) , c o m b a te r o b o m
c o m b a te p e la fé (1 T m 6 .1 2 ; 2 T m 4 .7 ) ,
tra v a r a g u e r r a ( 2 C o 1 0 .3 ) , p e r s e v e r a r (E f
6 .1 8 ) , s e r m a is q u e v e n c e d o r e s (R m 8 .3 7 ) ,
s e r v i to r io s o s (1 C o 1 5 .5 7 ) , tr iu n fa r ( 2 C o
2 .1 4 ) , d e fe n d e r o e v a n g e lh o (F p 1 .1 6 ) , -
c o m b a te r p e la fé (F p 1 .2 7 ; J d 3 ) , n ã o t e
m e r o s o p o n e n t e s (F p 1 .2 8 ) , n o s r e v e s t ir
d e to d a a a r m a d u r a d e D e u s ( E f 6 .1 1 ,1 3 ) ,
e s ta r f ir m e s (v . 1 4 ) , d e s tr u ir c o m a v e r d a
d e o s b a lu a r te s d e fa ls id a d e d e S a ta n á s
(2 C o 1 0 .4 ) , le v a r ca tiv o to d o e n te n d im e n to
à o b e d iê n c ia d e C r is to (2 C o 1 0 .5 ) , e s e r
p o d e r o s o s n a b a ta lh a (H b 1 1 .3 4 ) .
9.1 . Nosso Aliado — Deus
(6.10-1 la)
“O S e n h o r ” n o s s o D e u s é u m a l ia d o
o n ip o te n te . E m b o ra n o s s o in im ig o s e ja u m
g r a n d e a n t a g o n is t a , n ã o é o n ip o t e n t e ,
o n ip re s e n te n e m o n isc ie n te . S o m e n te D e u s
é u m s e r in f in ito ; S a ta n á s é f in ito . E n tr e
ta n to , é u m in im ig o r e a l e p o d e r o s o , q u e
“a n d a e m d e r r e d o r b r a m a n d o c o m o le ã o ,
b u s c a n d o a q u e m p o s s a t r a g a r ” (1 P e 5 .8 )
e , s e t e n ta r m o s c o m b a tê - lo c o m n o s s a s
p r ó p r ia s fo r ç a s e r e c u r s o s , s e r e m o s v e n
c id o s . P a u lo n o s e x o r ta a e n c o n tr a r n o s
sa fo r ç a n o S e n h o r e n a fo r ç a d o s e u p o d e r
( c f . 6 .1 0 ; 1 .1 9 ,2 0 ; 3 . 1 6 - 2 1 ) .
O v e r b o “fo r t a le c e i -v o s ” e s tá n o p a s
s iv o d o im p e ra tiv o p re s e n te e s ig n ifica “se ja
1264
EFÉSIO S 6
f o r t a le c id o ” o u “s e ja c a p a c i t a d o ”. U m a
in te r p r e ta ç ã o m a is l ite r a l d e 6 .1 0 é “S e ja
c a p a c i t a d o p e lo S e n h o r e p e lo p o d e r d e
s u a f o r ç a ” ( c f . 3 -1 6 ) . N e s s e c o m b a te s e
ria n ã o s ó t o lo c o m o p e r ig o s o te n ta r s e r
fo r te c o m o a p o io a p e n a s d e n o s s a a u to
c o n f ia n ç a . A o in v é s d a a u to -s u f ic iê n c ia ,
P a u lo e x o r ta o s c r e n t e s a f o r ta le c e r e m -
se so b re n a tu ra lm e n te n a fo rç a d o se u p o d e r
(c f . Sl 1 8 .1 ,3 1 ,3 2 ,3 9 ) .
U m se g u n d o im p era tiv o o c o rre e m 6 .1 la :
“R e v e s ti-v o s d e to d a a a rm a d u ra d e D e u s ”.
P a ra q u e o s c r e n te s p r e v a le ç a m d ia n te d o s
a ta q u e s d e S a ta n á s , n e c e s s i ta m n ã o s ó d o
p o d e r d e D e u s , m a s ta m b é m d e su a a rm a
d u ra . E ssa a rm a d u ra p e r te n c e a D e u s , n ã o
s o m e n te n o s e n t id o d e q u e D e u s n o - la d á ,
m a s é ta m b é m a a rm a d u ra v e s t id a p e lo
p ró p rio M essias (Is 11 .4 ,5 ) e p o r je o v á (5 9 .1 7 ).
