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Propriedade Fundador Director Editor Co-editor Conselho Editorial Endereço / Address Publicidade Apoios Design Gráfico e Paginação Pré-impressão e Impressão Sociedade Portuguesa de Ciências Veterinárias NIPC - 501 334 327 João Viegas Paula Nogueira José Pimentel de Carvalho Yolanda Vaz José Alexandre Leitão Cristina Lobo Vilela José Robalo Silva José Pedro Lemos José Oom Vale Henriques Luís Anjos Ferreira Telmo Pina Nunes FMV Pólo Universitário do Alto da Ajuda Av. da Universidade Técnica 1300-477 Lisboa Tel: +351 213580222, Fax: +351 213580221 Email: spcvet@spcvet.pt Internet: http://www.fmv.utl.pt/spcv/ Sociedade Portuguesa de Ciências Veterinárias Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade Técnica de Lisboa Maria José Beldock Direcção Geral de Veterinária Lisboa • Ano 108º • Vol. CIV • Nº 569-572 • pp 1 - 90 • Jan - Dez 2009 Publicação Semestral Tiragem 1000 exemplares Preço 25,00 Euro A Revista Portuguesa de Ciências Veterinárias foi fundada em 1902 É permitida a reprodução do conteúdo desta revista The reproduction of the contents of this publication is permitted Desejamos estabelecer permutas com outras publicações We wish to establish exchange with other publications Os trabalhos submetidos para publicação são analisados por especialistas Papers submitted for publication are peer reviewed R E V I S T A P O R T U G U E S A CIÊNCIAS VETERINÁRIAS DE Índice Artigos de revisão Nutrigenômica: situação e perspectivas na alimentação animal Nutrigenomics: state of the art and perspective in animal feeding Fernanda M. Gonçalves, Marcio N. Corrêa, Marcos A. Anciuti, Fabiane P. Gentilini, Jerri Teixeira Zanusso, Fernando Rutz Abordagem clínica de feridas cutâneas em equinos Clinical approach in equine skin wounds Júlio C. Paganela, Leandro M. Ribas, Carlos A. Santos, Lorena S. Feijó, Carlos E.W. Nogueira, Cristina G. Fernandes Utilização de bloqueio anestésico para exodontia do dente carniceiro em cão Block anesthesic used to do exodontia of canassial tooth in dog Víviam N. Pignone Memórias científicas originais Transferência embrionária em bovinos leiteiros na Ilha Graciosa (Açores): programa experimental de transferência de embriões sexados e congelados da raça Holstein Frísia Embryo transfer in dairy cattle at Graciosa Island (Azores): an experimental trial of sexed and frozen-thawed transfer of Holstein Friesian embryos João Chagas e Silva Exatidão da ultra-sonografia para diagnóstico de gestação aos 28 dias após inseminação e sua contribuição na eficiência reprodutiva em fêmeas Nelore e cruzadas Accuracy of the ultrasonography for pregnancy diagnosis at 28 days after insemination and its contribution in the reproductive efficiency on Nelore and crossbred females Adriana Gradela, Thiago Danieli, Tiago Carneiro, Denílson Valin Torres, Cássio Roberto Gradela, Vanessa Sobue Franzo Estudo do balanço eletrolítico alimentar para suínos machos castrados em acabamento mantidos em ambiente de alta temperatura Study of feed electrolyte balance of finishing castrated male pigs under high environmental temperature Anilce A. Bretas, Rony A. Ferreira, Patrícia C.B. Vale, Humberto P. Couto, Walter E. Pereira Estudo casuístico de dermatites por reacção de hipersensibilidade em cães e gatos Case study of dermatitis hypersensitivity reaction in dogs and cats Sílvia Silva, Sara Peneda, Rita Cruz, Helena Vala Parâmetros ecocardiográficos de cães cronicamente infectados com Trypanosoma cruzi (Cepa Colombiana) Echocardiographic parameters of dogs chronically infected by Trypanosoma cruzi (Colombian strain) João P.E. Pascon, Marlos G. Sousa, Aparecido A. Camacho Caracterização de agressões entre canídeos (83 casos) Characterization of dog-to-dog aggression (83 cases) Sofia Mouro, Cristina L. Vilela, Manuela R.E. Niza 5 13 19 25 31 37 45 55 61 Avaliação bacteriológica de anéis de lula, Dorytheutis plei (Blainville, 1823) (Mollusca: Cephalopoda), congelados e irradiados Bacteriological evaluation of squid rings, Dorytheutis plei (Blainville, 1823) (Mollusca: Cephalopoda), frozen and irradiated Flávia A. A. Calixto, Robson M. Franco, Eliana F. M. Mesquita, Helio C. Vital, Erika Murayama Comunicações breves Redução de fenda palatina, secundária a tumor venéreo transmissível, com obturador palatino Reduction of cleft palate, secondary to transmissible venereal tumor, with palatal prosthesis Liliana M. R. Silva, Fernando J. R. Magalhães, Ana Margarida A. Oliveira, Maria Cristina O. C. Coelho, Sílvia V. Saldanha Tronco celíaco-mesentérico em gato Celiac mesenteric trunk in cat Magno S. Roza, Fernanda M. Pestana, José M.F. Hernandez, Bárbara X. Silva, Marcelo Abidu- Figueiredo Electrocution accident in free-ranging bugio (Alouatta fusca) with subsequent amputation of the forelimb: case report Acidente elétrico em bugio de vida livre (Alouatta fusca) com consequente amputação do membro torácico: relato de caso Melissa P. Petrucci, Luiz A. E. Pontes, Fábio F. Queiroz, Márcia C. Cruz, Diogo B. Souza, Leonardo S. Silveira, Ana B. F. Rodrigues 71 77 83 87 Nutrigenômica: situação e perspectivas na alimentação animal Nutrigenomics: state of the art and perspective in animal feeding Fernanda M. Gonçalves*, Marcio N. Corrêa, Marcos A. Anciuti, Fabiane P. Gentilini, Jerri Teixeira Zanusso, Fernando Rutz Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil Resumo: O objetivo desta revisão é relatar a situação de estudos em nutrigenômica em sistemas de produção animal discutindo perspectivas quanto à utilização prática das inter- ações entre nutrição e genótipo e os benefícios produtivos relacionados. A importância da nutrição para a saúde e sua influência na ocorrência de doenças já é comprovada cientifica- mente por instituições de pesquisa. A conversão metabólica de componentes da dieta atua como um mecanismo de controle para a expressão genética. Desta forma, estudos em nutri- genômica têm despertado o interesse de cientistas, buscando entender a maneira como a alimentação regula a expressão de genes. O conhecimento de que a interação dieta-genoma possa contribuir para resolução de doenças crônicas ainda é discutido mundialmente, e o mecanismo de atuação de componentes dietéticos em nível molecular, ainda não foi evidenciado. Em sistemas intensivos de produção animal, esta área de estudos contribuirá para um melhor aproveitamento dos ingredientes das rações os quais representam um percentual considerável nos custos de produção. A necessidade em fornecer ingredientes naturais e biodisponíveis em dietas para animais, motiva a pes- quisa em nutrição e alimentação animal para o conhecimento de como determinados nutrientes irão atuar nos sistemas orgânicos e, conseqüentemente, melhorar o desempenho zootécnico e padrão sanitário dos efectivos animais. De acordo com o que foi descrito, o artigo de revisão abordará a aplicação desta ciência em sistemas de produção animal bem como os estudos já desenvolvidos nesta área. Summary: The aim of this review is to discuss the worldwide studies in nutrigenomics applied in farm animals systems, considering the perspectives about practical applications of nutrition gene interaction for animal health and the related benefits. The value of nutrition for health and its influence in many diseases is proved by researches laboratories and institu- tions. The metabolic conversion of chemical elements of diets also acts like a control mechanism for genetic expression. Therefore, the interest of nutrigenomics researches appears to be stronger, were scientific communities searches for answers about how food can regulated gene expression. The evidences of diet and genome interaction contribution for the wellness in chronic diseases conditions still remains in discussion, and the mechanisms by which nutrients perform molecular changes are still to be explained. In intensive animal production systems, this area of knowledge will contributed for a better used of diets ingredients, which represented a considerablehigh cost in the activity. The needed to offer natural and available ingredients in animal diets motivates research in animal nutrition and feeding into the explanation of the acting mechanism of the nutrients in organics systems in order to increase the performance and sanitary condition of animals. According to that, this review will address the application of nutrigenomics concepts in animal production systems and the research development in this field. Introdução Em sistemas de produção animal que visam obter alimentos para consumo humano, a