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Prévia do material em texto

Maria lê para os alunos:
fartura de material garantiu
que a turma se
alfabetizasse no primeiro
semestre 
Foto: Gilvan Barreto
Endereço da página:
https://novaescola.org.br/conteudo/2601/letramento-
de-verdade
Publicado em NOVA ESCOLA 01 de Setembro | 2001
Prática Pedagógica
Letramento de verdade
Tanto quanto a alfabetização, o letramento dos alunos é
importante para a conquista da cidadania
Denise Pellegrini
Colaborou Fabiana Fevorini
"Se a cartilha é um tipo de leitura tão bom, por
que não há uma entre os livros de sua
estante?" A pergunta, feita pela alfabetizadora
Mariá Ferreira dos Santos a um pai que não
concordava com a substituição do tradicional
livro didático por textos variados, o deixou
sem resposta. Parcialmente vencido, ele deu
um voto de confiança à professora da Escola
Estadual Almirante Barroso, em São Paulo.
Meses depois, totalmente rendido,
parabenizou-a agradecido por ter alfabetizado
a filha tão rapidamente. Quando a história
aconteceu, Mariá estava estreando essa
metodologia de trabalho, mas já tinha plena
consciência de que não basta ensinar os
códigos de leitura e escrita, como relacionar os
sons às letras. É preciso tornar os estudantes
capazes de compreender o significado dessa
aprendizagem, para usá-la no dia-a-dia de forma a atender às exigências da
própria sociedade. Em outras palavras, promover o letramento.
Hoje, nove anos depois, Mariá é especialista em transformar isso em
realidade. Na sala de aula, o que não falta é material escrito. Livros, são mais
de mil. Mas há também jornais, revistas, gibis, folhetos de propaganda,
novenas, anúncios de cartomantes, receitas. Enfim, tudo o que possa servir
para garantir que o primeiro tijolo da grande construção da cidadania fique
bem assentado. "Enquanto ainda não sabem ler, leio tudo para as crianças",
conta ela. O resultado desse esforço é visível. "No final do primeiro semestre,
meus 35 alunos, de 6 e 7 anos, estavam lendo e escrevendo", comemora. Dia
após dia, Mariá ensina que há muitos jeitos de usar a técnica que eles recém-
https://novaescola.org.br/conteudo/2601/letramento-de-verdade
https://nova-escola-producao.s3.amazonaws.com/ECjD8Wcayh4w9kuV3hQwDUTpy9k73dYPft3mSNxhdPEzzEEeEjUc9nzSz9Sz/145-ler-escrever.jpg
aprenderam. Em junho, a garotada leu com a professora o manual de
instruções do rádio que ela levou para a classe. E cada novo jogo só começa
depois que as regras (sempre impressas, certo?) forem devidamente
decifradas. 
Infelizmente, essa não é a rotina nas escolas brasileiras. De modo geral, o que
mais se vê é a preocupação de fazer os estudantes decodificarem a língua. E
só. Muitas agem assim por acreditar que, num passe de mágica, todos se
tornem capazes de compreender os textos de um livro de Ciências Naturais
ou de descobrir o melhor jeito de localizar um endereço no mapa. "Isso é um
erro", resume Magda Soares, professora da Faculdade de Educação e
membro do Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita da Universidade
Federal de Minas Gerais. "Não é porque os processos de alfabetização e de
letramento são diferentes que devem ser sucessivos. O ideal é alfabetizar
letrando." 
Só o avanço contínuo impede que a criança chegue à 4ª ou à 5ª série sem
saber ler nem escrever. Até porque alfabetizar de verdade é bom também
para o professor. "Quem conhece o processo de aprendizagem e sabe
encaminhar as propostas de ensino alcança resultados sempre próximos de
100%", confirma Rosaura Soligo, coordenadora geral do Programa de
Formação de Professores Alfabetizadores do Ministério da Educação,
oferecido em parceria com secretarias de Educação, universidades e
organizações não-governamentais. 
