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PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DO ENSINO LÚDICO (1)

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PRÁTICAS PEDAGÓGICAS 
DO ENSINO LÚDICO
Autora: Mariana De Bastiani Lange
Programa de Pós-Graduação EAD
UNIASSELVI-PÓS
 Reitor: Prof. Hermínio Kloch
 Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol
 Coordenador da Pós-Graduação EAD: Prof. Norberto Siegel
 Equipe Multidisciplinar da 
 Pós-Graduação EAD: Profa. Bárbara Pricila Franz
 Profa. Cláudia Regina Pinto Michelli
 Prof. Ivan Tesck
 Profa. Kelly Luana Molinari Corrêa
 Revisão de Conteúdo: Profa. Fernanda Germani de Oliveira Chiaratti
 Revisão Gramatical: Profa. Iara de Oliveira
 Revisão Pedagógica: Profa. Bárbara Pricila Franz
 Diagramação e Capa: Centro Universitário Leonardo da Vinci
370.115
L274p Lange, Mariana De Bastiani
 Práticas pedagógicas do ensino lúdico/ Mariana De 
 Bastiani Lange. Indaial: UNIASSELVI, 2015.
 108 p. : il.
 ISBN 978-85-69910-08-4
 1. Pedagogia – saberes necessários à prática 
 educativa. I. Centro Universitário Leonardo da Vinci. 
CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito
Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC
Fone Fax: (047) 3281-9000/3281-9090
Copyright © UNIASSELVI 2015
Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri
 UNIASSELVI – Indaial.
CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito
Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC
Fone Fax: (047) 3281-9000/3281-9090
Copyright © UNIASSELVI 2015
Ficha catalográfi ca elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri
 UNIASSELVI – Indaial.
M ariana De Bastiani Lange
Psicanalista, membro da Associação 
Psicanalítica de Porto Alegre/RS, graduada 
em Psicologia (UNIJUÍ), mestre e doutora em 
Literatura (UFSC), coordenadora de Ofi cinas de 
Escrita (adulto e infantil), professora do Projeto de 
Educação Comunitária Integrar em Florianópolis/
SC. Atua há mais de dez anos na clínica psicanalítica 
(adulto e infantil). Tem experiência em cursos de 
formação continuada para professores e atua como 
docente em cursos de Pós-Graduação (lato sensu) na 
área da Educação. Ministra cursos na área de Psicologia 
e Educação. Pesquisa sobre memória, escrita e laço 
social. Organizadora dos seguintes livros: “Escrita e 
Psicanálise II” (2008), “Fragmentos: escritos de vida em 
ofi cina de escrita” (2010) e “Literatura e Ensino: memória 
de nossos nós” (2015). Possui artigo publicado nos 
seguintes livros: “Interfaces em psicanálise e escrita” 
(2008), “A escrita como experiência de passagem” 
(2012), entre outros. Publicou na Revista Criação 
& Crítica – USP, o artigo “Concedamos a liberdade 
de traçar: brincando de escrever um Dicionário de 
Palavras Inventadas na Ofi cina de Escrita” (2011) 
e, na Revista Conjectura: Filosofi a e Educação – 
UCS, o artigo “Caminhares: fragmentos sobre 
ofi cinas de escrita e interrogações sobre os 
ensinares e os aprenderes” (2011).
Sumário
APRESENTAÇÃO ......................................................................7
CAPÍTULO 1
A Ludicidade e a Prática Interdisciplinar ............................ 9
CAPÍTULO 2
O Desenho Infantil ............................................................... 27
CAPÍTULO 3
A Literatura e a Ludicidade ................................................. 47
CAPÍTULO 4
A Matemática e a Ludicidade ................................................ 73
CAPÍTULO 5
Os Brinquedos e as Brincadeiras ...................................... 93
7
APRESENTAÇÃO
Caro(a) pós-graduando(a):
Você está aqui porque algo despertou em você o desejo de chegar mais 
perto e explorar os caminhos do lúdico na educação. A troca que faz com que 
professores e estudantes encontrem um viés de divertimento nas práticas 
cotidianas é fomentada pela disponibilidade em retomar a criança que um dia 
fomos.
Com isso em mente, vamos começar essa nossa caminhada tratando da 
ludicidade e suas relações com a interdisciplinaridade. Campo de estudos e 
práticas interdisciplinares serão esmiuçados no Capítulo 1 deste material. Em 
seguida, tomando o desenho como um momento privilegiado para vivenciar os 
limites e efeitos da ludicidade nas práticas com crianças, teremos o Capítulo 
2, procurando mostrar as implicações subjetivas do desenhar na vida psíquica 
infantil e na postura do professor diante das produções da criança.
Para chegar ainda mais perto do universo da fantasia infantil, temos o 
Capítulo 3, que traz a literatura para a roda. Com as diversas práticas ligadas ao 
mundo literário abriremos um leque de possibilidades para trabalhar fantasia e 
ludicidade com as crianças em sala de aula. Seguindo, a matemática não fica por 
menos: no Capítulo 3 será possível encontrar caminhos encantadores pelos quais 
a matemática se conecta com a brincadeira e com o divertimento. 
Nesse ínterim, para encerrar esse percurso, o Capítulo 5 trata dos jogos e 
das brincadeiras. Deste modo, salientando o que está em questão nos jogos, nas 
brincadeiras coletivas e nas brincadeiras individuais, são apontadas as melhores 
maneiras de organizar o espaço escolar e as propostas de jogos e outras formas 
de interações lúdicas. 
Lembre-se: para trabalhar com ludicidade é imprescindível assumir o desejo 
de lançar-se, deixar-se levar pelo encantamento, pelas brincadeiras já esquecidas, 
pelos desafios dos jogos. Sendo assim, sem mais delongas, primeiro passo dado, 
vamos avançar na jornada?
A autora.
CAPÍTULO 1
A Ludicidade e a 
Prática Interdisciplinar
A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes 
objetivos de aprendizagem:
  Reconhecer a importância do lúdico no processo de aprendizagem.
  Compreender a ludicidade na prática pedagógica.
11
 A LUDICIDADE E A PRÁTICA INTERDISCIPLINAR Capítulo 1 
ConteXtualiZaÇÃo
A sociedade já começou a tomar consciência 
de que é preciso outra vez estimular o lado ludens 
de uma população tão faber.
Luiz Octávio de Lima Camargo
Desde o nascimento até os seis anos de idade a criança percorre rapidamente 
aquilo que a humanidade levou milênios para conseguir atingir: o bebê começa 
brincando com as próprias mãozinhas e aos poucos vai coordenando seus 
movimentos, realizando gestos com intenção e precisão. Progressivamente, 
aprende a interagir com os outros, vai construindo alicerces para a compreensão 
e a utilização de sistemas simbólicos do desenho até a escrita. Desenvolve a 
autonomia, a habilidade de perceber, criar e estabelecer laços afetivos e durante 
todo este processo a brincadeira é uma das atividades centrais da vida das crianças. 
Podemos dizer que o brincar ocupa um espaço privilegiado na vida do 
ser humano desde o nascimento até a idade adulta. Na brincadeira de faz-de-
conta, uma sequência de ações nas quais a imaginação é a atração principal, 
a criança vivencia experiências de cunho simbólico que propiciam o esboço 
de compreensões para lidar com situações da vida. No jogo, aprende a viver 
socialmente, respeitar as regras, cumprir as normas, esperar a sua vez e interagir 
de forma mais organizada. Assim, a brincadeira permite a exploração do potencial 
criativo da criança, fundamental no processo de aprendizagem. 
Dessa maneira, é muito frequente ouvirmos falas que elogiam e apoiam a 
importância do lúdico na aprendizagem, mas que ao mesmo tempo reconhecem 
a falta da ludicidade nas salas de aula e a difi culdade para vivenciar atividades 
lúdicas. Recentemente, no Brasil, com o ingresso das crianças de seis anos no 
primeiro ano e a ampliação para nove anos no Ensino Fundamental, os aspectos 
relacionados ao tema fi caram ainda mais evidentes. De acordo com as orientações 
do Ministério da Educação – MEC no que se refere à inclusão da criança de seis 
anos de idade no Ensino Fundamental de nove anos:
[...] este é o momento de recolocarmos no currículo dessa 
etapa da educação básica o brincar como um modo de ser 
e estar no mundo; o brincar como uma das prioridades de 
estudo nos espaços de debates pedagógicos, nos programas 
de formação continuada, nos tempos deplanejamento; o 
brincar como uma expressão legítima e única da infância; o 
lúdico como um dos princípios para a prática pedagógica; a 
brincadeira nos tempos e espaços da escola e das salas de 
aula; a brincadeira como possibilidade para conhecer mais as 
crianças e as infâncias que constituem os anos/séries iniciais do 
ensino fundamental de nove anos (BRASIL, 2007, p. 10).
1212
 Práticas Pedagógicas do Ensino Lúdico
Assim, partindo do princípio de que o brincar faz parte de modo incisivo na 
constituição de uma criança, este capítulo apresenta a importância da ludicidade, 
discutindo alguns conceitos fundamentais para a compreensão da ludicidade nos 
processos de aprendizagem e nas práticas interdisciplinares. Nos subcapítulos 
seguintes você será convidado a entrar na ciranda da vivência lúdica e refl etir 
sobre outros temas inerentes ao desenvolvimento infantil e ao processo de 
aprendizagem envolvendo as práticas lúdicas.
O que É Ludicidade?
O lúdico tem sua origem na palavra “ludus”, que vem do latim e 
quer dizer jogo. A palavra recebeu as pinceladas do tempo e passou 
a ter um sentido mais amplo, fazendo parte da atividade humana e 
caracterizando-se por ser uma experiência prazerosa. Assim, podemos 
dizer que lúdico signifi ca brincar, e neste brincar estão incluídos 
os jogos, os brinquedos e as brincadeiras. O lúdico também está 
relacionado com a conduta daquele que joga, que brinca, que se diverte 
e ainda pode se referir às atividades prazerosas. 
Quando falamos em ludicidade, logo temos em mente o brinquedo, 
a brincadeira, a fantasia, o jogo, a dança, a música, a arte, o teatro. 
Quando pensamos em um ambiente lúdico surge a imagem de uma 
brinquedoteca, uma loja de brinquedos, um parque de diversões, uma 
praça, um circo. Uma pessoa com características lúdicas remonta 
alguém que brinca – o artista, o mágico, o palhaço. 