maior parte dos custos, independente da espécie animal a ser explora- da, concentra-se nas despesas com a alimentação dos rebanhos. Estima-se que tal despesa represente de 70 a 80% do total de recursos despendidos em um sistema de produção animal intensivo. A precisão na determinação dos ingredientes ideais que irão favorecer índices zootécnicos de interesse pode ser a solução para reduzir esse custo com alimentação (Berchielli et al., 2006). Um adequado consumo de macro e micronutrientes que considere a idade, a constituição genética e o metabolismo de cada indivíduo, permite uma melho- ria na saúde e na eficiência produtiva a um baixo custo em relação a outros procedimentos (Ames, 2004). A importância da interação entre nutrição e saúde é evidente em um sistema de produção animal, ainda que fatores ligados a ambiente e manejo também influenciem o desempenho produtivo do indivíduo e do rebanho por conseqüência. Nesse contexto, alguns alimentos poderão apresentar-se como componentes bioativos na proteção do organismo contra enfermi- dades que possam acometer os rebanhos (Afman e Muller, 2006; Ferguson, 2006), sendo que alguns elementos como, selênio, vitamina E, ácido ascórbico e carotenos, por exemplo, já foram identificados como agentes protetores. Com o desenvolvimento de métodos bioquímicos e de técnicas de biologia molecular, a elucidação dos 5 R E V I S T A P O R T U G U E S A CIÊNCIAS VETERINÁRIAS DE ARTIGO DE REVISÃO *Correspondência: fmedeiros_fv@ufpel.edu.br Tel/fax: +55 53 32757274 Gonçalves FM et al. RPCV (2009) 104 (569-572) 5-11 6 mecanismos químicos de ação de constituintes da dieta, assim como seus efeitos subseqüentes em mecanismos homeostáticos relacionados à condição de saúde ou doença, está avançando de forma rápida e gradual. O mapeamento do genoma humano e ensaios realizados em modelos biológicos também possibili- taram a condução de estudos e a identificação de genes responsáveis por reações específicas ligadas a mudanças dietéticas em indivíduos susceptíveis a determinadas enfermidades. Ainda que parte da informação sobre os genes que constituem o código genético, suas respectivas localizações no cromosso- ma, estrutura e função tenham sido identificadas, ainda serão necessários estudos sobre a forma orquestrada em que os genes atuam no metabolismo (Marti et al., 2005). Essas interações são estudadas pela genômica da nutrição, ciência conhecida como nutrigenômica. O termo faz referência ao modo como certos nutrientes interagem com os genes de um sistema orgânico em particular, favorecendo a síntese de proteínas de forma benéfica ao indivíduo. Atualmente, muitas publicações na área de nutrição e saúde humana têm utilizado conceitos de nutri- genômica para estudar a prevenção e, em menor potencial, o tratamento de doenças multifatoriais (Sedová e Seda, 2004; Ferguson, 2006; Trujillo et al., 2006). Assim, trata-se de uma área da ciência em expansão e que ainda necessita de muitos estudos para que ações sejam adotadas a fim de maximizar os benefícios do melhor entendimento das interações gene-nutrientes. Ainda são escassos na bibliografia mundial, estudos ou revisões que procurem informar técnicos e pesquisadores dedicados as áreas de ciências biológicas e agrárias sobre os conceitos e aplicações da nutrigenômica em sistemas de produção animal. O objetivo desta revisão é relatar a atual situação de estudos de nutrigenômica bem como discutir perspectivas do conhecimento e entendimento das interações entre nutrição e genótipo para a saúde animal e, conseqüentemente, os benefícios produtivos relacionados. Nutrigenômica: estado da arte A combinação de dados através de projetos para mapeamento do genoma das espécies, e a disponibilidade de ferramentas de alta tecnologia para a investigação da expressão gênica, permitem o esclarecimento sobre a complexa interação entre nutrição e genoma a qual afeta diretamente a função celular. Embora a nutrigenômica seja uma ciência recentemente descoberta, o conhecimento de que componentes dos alimentos afetam a expressão de determinados genes e, por conseqüência, a expressão fenotípica, já esta claramente evidenciada (Bergmann et al., 2006). As informações obtidas a partir de estudos de nutri- genômica poderão orientar para a elaboração de uma dieta mais específica considerando a condição de saúde dos animais e a composição nutricional dos alimentos, o que poderá proporcionar melhores respostas metabólicas e, conseqüentemente, de produção. Esta nova ciência permitirá a prevenção de doenças importantes em humanos como obesidade, hipertensão e diabetes, bem como otimizar as terapias para estas enfermidades. Em animais também poderão ser prevenidas enfermidades prevalentes, em especial àquelas ligadas a condição nutricional do indivíduo (Sedová e Seda, 2004), como é o caso da cetose, por exemplo, uma enfermidade de etiologia metabólica a qual acomete principalmente rebanhos leiteiros com condição corporal acima do preconizado no momento do parto (Ingvartsen, 2006). Desta maneira, poderão ser prevenidas doenças de origem metabólica em função de uma correta nutrição dos rebanhos (Goodacre, 2007), através do mapeamento de genes relacionados a expressão de determinadas característi- cas da espécie, sexo, padrão racial, genético e que potencialmente sejam suprimidos por componentes funcionais das dietas. Em aves domésticas, já foram descritas várias diferenças no pareamento de bases (2,8 milhões) entre linhagens (International Chicken Polymorphism Map Consortium, 2004), evidenciando a ampla diversidade genética em uma mesma espécie e, até mesmo, em um mesmo gênero. A utilização das ferramentas para a pesquisa em nutrigenômica permitirá estudar os mecanismo de nutrientes ou alimentos bioativos sobre a expressão (transcrição e tradução) e sobre o metabolismo de genes, especialmente sobre o mecanismo molecular e requerimento de nutrientes (Jiang et al., 2004; Trujillo et al., 2006), bem como sobre a forma em que alimentos bioativos podem interagir entre si. Neste contexto a nutrigenômica apresenta algumas premis- sas básicas (Trujillo et al., 2006): - a dieta e os componentes dietéticos podem alterar o risco de desenvolvimento de doenças, modulando os processos múltiplos envolvidos com o início, a incidência, a progressão e/ou severidade; - os componentes do alimento podem agir no genoma, direta ou indiretamente, alterando a expressão dos genes e dos produtos destes; - a dieta pode potencialmente compensar ou acentuar efeitos de polimorfismos genéticos; - as conseqüências de uma dieta são dependentes do estado da saúde ou da doença e da genética de cada indivíduo; - intervenções na dieta baseadas fundamentalmente no conhecimento das necessidades nutricionais e no genótipo, podem ser utilizadas para o desenvolvimen- to de planos nutricionais individualizados que otimizem a saúde e previnam ou minimizem os efeitos das doenças crônicas. A possibilidade de adequar a alimentação às carac- Gonçalves FM et al. RPCV (2009) 104 (569-572) 5-11 7 terísticas do código genético de cada indivíduo, a fim de prevenir o desenvolvimento de certa enfermidade identificada geneticamente, tem estimulado pesquisa- dores de todo o mundo a aprofundar conhecimentos nesse segmento de pesquisa. Em estudos de labo- ratório, pesquisadores já verificaram que a lunasina encontrada na soja, influencia 123 genes envolvidos no surgimento do câncer de próstata auxiliando a interrupção no crescimentodo tumor. Também foi evidenciado que o brócolis estimula a ação de genes envolvidos na produção de antioxidantes que atuam mantendo as artérias saudáveis (Moraes e Colla, 2006). Assim como a soja e o brócolis apresentam efeitos benéficos para saúde humana, atuando como coadjuvantes na prevenção de doenças, outros alimentos poderão igualmente atuar como suportes em tratamentos de doenças crônicas em animais de produção, uma vez que sejam estudadas e evidencia- das suas propriedades terapêuticas. Alguns alimentos têm sido estudados a fim de elucidar seus princípios ativos, entretanto, informações concretas de como estes componentes nutricionais atuam no processo de síntese de aminoácidos e proteínas, em nível de código genético, e a maneira como serão aplicadas, ainda não são totalmente esclarecidas. Na área de clínica veterinária, alguns marcadores biológicos têm sido utilizados como ferramentas para diagnóstico definitivo de alguma doença ou, até mesmo, como medida de profilaxia. Um exemplo, é a utilização de biomarcadores para a detecção de exposição à aflatoxinas (Lino et al., 2007), as quais