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[PT] Mercados Ilícitos Transnacionais, Crime Organizado e seu Impacto na Região das Américas pdf

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TEXTO PARA DISCUSSÃO 
MERCADOS ILÍCITOS TRANSNACIONAIS, CRIME ORGANIZADO E SEU IMPACTO NA REGIÃO DAS 
AMÉRICAS 
 
 
 
Leandro Piquet Carneiro 
Roberto Troncon 
Fabio R. Bechara 
Cristian Gabriel Taboada 
João Henrique Martins 
 
 
 
 
 
 
S​OBRE​ ​OS​ ​AUTORES​: 
 
Leandro Piquet Carneiro: Professor do Instituto de Relações Internacionais – Universidade 
de São Paulo. 
 
Roberto Troncon: Delegado de Polícia Federal (1995-2020, aposentado); Gerente Sênior de 
Segurança Estratégica Coca-Cola Brasil. 
 
Fabio R. Bechara: Professor da Faculdade de Direito Universidade Presbiteriana Mackenzie 
de São Paulo e Ministério Público de São Paulo 
 
Cristian Gabriel Taboada: Chefe da Seção de Segurança e Justiça da Organização dos 
Estados Americanos. 
 
João Henrique Martins: Investigador do Centro de Investigação de Políticas Públicas da 
Universidade de São Paulo. 
 
 
 
Sumário 
 
1 Introdução 1 
2 Ações baseadas em incentivos e a dinâmica dos mercados ilícitos 2 
3 Mercados ilícitos locais, nacionais e transnacionais 4 
4 Definição de “organização criminosa” nas convenções internacionais e na lei 7 
5 Como colocar esses conceitos em prática no trabalho policial? 13 
6 A relação entre mercados ilícitos e crime organizado 17 
6.1 Drogas 20 
6.2 Armas 23 
6.3 Tráfico de pessoas e contrabando de migrantes 25 
6.4 Novos mercados ilícitos 26 
7 Crime organizado e terrorismo 27 
8​ Comentários finais 30 
Bibliografia 34 
Mercados Ilícitos Transnacionais, Crime Organizado e seu impacto na região das Américas 37 
 
 
 
 
 
 
1 Introdução 
 
Este texto integra o acervo didático do curso de extensão Segurança Multidimensional 
nas Fronteiras, Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo. 
Abordaremos a seguir dois problemas diretamente relacionados: o funcionamento dos 
mercados ilícitos e o crime organizado. Juntos, eles representam uma nova ameaça ao 
sistema de segurança pública e defesa nacional dos países da região das Américas. 
Organizações criminosas surgem e atuam nos mercados de bens e serviços que, de 
acordo com as leis do país, são considerados ilícitos. Os bens e serviços comercializados 
ilicitamente têm natureza muito diversa, tais como: produtos industrializados falsificados, 
drogas como a maconha e a cocaína, prostituição, armas e munições, espécies animais, para 
citar alguns exemplos. 
A comercialização desses produtos viola regulamentos impostos pelo Estado, como a 
lei penal, leis sanitárias, ambientais e de racionamento, leis contra certos produtos e 
serviços e a regulação do sistema financeiro. Esse problema é monitorado por vários 
organismos internacionais. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento 
Econômico (OCDE) organizou, em 2013, uma força conjunta com o objetivo de conter em 
escala global a expansão do comércio ilícito. Essa força conjunta já realizou cinco reuniões 
anuais e publicou diversos relatórios e estudos sobre o problema​1 
Em resumo, quando falamos “mercados ilícitos”, queremos descrever um tipo de 
atividade econômica na qual se identifica a presença de uma ou mais das seguintes 
operações: 
 
1 Link para o site da OCDE: ​http://www.oecd.org/governance/risk/oecdtaskforceoncounteringillicittrade.htm 
acesso em 28/11/2020. 
1 
 
http://www.oecd.org/governance/risk/oecdtaskforceoncounteringillicittrade.htm
1. produção, distribuição, venda e compra de produtos e serviços proibidos, 
como narcóticos, animais silvestres e comércio sexual; 
2. venda irregular de ​commodities​, como antiguidades e pedras preciosas, de 
produtos que infrinjam os direitos intelectuais e de produtos não adequados aos 
padrões dos códigos locais; 
3. venda de produtos fora de seu mercado de destino, sem pagar os impostos de 
importação e de consumo local, como cigarros e bebidas alcoólicas; 
4. venda de mercadorias roubadas, como carros e eletrônicos. 
 
Se há algum tipo de demanda, haverá sempre alguém ou alguma organização dedicada a 
atender essa demanda. A organização dos mercados ilícitos, a formação de preços e o 
comportamento dos grupos criminosos que atuam nesses mercados podem ser analisados 
segundo um modelo econômico de custos e benefícios. 
Existem muitas teorias que explicam o comportamento criminoso. Neste módulo, 
assumiremos que criminosos respondem a incentivos: calculam o custo e o benefício de 
cada ação e decidem como vão agir. Precisamos entender quais incentivos são esses e como 
são produzidos. 
 
2 Ações baseadas em incentivos e a dinâmica dos mercados ilícitos 
 
Segue um exemplo para ilustrar o que é o comportamento baseado em incentivos. Pense 
em uma organização criminosa local que se dedica ao furto e à comercialização de 
automóveis. Uma inovação tecnológica que dificulte, por exemplo, a ignição do veículo no 
momento do furto pode fazer com que esse negócio fique menos lucrativo, pois o custo em 
termos de tempo investido para furtar o veículo aumenta muito, assim como o risco de ser 
apanhado enquanto o crime é cometido. Portanto, a inovação tecnológica introduzida 
funciona como um incentivo negativo para a organização criminosa. Isso não acaba com o 
crime, mas muda o comportamento dos infratores. Sem alternativas de ganho, a 
organização que atua nesse nicho buscará atuar em outro ou deixará de existir. 
 
 
Vamos falar um pouco mais sobre os diferentes mercados e bens ilícitos e tentar 
entender o que eles têm em comum e como podem ser analisados. 
A lei de cada país define o que é lícito ou ilícito produzir, comercializar e consumir. O 
Uruguai foi o primeiro país do mundo a legalizar a produção, o comércio e o cultivo dos 
diferentes tipos de ​cannabis​; portanto, é legal cultivar, portar, comercializar e consumir 
uma substância que em todos os países vizinhos é proibida. Em alguns países do mundo, as 
bebidas alcoólicas são proibidas; a cocaína já foi comercializada legalmente em todo o 
mundo por quase setenta anos; a prostituição é tratada de forma muito diferente entre os 
países. A legislação que regula e proíbe o comércio de determinados bens e serviços cria 
também os mercados ilícitos. 
Neste módulo, abordaremos o problema do crime organizado como um 
empreendimento criminal contínuo que racionalmente busca o lucro com as atividades 
ilícitas de grande demanda pública. Sua existência é mantida por meio do uso de força, de 
ameaças ou da corrupção de funcionários públicos. Essa definição foi oferecida pelo 
criminólogo Jay Albanese, um dos principais pesquisadores sobre o tema em atividade​2​. 
A proibição de bens e serviços para os quais há demanda gera a possibilidade de ganhos 
ilícitos e propicia o desenvolvimento de organizações que funcionam da mesma forma que 
as firmas que se dedicam a atividades legais. Um destaque importante: um bem não precisa 
ser proibido para se tornar objeto de interesse das organizações criminosas. As políticas de 
racionamento também criam restrições que propiciam a atuação de organizações 
criminosas, as quais se dedicam a equalizar a distribuição dos bens e serviços escassos. O 
comércio desses bens burlando as leis de racionamento permite que as organizações 
criminosas tenham ganhos cobrando mais do que os preços legais para garantir a oferta. 
A proibição e o racionamento geram nichos de mercado nos quais organizaçõescriminosas burlam os controles legais e comercializam o bem ilícito ou escasso. Até mesmo 
a taxação excessiva de alguns produtos, como cigarro e álcool, cria nichos para a atividade 
ilícita, podendo propiciar a falsificação e o contrabando. 
2 Outro criminólogo influente nesse debate é Klaus Von Lampe; ele construiu um ​website​ que reúne 200 
definições de “crime organizado”: <http://www.organized-crime.de/organizedcrimedefinitions.htm​>​. 
 
 
Os mercados ilícitos podem ser locais, nacionais ou transnacionais. Vamos ver alguns 
exemplos. 
 
3 Mercados ilícitos locais, nacionais e transnacionais 
 
A atividade criminal segue uma lógica econômica, e a criminalidade cotidiana é 
exercida por atores racionais, motivados por incentivos. Crimes como roubo, contrabando, 
tráficos, falsificação, furto, descaminho, receptação, corrupção, latrocínio alimentam 
mercados ilícitos, nacionais e transnacionais de diferentes dimensões e estrutura, formando 
uma lucrativa economia ilícita global, geradora de externalidades negativas para a 
sociedade. 
 
A natureza econômica do crime já era destacada pelo economista Gary Becker ainda 
em 1968: ​“Em geral, o ‘crime’ é uma atividade ou ‘indústria’ economicamente 
importante, apesar da negligência quase total dos economistas.” ​(BECKER, 1968)​3​. 
 