A ludicidade pode ser abordada tomando diferentes contextos: a história, o 
social, o cultural. Estudioso do tema, Luckesi (2005) aborda a ludicidade como um 
fenômeno interno do sujeito, uma vivência interior, uma experiência prazerosa. 
Mas esta vivência só poderá ser considerada lúdica quando propiciar ao sujeito a 
plenitude da experiência. 
Luckesi (2005) levanta alguns questionamentos que nos 
interessam também:
• O que é a atividade lúdica para o sujeito que a vivencia?
• E, enquanto vivenciada, que efeitos essa experiência lhe produz?
Para Luckesi (2005) a ludicidade refere-se àquelas atividades que 
• O que é a 
atividade lúdica 
para o sujeito que a 
vivencia?
• E, enquanto 
vivenciada, que 
efeitos essa 
experiência lhe 
produz?
Lúdico signifi ca 
brincar, e neste 
brincar estão 
incluídos os jogos, 
os brinquedos e 
as brincadeiras. 
O lúdico também 
está relacionado 
com a conduta 
daquele que joga, 
que brinca, que 
se diverte e ainda 
pode se referir 
às atividades 
prazerosas.
13
 A LUDICIDADE E A PRÁTICA INTERDISCIPLINAR Capítulo 1 
propiciam experiências de plenitude, quando o sujeito utiliza-se ali de sua atenção 
plena e participa verdadeiramente daquela atividade. Nessa perspectiva, uma 
atividade lúdica signifi ca uma ação que tem como objetivo produzir prazer na sua 
execução, ou seja, divertir o praticante, que por sua vez, vive aquele momento 
com uma entrega total. 
Mas não é tão simples quanto possa parecer. Camargo (1998), no livro 
intitulado Educação para o lazer, ressalta que poucas noções são vítimas de tanto 
preconceito quanto o lúdico. O autor lista alguns desses preconceitos presentes 
em nossa sociedade e que acabam se fazendo presentes, de um modo ou de 
outro, na implementação de práticas lúdicas:
• Primeiro preconceito: diversão é preocupação de ricos;
• Segundo preconceito: o trabalho é mais importante do que o 
lúdico;
• Terceiro preconceito: a diversão atrapalha o trabalho, o dever;
• Quarto preconceito: trabalhar é difícil, divertir-se é fácil. 
(CAMARGO, 1998, p. 16).
Com isso constata-se que não é sem ressalvas que o lúdico se insere em 
nossa sociedade. É difícil ser homo faber (o artífi ce que fabrica instrumentos) e 
homo ludens (o homem que joga) ao mesmo tempo, quando vivemos cercados 
de pre(con)ceitos que indicam que nada pode ser mais importante que o dever 
e a disciplina. O tratamento dado à diversão é questionável, uma vez que a 
improdutividade não tende a ser um valor em destaque nos tempos atuais e, 
mesmo assim, assume-se como importante incentivar a ludicidade 
nas escolas. 
O homo ludens é receptivo ao ambiente, é “relaxado”, é – sim – 
“improdutivo” (CAMARGO, 1998, p. 22-23). Isso não signifi ca dizer 
que o lúdico não possa trazer inúmeros efeitos e implicações da maior 
importância, como veremos a seguir. Aliás, o homo ludens é o primeiro 
a surgir na constituição psicológica humana, antes do faber. Então, 
conclui-se, que as características lúdicas não impedem que advenham 
as qualidades necessárias ao trabalho.
Os momentos nos quais a criança cria desenvoltura no universo 
da fantasia, da brincadeira e dos jogos servirão como alicerce para 
que esse ser em constituição possa perceber a si mesmo e também se 
organizar em relação a diversas situações. A importância da ludicidade 
e do prazer nas atividades com as quais a criança se envolve reside 
no fato de que, por meio dessas ações, a criança fi ca à vontade para 
experimentar e conhecer suas compreensões e reações diante das 
propostas e do convívio com um grupo. 
Os momentos nos 
quais a criança cria 
desenvoltura no 
universo da fantasia, 
da brincadeira e 
dos jogos servirão 
como alicerce 
para que esse ser 
em constituição 
possa perceber a si 
mesmo e também 
se organizar em 
relação a diversas 
situações.
O homo ludens é 
o primeiro a surgir 
na constituição 
psicológica humana, 
antes do faber.
1414
 Práticas Pedagógicas do Ensino Lúdico
O trato lúdico das atividades rotineiras ex(er)cita as possibilidades 
criativas e oferece espaço para que seja encenado o conteúdo 
das fantasias do mundo infantil. Essas fantasias vão apontando, 
naturalmente, os estados emotivos vividos pela criança nos diferentes 
momentos do seu desenvolvimento: medo, segurança/insegurança, 
sensação de conquista frente a um objetivo, solidão, inserção em um 
grupo, entre outros. 
Sugestão de leitura: CAMARGO, Luiz Octávio de Lima. 
Educação para o lazer. São Paulo: Aleph, 1998. 
A infância é vivida na escola entremeada com as direções 
apontadas pelo ensino formal: existem conteúdos a serem 
observados, mas o modo como este conteúdo é apresentado à 
criança provoca – ou não – certos efeitos. O modo como o professor 
acolhe o fantasiar da criança e propõe interações e signifi cados deixa 
marcas na criança e, por isso, a ludicidade é tema de relevantes 
estudos na área da educação. 
A escola pode e deve ser um território de incentivo à fantasia e ao 
mundo criativo. Saber acolher e conduzir os devaneios infantis, bem 
como providenciar meios para elaborar essa atividade imaginativa 
de modo que uma cena se organize (incluindo e situando o lugar de 
cada criança no todo), é nortear uma prática pedagógica alinhada com 
os preceitos indicados pelo MEC: o brincar como um modo de ser e 
estar no mundo, prioridade nos espaços educacionais, legitimando e 
conhecendo, assim, as infâncias que ali se apresentam.
Deste modo, as atividades lúdicas na prática escolar são: 
• atividades elaboradas de maneira que o estudante possa realizar 
a tarefa de forma prazerosa; 
• atividades em que haja valorização da situação vivenciada e não 
somente do resultado ou do produto fi nal;
• ações que possibilitem momentos de encontro consigo mesmo e 
com o outro, momentos de exercitar a fantasia, momentos de criatividade, 
de conhecimento, de ressignifi cação, de percepção e de expressividade. 
Deste modo, as 
atividades lúdicas 
na prática escolar 
são: 
• atividades 
elaboradas de 
maneira que o 
estudante possa 
realizar a tarefa de 
forma prazerosa; 
• atividades em que 
haja valorizaçãoda 
situação vivenciada 
e não somente do 
resultado ou do 
produto fi nal;
• ações que 
possibilitem 
momentos de 
encontro consigo 
mesmo e com o 
outro, momentos 
de exercitar a 
fantasia, momentos 
de criatividade, de 
conhecimento, de 
ressignifi cação, de 
percepção e de 
expressividade. 
O trato lúdico 
das atividades 
rotineiras ex(er)cita 
as possibilidades 
criativas e oferece 
espaço para que 
seja encenado 
o conteúdo das 
fantasias do 
mundo infantil.
15
 A LUDICIDADE E A PRÁTICA INTERDISCIPLINAR Capítulo 1 
No livro intitulado “No mundo da brincadeira: jogo, brinquedo e cultura na 
educação infantil” a professora Mônica Fantin (2000) repensa o brincar e destaca: 
“na brincadeira de faz-de-conta, a criança ao imitar o comportamento de adultos 
vai antecipando vivências de um mundo que não é seu, e nos jogos tradicionais vai 
entrando em contato com diversos elementos da cultura” (FANTIN, 2000, p. 26). A 
autora lembra que “Platão já comentava a importância de ‘aprender brincando’ em 
oposição à utilização da violência e da opressão, e Aristóteles sugeria que para 
educar crianças os jogos deveriam imitar atividades sérias de ocupação adulta 
como forma de preparo para a vida adulta” (FANTIN, 2000, p. 32). 
Um dos desafi os, hoje, seria reposicionar o lugar do brincar e 
do fantasiar na vida da criança em uma sociedade na qual existem 
os direitos da criança, garantidos pelo Estatuto da Criança e do 
Adolescente, ao mesmo tempo em que a muitas dessas crianças é 
negado o direito à brincadeira, pois são colocadas prematuramente 
no mundo do trabalho, perdendo, assim, o direito a essa condição 
fundamental para o desenvolvimento infantil e para a construção de 
condições subjetivas. O prazer em conhecer, essencial nas questões 
de aprendizagem, resulta do modo como essas relações vão se 
construindo no universo subjetivo da criança, deixando marcas e 
estabelecendo alguns padrões.
E qual a importância da ludicidade em sua relação com a 
subjetividade? Bem, a subjetividade se refere a todo o arcabouço 
constituído por experiências que vão deixando marcas e moldando o 
entendimento de vida de uma pessoa. O modus vivendi, a maneira 
de operar de cada um, resulta de uma série de marcas subjetivas, 
que norteiam as modalidades de exercício da condição humana, 
destacando preferências e designando possibilidades e difi culdades. 
Sendo assim, a ludicidade constitui muito mais do que um 
divertimento ou um fazer ligado ao brincar. A ludicidade envolve 
fantasias, objetos, ações e signifi cados. O lúdico é o lugar da 
socialização e do exercício da invenção e da decisão. É no fazer 
lúdico que vai sendo lapidado o modo de administrar a relação com 
o outro, por isso, a ludicidade como prática deve estar em foco na 
ação pedagógica.
O Fantasiar na InfÂncia
A fantasia, desde os tempos do pai da psicanálise Sigmund 
Freud, ganhou holofotes ao enfatizar acontecimentos do psiquismo 
Sendo assim, a 
ludicidade constitui 
muito mais do que 
um divertimento ou 
um fazer ligado ao 
brincar. A ludicidade 
envolve fantasias, 
objetos, ações e 
signifi cados. O 
lúdico é o lugar 
da socialização 
e do exercício da 
invenção e da 
decisão. É no fazer 
lúdico que vai sendo 
lapidado o modo de 
administrar a relação 
com o outro, por 
isso, a ludicidade 
como prática deve 
estar em foco na 
ação pedagógica.