Se você acha um sonho impossível que todos os alunos aprendam, é melhor
repensar alguns conceitos. Não há pesquisador em educação que aceite a
exclusão "natural" de algumas crianças. Todos podem aprender. Sem
exceção. A professora Valéria Scorsafava comprovou isso no ano passado,
quando alfabetizou uma turma de 4a série com 34 jovens entre 9 e 13 anos ?
vários dos quais se consideravam fracassados incorrigíveis. A classe foi
formada pela Escola Municipal de Ensino Fundamental Comandante Gastão
Moutinho, em São Paulo, especialmente para servir de referência e mostrar
que não nascemos inteligentes, mas podemos ficar aprendendo.
Leitura com sentido
Além de recuperar a auto-estima da turma, Valéria precisava destacar a
função social da leitura. A solução foi trabalhar por projetos. Um deles foi a
produção de um livro com cantigas de roda. Por serem muito conhecidas,
elas são ótimo material de trabalho no início da alfabetização. Mas e para
uma classe de adolescentes? "Todos se empolgaram porque sugeri que
produzíssemos o material para presentear a turma de 1ª série", diz. 
Ao mesmo tempo em que avançava nas atividades de escrita, Valéria
incentivava a leitura. Num canto da sala, colocou várias caixas com jornais,
gibis, revistas e livros de prosa e poesia. Ela promovia leituras diárias ? e os
estudantes podiam levar o material para casa. Uma das publicações que mais
chamaram a atenção da garotada foi a revista Superinteressante.
Principalmente a seção Superintrigante, que traz respostas para perguntas
curiosas. Logo nascia outro projeto: divulgar para os pequenos, da 1ª série, o
que era possível aprender naquelas páginas. "Cada dupla escrevia um texto,
só com as lembranças do que havia sido lido, para dividir com as outras
salas", conta. 
O melhor ainda estava por vir. Os próprios alunos combinaram que não
poderia haver erros de ortografia ou pontuação. Afinal, os textos não eram
feitos para a professora corrigir ? mas para os leitores. A idéia foi tão bem-
sucedida que as redações passaram a ser colocadas no mural. Assim, toda a
escola tinha acesso ao novo conhecimento. Em dezembro, apenas três
estudantes ainda tinham dificuldades de leitura e escrita. Este ano, a turma
continua na 4ª série, para aprender os demais conteúdos do currículo. "Eles
realizam com autonomia os trabalhos em todas as disciplinas e, o mais
importante, acreditam em sua capacidade de aprender", comemora Valéria,
que leciona Língua Portuguesa e Arte. 
Elisa, fonoaudióloga, diz que a solução para boa parte dos problemas de
aprendizagem está nas mãos do professor: não ao estigma de que os pobres
não aprendem.
A falta de confiança do estudante em si mesmo (e do professor em seu
trabalho) aparece em quase todas as histórias de fracasso, principalmente
nas regiões mais pobres. "Muitas escolas encaminham as crianças para
especialistas, mas a solução do problema está lá mesmo", afirma a
fonoaudióloga Elisa Maria Pinto Cesar Andrade. Acostumada a receber
pacientes com "dificuldade de aprendizagem" em seu consultório, ela
resolveu investigar a sala de aula. 
Toda semana, ela observa o trabalho de professores de 3ª e 4ª séries em duas
escolas públicas de Cotia e Taboão da Serra, na região metropolitana de São
Paulo, e sugere atividades testadas e aprovadas no consultório. Vários dos
exercícios, bastante simples, são baseados na utilização de livros e jornais. "É
preciso acabar com a crença de que filhos de pais analfabetos ou que não
possuem material de leitura em casa não têm condições de aprender", diz
Elisa. 
"A primeira coisa que a escola deve fazer é descobrir qual o grau de
letramento das crianças", ensina Magda Soares. Nas famílias escolarizadas há
muito mais situações desse tipo, como a leitura de jornais e revistas, a
redação de um bilhete ou de uma lista de compras. Mas é bem possível,
mesmo para quem não sabe ler, dominar o conceito de que existe um código
próprio para entender as letras, palavras e textos ? na conta de luz, na
indicação da linha do ônibus, no grande outdoor que chama a atenção na
rua. E isso, é claro, vale tanto para crianças como para adultos (leia o quadro).