A economia de bens e serviços ilícitos conheceu uma expansão nos últimos trinta 
anos, incentivada pela alta lucratividade​ ​proporcionada pelas redes criminais que 
viabilizam a oferta contínua de produtos e serviços ilegais, como o tráfico de drogas, 
animais silvestres ou pessoas, órgãos humanos; de produtos lícitos desviados ou fabricados 
na ilegalidade, como tabaco, armas, defensivos agrícolas, eletrônicos, alimentos, vestuário, 
audiovisual, fertilizantes, automóveis, bebidas, medicamentos e combustíveis; ou de 
serviços como TV a cabo, energia elétrica, entre outros com demanda garantida ou 
crescente. 
 
Trata-se, portanto, de um tipo de problema público complexo e crônico, 
potencializado pela sua natureza eminentemente transnacional. O enfrentamento desse 
problema exige polícias e órgão públicos de controle das atividades econômicas 
modernizados e focados na produção de inteligência sobre as estruturas econômicas do 
3 BECKER, G. S. Crime and Punishment: an Economic Approach. ​Journal of Political Economics​, n. 76, 
1968. 
 
 
crime transnacional, bem como o aprimoramento dos marcos e estruturas de regulação, 
controle e fiscalização do comércio internacional. 
 
A ​Task Force on Countering Illicit Trade da Organização para a Cooperação e 
Desenvolvimento Econômico (OCDE), em seu relatório ​Converging Criminal Networks 
(OECD, 2016), adotou, a partir da definição formulada por Willians (2015)​4​, um importante 
parâmetro técnico para a classificação dos mercados ilícitos. Esses mercados podem ser 
definidos a partir da presença, combinada ou isolada, da oferta coordenada de uma das 
quatro categorias de produtos e serviços ilegais: 
 
1. produtos e serviços proibidos, como narcóticos e comércio sexual; 
2. venda irregular de ​commodities​, como antiguidades ou espécies nativas da 
fauna e flora, produtos que infrinjam os direitos intelectuais (pirataria) e 
produtos não adequados aos padrões locais; 
3. venda de produtos fora de seu mercado de destino, sem pagar os impostos 
de consumo local, como cigarros e álcool (contrabando e descaminho); 
4. venda de mercadorias roubadas (ou furtadas), como carros e eletrônicos. 
 
A definição de ​transnacionalidade ​é outro parâmetro técnico importante, que 
depende da capacidade dos criminosos e suas “firmas” (organizações criminosas 
funcionam, em parte, como as firmas do setor legal) de atuarem simultaneamente em vários 
países. A Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional definiu 
a transnacionalidade quando o crime é cometido 
 
1. em mais de um Estado; 
2. em um Estado mas com preparação substancialmente feita em outro; 
3. em um Estado com o estabelecimento da organização criminal do grupo 
em outro Estado; 
4 ​WILLIANS, P. Crime, illicit markets, and money laundering, carnegie endowment. In: TASK FORCE ON COUNTERING 
ILLICIT TRADE/ ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT. Converging Criminal Networks, 
2015. p. 107. Disponível em: http://carnegieendowment.org/pdf/files/mgi-ch3.pdf. Acesso em: 20/07/2016. 
 
 
 
4. em um Estado com efeitos substanciais em outro. 
A oferta combinada de produtos (conceito 1) de forma transnacional (conceito 2) 
permitiu a redução drástica dos custos e riscos logísticos das operações criminais de vários 
mercados ilícitos. 
Os mercados ilícitos tendem a reduzir o custo médio de suas operações​5 por meio da 
formação de redes criminais, as quais fornecem, por exemplo, serviços de transporte, 
proteção e informações. Essa nova forma de cooperação em rede permite que as 
organizações criminosas ampliem o atendimento de novas demandas pelo 
compartilhamento das cadeias logísticas e a terceirização de serviços (organizações 
criminosas contratam outras organizações, ou indivíduos, para executar parte de sua cadeia 
de produção e comercialização). 
O sucesso das “firmas”, das organizações criminosas que operam os mercados 
ilícitos depende da sua capacidade de controlar os custos de produção e transações e, 
principalmente, minimizar os riscos das operações. Os governos, por meio do sistema de 
justiça criminal, podem desestimular o crime à medida que alteram o custo de produção, 
transporte e comercialização dos bens e serviços ilícitos, assim como atribuem impostos, 
regulações e proibições de práticas aos setores legais da economia – a aplicação eficiente da 
sanção penal é o fator determinante para o controle das atividades ilícitas. Quando o crime 
se torna mais eficiente, a capacidade de controle e repressão pelo sistema de justiça 
criminal ​precisa também aumentar sua eficiência, e na mesma velocidade. Como ensinava 
Jeremy Bentham, já no século XIX (BENTHAM,1843)​6​, 
 
[...] a lucratividade ou os ganhos de um crime são as forças que incentivam ou levam os 
homens à delinquência; a dor e as perdas oriundas da punição são as forças usadas para 
afastar os homens de realizar atos ilegais. Se as primeiras forças forem maiores do que as 
segundas, o crime será realizado; se as segundas forças forem as maiores, racionalmente o 
crime não acontecerá. 
 
 
 
5 O principal componente do custo para as organizações criminosas que atuam nos mercados ilícitos é o risco 
de serem detectadas pela polícia. 
6 ​Bentham, J. Principles of Penal Law, 1 Works, 399 p, 1843 
 
 
4 Definição de “organização criminosa” nas convenções internacionais e na lei 
 
Questões-chave para a seção: 
Qual é o marco regulatório internacional do 
crime organizado? 
Como certos crimes são definidos 
internacionalmente? 
Que ferramentas eles nos fornecem na luta 
contra o crime organizado? 
 
A Convenção das Nações Unidas Contra o Crime Organizado Transnacional 
(Convenção de Palermo), e seus três protocolos​7​, apresenta a seguinte definição para o 
conceito de “crime organizado”, com destaque a sua forma estrutural, como disposto no seu 
art. 2º: 
a) “grupo criminoso organizado” é um grupo estruturado de três ou mais pessoas, 
existentehá algum tempo e atuando de forma coordenada com o propósito de 
cometer uma ou mais infrações graves, com a intenção de obter, direta ou 
indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material; 
b) “infração grave” é todo ato que constitua infração punível com uma pena de 
privação de liberdade, cujo máximo não seja inferior a quatro anos ou com pena 
superior; 
c) “grupo estruturado” é grupo de pessoas formado de maneira não fortuita para a 
prática imediata de uma infração, ainda que os seus membros não tenham funções 
formalmente definidas, que não haja continuidade na sua composição e que não 
disponha de uma estrutura elaborada. 
 
7 Protocolo para prevenir, reprimir e punir o tráfico de pessoas, especialmente mulheres e crianças 
(promulgado no Brasil como Decreto Presidencial n. 5.017 de 2004. Disponível em: 
<​http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5017.htm​>); Protocolo contra o 
contrabando de migrantes por terra, mar e ar (promulgado no Brasil como Decreto Presidencial n. 5.016 de 
2004. Disponível em: <​http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5016.htm​>); e 
Protocolo contra a fabricação e o tráfico ilícito de armas de fogo, suas partes e componentes e munições 
(promulgado no Brasil como Decreto da Presidência da República n. 5.941 de 2006. Disponível em 
<​http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/decreto/D5941.htm​>). 
 
 
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5017.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5016.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/decreto/D5941.htm
O conceito de “grupo estruturado” possibilita a diferenciação entre a associação de 
duas ou mais pessoas que se unem de forma não permanente, com um vínculo temporário e 
volátil, ​para a prática imediata de ilícito penal, punível com uma pena inferior a quatro 
anos, e o grupo criminoso organizado, formado por três ou mais pessoas, com vínculo 
associativo perene, para a prática de crimes graves, punidos com pena máxima de prisão 
não inferior a quatro anos. 
A definição ​apresentada na Convenção de Palermo permite desenvolver um 
conceito geral sobre as organizações criminosas a partir da sistematização de seus 
componentes principais: 
1. apresentam ​estruturas ordenadas de coordenação​, ​não necessariamente na 
forma tradicional com hierarquia rígida, podendo ser redes difusas e fluidas; 
2. t​êm um caráter racional de exploração dos mercados ilícitos​, fundado no 
cálculo do ganho em relação ao risco da atividade; 
3. exploram ​as vantagens ilícitas ​disponíveis de qualquer natureza 
economicamente aferível, podendo ser um benefício ou privilégio; 
4. apresentam capacidade de atuação supranacional de caráter transnacional​: 
não respeitando as fronteiras dos Estados.​ 8 
Esses quatro componentes permitem entender a Convenção de Palermo não apenas 
como um marco normativo, mas como a base para uma teoria sobre o funcionamento dos 
mercados ilícitos e do crime organizado. Segundo essa teoria, o crime organizado pode ser 
entendido como um conjunto de agentes que buscam maximizar seus ganhos e que atuam 
em um mercado global. 
Há esforços importantes também no âmbito dos países da região das Américas, que 
estão empenhados em tipificar o crime organizado em seus regulamentos internos e 
promover a cooperação internacional para combater o crime organizado, compromisso 
ratificado na Declaração sobre Segurança nas Américas de 2003​9​. 
8 Conceito desenvolvido em WERNER, Guilherme Cunha. Teoria Interpretativa das Organizações 
Criminosas: Conceito e Tipologia. In: ORGANIZAÇÕES Criminosas: Teoria e Hermenêutica da Lei n.º 
12.850/2013. Porto Alegre: Nuria Fabris, 2015. 
9 Declaração sobre Segurança na Américas de 2003. Disponível em: 
 
