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Direitos Fundamentais dos índios em situação de rua

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e 
D PLÁCIDO 
E D I T O R A 
Copyright O 2014, D' Plácido Editora. 
Copyright O 2014, Os autores. 
Editor Chefe 
Plácido Arraes 
Produtor Editorial 
Tales Leon de Marco 
Capa, Projeto Gráfico 
Tales Leon de Marco 
(Sobre imagem deloão Machado) 
Diagrama(ão 
Bárbara Rodrigues da Silva 
Letícia Robini 
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode 
ser reproduzida, por quaisquer meios, sem a autorização prévia da 
D' Plácido Editora. 
Catalogação na Publicação (CIP) 
Ficha catalográfica 
Ada Pellegrini; Gregório Assagra; Miracy Gustin; Paulo César Vicente de Lima; 
Rodrigo lennaco [Orgs.] -- Belo Horizonte: Editora D'Plácido, 2014. 
Bibliografia 
ISBN: 978-85-67020-60-0 
1. Direito 2. Direitos Fundamentais 3. Artigos I. Título 11. Direito. 
I CDU347 CDD 342.2 
D' PLACIDO 
E D I T O R A 
Editora D'Plácido 
Av. Brasil, 1843 , Savassi 
Belo Horizonte - MG 
Tel.: 3261 2801 
CEP 30140-002 
José Alcebíades de Oliveira Juniorl 
As enormes e crescentes popula~ões em situação de rua2, tal como se 
verifica em Porto Alegre - R S e em várias outras cidades brasileiras, além 
de esprlharem o alto grau de desigualdade social e exclusão da cidadania 
em sentido amplo, apresentam-se como um conjunto heterogêneo e 
Professor Titular da Faculdade de Direito e coordenador do programa de pós-gra- 
duação em Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Pesquisador 1D 
do CNPq. Líder dos Grupos de Pesquisa "Direitos Fundamentais e Novos Direitos" 
e "Sociologia Judiciária" na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Professor 
convidado do Mestrado em Direito da URI-Santo Angelo. 
Para alguns, como Eduardo Martinelli Leal, "situação de rua" é o outro nome da 
pobreza. Em um relato sobre "o lugar da rua", o autor nos fornece alguns elementos 
históricos: "os primeiros núcleos de povoamento civilizado no Brasil foram criados 
pelos senhores rurais que, uma vez donos de nossas terras, marcaram nelas seus sinais 
de distinção e poder. O domínio das famílias rurais estruturava o imaginário social, 
estendendo ao domínio público o poder privado dos senhores rurais e fazendo com 
que os interesses das famílias coloniais se sobrepusessem à cidade, delimitando seu 
tempo e espaço. Desta forma, a regulação das cidades obedecia aos ciclos da produção 
rural, as casas eram construídas de acordo com os interesses privados e o espaqo da 
casa grande referenciava a existência da rua, desprezada como o 'confim da casa'. A rua 
colonial não era um espaço para mulheres e crianças brancas, mas um lugar reservado 
a homens vagabundos, capoeiras, ciganos, ladrões, quadrilheiros, prostitutas, mendigos, 
penitentes e negros". E a esse contingente, acrescentaríamos os índios.Ver: O outro 
nome da pobreza: a situação de rua na perspectiva antropológica. In: LIMA, Roberto 
Kant de (Org.) .Antropologia e Direitos Humanos. Brasília, RJ: ABA; Booklink, 2008. 
p. 65 e segs.Ver também sobre a vulnerabilidade socioeconÔn~ica e civil: KOWARICK, 
Lúcio.Viver em Risco. São Paulo: Editora34,2009. 
multiétnico de seres humanos, o que quer dizer que a desigualdade social 
e a diversidade cultural andam juntas nessas malfadadas situações. 
Neste texto, temos a pretensão de abordar esse "drama" a partir do 
contingente indígena dessas pessoas, primeiramente desde discussões sobre 
o tema da diversidade e do reconhecimento em geral das pessoas, para, 
logo a seguir, realizar ponderações específicas sobre essas populações de 
rua de origem indígena no que diz respeito à exposição de sua arte e de 
sua cultura para fins de sobrevivência, e que, a nosso juízo, não ocorre de 
forma sustentável. 
Orientam metodologicamente nossa abordagem teses já trabalhadas 
por outros autores sobre redistribuição, reconhecimento e sustentabi- 
lidade3, mas que gostaríamos de expandir para melhor compreender e 
chamar a atenção para problemas que são de todos nós - problemas estes 
que são as questões tangentes às pessoas em situação de rua -, mas que 
lamentavelmente são vistos com aquilo que Bauman e May denominam 
de "desatenção civilw4. 
Segundo nossa abordagem, a agressão aos Direitos Humanos dessas 
populações não se dá apenas pela desatenção dos governos e das justiças 
de países como o Brasil, supostamente autônomos, mas, principalmente 
como saldo negativo de um tipo de endeusamento da economia mundial. 
que submete os Estados - nação - à condição de pedintes5. 
