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Apostila-_-DIVERSIDADE-LINGUÍSTICA-E-COM

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Complementação Pedagógica 
Coordenação Pedagógica – IBRA 
 
DISCIPLINA 
 
 
 
 
 
DIVERSIDADE LINGUÍSTICA E 
COMUNICAÇÃO ALTERNATIVA 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
 
LÍNGUA ................................................................................................................... 4 
LINGUAGEM ........................................................................................................... 5 
LINGUAGEM E SOCIEDADE ............................................................................... 10 
3.1 Hymes .......................................................................................................... 13 
3.2 Labov ............................................................................................................ 15 
3.3 A noção de comunidade de fala ................................................................... 15 
ORALIDADE E ESCRITA ...................................................................................... 18 
AS LÍNGUAS DO BRASIL ..................................................................................... 19 
OS CONDICIONAMENTOS SOCIAIS E ESTILÍSTICOS' ..................................... 24 
PLURALIDADE LINGUÍSTICA .............................................................................. 28 
TIPOS DE VARIEDADES LINGUÍSTICAS ............................................................ 33 
PRECONCEITO LNGUÍSTICO E PRÁTICAS DISCURSIVAS ESCOLARES ....... 35 
O ENSINO DAS VARIAÇÕES LINGUÍSTICAS E MULTICULTURAIS NOS ANOS 
INICIAIS .................................................................................................................... 36 
GÊNEROS TEXTUAIS .......................................................................................... 45 
TIPOS E GÊNEROS TEXTUAIS ........................................................................... 47 
12.1 Exemplos de tipos textuais ........................................................................... 48 
12.2 Gêneros textuais pertencentes aos textos narrativos: .................................. 48 
12.3 Gêneros textuais pertencentes aos textos descritivos .................................. 49 
12.4 Gêneros textuais pertencentes aos textos expositivos: ................................ 49 
12.5 Gêneros textuais pertencentes aos textos argumentativos: ......................... 49 
12.6 Gêneros textuais pertencentes aos textos injuntivos .................................... 49 
 
12.7 Gêneros textuais pertencentes aos textos prescritivos ................................. 50 
12.8 Gêneros textuais e gêneros literários ........................................................... 50 
12.9 Texto Narrativo ............................................................................................. 51 
12.10 Texto Descritivo ........................................................................................... 52 
12.11 TextoDissertativo-Argumentativo ................................................................. 52 
12.12 Texto Expositivo ........................................................................................... 53 
12.13 Texto Injuntivo .............................................................................................. 53 
REDAÇÃO OFICIAL CARACTERÍSTICAS E ESPECIFICIDADES ...................... 54 
13.1 O que é uma redação oficial? ....................................................................... 55 
13.2 Formalidade .................................................................................................. 56 
13.3 Padronização ................................................................................................ 56 
13.4 Concisão ....................................................................................................... 56 
13.5 Clareza ......................................................................................................... 56 
13.6 Impessoalidade ............................................................................................. 57 
SINTAXE E SEMÂNTICA ...................................................................................... 58 
14.1 Funções e Relações sintáticas ..................................................................... 58 
14.2 Funções sintáticas ........................................................................................ 58 
14.3 Relações sintáticas ....................................................................................... 59 
SEMÂNTICA ........................................................................................................ 59 
REPRESENTAÇÃO, MULTICULTURALISMO E IDENTIDADE ........................... 63 
PRODUÇÃO DE TEXTOS ................................................................................... 69 
17.1 Como produzir um texto? .............................................................................. 72 
17.2 Tipos de Textos ............................................................................................ 74 
17.3 Como Produzir um Bom Texto? .................................................................... 74 
17.4 Crie a Estrutura do Texto – Tema e Título .................................................... 75 
 
17.5 Apresentação ................................................................................................ 75 
17.6 Conclusão ..................................................................................................... 76 
DICAS PARA PRODUZIR UM BOM TEXTO ........................................................ 76 
PRODUÇÃO DE TEXTO EM DIFERENTES FORMATOS ................................... 77 
BIBLIOGRAFIA BÁSICA ....................................................................................... 78 
4 
 