O prazer em 
conhecer, essencial 
nas questões de 
aprendizagem, 
resulta do modo 
como essas 
relações vão se 
construindo no 
universo subjetivo 
da criança, 
deixando marcas 
e estabelecendo 
alguns padrões.
1616
 Práticas Pedagógicas do Ensino Lúdico
humano que têm fundamental importância na constituição da identidade de um 
sujeito. Muito além de uma ação que alimenta a imaginação e outros aspectos 
ligados ao infantil, o fantasiar é visto pelas áreas “psi” com muita seriedade, afi nal, 
representa algo importante na constituição da nossa psiquê.
Em um estudo sobre a fantasia e o seu papel de agente intermediário entre 
o princípio do prazer e o princípio de realidade, espécies de balizas do nosso 
psiquismo, o psicanalista Juan-David Nasio (2007) explica que a fantasia é um 
dos fenômenos mais espantosos da vida psíquica. Ele refere a fantasia 
como sendo “uma fábula interior”, um “pequeno romance de bolso” que 
carregamos conosco ainda depois na vida adulta, formatando nossas 
modalidades de amar e de sofrer (NASIO, 2007, p. 9). 
O fantasiar na criança se dá privilegiadamente por meio das 
experiências lúdicas e como estas são conduzidas. Deste modo, 
o fantasiar na infância designa os caminhos que irão pautar as 
modalidades dos laços afetivos de um sujeito. Há muita coisa pairando 
na cena da infância: os medos (medo do abandono, por exemplo), 
as incertezas, o não saber (e a imagem do adulto que sabe), a falta 
de compreensão do mundo adulto, as expectativas, etc. Tudo isso se 
torna material envolvido no fantasiar e, por conseguinte, aparece com 
frequência nas brincadeiras das crianças.
E por que fantasiar? Para dar conta dos medos e desejos que 
agitam os interiores, oportunizando encenações relevantes para os 
arranjos do psiquismo. O fantasiar infl uencia o comportamento – 
mesmo sem consentimento –, ainda que não se reconheça de imediato 
essa intromissão. Na criança, as fantasias modelam a realidade por ela 
percebida, bem como guiam suas interpretações e leituras de mundo. A 
criança, ao brincar, lida com suas expectativas e também com a magia 
de interagir com o mundo que a cerca.
Vejam o alcance disso: a própria noção de “eu”, constituída na 
infância, é pautada pelos efeitos da fantasia. Nas palavras de Nasio 
(2007, p. 79): “[...] para dominar o perigo encerrado na pergunta ‘quem 
sou eu?’, o sujeito extrai de sua própria substância corporal o suporte 
imaginário para constituir a fantasia”. O fantasiar não apenas oferece 
uma imagem como faz parte de um agir. Essa montagem fundamental, 
cujos contornos se organizam na infância e na relação com o outro, 
será remontada mais tarde na vida adulta. Esses momentos de 
encenação da fantasia na infância (o que inclui momentos de desafi o, 
medo, vitória, superação, etc) poderão formar padrões para toda a vida.
Eis o destaque da cena do brincar na constituição psíquica: 
O fantasiar na 
criança se dá 
privilegiadamente 
por meio das 
experiências lúdicas 
e como estas são 
conduzidas. Deste 
modo, o fantasiar 
na infância designa 
os caminhos que 
irão pautar as 
modalidades dos 
laços afetivos de 
um sujeito.
E por que fantasiar? 
Para dar conta 
dos medos e 
desejos que agitam 
os interiores, 
oportunizando 
encenações 
relevantes para 
os arranjos 
do psiquismo.
Na cena da 
brincadeira, guiada 
pela fantasia, 
limites com o 
outro vão sendo 
delineados e 
éticas vão sendo 
esboçadas.
17
 A LUDICIDADE E A PRÁTICA INTERDISCIPLINAR Capítulo 1 
o eu e o outro vão criando consistência nessa relação. Na escola, em meio às 
aprendizagens, a cena lúdica permite explorar essa temática, ofertando suporte 
para que a criança se aproprie do seu corpo e do seu lugar discursivo (um lugar 
desde o qual ela possa falar de si e encontrar possibilidades de enunciação). 
Na cena da brincadeira, guiada pela fantasia, limites com o outro vão sendo 
delineados e éticas vão sendo esboçadas. 
As formulações do fantasiar na criança tomam rumos imprevistos – daí a 
importância do educador ter conhecimento sobre o alcance da ludicidade e suas 
possíveis infl uências nas matrizes que marcarão os caminhos de uma criança. 
Por exemplo, ao brincar de casinha a criança pode querer assumir diferentes 
papéis: ela pode buscar nas fi guras familiares modos de agir, parecendo-se com 
o pai ou com a mãe, ou então diferindo destes, mostrando uma postura mais frágil 
ou mais poderosa. 
O fato dessa variedade de possibilidades estarem abertas à 
criança permite que ela se experimente. O “fazer de conta” autoriza 
isso. Os enredos do faz-de-conta permitem trocas depapéis, ajustes e 
recomeços, auxiliando a vida da criança e servindo como baliza ainda 
por muito tempo.
As montagens imaginárias do infantil terão vez nas vivências e 
narrativas produzidas pelas práticas lúdicas. A relevância deste espaço 
deve ser observada a fi m de garantir que haja o exercício cotidiano 
do fantasiar, pois ali estão sendo inscritas as bases da formação da 
identidade e da memória. 
Vejamos: 
Nossa identidade íntima e atemporal, a mais 
irredutível unidade de si mesma, o “Eu sou” 
mais profundo e permanente, tem sempre o 
aspecto de um garotinho ou uma garotinha, bebê 
ou já andando, até maior, que está no centro de uma cena 
imaginária representada incessantemente ao longo de nossa 
vida (NASIO, 2007, p. 18).
Ou seja, nossa vida adulta se baseia em resquícios de um outro tempo, a 
infância, quando montamos essa cena imaginária que nos acompanhará e se fará 
presente diante dos obstáculos e realizações da vida adulta. Aquela imagem da 
“criança que deixamos para trás”, na verdade, não fi ca tão para trás assim, pois 
nos acompanha e segue sendo representada de outras maneiras ao longo de 
uma existência.
A memória, em sua relação com o fantasiar infantil, carrega restos deste 
As montagens 
imaginárias do 
infantil terão vez 
nas vivências 
e narrativas 
produzidas pelas 
práticas lúdicas. A 
relevância deste 
espaço deve ser 
observada a fi m de 
garantir que haja o 
exercício cotidiano 
do fantasiar, pois 
ali estão sendo 
inscritas as bases 
da formação da 
identidade e 
da memória.
1818
 Práticas Pedagógicas do Ensino Lúdico
tempo que, na verdade, nunca passa por completo. Freud havia percebido isso 
ao teorizar sobre a fantasia e seu papel nas neuroses adultas: não é tão simples 
separar realidade e fi cção quando esta é investida psiquicamente, tendo valor de 
verdade para o sujeito. Cenas são criadas na fantasia e constituem uma espécie 
de “realidade psíquica”. Mesmo com o passar do tempo cronológico, o tempo 
subjetivo guarda e atualiza essa realidade psíquica. E, assim, é constituída a 
nossa memória, inevitavelmente permeada por fantasias, resquícios e marcas 
que permanecem. 
E essas marcas deixam registro inclusive na dinâmica inconsciente. 
Por essa razão, nos tratamentos de casos envolvendo questões 
traumáticas, a brincadeira faz parte da sessão de atendimento como um 
poderoso instrumento de trabalho. Isso porque o brincar coloca em cena 
as problemáticas enfrentadas pela criança, acontecimentos vinculados 
ao prazer e ao desprazer, elaborando, assim, registros e signifi cados.
Na criança um esboço de espaço subjetivo se dá com a 
inauguração das oposições simbólicas ausência/presença e dentro/
fora, marcadas por meio de experiências de prazer e desprazer. Esta 
diferença estabelece noções cruciais que irão marcar a pulsação do 
tempo na vida subjetiva do sujeito. 
A lógica temporal rege o manejo da memória. Dessa forma, é a relação entre 
a marca inscrita e passagem do tempo que estabelece os traçados da memória. 
O fi lósofo Jacques Derrida, dedicado leitor da obra freudiana, afi rma que uma 
lembrança “pode somente se lembrar, fabulosamente, aquém da memória, 
como todo livro se ocupa do que revém de mais longe do que a origem simples” 
(DERRIDA, 2007, p. 412-413). Lembrar fabulosamente; talvez nem seja possível 
lembrar de outra maneira que não “fabulosamente”. 
Podemos então afi rmar que a fantasia, essa “fábula interior” 
– ou “pequeno romance de bolso”, nas palavras de Nasio (2007, p. 
9) – não deixa de nos acompanhar. Nossa história não é exatamente 
uma linha reta, e sim, é composta por movimentos de retomada e 
ressiginifi cações constantes.
As experiências da memória, do fantasiar e de identifi cação com o 
si mesmo estão imbricadas, experiências estas que são essencialmente 
temporais e apontam para o pressuposto de que há um outro em jogo. 
Situando o eu torna-se possível contar (a alguém) uma história, e nisso 
consiste o endereçamento.
O eu é uma fi cção, uma fi cção compartilhada, afi rmada mediante o 
reconhecimento do outro. A psicanalista Ana Costa (1998), autora do livro “A fi cção 
 Nossa história 
não é exatamente 
uma linha reta, e 
sim, é composta 
por movimentos 
de retomada e 
ressiginifi cações 
constantes.
O brincar coloca 
em cena as 
problemáticas 
enfrentadas 
pela criança, 
acontecimentos 
vinculados 
ao prazer e 
ao desprazer, 
elaborando, 
assim, registros e 
signifi cados.
19
 A LUDICIDADE E A PRÁTICA INTERDISCIPLINAR Capítulo 1 
do si mesmo”, destaca que “a fi cção é o que dá suporte ao corpo, amparando-o 
num circuito de relações, num circuito de identidades” (COSTA, 1998, p. 121). A 
“identidade”, inscrita com o aval do outro, vem na esteira das artes da memória. 
Mais que isso, é preciso contar com a memória do outro para que se sustente, no 
eu, um sentimento de identidade com o qual se possa contar.