Mais uma vez, vale o conceito: é possível ser analfabeto e letrado ao mesmo
tempo. Um exemplo vivo disso é o do menino que finge ler enquanto vira as
páginas de um livro. 
Isso só aumenta a responsabilidade em sala de aula. "Nos casos de alunos
cujas famíliastêm pouca ou nenhuma escolaridade, o professor, por ser
letrado, assume um papel crucial para o letramento deles", enfatiza Angela
Kleiman, professora do Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp). Cabe a ele conhecer e avaliar as situações
já vividas pelo estudante para fazê-lo avançar. Um bom caminho é inundar
essas crianças com aquilo que elas não têm em casa: livros, revistas, jornais,
material impresso de todo tipo. "Restringir-se ao livro didático é garantia de
fracasso no processo de aculturar a turma por meio da escrita", completa.
Tarefa interdisciplinar
O letramento inclui a capacidade que temos de nos instruir por meio da
leitura e de selecionar, entre muitas informações, aquela que mais nos
interessa. A qual professor, então, está reservada a tarefa de preparar os
estudantes para isso? Sim, você acertou ao responder que todos são
responsáveis. Pesquisa realizada nos Estados Unidos revelou que, num dia
normal, 80% do que um adulto lê é não-ficcão: o mapa de ruas da cidade, um
guia de turismo, uma revista, a página do jornal que traz o horário do
programa de TV favorito, uma enciclopédia, uma receita, a tela do caixa
eletrônico do banco. 
Ocorre que muitos professores de Língua Portuguesa limitam-se aos relatos
de ficção, o que está longe do ideal. "Dá para imaginar o sofrimento da
criança que só conhece textos narrativos até a 4ª série e, a partir da 5ª, se vê
diante de material informativo?", pergunta Rosaura Soligo. Segundo ela, o
problema é o empurra-empurra que essa questão provoca. Quem leciona
Língua Portuguesa atribui o problema ao titular da disciplina em questão ?
seja ela qual for. Este, por sua vez, acredita que a turma não aprende por
uma deficiência na alfabetização. 
De fato, argumenta Lusinete Vasconcelos de Souza, professora do Centro de
Ensino e Pesquisa Aplicada à Educação da Universidade Federal de Goiás, em
Goiânia, o docente que só explora histórias de ficção em classe tem boa
parcela de responsabilidade pelos futuros problemas da garotada. "É preciso
mesclar com o texto informativo, que estará presente não só na própria
escola como em toda a vida." Ela destaca, porém, que esse erro não é
exclusividade de quem leciona Língua Portuguesa. "Os textos têm
características diferentes, que precisam ser mostradas aos estudantes. Não
importa a série, não importa a disciplina. Todos têm de assumir essa
obrigação." 
Lusinete, doutora em Lingüística Aplicada e Estudos da Linguagem, fala com a
experiência de vinte e cinco anos de Magistério e treze de alfabetização.
Atualmente, ela dá aulas de Língua Portuguesa, História e Geografia para a 4ª
série. Os conteúdos das duas últimas disciplinas são amarrados em textos
expositivos. A hidrografia de Goiás, por exemplo, serviu para as crianças
localizarem no mapa os principais rios do Estado (Araguaia, Tocantins e
Parnaíba). Depois de avaliar as características e a importância dos três, a
turma montou uma maquete da bacia hidrográfica e escreveu um resumo
dos conceitos aprendidos. "Texto bom é aquele com boa estrutura e
conhecimento", diz a professora. Na classe dela, os trabalhos têm uma
introdução, o desenvolvimento das informações e uma conclusão, na qual o
aluno exprime sua opinião sobre o tema. 