 
LÍNGUA 
 
 
A língua é uma forma de linguagem, é um dos instrumentos de interação soci- 
ocomunicativa e, assim como as religiões, a culinária, as vestimentas, integra-se na 
cultura dos povos. Os idiomas são mecanismos de expressão das manifestações cul- 
turais e estão a serviço da comunicação social. As aquisições culturais são ensinadas 
e transmitidas, em grande porte, pela língua. 
Existem no mundo pelo menos, 3 mil línguas. Além dessas línguas faladas hoje, 
existem entre 7 a 8 mil dialetos que são variantes de um idioma. Cada língua desen- 
volveu seus próprios padrões de nomeação de experiência perceptivas. Não há duas 
línguas iguais quanto à maneira de dividir a realidade conceitual. Os esquimós têm 
uma serie de palavras para designar diferentes tipos de neve, enquanto outros povos 
têm apenas um termo para ‘’neve’’. Existem povos que só tem uma palavra para de- 
signar o azul e o verde, enquanto nós temos essas duas palavras para essas cores. 
Todos os países têm sua língua oficial, que é aquela em que o governo conduz 
seus trabalhos e foi adotada com essa finalidade por decisão governamental; é a co- 
nhecida como língua do país. É a língua de um Estado, a qual e obrigatória. Nem 
sempre ela é a língua materna, ou seja, a língua cujos falantes praticam por ser a 
primeira aprendida, geralmente, em ambiente familiar. 
No Brasil, a língua oficial é a língua portuguesa, embora nosso país seja multi- 
língue. Em nosso país, são faladas línguas indígenas, além das origens africanas, 
ainda praticadas nos quilombos, e das línguas dos imigrantes que vieram principal- 
mente da Europa e da Ásia. Entre elas, é possível citar o alemão, o árabe, o chinês, 
o coreano, o espanhol, o holandês, o inglês, o italiano e o japonês. Além dessas lín- 
guas, existem em nosso país, as línguas de fronteiras que são os idiomas praticados 
pelas diferentes etnias índios, espanhóis, árabes, portugueses alemães, entre outros 
– em contato. 
Em todos os países, existe uma variedade da língua de prestigio social, deno- 
minada língua padrão; é aquela eleita como a mais apropriada nos contextos formais 
e educacionais. A íngua padrão é a variedade da línguaque tem um status especial 
5 
 
 
na sociedade e é adquirida pelo ensino formal. A maior parte das publicações acadê- 
micas, dos noticiários nacionais é feita em língua padrão. Ela é a recomendada para 
a escrita formal, tem prestigio social e é protegida por lei. 
Podemos conceber língua como um fenômeno natural, um organismo dinâ- 
mico, que evolui com o passar do tempo; como um sistema formal em funcionamento 
numa comunidade. Pelos usos diferentes no tempo e nos diversos agrupamentos so- 
ciais, as línguas passam a existir como um conjunto de falares diferentes, todos muito 
semelhantes entre si, mas cada qual apresentando suas peculiaridades com relação 
a alguns aspectos linguísticos. 
A língua de um povo surge e se constrói junto com seu modo de ver o mundo, 
sua história e sua cultura, e, nessa construção, ela se transforma e deixa que o tempo 
lhe traga novas nuances. A língua não é um sistema homogêneo, ela varia no espaço 
e na hierarquia social. Não é um sistema fixo e imutável. Além de evolui no tempo, a 
língua ainda está em evolução, em constante mudança, pela ação dos falantes. Sua 
história ainda não acabou; está sempre se fazendo pela ação dos falantes. 
Como o homem dispõe e inúmeras possibilidades para se comunicar, cada lín- 
gua corresponde à expressão de uma escolha entre essas possibilidades, apresen- 
tando variações relevantes em função de valores sociais, regionais, de faixa etária, de 
situação, etc., concretizando, dessa forma, a relação entre linguagem, língua e cul- 
tura.1 
 
 
 
LINGUAGEM 
 
 
Uma língua, seja ela qual for, tem a função de permitir a comunicação entre os 
indivíduos. Essa é sua função primordial. Há uma relação direta e indissolúvel entre 
sociedade e língua ou língua e sociedade, que não permite que se pense em indiví- 
duos vivendo conjuntamente sem o estabelecimento de comunicação entre si e, da 
 
 
 
 
1 Texto adaptado: www.pt.slideshare.net 
http://www.pt.slideshare.net/
6 
 
 
mesma forma, não é possível a comunicação sem que haja uma convenção social a 
respeito dessa comunicação, o que chamamos de língua. 
Língua nada mais é que um conjunto de convenções sociais historicamente 
constituídas, que permite que os seres humanos se comuniquem entre si. Somente 
os seres humanos têm essa capacidade, uma capacidade relacionada talvez com al- 
gum dispositivo biológico, que permite que se formule e se entenda um conjunto de 
sons e a eles se associe um sentido. 
É possível que outros seres vivos se comuniquem como é o caso, por exemplo, 
das abelhas, que, com um conjunto de movimentos (danças) são capazes de trans- 
mitir informações a respeito da localização de alimento ou mesmo do risco iminente à 
colmeia, porém não se pode confundir esse tipo de comunicação, de propósito restrito, 
com linguagem ou mesmo língua. 
 