inibem a síntese proteica e do DNA, promovem stress oxidativo, induzem a fragmentação do DNA e inter- rompem o ciclo celular (Lino et al., 2004). Nos estu- dos em nutrigenômica, utilizam-se técnicas como o microarranjo para analisar as adaptações metabólicas que são induzidas pelas variações da nutrição (Bauer et al., 2004). O microarranjo (gen chip) é uma técnica experimental da biologia molecular que busca medir os níveis de expressão de transcritos em larga escala, isto é, medindo muitos (em alguns casos todos) transcritos simultaneamente. O desenvolvimento da tecnologia de microarranjo permite aos cientistas uma ferramenta para examinar sítios potenciais de ação de componentes alimentares e suas interações com vários processos celulares. Com o uso desta ferramenta, diversos genes e sua expressão relativa são avaliados simultaneamente em células normais e doentes, antes ou depois da exposição a diferentes componentes dietéticos. Como exemplo de tal evolução, cita-se o progresso do projeto do genoma suíno e de aves, o qual apresentou consideráveis avanços quanto ao entendimento da seqüência de nucleotídeos associada a genes específicos de suínos permitiu a produção comercial de microarranjos individuais (gen chip) que podem ser utilizados para avaliação de 23256 transcrições correspondentes a 20201 genes do geno- ma desta espécie (Caetano et al., 2004). Estas informações podem auxiliar a descoberta de novos biomarcadores para o diagnóstico de doenças e a predição de prognóstico, além de novas alternativas terapêuticas (Trujillo et al., 2006). O surgimento dos estudos em nutrigenômica e em nutrigenética, dois campos com diferentes abordagens para a elucidação da interação entre dieta e genes, possui um objetivo final em comum: otimizar a saúde através de uma dieta personalizada e fornecer poderosa aproximação para decifrar a complexa relação entre moléculas nutricionais, polimorfismo genético e o sistema biológico por inteiro (Mutch et al., 2005). A nutrigenômica descreve o uso de ferra- mentas para investigar um sistema biológico em particular, de acordo com um estímulo nutricional que irá permitir o conhecimento de como nutrientes influenciam mecanismos metabólicos e de controles homeostáticos. Por outro lado, a nutrigenética visa compreender como o tipo genético de um indivíduo coordena a resposta deste a uma dieta, e isto con- siderando o polimorfismo genético. O polimorfismo genético é reconhecido como um fator que pode alterar a resposta a componentes da dieta (efeito da transcrição nutricional) por influenciar a absorção, metabolismo ou sítio de ação (Kussmann et al., 2006). A nutrigenômica em sistemas de produção animal Os estudos que estão sendo realizados na área da nutrigenômica são, em maior parte, desenvolvidos em humanos. Desta maneira, ainda serão necessários muitos ensaios para determinar e compreender os benefícios advindos de nutrientes que sabidamente são responsáveis por contribuir para um desempenho produtivo satisfatório, mas que ainda não foram consolidados em relação a possíveis interações com determinados genes em diferentes espécies. Neste contexto inserem-se os minerais, nucleotídeos, aminoácidos, as vitaminas, dentre outros elementos orgânicos que podem modificar a transcrição de genes com o potencial de alterar as respostas biológicas e metabólicas envolvidas em processos como o cresci- mento e a diferenciação celular. Siske et al. (2000) observaram maior peso dos ovos quando utilizaram zinco e manganês, ambos na forma orgânica, nas dietas de aves produtoras de ovos. Em uma primeira análise, não se observa uma correlação entre a suplementação de tais minerais e o incremento de solutos e líquidos na composição do ovo. No entanto, estes elementos atuam ativamente como co-fatores em processos enzimáticos importantes para o organismo. A enzima anidrase carbônica, por exemplo, necessita da presença de zinco para catalisar a reação que produz ácido carbônico a partir de água e dióxido de carbono (Slattery et al., 2004), necessária para a formação da casca. É possível que outras Gonçalves FM et al. RPCV (2009) 104 (569-572) 5-11 8 reações orgânicas sejam direta ou indiretamente influenciadas por diferentes minerais, e que interações entre estes e o conteúdo genético do indivíduo ocorram durante a exposição. A utilização de nutri- entes com maior biodisponibilidade ao organismo poderá fornecer as quantidades ideais de um determi- nado mineral após o estabelecimento da dieta gênica para uma raça ou linhagem. Em um experimento com cobaias, observou-se que ratos alimentados com uma dieta pobre em selênio demonstraram um aumento na expressão de genes envolvidos no processo de danificação do DNA, no estresse oxidativo e no controle do ciclo celular e, ainda, apresentaram redução na expressão de genes envolvidos na detoxificação (Sreekumar et al., 2002). Blanchard et al. (2001) utilizaram arranjos de cDNA para demonstrar mudanças na expressão gênica intes- tinal induzida por deficiência de zinco em roedores. Estes estudos indicam que o perfil de expressão genética pode ser utilizado para a detecção de doses subótimas de micronutrientes essenciais utilizados nas dietas comerciais para as diversas espécies de interesse zootécnico. Os componentes do alimento com potencial bioati- vo modificarão diversos processos simultaneamente. Assim, um dos desafios no campo da pesquisa é a identificação de quais processos, ou a interação entre processos, serão mais importantes para proporcionar uma mudança fenotípica (Trujillo et al., 2006). Outro aspecto relevante a ser observado é a identificação de quais doenças poderão ser prevenidas ou debeladas por uma intervenção através da dieta. No estudo da relação nutrição-gene também deverá ser considerado o fator ambiental como um agente modulador da resposta, a qual será única frente às variadas condições ambientais. A progressão de um fenótipo saudável para um fenótipo de doença crônica deve ocorrer por mudanças na expressão de genes ou por diferenças na atividade de proteínas e enzimas (Kaput e Rodriguez, 2004), sendo estas ativadas ou suprimidas por agentes extrínsecos ao animal. Um grande número de componentes dietéticos pode alterar eventos genéticos e, de tal modo, influenciar a saúde. Além dos nutrientes essenciais, tais como cálcio, zinco, selênio, folato, vitaminas C e E, existe uma variedade de classes de nutrientes não essenciais e de componentes bioativos que parecem influenciar de maneira significativa a saúde. Estes compostos essenciais e não essenciais do alimento, sabidamente modificam um número de processos celulares associados à prevenção de doenças, incluindo o metabolismo carcinogênico, o balanço hormonal, mecanismos de sinalização celular, controle do ciclo celular, apoptose e angiogênese (Davis e Uthus, 2004). A vitamina E, por exemplo, é um potente seqüestrador de radicais livres e o mais poderoso antioxidantelipossolúvel da natureza (Souza et al., 2006), sendo associada à defesa das membranas extra e intracelulares contra espécies reativas que danificam as células, conferindo, conseqüentemente, proteção ao conteúdo genético destas estruturas. Souza et al. (2006) relataram efeitos positivos para força de cisalhamento (força de corte) em músculos de frangos de corte suplementados com níveis crescentes de vitamina E nas dietas, atribuindo esta maior firmeza à função de proteção da vitamina E às injúrias na membrana celular durante o processo de congelamen- to. Contudo, tal resultado pode ser utilizado para uma investigação mais profunda, associando a composição estrutural muscular de frangos suplementados com vitamina mais firme à expressão de genes para a síntese de proteínas estruturais da fibra muscular, por exemplo. Desta forma, uma avaliação genômica da ação da vitamina E no organismo animal conduziria a uma determinação mais específica sobre a função estrutural deste nutriente. Uma questão sobre o selênio interessante de ser destacada é que estudos demonstraram que este mineral reduz a incidência de câncer no fígado, próstata e nos pulmões de humanos (Clark et al., 1996). Entretanto os indivíduos não respondem da mesma forma a suplementação com selênio, já que a variabilidade genética consiste em um dos fatores que contribuem para o nível e o tipo de resposta. A glutationa peroxidase é uma enzima dependente de selênio que atua no sistema antioxidante da membrana celular. Um polimorfismo no códon 198 da glutationa peroxidase em humanos resulta em uma substituição de leucina por prolina, sendo este mecanismo associa- do ao aumento