O estímulo aos textos opinativos vem desde 1996, quando Lusinete assumiu
uma pré-escola. As crianças continuaram com ela na 1ª série. Em classe,
sempre liam notícias de jornal e discutiam acontecimentos do próprio dia-a-
dia. Mas havia um problema: o bebedouro era distante. Junto com a
professora, a turminha preparou um texto coletivo, solicitando à diretora a
instalação de novos garrafões de água. Na carta, foram listados argumentos
para justificar o pedido, como o calor intenso e a necessidade de se ausentar
por muito tempo da sala. "Aquelas crianças, hoje na 5ª série, são cada vez
mais críticas e conscientes", festeja. Na tese, ela conclui que o texto opinativo
facilita a construção e a compreensão dos textos expositivos, como os que
dominam as aulas de Ciências, Geografia, História e, por que não,
Matemática. 
Fórmulas e enunciados
No ano passado, o Programa de Avaliação da Rede Pública de Educação
Básica de Minas Gerais concluiu que 15% dos quase 145000 estudantes de 4a
série avaliados têm dificuldade para entender questões simples, baseadas na
interpretação de um texto curto. A deficiência apareceu também nos testes
de Matemática. O drama nem sempre é a fórmula, mas ler (e extrair o
sentido) do problema. "O alto índice de erros em questões que envolvem
operações simples, como adição, só pode ser explicado pelo fato de o
enunciado não ter sido compreendido", avalia Azuede Fogaça, uma das
coordenadoras do programa. 
A falha não é exclusiva dos mineiros. "Há um bom tempo percebemos que os
alunos sofrem para entender as provas de Matemática", reconhece Magali
Saquete Lima Moraes, coordenadora pedagógica de 1ª a 4ª série do Colégio
Província de São Pedro, em Porto Alegre. Por isso, desde 1997 a escola
desenvolve um trabalho específico para suprir essa carência. A solução? Levar
a criançada a interpretar textos em que elementos matemáticos estão
embutidos. "Em vez de exercícios que se resolvem só na base do cálculo,
usamos fichas com situações-problema, que precisam ser interpretadas",
explica a professora Edilene Regina Dotto Janjar. 
Nas aulas de Matemática que Edilene prepara para a 4a série entram até
crônicas, como Recado ao Senhor 903, de Rubem Braga (Para Gostar de Ler,
Vol. 1, Ed. Ática, tel. (11) 3346-3000, 11,90 reais), que fala sobre o morador de
um edifício cujo vizinho reclama do barulho. Entre informações sobre a
localização dos apartamentos e os horários dos condôminos, há muitas
situações envolvendo números. "Quando li o texto, achei-o perfeito. É preciso
raciocinar para responder a algumas questões que proponho", conta a
professora. 
Na avaliação dela, a capacidade de interpretação dos estudantes melhora
sensivelmente com trabalhos desse tipo. Em outra atividade, com a turma de
6a série, Edilene pediu que todos lessem jornais e recortassem notícias que
envolvessem Matemática. Porcentagens, números negativos e abreviados e
outros conteúdos típicos da disciplina acabaram virando anúncios criados e
apresentados pela moçada. Tudo isso apenas como "aperitivo". Depois, a
professora introduziu novos temas. "É um jeito bárbaro de tratar a matéria",
diz ela. "As informações já foram assimiladas dentro de um contexto e nada é
estranho para a classe." 
Jornal desde a pré-escola
Os jornais, aliás, são importantes fontes de letramento. De suas páginas é
possível extrair informação e lazer. Para isso, porém, é preciso aprender a lê-
los. E isso pode ser feito antes mesmo da alfabetização. A professora Stefânia
Padilha Costa, do Jardim Municipal Maria Sales Ferreira, de Belo Horizonte,
está proporcionando essa experiência à sua turma de 5 e 6 anos. "Quero
estimular o habito da leitura no dia-a-dia", planeja. O trabalho é feito todas as
segundas-feiras (as terças são dedicadas à poesia, as quartas, quintas e
sextas, à literatura e aos contos de fadas). 
"É incrível ver como os garotos já sabem que, se estou com um jornal nas
mãos, não vou ler um texto que começa com ?era uma vez?", ela conta. No
início das atividades, Stefânia levou para a sala alguns exemplares do Estado
de Minas, que edita um suplemento semanal, o Gurilândia. Todos os
cadernos foram manuseados livremente. "Eles perceberam logo que o jornal
grande é dos adultos e o pequeno, das crianças." 