Vale lembrar as palavras da educadora Gloria Kirinus: “damos 
sentidos fantásticos ao nosso ser/estar no mundo, inventamos fábulas” 
(KIRINUS, 2011, p. 12). Deste modo, constatamos que há muito mais 
nas entrelinhas do que o que pode ser visto nas brincadeiras e nos 
arranjos imaginários produzidos na infância. Ao aprender a brincar 
a criança amplia o seu horizonte perceptivo, suas modalidades de 
criação/recriação e toma posse de um lugar a ser ocupado no mundo 
– um lugar desde o qual se possa agir em nome próprio.
Sendo assim, podemos concluir que o estilo é calcado na 
memória. Os traços que fazem de cada ser um ser único provém das 
confi gurações estabelecidas nas relações e no que estas propiciam 
como leituras de mundo.
Você consegue lembrar da sua própria infância e perceber 
a importância que os momentos de divertimento, os jogos e as 
brincadeiras tiveram na sua formação como pessoa?
Você percebe que as experiências lúdicas vividas na sua 
infância podem ter infl uenciado até mesmo o seu estilo de ensinar?
A Ludicidade e a 
Interdisciplinaridade
Vimos até aqui a relevância do estudo das práticas lúdicas e o 
seu alcance no campo de atuação da educação. É preciso observar 
que as práticas com teor lúdico traçam vizinhanças interessantes 
em suas perspectivas interdisciplinares. A ludicidade habita vários 
territórios, constituindo, portanto, uma concepção que toca várias 
áreas do conhecimento. 
Ao aprender a 
brincar a criança 
amplia o seu 
horizonte perceptivo, 
suas modalidades 
de criação/recriação 
e toma posse de um 
lugar a ser ocupado 
no mundo – um 
lugar desde o qual 
se possa agir em 
nome próprio.
A ludicidade habita 
vários territórios, 
constituindo, 
portanto, uma 
concepção que toca 
várias áreas do 
conhecimento.
2020
 Práticas Pedagógicas do Ensino Lúdico
As perspectivas interdisciplinares da ludicidade apontam para encontros: o 
universo social e cultural, as bases para o desenvolvimento das aptidões da leitura e 
da escrita, as artes e a sua pluralidade, o desejo de brincar e os aspectos psicológicos, 
enfi m, as possibilidades de expressão de um pequeno sujeito em constituição. Ser e 
estar no mundo, portanto, constituem-se por meio de vivências multifacetadas.
A criança, vivendo experiências com a linguagem, vai forjando seu próprio 
modo de ser e estar no mundo, ao mesmo tempo em que se reconhece, 
gradativamente, parte de uma articulação social. Esta, por sua vez, aponta 
valores, demanda comportamentos e circunscreve limites. As práticas lúdicas não 
estão isoladas, e sim, integradas ao que conhecemos como realidade. 
A ludicidade, no campo teórico, pode ser fragmentada por pesquisadores, no 
entanto, na prática, o que temos são fronteiras permeáveis. Vale lembrar que:
As disciplinas são necessárias. Devido a elas o homem criou 
muitas inovações verdadeiramente humanizadoras. Mas 
também criou outras tantas não tão humanizadoras. E quantas! 
Se a compartimentação do conhecimento em disciplinas ajudou 
o homem a progredir no domínio da natureza, a subdivisão 
exagerada em domínios e subdomíniosnão permite atender 
às questões mais radicais que o ser humano se coloca neste 
momento. (BRASIL, 2000, p. 40).
Em se tratando de inovações humanizadoras, vale observar que as artes são 
facilmente colocadas nas intersecções desses encontros interdisciplinares. Por 
meio do desenho, da contação de histórias, da literatura, da música e das artes 
cênicas o horizonte se amplia. É preciso inventar encontros, de modo que o efeito 
seja humanizador. Para o poeta Manoel de Barros (2008), entendedor das várias 
infâncias – enumerava: primeira infância, segunda infância, terceira infância –, a 
invenção é uma coisa que serve para aumentar o mundo e o ofício do educador é 
trabalhar por meio deste viés (BARROS, 2008). 
O próprio conceito de infância é lido de forma interdisciplinar, tomado por 
olhares diversos. O ponto em comum, ressaltado em inúmeros estudos, é a 
importância do fantasiar:
A infância é hiperbólica por natureza. Ela amplia, aumenta, 
com a lente da fantasia, do mundo fabuloso, o tempo e o 
espaço que lhe toca viver. O tempo é sempre agora. O ‘mais 
tarde’, ‘depois’, ‘no fi nal da semana’, ‘no próximo ano’, ‘no dia 
do aniversário’, são marcas temporais que existem de maneira 
clara no adulto. Não na criança. Para ela, o tempo é agora! [...] 
Infância é o tempo privilegiado do brincar, em que a natureza 
lúdica não está dissociada da natureza do trabalho (KIRINUS, 
2011, p. 33-34).
21
 A LUDICIDADE E A PRÁTICA INTERDISCIPLINAR Capítulo 1 
Na vivência da criança o trabalho está revestido do lúdico: trata-se de 
produzir/criar sem implicação com as noções de tempo e remuneração. Eis um 
ponto que desafi a o entendimento do adulto, afi nal, ele precisa se deslocar para 
conseguir ver como a criança valoriza coisas que na vida adulta deixam de ter 
valor prioritário.
Os educadores sensíveis à sua própria infância entendem que 
a interdisciplinaridade se faz presente em todos os temas infantis. E 
o que pode ser mais interdisciplinar que uma criança? A criança, ela 
própria, é agente interdisciplinarizador por excelência. Como lembra 
Kirinus (2011, p. 31), “criança quer fazer arte” e para isso utiliza tudo 
que tem: corpo, linguagem, imaginação, memória – e também o outro, 
que inevitavelmente entra nessa história. 
Seguindo por este caminho, é preciso indagar:
Como disciplinar a criança que se indisciplina e se 
transdisciplina, nos momentos que ela mais valoriza: o recreio, 
a folga do fi nal de semana, uma festa, onde se liberta do 
controle dos adultos? Como pedir para ela: ‘Uma coisa de cada 
vez’, se ela prima pela simultaneidade insólita, nos momentos 
que menos esperamos? De fato, atrair e conseguir a atenção 
da criança para aspectos abstratos, analíticos e específi cos 
do ensino tradicional, na sala de aula, não é tarefa fácil. Cabe 
ao professor sintonizar e descobrir, conforme o senso de 
oportunidade, na hora do aprender (que nem deveria ter hora, 
pois aprender é uma condição constante desde que estamos 
vivos), a maneira de facilitar a construção do conhecimento e 
da descoberta (KIRINUS, 2011, p. 31-32).
A educação deve constantemente rever o seu papel no sentido de valorizar a 
intuição, o imaginário e a sensibilidade das construções infantis. A transmissão do 
desejo de saber passa pelo educador e este, para que possa compreender o que 
a criança imagina, deve adotar uma postura interdisciplinar.
Ao longo deste caderno de estudos teremos contato com saberes diversos 
e seus desdobramentos lúdicos no ambiente educacional. Imagine dar aos 
conteúdos do currículo um tratamento lúdico; imagine revestir o trabalho com 
a ludicidade! Já imaginou como isso pode ser feito com a literatura, com a 
matemática e com outros saberes?
E o que pode ser 
mais interdisciplinar 
que uma criança? 
A criança, ela 
própria, é agente 
interdisciplinarizador 
por excelência.
2222
 Práticas Pedagógicas do Ensino Lúdico
A Atitude LÚdica no Processo de 
AprendiZaGem
 
Ressaltamos que a forma como o educador orienta a atividade 
é fundamental para torná-la lúdica, portanto, o planejamento é um 
forte instrumento do educador. Trata-se, sim, de diversão, mas não 
diversão apenas, e sim, diversão com intencionalidade. Outro aspecto 
imprescindível ao educador é a “atitude lúdica”, o que implica em 
sensibilidade, envolvimento, afetividade e criatividade. 
As intervenções que possam vir a acontecer neste sentido serão 
necessariamente (ou ao menos deveriam almejar esta perspectiva) 
interdisciplinares. A postura lúdica e interdisciplinar do educador diante 
de suas práticas junto ao público infantil deve ser tanto curiosa quanto 
responsável, amadurecida a ponto de poder estar junto com pares e 
propiciar trocas. O ambiente de trabalho, em alguns casos, permite 
(ou incentiva) a atuação por meio de projetos com o intuito de ser 
transformador em alguma medida, e essa facilidade deve ser explorada.
O currículo não determina o grau de porosidade que uma prática 
poderá ter. É preciso ter em si um pouco de ousadia a fi m de colocar 
em ação alguns desafi os para si mesmo enquanto educador. Para sair 
da trilha o entusiasmo é um ingrediente necessário e determinante. A 
atitude lúdica do educador o leva a trabalhar na perspectiva de viver, 
verdadeiramente, projetos de encontros.
Segundo Ivani Catarina Arantes Fazenda, no livro “Interdisciplinaridade: 
um projeto em parceria”, temos que:
A temática deste trabalho é a interdisciplinaridade; sua 
problemática é a interdisciplinaridade como atitude possível 
diante do conhecimento. Atitude de quê? Atitude de busca de 
alternativas para conhecer mais e melhor; atitude de espera 
perante atos não consumados; atitude de reciprocidade que 
impele à troca, ao diálogo com pares idênticos, com pares 
anônimos ou consigo mesmo; atitude de humildade diante 
da limitação do próprio saber; atitude de perplexidade ante 
a possibilidade de desvendar novos saberes; atitude de 
desafi o diante do novo, desafi o de redimensionar o velho; 
atitude de envolvimento e comprometimento com os projetos 
e as pessoas neles implicadas; atitude, pois, de compromisso 
de construir sempre da melhor forma possível; atitude de 
responsabilidade, mas sobretudo de alegria, de revelação, de 
encontro, enfi m, de vida (FAZENDA, 2014, p. 19).
O currículo não 
determina o grau 
de porosidade que 
uma prática poderá 
ter. É preciso ter 
em si um pouco de 
ousadia a fi m de 
colocar em ação 
alguns desafi os 
para si mesmo 
enquanto educador. 
Para sair da trilha 
o entusiasmo é 
um ingrediente 
necessário e 
determinante.
Ressaltamos que 
a forma como o 
educador orienta 
a atividade é 
fundamental 
para torná-la 
lúdica, portanto, o 
planejamento é um 
forte instrumento 
do educador. 
Trata-se, sim, de 
diversão, mas não 
diversão apenas, e 
sim, diversão com 
intencionalidade.