 
Nessa declaração, a OEA faz um chamado aos países membros para lutarem contra 
o crime organizado transnacional por meio ​da plena implementação das obrigações 
contraídas pelos Estados Partes na Convenção de Palermo e seus três protocolos, em 
especial para que a lavagem de dinheiro, o tráfico ilícito de pessoas, a corrupção e outros 
delitos conexos sejam criminalizados no hemisfério. A OEA preconiza, também, que os 
países implementem leis que permitam ágil identificação, rastreamento, apreensão e 
confisco dos bens e recursos financeiros obtidos por meio das infrações praticadas pelas 
organizações criminosas. 
A Declaração da OEA reconhece que os países da região estão expostos a “novas 
ameaças” à segurança representadas pelo terrorismo, o crime organizado transnacional, as 
drogas ilícitas, a corrupção, a lavagem de dinheiro, o tráfico ilícito de armas, o tráfico 
humano e os crimes cibernéticos. As medidas contra essas ameaças estão contidas no Plano 
de Ação Hemisférico contra o Crime Organizado Transnacional de 2006​10​, que propõe uma 
série de ações com os objetivos de 
1. prevenir e combater o crime organizado transnacional, com pleno respeito aos 
direitos humanos, tomando como referência a Convenção de Palermo e seus 
três protocolos; 
2. aprofundar a cooperação internacional na prevenção, investigação e ações 
judiciais relacionadas ao crime organizado transnacional; 
3. incentivar a coordenação entre os respectivos órgãos da OEA com competência 
em assuntos relacionados à luta contra o crime organizado transnacional, bem 
como a cooperação entre eles e o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e 
Crime (UNODC); 
4. fortalecer as capacidades e habilidades nacionais, sub-regionais e regionais para 
enfrentar o crime organizado transnacional. 
<​http://www.dereitoshumanos.usp.br/index.php/OEA-Organiza%C3%A7%C3%A3o-dos-Estados-Americ
anos/declaracao-sobre-seguranca-nas-americas.html​>. Acesso em: 28 nov 2020. 
10 Plano de Ação Hemisférico contra o Crime Organizado Internacional. Disponível em: 
<http://www.oas.org/consejo/pr/resolucoes/res908.asp>. Acesso em: 28 nov 2020. 
 
 
 
http://www.dereitoshumanos.usp.br/index.php/OEA-Organiza%C3%A7%C3%A3o-dos-Estados-Americanos/declaracao-sobre-seguranca-nas-americas.html
http://www.dereitoshumanos.usp.br/index.php/OEA-Organiza%C3%A7%C3%A3o-dos-Estados-Americanos/declaracao-sobre-seguranca-nas-americas.html
O respeito aos direitos humanos, a cooperação internacional, a coordenação e a 
construção de capacidades institucionais são conceitos que fazem parte, portanto, do núcleo 
de valores da nova doutrina de segurança multidimensional, da qual a OEA é uma das 
vozes mais importantes na região. 
Ainda no âmbito da Organização dos Estados Americanos, durante as seis 
Reuniões de Ministros em Matéria de Segurança Pública das Américas, foram aprovadas 
recomendações que explicitamente reconhecem a importância do fortalecimento da 
cooperação entre seus países membros para se aprimorar o enfretamento da criminalidade 
transnacional na região. Dentre as recomendações aprovadas, destacam-se as seguintes: 
1. cooperação, coordenação e assistência técnica entre as instituições de 
segurança pública dos Estados Membros, como meio adequado de resposta à 
criminalidade, à violência e à insegurança; 
2. desenvolvimento de mecanismos regionais e bilaterais de intercâmbio de 
informações operacionais e/ou de inteligência com o fim de prevenir e 
investigar, em conformidadecom a legislação interna, a criminalidade 
organizada transnacional e a insegurança que afetam o hemisfério; 
3. fortalecimento da cooperação judicial que permita aos Estados Membros, em 
conformidade com a legislação interna e as convenções internacionais 
firmadas, dar uma resposta efetiva ao cometimento, à execução, ao 
planejamento, à preparação ou ao financiamento de atos delitivos que atentem 
contra a segurança pública; 
4. estimular e consolidar as iniciativas de cooperação regional e sub-regional 
entre as polícias em matéria de luta contra a criminalidade organizada 
transnacional; 
5. fomentar a cooperação bilateral e com organismos multilaterais de cooperação 
e desenvolvimento, a fim de promover iniciativas de programas que incluam 
segurança, justiça e desenvolvimento, na luta contra a criminalidade, a 
violência e a insegurança. 
 
 
A região também tem sido pioneira no combate a algumas manifestações específicas 
do crime organizado: principalmente armas de fogo, tráfico de pessoas e de drogas. Em 
1997, foi sancionada a Convenção Interamericana contra a Fabricação e o Tráfico Ilícitos 
de Armas de Fogo, Munições, Explosivos e Outros Materiais Correlatos (CIFTA)​11​, um 
instrumento regional que estabeleceu uma estrutura internacional com a prerrogativa de 
conceder autorizações e licenças para exportação, importação e o trânsito de armas de fogo; 
a obrigação de classificar como crime o tráfico e a fabricação ilícita de armas de fogo, 
munições, explosivos e outros materiais correlatos; e o reforço no controle dos pontos de 
importação e exportação desses produtos. O instrumento também facilita a cooperação e o 
intercâmbio de informações e experiências entre os Estados Partes sobre armas de fogo. 
A convenção entrou em vigor em 1998 e, desde então, os Estados Partes aprovaram 
uma série de leis-modelo para facilitar a incorporação das obrigações assumidas no direito 
interno dos países. No âmbito das Nações Unidas, em 2014, entrou em vigor o Tratado de 
Comércio de Armas, que reforça muitas das medidas que a região vem adotando no âmbito 
da Convenção Interamericana contra a Fabricação e o Tráfico Ilícito de Armas de Fogo. 
Com relação ao Protocolo para prevenir, reprimir e punir o tráfico de pessoas, 
especialmente mulheres e crianças, a região aprovou em 2015 o II Plano de Trabalho de 
Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas no Hemisfério Ocidental 2015-2018​12​. O plano de 
trabalho adota a definição de “tráfico de pessoas” do Protocolo das Nações Unidas, 
entendendo esse crime como “[...] o recrutamento, transporte, transferência ou recepção de 
pessoas, mediante o emprego de ameaça, violência ou outras formas de coerção, sequestro, 
fraude, engano, abuso de poder ou da situação de vulnerabilidade da vítima ou ainda por 
meio da concessão ou recebimento de pagamentos ou benefícios para obter o 
consentimento de uma pessoa que tem autoridade sobre outra, para fins de exploração.” 
11 ​Convenção Interamericana Contra a Fabricação e o Tráfico Ilícito de Armas de Fogo, Munições, 
Explosivos e Outros Materiais​. Disponível em: 
<http://www.oas.org/juridico/portuguese/treaties/a-63.htm>. Acesso em: 28 nov 2020. 
 
12 ​P​lano de Trabalho de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas no Hemisfério Ocidental (​2015-2018). 
Disponível em : ​https://www.oas.org/csh/portuguese/traficopessoas.asp 
 
 
 
https://www.oas.org/csh/portuguese/traficopessoas.asp
Na mesma Reunião de Autoridades Nacionais em Matéria de Tráfico de Pessoas em 
que foi aprovado o Plano de Trabalho 2015-2018, foi aprovada a “Declaração 
Interamericana de Combate ao Tráfico de Pessoas” ou “Declaração de Brasília” (2014). 
Em matéria de delito cibernético, em 2004, os Estados Membros da OEA aprovaram 
a Estratégia Interamericana Integral de Combate às Ameaças à Segurança Cibernética. A 
estratégia emprega uma abordagem abrangente para a construção de capacidades, 
reconhecendo que a responsabilidade nacional e regional pela segurança cibernética recai 
sobre uma ampla gama de entidades dos setores público e privado, que trabalham em 
aspectos políticos e técnicos para proteger o ciberespaço. A estratégia visa ao 
estabelecimento de grupos nacionais de “alerta, vigilância e prevenção”, também 
conhecidos como Equipes de Resposta a Incidentes (CSIRT) em cada país; cria uma rede 
de alerta hemisférica; promove o desenvolvimento de estratégias nacionais de segurança 
cibernética e o desenvolvimento de uma cultura que permita o fortalecimento da segurança 
cibernética no hemisfério. 
Por fim, deve-se observar que o arcabouço jurídico internacional para 
enfrentamento do tráfico ilícito de drogas é regido principalmente por três tratados 
internacionais: a Convenção Única sobre Entorpecentes de 1961 (emendada em 1972), a 
Convenção sobre Substâncias Psicotrópicas de 1971 e a Convenção das Nações Unidas 
contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas de 1988. Nesse 
quesito, a região também esteve na vanguarda. Prova disso é a Declaração de Antígua, na 
Guatemala, de 2013​13​, que visa “uma política integral frente ao problema mundial das 
drogas nas Américas”, por meio da qual se questionou de forma construtiva a atuação da 
abordagem tradicional dominante até então. 
Conhecer o marco normativo internacional sobre os mercados ilícitos e o crime 
organizado é fundamental para desenvolvermos uma visão mais abrangente dos fenômenos 
que, como profissionais de segurança, temos que conhecer para poder prevenir e controlar. 
13 Declaração de Antígua, na Guatemala​, de 2013.Disponível em: 
<​https://www.oas.org/pt/centro_midia/nota_imprensa.asp?sCodigo=PG-010​>. 
 
 
https://www.oas.org/pt/centro_midia/nota_imprensa.asp?sCodigo=PG-010
5 Como colocar esses conceitos em prática no trabalho policial? 
 