 
Fonte: ericasitta.wordpress.com 
 
 
Da mesma forma, observam-se alguns pássaros que são capazes de produzir 
um conjunto de sons muito parecidos com os sons produzidos pelos seres humanos, 
o que não permite às aves, porém, dialogar com seres humanos ou entre si, estabe- 
lecendo um raciocínio a respeito dos sons produzidos e produzindo, como os seres 
7 
 
 
humanos, outros conjuntos de sons, como resposta. Os macacos, animais que guar- 
dam grande semelhança com o homem, também não possuem um mecanismo capaz 
de estabelecer comunicação por meio da língua, ainda que seu raciocínio beire o ra- 
ciocínio humano. 
As baleias também têm sua ‘’linguagem’’, produzem, ao menos, dois tipos de 
sons: os que intervêm e seu sistema de eco localização, funcionando como uma es- 
pécie de sonar biológico, e as vocalizações, conhecidas canções das baleias, que 
parecem ser um meio de comunicação entre os membros da mesma espécie. Inúme- 
ros estudos com animais em cativeiro e selvagens tem mostrado que esses mamíferos 
marinhos são capazes de comunicação com qualquer ouro usando uma ‘’linguagem’’. 
Embora essa forma de linguagem não possa ser comparada com a linguagem hu- 
mana, e um sistema articulado de comunicação, no qual cada som e modulado em 
tons e frequências que são repetidos constantemente durante atos específicos e situ- 
ações particulares. 
Animais domésticos se comunicam com seus donos. Podemos dizer que os 
cachorros emitem sons que nos permitem identificar sentimentos como medo, raiva e 
dor. Um cão abana o rabo, demonstrando satisfação; rosna, expressando ameaça. Os 
animais em modos de se expressar; entretanto, a natureza dessa comunicação não 
se compara à utilizada pelo homem. A ‘’linguagem’’ animal possui características bem 
distintas da linguagem humana. Em linhas gerais, trata-se de uma forma de adap- tação 
à situação concreta, relacionada a uma forma fixa de resposta e determinado estímulo. 
A linguagem está no limiar do universo humano porque caracteriza o homem e 
o distingue do animal. O homem tem a capacidade de ultrapassar os limites da vida 
animal ao entrar no mundo do símbolo. A natureza da comunicação animal não se 
compara à revolução que a linguagem humana provoca na relação do homem como 
o mundo. 
A diferença entre a linguagem humana e a ‘’linguagem’’ do animal está no fato 
de que este não conhece o símbolo, mas somente o índice. O índice está relacionado 
com a forma fixa e a única com a coisa a que se refere. Por exemplo, as frases com 
8 
 
 
que adestramos o cachorro devem ser sempre as mesmas, pois são índices, isto é, 
indicam alguma coisa muito específica. 
A linguagem humana é uma manifestação cultural; relaciona-se com padrões 
de comportamentos, crenças, conhecimentos, realizações, costumes que podem ser 
transmitidos de gerações. O homem imprime sentido às linguagens que cria. Ele cria 
palavras, gestos, símbolos, enfim, formas de expressar suas ideias. 
 
A linguagem é atividade. É forma de ação, ação entre indivíduos, orientada 
para uma finalidade, e lugar de interação que possibilita aos membros de uma 
sociedade a prática dos mais diversos tipos de atos, que vão exigir dos se- 
melhantes reações e/ou comportamentos, levando ao estabelecimento de 
vínculos e compromissos anteriores inexistentes. (KOCK, 1997,p.9) 
 
A linguagem humana envolve a representação simbólica de conceitos e diver- 
sos tipos de relações entre eles. Ela está em toda parte; sem ela, as sociedades não 
seriam o que são. Por meio da apresentação simbólica e abstrata, o homem dá sentido 
ao mundo, distancia-se da experiência vivida é capaz de compreender o mundo e nele 
agir. 
Desde que nascemos, estamos mergulhados no mundo da linguagem. Cresce- 
mos imersos em um universo de sons, de gestos e sinais, através dos quais passamos 
a interagir com tudo o que nos cerca. Nosso pensamento, a forma de entendermos as 
coisas, começa então a ter por primordiais as palavras, a linguagem, o nome das coi- 
sas existentes no mundo. 
 