do risco de câncer de pulmão (Singh et al., 2006). Não foram identificadas neste estudo as causas que influenciaram este polimorfismo, no entanto, tal alteração pode estar relacionada a quanti- dade de selênio que é necessária para otimizar a atividade da enzima. A eficácia do uso de selênio com diferentes alelos para a glutationa peroxidase não é totalmente conhecida (Hu e Diamond, 2003). A atividade da vitamina D constitui um outro exemplo sobre os efeitos mediados pela expressão genômica de receptores para a mesma. Por sua vez, a expressão de genes para estes receptores são dependentes dos níveis de cálcio na dieta e do consumo de Vitamina D (Slattery et al., 2004). Dada a importância desta vitamina nos mais diferentes processos fisiológicos dos animais, informações que possam maximizar os benefícios de seus efeitos, implicaram em novas aplicações de conceitos nutricionais na formulação de dietas para animais de produção. A nutrigenômica em nutrição animal promete ser uma alternativa de grande utilidade principalmente em sistemas de produção intensiva, onde a alimentação contribui, associada a outros fatores inerentes ao ambiente e métodos de manejo, com uma parcela significativa para a melhoria do desempenho zootéc- nico dos lotes, bem como na rentabilidade econômica Gonçalves FM et al. RPCV (2009) 104 (569-572) 5-11 9 das unidades. Para este aumento na eficiência biológica, a aplicação de novas tecnologias em produção animal serão responsáveis por custos de produção mais baixos e competitivos. Nos domínios metabólico, genético, reprodutivo e produtivo, novas técnicas que não apresentem riscos à saúde pública e que sejam eticamente aceitas pelo consumidor, permitirão aplicar no próximo século e nos sistemas de produção intensiva, tecnologias de produção que incrementem o setor primário de produção de alimentos (Portugal, 2002). Os princípios de nutrigenômica a serem aplicados para animais de produção, poderão não ter somente o objetivo de prevenir doenças relacionadas a alterações genéticas, mas também correlacionar à utilização de certo nutriente em uma dieta animal com o aumento de índices produtivos. As descobertas a serem reali- zadas na próxima década utilizando ferramentas moleculares, tais como os microarranjos, irão revolu- cionar nosso entendimento básico sobre a fisiologia dos rebanhos e auxiliarão a definir novos métodos para o controle nutricional dos animais. Em longo prazo, provavelmente a transcrição destes perfis será capaz de fornecer diversas ferramentas elementares para a avaliação do status nutricional e fisiológico de um indivíduo, animal ou grupo de animais (Dawson, 2006). As técnicas utilizadas para a elucidação da genômica nutricional não são diferentes daquelas utilizadas nas pesquisas em genética molecular. Uma rede integrada que simultaneamente examina a genética e associa polimorfismo com doenças ligadas a dietas (nutrigenética), nutrientes induzindo a metilação do DNA e a alteração da cromatina (epigenômica nutricional), nutrientes que induzem mudanças na expressão gênica (transcriptômica nutri- cional) que alteram a formação e/ou bioativação de proteínas (proteômica) irá permitir um completo entendimento da inter relação entre dieta e desen- volvimento de doenças (Davis e Milner, 2004). Alimentos funcionais O termo “funcional”, bioativo ou nutracêutico, vem sendo aplicado como conceito de alimentos que proporcionam um benefício fisiológico adicional além das qualidades nutricionais básicas. Tais alimentos também são vistos como promotores de saúde, sendo muitas vezes associados a um tratamento profilático à instalação ou retardo de alterações pré- estabelecidas (Moraes e Colla, 2006). Variações entre os alimentos ingeridos não somente influenciam o consumo de componentes bioativos como alteram o metabolismo celular, influenciando os sítios de ação de ambos nutrientes essenciais e não essenciais (Milner, 2004). Segundo Diplock et al. (1999) foi definido consen- sualmente o conceito europeu de alimento funcional como “um alimento em que está satisfatoriamente demonstrado possuir efeito benéfico em uma ou mais funções fisiológicas alvo, para promover a saúde e bem-estar e/ou reduzir o risco de doença”. Um alimento funcional deve assim configurar-se, e seus efeitos devem ser demonstrados em doses que possam ser normalmente esperadas em uma dieta. Embora associado, este conceito não deve ser confundido com o conceito de nutracêutico, o qual se refere a um composto químico presente naturalmente nos alimentos ou substâncias encontradas naturalmente na natureza possíveis de ser ingeridas, como as ervas aromáticas, por exemplo, que sabiamente são benéficas para o organismo humano na prevenção ou tratamento de uma ou mais doenças, reforçando as reações fisiológicas. Embora, a maioria das substâncias de ocorrência natural benéficas a saúde originem-se de plantas, também existem diversos componentes fisiologica- mente ativos em produtos de origem animal que devem ser destacados devido a função em potencial na promoção de saúde como, por exemplo, os ácidos graxos conjugados encontrados em produtos cárneos, principalmente (Prates e Mateus, 2002). As recomendações nutricionais variam conforme a espécie, sexo, categoria linhagem ou raça e, considerando estas características, diversos manuais são elaborados baseados em exigências específicas. Em muitas situações a formulação das dietas não permitem a máxima expressão do potencial genético dos animais de produção, desconsiderando o manejo nutricional como favorecedor do desempenho. A maioria das vezes, tal medida é realizada através de ensaios que avaliam o desempenho dos animais submetidos a uma dieta e também por estudos de digestibilidade que determina, através das excretas do animal, a porção do alimento ingerido que realmente foi aproveitada pelo organismo. Estes ensaios, comuns nos estudos de nutrição animal, necessitam de um melhor aproveitamento de seus resultados, sendo necessário o conhecimento do sistema orgânico que está sendo favorecido por determinado nutriente. Nesse sentido, estudos de nutrigenômica permitiriam o entendimento do efeito de alimentos bioativos nas diversas funções celulares. Embora os estudos em nutrigenômica tenham progredido consideravelmente, a complexidade da interação entre nutrientes e genes promove questiona- mentosainda não esclarecidos, impossibililitando a aplicação dos benefícios relacionados a este novo conceito nos sistemas de produção animal. Conclusão Considerando o que foi relatado nessa revisão, entende-se que a variação genética individual pode influenciar a maneira com que nutrientes são assimi- Gonçalves FM et al. RPCV (2009) 104 (569-572) 5-11 10 lados, metabolizados, armazenados e excretados pelo organismo. Certamente o estudo da nutrigenômica permitirá uma maior compreensão de fatores ambientais e comportamentais que influenciam o fenótipo, possi- bilitando a formulação de dietas que favoreçam a condição de cada sistema de produção animal em especial, personalizando estas unidades de produção. O sucesso em aplicação deste novo conceito em nutrição possibilitará a maximização dos índices de produtividade e, conseqüentemente, a rentabilidade da atividade agropecuária. Para tal, muitos estudos ainda precisam ser desen- volvidos a fim de identificar e validar o potencial de alimentos ou componentes nutricionais que deter- minarão características ou condições desejáveis no organismo animal ou mesmo minimizar as não desejáveis. Bibliografia Afman L e Muller M (2006). Nutrigenomics from molecular nutrition to prevention of disease. Journal of the American Diet Association, 106, 569-576. Ames BN (2004). A role for supplements in optimizing health: the metabolic tune-up. Archives of Biochemistry and Biophysics, 423, 227-34. Bauer M, Hamm A, Pankratz MJ (2004). Linking nutrition to genomics. Biological Chemistry, 385, 593-596. Berchielli TT, Pires AV, Oliveira SG (2006). Nutrição de Ruminantes. FUNEP, Jaboticabal-SP. Prol Editora Gráfica. 