A s p a lav ras d e P a u lo d e ix a m c la ro q u e D e u s
fo r n e c e a a rm a d u ra , p o r é m c a b e a n ó s a
re s p o n s a b ilid a d e d e n o s re v e s t ir m o s d e la .
N ã o “r e n a s c e m o s ” c o m e la . D e v e m o s n o s
r e v e s t ir e v iv e r d e n tr o d e la , e n u n c a n o s
d e s a r m a r m o s s o b a i lu s ã o d e q u e a s h o s
til id a d e s d im in u íra m o u c e s s a r a m .
9-2. Nosso Inimigo— Satanás
e suas Forças (6.11b, 12)
P a u lo a d m o e s ta s e u s le ito r e s a e s ta r e m
f ir m e s , o u s e ja , d e v e m a d o ta r u m a p o s i
ç ã o d e fin id a “c o n tr a a s a s tu ta s c i la d a s d o
d ia b o ”. F a z e r u m a a v a lia ç ã o a d e q u a d a d o
in im ig o é u m a c o n d iç ã o c r u c ia l e m u m a
g u e r ra . E s u b e s t im a r n o s s o in im ig o e s p i
ritual p o d e le v a r-n o s a n e g lig e n c ia r o p o d e r
d e D e u s e s u a a rm a d u r a , q u e s ã o o s s u
p r im e n t o s n e c e s s á r io s a e s t e c o m b a t e
e s p ir itu a l. “C ila d a s ” s e r e f e r e m a o s m é
to d o s a s tu c io s o s q u e o D ia b o u s a c o n tr a
o s c r e n t e s e a Ig r e ja . A lg u m a s d e s u a s
e s t r a té g ia s s ã o a t e n ta ç ã o , a a c u s a ç ã o , a
in t im id a ç ã o , a d e c e p ç ã o e a d iv isã o . J á fo i
m e n c io n a d o o p la n o d e S a ta n á s ( 4 .2 7 ) d e
“s e a p r o v e i ta r d e r e la ç õ e s e s t r e m e c id a s
e d e s e n t im e n to s d e ira e n tr e o s c r e n te s ,
a f im d e p r e ju d ic a r s e u b e m - e s t a r e s e u
t e s te m u n h o p e s s o a l o u c o le t iv o ” ( B r u c e ,
1 9 8 4 ,4 0 4 ) . P a u lo ta m b é m e x o r ta o s c re n te s
a n ã o ig n o r a r e m a s a r t im a n h a s d e S a ta
n á s , p a r a q u e n ã o le v e v a n ta g e m s o b r e
e le s ( 2 C o 2 .1 1 ) . P o r e s s e m o t iv o o s c r e n
te s d e v e m s e r e s p ir itu a lm e n te c a p a c i t a
d o s e e q u ip a d o s p a r a q u e p o s s a m “e s ta r
f ir m e s ” c o n tr a ta is c i la d a s .
O v e rs o 12re v e la c la ra m e n te q u e n o s s o s
v e r d a d e ir o s in im ig o s n a v id a n ã o s ã o
h u m a n o s , p o r é m e s p ír i to s m a lig n o s s u
je i to s a o d e m ô n io (c f . 2 .2 ; 6 .1 1 ) . A p a la
v ra “lu ta r ” s ig n if ic a u m e n c o n tr o c o r p o a
c o r p o , o u u m c o m b a te f a c e a f a c e , e e ra
e m p r e g a d a p a r a fa z e r a lu s ã o à s lu ta s r o
m a n a s (c f . K JV , N K JV ). E m b o r a a s lu ta s
r o m a n a s e m “c a r n e e s a n g u e ” f o s s e m u m
e s p o r te m u ito c o m u m e m É fe s o e n a p r o
v ín c ia d a Á s ia , a Ig r e ja e s tá c o m p r o m e t i
d a c o m u m e n c o n tr o d e “fo r ç a s e s p ir itu
a is ” d e d im e n s õ e s c ó s m ic a s , q u e to r n a m
n e c e s s á r ia s a arm a d u ra e a s a rm a s d e D eu s.