A linguagem impregna nossos pensamentos, é intermediária em nossas re- 
lações com os outros, e se insinua até em nossos sonhos. O volume esma- 
gador de conhecimentos humano é guardado e transmitido pela linguagem. 
A linguagem é, de tal modo, onipresente que a aceitamos e sabemos que 
sem ela a sociedade, tal cm a conhecemos, seria impossível. (LANGAC- 
KER,1972, p.11) 
 
A linguagem e o pensamento se misturam à medida que a capacidade da co- 
municação simbólica se desenvolve. Uma criança, com cerca de dois anos de idade, 
começa a usar o idioma para se comunicar. Seu conhecimento sobre o mundo, antes 
baseado em experiências sensoriais e motoras, torna-se lentamente mais e mais sim- 
bólico. A partir de então, a criança não precisa mais aprender tudo através de suas 
próprias experiências – ela pode aprender através da linguagem. 
9 
 
 
O mundo que resulta do pensar e o agir humanos não pode ser chamado de 
natural, pois se encontra transformado e ampliado por nós. Portanto, as diferenças 
entre pessoa e animal não são apenas de grau, porque, enquanto o animal permanecemergulhado na natureza, nós somos capazes de transforma-la, tornando possível a 
cultura. 
 
 
Fonte: vitaclinica.com.br 
 
 
A linguagem e a comunicação por meio de uma língua são, portanto, atividades 
estritamente humanas. A facilidade com que uma criança adquire sua língua materna 
é algo quase inexplicável, levando em consideração a complexidade de uma lín- gua. 
Em aproximadamente três anos, adquire-se um conjunto razoavelmente grande de 
palavras, aliado às regras de uso da língua, as chamadas regras da gramática dos 
usuários de uma língua, algo que permite que se estruturem frases coesas e coeren- 
tes, ou seja, que permite que se diga “O bebê está com fome” em vez de “Fome bebê 
com está”, uma operação que parece simples, mas que possui uma grande complexi- 
dade, mesmo para adultos que tentam adquirir uma segunda língua. 
Além dessa facilidade na apreensão das estruturas e do léxico (palavras), 
some-se a isso a estruturação, por parte da criança, de frases nunca ouvidas, de- 
monstrando sua capacidade criativa e não somente reprodutiva, provando que o ser 
humano possui uma estrutura em seu cérebro capaz de criar e modificar a língua. 
10 
 
 
É essa capacidade única que coloca o homem como espécie central do planeta 
terra, essa capacidade de se organizar em sociedade e se comunicar que faz do ser 
humano um animal capaz de exercer dominação sobre outras espécies e permite-lhe, 
dentre outras coisas, o desenvolvimento e a manipulação de objetos, o que o torna 
tão diferente das demais espécies. O que permite a esse ser alterar seu meio e traçar 
o seu destino, mas, por outro lado, o que lhe permite galgar a própria destruição.2 
A linguagem é um sistema organizado de símbolos a serviço das sociedades 
humanas. Esse sistema é amplo, complexo, extenso e possui propriedades particula- 
res que possibilitam a codificação, a estruturação das informações sensoriais, a capi- 
tação a transmissão de sentidos, que favorecem a interação entre os homens. 
 
 
 
LINGUAGEM E SOCIEDADE 
 
 
Os estudos sistemáticos que tratam da relação entre linguagem e sociedade 
começam a se solidificar ao longo de 1960, quando a sociolinguística emerge como 
um campo de saber interdisciplinar, com suas bases fortemente ancoradas na linguís- 
tica, na antropologia e na sociologia. Como se trata de uma relação, duas questões 
antagônicas naturalmente se põem: a linguagem determina a realidade social? 
A sociedade determina a linguagem? Dada a natureza da temática proposta 
neste ensaio, abordo três diferentes perspectivas: de Sapir e Whorf, de Hypes e de 
Labov', examinando a hipótese determinística no que concerne à maneira pela qual 
linguagem e sociedade podem se implicar. Consideramos, então, uma terceira ques- 
tão: em que medida é possível falar em determinismo sob a ótica dos referidos auto- 
res? 
Na discussão aqui proposta releva aos seguintes aspectos: a realidade social 
como produto linguístico, segundo Sapir e Whorf o papel do contexto e da competên- 
cia comunicativa no que diz respeito à relação entre linguagem e mundo, na visão de 
Dell Hymes; e a importância do conceito de comunidade de fala e da correlação entre 
 
