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Agente etiológico: gênero Flavivirus, família Flaviviridae (mesma do vírus da febre amarela) Sorotipos: DENV-1, DENV-2, DENV-3 e DENV- 4 Epidemiologia A incidência da dengue acompanha a distribuição do seu vetor e, por conseguinte, suas taxas são maiores no verão (período quente e úmido). Vetor: Aedes aegypti A fêmea pões os ovos em coleções de água parada, onde se desenvolvem as larvas. O Aedes albopictus também é capaz de transmitir a dengue, e foi recentemente introduzido nas Américas. Atualmente, ele é responsável pela endemia asiática. O mosquito adquire o vírus através de um indivíduo infectado, na fase de viremia, que começa um dia antes do aparecimento da febre e vai até o sexto dia da doença. Após 8-12 dias surge a capacidade de transmissão. Seus hábitos são diurnos (início da manhã) e vespertinos (final da tarde). Transmissão vertical: gestante para o recém-nato (“dengue neonatal”); transmissão por transfusão sanguínea (indivíduo na fase de viremia). Não há transmissão pessoa a pessoa, por secreções ou fômites. Nos dias de hoje, a dengue ocorre de forma contínua em nosso meio (endemia), com epidemias recorrentes se intercalando ao longo dos anos. Patogênese A replicação viral estimula a liberação de citocinas pelos macrófagos e linfócitos T. A síndrome febril é derivada da liberação dessas substâncias, principalmente TNF-alfa e IL-6. A resposta imunológica começa a surgir na primeira semana. Tanto a imunidade humoral qual a celular participam do controle da infecção. A partir do 6º dia, o IgM já é identificado, atingindo seu pico na primeira semana e persistindo por alguns meses. O IgG surge na primeira semana e tem seu pico ao final da segunda, mantendo-se positivo por vários anos. Forma Grave Geralmente ocorre em pacientes que já se infectaram por algum sorotipo. A chance de dengue grave é maior quando a segunda infecção é pelo sorotipo 2. Em termos de virulência, temos: sorotipo 2, 3, 4 e 1. Alguns pacientes podem evoluir para a forma grave já na PRIMOINFECÇÃO, como naqueles que possuem predisposição genética. 1) Teoria de Halstead: Após anos da primeira infecção, os anticorpos desenvolvidos previamente, tem caráter “subneutralizante”, denominados anticorpos heterólogos. O novo sorotipo se liga a esses anticorpos, que não conseguem neutraliza-lo e facilitam sua penetração nos macrófagos pelo mecanismo de opsonização. Opsonização é o processo que consiste em fixar epítopes do antígeno, para facilitar sua fagocitose. Esses epítopes são fragmentos de antígenos. Assim, uma quantidade muito maior de vírus penetra os fagócitos, se proliferando em larga escala, aumentando a viremia e estimulando a “tempestade” de citocinas, além de proteases ativadoras do sistema complemento e tromboplastina (fator pró-coagulante). 2) Teoria de Rosen: O quadro seria causado exclusivamente por cepas mais virulentas. 3) Teoria da “multicausalidade”: Inoculação do vírus pela picada Replicação inicial nas células mononucleares dos linfonodos locais ou nas células musculres esqueléticas Penetração nos monócitos → onde sofre a segunda onda de replicação Disseminação pelo organismo (interior dos monócitos ou livre no plasma) Integra as duas teorias e acrescenta outras variáveis: • Individuais: menores de 15 anos e lactentes, sexo feminino, brancos, presença de doenças crônicas, etc; • Virais: sorotipos circulantes e virulência das cepas; • Epidemiológicos: circulação simultânea de dois ou mais sorotipos, alta densidade do vetor, sequência de infecções, etc. Quadro fisiopatológico da dengue grave A trombocitopenia, também presente na dengue grave, é causada pela destruição periférica de plaquetas por ação de imunocomplexos e do sistema complemento, agravando-se, posteriormente, em função do surgimento de CIVD (coagulação intravascular disseminada). Nos lactentes que herdam anticorpos da mãe pode haver o desenvolvimento desse tipo de infecção devido à queda progressiva dos anticorpos ao longo dos nove meses de vida, passando a ser subneutralizantes. A Dengue é uma doença de notificação compulsória semanal, a menos que se expresse em sua forma grave, possuindo então caráter imediato de notificação. Quadro Clínico De modo geral, a dengue é uma doença autolimitada. Contudo, algumas pessoas evoluem para sua forma grave. Quase sempre essa evolução é precedida de sinais de alerta, alterações clinicolaboratoriais que derivadas do extravasamento plasmático. Outros pacientes também podem desenvolver hemorragias graves ou lesões de órgãos específicos, sendo igualmente classificados como dengue grave. 