23
 A LUDICIDADE E A PRÁTICA INTERDISCIPLINAR Capítulo 1 
O estudioso da educação e da infância precisa estar vinculado, 
antes de qualquer coisa, à alegria e à vida. Este educador curioso 
se coloca como eterno pesquisador e se preocupa imensamente 
com o imaginário e sua relação com aquilo que a sociedade costuma 
considerar “assunto sério”, percebendo as relações entre um e outro. 
Na sabedoria de Rubem Alves, que aqui nos parece valiosíssima, 
o professor deve ser um provocador de sonhos. E no intento de ser um 
provocador que trabalha no viés interdisciplinar é preciso inicialmente 
estar motivado por uma fi nalidade. Mas não basta ter um objetivo em 
mente, faz-se necessário estar engajado na experiência dos encontros 
e desencontros resultante da produção em parceria. 
Para que haja trabalho interdisciplinar é preciso ter abertura para 
outros contatos, permitindo que possa acontecer, em dados momentos, 
construções no âmbito coletivo. Afi nal, “a atitude interdisciplinar não 
está na junção de conteúdos, nem na junção de métodos; muito 
menos na junção de disciplinas, nem na criação de novos conteúdos 
produto dessasfunções; a atitude interdisciplinar está contida nas 
pessoas que pensam o processo educativo” (FAZENDA, 2014, p. 73). 
Na atuação junto com outros profi ssionais fi ca valendo o entusiasmo, a 
ousadia e o respeito. Estamos aqui fazendo coro com Fazenda (2014) quando 
nos referimos a um compromisso autêntico em superar os obstáculos, sejam eles: 
“epistemológicos, institucionais, psicossociológicos, culturais, metodológicos, 
materiais e obstáculos quanto à formação” (FAZENDA, 2014, p. 40). Isso implica 
em respeitar o modo peculiar de cada um e os diversos caminhos possíveis 
na busca pela autonomia. As marcas das escolhas teóricas individuais devem 
aparecer a fi m de deixar notar conexões e confl uências. 
Um projeto de ação, mesmo individual, traz a marca do grupo, e aí está 
a dimensão interdisciplinar buscada no trabalho do educador alinhado com 
a ludicidade. Mais que um plano de trabalho que organiza um conjunto de 
atividades, um projeto mostra uma busca. 
Refl ita:
Um bom projeto deve ser uma espécie de convite. 
E você... aceitaria o seu próprio convite? 
O estudioso da 
educação e da 
infância precisa 
estar vinculado, 
antes de qualquer 
coisa, à alegria 
e à vida. Este 
educador curioso 
se coloca como 
eterno pesquisador 
e se preocupa 
imensamente com 
o imaginário e sua 
relação com aquilo 
que a sociedade 
costuma considerar 
“assunto sério”, 
percebendo as 
relações entre um 
e outro.
2424
 Práticas Pedagógicas do Ensino Lúdico
Para ser inovador, criativo, é preciso ousar questionar o óbvio. 
Antes de tudo, é preciso desacomodar-se e enfrentar algumas 
resistências. Pode-se começar ousando fazer-se, cotidianamente, 
boas perguntas – perguntas que peçam rearranjos, perguntas que 
demandem aprender fazendo.
Neste sentido, vale indagar-se: 
• Que possibilidades de troca estou buscando?
• A que novos saberes tenho dado abertura?
• Qual o meu grau de envolvimento com as práticas que eu 
preconizo?
• Estou de fato buscando o novo e procurando redimensionar o 
velho?
Trilhar esse caminho é mostrar interesse pela condição humana, o 
que leva a um entendimento de que é preciso conhecer a importância 
da ludicidade e procurar desenvolver um outro olhar em relação aos efeitos 
dessa prática – um olhar que entenda que a história da criança é feita de uma 
soma de movimentos ao longo do caminho, e esse caminho pode ser mais ou 
menos saboroso.
E então, você saberia encontrar um modo de fazer mais lúdico 
para as suas práticas cotidianas?
Atividade de Estudos: 
1) Proposta de exercício
• Fazer uma retomada das memórias pessoais de infância. 
• Escreva um pequeno memorial, de 20 a 30 linhas, ressaltando 
aspectos da sua infância que podem ser entendidos como lúdicos 
e relacione a importância destes aspectos com a sua formação 
como professor.
Para ser inovador, 
criativo, é preciso 
ousar questionar 
o óbvio. Antes de 
tudo, é preciso 
desacomodar-se e 
enfrentar algumas 
resistências. 
Pode-se começar 
ousando fazer-se, 
cotidianamente, 
boas perguntas 
– perguntas que 
peçam rearranjos, 
perguntas que 
demandem 
aprender fazendo.
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 A LUDICIDADE E A PRÁTICA INTERDISCIPLINAR Capítulo 1 
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AlGumas ConsideraÇÕes
Nas palavras do eterno menino Manoel de Barros no documentário de 2008 
intitulado “Só dez por cento é mentira, tudo que não invento é falso”, o poeta 
que tão lindamente recria as experiências infantis nos ensina algo valioso: as 
aprendizagens mais importantes são coloridas pelas tintas dos encontros que 
nos tocam pelo viés do sensível. E isso nenhum currículo pode abarcar. Somente 
um olhar que vê, revê e “transvê” o mundo pode trabalhar com essas singelezas 
(BARROS, 2008).
2626
 Práticas Pedagógicas do Ensino Lúdico
Se essas preciosas aprendizagens não são garantidas pelos currículos e 
pelas formações, cabe a cada professor consultar a sua criança interior e buscar 
caminhos para que a sensibilidade do infantil habite cada vez mais as suas 
práticas. Que esse olhar sensível possa tocar outros humanos e expandir as 
práticas interdisciplinares na escola, deixando marcas que ressoarão para sempre.
ReferÊncias
BARROS, Manoel de. Só dez por cento é mentira. Documentário desbiográfi co. 
Direção: Pedro Cezar. Brasil, 2008. 
BRASIL. MEC. Ensino fundamental de nove anos: orientações para a inclusão 
da criança de seis anos de idade. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de 
Educação Básica, 2007.
BRASIL. PROINFO: Projetos e ambientes inovadores. Secretaria de Educação a 
Distância. Brasília: Ministério da Educação/Seed, 2000. 
CAMARGO, Luiz Octávio de Lima. Educação para o lazer. São Paulo: Moderna, 
1998.
COSTA, Ana. A fi cção do si mesmo. Rio de janeiro: Companhia de Freud, 1998. 
DERRIDA, Jacques. O cartão-postal: de Sócrates a Freud e além. Trad. Ana 
Valéria Lessa. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007. 
FANTIN, Mônica. No mundo da brincadeira: jogo, brinquedo e cultura na 
educação infantil. Florianópolis: Cidade Futura, 2000. 
FAZENDA, Ivani Catarina Arantes. Interdisciplinaridade: um projeto em 
parceria. São Paulo: Edições Loyola, 2014. 
KIRINUS, Gloria. Synthomas de poesia na infância. São Paulo: Paulinas, 2011. 
LUCKESI, Cipriano Carlos. Ludicidade e atividades lúdicas: uma abordagem 
a partir da experiência interna. 2005. Disponível em: <www.luckesi.com.br>. 
Acesso em: 20 jun. 2015. 
NASIO, Juan-David. A fantasia: o prazer de ler Lacan. Trad. André Telles e Vera 
Ribeiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007. 
CAPÍTULO 2
O Desenho Infantil
A partir da concepção do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes 
objetivos de aprendizagem:
  Identifi car o processo de evolução do desenho infantil.
  Compreender as intervenções mais importantes para cada momento desse 
processo.
29
 O DESENHO INFANTIL Capítulo 2 
ConteXtualiZaÇÃo
Com ele [o desenho], não estaríamos frente a uma
espécie de ecografi a, de tomografi a computadorizada
ou de ressonância magnética dos processos de subjetivação?
Ricardo Rodulfo
O que faz uma criança ao desenhar? Esta é a pergunta central que permite 
que sejam tecidas outras tantas indagações ligadas ao tema do desenho infantil, 
abordado aqui neste capítulo. Os aspectos abarcados pelo desenhar apontam 
para acontecimentos determinantes na formação de uma criança. Elementos 
subjetivos embasam o hábito de desenhar e é preciso ter isso em mente ao tomar 
a importância dodesenho nos processos de aprendizagem.
A evolução do desenho infantil pode ser vista como um modo de perceber 
as alterações que se passam com a criança, pois a relação com o papel (e o que 
esse espaço representa) indica momentos distintos da vida psíquica na infância. 
Quando desenha, o pequeno se coloca diante de um espaço vazio, repleto de 
possibilidades e, por isso mesmo, frutífero. 
Que espécie de trabalho acontece ali? De algum modo, o corpo da criança 
está envolvido no desenhar, portanto, a questão do corpo é problematizada em 
relação a esta temática. Cenas de desenho mostram muito da relação da criança 
com seu corpo. E não seria justamente o corpo humano, em forma de boneco 
palito, um clássico do desenho infantil, repetido há gerações?
Neste capítulo trataremos do desenhar, suas implicações nos movimentos 
de subjetivação da criança e na sua vida escolar. O olhar do profi ssional que 
acompanha esse processo deve abarcar a importância do desenho no decorrer do 
desenvolvimento infantil, bem como deve saber lidar com o que a criança vivencia 
nessa experiência tida como lúdica.
Veremos aqui como o desenho se relaciona com a escrita. Os procedimentos 
da descoberta da superfície em branco, das tentativas repetidas e da satisfação 
obtida nessas atividades serão esmiuçados neste capítulo. O desenhar deixa 
suas impressões não somente no papel, mas também na criança, como veremos 
a seguir.
3030
 Práticas Pedagógicas do Ensino Lúdico
A ImportÂncia do Desenho no 
Processo de AprendiZaGem
Quando falamos da infância e suas inúmeras experiências de aprendizagem, 
especialmente no que diz respeito ao lúdico, não podemos deixar de dar atenção 
aos desenhos infantis. No ato de desenhar estão presentes várias noções como: 
o corpo, o outro, os limites. 
Quando uma criança se coloca diante de um espaço vazio, uma folha 
em branco ou qualquer outra superfície passível de ser tomada como espaço 
para desenhar (aqui lembramos facilmente das paredes e dos muros), o que 
acontece nessa cena? O desenhar representa na vida da criança um daqueles 
momentos que marcam – não apenas as folhas e as paredes –, mas também a 
sua própria constituição.