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Fernandes Universidade Federal de Pelotas – RS – Brasil Resumo: Problemas cutâneos são comuns em eqüinos e freqüentemente determinam complicações e dificuldades diagnósticas. Devido à alta incidência de lesões cutâneas em eqüinos registrados no HCV no período de 2000 a 2008, e ao fato de que abordagem de feridas cutâneas em eqüinos está ligada à rotina dos profissionais especializados nessa espécie, acredita-se na importância do estudo desse assunto. Assim sendo, o artigo tem por objetivo realizar uma revisão do tema abordandoos aspectos clínicos do processo cicatricial, compli- cações na cicatrização e as principais formas de tratamento alopático e fitoterápico, com o objetivo de auxiliar o profis- sional desde o manejo inicial da ferida até o completo reparo tecidual. Palavras-chave: feridas cutâneas, cicatrização, eqüinos Summary: Skin problems in the horse are a common occur- rence and can often be complicated and difficult to diagnose. Due to the high incidence of equine cutaneous injuries, regis- tered in Veterinarian Clinical Hospital, during the period of 2000 to 2008, and considering that the approach of cutaneous wounds in equines stand together with the routine of equine practioneers, its necessary to clarify this issue. In this way, clini- cal aspects about healing process, proud flesh complications and the major allopathic or phytotherapic therapy are rewiwed with the aim to support practitioners conduct from the initial manipulate of wound until the complete tissue repair. Keywords: cutaneous wounds, proud flesh, equine Introdução Devido ao comportamento ativo e de reações rápi- das, o cavalo está predisposto a traumatismos (ou agressões traumáticas ou lesões), principalmente quando sua função está associada a atividades esporti- vas ou de tração. Além dos fatores ligados a sua natureza, as pastagens sujas e instalações inadequadas podem ser consideradas fatores de risco a ocorrência de feridas traumáticas. Segundo Neto (2003), os feri- mentos de pele representam uma das mais freqüentes ocorrências na clínica de eqüídeos, principalmente os ferimentos localizados nos membros locomotores. O Hospital de Clínicas Veterinária (HVC) da Universidade Federal de Pelotas/RS disponibiliza atendimento clínico a eqüinos provenientes da região Sul do Estado do Rio Grande do Sul. Os cavalos da raça Crioula e os cavalos de tração (carroça) compõem a maioria dos atendimentos na rotina hospitalar. A partir de um estudo retrospectivo dos casos clínicos registrados no HVC entre os anos 2000 e 2008, pôde- -se registrar alta incidência (37%) de afecções cutâneas entre os eqüinos atendidos. Destes, 63% sofreram lesões que variaram entre lacerações, perfurações, incisões e contusões. Os 37% restantes foram acometidos por neoplasias, dermatites e prolife- ração de tecido de granulação exuberante. A grande maioria destas lesões evoluíram para cicatrização, sendo que as neoplasias e as cicatrizes exuberantes foram as alterações com maiores complicações e demora para resolução. Para alguns autores, a cicatrização da pele é alvo de estudos pelo interesse clínico, científico e econômico (Hussini et al., 2004; Ribas et al., 2005). Em geral a cicatrização de feridas apresenta prognóstico favo- rável, porém as feridas cutâneas freqüentemente não evoluem do modo desejado. Neto (2003) cita o exemplo de feridas localizadas nas extremidades distais, as quais são, em geral, complicadas pela falta de tecido de revestimento, má circulação, movimento articular, maior predisposição para contaminação e conseqüente infecção. Este artigo de revisão tem por objetivo descrever aspectos clínicos da cicatrização por segunda intenção de feridas cutâneas na espécie eqüina, buscando contribuir para a definição da abordagem adequada deste tipo de lesão na rotina clínica eqüina. Tipos de feridas cutâneas em eqüinos A classificação das feridas é útil para a seleção do tratamento apropriado, assim como para a previsão da recuperação final. As classificações que se baseiam no 13 R E V I S T A P O R T U G U E S A CIÊNCIAS VETERINÁRIAS DE ARTIGO DE REVISÃO *Correspondência: j_paganela@hotmail.com Paganela JC et al. RPCV (2009) 104 (569-572) 13-18 14 grau de contaminação microbiana incluem lesões limpas, limpas-contaminadas, contaminadas e sujas ou infectadas. Segundo Romatowski (1989) este sis- tema de classificação foi desenvolvido para humanos e classifica o nível de contaminação potencial tanto em feridas eletivas como traumáticas. Muitas feridas abertas em cavalos estão contami- nadas ou sujas no momento inicial do exame devido à natureza do animal e seu ambiente. Feridas contaminadas são lesões traumáticas com menos de seis horas de evolução, na qual pêlo e outros fragmen- tos teciduais estão presentes (Daly, 1985). Feridas sujas são caracterizadas pela presença de edema e supuração. Entretanto, o tempo entre a ocorrência de exposição, aderência e subseqüente multiplicação e invasão bacteriana do tecido varia dependendo do tipo e quantidade de organismos presentes. Muitas feridas podem ser elevadas à categoria de limpas-contami- nadas e fechadas após meticulosa limpeza e debrida- mento completo ou radical (Romatowski,1989). Classicamente as feridas são divididas em abrasões, contusões, hematomas, incisões, lacerações e per- furações. As lacerações são provavelmente as mais comuns entre os eqüinos. São geralmente produzidas por objetos angulares, tais como cercas de arame farpado e por mordidas. Os bordos deste tipo de lesão são geralmente irregulares e o dano se estende aos tecidos subjacentes. Outro tipo comum de ferida são as perfurações, produzidas por objetos cortantes que se caracterizam por serem superficiais, pequenas e de profundidade variável. São tipos especiais de ferida, porque embora a perda tecidual seja mínima, a injúria das estruturas mais profundas após penetração pode resultar em debilidade (Neto, 2003). Para Ribas et al. (2005) outro tipo comum de ferida na espécie eqüina está relacionada ao ambiente e ou tipo de instalação em que o animal está, tais como cercas, porta de cocheira, mata-burro, onde o animal coloca o membro em local estreito e a partir de movimento brusco, ocorre a laçada causando dano interno sem lesão externa aparente além da alopecia. Nestes casos ocorre lesão de tecido subcutâneo com edema, exsu- dação e ruptura da pele. Processo (mecanismos) de cicatrização A cicatrização é um processo corpóreo natural de regeneração concomitante dos tecidos epidérmico e dérmico. Após uma lesão, um conjunto de eventos bioquímicos complexos e orquestrados se estabelece para reparar a o dano. Usualmente o processo cicatri- cial é dividido em cinco fases principais: coagulação, inflamação, proliferação, contração da ferida e remo- delação (Fazio et al., 2000; Mandelbaum e Santis, 2003). A fase de coagulação marca o início do processo, imediatamente após o surgimento da ferida. Nesta fase, substâncias vasoativas, proteínas adesivas, fatores de crescimento e proteases são liberadas e ditam o desencadeamento de outras fases (Terkeltaub e Ginsberg, 1998). A vasoconstrição descrita neste momento ocorre a fim de minimizar a hemorragia. Em seguida, o processo inflamatório inicia-se com a vasodilatação, migração de células brancas e proteínas plasmáticas, propiciando uma barreira de defesa na ferida (Stashak, 1994). Nesta fase se consolida a secreção de proteases como hialuronidase, colagenases e hemolisinas são responsáveis por inibir a ação bacte- riana durante a cicatrização, visto que as bactérias agem prolongando a fase inflamatória (Hackett et al., 1983) A proliferação é dividida em três subfases: reepitelização, fibroplasia e neovascularização. Na reepitelização ocorre a migração de queratinócitos não danificados das bordas dos anexos epiteliais quando a ferida é de espessura parcial, e apenas das margens epidérmicas em casos de feridas de espessura total. Os diferentes fatores de crescimento são respon- sáveis pelos aumentos de mitoses e conseqüente hiperplasia do epitélio (Mandelbaum e Santis, 2003). A fibroplasia ocorre a partir de fibroblastos, os quais são células mesenquimais diferenciadas que proliferam na região mais superficial da ferida. Concomitante- mente há o desenvolvimento de novos capilares por brotamento endotelial (Stashak, 1994). A neovascu- larização verificada nesta fase fornece metabólitos e oxigênio para nutrir tecido de reparação que prolifera na área lesional. A nova rede vascular expande-se para o centro da lesão proporcionando uma aparência rosada e exuberante (Neto, 2003).Neste momento, se estabelece o tecido de granulação que consiste primariamente em vasos sangüíneos neo- formados, fibroblastos e produtos de fibroblastos, incluindo o colágeno fibrilar, elastina, fibronectina, proteases, glicosaminoglicanas sulfatadas e não sulfa- tadas. O tecido de granulação é produzido três a quatro dias após a indução da lesão como um passo inter- mediário entre o desenvolvimento da malha formada por fibrina/fibronectina e a reestruturação de colágeno Berry e Sullins (2003). À medida que o fluxo