Perguntas-chave para a seção: 
Quais são as características dos grupos do crime organizado? 
Que estruturas​ ​os grupos do crime organizado apresentam? 
 
A partir da breve revisão apresentada sobre o marco normativo, é possível apontar 
dois caminhos possíveis a orientar o esforço de mapeamento e diagnóstico da atuação de 
grupos criminosos organizados ou organizações criminosas nos diferentes contextos 
nacionais. 
O primeiro deles coloca foco na organização criminosa em si: suas características 
elementares, estrutura organizacional, divisão de tarefas, hierarquia, dentre outros aspectos 
organizacionais e funcionais característicos. Este foi o caminho seguido nas primeiras 
iniciativas contra a máfia, principalmente nos EUA, e segue como uma vertente importante 
da literatura que se dedica a classificar e analisar o padrão organizacional dos grupos 
criminosos​14​. 
O segundo caminho, por sua vez, dirige seu foco para as atividades ilícitas e suas 
externalidades. No primeiro caminho, identifica-se a organização e chega-se às atividades 
ilícitas às quais a organização se dedica; no segundo caminho, que estamos seguindo como 
linha principal do presente módulo, identifica-se a atividade ilícita e a partir daí chega-se à 
organização ou às organizações que realizam essa atividade ou que dela se aproveitam de 
alguma forma. 
O crime organizado tem uma presença difusa em toda a Região,atuando em 
atividades como tráfico de armas e drogas, roubo a bancos e de cargas, biopirataria, 
contrabando de produtos falsificados e tráfico de pessoas. Há, também, extensas 
14 Albanese (2011) aponta cinco espécies de grupos criminosos organizados: (a) hierarquia rígida: chefe 
individual com uma forte disciplina interna com muitas divisões; (b) hierarquia descentralizada: estruturas 
regionais, cada qual com a sua própria hierarquia e nível de autonomia; (c) conglomerado hierarquizado: 
uma associação de grupos criminosos organizados; (d) grupo criminoso central: estrutura horizontal de 
indivíduos que se autodescrevem como trabalhando para uma mesma organização; (e) rede criminosa 
organizada: engajamento individual em atividades criminosas na modificação de alianças, não 
necessariamente afiliadas a algum grupo criminoso, mas agindo de acordo com as suas respectivas 
habilidades para realizar atividades ilícitas. 
 
 
ramificações do crime organizado no comércio legal, no setor de serviços (incluindo os 
serviços financeiros), na burocracia estatal, nas polícias e na política. Diante desse cenário, 
fica evidente a necessidade de se buscar novas formas de análise do fenômeno e também da 
adoção de novos modelos de organização, operação e articulação das forças de segurança, 
principalmente por meio da maior interação entre os sistemas de inteligência e informação 
das polícias, dos órgãos de controle interno, do Ministério Público, dentre outras instâncias, 
com vistas a permitir a gestão estratégica do problema. 
Como temos enfatizado, as organizações criminosas são muito diversificadas e 
podem ser inicialmente identificadas como uma associação perene de indivíduos que visa 
ao cometimento de atos ilícitos para obter vantagens econômicas da exploração de bens e 
serviços ilícitos. 
A aproximação do tema no âmbito do trabalho policial exige, no entanto, reflexões 
adicionais sobre o uso do conceito de “crime organizado”, o qual é comumente empregado 
como se denotasse um fenômeno claro e coerente, mas que de fato se trata de um conceito 
temporalmente mutável e difuso (LAMPE 2003)​15​. Nos estudos acadêmicos sobre o tema, 
encontramos exemplos de aplicação do conceito de “crime organizado” derivados de 
diferentes modelos criminológicos e que refletem pontos de vistas muitas vezes conflitivos, 
expondo a dificuldade de se conceber uma definição universalmente aceita do fenômeno 
(LAMPE, 2016; NAYLOR, 2004)​16​. 
Mesmo sem uma definição clara do que constitui o problema, as agências policiais 
são chamadas a desenvolver análises prospectivas para entenderem e se prepararem 
antecipadamente para enfrentarem as novas tendências, dinâmicas e ameaças advindas do 
crime organizado. 
Dessa forma, um caminho possível para se contornar a dificuldade posta pela falta 
de um conceito compartilhado sobre o fenômeno do crime organizado é considerar a 
atividade ilícita (o empreendimento e o mercado no qual os grupos criminosos atuam) e 
15 ​ Ver Lampe, 2003. 
 
16 ​Ver Naylor, 2004. 
 
 
 
não somente a ​estrutura da organização como ponto de partida para a análise e 
investigação policial. 
Estudos científicos podem ajudar na reflexão sobre os desafios do trabalho policial 
diante do problema do crime organizado. O sociólogo Howard Abadinsky (2000) destacou 
as características centrais do crime organizado: (a) não apresenta objetivos políticos; (b) 
organização hierarquizada; (c) participação de seus membros definida através das 
qualidades individuais especificas; (d) formam uma ​subcultura​, os participantes aceitam 
padrões e regras comportamentais; (e) perpetuação da organização criminosa com a 
agregação de novos membros; (f) uso da força e da corrupção visando à impunidade; (g) 
especialização e divisão das tarefas; (h) monopólio das atividades ilícitas objetivando a 
hegemonia; (i) comando através de normas e regras preestabelecidas. Essas características 
guardam um paralelo com os elementos constitutivos do crime organizado indicados por 
Donald R. Cressey. 
As ideias defendidas por Abadinsky de que o crime organizado apresenta 
necessariamente algum tipo de hierarquia e produz uma subcultura própria têm sido 
questionadas nos trabalhos mais recentes sobre o tema. Nesse sentido, outro caminho que 
começa a ser percorrido envolve a análise das ​redes criminais e o conceito de “vínculos 
sociais que podem ser criminalmente explorados” ​(​criminally exploitable ties​), 
desenvolvido pelo criminólogo Klaus von Lampe em diferentes trabalhos ​17​. A vantagem 
desse conceito é que ele pode ser empregado para analisar tanto agentes que são fixos na 
sua conduta criminosa (criminosos de carreira e organizações criminosas de vários tipos) 
quanto agentes que são híbridos (atuam em atividades legais e ilegais de forma simultânea 
ou transitam de uma para outra em diferentes momentos). 
Outra questão importante diz respeito à forma como se dá a mudança de escala das 
organizações criminosas do âmbito local e nacional para o transnacional. Aqui também 
existem visões conflitivas sobre esse processo: três modelos distintos podem ser utilizados 
para explicar as mudanças na escala de operação. 
17 ​Ver Lampe 2003 y 2016. 
 
 
 
O primeiro modelo pode ser descrito como o modelo evolucionário do crime 
organizado​18​(LUPSHA, 1996; BEATTO E ZILLI, 2012). 
, no qual as organizações criminosas evoluem desde o nível mais simples (gangues e 
quadrilhas locais), no qual basicamente há uma relação de conflito permanente entre grupos 
criminosos e desses com a polícia. No segundo estágio de evolução, algumas organizações 
se mostram mais adaptadas ao ambiente social e criminal no qual atuam e se estabelecem 
territorialmente (ou em algum segmento de atividade ilícita) como uma força dominante. 
Em seguida, passam a “se envolver em modalidades criminosas mais complexas” 
(BEATTO e ZILLI, 2012)​19​, como também a desenvolver relações parasitárias com as 
organizações do Estado e da sociedade civil​20 . No último estágio de evolução, não apenas 
as conexões criminais normalmente se expandem além das fronteiras nacionais como a 
relação com o Estado sofre mudanças profundas no sentido de se tornar simbiótica. 
O segundo modelo explora a relação entre crime e política de forma distinta do 
modelo evolucionário: os grupos políticos representados no Estado exploram diretamente 
as atividades ilícitas e “taxam” ilicitamente as organizações criminosas, com elas 
estabelecendo um verdadeiro conluio (PIMENTEL, 2000)​21 . Há, portanto, uma relação 
endógena entre o crime organizado e a elite político-econômica que explora a atividade 
ilícita com o objetivo de obter moedas fortes, financiar campanhas e alavancar fundos para 
investimentos privados em atividades lícitas. A passagem da escala local de operação para a 
escala transnacional ocorre, nesse caso, como consequência de uma associação entre as 
elites político-econômicas de Estados fracos ou falidos, por um lado, e as organizações 
criminosas, por outro, que são economicamente exploradas ao mesmo tempo que são 
apoiadasnas suas operações ilícitas. 
Por fim, o terceiro modelo procura explicar a emergência do crime transnacional 
como decorrente de um processo de formação de redes entre organizações criminosas locais 
incentivadas por processos econômicos e tecnológicos como o aumento do comércio e das 
18 Lupsha 1996; Beato y Zilli 2012; Pimentel 2000 
 