O gosto pelo desenhar ganha lugar na vida da criança na medida em que 
ela se lança com prazer na atividade. Na escola, tudo parte de um convite, 
sinalizado pelo adulto – uma folha entregue individualmente, um cartaz oferecido 
para que seja confeccionado um desenho coletivo, materiais capazes de permitir 
traços e pinturas. Convite feito, o imprevisível aparece: alguns surpreendem com 
explicações inusitadas para linhas que desenham algo nem tão evidente assim, 
outros habitam mais timidamente o espaço em branco, outros extravasam os 
limites e os contornos, e outros, inconformados, escondem o que produziram.
Nessa cena temos ali dispostos conceitos que constituem uma prática. 
Considerações valiosas sobre o tema do desenho infantil não podem deixar 
passar a questão do divertimento presente no desenhar. O desenho costuma ser 
uma atividade repetida e geralmente muito bem recebida pelas crianças, afi nal, há 
tanto por ser feito ali, há tanta imaginação por tecer que não raro a atividade só é 
interrompida por falta de tempo e/ou papel.
O outro é convocado como expectador: “olha só o que eu fi z”, costumam 
dizer as crianças com a obra em mãos. E, mais que buscar um expectador, uma 
testemunha, a criança busca o contentamento do outro diante do seu feito. Alguns 
ainda preferem outro gesto: “posso levar para casa e mostrar para a minha mãe?”, 
apontando para aqueles que são signifi cativos na vida de cada um. Querer mostrar o 
desenho, oferecer, dedicar, sinaliza uma vontade de colocar a produção no circuito de 
trocas, o que requer um certo encorajamento. 
Dizem os psicanalistas que a pergunta que move o mundo é “o que você quer 
de mim?”, salientando a expectativa que move o sujeito em sua trajetória sempre 
um tanto desajustada com relação ao ideal imaginado. O encontro com o outro 
31
 O DESENHO INFANTIL Capítulo 2 
é acolhedor, mas é também um embate velado: quanto das minhas expectativas 
serão cumpridas? Como poderei lidar com o fato de não corresponder perfeitamente 
ao que o outro espera de mim? E afi nal, o que eu posso esperar de mim? 
Na medida em que a percepção de si vai tomando corpo, as 
perguntas começam a ganhar outra dimensão, apontando para 
o produto (no caso, o desenho) a fi m de indagar sobre o seu valor 
nesse circuito de trocas. A criança, então, passa a se indagar: a minha 
produção é parte de mim? Diz respeito a mim? E então a avaliação 
feita sobre ela me desmerece/enaltece?
Sendo assim, vemos que o desenho infantil não confi gura 
somente um momento de fi rmar o traço, preparando para a escrita, 
nem tampouco um simples divertimento sem grandes consequências. 
O desenhar lida com a questão dos contornos e dos limites – e, 
portanto, lida diretamente com o terreno das inseguranças e das 
expectativas. Estamos falando aqui da autoestima, ou melhor, da 
busca pela resposta sobre a estima que o outro tem de mim (se 
pararmos para observar, ela nem é tão “auto” assim, afi nal, é buscada 
no olhar do outro).
Para avançarmos na elaboração sobre o que compreende esta 
prática e os seus efeitos sobre a criança, tentaremos responder à 
pergunta: de que está impregnado o desenho infantil? O que queremos 
saber é: o que acontece quando uma criança desenha?
Se compreendemos que desenhar coloca em jogo percepções de 
si (afi nal, ela testa habilidades e expectativas cada vez que rabisca um 
papel), carregando questionamentos sobre o valor das produções de 
cunho próprio, entenderemos que a temática que subjaz este momento 
é a distância entre o eu e o outro – em outras palavras, os limites que 
apontam para uma diferença, uma descontinuidade. Traduzindo em 
uma cena: na solidão do “eu” e das minhas expectativas, procuro no 
olhar do “outro” a satisfação (ou frustração) que ele sente ao deparar-
se com o que eu produzo e ofereço. Assim, o que se percebe é que a 
minha expectativa e a do outro nem sempre “batem”, não combinam, e 
isso mostra que somos irremediavelmente diferentes e distantes.
Essa distância não é dada, ela é construída. É preciso repetir a 
experiência tantas vezes que faça saltar aos olhos o quanto a criança 
precisa estar em um momento mais amadurecido dos processos de subjetivação 
para que seja possível deixar despreender de si uma produção a ser oferecida ao 
outro. Esse gesto estabelece na cena um eu e um outro, mostrando que há uma 
descontinuidade e que o desenho, ali, pode ser algo importante: uma ponte. 
Na medida em 
que a percepção 
de si vai tomando 
corpo, as perguntas 
começam a ganhar 
outra dimensão, 
apontando para o 
produto (no caso, o 
desenho) a fi m de 
indagar sobre o seu 
valor nesse circuito 
de trocas. A criança, 
então, passa a se 
indagar: a minha 
produção é parte de 
mim? Diz respeito 
a mim? E então a 
avaliação feita sobre 
ela me desmerece/
enaltece?
Sendo assim, vemos 
que o desenho 
infantil não confi gura 
somente um 
momento de fi rmar 
o traço, preparando 
para a escrita, 
nem tampouco um 
simples divertimento 
sem grandes 
consequências. 
O desenhar lida 
com a questão dos 
contornos e dos 
limites – e, portanto, 
lida diretamente 
com o terreno das 
inseguranças e 
das expectativas.
3232
 Práticas Pedagógicas do Ensino Lúdico
Oferecer o desenho pode ser o elo, constituído momentaneamente, que 
aproxima dois ou mais sujeitos. Aproxima, inclusive, simbolicamente, buscando 
relação com quem nem sequer está ali – como no caso de lembrar de uma outra 
pessoa e querer levar o desenho para mostrar a ela. Esse também é um modo de 
elaborar a distância e a ausência dos entes queridos, o que é importante na vida 
de uma criança que deixa a sua casa para frequentar diariamente a escola, longe 
dos seus.
O corpo ganha contornos com esta prática. A auto-imagem ganha 
consistência. O enlace entre corpo e linguagemé um acontecimento da maior 
importância na constituição de um sujeito, já que as produções da criança se 
transformam em interrogantes. O psicanalista Ricardo Rodulfo, autor do livro 
“Desenhos fora do papel: da carícia à leitura-escrita na criança” (2004) pesquisa 
movido pela pergunta “o que a criança faz ao desenhar?” (RODULFO, 2004, p. 
78) e afi rma, ao estudar sobre os limites com o outro, que “o corpo não é só uma 
decantação, é também um enredo” (RODULFO, 2004, p. 123). Com isto o autor 
aponta que cada história tecida nos entreatos da criança demarca algo do seu 
território e amplia o seu mundo de percepções e compreensões, inclusive sobre o 
seu corpo e lugar próprio.
A criança não traça o que ela vê, mas sim, o que ela acha que 
signifi ca o que ela vê, o que é indicado pela família, pelo social etc. 
Por meio do brincar e do desenho a criança mostra boa parte das 
hipóteses que ela esboça sobre o mundo e suas leituras. A relação com 
o outro, com o corpo do outro, com o olhar julgador e com as fantasias 
embutidas aí constituem a cena do desenhar.
Sendo assim, não se pode tomar um rabisco no papel como algo 
sem relevância ou somente um treino prévio para algo mais importante 
ainda por ser constituído. A criança, ao se debruçar sobre o papel, 
coloca algo de si nesse encontro. Quando o corpo sai da inércia e toca 
o papel com traços, muita coisa está acontecendo ali: “A garatuja com 
o lápis é pensável como transposição dessa outra garatuja fundamental 
que é a carícia” (RODULFO, 2004, p. 100). O desenhar pode ser visto 
como um modo de acariciar o papel a fi m de produzir, entre outras 
coisas, prazer – não apenas em si próprio, mas também no outro.
Os signifi cados dados pelos adultos às produções da criança 
respondem pelas infl uências socioculturais de cada um, são marcados 
por saberes transmitidos de geração em geração e, por sua vez, também 
irão marcar algo de transmissível que fi cará marcado na criança. Não 
basta dispor de capacidades: para aprender também é preciso que haja 
desejo. É imprescindível pensar o processo de ensino/aprendizagem vinculado ao 
desejo e às histórias dos sujeitos nele envolvidos. 
A criança não traça 
o que ela vê, mas 
sim, o que ela 
acha que signifi ca 
o que ela vê, o 
que é indicado 
pela família, pelo 
social etc. Por meio 
do brincar e do 
desenho a criança 
mostra boa parte 
das hipóteses que 
ela esboça sobre 
o mundo e suas 
leituras. A relação 
com o outro, com o 
corpo do outro, com 
o olhar julgador e 
com as fantasias 
embutidas aí 
constituem a cena 
do desenhar.
33
 O DESENHO INFANTIL Capítulo 2 
Portanto, não se trata de contemplar passivamente a criança e suas 
produções. Diante do exposto acima, é impossível negar: o lugar do professor é 
um lugar ativo. O olhar do professor vai acompanhar a construção de hipóteses 
da criança e suas intervenções vão ajudar a reformular a compreensão da criança 
sobre o mundo e o seu lugar no mundo.
Alicia Fernández, psicopedagoga pautada pela psicanálise, propõe uma 
leitura interessante sobre a relação entre corpo, organismo, desejo e inteligência 
no livro “O saber em jogo” (FERNÁNDEZ, 2001), expondo um interessante 
panorama sobre a relação entre as posições de ensinante e aprendente, 
mostrando que aprender pode ser tão interessante quanto brincar. Neste sentido, 
não esqueçamos: o professor, ao trabalhar com desenhos infantis, deve olhar 
além da criança e além do papel para perceber que, em muitos momentos, 
o professor também pode ser o aprendente, pois ele também aprende 
continuamente na relação.
Sugestão de leitura: livro de Alícia Fernández – O saber em 
jogo: A Psicopedagogia Proporcionando Autorias de Pensamento. 
Porto Alegre: Penso, 2001.
E nesse mundo repleto de hipóteses, as crianças vão explorando 
reformulações, que acontecem de tempos em tempos, na medida em que a 
experiência do desenho é exercitada. Nas palavras do psicanalista Ricardo 
Rodulfo:
Se levássemos ao papel todo esse emaranhado, que desenho 
obteríamos, se não o da garatuja – ironicamente, aquele que 
sempre fi cou fora da noção de desenho, na consideração 
tradicional? Com ele, estaríamos frente a uma espécie de 
ecografi a, de tomografi a computadorizada ou de ressonância 
magnética dos processos de subjetivação? (RODULFO, 2004, 
p. 100).