Alerte-se, ainda, na esteira de Néstor Canclini, o quão complexa é 
uma discussão sobre globalização (econômica, cultural etc.) que requer 
aprofundamento nas tentativas de compreensão de sua condição paradoxal, 
Nancy Fraser,Axel Honneth, Zygmunt Bauman, Boaventura Santos, Carlos Frederico 
de Souza Marés Filho, Paula Caleffi etc. 
Zygmunt Bauman, em sua obra "Aprendendo a Pensar com a Sociologia", no capítulo em 
que discute o pertencimento a grupos e especificamente a segregação e o movimento 
nas cidades, tendo por base a sociologia de Erving Goffman, mostra como desejamos 
não nos fazer notar e como ignoramos os outros, a fim de que desconhecidos não 
irrompam a nossa identidade. Ora, nesse sentido, o conceito de ''desaten$io civil" 
"é primordial em meio às técnicas que viabilizam a convivência de desconhecidos 
em uma cidade. Caracterizada por modalidades elaboradas - fingir que não olnamos 
nem escutamos, ou assumir postura sugestiva de que não vemos, não ouvimos nem 
mesmo ligamos para o que os outros a nossa volta estão fazendo -, a desatenção civil 
é rotinizada". (Aprendendo.. ., p. 69). Mas, a nosso juizo, a questão vai além: para man- 
termo-nos distantes, frequentemente "atiramos" algumas migalhas de atenção que 
podem ser compreendidas entre dar algumas moedas ou manifestar alguns sentimentos 
um tanto confusos de misericórdia com essas pessoas. 
Pode-se dizer também que a situação de penúria em que se encontram várias na- 
ções se deve, consoante Loic Wacant, em seu " A s prisões da Miséria", a uma paulatina 
substitiiição do Estado de Bem-Estar-Social por um Estado penal, em muito devido 
a consensos bem conhecidos e discutidos, como é o caso dewashington. 
que ora inclui, ora exclui grupos variados, inclusive os indígenas, o que 
aparecerá em nossa discussão ao final6. 
Enfim, como se respira no país por assim dizer um Estado de Di- 
reito constitucional e democrático, com alguns significativos avanqos nas 
demarcações de terras indígenas, conclui-se pela necessidade de políticas 
públicas gerais e específicas para essas comunidades em situação de rua. 
1 6.2. Casos reveladores 
A exclusão e a ausência de reconhecimento são visíveis nas cidades 
e nas estradas do RS, além, é claro, de em outras partes e lugares do País'. 
Um primeiro caso que gostaríamos de comentar a fim de ilus- 
trar nossa preocupação se encontra contido no processo judicial 
2008.7 1.00.024096-9, apresentado por Cândido Leal Junior em livro 
por nós organizado e referido há pouco, e que envolve cumprimento de 
mandado de reintegração na posse contra grupo indígena. Segundo esse 
magistrado, "a liminar possessória foi deferida pelo Juiz de Direito da 
Comarca de Eldorado do Sul - processo 165/ 1.08.0001027-9 - contra 
ocupação de área de terras da FEPAGRO (empresa pública estadual) 
por grupo indígena kaingang liderado por determinado indígena". 
E, como segue Cândido, a FUNAI não participou desse processo e 
nem teria sido previamente cientificada quanto ao cumprimento do 
mandado possessório. 
Ora, a primeira indagação que nos vem à mente é a dos porquês de 
pessoas em situação especial, conforme reza o texto constitucional, não 
serem tratadas de acordo com a Constituição.Trata-se de um quadro de 
invisibilidade ou de dificuldade de reconhecimento? 
Por outro lado, observa-se que, no cumprimento do mandado, com 
apoio de contingente do batalhão de choque da Brigada Militar (cerca de 
30 policiais), ocorreu uma série de outros "equívocos" contra a dignidade 
das pessoas humanas. Como não encontraram o grupo indígena kaingang 
ocupando a área, pois haviaoutro grupo indígena (guarani, e não kaingang) 
acampado na faixa de domínio da rodovia, próximo ao local descrito no 
mandado (mas não no local descrito no mandado), o oficial de justiça 
Ver: CANCLINI, Nestor. Dijirentes, Desiguais e Desconectados. Rio de Janeiro: Editora 
UFRJ, 2005. Sobre as duas mãos da globalização, veremos adiante os textos de Roa- 
ventura Santos e Paula Caleffi. 
' Ver: OLIVEIRA JUNIOR, José A. (Org.). Direitos Fundamentais e Contemporâneos. 
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2012. Especialmente o capitulo "O Direito naguerra entre 
culturas - tratamento judicial de con.itos entre grupos indígenas e agentes públicos", escrito 
conjuntamente com o Desenibargador Federal Candido Leal Junior. 
decidiu cumprir o mandado contra aquele grupo indígena guarani, ainda 
que não se tratasse do grupo kaingang descrito no mandado. 
Das colocações de Cândido, uma nos chama muito a atenção: trata- 
-se do "enorme" potencial "bélico" do grupo invasor, pois o grupo era 
composto por 5 (cinco) indígenas adultos (1 homem e 4 mulheres) e por 
10 (dez) crianças! E o mais importante para os nossos fins: os demais ho- 
mens do grupo não estavam presentes porque tinham ido comercializar 
seu artesanato, como era usual fazerem, segundo Cândido. 