 
2 Texto extraído: https://www.portaleducacao.com.br 
http://www.portaleducacao.com.br/
11 
 
 
fatos linguísticos, estratificação social e estilo, para Labov. Concluo que as relações 
entre linguagem e sociedade são permeadas por um certo determinismo (de diferen- 
tes tipos e em diferentes graus) nas três perspectivas abordadas. 
Inicialmente, chamamos atenção para o fato de que Sapir e Whorf tratam ex- 
plicitamente das relações linguagem/cultura e linguagem/ pensamento. Entretanto, 
considerando-se que "cultura pode ser descrita como conhecimento adquirido social- 
mente, isto é, como o conhecimento que uma pessoa tem em virtude de ser membro 
de determinada sociedade' (Hudson 1980: 74 apudLyons 1987: 274 grifo meu), pode- 
se dizer que há uma estreita ligação entre cultura e sociedade. Ademais, segundo 
Sapir, "não há duas línguas que sejam bastante semelhantes para que se possa dizer 
que representam a mesma realidade social' (1969:20 grifo meu). Assim, para efeito da 
discussão proposta nesta seção, tomo o termo 'sociedade' como equivalente a 're- 
alidade social' e, grosso modo, a 'cultura'. 
De acordo com Sapir, a realidade é produzida pela linguagem, o que significa 
dizer que não há mundos iguais, visto que não há línguas iguais. Para o autor, a lin- 
guagem possui, sobretudo, o papel de produzir e organizar o mundo mediante o pro- 
cesso de simbolização. O caminho para compreensão do(s) mundo(s) se dá pela de- 
cifração dos símbolos, que referem (produzem) a realidade e remetem a conceitos 
(pensamento). Por exemplo: entender um poema exige a "compreensão plena de toda 
a vida da comunidade, tal como ela se espelha nas palavras ou as palavras a sugerem 
em surdina" (op. cit). 
O processo de simbolização da linguagem exige um sistema fonético que arti- 
cule imagens acústicas "gerando" o símbolo, o qual proporcionará condições para a 
produção de conceitos/pensamentos. Sem os símbolos na matemática, por exemplo, 
um raciocínio matemático não seria possível, o que vale dizer que a matemática não 
existiria e muito menos se expandiria em níveis de complexidade. Os símbolos, por 
sua vez, geram um efeito sobre a linguagem que é o de sua ampliação (abstração), 
mediante um processo de classificação, categorização e seriação - característicos do 
pensamento. É dessa forma que o mundo ao nosso redor é possível/ construído, se- 
gundo Sapir. 
12 
 
 
Uma ilustração clássica da construção da realidade a partir da linguagem é 
apresentada por Whorf em relação à língua hopi, na qual não é possível pensar o 
tempo de forma linear como em outras línguas, pois não há palavras, expressões ou 
formas gramaticais que permitam isso. Ao invés das noções de tempo e espaço (pas- 
sado, presente e futuro), essa língua permite organizar o contraste entre partícula e 
onda 2, obrigando, "ao ser obrigatório pela forma de seus verbos, o povo hopi a per- 
ceber e observar os fenômenos vibratórios, animando-os além disso a encontrar no- 
mes e a classificar esta classe de fenômenos" (1971:72). 
 
 
Fonte: atosociologico.blogspot.com 
 
 
Para o autor, é possível descrever qualquer fenômeno observável no universo 
sem levar em consideração os contrastes entre espaço e tempo, ou seja, sem consi- 
derar o espaço como algo homogêneo e independente do tempo, mas sim levando 
em conta as inter-relações existentes entre os fenômenos. Segundo Whorf, "o ponto 
de vista da relatividade, pertencente à física moderna, é um desses pontos concebidos 
em termos matemáticos, e a concepção universal do hopi é outra muito diferente e 
que não é matemática, mas sim linguística" (p. 74). 
As ideias desses dois estudiosos costumam ser referidas como a "hipótese de 
Sapir-Whorf", podendo ser assim sintetizadas: a linguagem determina a forma de ver 
13 
 