É apontado, aqui, o momento da produção da garatuja como sendo um 
tempo privilegiado para entender o que se passa com a criança e seus processos 
internos. Veremos a seguir como o desenho vai aparecendo de diferentes formas 
na produção da criança e o que essas fases podem indicar.
3434
 Práticas Pedagógicas do Ensino Lúdico
A EVoluÇÃo do Desenho Infantil
A criança cresce e engrandece também os alcances do seu horizonte. 
Seu arcabouço de conhecimentos espicha na medida em que ela desenvolve 
habilidades e percepções. No caso do desenho, a criança dá mostras de seu 
desenvolvimento cognitivo por meio das características que aparecem na 
representação que ela oferece ao papel.
Veremos a seguir alguns momentos do desenho infantil. São eles:
• Garatuja;
• Pré-esquematismo;
• Esquematismo;
• Realismo.
Tomando a leitura de Jean Piaget e Barbel Inhelder (2007) a respeito da 
evolução do desenho infantil, assumimos que as etapas evolutivas do desenho 
infantil podem ser descritas como: Garatuja, Pré-esquematismo, Esquematismo e 
Realismo. Tomemos estes pontos para orientar a nossa compreensão acerca das 
fases do desenho.
Em um primeiro momento, temos a garatuja, defi nida como os primeiros 
traços que a criança produz ao rabiscar o papel. Os tipos de garatuja podem 
ser divididos em dois: garatuja desordenada e garatuja ordenada. Na garatuja 
desordenada os movimentos são amplos e desordenados. A criança tem prazer 
em traçar linhas em movimentos de vai e vem, sem levantar o lápis do papel. 
É como se o lápis fosse o prolongamento de sua mão e ela ainda não tivesse 
consciência de que o rabisco é consequência do seu movimento com o lápis. 
A garatuja ordenada começa a aparecer aos dois anos de idade 
aproximadamente. Nesta fase a criança descobre a relação gesto/traço e passa a 
destinar um olhar ao que faz, distanciando-se, de certo modo, de sua produção. 
Nesta fase a criança procura controlar o tamanho dos rabiscos, a forma e o limite 
do papel, mas ainda não existe relação fi xa entre o objeto e sua representação. O 
mesmo traço pode ser uma árvore, logo em seguida um pássaro ou um cachorro. 
Este momento da garatuja requer atenção: não raro há um pouco de 
ansiedade por parte do professor em querer que a criança deixe o quanto antes 
essa fase de traços desconexos e profusão de riscos. No entanto, trata-se de 
uma experiência que ultrapassa os rabiscos sem nexo aparente. Ali a criança 
está experimentando o jogo de forças do desenho pela primeira vez, tomando a 
medida dessa habilidade e descobrindo o prazer de jogar esse jogo.
35
 O DESENHO INFANTIL Capítulo 2 
Para detalhar melhor os diferentes tipos de garatuja ordenada faremos aqui 
uma subdivisão: garatuja longitudinal, garatuja circular e garatuja mescla. Na 
garatuja longitudinal a criança ainda não controla a força, mas exerce movimentos 
longitudinais, alinhando-se com o início da coordenação viso-motora. A garatuja 
circular torna-se facilmente reconhecível: a criança começa a desenhar círculos, 
e em seguida coloca linhas ao redor destes círculos, que passam a ter forma de 
aranha ou mandala – utilizando, assim, a coordenação viso-motora. Nesta fase 
é crucial a relação olho/mão. Já no caso da garatuja mescla pode ocorrer uma 
mistura de uma etapa e outra ou todas ao mesmo tempo. 
O momento em que a criança consegue sair com uma linha de um ponto no 
papel e voltar ao mesmo ponto, fechando um círculo, é um marco na apreensão 
da coordenação viso-motora e na construção do desenho. Este traçado é uma 
grande conquista, pois a partir deste círculo nascem novas formas, inclusive 
a forma para a representação da fi gurahumana, na qual o círculo passa a 
representar a cabeça e os palitos representam os membros. 
Na fase de pré-esquematismo a criança começa a adquirir consciência da 
forma que pretende dar ao desenho e faz tentativas para representar o mundo. 
O desenho já apresenta algumas formas, mas estas não estão relacionadas 
entre si e ainda estão soltas, desordenadas e desproporcionais. O uso das cores 
também não tem relação com a realidade, depende do desejo da criança ou da 
sua preferência pela cor. 
Segue-se a esta a fase do esquematismo, quando a criança começa a 
construir formas diferenciadas para cada categoria de objetos e já apresenta um 
conceito defi nido da fi gura humana – embora ainda apareçam alguns desvios 
nesta fi gura como omissão de algum membro ou exagero de alguma parte do 
corpo. É nesse momento que a criança começa a organizar as fi guras no papel. 
Antes elas estavam soltas como se estivessem voando. Agora, as fi guras 
aparecem sobre o traçado de uma linha de base ou uma linha de base imaginária, 
que pode ser o limite inferior da folha de papel. Aqui já se nota uma preocupação 
por parte da criança em demarcar o chão e também o céu, limites antes ausentes 
nos desenhos. 
Na etapa do realismo a criança busca a semelhança: não basta mais a forma, 
é preciso decorar a forma. Quando aparece a decoração no desenho é o início do 
realismo. Observa-se no desenho a preocupação com o fundo e os confl itos da 
perspectiva. Nessa fase é fundamental que o professor proporcione desenhos de 
observação, podendo trabalhar com observações diretas de espaços cotidianos e 
também a releitura de obras de arte. 
3636
 Práticas Pedagógicas do Ensino Lúdico
Sendo assim, observando o desenrolar da história do desenho e como 
ela é vivenciada por cada sujeito, o professor percebe avanços, preferências, 
signifi cados. Estes saberes constituídos por meio do desenho serão cruciais para 
que outras compreensões relevantes aconteçam, como veremos a seguir.
Do Desenho ao Mapa
Tomaremos por base o entendimento de que as crianças 
desenham como um meio de agir sobre o ambiente. Por isso, 
apontamos aqui a interessante relação que há entre o esquema 
corporal e o espaço em torno da criança. Os contornos de si próprio, 
assim como os contornos ao redor, formulam espaços, distâncias, 
perspectivas – e isso aparece no desenho na medida em que a criança 
vivencia, com o corpo, essas experiências.
O domínio da representação espacial traz elementos da 
representação corporal. Quando a criança pode fazer uma aproximação 
do desenho ao mapa ela está organizando espacialmente a sociedade e 
a si mesma, colocando-se como parte de um mundo feito de territórios.
Saber sobre uma representação cartográfi ca indica uma 
rebuscada representação espacial, afi nal, do desenho ao mapa traça-
se um caminho que engloba inúmeros elementos, compondo diversos 
saberes. Trata-se do conhecimento sobre proporções, lateralidades, 
planos, dimensões, etc. 
Neste caminho do desenho ao mapa, cabe indagar: e o que é um mapa?
Para os cartógrafos o mapa é uma representação da superfície 
da Terra, conservando com estas relações matematicamente 
defi nidas de redução, localização e de projeção no plano. 
Sobre um mapa-base, assim obtido, pode-se representar 
uma série de informações, escolhidas por interesses ou 
necessidades das mais diversas ordens: política, econômica, 
militar, científi ca, educacional etc. [...] Além disso, a elaboração 
dos mapas não é determinada apenas pela técnica: os mapas 
expressam ideias sobre o mundo, criadas por diversas culturas 
em épocas diferentes (ALMEIDA, 2004, p. 13).
O domínio dos saberes cartográfi cos está intimamente ligado com a 
autonomia do sujeito, afi nal, ali estão representados espaços que exigem do olhar 
um alcance que passa pela estruturação subjetiva, pois esse olhar que lê o mapa 
é constituído por esquemas corporais e apropriações dos espaços mediante 
Apontamos aqui a 
interessante relação 
que há entre o 
esquema corporal 
e o espaço em 
torno da criança. 
Os contornos de 
si próprio, assim 
como os contornos 
ao redor, formulam 
espaços, distâncias, 
perspectivas – e 
isso aparece no 
desenho na medida 
em que a criança 
vivencia, com 
o corpo, essas 
experiências.
37
 O DESENHO INFANTIL Capítulo 2 
experiência. A relevância da questão é apontada por Rosângela Doin de Almeida 
no livro “Do desenho ao mapa: iniciação cartográfi ca na escola”:
O indivíduo que não consegue usar um mapa está impedido 
de pensar sobre os aspectos do território que não estejam 
registrados na memória. Está limitado apenas aos registros 
de imagens do espaço vivido, o que o impossibilita de realizar 
a operação elementar de situar localidades desconhecidas 
(ALMEIDA, 2004, p. 17).
A fi m de habilitar os alunos a tomar posse desse conhecimento, a escola se 
organiza para que sejam trabalhados esses conteúdos, prevendo para o ensino 
fundamental os conhecimentos de representação espacial. Estes devem ser 
desenvolvidos e aprofundados desde o 1º até o 4º ciclo, integrados aos estudos 
da Geografi a. Porém, “na verdade, são habilidades ligadas à leitura e à escrita, 
no sentido amplo de leitura e compreensão do mundo” (ALMEIDA, 2004, p. 18). 
Trata-se, portanto, de algo importante e que deve ser conectado à ludicidade 
a fi m de fazer com que a criança seja envolvida prazerosamente neste fazer, 
constituindo, assim, as bases para a sua leitura de mundo.
Comumente, na escola, vemos o uso do mapa na escola fi cando restrito 
a uma mera ilustração, o que não é difícil de ser percebido ao tomarmos como 
material alguns livros didáticos – e, às vezes, até mesmo o professor se posiciona 
validando este entendimento. No entanto, segundo Almeida (2004, p. 18), “a 
formação do cidadão não é completa se ele não domina a linguagem cartográfi ca, 
se não é capaz de usar um mapa”.
Sugestão de leitura: ALMEIDA, Rosângela Doin de. Do desenho 
ao mapa: iniciação cartográfi ca na escola. São Paulo: Contexto, 2004.