Pois bem. Resta dizer que, na sequência, o único indígena homem co- 
meçou a negociar e obviamente resistir contra aquela agressão. Resultado: foi 
algemado reiteradas vezes e acusado do crime de "desobediência e resistência". 
Enfim, a cena se encerra com uma ampla destruição de todos os bens, 
pertences, utensílios e artesanato do grupo indígena, ao serem desmonta- 
dos e recolhidos na diligência para serem levados a outro local. Pois bem, 
a FUNAI ajuizou ação civil pública contra o Estado do Rio Grande do 
Sul, tendo ao final ocorrido uma indenização como reparaçãox. 
O segundo caso, processo 2009.7 1.0.01 6340-8, envolve confronto 
havido em entre kaingangs e policial militar no Brique da Redenção, em 
Porto Alegre, e também é retratado por Cândido Leal Junior no livro 
referido. Embora tenha ocorrido em momento anterior ao caso descrito, 
' Para ilustrar, acrescentem-se os comentários do magistrado sobre o ocorrido e que 
integram o livro Direitos Fundamentais e Contemporâneos.. .": "A sentença julgou 
procedente a ação e condenou o Estado do Rio Grande do Sul ao pagamento da 
indenização por danos morais em favor daquele grupo indigena guarani porque: (a) 
houve falha da Justiça Estadual quando não intimou previamente nem comunicou a 
Funai sobre a ordem de reintegração, conforme exigido pelo artigo 63 da Lei 6.0011'73 
('nenhuma medida judicial será concedida liminarmente em causas que envolvam interesse de 
silvícolas ou do Patrimônio Indiyena, sem prévia audiência da União e do órgâo de proteção 
ao índio'); (b) houve falha dos serventuários da Comarca de Eldorado do Sul quando 
expediram mandado de reintegração que não indicou exatamente as pessoas contra as 
quais a ordem se dirigia e a área que seria objeto de reintegração; (c) houve falha do 
oficial de justiça estadual quando reintegrou na posse da faixa de domínio da rodovia 
a Fepagro e retirou do local pessoas contra as quais não fora proposta a ação nem 
dada ordem judicial nem constavam do mandado (o mandado era endereçado à área 
de terras dentro da Fepagro que estaria ocupada por kaingangs, mas foi cumprido 
quanto i faixa de domínio da rodovia onde estavam acampados guaranis); (d) houve 
falha da Brigada Militar quando, em apoio ao cumprimento equivocado do mandado, 
deteve de forma indevida e arbitrária, e algemou por duas vezes o líder do grupo 
guarani, que tentava negociar e pedia se aguardasse a Funai; (e) houve dano inoral 
àquele grupo indigena porque as medidas adotadas contra o líder do grupo foram 
desproporcionais, já que ele não oferecia perigo, não se justificava fosse na frente de 
seus familiares, das crianças e das mulheres, duas vezes algemado e levado no camburão 
policial; (0 também houve dano moral porque foram indevidamente removidos (alguns 
destruidos e outros retirados) os bens e pertences do grupo indigena, atingindo assim 
sua identidade cultural e sua dignidade enquanto pessoas humanas". 
nele vislumbra-se mais diretamente o ponto que nos interessa: a situação 
inapropriada de produção e consumo da arte e da cultura indígena. 
Assim, a comunidade indígena kaingang usava aquele espaço urbano 
para comercialização de seu artesanato (comércio ambulante de rua). O 
espaço também era utilizado para encontro, convivência e integração entre 
diferentes comunidades indígenas dentro de Porto Alegre. 
Entretanto, certo dia o que começou como fiscalização rotineira se 
transformou, em poucos instantes, num conflito generalizado que envol- 
veu e opôs cerca de 30 artesãos indígenas e o policial militar. Sem que 
ficasse perfeitamente esclarecido como as agressões iniciaram, em poucos 
instantes não houve mais espaço para negociação entre o grupo indígena 
e o policial militar, tendo este acabado por disparar um tiro que feriu ter- 
ceiro (cacique indígena que tentava acalmar o grupo, mas não parece ter 
sido responsável pelas agressões). O policial militar teve de ser resgatado 
do meio do tumulto, sendo hospitalizado em razão dos ferimentos.Vários 
integrantes da equipe de fiscalização da SMIC também ficaram feridos. 
Dentre os indígenas, apenas se teve notícia do tiro recebido pelo cacique 
que tentava acalmar o grupo. 
Segundo a FUNAI, o policial militar determinou que os indígenas 
desobstruíssem a passagem de veículos e, quando não foi prontamente 
atendido, começou a chutar e afastar com os pés os artesanatos expostos 
na rua. Em síntese, o policial agrediu injustamente integrantes da comuni- 
dade indígena (ao chutar seu artesanato) e foi o causador do tumulto por 
conta de não ter recebido adequada preparação e treinamento suficiente 
para lidar com aquele tipo de situação envolvendo populações vulneráveis, 
como os indígenas que moram em Porto Alegre. 