 
o mundo, e consequentemente, de se relacionar com esse mundo (hipótese do deter- 
minismo linguístico); isso significa que para diferentes línguas há diferentes perspec- 
tivas e diferentes comportamentos (hipótese do relativismo linguístico). 
É interessante destacar que, para Sapir, tanto a língua como a cultura (reali- 
dade social) é passível de modificações: é da natureza da linguagem a mudança, visto 
que "não há nada perfeitamente estático" e a "deriva geral de uma língua tem fundo 
variável" (1969: 137). Entretanto, existe um paradoxo: embora ambas estejam sujeitas 
a mudanças, essas se dão em velocidades diferentes - a língua se modifica mais len- 
tamente, pois "um sistema gramatical, no que depende dele próprio, tende a persistir 
indefinidamente. Em outras palavras, a tendência conservadora se faz sentir muito 
mais profundamente nos lineamentos essenciais da língua do que da cultura" (p. 61). 
As consequências disso são que asculturas não poderão WORKING PAPERS EM 
LINGÜÍSTICA, UFSÇ N.8, 2004 130 - Cristine Gorski Severo ser sempre simbolizadas 
pela linguagem, conforme a passagem do tempo; e que será muito mais fácil simboli- 
zar a cultura no passado do que no momento atual. 
Posto isso, remeto-me às questões colocadas na introdução: para Sapir e 
Whorf, a linguagem determina a realidade social. Todavia, a versão forte da hipótese 
do determinismo linguístico parece se enfraquecer diante do descompasso verificado 
entre as mudanças na língua e na cultura, conforme exposto no parágrafo acima. 
 
3.1 Hymes 
 
 
Fonte: ello.uos.de 
14 
 
 
Hymes pauta sua teoria no pressuposto da linguística constituída socialmente, 
o que implica uma relação entre ideologia/cultura e linguagem no que diz respeito à 
utilização da forma linguística motivada pelo uso social. Esse pressuposto estipula que 
usos linguísticos se diferenciam mediante instituições, valores, crenças e diferen- ças 
individuais, no sentido de que são as diferenças do mundo/ da realidade/ do con- texto 
que causam diferenças linguísticas: "valores culturais e crenças são em parte 
constitutivos da realidade linguística" (Hymes apud Figueroa 1994:42). 
O autor não está preocupado com o sistema gramatical formal, mas compre- 
ende a linguagem dentro de uma perspectiva comunicativa'', o que invoca outras áreas 
para o seu estudo, uma vez que a linguagem pode ser considerada como uma "parte 
integrada de uma organização sociocultural geral do comportamento" (Figueroa 
1994:33). Para ele, a definição de língua é complexa e deve levar em conta diferentes 
aspectos, como o histórico, o social, o cultural e as particularidades individuais. Com 
a inserção do contexto histórico e etnográfico há a consequente supremacia do as- 
pecto funcional em detrimento do formal. Segundo o autor, "não é a forma linguística 
que cria o padrão social, mas o padrão social informa a forma linguística. Nesse caso, 
a inferência é dos dados etnográficos para as funções da língua" (p. 42). Vemos assim 
que Hymes atribui ao contexto social uma propriedade causal - prioritária - em relação 
ao uso linguístico. Mesmo a estrutura formal está subordinada ao contexto que, para 
ele, é sempre comunicativo. 
Dessa forma, o autor subordina a competência gramatical à competência co- 
municativa, que implica "a habilidade de escolher, dentre uma variedade de falas pos- 
síveis, aquela que é mais apropriada para a situação (...) a competência consiste numa 
variedade de habilidades, incluindo conhecimento gramatical, mas sem se re- duzir a 
esse" (op. cit p.53). Ainda na visão do linguista, diferentes línguas refletem diferentes 
mundos e isso implica um certo relativismo linguístico, que, em seu grau máximo, nos 
remete à hipótese de Sapir-Whorf (discutida na seção anterior). Como características 
desse relativismo, destacam-se: que ele se baseia em um princípio de diversidade e 
heterogeneidade ao invés de homogeneidade ou invariância; que os aspectos a priori 
e universais da língua não são suficientes e que não há igualdade 
15 
 
 
linguística entre os falantes (devido, por exemplo, à natureza política da interação) (cf. 
Figueroa 1994: 42). 
Novamente aqui percebemos em evidência o caráter heterogêneo da língua 
permeando a relação linguagem e sociedade. Em síntese: ao atribuir relevância ao 
contexto social/cultural como constitutivo da realidade linguística, Hymes não deixa de 
operar com um certo determinismo. Só que, diferentemente de Sapir e Whorf o autor 
não prevê que a linguagem cria o contexto, mas que diferentes contextos moti- vam 
diferentes linguagens. Seria um tipo de determinismo sócia 
 
3.2 Labov 
 
 
Fonte: english.osu.edu 
 
 
Em relação à teoria laboviana, dois aspectos principais merecerão nossa aten- 
ção: o contexto social (sociedade) traduzido pela noção de comunidade de fala e (os 
condicionamentos sociais e estilísticos. 
 