T r ê s a s p e c to s c a r a c te r iz a m o s e s p ír i
to s d e m o n ía c o s q u e p e le ja m c o n tra a Igreja :
s ã o p o d e r o s o s ( c o m d ife r e n te s in f lu ê n
c ia s e c a te g o r ia s ) , m a lig n o s (o d e ia m a lu z
e h a b ita m a s t r e v a s d o p e c a d o e d a fa ls i
d a d e ), e a s tu c io so s (co n sp ira d o re s d e fa lsas
a r t im a n h a s ) (v e ja S to tt, 2 6 3 -6 6 ) . E sta h o s te
d e e s p ír i to s m a lig n o s p o d e r o s o s é a p a
r e n te m e n te c o m p o s ta p o r s e r e s a n g e lic a is
d e c a íd o s (c f. J d 6 ; A p 1 2 .4 ) , s o b o c o m a n d o
d e S a ta n á s (c f . J o 1 2 .3 1 ; 1 4 .3 0 ; 1 6 .1 1 ; A p
1 2 .7 ) c o m o o d e u s d e s te s é c u lo (2 C o 4 .4 ;
1 J o 5 .1 9 ) . J u n ta m e n t e c o m S a ta n á s , o p e
r a m n o s ím p io s ( E f 2 .2 ) , q u e s e o p õ e m à
v o n ta d e d e D e u s e a se u p o v o (D n 1 0 .1 2 ,1 3 ;
M t 1 3 - 3 8 ,3 9 ) e p r o c u r a m a ta c a r o s c r e n
te s e m n o s s o s d ia s (c f . 1 P e 5 .8 ; ta m b é m
J ó 1 .1 ,2 ) . F o r m a m u m a g r a n d e m u ltid ã o
(A p 1 2 .4 , 7 ) e s ã o d e s ig n a d o s p a r a d ife
r e n te s p o s iç õ e s d e c a te g o r ia e a u to r id a
d e n o r e in o d a s tre v a s ( E f 6 .1 2 ) .
P a u lo m e n c io n a a e x is t ê n c ia d e q u a
tro c a te g o r ia s e n tr e a s h o s t e s d e S a ta n á s ,
q u e g o v e rn a m a s trev a s e o p õ e m -s e a to d o s
o s c r e n t e s e à Ig r e ja :
1) “P rin cip ad o s” ( archai) sã o esp íritos m a
lig n os p o d ero so s qu e m antêm o s “territó
rios q u e lh es foram co n fia d o s” (T h ay er).
D ellingescreve(7D A ^ 1.479): “Arche sempre
significa ‘primazia’, ou, referindo-se ao tempo:
‘c o m e ç o ’... ou , re ferin d o -se à ca teg oria ;
‘p o d e r’, ‘d o m ín io ’ ou ‘o f íc io ’”. Talvez s e
jam aqui governantes regionais das diversas
categ orias d em o n íacas, tais c o m o “o [es-
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EFÉSIO S 6
pírito] p rín c ip e da P érsia” e “o [espírito]
príncipe da G récia” em D aniel 10 .12 ,13 ,20 .
2) “P o te s ta d e s ” ( exousiai) p o d e se referir
àq u eles esp íritos m aligno s p o d ero so s qu e
receberam autoridade de Satanás para presidir
so b re tod as as estru tu ras p e ca d o ra s do
m undo.
3) “P r ín c ip e s d as tre v a s” ( kosmokratoroi)
s ig n ifica , lite ra lm en te , “g o v e rn a n te s do
m u n d o” q u e , ao lad o d e Satanás, g ov er
nam so b re a atual ord em m undial, orga
nizada em re b e liã o co ntra D eu s.
4 ) “H ostes espirituais da m ald ade” p od e co m
p re e n d e r to d o s o s p o d e ro s o s esp írito s
m alignos (Lincoln, 444), ou se referir às vastas
h o stes d e d em ô n ios de categ oria in ferior
que servem aos propósitos iníquos de Satanás
para a d estru ição geral, e para m anter os
h o m en s em escrav id ão .
P a u lo u s a , e m E fé s io s , c in c o v e z e s a
e x p re ssã o “n o s lugares ce lestia is”. E la sem p re
e s tá lig a d a à e s fe r a e s p ir itu a l in v is ív e l, e m
c o n tr a s te c o m a v is ív e l d im e n s ã o m a te r i
a l d a v id a ( v e ja c o m e n tá r io s s o b r e 1 .3 ) .