1) Fase Febril: Febre alta (39ºC a 40ºC) de início súbito que dura de 2-7 dias; Adinamia (fraqueza muscular); Cefaleia; Dor retrorbitária; Mialgia; Artralgia; Queixas gastrointestinais (anorexia, náuseas, vômitos e diarreia); A diarreia costuma ser branda, com fezes pastosas, 3- 4x ao dia. Exantema maculopapular – pode ser ou não pruriginoso, acometendo face, tronco, extremidades, mãos e pés. Muitos pacientes vão da fase febril diretamente para a fase de recuperação. 2) Fase Crítica: Essa fase se instala durante a defervescência (entre o 3º e o 7º dia após o início dos sintomas). Sinais de alarme na dengue: Dor abdominal intensa e contínua; Vômitos persistentes; Hipotensão ortostática e/ou lipotimia; Hepatomegalia > 2cm abaixo do rebordo costal; Sangramento de mucosas; Letargia e/ou irritabilidade; Acúmulo de líquido (ascite, derrame pleural e/ou pericárdico). Esses sinais precedem o estado de choque circulatório, que ocorre quando um grande volume de plasma deixa o espaço intravascular, resultando em hipovolemia e má perfusão generalizada. O intervalo entre o início do extravasamento e o estado de choque varia de 24 a 48h. uma vez instalado, sem tratamento, leva ao óbito em 12 a 24h, por falência orgânica múltipla. Pacientes com sinais de alarme devem receber reposição volêmica e serem mantidos em observação para constante reavaliação. Liberação maciça de fatores pró-inflamatórios Aumento súbito e generalizado da permeabilidade vascular Hipovolemia relativa e Hemoconcentração Choque circulatório falência múltipla de orgãos Como já mencionado, além do choque circulatório, a forma grave pode se manifestar de outras formas: • Hemorragia digestiva – frequente em pacientes com história de doença ulcerosa péptica, uso de AAS, AINES ou anticoagulantes; • Miocardite – se expressa por alterações no ritmo cardíaco, alterações da repolarização ventricular e disfunção contrátil; • Manifestações neurológicas – crises convulsivas, meningite linfomonocrítica, síndrome de Reye e encefalite. 3) Fase de Recuperação: Pacientes que recebem terapia apropriada durante a fase crítica atingem a fase de recuperação dentro de poucos dias. Diagnóstico 1) Diagnóstico Diferencial: • Gripe (influenza); • Arboviroses (zika e Chikungunya); • Leptospirose (forma anictérica); • Viroses exantemáticas (sarampo, rubéola, mononucleose, enteroviroses); • Hepatites virais; • Infecções bacterianas agudas (pielonefrite, pneumonia, colecistite, endocardite). A presença de leucocitose significativa, especialmente com “desvio à esquerda”, praticamente afasta o diagnóstico de dengue, sugerindo infecção bacteriana ou leptospirose. As formas graves podem ser confundidas com: • Sepse bacteriana; • Meningococcemia; • Malária; • Febre amarela; • Febre maculosa brasileira; • Hantovirose. Na Meningococcemia, as petéquias ou equimoses aparecem desde o primeiro dia, enquanto na dengue só são vistas após o terceiro ou quarto dia. Um dado que fala bastante contra o diagnóstico da dengue é a icterícia, mais comum na malária, leptospirose, hepatite viral,sepse e febre amarela. 2) Confirmação Diagnóstica: Até o quinto dia • Pesquisa de antígenos virais (NS1 no sangue); Esse antígeno é mais sensível nos primeiros 3 dias e pacientes com história prévia de dengue possuem sensibilidade diminuída. • Isolamento viral (cultura); • Teste de amplificação gênica (RT-PCR); • Imuno-histoquímica (biópsia ou autópsia). A negatividade desses testes não descarta o diagnóstico. Do sexto dia em diante: • Sorologia com pesquisa de IgM antidengue. Se for identificado IgG, significa que houve o contato prévio com o vírus, não contribuindo para o diagnóstico atual. 3) Classificação de Caso: Caso suspeito de dengue Pessoa que vive em área com transmissão de dengue ou que tenha viajado para um local que tenha nos últimos 14 dias, apresentando febre, com duração de 2-7 dias, e dois ou mais dos seguintes sintomas: • Náusea, vômitos; • Exantema; • Mialgias, artralgias; • Cefaleia, dor retrorbitária; • Petéquias; • Prova do laço positiva; • Leucopenia. Nas crianças, basta apresentar febre com duração de 2-7 dias. Prova do laço Pode ser feito em qualquer caso suspeito e consiste em desenhar um quadrado com 2,5cm de lado no antebraço do paciente, deixar o manguito do esfigmomanômetro inflado por até 5min (3min para crianças) e observar o surgimento de petéquias ou equimoses. O surgimento de 20 ou mais petéquias em adultos, e 10 ou mais petéquias na criança, define a positividade da prova do laço. Ela pode ser falso negativa em obesos e nos casos de choque. Caso suspeito de dengue com sinais de alarme É todo caso suspeito, que no período da defervescência, desenvolve um ou mais sinais de alarme. Caso suspeito de dengue grave É todo caso suspeito de dengue que apresenta: • Choque compensado ou descompensado; • Sangramento “grave” – melena, hemorragia