3.3 A noção de comunidade de fala 
 
Labov propõe "o estudo da estrutura e da evolução da língua dentro do contexto 
social da comunidade de fala "(1972: 184 grifos meu). Interessa a ele, sobretudo, um 
16 
 
 
certo tipo de macro linguística, que "coloca os lócus da linguagem em algum tipo de 
ordem social (a comunidade de fala) ao invés do indivíduo" (Figueroa 1994: 70). 
A preocupação de Labov com a fala da comunidade fica patente em sua defi- 
nição de linguagem como "o instrumento de comunicação utilizado por uma comuni- 
dade de fala, um sistema comumente aceito de associações entre formas arbitrárias 
e seus significados" (Labov 1994: 09). 
Daí a questão: quais os limites que fazem com que um falante pertença a uma 
determinada comunidade de fala e não a outra? Para o socio linguista, os limites não 
estão presentes no fato de um falante se considerar pertencente a uma dada comuni- 
dade, mas sim nas características essenciais - as regras gramaticais - do sistema 
linguístico abstrato daquele falante, em relação à comunidade a que pertence. 
A aquisição desse sistema linguístico não se dá conscientemente, ou seja, não 
diz respeito à vontade do falante de falar de determinada forma; a aquisição da gra- 
mática ocorre de forma inconsciente, como também são também inconscientes, em 
grande parte, as reações subjetivas dos falantes em relação à língua. 
Além disso, para o autor, a característica principal da comunidade de fala está 
no fato de que seus integrantes devem compartilhar as mesmas atitudes e os mesmos 
valores em relação à língua: "atitudes sócias em relação à língua são extremamente 
uniformes numa comunidade de fala" (Labov 1972: 248). Guy (2001), com base em 
Labov, aponta três características essenciais na definição de uma comunidade de fala 
6: os falantes devem compartilhar traços linguísticos que sejam diferentes de outros 
grupos; devem ter uma frequência de comunicação alta entre si; e devem ter as mes- 
mas normas e atitudes em relação ao uso da linguagem. 
Entretanto, a identificação de uma comunidade de fala, ou o estabelecimento 
de seus limites, não é uma tarefa fácil, o que pode ser ilustrado pelo seguinte exemplo 
fornecido pelo autor: há diferenças entre o falar dos nativos de Fortaleza e de Floria- 
nópolis em relação aos três aspectos colocados acima, o que permite distinguir duas 
comunidades de fala; contudo, ao se considerar Brasil e Portugal, provavelmente os 
nativos de Fortaleza e de Florianópolis integrariam uma mesma comunidade de fala. 
17 
 
 
Guy levanta então algumas questões: quais seriam os limites internos de uma comu- 
nidade? Até que ponto uma comunidade de fala seria caracterizada pelo uso linguís- 
tico? 
Guy considera aspectos quantitativos e qualitativos para limitar uma comuni- 
dade de fala. Quanto aos primeiros, tem-se como exemplo a frequência com que uma 
certa comunidade apaga o -r final no português brasileiro. Isso teria uma implicação 
(e motivação) social e dialetal, mas, também, poderia ser motivado pelo efeito de con- 
texto', havendo uma grande frequência de apagamento do -r final em verbos no infini- 
tivo para quase todos os brasileiros, diferentemente do apagamento do -r final em 
outras palavras. 
Avançando em suas reflexões, o linguista aponta duas possibilidades: pode ha- 
ver diferenças de frequência em diferentes comunidades de fala, sendo que o efeito 
de contexto permanece semelhante; ou pode haver diferenças em termos do efeito de 
contexto (peso relativo) entre as comunidades, o que determinaria diferenças estrutu- 
rais ao invés de diferenças simplesmente quantitativas. Assim, a sua hipótese é: fa- 
lantes que variam apenas na frequência possuem a mesma gramática e falantes que 
variam em termos de efeito de contexto possuem gramáticas diferentes. 
Daí os limites postos por Guy: as diferenças em uma mesma comunidade de 
fala implicam diferenças em uma mesma gramática (não-gramaticais) enquanto que 
diferentes comunidades de fala fazem uso dediferentes gramáticas. Essa hipótese 
lançada por Guy não só encontra respaldo nos pressupostos labovianos - pois, con- 
forme visto acima, Labov considera que os limites de uma comunidade de fala devem 
ser buscados no sistema linguístico abstrato dos falantes, além do compartilhamento 
de atitudes sociais -, como também operacionaliza uma forma de medir o partilha- 
mento de traços linguísticos pelos falantes. Diante do exposto parece possível falar 
em um certo determinismo linguístico, uma vez que usos linguísticos de uma mesma 
gramática funcionariam como identificadores de uma mesma comunidade de fala, ao 
passo que usos de gramáticas diferentes apontariam para diferentes comunidades de 
fala. Em outras palavras, a estrutura gramatical estaria delineando a comunidade de 
fala. As bases para a identificação de uma comunidade de fala seriam, nesse sentido, 
de natureza linguística'. 
18 
 