Semana após semana, a classe é apresentada a uma das seções fixas. O
nome de cada uma delas é incluído pela professora em listas (uma para a
edição "adulta" e outra para a "infantil") que ficam penduradas pelas paredes.
A curiosidade faz com que a gurizada aprenda a escrever as palavras. 
Do jornal adulto, Stefânia sempre escolhe uma reportagem para trazer novas
questões. Na maioria das vezes, o assunto é esporte, presença forte nas
edições de segunda-feira. "Vou fazendo perguntas até que meus alunos
consigam descobrir asinformações, principalmente pelas fotos", explica. Só
depois ela lê a notícia. Até o final do ano, o projeto é fazer com que a
garotada escreva o próprio jornalzinho. 
Mas o foco do letramento é outro. Meninos e meninas têm plena consciência
de que o Gurilândia é o espaço para historinhas, notícias e a programação
cultural. Ali, a turma descobriu que a peça teatral Bento Cabeça-de-Vento
estava estreando na capital mineira, o que provocou grande alvoroço. Tanto
que a professora organizou uma excursão para ver o espetáculo. Ou seja,
mesmo sem estar 100% alfabetizados, os alunos de Stefânia já aprenderam a
utilidade dos veículos de comunicação. Estão se letrando. 
Toda escola deve assumir a tarefa de formar leitores, e não apenas de
jornais. Mas essa não é uma missão só dela. "A pequena quantidade de
bibliotecas no país é um fator que contribui, e muito, para a deficiências de
letramento dos estudantes", afirma Angela Kleiman, da Unicamp. De acordo
com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 20% dos municípios
brasileiros não possuem biblioteca pública e 55%, que podem se considerar
privilegiados, contam com apenas uma. Sim, e apenas 25% de nossas cidades
têm mais de uma biblioteca pública, um número ridículo. Nos colégios, a
situação é um pouco diferente, mas nem por isso muito melhor: dados do
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, órgão do MEC,
mostram que só 57% dos estudantes do Ensino Fundamental têm prateleiras
de livros à sua disposição. 
A Escola Municipal Barão de Macahubas, no Rio de Janeiro, não tem uma
grande biblioteca, mas a professora Sônia Maria Cerqueira Pierucci comanda
uma bela sala de leitura, que tem por objetivo despertar o gosto pelas letras.
Em maio, ela acompanhou um grupo da 1a à 4a série à Bienal Internacional
do Livro, realizada na cidade. Durante o passeio, os alunos percorreram
vários estandes, manusearam publicações de diferentes autores e
ilustradores e até conheceram alguns escritores. A experiência serviu para
preparar um evento semelhante, no colégio, em julho. Nele, os estudantes
expuseram e autografaram as próprias obras. Algumas eram exemplares
coletivos, compostos por textos de toda a classe. Outras eram produções
individuais. Quase todas reproduziam histórias criadas, lidas e ouvidas
durante as aulas. 
O prazer de ler
Sônia organiza leituras em voz alta na classe todos os dias. Uma enquete
realizada pelos professores no início do ano mostrou que os pais dos alunos
lêem pouco. Por isso, a escola resolveu incentivar o hábito entre os filhos.
"Sempre que recito alguma coisa, mostro que adquiro conhecimento e, ao
mesmo tempo, sinto prazer e emoção", diz. Ela não deixa de valorizar, no
entanto, as opiniões de todos nas rodas de leitura. "Eles sabem muito. Às
vezes, relacionam histórias contadas pela família ao assunto em pauta, o que
abre brechas para debates interessantíssimos ou, quem sabe, a escolha de
novos livros." 
Desde o início do ano, a professora está formando contadores de histórias
entre a turma de 4ª série. Seis estão se aventurando em outras salas,
acompanhados apenas por um colega. Contar uma história, explica Sônia, é
diferente de lê-la. Significa fazer com que o ouvinte possa entrar no mundo
descrito pelo autor ? e interpretado pelo narrador. 