A partir da prova testemunhal produzida, a sentença reconheceu 
que existiam duas versões para o início dos fatos, que ambas as versões 
eram verossímeis e que não havia como determinar, pela prova dos autos, 
quem deu início às agressões. Era possível que o policial militar tivesse 
se excedido no início de sua intervenção, falando rispidamente como 
os indígenas e dando a entender que estaria agredindo a identidade in- 
dígena ao remover seus artesanatos para abrir passagem para o veículo 
da SMIC. Mas também era possível que o policial tivesse agido dentro 
dos limites de suas atribuições e que a agressão tivesse iniciado pelo 
comportamento agressivo da indígena que teria surpreendido o policial 
militar ao jogar contra ele objeto. Em síntese, a prova foi contraditória 
e o tumulto que ocorreu no local apagou a percepção dos presentes 
quanto ao que efetivamente ocorreu, tornando os fatos nebulosos e 
impedindo ao juízo convencimento seguro sobre quem foi o responsável 
pelo início das agressões. 
A sentença julgou improcedente a indenização por danos morais, mas 
deferiu indenização pelos danos materiais causados ao cacique, entendido 
como terceiro em relação aos fatos9. 
Enfim, o que necessita ser dito a partir dessa exposição de casos rela- 
tados pelo magistrado Cândido é que os índios estão nas ruas e nas estra- 
das, como se esse fosse um lugar de passagem obrigatório nesse processo 
de transição entre as suas vidas comunitárias de origem e as sociedades 
atuais de competição econômica e consumista, situação que se imporia, 
porque, segundo alguns, esse seria o único mundo possível. A indagação 
que fica é: mas não haveria outro lugar de passagem menos agressivo de 
sua dignidade e tradição cultural do que as ruas? 
16.3. Redistribuição e reconhecimento 
Como dito, os exemplos retratados neste trabalho mostram de forma 
cabal a dificuldade de convivência e a necessidade de respeito entre os 
diferentes grupos sociais e culturais, mas, principalmente, a necessidade 
de uma visão renovadada inter-relação entre esses grupos e os distintos 
agentes do Estado, desde os mais periféricos aos mais centrais em relação 
ao sistema político, para utilizar aqui expressões sistêmicas difundidas por 
Jurgen Habermas em suas obras sobre inclusão e democracialO. 
E, dentre os autores atuais que se destacam na discussão sobre ex- 
clusão, encontramos Nancy Fraserl1, para quem esse assunto se encontra 
no âmbito de um questionamento sobre as demandas por justiça social. 
V Para ilustrar, também conforme Cândido Leal Junior: "quanto aos danos morais a 
sentença reconheceu que não seria possível responsabilizar o Estado do Rio Grande 
do Sul pelos danos causados à comunidade indígena porque: (a) não ficou provado que 
as agressões tivessem sido causadas pela falta de orientação ou treinamento do policial 
militar; (b) não foi provado que o resultado poderia ser diferente se aquele policial 
militar tivesse recebido um treinamento diferente para lidar com populações vulne- 
ráveis; (c) não se poderia exigir que o policial militar e a fiscalização da Smic tivessem 
se omitido em cumprir seus deveres quanto à fiscalização do comércio ambulante 
em Porto Alegre; (d) não poderia ser atribuída apenas ao Estado do Rio Grande do 
Sul a responsabilidade quanto a treinamento para lidar com populações vulneráveis, 
uma vez que a Funai também não organizou, não ministrou nem recomendou esse 
tipo de treinamento; (e) o incidente parece fato isolado, decorrido de mal-entendido 
havido no local e fruto de acidentes provenientes de contatos causados pela vida 
urbana moderna, não parecendo se tratar de resultado de ódio racial, discriminação 
étnica ou despreparo pelos agentes públicos" op. cit. p. 16-17. 
'O Como são exemplos: Direito e Democracia, entre facticidade e validade. 2 vols.Trad. Flávio 
Siebeneichler, Rio de Janeiro:Tempo Brasileiro, 1997; e Inclusão do 0utro.Trad. George 
Sperber, Paulo Soethe e Milton Mota. São Paulo: Edições Loyola, 2007. 
FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or Recognition? A Political-Phi- 
losophical Exchange. London and NewYork:Verso, 2003. 
Contudo, para ela, necessário se faz saber distinguir entre demandas de 
redistribuição e de reconhecimento, que podem estar juntas ou indepen- 
dentes, estas últimas tendo a ver diretamente com as minorias étnicas, 
raciais, sexuais e de gênero. Um dos maiores equívocos, segundo a autora, 
são as falsas antíteses entre essas duas dimensões, muito frequentemente 
tendentes a reduzir um problema ao outro. Aliás, como são conduzidas 
muitas das defesas contra as cotas raciais no Brasil, sustentando que a ex- 
clusão dos afrodescendentes seria uma questão apenas socioeconômica. 
Enfim, deixando de lado essa importante discussão teórico-doutrinária, 
importante salientar que o tema está muito próximo das várias histórias 
contadas nas sociedades ditas democráticas e que falam de inclusão em 
sua esfera pública12, mas que, como veremos com Carlos Marés, tem um 
passado e um presente bastante complexo e nada convincente em termos 
de superação da discriminação13. 