19 ​ ​Beato, Zilli 2012, p 91 
 
20 Pimentel 2000, p. 56 
 
21 Ibid., p 56 
 
 
viagens internacionais e o crescimento e barateamento dos sistemas de informação e 
comunicação via internet, telefones celulares, ​e-mails e redes sociais (LAMPE, 2003 E 
2016) ​22​. 
Organizações e redes criminais não são independentes, à medida que evoluem a 
partir do território ou segmento em que estão inseridas. Isso significa dizer que 
organizações criminosas locais não precisam necessariamente modificar suas estruturas 
funcionais internas e “evoluir” para formas mais complexas de organização, mas podem 
contribuir, a partir da conexão e do compartilhamento de recursos e operações, para a 
produção de um ambiente criminal mais complexo e agressivo contra as organizações do 
Estado e da sociedade. 
Esses três modelos pretendem explicar como o crime se modifica 
organizacionalmente e supera as fronteiras nacionais. 
Outro problema distinto diz respeito à evolução dos mercados de bens e serviços 
ilícitos. É evidente que as organizações criminosas e os mercados são entes 
inter-relacionados, mas, no caso das atividades ilícitas em particular, há mais possibilidade 
de observação do comportamento do mercado do que do comportamento e da estrutura 
organizacional dos grupos criminais. Vejamos a magnitude e as características dos 
principais mercados ilícitos na região. 
 
 
6 A relação entre mercados ilícitos e crime organizado 
 
Perguntas-chave para a seção: 
Quais são as principais manifestações do crime organizado? 
Como isso afeta cada país? 
Que novas tendências podem ser identificadas? 
 
 
22 ​Lampe, 2003 e 2016. 
 
 
 
Mercados ilícitos transnacionais são ou constituem-se a partir da oferta, em escalas 
regional e internacional, de bens e serviços como drogas, armas, órgãos humanos, pessoas, 
criptomoeda, serviços sexuais, animais silvestres e plantas, minérios, produtos roubados, 
furtados, contrabandeados, falsificados ou pirateados. A oferta desses bens atende a uma 
demanda crescente vinda de consumidores de diferentes países do mundo. Infratores se 
organizam e se conectam em redes para atuar nesses mercados, utilizando-se da corrupção, 
da violência e de ameaças contra agentes públicos e a sociedade. Essas atividades geram 
também um fluxo de recursos financeiros que precisam ser reintroduzidos na economia 
após serem “lavados”. Portanto, os mercados ilícitos e suas cadeias globais constituem um 
problema público que precisa ser enfrentado e controlado de forma sistêmica. Não basta 
atuar contra os crimes como o contrabando, o tráfico ou o roubo de carga isoladamente. 
Tanto do ponto de vista prático, da investigação policial e da prevenção, quanto da análise 
de inteligência, é preciso entender como se conectam os diferentes agentes envolvidos nas 
cadeias logísticas dos mercados ilícitos. Essa é a forma principal pela qual os órgãos 
policiais passaram a lidar com o problema dos novos tipos de crime globais, principalmente 
desde os anos 2010. 
Compreender a base econômica do problema criminal contemporâneo significa que 
a polícia e a justiça criminal precisam redirecionar o foco de suas ações, hoje voltadas para 
a conduta criminal do infrator e sua tipificação, para o quadro mais abrangente no qual se 
desenvolve o crime. A função desempenhada pelo infrator em suas conexões com outros 
agentes (que atuam em atividades lícitas ou ilícitas) precisa ser devidamente compreendida. 
A emergência e o barateamento de novas tecnologias de comunicação, a 
digitalização do dinheiro e a expansão do comércio internacional que a globalização 
econômica viabilizou fizeram do comércio de bens e serviços ilícitos uma opção com 
custos decrescentes e retornos crescente para a maioria dos criminosos em qualquer país do 
mundo. Essa opção racional dos infratores pelos mercados ilícitos não significa que 
estamos assistindo à substituição dos criminosos de antes por novos criminosos mais 
capazes intelectualmente. As oportunidades mudaram, igualmente a escala dos ganhos e o 
impacto na sociedade, mas o perfil dos infratores não mudou da mesma forma. Esses 
continuam a ser recrutados nos grupos sociais de menor renda e entre segmentos 
marginalizados em diferentes países do mundo e, além dessa presença persistente de fatores 
 
 
como a pobreza e a falta de oportunidades econômicas como motores do engajamento no 
crime, o gosto e a capacidade de exercer a trapaça e a violência​23 continuam a ser 
pré-requisitos básicos para qualquer um que queira ter uma carreira nos novos negócios 
ilícitos globais. 
Devido à natureza clandestina dos mercados de bens e serviços ilícitos, há uma 
grande dificuldade de se estabelecer suposições confiáveis sobre a magnitude e o 
funcionamento desses mercados. As estimativas disponíveis diferem, muitas vezes, de 
forma acentuada, embora possam oferecer algumas informações úteis para o trabalho de 
inteligência e de investigação. 
Para fins da análise que faremos a seguir, vamos classificar os mercados ilícitos 
segundo suas cadeias de suprimentos. O primeiro grupo é constituído por bens e serviços 
que são integralmente ilícitos, ou seja, toda a cadeia de produção e suprimentos, a entrada e 
a venda desses bens e serviços nos países é ilícita, sem exceções. Esse é o caso das drogas e 
do contrabando de cigarro, celulares, bebidas, entre outros. O segundo grupo é composto 
por bens e serviços que são parcialmente lícitos. Nesse caso, os produtos foram fabricados 
ou entraram no país de forma legal, mas foram roubados de seus donos (carros, relógios, 
celulares, etc.) ou, após serem produzidos legalmente, foram comercializados de forma 
ilícita (como no caso das armas de fogo, por exemplo). 
Esses dois segmentos dos mercados ilícitos são altamente lucrativos, como veremos. 
O Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime publicou em 2011 a pesquisa 
“Estimating Ilicit Financial Flows Resulting from Drug Trafficking and Other 
Transnational Organized Crimes” (UNODC, 2011)​24​, em que examina a magnitude dos 
fundos ilegais gerados pelas atividades ilícitas, a partir de parâmetros técnicos estabelecidos 
pelo Fundo Monetário Internacional. Nesse estudo, os produtos ou receitas provenientes de 
crimes somam aproximadamente 3,6% do Produto Interno Bruto global. Vejamos quais são 
os principais segmentos dos mercados ilícitos globais e suas respectivas magnitudes. 
23 ​O comportamento violento e o gosto pela trapaça nas interações sociais são fatores associados à baixa 
inteligência (FREEMAN, 2012)​. 
24 UNODC, 2011. “Estimating Ilicit Financial Flows Resulting from Drug Trafficking and Other Transnational 
Organized Crimes” ​. Disponível em: 
<​https://www.unodc.org/documents/data-and-analysis/Studies/Illicit_financial_flows_2011_web.pdf​> 
 
 
https://www.unodc.org/documents/data-and-analysis/Studies/Illicit_financial_flows_2011_web.pdf6.1 Drogas 
 
A principal fonte de dados e informações sobre o problema global das drogas ilícitas 
no mundo é o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime, conhecido pela sigla em 
inglês UNODC. Essa agência da ONU estima que aproximadamente 35,6 milhões de 
pessoas no mundo sofrem algum tipo de problema de saúde associado ao consumo de 
drogas. 
Embora o valor do mercado de drogas ilícitas seja extremamente difícil de se 
estimar (KILMER; PACULA, 2009), o UNODC avalia que o mercado ilícito das drogas 
produziu uma receita equivalente a U$650 bilhões por ano na primeira década do novo 
milênio, o que é equivalente a 1,5% do PIB global. Na maior parte, esses recursos são 
lavados no sistema financeiro (aproximadamente 1% do PIB global, ou U$580 bilhões em 
2009) e o restante é reinvestido nas próprias atividades ilícitas (UNODC, 2011). Os Estados 
Unidos ainda são o maior mercado de cocaína no mundo: embora tenha ocorrido um 
declínio importante entre 2006 e 2011, as pesquisas de epidemiológicas indicam que o 
consumo da cocaína permanece em níveis muito altos naquele país (UNODC, 2020b, p. 
25). 
Na América do Sul, o consumo da cocaína também se apresenta como um problema 
grave. Na região, segundo as estimativas do Relatório Mundial sobre Drogas 2020, 2,8 
milhões de pessoas, ou quase 1% da população com idade entre 15 e 64 anos, fizeram uso 
da cocaína no ano de 2018. O Brasil é o maior mercado de cocaína da América do Sul, com 
quase 1,5 milhão de usuários de cocaína e “crack” no mesmo ano. 
Segundo os dados disponíveis no Relatório Mundial sobre Drogas (2017), 
aproximadamente um bilhão de pessoas, ou cerca de 15% da população global, usou drogas 
pelo menos uma vez em 2015 (ano de referência da pesquisa). Ainda mais preocupante é o 
fato de que cerca de 29,5 milhões desses usuários de drogas, ou 0,6% da população adulta 
global, sofrem de transtornos de uso de drogas. 
 Com base nas pesquisas de prevalência de uso de drogas pela população, Reuter e 
Greenfield (2001) estimaram o consumo ​per capita e, levando em conta o valor de varejo 
 