sangüí- neo e a oxigenação são restabelecidos, o principal fator desencadeador da angiogênese é reduzido e os vasos neoformados começam a diminuir (Neto, 2003). A partir deste evento, inicia-se a fase de contração das paredes marginais da lesão. Esta ação é realizada pelos fibroblastos ativados, os quais se diferenciam em miofibroblastos. Os miofibroblastos contêm fibras intracelulares de actina e miosina e formam conexões especializadas, ou fibronexus, com a matriz extracelu- lar e outras células dentro da cavidade da lesão. Segundo Borjrab (1982) estas propriedades possibili- tam aos miofibroblastos contrair ativamente e gerar a tensão necessária para fechar o defeito. Os miofibrob- lastos aproximam as margens da ferida, forçando as fibras de colágeno a se sobreporem e se entrelaçarem Paganela JC et al. RPCV (2009) 104 (569-572) 13-18 15 e, desta maneira, dar o suporte para diminuir o tama- nho da lesão. A fase final do processo cicatricial consiste na remodelação tecidual. Ao contrário das outras fases de cicatrização, a remodelação dos componentes do colágeno e matriz, como ácido hialurônico e proteo- glicanas, persiste por longo tempo após o ferimento e é o período no qual os elementos reparativos da cica- trização são transformados para tecido maduro de características bem diferenciadas (Neto, 2003). As várias fases da reparação não devem ser consideradas como ações seqüenciais. Cada fase da cicatrização deve contribuir com seu efeito no tempo e intensidade certos (Fazio et al., 2000; Mandelbaum e Santis, 2003). Os mecanismos moleculares que regulam as diferentes fases da cicatrização ainda não são totalmente compreendidos, porém aparentemente, as citocinas são mediadores celulares críticos. Citocinas são glicoproteínas sinalizadoras lançadas pela maioria das células nucleadas no corpo, que atuam através de receptores específicos na superfície celular para causar estimulação autócrina, parácrina e ou endócrina causando migração celular, proliferação e síntese (Theoret, 2005). Tipos de cicatrização Cicatrização por primeira intenção A cicatrização por primeira intenção ocorre quando os bordos da ferida estão próximos e se unem nova- mente com rapidez. Ocorre em feridas não contami- nadas (McGavin e Zachary, 2007). O manejo de uma ferida como passível de cicatriza- ção por primeira intenção é indicada após incisões cirúrgicas, e consiste em aproximar os bordos da lesão por meio de suturas, favorecendo a cicatrização devi- do a diminuição do tempo da fase inflamatória e de remodelação do colágeno, obtendo uma melhor con- tração da ferida e posterior reepitelização (Auer e Stick, 1999; Mandelbaum e Santis, 2003). Cicatrização por segunda intenção As feridas cujos bordos estão distantes, não apresentam uma aposição dos mesmos ou ainda que estejam contaminadas por agentes infecciosos ou contenham corpos estranhos, geralmente cicatrizam pelo processo de segunda intenção (McGavin e Zachary, 2007). A cicatrização por segunda intenção é complexa e uma ferida é tratada como tal, quando a cicatrização por primeira intenção não é justificável. Depende inteiramente da neovascularização e remodelação da matriz celular para restaurar a perda de tecido através da contração da ferida para restabelecer a tensão nor- mal do tecido e reduzir o tamanho da cicatriz (Auer e Stick, 1999). Fatores que contribuem para a utilização da cica- trização por segunda intenção no manejo de feridas são: o nível de contaminação, volume de tecido perdi- do e situações em que a cicatrização por primeira intenção falhou (Neto, 2003). Complicações na cicatrização cutânea em eqüinos As complicações na cicatrização cutânea decorrem de anormalidades em qualquer um dos componentes básicos do processo de reparo e pode ser agrupadas em: 1) formação excessiva de componentes do reparo; 2) formação de contraturas e 3) a deficiência de formação de tecido cicatricial (McGavin e Zachary, 2007). Em eqüinos são reconhecidas especialmente as difi- culdades decorrentes da formação excessiva de tecido de granulação em feridas cutâneas localizadas em extremidades. Este aspecto constitui um desafio para o médico veterinário que elege, para determinados casos, a cicatrização por segunda intenção como método de tratamento, seja pelas condições locais e tempo decorrente da lesão ou pela falta de tecido para recobrimento. A cicatrização por segunda intenção na porção distal dos membros em eqüinos pode ser lenta e complicada. Estas feridas curam mais lentamente que aquelas no tronco por exibirem taxas relativamente baixas de epitelização e contração (Wilmink et al., 1999). Berry e Sullins (2003) afirmam que o menor suprimento sanguíneo, menor tensão de oxigênio, temperatura mais baixa e a presença de quantidades insuficientes de citocinas determinam os diferentes padrões de cicatrização entre as diversas regiões anatômicas do eqüino. Wilmink et al. (1999) relatam que há diferenças na cicatrização entre eqüinos e pôneis. Feridas similares na região dorsal do metatarso cicatrizam lentamente em eqüinos se comparados com pôneis, devido à contração da ferida nos pôneis ser mais intensa ocor- rer em maior. Análises histológicas das lesões mostraram uma fase inflamatória prolongada nos eqüinos embora com menos organização dos miofi- broblastos comparado com os pôneis (Wilmink et al., 1999). As taxas lentas de epitelização foram atribuídas à inibição de células migratórias e inibição da ativi- dade mitótica pelo tecido exuberante de cicatrização (Bertone et al., 1985). Embora não se possa definitivamente acelerar o processo de cicatrização, é importante entender que vários fatores afetam adversamente a taxa de cica- trização das feridas. Entre estes fatores está a má nutrição, hipovolemia, hipotensão, hipóxia, hipoter- mia, infecção, trauma e o uso de medicamentos de ação anti-inflamatória (Neto, 2003). Vale lembrar que para Blackford et al. (1991) o efeito de uma única dose de esteróides em cavalos pode não criar um impacto nas diferentes fases de cicatrização, assim como flunixina de megluminaqualitativamente não Paganela JC et al. RPCV (2009) 104 (569-572) 13-18 16 parece influenciar a fase proliferativa ou as fases subseqüentes da cicatrização de feridas (Lefebvre- Lavoie et al., 2005). Sabe-se ainda que a presença de um número maior que 105 bactérias por grama de tecido lesional significa que, se a ferida não tiver assistência, não cicatrizará por primeira nem por segunda intenção (Hackett et al., 1983). Tratamento Ainda que muitas alternativas diferentes de trata- mento sejam reconhecidamente satisfatórias para o manejo de determinada ferida, o método selecionado deve fornecer um ambiente favorável, permitindo progressão natural para não retardar processo de reparação (Neto, 2003). Em relação à conduta clínica, a cicatrização por segunda intenção é recomendada em função do tempo decorrido, do grau de contaminação e da perda de tecido lesado (Hussni et al., 2004). O tratamento baseia-se na higienização da lesão e conseqüente- mente o curativo local com pomadas que favorecem a cicatrização. Existe uma variedade de preparações tópicas para a cicatrização de feridas em eqüinos, porém, a escolha e composição do fármaco a ser usada deve ser avaliada criteriosamente, já que muitos destes produtos são ineficientes e caros, ou prejudiciais à cicatrização, por serem irritativos ou estimularem a proliferação de tecido de granulação exuberante (White e Maltodextran, 1995). Além disso, é neces- sário avaliar a localizaçãoanatômica da lesão para estabelecer o prognóstico e tratamento adequado. Embora Wilmink et al. (1999) tenha mostrado que a melhor taxa de contração é a razão pela qual as feridas no corpo curam significativamente mais rápidas do que as localizadas nos membros de eqüinos, nenhum tratamento é ainda viável para superar os fenômenos particulares na cicatrização, tal como a proliferação de tecido de granulação exuberante. Hanson (2006) rela- ta que para este caso é indicada a remoção cirúrgica por ser um método simples e eficaz, comparada a outros métodos como o uso de drogas cáusticas. Pomadas a base de Ketanserina são efetivas na prevenção da formação de tecido exuberante nos membros dos eqüinos. Este princípio tem ação antagônica na indução de serotonina, um mediador da atividade de macrófagos. O manejo inicial é direcionado para isolar a ferida de contaminantes de origem exógena e endógena e preparar a pele vizinha para a manipulação durante o tratamento e cicatrização. Na área ao redor da ferida deve-se realizar tricotomia e preparação antisséptica para