Destaque-se, do professor Carlos Marés, seu interessante texto sobre 
" O Direito de Ser Povo"", que nos mostra que o Brasil, tal como tantos outros 
países ocidentais, integra o rol das nações que assimilaram, por assim dizer, 
de modo acrítico e abstratamente as grandes conquistas jurídico-políticas 
modernas, entronizando valores importantes como liberdade, igualdade, 
propriedade etc., gerando uma filosofia individualista e um racionalismo 
fundado no contrato social que, muito embora seus aspectos de superação 
do Antigo Regime europeu, engendrou um Estado brasileiro que em 
muitos aspectos não soube lidar com sua peculiar realidade, permeada por 
comunidades autóctones (índios) e não autóctones (negros escravos e tra- 
zidos da África), que pouco ou quase nada tinham a ver com essa filosofia. 
Devido à complexidade do tema, que, por sua riqueza, transborda 
nossas possibilidades de análise detalhada, alguns trechos do trabalho de 
Marés são autoexplicativos e merecem ser reproduzidos: 
... num mundo onde existem apenas indivíduos e não coletivos, 
onde as relações são sempre contratuais, isto é, expressão livre 
da vontade na busca de interesses racionais, evidentemente os 
povos que se relacionam movidos pela emoção e pela leitura 
dos fenômenos naturais, que muito longe de contrair uma 
l2 FRASER, Nancy; HONNETH,Axel. A Sociologia Política do reconhecimento -As con- 
tribuições de Charles Taylor. São Paulo: Annablume, 2006, p. 11. 
'' Os temas da diversidade, multiculturalismo e reconhecimento têm recebido nossa 
atenção em vários trabalhos, dentre os quais os seguintes: Multiculturalismo: o olho 
do furacão no direito pós-moderno. Revista Direitos Culturais, n. 1,2006; e O Juiz e 
o Multiculturalismo. Revista Multijuris, n. 9, Ajuris, RS, 2010. 
l4 O Direito de Ser Povo. 111: SARMENTO, Daniel et al. (Org.). Igualdade, Dgerença c 
Direitos Humanos. p. 475-495. 
obrigação prévia pelo contrato acredita que tem a obrigação 
da dádiva, não podem subsistir, porque terão que ser reduzidos 
a indivíduos. Neste mundo, de coisas concretas e delimitadas, 
de bens, de mercadorias, os animais soltos, ao contrário dos 
homens livres, não têm serventia nem utilidade, as plantas que 
não se deixam domesticar tampouco e, ainda menos os mine- 
rais sem valor de troca. Todos haveriam de ser considerados 
inúteis e nocivos.Assim, no Estado moderno não têm serventia 
teórica nem prática as sociedades, povos e populações coletivas 
(tradicionais), nem a natureza.15 
Por outro lado, também como demonstra Marés e acreditamos ser 
essa interpretação lamentavelmente ainda vigente e em parte explicativa 
de nossa ainda maciça exclusão, 
É fácil entender que neste sistema jurídico preocupado com os 
contratos e os patrimônios individuais, os interesses e direitos 
coletivos não tinham nenhuma importância. Daí que não só a 
liberdade dos trabalhadores africanos e seus descendentes, mas 
também a vida e a organização dos índios lhe era indiferente. 
Mais do que isso, todos aqueles que não estivessem integrados ao 
sistema econômico por um contrato, seja de trabalho (trabalhador 
livre), seja de compra e venda (proprietário de terra ou de outros 
bens de produção) estavam desassistidos por Lei.16 
E, como diz Carlos Frederico Marés, o sistema, como tal, era mais 
cruel do que isso. Não se tratava de desassistência, mas de negação de 
existência. Consoante afirma esse professor, 
De fato o sistema considerava que os índios, escravos, caboclos 
(coletores, pescadores, camponeses em terras sem títulos) deve- 
riam integrar individualmente o sistema: os índios, deixar de ser 
índios, os escravos, adquirir sua liberdade e tornar-se trabalhadores 
assalariados, os caboclos, que declarassem sua posse ao Estado e 
se tornassem ou proprietários por compra ou empregados dos 
novos proprietários.17 
De modo que uma das importantes conclusões de Marés diante do 
exposto e que pode ser bem compreendida porque se trata de uma situação 
que ocorre ainda hoje com muitas pessoas, sobretudo com os moradores 
de rua indígenas, é a de que 
'"arés, op.cit.p.477. 
'"arés, op.cit.p.480. 
Marés, op.cit.p.480. 
... nessa lógica do indivíduo, os povos indígenas se tornaram invi- 
síveis. E tal invisibilidade só poderia ser evitada em duas hipóteses: 
quando reconhecidos como inimigos, então se lhes declarava 
guerra e era legitimada a matança, ou quando o indivíduo se 
reconhecia como cristão e trabalhador.18 
Ora, os indígenas não só se cristianizaram (no sentido pejorativo dessa 
palavra) como estão a viver um longo e dificil processo de transição de suas 
vidas comunitárias para as sociedades racionais e calculistas modernas, nas 
quais o que vale é a capacidade de resistência e competição num mercado 
comercial realmente selvagem. 