 
da cocaína nos EUA e na Europa, construíram um intervalo com o valor mínimo de 35 
bilhões e máximo de U$115 bilhões de gasto com a droga. Kilmer e Pacula (2009) 
apresentam uma estimativa mais conservadora para a receita gerada pelo comércio 
internacional de cocaína: entre U$7 e U$8 bilhões de dólares (p. 70). 
As estimativas do UNODC são bem mais elevadas. Os lucros obtidos com a venda 
da cocaína foram estimados, por essa agência, em U$84 bilhões de dólares para o ano de 
2009, sendo que aproximadamente um bilhão corresponde aos custos de produção. A maior 
parte dos lucros dessa cadeia produtiva foi gerada não na região produtora, a região andina 
da América do Sul, mas na América do Norte e na Europa. Os cálculos derivados dessas 
estimativas do tamanho do mercado e da estrutura do mercado sugerem que 
aproximadamente 92% da receita proveniente da comercialização da cocaína no mundo 
estiveram aptos para a lavagem em 2009. A pesquisa revela ainda que, do total mencionado 
de U$84 bilhões de lucro, U$56 bilhões estão disponíveis para lavagem, sendo que, destes, 
aproximadamente U$26 bilhões deixaram as jurisdições onde os lucros foram obtidos. 
Outro mercado de drogas ilícitas de grande importância regional e global é o da 
Cannabis​. As estimativas globais do mercado de ​Cannabis apresentadas por Kilmer e 
Pacula (2009), seguindo a mesma metodologia com base em dados de demanda, indicam 
que o consumo global dessa droga é apenas a metade do valor estimado pelo UNODC. As 
estimativas sobre a ​Cannabis são ainda mais precárias do que as que estão disponíveis para 
a cocaína, devido ao fato de o cultivo dessa droga encontrar-se bastante disseminado no 
mundo. 
O World Drug Report de 2017 indica que 135​25 países no mundo relataram a 
presença de cultivo ilícito da droga, sendo que na região das Américas, Canadá, EUA, 
México, Paraguai, Colômbia e Brasil, entre outros países, produzem grande quantidade da 
droga; aproximadamente 24% da produção mundial ocorrem na América do Sul, e 31%, na 
América do Norte ​26​ (WORLD DRUG REPORT​, ​2017, Booklet 2, p. 39). 
25 World Drug Report, 2017; “​A estimativa do número de países é feita com base em um questionário em 
que os Estados Membros informam sobre a existência de cultivo no próprio país e nos países do entorno. 
“​. 
26 ​World Drug Report, 2017. Booklet 2, p. 39. 
 
 
 
O relatório de 2017 confirma essa característica disseminada do cultivo da ​Cannabis 
e a forte presença da droga na região das Américas. O Paraguai, segundo o WDR 2017, é o 
primeiro país do mundo com maior número na erradicação de plantas de ​Cannabis​, com 12 
milhões de pés erradicados ​27​ (WORLD DRUG REPORT​, ​2017)​ ​. 
As estimativas devem ser lidas com cautela. Embora ofereçam uma base útil para o 
planejamento de ações de prevenção e controle do problema, segundo alguns especialistas, 
esses procedimentos têm várias falhas metodológicas, principalmente em função do fato de 
que o preço das drogas no varejo é estimado com base em uma média de uma distribuição 
que apresenta grande variação (REUTER; GREENFIELD, 2001; ARKES, 2008; 
PACULA, 2007). O preço de qualquer droga varia enormemente entre países e entre 
cidades e regiões de um mesmo país​28​. A validade dessas estimativas globais do mercado 
de bens e serviços ilícitos e a metodologia empregada são objeto de intensa disputa entre os 
especialistas (NAYLOR, 2004; KILMER; PACULA, 2009). 
Mesmo diante das dúvidas sobre a qualidade das estimativas oferecidas pelo 
UNODC, há algumas vantagens na utilização desses dados em estudo sobre tendências e 
principalmente na comparação entre países. Em primeiro lugar, os levantamentos 
oferecidos pela UNODC apresentam metodologia padronizada para a mensuração (de 
validade discutível, mas razoavelmente confiáveis) de aspectos como o cultivo e a 
produção de drogas, entre outros, o que permite estabelecer comparações longitudinais 
(como as que faremos a seguir) sobre a evolução de diversas atividades ilícitas. Em 
segundo lugar, as estimativas do UNODC têm abrangência global, ao contrário dos estudos 
acadêmicos, que geralmente apresentam estimativas pontuais baseadas em protocolos 
metodológicos que dificilmente são aplicados em mais de um momento no tempo e em 
mais de um país ou região. Em terceiro lugar, essas estimativas têm sido crescentemente 
utilizadas na definição de estratégias governamentais diante do problema do crime 
27 ​World Drug Report, 2017, Dados Tabla “Cannabis cultivation, production and eradication, latest year 
available from the period of 2011-2016. Disponível em: 
<​https://www.unodc.org/wdr2017/field/6.3.1_Cannabis_cultivation_production_eradication.pdf​” >. 
 
28 ​Por exemplo, Reuters e Greenfield (2001) relatam estimativas sobre o preço da cocaína na Espanha: 
entre 1988 e 1993, o preço teria caído de U$84 par​a U$44; enquanto na França, no mesmo período, teria 
ocorrido um movimentocontrário: um aumento de $72 para $107. Variações internas nos EUA mostram 
também diferenças muito acentuadas. O preço da cocaína em Pittsburgh em 1992 era de U$80 contra 
U$54 em Miami. 
 
 
https://www.unodc.org/wdr2017/field/6.3.1_Cannabis_cultivation_production_eradication.pdf
organizado. É claro que estimativas exageradas podem levar à alocação ineficiente de 
recursos, mas são adequadas para se avaliar a motivação dos governos na definição de 
políticas ou, no mínimo, para analisar a sensibilidade das lideranças políticas diante do 
problema. 
 
6.2 Armas 
 
Nenhuma análise dos mercados ilícitos estaria completa sem uma referência ao 
mercado de armas de fogo. Há uma conexão entre os mercados ilícitos de armas e drogas 
que precisa ser detalhada analiticamente e que tem grande impacto na forma como a 
distribuição da droga e o tráfico de armas ocorrem nas áreas urbanas. Os mercados ilícitos 
de armas e drogas têm, no entanto, uma diferença importante: armas são produzidas 
legalmente para então serem transferidas ao mercado ilegal em algum ponto do processo de 
comercialização. 
O valor global do comércio autorizado de armas de fogo foi estimado pela ONU em 
US$5,8 bilhões no ano de 2013, um aumento de 17% em relação a 2012​29​. A análise de 
tendências revelou que o valor do comércio global de armas leves e de pequeno porte quase 
dobrou entre 2001 e 2011 (de US$2,38 bilhões para US$4,634 bilhões)​30​. A tabela 1 mostra 
o peso que os EUA e o Brasil têm no comércio legal de armas entre os países da região das 
Américas. Os EUA são os maiores exportadores e importadores de armas da região: 
sozinhos, movimentam mais do que todos os demais países da região. O Brasil é o segundo 
exportador e o quinto importador de armas leves na região das Américas e, globalmente, 
está entre os dez maiores produtores mundiais de armas leves (SMALL ARMS SURVEY, 
2016). O grande desafio das políticas para o setor não é propriamente o de regular o acesso 
legal às armas, mas a capacidade de controle das transferências ilegais de armas. A zona 
cinzenta entre o segmento legal e o comércio ilícito é o grande problema a ser enfrentado 
pela legislação e pelas polícias. 
29 PAVESI,I. In: ​Trade Update 2016: Tranfers and Transparency​. Small Arms Survey: Geneva, 2016. Disponível 
em: <htttp://www.smallarmssurvey.org/fileadmin/docs/S-Trade-Update/SAS-Trade-Update.pdf> . 
30 AUTHORIZED Trade. Small Arms Survey, Geneva, 2016. Disponível em: 
<​http://www.smallarmssurvey.org/weapons-and-markets/transfers/authorized-trade.html> 
 
 
Quadro 1 
 
 
 
O mercado mundial de armas ilícitas tem passado por transformações importantes. 
Os Estados Unidos e a Rússia já não dominam o mercado mundial de armas leves (como 
ocorria durante o período da Guerra Fria), mas foram substituídos por países da África, 
Ásia, e América Latina que desenvolveram suas próprias indústrias de armas e tornaram-se 
exportadores globais importantes. Embora a maior parte dos negócios ocorra legalmente, o 
fato é que a participação desses novos países produtores no mercado de armas alterou 
substancialmente as cadeias logísticas dessa indústria e facilitou o processo de transferência 
para o segmento ilegal. 
O tráfico de armas leves é uma atividade ilícita global em expansão. Esse é um 
mercado diretamente afetado pelas novas tecnologias disponíveis nas áreas de transporte, 
 
 
comunicação e produção, as quais permitem que as armas de pequeno porte sejam 
negociadas de forma muito mais fluida. 
6.3 Tráfico de pessoas e contrabando de migrantes 
 