facilitar uma avaliação precisa da mesma e estru- turas adjacentes (Auer e Stick, 1999). O aspecto mais importante na preparação de feridas traumáticas para cicatrização é o desbridamento cirúr- gico, o qual consiste na remoção de tecido morto e desvitalizado para reduzir os níveis de bactérias patogénicas e oportunistas. A irrigação ou lavagem é um meio comum para limpeza de feridas traumáticas. Os benefícios gerais da lavagem da ferida incluem a remoção de pequenas e grandes partículas endógenas, bactérias e tecido desvitalizado (Auer e Stick, 1999). O uso de bandagens ou gesso minimiza a formação de tecido exuberante de granulação pelo seu efeito de imobilização e por evitar contaminações. O enfaixa- mento da ferida ainda protege contra traumas e dissecação, além de aplicar pressão superficial e manter o medicamento tópico na área lesionada. As combinações de anti-inflamatórios esteróides e antibióticos tópicos diminuem marcantemente a produção de líquidos, permitindo trocas menos freqüentes de bandagens. Em estudo realizado com um pequeno grupo de animais, as lesões tratadas com esteróides tópicos cicatrizaram mais rápido do que aquelas nas quais eles não foram utilizados (Barber, 1989). São necessários mais estudos, com um maior número de animais para avaliar o seu benifício nestes casos. Histologicamente, não se observou nenhuma diferença entre feridas tratadas com combinação de esteróides e antibióticos e aquelas tratadas de outra maneira (Blackford et al., 1991). Tratamento alopático Para o tratamento de feridas recomenda-se a aplicação de antimicrobianos na lesão, no qual desta- ca-se o uso do iodo-povidine (Moens et al., 1980). Soluções de iopo-povidine estão disponíveis comer- cialmente em várias formulações (solução, creme, spray). Diversos estudos in vitro realizados por Payne et al. (1999) evidenciaram a eficácia do iodo-povidine como um agente anti-séptico, já que seus compo- nentes possuem ação de amplo espectro contra bactérias, esporos, fungos, leveduras, vírus e proto- zoários. Este composto é disponível comercialmente em várias formulações como solução, creme e spray, sendo sua concentração ideal entre 0,1 e 0,2% (10-20 ml p/ 1000 ml) para a lavagem da ferida, pois soluções mais concentradas podem ser citotóxicas para os neu- trófilos (Stashak, 1994). Solução de iodo-povidine com açúcar cristal, combinados até atingir uma consistência pastosa, constitui um agente hipertônico que age por osmose para retirar o exudato da ferida (Berry e Sullins, 2003). A água oxigenada tem sido amplamente usada como anti-séptico e desinfetante e é amplamente utilizada como anti-séptico na concentração de 3%, devido ao seu largo espectro antibacteriano, principalmente para bactérias Gram positivas e algumas Gram negativas (Drosou et al., 2003). Soluções tópicas a base de clorexidina são fre- quentemente utilizadas no tratamento de feridas. Tem ação antibacteriana em Staphylococcus aureus, Paganela JC et al. RPCV (2009) 104 (569-572) 13-18 17 Pseudomonas aeruginosa e bactérias não esporuladas (Payne et al., 1999). A eficácia do tratamento a base de clorexidina não é bem caracterizada. Em revisão feita por Drosou et al. (2003), vários trabalhos relatam a utilização de clorexidina, porém o autor conclui que os resultados são insuficientes para afirmar sobre a melhora na cicatrização, principalmente em feridas abertas. Embora a nitrofurazona tenha efeito antimicrobiano contra microorganismos Gram-positivos e Gram- -negativos, segundo Berry e Sullins (2003) não deve ser utilizada, já que demonstrou retardo na contração da ferida, epitelização e reparação no geral. O mel de abelha tem muitas propriedades, incluindo um amplo espectro com ação antimicrobiana, ação antiinflamatória além de estimular novos fatores de crescimento de tecido. O efeito estimulatório do mel na cicatrização de feridas pode estar relacionado a auto regulação de citocinas inflamatórias nos monó- citos (Tonks et al., 2003). Os enxertos biológicos derivados de tecidos como pele ou placenta são relatados como promotores da cicatrização por retardarem a formação do tecido exuberante de cicatrização, visto que induzem uma resposta inflamatória branda, promovem e mantém um ambiente úmido que conduz a regeneração e migração de células epiteliais e agem como uma barreira anti-bacteriana que protege a ferida contra infecções (Purna e Babu, 2000). Tratamento fitoterápico A literatura refere o uso de fitoterápicos em diferentes enfermidades com diversas indicações terapêuticas, sendo alguns deles de uso consagrado e pertencentes à farmacopéia (Heggers e Kucukcelebi, 1995). Muitos estudos são realizados na tentativa de se detectar a eficácia do uso de plantas na cicatrização de feridas. Segundo Solorzano et al. (2001) as fitoesti- mulinas do Triticum vulgare ativam fenômenos da cicatrização ao estimular a mitose e motilidade dos fibroblastos, além de aumentar a síntese de fibras colágenas e glicosaminoglicanas pelos fibroblastos. De acordo com Souza et al. (2006) o uso do creme à base de Triticum vulgare aumentou o número de vasos sangüíneos neoformados encontrados durante o perío- do inicial da reparação das feridas tratadas em relação aos controles, demonstrando que o tratamento influen- ciou de maneira positiva no processo de cicatrização. A babosa (Aloe vera) é um excelente cicatrizante e antinflamatório, devido aos seus constituintes, principalmente os mucilaginosos, o que a torna uma boa opção para o tratamento tópico de lesões de pele (Rovatti e Brennan, 1959). Ribas et al. (2005) comparou o extrato aquoso de Triticum vulgare (Bandvet®) com o extrato aquoso de babosa. O primeiro apresentou tempo de cicatrização menor, sem processos irritativos ou presença de secreções. Martins e Alves (2003) compararam o uso tópico de fitoterápicos na cicatrização cutânea em eqüinos, avaliando as observações macroscópicas, histopa- tológica e a retração centrípeta do halo da lesão nos primeiros quinze dias. Esse estudo demonstrou que o barbatimão (Stryphnodendron barbatimao Martius) teve efeito benéfico na cicatrização, seguido pela calêndula (Calendula officinalis). Os resultados do grupo controle foram superiores ao confrey (Symphitum officinalis). Considerações finais A elevada incidência de lesões cutâneas na espécie eqüina, demonstrada na rotina do Hospital de Clínicas Veterinária, mostra a demanda por técnicos capacita- dos, seja tratador ou cavalariço que realizem serviços de enfermagem, tal como curativos. Pois o Médico Veterinário intervindo de maneira correta, na rotina de clínica de eqüinos mostra que protocolos baseados na higiene diária, com limpeza das feridas, retirada do tecido morto, proteção e hidratação são efetivos na maioria dos casos, exceção nas neoplasia. E que apesar de a cicatrização, principalmente nos membros locomotores dos equinos ser mais lenta devido a fatores como: maior facilidade de contato com sujidades, pouco tecido e menorvascularização. A orientação de pessoal treinado para seguir realizan- do curativos diários é essencial para o sucesso do tratamento. Bibliografia Auer JA e Stick JA (1999). Wound Management..in: Equine surgery. Philadelphia: WB Saunders. 2ª ed., 937. Barber SM (1989). Second intention wound healing in the horse: the effects of bandages and topical corticosteroids. In: AAEP Proceedings, Lexington, 35, 107-113. Berry DB e Sullins KE (2003). 