Apropriar-se dos conhecimentos sistematizados a respeito dos espaços, 
das três dimensões reduzidas ao plano do papel e das projeções é parte do 
projeto de formação que contempla a cidadania, habilitando o sujeito ao uso da 
linguagem cartográfi ca e dando-lhe autonomia. Em sala de aula, o professor pode 
relacionar essas aprendizagens ao uso lúdico das maquetes: construir maquetes 
coletivamente, explorando as dimensões, mostra a importância de guardar a 
proporcionalidade e respeitar a organização das formas.
O trabalho lúdico com a confecção de maquetes explora as noções espaciais, 
o convívio social e a organização. A maquete é uma ferramenta que permite 
3838
 Práticas Pedagógicas do Ensino Lúdico
trabalhar, inclusive, a geometria. No trabalho com a proposta de confecção de 
maquetes, as abordagens, podem ser temáticas relacionando as maquetes com 
algum elemento signifi cativo para a turma.
Se inicialmente a criança conhece o prazer de riscar quando experimenta 
abordar o papel com traços fortes, representando no desenho os elementos mais 
característicos dos objetos que crê desenhar, em outro momento, o professor 
pode convidar a criança a relacionar representação e memória, pedindo que seja 
desenhado (ou elaborado em forma de maquete), por exemplo, o prédio da escola 
– primeiro contando apenas com a memória e depois realizando uma observação 
direta. Deste modo, pode-se perceber as variações presentes nas representações 
que as crianças são capazes de produzir.
Aos poucos vai se esboçando na criança a construção da perspectiva, da 
proporção e da distância. Estas questões habitam a criança juntamente com as 
alterações vividas em seu esquema corporal. A esse respeito, Almeida (2004, p. 
36) salienta:
Sobre a interação entre motricidade e espaço existem 
dois princípios complementares, que são: a) a motricidade 
é expressão de uma ordem biológica e b) a máquina biológica 
gera seu universo espacial. Esses princípios sinalizam,primeiro, 
para o aparelho sensório-motor e sua morfologia (o corpo tem 
alto e baixo, frente e atrás e, ainda, dois lados simétricos – direito 
e esquerdo). Em segundo lugar, apontam para o fato de o 
corpo humano movimentar-se e deslocar-se seguindo uma 
postura ortostática (ortogonal em relação ao solo). Esses dois 
aspectos determinam sistemas de referência e mecanismos 
de captação de informação espacial. 
Fatores ligados à psicomotricidade, mais especifi camente o 
esquema corporal, têm relação com o delinear do espaço pela criança, 
pois permitem ressaltar aspectos da organização psicológica do 
sujeito que desenha, bem como dá mostras de como este se relaciona 
com o espaço. No desenhar aparecem, por exemplo, questões de 
lateralização, problematizadas na percepção dos esquemas corporais: 
“os lados direito e esquerdo são percebidos simultaneamente pela 
criança, porém frente-atrás não, pois a passagem da frente para trás 
supõe uma conversão” (ALMEIDA, 2004, p. 38).
No encontro com o mundo e, posteriormente, na tentativa de 
colocar um pouco desse mundo no papel, dá-se um sem número de 
descobertas:
A “lateralização” surge, já no primeiro ano de vida, ligada à 
assimetria funcional, quando a mão dominante é preferida 
Fatores ligados à 
psicomotricidade, 
mais 
especifi camente o 
esquema corporal, 
têm relação com o 
delinear do espaço 
pela criança, 
pois permitem 
ressaltar aspectos 
da organização 
psicológica 
do sujeito que 
desenha, bem 
como dá mostras 
de como este 
se relaciona 
com o espaço. 
No desenhar 
aparecem, por 
exemplo, questões 
de lateralização, 
problematizadas 
na percepção 
dos esquemas 
corporais.
39
 O DESENHO INFANTIL Capítulo 2 
nas tarefas manuais novas. Vê-se aí que a lateralização está 
relacionada com a dominância hemisférica. Esse processo 
leva ao conhecimento da lateralidade, primeiro no próprio 
corpo e, depois, sobre os outros corpos. Isso implica saber 
que se tem mão direita e mão esquerda e reconhecê-las. 
No entanto, pode haver oscilação da lateralidade até os 
sete anos. A lateralidade é reconhecida no próprio sujeito, 
aproximadamente aos seis anos, e nos outros, mais ou menos 
aos oito anos. Por volta dos 4-5 anos, a criança compreende 
que tem uma direita e uma esquerda, mas não sabe distinguir 
entre elas nos membros do corpo. Aos 6-7 ano, já sabe 
distinguir suas duas mãos, seus dois pés, e, depois, seus 
dois olhos. Aproximadamente aos 8-9 anos reconhece com 
precisão as partes direita e esquerda do corpo. (ALMEIDA, 
2004, p. 39).
A passagem dos espaços corporais para os espaços do mundo acontece 
com a marca dessas fases vividas na escola:
Quanto à orientação espacial, aos 5-6 anos a criança 
confunde-se ao seguir um referencial no próprio corpo (para a 
direita ou esquerda), mas não tem dúvida se o referencial for 
um objeto. Por exemplo, não sabe que direção tomar quando 
lhe solicitam que caminhe para a direita, mas não tem dúvida 
se lhe pedirem para ir em direção a uma árvore que está à 
direita (ALMEIDA, 2004, p. 39).
Temos, então, que o esquema corporal é uma resultante do esquema 
postural e do ambiente. A criança vai internalizando elementos do mundo e 
exigindo cada vez mais da sua memória a fi m de montar para si o que seria o 
mapa do seu corpo. Só então ela consegue projetar e – não esqueçamos – brincar 
com a possibilidade de registrar essas percepções e perceber-se crescendo em 
habilidade e leitura de mundo.
O Papel do Educador na 
ValoriZaÇÃo do Desenho da CrianÇa
Como vimos até aqui, o objetivo do trabalho com o desenho deve ser 
colocado em perspectiva, afi nal, ali estão sendo trabalhados vários saberes. 
No visível do desenho também opera uma dinâmica invisível: as relações entre 
cultura, criatividade, expressão, desenvolvimento cognitivo, adequação, estilo. 
Desenho: de que modo nós o consideramos? Eis uma pergunta importante. 
Como o desenho se mostra distante da vida adulta nós costumamos esquecer o 
quanto ele pode ser signifi cativo para uma criança. A aprendizagem do desenho 
4040
 Práticas Pedagógicas do Ensino Lúdico
mostra as aprendizagens sociais e culturais, e mostra também as teias de relações 
estabelecidas com a cultura que banha esta criança. 
De acordo com Rosa Iavelberg, autora do livro “O desenho cultivado da 
criança: prática e formação de educadores”:
Uma criança de 1 ano e 8 meses que desenha na superfície 
dos chinelos da mãe, ou em uma parede não autorizada para 
tal, será repreendida e progressivamente saberá onde pode e 
onde não pode desenhar. Ora, tais regularidades são advindas 
de uma cultura social, urbana e ocidental. Crianças que 
moram na zona rural, por exemplo, costumam desenhar na 
terra, oportunidade que falta às crianças dos grandes centros. 
Os hábitos culturais, portanto, diversifi cam as ideias da criança 
sobre o desenho (IAVELBERG, 2013, p. 35).
Com a percepção de que desenhar não é um ato isolado da cultura, 
as considerações do professor diante destas produções devem propiciar 
um ambiente de interação, permitindo, inclusive, a comunicação entre 
os pares no momento em que estes desenham, pois isto é importante 
para expandir a construção de signifi cações e ressignifi cações neste 
momento da vida das crianças. Organizar um ambiente propício às 
trocas é respeitar a relevância desta atividade, pois no enfrentamento 
das difi culdades do desenho, bem como no encontro com o divertimento 
presente ali, a criança atribui valor a esta aprendizagem. 
A autoconfi ança daquele que desenha busca balizas no olhar do 
adulto que o acompanha – no caso, o professor –, que pode incentivar 
a continuidade desta prática (tornando-a convidativa por sua ludicidade) 
ou provocar desestímulo na criança (podendo até mesmo deixar marcas 
negativas indeléveis). É preciso valorizar a dedicação sem deixar de 
incentivar o aperfeiçoamento. O toque de criatividade pode vir por 
conta de propostas inusitadas, como diferentes superfícies e materiais 
interessantes para que a criança explore sua veia pesquisadora.
• Desenhar pode ser infi nitamente divertido! Como? Por exemplo, 
pode-se brincar com várias opções:
• Oferecer superfícies diversas: desenhar na madeira, na areia, no 
computador, na lousa mágica, em papéis texturizados, em tecido, em 
superfícies transparentes, papéis em diferentes formatos (por exemplo, 
circular), etc.
Oferecer materiais inusitados para criar desenhos: carvão, pena, 
papel carbono, lãs, pedras, luz direcionada, cola e areia e/ou farelos 
diversos, etc.
A autoconfi ança 
daquele que 
desenha busca 
balizas no olhar 
do adulto que 
o acompanha 
– no caso, o 
professor –, que 
pode incentivar a 
continuidade desta 
prática (tornando-a 
convidativa por 
sua ludicidade) 
ou provocar 
desestímulo na 
criança (podendo 
até mesmo deixar 
marcas negativas 
indeléveis). É 
preciso valorizar 
a dedicação sem 
deixar de incentivar 
o aperfeiçoamento. 
O toque de 
criatividade pode 
vir por conta 
de propostas 
inusitadas, 
como diferentes 
superfícies 
e materiais 
interessantes para 
que a criança 
explore sua veia 
pesquisadora.
41
 O DESENHO INFANTIL Capítulo 2 
Após o professor iniciar o movimento convidativo ao desenho, as crianças 
se lançam no desafi o de ocupar o espaço com suas criações. Em seguida, diante 
da produção esboçada, o professor deve atentar para as críticas inábeis ao que a 
criança oferece em seu gesto. É preciso lembrar: ali está presente muito mais que 
um simples desenho, ali está um gesto de endereçamento – e por que não dizer: 
um gesto de endereçamento amoroso. 
O oferecimento do desenho à fi gura do professor é um momento oportuno 
para que a criança trabalhe questões de confi ança, expectativas, insegurança 
etc. Tal entrega pressupõe uma interação social na qual se percebe o medo de 
desagradar, a insegurança e os receios, e isso não pode passar despercebido.
E quando a criança se recusa a desenhar? Como trabalhar com (ou contra) 
essa resistência

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