16.4. O consumo não sustentável da 
cultura e da arte indígena nas ruas 
A professora Paula Caleffi apresenta, também em obra organizada 
por nós1', uma interessantetese que vem ao encontro ou mesmo está na 
base e expande nossas suspeitas de um consumo não sustentável da cul- 
tura e da arte indígena. Em síntese, trata-se do seguinte: em que pesem os 
avanços constitucionais de proteção aos índios no Brasil e de certo apoio 
a setores indígenas amaz6nicos, em razão de interesses internacionais não 
bem esclarecidos, é possível constatar-se que o processo de globalização 
neoliberal tem submetido à dominação e mesmo domesticação grande 
parte da cultura e a arte indígena em várias regiões do País, tornando-a 
mais um dos seus espetáculos controlados e por vezes deprimentes de 
consumo de massa. 
Saudamos a abordagem de Calefi, pois ela expande não somente as 
reflexões críticas sobre os aspectos de classe da cultura jurídica importada 
para o Brasil e que se tornou opressora, como bem demonstrou Marés 
em seu texto, mas, também, porque ela formata as bases para uma discus- 
são crítica de certos correntes multiculturalistas, bem como nos permite 
iniciar um trabalho com o tema multicultural nas relações de consumo, O 
que, aliás, Bauman e outros já vêm fazendo20. 
Diante disso, acreditamos importante reproduzir as propostas de Pau- 
la Calefli para que possamos compreender, sem nos valermos de meros 
-- 
l8 Marés, op.cit.p.481. 
l9 OLIVEIRA JUNIOR, José Alcebíades (Org.). Faces do Multiculturalismo. santo Ângelo: 
Ediuri, 2007, p. 119-126. 
Ver, por exemplo, sua obra "A Éticu é possível num mundo de consumidores?'. Para ilustrar, &i- 
amos que, coni a udormizaqão da sociedade de consumo, através das roupas e das formas 
de se alimentar, não é mais possível distinguir um chinês de um latino-americano etc. 
chavões, u m pouco melhor u m dos mais importantes filões responsáveis 
pela exclusão no mundo, que é a globalização, 
Ao analisarmos os processos de legitimação jurídica da diversidade 
cultural em determinados países da América Latina, como Brasil e 
Equador, constatamos historicamente uma situação de um embate 
entre grupos nativos, (em conjunto com agentes sociais como 
setores acadêmicos, entre outros); e os Estados Nacionais, com 
tendência recente a resultados favoráveis aos grupos indígenas, 
como está materializado na Constituição brasileira de 1988, e 
nas discussões em favor da utilização da justiça comunitária por 
grupos Saraguros (Quechua), no Equador. Porém, em paralelo 
a este fenômeno temos o processo de ação da globalização ne- 
oliberal, escolhendo através de instituições supranacionais quais 
diversidades serão preservadas através do investimento de capital 
transnacional neste objetivo. As outras culturas indígenas que 
estão fora deste rol de eleitas ficam relegadas a uma situação de 
domesticação das suas manifestações étnicas, e digestão das mes- 
mas, pela globalização neoliberal, que as inclui em seu repertório 
de possibilidades e escolhas controladas. Isto ocorre claramente 
quando grupos indígenas são chamados a apresentarem suas 
manifestações culturais em espetáculos onde as regras são do 
espetáculo cultural ocidental e onde eles devem desempenhar 
exatamente o que se espera deles - a visão do exótico - a prova 
da existência da diversidade.A contrapartida deste processo é que 
para fugir da marginalização econômica, da miséria propriamente 
dita, grupos indígenas aceitam entrar nesta dinâmica.21 
Ora, é impossível deixar de assinar em baixo das colocações dessa 
professora. O Rio Grande do Sul é pleno de situações desse tipo e diante 
das quais todos somos testemunhas diárias. Dá pena de assistir, na famosa 
"Rua da Praia", e m Porto Alegre, os intermináveis "shows" apresentados 
por horas a fio pelos pequenos índios e m fila, que, orientados pelos seus 
pais, murmuram u m canto que não entendemos, mas que podemos sentir 
como u m massacre da alma, tudo por alguns centavos de reais. 
Portanto, as teses da professora não só nos permitem fazer observações 
históricas sobre o processo de construção de um multiculturalisrno cidadão 
no Brasil bem como observações críticas acerca do desenvolvimento do 
que chama, então, de um multiculturalismo domesticador - índios fazen- 
do o papel de índios para chamarem a atenção -, tema que mereceria 
ser aprofundado, mas que não cabe de modo integral neste breve escrito. 
Mas o fundamental em toda a reflexão de Caleffi, segundo nosso 
ponto de vista e que gostaríamos de registrar para estudos futuros, é o 
CALEFFI, Paula. A domesticação do Exótico, op.cit. p.199 e segs. 
352 
conceito de "etnossustentabilidade", que implica o eiitendimento de que 
sustentabilidade para as populações indígenas enseja uma relação articulada 
e equilibrada, própria do dinamismo das culturas, de três termos: cultura- 
-.sustentabilidade-mercado22. 