intracraniana, hematêmese, metrorragia vultuosa; • Lesão grave de órgãos específicos. Caso confirmado Todo caso suspeito com confirmação laboratorial. Em situações de epidemia, somente os primeiros casos precisam de confirmação, o restante segue apenas critérios clinicoepidemiológicos. Todo caso de dengue grave deve ser confirmado por exames laboratoriais. Em sua ausência, podem seguir critérios clinicoepidemiológicos, desde que haja vínculo com outro caso confirmado laboratorialmente. Caso descartado • Exames laboratoriais negativos – desde que feitos no período adequado; • Confirmação laboratorial de outra doença; • Ausência de exames laboratoriais, mas com investigação clínica e epidemiológica sugestiva de outra doença. Tratamento Sintomáticos: hidratação (oral ou intravenosa), analgésicos, antitérmicos, antieméticos e antipruriginosos. Os salicilatos (AAS) e demais AINEs estão contraindicados na suspeita de dengue, pelo risco de sangramento. Profilaxia 1) Controle Vetorial Medidas individuais: erradicação dos criadouros peridomiciliares (qualquer coleção de água parada ou objeto que possa coletar chuva). Programa de Erradicação do Aedes aegypti: uso de inseticidas ambientais (UBV). 2) Vacinação Dengvaxia → vacina de vírus vivo recombinante atenuado que confere proteção aos 4 sorotipos. O vírus utilizado é uma cepa enfraquecida da febre amarela. A vacina está indicada para pacientes com idade entre 9 e 45 anos, e seu esquema posológico consiste de três doses subcutâneas, com intervalo de seis meses entre cada dose (0, 6 e 12 meses). Contraindicações: grávidas, imunodeprimidos e fenilcetonúricos. A pessoa está imunizada apenas com o esquema completo. A eficácia da vacina tem apenas 60%, mas evita casos graves em 80-95% dos casos. Foi licenciada apenas para uso clínico (ainda não está disponível na rede pública Grupo A 1) Definição: Caso suspeito de dengue + ausência de sinais de alarme + ausência de sangramentos espontâneos ou induzidos (prova do laço negativa). O paciente também não deve ser portado de comorbidades crônicas. 2) Conduta Diagnóstica: Exames específicos são obrigatórios apenas em situações não epidêmicas. Hemograma e outros exames não são obrigatórios. 3) Tratamento: Hidratação oral (1/3 com solução salina) Para crianças com idade < 13 anos (1/3 com solução salina): • Crianças até 10kg = 130ml/kg/dia • Crianças de 10-20kg = 100ml/kg/dia • Crianças > 20kg = 80ml/kg/dia Grupo B 1) Definição: Suspeita de dengue + ausência de sinais de alarme + presença de sangramento espontâneo (ex.: petéquias, equimoses) ou induzidos. Estão nesse grupo os portadores de comorbidades crônicas ou condições clínicas especiais (< 2 anos ou > 65) ou risco social. 2) Conduta Diagnóstica: Exames específicos são obrigatórios apenas em situações não epidêmicas. Contudo, hemograma é obrigatório para avaliar a hemoconcentração. 3) Tratamento: Paciente deve ficar em observação até o resultado do hemograma, enquanto isso ele recebe hidratação oral, conforme recomendações do grupo A. Hematócrito normal → manter a prescrição e reavaliar diariamente em ambulatório, por até 48h até o desaparecimento da febre. Hematócrito alterado → constitui sinal de alarme (hemoconcentração). Paciente deve então ser internado e conduzido para grupo C. Grupo C 1) Definição: Suspeita de dengue + presença de algum sinal de alarme. Sinais de alarme na dengue: Dor abdominal intensa e contínua; Vômitos persistentes; Hipotensão ortostática e/ou lipotimia; Hepatomegalia > 2cm abaixo do rebordo costal; Sangramento de mucosas; Letargia e/ou irritabilidade; Acúmulo de líquido (ascite, derrame pleural e/ou pericárdico); Aumento progressivo do hematócrito. 2) Conduta Diagnóstica: Exames específicos obrigatórios sempre. Alguns exames inespecíficos além do hemograma também são obrigatórios. Exames Inespecíficos Obrigatórios para GRUPOS C e D Hemograma Aminotransferases Albumina sérica RX de tórax (PA, perfil e incidência de Laurell) * USG de abdome (*avaliar presença de derrame cavitário) 3) Tratamento: Iniciar reposição volêmica intravenosa imediata. O paciente deve permanecer internado até estabilização (no mínimo por 48h). Após preencher critérios de alta, o retorno para avaliação clínica segue orientações do grupo B. Critérios para alta hospitalar: Grupo D 1) Definição: Caso suspeito de dengue + presença de sinais de choque, sangramento grave ou disfunção grave de órgãos. 2) Conduta Diagnóstica: Exames específicos obrigatórios SEMPRE. Há também alguns exames inespecíficos obrigatórios (citados acima). 3) Tratamento: O paciente deve permanecer internado, de preferência em leito de terapia intensiva, até estabilização clínica.
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