O N o v o T e s ta m e n to s u g e r e s e is e s tá g io s
p a r a o d e s d o b r a m e n to d o d ra m a d e S a
tan ás e d e su a h o ste d e m o n ía ca : “su a cr ia çã o
original, su a q u e d a su b se q ü e n te , su a d ecisiva
co n q u ista p o r Cristo, seu ap ren d izad o através
d a Ig r e ja [3 .1 0 ], s u a p e r m a n e n t e h o s t i li
d a d e e s u a d e s t r u iç ã o f in a l” (S to t t , 2 7 3 )-
93■ Nossas Armas— Toda a
Armadura de Deus
( 6.13-20)
9.3.1. AArmadura(6.13-17). N o V erso
6 .1 3 , P a u lo r e p e te a e x o r ta ç ã o p re v ia m e n te
e n u n c ia d a e m 6 .1 1 ( “P o r ta n to , to m a i to d a
a a rm a d u ra d e D e u s ”) — d e s ta v e z , e m
v is ta d e 6 .1 2 , is to é , d a s h o s t e s d e S a ta
n á s q u e e s tã o e n v o lv id a s n a g u e r ra e s p i
r itu a l. U m a p a la v r a d ife r e n te p a r a “v e s
tir” Qanalabete) fo i u sa d a a q u i, e m b o r a e m
6 .1 1 te n h a s id o u tilizad o o te rm o endysasthe
(sig n ifican d o “estar v estid o c o m ”). Analabete
s ig n if ic a “t o m a r ” d e m o d o r e s o lu to p a r a
q u e , m e s m o d e b a ix o d o a ta q u e m a is ri
g o r o s o , o c r e n te p o s s a r e s is tir a o in im i
g o e “e s ta r f ir m e ” e m s u a p o s iç ã o .
P a u lo , p o r t rê s v e z e s , e x o r ta o s c r e n
te s a “e s ta r e m f ir m e s ” ( 6 .1 1 ,1 3 ,1 4 ) . C o m
is s o , q u e r d iz e r q u e o s c r e n t e s e a Ig r e ja
d e v e m p e r m a n e c e r c o n s ta n te s e in a b a
lá v e is , “e s ta n d o f ir m e s ” q u a n d o a b a t a
lh a e s p ir itu a l fo r in te n s a , s u s te n ta n d o su a
p o s iç ã o q u a n d o o c o n f li to e s t iv e r s e a p r o
x im a n d o d e s e u f in a l, s e m s e r e m “d e s lo
c a d o s o u a b a t id o s , p o r é m m a n te n d o -s e
f im ie s e v itoriosos e m s e u s p o sto s” (Salm o nd ,
3 - 3 8 5 ) . O b s e r v e q u e d ife r e n te s a s p e c to s
d e “e s ta r f ir m e s ” s ã o e n fa t iz a d o s d u r a n te
a p a s s a g e m ( 6 .1 0 - 2 0 ) . D e v e m o s “e s ta r
f ir m e s ” ( 6 .1 4 a ) , n a fo rç a d o p o d e r d e C risto
( 6 .1 0 ) , c o n tr a a s c i la d a s d o D ia b o ( 6 .1 1 ) ,
c o m n o s s a a rm a d u ra f ir m e m e n te c o lo c a d a
( 6 . 1 1 a ,1 3 a ) e e m o r a ç ã o ( 6 .1 8 - 2 0 ) .
A f r a s e “P a r a q u e p o s s a is r e s is t i r n o
d ia m a u ” se re fe re à q u e le s m o m e n to s q u a n
d o o a s s a lto d o in im ig o é m a is fo r te c o n tra
n ó s . A te n s ã o n o s ú lt im o s d ia s d o “já , m a s
a in d a n ã o ” o p e r a d u r a n te t o d o o p e r ío
d o e n t r e a P r im e ir a e a S e g u n d a V in d a
d e C r is to , e m b o r a s e ja m a is e v id e n te d u
r a n te o s m o m e n t o s e m q u e “m a is p a r t i
lh a m d a te r r ív e l s e n s a ç ã o ‘d o ú lt im o d ia ’”
(T u r n e r , 1 2 4 3 ) .
E m 6 .1 4 - 1 7 , P a u lo fa z u m a d e s c r i ç ã o
d a s v á r ia s p a r te s d a a rm a d u ra v e s tid a p e lo
s o ld a d o r o m a n o e , e m s e g u id a , m o s tr a
su a a p lic a ç ã o esp ir itu a l (c f. Is 1 1 .4 ,5 ; 5 9 -1 7 ).
O b s e r v e q u e s u a s m e t á f o r a s n ã o s ã o
e m p r e g a d a s d e fo r m a r íg id a ( p o r e x e m
p lo , e m 1 T s 5 .8 , a c o u r a ç a é a fé e o a m