O tráfico de pessoas deve ser analisado entre os grandes vetores das atividades 
ilícitas globais. Essa atividade é considerada pelo Escritório das Nações Unidas sobre 
Drogas e Crime como o terceiro maior comércio ilegal do mundo, somente atrás do tráfico 
de armas e de drogas. Essa atividade geralmente é dividida em nichos específicos: (a) para 
fins de exploração sexual do indivíduo; (b) para a realização de trabalhos escravos ou em 
regime de semiescravidão: a finalidade é a utilização do indivíduo como mão de obra, sem 
o seu consentimento; (c) para o tráfico de órgãos: quando há o transporte de indivíduos para 
retirada de seus órgãos, seja por rapto, morte ou venda; (d) para a adoção de crianças: 
compra e venda de menores para adoção ilegal; (e) fins militares: utilização de indivíduos 
em conflitos armados; (f) tráfico de esposas, o que é diferente do tráfico sexual, pois a 
finalidade deste tráfico é o fornecimento de mulheres para o casamento forçado a regiões 
do mundo onde esse tipo de prática ocorre. 
A organização não governamental norte-americana Polaris​31​, em parceria com o 
Departamento de Estado dos Estados Unidos, apresentou o ​Human Trafficking Statistics​, no 
qual identificou que 800 mil pessoas são traficadas através de fronteiras todos os anos e que 
50% desse contingente são compostos por crianças e adolescentes. Estima-se que 1 milhão 
de crianças são exploradas no comércio sexual anualmente, sendo 80% do sexo feminino, e 
que quase a totalidade dos países é afetado pelo problema. O tráfico de pessoas gera 
anualmente um montante de US$32 bilhões de receita. 
Por sua vez, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) estima as vítimas do 
trabalho forçado em todo o mundo em 21 milhões, das quais 11,4 milhões são mulheres e 
meninas, gerando lucros de 150 bilhões por ano globalmente. 
É importante notar que o tráfico de pessoas pode ocorrer tanto nacional quanto 
internacionalmente. Grande parte dos negócios ligados ao tráfico de pessoas ocorre 
31 HUMAN Trafficking Statistics. Polaris Project, Washington D. C., 2016. Disponível em: 
<​http://www.polarisproject.org/human-trafficking/overview​>. Acesso em:28 de nov 2020. 
 
 
http://www.polarisproject.org/human-trafficking/overview
localmente dentro dos países, sem a necessidade de cruzar fronteiras. Em relação ao 
contrabando de migrantes, estima-se que mais de 232 milhões de pessoas em todo o mundo 
são migrantes internacionais, dos quais 57,5 milhões vivem nas Américas. Destes, 19,15 
milhões de pessoas vêm do México e da América Central, e estima-se que metade está sem 
documentos pessoais. Este negócio ilícito traz lucros de US$6,6 trilhões por ano 
globalmente​32​. 
 
6.4 Novos mercados ilícitos 
 
Novos mercados ilícitos têm-se mostrado extremamente dinâmicos e em forte 
expansão. Os avanços da biotecnologia e a facilidade de se registrar marcas e patentes em 
âmbito internacional têm facilitado, nos últimos anos, o contrabando de recursos biológicos 
para fins comerciais ou científicos, atividade denominada “biopirataria”. A exemplo do que 
ocorre no mercado das drogas, os dados sobre biopirataria têm baixa confiabilidade; 
entretanto, os levantamentos disponíveis revelam prejuízos econômicos significativos. 
Estima-se que 12 países no mundo concentram 70% de todas as espécies de 
vertebrados, insetos e plantas conhecidas. Desses países, cinco estão na América Latina, 
sendo o Brasil líder do ​ranking​, com cerca de 150 mil espécies já pesquisadas e 
catalogadas,ou 13% de todas as espécies de flora e fauna que existem no mundo. Porém, 
ainda falta identificar até 90% desse potencial, o que torna o País alvo profícuo para a 
atividade de diversos grupos organizados nessa atividade. O ​modus operandi tradicional 
nesse setor envolve a apropriação indevida de espécies que ainda não são conhecidas e que, 
portanto, demoram a ser reivindicadas por pesquisadores e empresas que atuam no País. 
Quanto à extração ilegal de madeira, segundo estimativas de estudo do Banco 
Mundial, esta atividade criminosa gera receitas entre US$10 e US$15 bilhões por ano em 
todo o mundo (GONÇALVES, PANJER et al., 2012). Dados de estudos mais recentes, de 
2014, apontam para valores ainda maiores, segundo os quais a indústria de madeira ilegal 
movimenta em torno de US$100 bilhões por ano, representando cerca de 30% da atividade 
32 ​MANUEL, O.; MALLOY, M. In: ​Trabajo de instrucción. Seguridad y Migración en México y América 
Central 
 
 
 
de comércio de madeira mundial (GLOBAL INITIATIVE AGAINST TRANSNATIONAL 
ORGANIZED CRIME, 2014). 
Esses dados indicam que os governos e as sociedades, principalmente dos países em 
desenvolvimento da região, enfrentam desafios muito concretos diante do aumento do 
poder dos grupos criminosos que atuam nos principais mercados ilícitos globais. 
Há um enorme acervo de informações disponível ​on-line sobre todas as atividades 
ilícitas analisadas neste módulo, que pode e deve ser explorado no planejamento das ações 
de prevenção e de investigação contra o crime organizado. Nosso objetivo foi o de 
apresentar a morfologia geral do problema e induzir uma reflexão sobre as conexões 
existentes entre as diversas atividades ilícitas, com o intuito de impulsionar o debate sobre 
as políticas públicas de resposta ao fenômeno, o que faremos a seguir. 
 
7 Crime organizado e terrorismo 
 
Perguntas-chave para a seção: 
Como o crime organizado e o terrorismo estão ligados? 
Quais são as diferenças entre esses fenômenos? 
O terrorismo, cuja classificação é variada, apresenta diversos pontos de 
convergência com as organizações criminosas quanto à sua estruturação em cadeias 
logísticas e à utilização das redes de lavagem de dinheiro. No entanto, os grupos terroristas 
divergem das organizações criminosas quanto a sua motivação, finalidade e uso da 
violência. 
O caráter político do terrorismo é o ponto central para o enfrentamento da questão e 
vem sendo abandonado como elemento caracterizador, tendência observada desde 1919 
com a ​Convenção de Prevenção e Punição do Terrorismo editada pela ​Liga das Nações​33 e 
destinada ao combate dos movimentos anarquistas do início do século XX. Desde então, as 
33 A Liga das Nações, em 16 de novembro de 1937, promulgou a Convenção de Prevenção e Punição do 
Terrorismo da Liga das Nações contra o terrorismo anárquico que assolava o continente europeu, e definiu o 
terrorismo como sendo todos ​os ​atos criminosos dirigidos contra um Estado e com a intenção premeditada de 
criar um estado de terror nas mentes de pessoas específicas ou de um grupo de pessoas ou do público em geral 
(art. 1º), sendo os atos de terror especificados como aqueles aptos a atacar funcionários públicos, chefes de 
Estado e seus familiares, bem como pôr em risco ou destruir as instalações públicas. 
 
 
medidas ​antiterrorismo tendem a afastar tal característica, como pode ser observado na 
postura adotada pela Organização das Nações Unidas, que identifica o terrorismo como 
 
Qualquer ato intencional voltado a causar a morte ou grave lesão física a civis ou 
não combatentes, quando o propósito desse ato, pela sua natureza ou contexto, seja 
intimidar a população ou compelir um governo ou uma organização internacional a 
fazer ou se abster de fazer algum ato​.​34​ ​35 
 