Ora, concordando com Paula, no R io Grande do Sul não há nenhu- 
ma dúvida de que esse equilíbrio não se mantém devido a uma série de 
fatores. E o importante é perceber, como bem demonstra essa autora, que 
a insustentabilidade pode ser observada, inclusive, nas próprias políticas 
dos órgãos de proteção indígena, que não raramente focam no desen- 
volvimentismo sua atenção às terras indígenas, ao invés da preservação, a 
exemplo da própria FUNAI. Por outro lado, como mostra Paula, a cultura 
indígena é integrada por várias atividades, como caça, pesca, horticultura 
e artesanato, e o que se observa é predominantemente a atividade de 
confecção de artesanato, que, como se viu nos casos relatados, ocupa de 
modo integral os homens indígenas nas ruas e nas estradas. 
Mas o estudo da professora avança para um dos aspectos que fundaram 
nosso interesse pela inclusão dos índios nessas populações de rua e que 
detectamos pessoalmente pelas ruas de Porto Alegre, e que é a crescente 
mercantilização da arte indígena. Reproduzindo Calefi, 
... nas manifestações culturais de canto e dança de comunidades 
do Rio Grande do Sul, por meio das quais essas conseguem 
algum dinheiro, ou na maior parte das vezes, alimentos para seu 
sustento, da mesma forma que o artesanato, ocorre um fenômeno 
interessante, porém perverso. Essas manifestações se tornaram um 
misto de autenticidade, espaço de divulgação e afirmação cultural, 
encontrada principalmente, nos cantos (letras e músicas), mas, ao 
mesmo tempo, para serem aceitos e convidados a se apresentar, 
os grupos indígenas necessitam enquadrar-se nos formatos dos 
shows, moldarem-se ao padrão do espetáculo, o que consiste em 
apresentarem-se com um padrão de higiene estabelecido pela 
sociedade dominante, utilizando roupas, vestimentas que reme- 
tem ao exótico e que, na maior parte das vezes, esses grupos não 
utilizam nem em seu cotidiano, muito menos em seus rituais, e 
fundamentalmente usar o tempo (elemento precioso utilizado de 
diferentes formas nas diferentes culturas) da maneira ocidental, 
não extrapolando o tempo predeterminado pelos organizadores 
dos eventos2" 
Assim, resta claro que o predomínio das sociedades de mercado e 
de consumo tem sistematicamente oprimido a cultura indígena e suas 
22 CALEFFI, 0p.cit.p. 210. 
23 CALEFFI, Paula. A domesticação ..., op. cit. p. 212. 
condições de sustentabilidade, situação observada em pelo menos duas 
direções: quanto às fontes naturais para a produção do artesanato, já que 
não são mais naturais essas fontes por terem sido exterminadas, pois nem 
terras possuem mais os índios daqui; e quanto à perda crescente de sua 
condição de vida comunitária, originalmente ligada a um vínculo espiri- 
tual com a terra (da qual, para eles, o corpo é uma extensão) e que funda 
toda a manifestação artística dos índios, substituída por atos em busca tão 
somente de um ganha-pão. 
Enfim, da domesticação do exótico, como constatou Paula, essas 
culturas caminham em busca de sua adaptação às sociedades racionais 
modernas, mas parece que ainda têm um longo percurso pelas ruas e as 
estradas até chegarem a um patamar de dignidade, e é diante disso que 
estudos como o nosso devem continuar sendo feitos, como forma de ajudar 
na luta pela concretização dos Direitosconstitucionalmente estabelecidos 
em prol dessas pessoas. 
16.5. Os direitos dos índios em situação de rua 
Como acreditamos ter deixado claro, as questões multiculturais dos 
índios podem ser lidas também enquanto vinculadas aos Direitos Funda- 
mentais das pessoas em situação de risco e de rua. 
E, como salienta Carlos Frederico Marés de Souza Filho no texto 
"Multiculturalismo e direitos coletivo^"^^, a proteção do multiculturalismo 
depende de um embate com a ideologia individualista e de um incre- 
mento da proteção dos direitos coletivos, particularmente quanto aos 
povos indígenas. E tal incremento, consoante esse autor, é devido a vários 
fatores historicamente opressores, tais como o colonialismo mercantil na 
formação dos Estados latino-americanos, a falácia do integracionismo, 
aos equívocos da política de contato na Amazônia, a necessidade de se 
tratar de forma compartilhada (coletivamente) a territorialidade indígena 
etc., assim como medidas coletivas devem ser tomadas para que se instale 
o desenvolvimento - direitos humanos econômicos, sociais, culturais e 
ambientais dos índios. 
Acreditamos corroborarem também com essa perspectiva as teses sobre 
Direitos Fundamentais do professor Gregório Assagra de Almeida2s, com 
destaque para sua proposta de superação da summa divisio Público versus 
24 Ver: SANTOS, Boaventura de Sousa (Org.). Rcconhecerpara Libertar: os caminhos do 
cosmopolitismo multicultural. p.7 1-1 09. 
25 Ver: ALMEIDA, Gregório Assagra de. Direito Material Coletivo: superação da summa 
divisio direito público e direito privado por uma nova summa divisio constituciona- 
lizada. Belo Horizonte: De1 Rey, 2008. 