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Por ser um dente muito utilizado, é mais predisposto a afecções, como fratura dental com ou sem exposição pulpar, lesão periapical e doença periodontal podendo o cão desenvolver uma fístula infraorbitária. Embora existam tratamentos que zelam pela preservação do elemento dental, como cirurgia periodontal e tratamento endodôntico, muitas vezes os proprietários optam pela exodontia deste dente, sendo o custo do procedimento um dos fatores limitantes. O presente artigo tem como objetivo apresentar as principais causas de exodontia do dente carniceiro, mostrando como é feita a exodontia mediante des- sensibilização da área através de bloqueio anestésico. Summary: The utilization of anesthetic blocks by veterinarians is becoming more widely employed in the routine, pertaining to general anesthesia, especially in veterinary dentistry. The regional nerve blocks are the most commonly used, especially those performed on the nerves infraorbital, maxillary, mental and inferior alveolar. The fourth upper premolar, also known as "carnassial tooth," is the largest carnivorous tooth, used for tear- ing meat. Being a very used tooth, it is more prone to affection, such as dental fracture with or without pulpal expo- sure, periapical lesion and periodontal disease, predisposing the dog to develop an infraorbitary fistula. Although there are treatments which strive for dental preservation, such as periodontal surgery and endodontic treatment, most of the times owners opt for exodontia, being the procedure cost the leading factor. This article aims to show the main causes of carnassial tooth exodontia, demonstrating the exodontia technique throughdesensitization of the area through anesthetic block. Introdução O controlo da dor, tanto na medicina humana como na veterinária, tem se destacado nos últimos anos. A utilização de bloqueios anestésicos tem sido cada vez mais empregada na rotina, associada à anestesia geral, sobretudo durante os procedimentos odontológicos em animais (Lopes e Gioso, 2007). A anestesia local apresenta alguns benefícios destacando-se a diminuição da sensibilização central à dor, a minimização da reação tissular inflamatória, redução da quantidade de anestésico geral requerida durante o procedimento cirúrgico, e diminuição da dose e freqüência dos analgésicos empregados no pós- -operatório (Hellyer e Gaynor, 1998; Holmstrom e Frost-Fitch, 1998; Gross e Pope, 2002). Os bloqueios regionais de nervos são mais comu- mente empregados nos procedimentos odontológicos em animais, sendo que os mais utilizados são o bloqueio infra-orbitário e bloqueio maxilar, na maxila, e bloqueio mentoniano e bloqueio alveolar inferior, na mandíbula (Lopes e Gioso, 2007; Holmstrom e Frost- Fitch, 1998). Dentre os 42 dentes permanentes apresentados pela espécie canina, o quarto pré-molar, também denominado "dente carniceiro", é um dos principais dentes, responsável por rasgar os alimentos (Wiggs e Lobprise, 1997; Harvey e Emily, 1993; Gioso, 2007). Por ser um dente muito utilizado pelo cão, torna-se mais predisposto a afecções como fratura dental com ou sem exposição pulpar, lesão periapical, e doença periodontal, podendo evoluir para uma fístula infra- -orbitária (Wiggs e Lobprise, 1997; Bolson e Pachaly, 2004; Roza, 2004; Gioso, 2007). Entretanto, apesar da existência de tratamentos que zelam pela preservação do elemento dental, como cirurgia periodontal e tratamento endodôntico, a realização da extração dental, denominado exodontia, ainda é uma das intervenções cirúrgicas mais fre- qüentes na clínica de cães e gatos, sendo o custo um dos fatores limitantes (Gioso, 2007). 19 R E V I S T A P O R T U G U E S A CIÊNCIAS VETERINÁRIAS DE ARTIGO DE REVISÃO *Correspondência: vividogodonto@gmail.com Tel: +55 51 33773900; 92499962 Pignone VN RPCV (2009) 104 (569-572) 19-24 20 Todavia, o quarto pré-molar superior, por se tratar de um dente tri-radicular, necessita alguns cuidados especiais, como conhecimento anatômico, além da técnica de exodontia complexa (Gioso, 2007), sendo o bloqueio anestésico do nervo maxilar o indicado para a dessensibilização da área na realização do procedi- mento (Wiggs e Lobprise, 1997; Lopes e Gioso, 2007). Anestesia local Os anestésicos locais consistem em substâncias químicas responsáveis por impedir geração e con- dução de impulso nervoso de maneira reversível, por ação direta na membrana da fibra nervosa (Muir e Hubbell, 1995; Mclure e Rubin, 2005; Lopes e Gioso, 2007). Na odontologia veterinária, os anestésicos locais mais utilizados são a lidocaína e a bupivacaína, com período de ação curto e longo, respectivamente (Lanz, 2003; Klaumann et al., 2007). Entretanto, outros anestésicos locais como a mepivacaína, a prilocaína e a articaína são amplamente utilizados na odontologia humana e vêm sendo empregados na prática veteri- nária odontológica, sendo estes com duração de ação moderada (Fantoni e Cortopassi, 2002; Malamed, 2005; Mclure e Rubin, 2005). Além desses, ainda se encontra a ropivacaína, caracterizada por apresentar período hábil e de latência semelhantes ao da bupiva- caína, efeito vasoconstritor e menor toxicidade cardíaca e no SNC (De Negrini e Ivani, 2005; Malamed, 2005; Mclure e Rubin, 2005). A adição de vasoconstritores aos anestésicos locais possui a função de controlar as ações vasodilatadoras, retardando a absorção deste pelo sistema vascular, minimizando os riscos de toxicidade anestésica (Cortopassi e Fantoni, 1999), além de prevenir ou minimizar a hemorragia no trans-operatório (Gross e Pope, 2002). Contudo, é importante ressaltar que a toxicidade dos anestésicos locais está associada com a administração intravascular acidental ou a adminis- tração de altas doses do agente anestésico (Klaumann et al., 2007). A escolha do agente anestésico varia de acordo com o procedimento cirúrgico a ser realizado, período hábil de analgesia e necessidade de controlo da dor pós-operatória. A dose utilizada para dessensibiliza- ção dos nervos da mandíbula e da maxila varia de acordo com o porte do animal, porém preconiza-se o uso de volumes pequenos de anestésico, aplicados lentamente, evitando lesar pequenos ramos nervosos (Holmstrom e Frost-Fitch, 1998; Cediel e Sanches, 1999). As dose dos anestésicos locais utilizados em cães citados anteriormente estão representadas na Tabela 1, exceto da articaína que não foi encontrada a dose para a espécie canina, sendo que em humanos, foi encontrada na literatura apenas a dose máxima deste fármaco (7 mg/kg) (Lopes e Gioso, 2007). Bloqueio anestésico do nervo maxilar A realização de qualquer bloqueio anestésico deve ser precedida de anti-sepsia tópica, com intuito de diminuir transitoriamente a microbiota bacteriana local (Malamed, 2005), sendo o gluconato de clorexi- dina 0,12% o anti-séptico de eleição na prática odon- tológica veterinária (Evers e Haegerstam, 1991). O bloqueio do nervo maxilar é um método bem eficaz para promover dessensibilização de uma hemi- Tabela 1 - Principais agentes anestésicos locais utilizados na odontologia veterinária na espécie canina Agente anestésico Dose/volume recomendados Dose máxima Período de latência Período de duração Lidocaína 2% 2 mg/kg 5 mg/kg 5 a 10 minutos 1h a 1h e 30min Lidocaína com 0,1 ml de 1:1.000 ND ND 3h e 30min epinefrina (0,1 mg epinefrina) Bupivacaína 0,5% 1 mg/kg 2 mg/kg 20 a 30 minutos 4 a 6 h Lidocaína + 1 mg/kg + ND 5 a 10 minutos Efeito mais rápido, Bupivacaína 0,25 mg/kg porém menor duração Morfina 0,1 mg/kg ND ND Maior eficácia e prolongamento da analgesia Buprenorfina 0,01 mg/kg ND ND Maior eficácia e prolongamento da analgesia Mepivacaína 3% Não disponível 9 mg/kg 1,5 a 2 minutos ND Ropivacaína 0,5% 0,5 a 2 mg/kg Não disponível 8 a 10 minutos ND Fontes: Lopes e Gioso (2007); Egger e Love (2009). ND = não disponível. Pignone VN RPCV (2009) 104 (569-572) 19-24 21 maxila, reduzindo o volume dos demais fármacos administrados (Malamed, 2005; Lopes e Gioso, 2007). Este bloqueio é efetuado a partir da administração do anestésico local na região da fossa pterigopalatina, localizada caudalmente ao último molar superior (segundo molar), ao final do processo alveolar do osso maxilar (Figura 1). O bloqueio do nervo maxilar promove a dessensibilização dos ramos deste nervo – nervo infra-orbitário, nervo alveolar maxilar caudal, nervo pterigopalatino e nervo nasal caudal (Cediel e Sanches, 1999). O bloqueio também pode ser realizado através da via percutânea. Neste caso a agulha deverá ser introduzida através da pele formando um ângulo de 90 graus em direção medial, ventral a borda do arco zigomático e aproximadamente 0,5 cm caudal ao canto lateral, e então avança para a fossa pterigo- palatina. Caso a agulha tocar o ramo da mandíbula, esta deverá ser direcionada para fora no sentido cranial (Egger e Love, 2009). O diâmetro da agulha para realizar o bloqueio deve ser de 25 a 29 G. A cabeça do paciente deve ser elevada, fazer a aspiração da seringa antes de injetar e aplicar uma pressão digital sobre o forame, seguido da administração lenta do anestésico local com a finalidade de facilitar este movimento caudamente ao forame. Não é recomendável avançar com a agulha dentro do forame, pois aumenta a chance de lacerar o nervo (Egger e Love, 2009). Afecções no "dente carniceiro" O quarto pré-molar superior ou "dente carniceiro" é o maior dente da arcada superior dos cães, responsável por rasgar os alimentos. Por este motivo, fica evidente sua predisposição a afecções, como a doença perio- dontal e os problemas endodônticos (Wiggs e Lobprise, 1997; Gioso, 2007). A doença periodontal avançada, a lesão periapical e lesões iatrogênicas são as causas mais freqüentes
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