A preparação da garotada começa com uma leitura, em que ela dramatiza o
texto. "Em seguida, digo que qualquer um é capaz de fazer o mesmo e
convido os interessados." Para que até os mais retraídos se sintam
encorajados, Sônia insiste para que não haja nenhum tipo de reprovação
(vaias, risadas, comentários) ao trabalho dos colegas. Mesmo que o contador
gagueje ou fale muito baixo, é preciso esperar que ele termine. 
Outra técnica que faz sucesso é a leitura em parceria: uma parte da história é
lida pela criança, a outra pela professora. "Discuto o tema do livro e procuro
relacioná-lo ao contexto em que o aluno vive, ao conhecimento que já
possui", descreve Sônia. "Assim, tudo faz mais sentido." A formação inclui
também ensaios em casa e na escola. Para que os ouvintes se emocionem, é
preciso escolher a melhor maneira de compor cada passagem: triste, alegre,
irônica... "Sei que estou só mostrando um caminho e que os resultados virão
no futuro, mas é muito gratificante." 
Livros de ficção, como os usados por Sônia, jornais, revistas, manuais de
instrução, regras de jogos, cantigas de roda, folhetos de propaganda, textos
didáticos e de não-ficção com conteúdos de todas as áreas do conhecimento.
Leve esses materiais para a sala de aula ? e o que mais chegar às suas mãos.
Faltou alguma coisa? Sim. Não se acanhe. Venha conhecer essas maravilhas
junto com seus alunos. Porque os códigos de leitura e escrita a gente aprende
fácil. Mas o letramento é um aprendizado para toda a vida.
Quer saber mais?
Centro de Ensino e Pesquisa Aplicada à Educação, Campus II da Universidade Federal de Goiás, Caixa Postal 131,
CEP 74001-970, Goiânia, GO, tel. (62) 521-1103 
Colégio Província de São Pedro, R. Marechal Andrea, 345, CEP 91340-400, Porto Alegre, RS, tel. (51) 3328-2810 
Escola Estadual Almirante Barroso, Av. Jabaquara, 2875, CEP 04045-004, São Paulo, SP, tel. (11) 276-3692 
Escola Municipal Barão de Macahubas, R. Padre Januário, 220, CEP 20765-140, Rio de Janeiro, RJ, tel. (21) 2596-
5920 
Escola Municipal de Ensino Fundamental Comandante Gastão Moutinho, R. Coronel João da Silva Feijó, 40, CEP
02422-200, São Paulo, SP, tel. (11) 6231-3788 
Grupo de Estudos sobre Educação ? Metodologia de Pesquisa e Ação, R. Lopo Gonçalves, 511, CEP 90050-350,
Porto Alegre, RS, tel. (51) 3226-5218 
Jardim Municipal Maria Sales Ferreira, Av. Amazonas, 5855, CEP 30510-000, Belo Horizonte, MG, tel. (31) 3277-
7054 
Programa de Formação de Professores Alfabetizadores , Esplanada dos Ministérios, Bl. L, 6º andar, sala 613, CEP
70047-900, Brasília, DF, tel. (61) 410-9677 
BIBLIOGRAFIA 
Ler e Escrever: Compromisso de Todas as Áreas, Iara Conceição Bitencourt Neves e outros orgs., 231 págs., Ed.
da UFRGS, tel. (51) 3224-8821, 18 reais 
Ler, Escrever e Resolver Problemas, Kátia Stocco Smole e Maria Ignez Diniz (orgs.), 203 págs. Ed. Artmed, tel. (51)
3330-3444, 39 reais 
Letramento e Alfabetização, Leda Verdiani Tfouni, 104 págs., Ed. Cortez, tel. (11) 3864-0111, 9 reais 
Letramento, Um tema em Três Gêneros , Magda Soares, 125 págs., Ed. Autêntica, tel. (31) 3423-3022, 17 reais 
O Ensino e a Formação do Professor: Alfabetização de Jovens e Adultos, Angela Kleiman e Inês Signorini, 280
págs., Ed. Artmed, 36 reais 
Os Significados do Letramento, Angela Kleiman (org.), 294 págs., Mercado de Letras, tel. (19) 3241-7514, 29 reais

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