No mesmo sentido é a Convenção Interamericana Contra o Terrorismo,​36 no 
âmbito da Organização dos Estados Americanos (OEA), ao estabelecer a inaplicabilidade 
da exceção por delito político e reafirmar a necessidade na adoção de medidas para a 
supressão do financiamento ao terrorismo.​37 
Os países da região têm paulatinamente aumentado sua adesão aos instrumentos 
internacionais contra o terrorismo, particularmente em matéria de seu financiamento. 
As dificuldades que os países da região enfrentam em promover ações 
coordenadas contra o terrorismo, tanto no plano doméstico quanto no internacional, são 
analisadas em profundidade no relatório do Grupo de Ação Financeira, o GAFI. Segundo o 
documento, há importantes deficiências nas informações disponíveis em todas as 
instituições envolvidas com o processo criminal e que atuam na prevenção à lavagem de 
dinheiro. Os Estados não conseguem alcançar o mínimo de consenso sobre as ações 
práticas que precisam ser desenvolvidas para conter o risco de atentados terroristas e para a 
34 Report of The Secretary-General’s High-level Panel on Threats, Challenges and Changes. A more secure 
world: Our Shared Responsibility. United Nations 2004 pp.52 Disponível em: 
<http://www.un.org/en/peacebuilding/pdf/historical/hlp_more_secure_world.pdf>. Acesso em: 16 ago. 
2016. 
35 Destaca-se o avanço legislativo proposto com a Resolução n. 2195/2014 ao identificar o vínculo existente 
entre as atividades terroristas e as organizações criminosas e especificamente na Resolução n. 2199/2015 
em relação ao terrorismo fundamental​ista. 
36 ​Conforme previsto no art. 11: Inaplicabilidade da exceção por delito político. Para os propósitos de 
extradição ou assistência judiciária mútua, nenhum dos delitos estabelecidos nos instrumentos 
internacionais enumerados no artigo 2 será considerado delito político ou delito conexo com um delito 
político ou um delito inspirado por motivos políticos. Por conseguinte, não se poderá negar um pedido de 
extradição ou de assistência judiciária mútua pela única razão de que se relaciona com um delito político ou 
com um delito conexo com um delito político ou um delito inspirado por motivos políticos. (Disponível em: 
<​http://www.oas.org/pt/topicos/terrorismo.asp​>. Acesso em: 10 jul. 2016). 
37 Conforme se observa nas publicações do Banco Mundial, e especificamente em Reference Guide to 
Anti-Money Laundering and Combating the Financial of Terrorism The World Bank. (Disponível em: 
<​http://siteresources.worldbank.org/EXTAML/Resources/396511-146581427871/Reference_Guide_AMLCF
T_2ndSupplement.pdf​>. Acesso em:​ 10 jul. 2016). 
 
 
http://www.oas.org/pt/topicos/terrorismo.asp
http://siteresources.worldbank.org/EXTAML/Resources/396511-146581427871/Reference_Guide_AMLCFT_2ndSupplement.pdf
http://siteresources.worldbank.org/EXTAML/Resources/396511-146581427871/Reference_Guide_AMLCFT_2ndSupplement.pdf
construção de um modelo de cooperação entre agências capaz de gerenciar esses riscos de 
forma permanente e eficaz. 
São conhecidas as enormes facilidades operacionais para a atuação de 
organizações terroristas na região, como a extensa e crescente presença do crime 
organizado e as fronteiras porosas por onde fluem continuamente drogas, armas e outros 
produtos e serviços ilícitos. Embora o crime organizado e o terrorismo sejam fenômenos 
distintos, conectam-se constantemente nouso comum da mesma cadeia logística de 
serviços ilegais. 
A literatura acadêmica mais aplicada que se dedica a avaliar as respostas dos 
governos ao terrorismo destaca o desafio da coordenação entre agências e o controle de 
fatores facilitadores (CLUTTERBUCK, 1986; FORST, 2009; ENGLISH, 2009). A agenda 
derivada dessas reflexões pode ser resumida nas seguintes cinco etapas: (1) identificar 
fatores causais e dos agentes facilitadores em cada contexto específico (redes de apoio, 
ativos financeiros utilizados, relações com o crime organizado, etc.); (2) evitar a 
militarização excessiva da resposta; (3) reconhecer a inteligência como o elemento mais 
importante para orientar as ações de contraterrorismo; (4) desenvolver uma infraestrutura 
legal que respeite as características dos regimes jurídicos construídos democraticamente; 
(5) coordenar as medidas preventivas de segurança, controle de ativos e segurança 
cibernética. 
Os grupos terroristas organizam-se à semelhança de organizações criminosas, 
interessados na criação ou na exploração de um ambiente operacional hospitaleiro. A 
maioria dos atentados promovidos por grupos terroristas exige uma intensa cooperação 
entre seus integrantes e fornecedores de bens e serviços logísticos, quase sempre de 
natureza ilícita. As armas utilizadas nos atentados de novembro de 2015 em Paris, por 
exemplo, segundo os resultados das investigações já divulgados, foram compradas pelos 
terroristas de ​dealers​ que atuam no mercado ilegal de armas na Europa. 
O monitoramento dos recursos que sustentam financeiramente os grupos 
terroristas é outra frente que demanda atenção e pode ser considerada de grande 
complexidade pela forma como o ilícito e a economia formal se articulam. Sob a 
perspectiva da atividade de controle, o ponto crítico é garantir a atuação interdisciplinar 
 
 
(policiais, fiscais aduaneiros, agentes de imigração, membros do Ministério Público, 
economistas e analistas de risco, dentre outros) e uma forte rede de colaboração 
público-privada para a construção de indicadores que permitam monitorar os fluxos 
financeiros suspeitos (KEENE, 2012). Para que esse monitoramento seja viável, torna-se 
essencial levar em consideração a transnacionalidade desse fenômeno, o que impõe a 
ampliação da atuação dos órgãos nacionais para além das suas fronteiras, bem como a 
criação de instituições internacionais e regionais como o Grupo de Ação Financeira contra 
a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo (GAFI). 
 
8 Comentários finais 
 
Perguntas-chave para a seção: 
Quais são os resultados esperados das políticas de enfrentamento ao crime organizado? 
Como as instituições de diferentes países cooperam? 
 
O enfrentamento operacional do crime organizado na região e a mensuração do 
impacto das iniciativas em curso dependem fundamentalmente de um crescente esforço de 
integração entre agentes públicos situados em diferentes níveis de governo. 
Embora as polícias de vários países da região tenham demonstrado capacidades de 
reduzir as taxas dos crimes mais graves de forma significativa ao longo da última década 
(como foi o caso das principais cidades dos EUA, Colômbia e de alguns estados do Brasil), 
resta ainda o desafio representado pela presença e pelo aumento da atuação do crime 
organizado na região a ser superado. 
Uma das tarefas práticas mais urgente nessa área envolve a construção de sistemas 
de informação compartilhados e o desenho de indicadores que permitam minimamente 
avaliar a incidência do problema e os resultados obtidos por meio das políticas públicas 
adotadas. 
Em segundo lugar, o enfrentamento dos reflexos das atividades ilícitas globais 
impõe aos países a necessidade de atuar internacionalmente em prol de uma agenda que 
transcenda os esforços hoje limitados à produção de normas internacionais, mas que avance 
 
 
na direção do desenvolvimento de estruturas capazes de viabilizar um novo modelo de 
cooperação internacional. 
Os principais documentos internacionais relacionados com os mercados ilícitos 
globais – notadamente as Convenções de Viena contra o Tráfico de Drogas, de Palermo 
contra o Crime Organizado Transnacional e de Mérida contra a Corrupção – reconhecem a 
cooperação como fundamento, mas também como instrumento essencial para a efetivação 
dos compromissos. No entanto, esses mesmos documentos não são acompanhados de 
procedimentos e protocolos relacionados à implantação e ao monitoramento da execução 
dos compromissos assumidos. 
Nesse sentido, deve-se considerar que a expressão “cooperação jurídica 
internacional”, a qual inclui a ação das polícias, abrange outros termos como “assistência”, 
“ajuda” ou “auxílio mútuo internacional” – todas equivalentes entre si. A amplitude da 
expressão abrange o intercâmbio não somente entre órgãos judiciais, mas também entre 
órgãos judiciais e administrativos dos Estados – notadamente as instituições policiais. 
Importante destacar que a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 
dispõe, no seu preâmbulo, que o respeito universal aos direitos e liberdades fundamentais 
da pessoa e a observância desses direitos e liberdades têm como base a cooperação dos 
Estados. Nesse ponto, cabe destacar que a proteção dos direitos humanos não pode ser 
considerada um obstáculo para a cooperação jurídica internacional, mas o caminho para 
reforçar as normas jurídicas, de modo que os Estados façam prevalecer as suas obrigações 
de respeito aos direitos humanos, recusando a assistência, impondo condições ao outro 
Estado envolvido, ou buscando entendimento quanto ao interesse das pessoas envolvidas. 
Isso significa dizer que, no processo de elaboração de novos instrumentos de cooperação 
internacional em matéria penal, os Estados devem se atentar para a definição e a proteção 
dos direitos individuais na aplicação desses instrumentos. Em outras palavras, quanto maior 
o esforço de incorporação e concretização do padrão normativo universal dos direitos 
humanos, menor a resistência, maiores a fluidez e a segurança no relacionamento. 
A transnacionalidade do crime organizado e seu crescente impacto na segurança da 
região exigem uma resposta coordenada dos países. Essa resposta envolve a cooperação por 
meio de marcos jurídicos homogêneos, a capacidade de produzir e trocar informações sobre 
 
 
a ação do crime organizado, a capacidade de desenvolver inteligência prospectiva para se 
antecipar às ações do crime organizado e a capacidade de cooperar e coordenar 
investigações entre diferentes jurisdições. 
A partir do mapeamento apresentado, é possível reconhecer nos esforços de 
cooperação internacional a principal tendência para o enfrentamento dos mercados ilícitos 
globais. Do ponto de vista dos interesses criminosos, a expansão das economias no plano 
global e o crescimento das atividades ilícitas para além das fronteiras de um determinado 
país são estímulos a maiores ganhos ilegais, à existência de diversidade de grupos e 
produtos, à corrupção e à cooptação do poder político, à lavagem de dinheiro e à formação 
de alianças criminosas

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