Privado no Direito, por uma nova summa divisio Direitos Individuais e 
Direitos Coletivos constitucionalizada, claramente incluindo como uma 
das dimensões da preocupação coletiva, os indígenas. Como demonstra o 
professor, invocando José Afonso da Silva, 
... os direitos e interesses dos índios têm natureza de direito coleti- 
vo, de direito comunitário, de sorte que eles pertencem, ao mesmo 
tempo, à comunidade toda e a cada índio em particular como 
seu integrante. Conclui o citado jurista que é justamente por isso 
que a Constituição reconhece legitimação para defendê-lo em 
juizo aos próprios índios, às suas comunidades e às organiza~ões 
antropológicas e pró-índios, devendo intervir obrigatoriamente 
o Ministério Público em todos os atos do processo.26 
Enfim, nunca é demais insistir na condição constitucional dos direitos 
dessas populações, tal como reza o artigo 231, da Constituição Federal de 
1988, no qual são reconhecidos aos índios sua organização social, costu- 
mes, línguas, crenças e tradiçoes, e os direitos originários sobre as terras 
que tradicionalmente ocupam, bem como o artigo 232, que se refere às 
partes legítimas para ingressar em juízo. Mas há muito por se fazer em 
termos de legislação complementar e infraconstitucional. Não obstante, 
uma pergunta que é sempre feita e que deve ser sempre relembrada é a 
seguinte: qual o critério para se definir a tradicionalidade das terras indí- 
genas, o do homem branco (sociedade ocidental), que historicamente foi 
quem sempre negou tais direitos originários, ou o dos índios?'lA resposta, 
infelizmente, continua insatisfatória e as consequências são conhecidas: os 
indios são encontrados mais nas ruas e nas estradas ... 
16.6. Conclusão 
"Não se mede a grandeza de um país unicamente pelo nível de renda 
per capita, nem pelo PNB. Mas, sobretudo, pela capacidade de preservar 
suas raízes, de conter a variedade dentro da unidade, de atender com justiça 
26 Direito Material.. . , op.cit. p. 551. Inobstante a positivação dos direitos, é preciso consi- 
derar, com o professor Assagra, a presença de inúmeros obstáculos à sua concretização, 
dentre os quais, como já referimos, autorizações por parte de funcionários da Funai e 
da Ibama em contratos ilegais para a exploração, por terceiros, de madeiras nobres, o 
que acaba afetando gravemente o ecossistema da região, e a abertura de estradas em 
terras indígenas para permitir o escoamento de bens de produção agrícolas de cidades 
que se situam nas suas proximidades etc. (op.cit. p. 554). 
27 Cfe. José Carlos Moreira da Silva Filho, in Jornal Constituição e Democracia, n. 11, 
UnB, 2007, p. 07. 
aos diferentes grupos que o constituem", afirmou Orlando Villas Boas, 
em discurso na UFMG28. 
Felizmente, após muitos anos conseguimos aprovar Orlando, 
o nosso país necessita não somente continuar a sua luta contra os 
preconceitos ainda existentes acerca da capacidade dos índios, como 
concretamente implantar políticas públicas de inclusão29. 
Felizmente, após 10 (dez) anos parece estarmos próximos da aprovação 
de um projeto de cotas (PLC 180-2008) que inclui, entre outros, negros 
e índios nas universidades e instituições de ensino técnico federais. Nesse 
meio tempo, temos acompanhado um tenso, contraditório e desgastante 
debate público e judicial, mas que tem deixado como contribuição decisiva 
o necessário amadurecimento sobre o tema e o problema que ele carrega. 
estra- Talvez, com esse avanGo, possamos tirar os índios das ruas e da, 
das e fornecer-lhes um lugar digno para que realizem um processo sadio 
de transição desde suas comunidades de origem às sociedades modernas, 
contemporâneas e consumistas, mundo este que, sim, parece cada vez mais 
inevitável e que necessitaria de outro e ainda mais longo debate. 
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Divisio Direito Público e Direito Privado por urna nova Summa Divisio 
Constitucionalizada. Belo Horizonte: De1 Rey, 2008. 
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Janeiro: Zahar, 201 0. 
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Alcebíades de (Org.). Faces do Multiculturalismo. Santo Angelo: Ediuri, 2007, 
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Trad. Luiz Sérgio Henriques. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2005. 
FRASER, Nancy; HONNETH,Axel. Redistribucion or Recognition? A Political - 
Philosophical Exchange. London and NewYork:Verso, 2003. 
28 Revista ScientijicAmerican, Edição Especial n. 44 - Patrimônio Cultural do Xingu - O 
Começo do fim?, p, 31. 
29 Gostarbmos de referir também sobre importantes pesquisas que estão sendo realizadas em 
Santo Angelo, na Região das Missões Jesuíticas, RS, sobre os in&os Mbyá Guaranis, tanto 
no Mestrado em Direito da URI, na linha sobre Multiculturalismo e Direito, quanto no 
Grupo de Estudos do Sebo Café, liderado pelo Advogado e Professor Dr. Paulo Leal. 
HAHN, Noli; GROFF, PauloVargas (Orgs.). Multiculturalismo e Cidadania. Santo 
Ângelo: FURI, 2009. 
1<ONNETH,Axcl. Reconocimiento y menosprecio. Sobre Ia fundamentación normativa 
de una teoria social. Buenos Aires: Katz Editores, 2010. 
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