 
ORALIDADE E ESCRITA 
 
 
A relação entre a oralidade e a escrita é tema de estudo de várias áreas de 
conhecimento e, dependendo da abordagem escolhida, esses termos podem apare- 
cer em uma relação de oposição ou de integração. A oposição entre escrita e oralidade 
foi utilizada como a grande divisão que separa as sociedades históricas e pré-históri- 
cas, civilizadas e selvagens. Os etnólogos que estudaram os costumes ameríndios, 
africanos e dos habitantes da Oceania mostraram que a narrativa mítica sempre pre- 
valeceu sobre a análise lógica, os rituais de iniciação sobre as transmissões formais, 
o ver fazer e o ouvir dizer sobre o procedimento científico. Contudo, a crença de que 
a oralidade induziria a um pensamento pré-lógico deixou de ser dominante após o fim 
do colonialismo. 
A Psicologia, por sua vez, descreveu a gênese das funções psicológicas e sim- 
bólicas, analisando como o discurso oral de uma criança se transforma em discurso 
interior, isto é, em pensamento. Esse processo acontece tanto com crianças que vi- 
vem em sociedades ágrafas (sem escrita) quanto com crianças que convivem cotidi- 
anamente com a escrita. Já a Sociologia analisou a face oculta da cultura escolari- 
zada, os saberes inscritos em redes de poder, a violência simbólica das classificações 
eruditas vinculadas exclusivamente ao domínio da escrita. 
A existência da escrita acarreta várias consequências na construção de regis- 
tros, na mudança de lugares de poder e nos sistemas de funcionamento da sociedade. 
A escrita modifica o sistema jurídico (contrato escrito versus palavra dada), confere à 
pessoa instruída autoridade sobre o iletrado –, mas não anula as culturas populares 
em que persistem tradições orais e transmissões práticas. A oposição popular/erudito, 
que reduz a cultura escrita aos discursos teóricos mais formais, esquece que os letra- 
dos também falam e que, simultaneamente ao uso da escrita, a oralidade é uma mo- 
dalidade fortemente presente nas interações sociais. 
A oposição oralidade/escrita aponta não só as distâncias e transferências entre 
a voz e a letra, mas também sua coexistência instável nas diversas interações sociais 
que praticamos. As novas mídias que circulam na sociedade e na escola mesclam 
recursos orais, verbais e visuais, colocando em questão as grandes divisões entre o 
19 
 
 
que constitui as especificidades da escrita e as da oralidade. As mídias audiovisuais 
nos habituam a considerar como oral o que é uma escrita falada: apresentadores de 
rádio e televisão leem textos previamente elaborados; palestrantes e conferencistas 
também preparam suas falas por escrito, mas é preciso dar a esses usos da palavra 
a aparência de uma expressão oral espontânea. 
A escola trabalha com uma cultura escrita, com dispositivos que são organiza- 
dos pela escrita, como livros, cadernos, fichários, quadros e tabelas. Os escritos que 
circulam nesses materiais acabam conduzindo a um modo de se expressar e pensar 
que é nutrido pelo modelo escrito e pelos poderes da escrita. No entanto, a escola é, 
além disso, espaço de encontro de culturas da oralidade, quando os alunos produzem 
textos orais de sua tradição familiar e de seus grupos de convivência, quando diferen- 
tes falares convivem no espaço escolar, quando muitos conhecimentos são transmiti- 
dos pela via da oralidade. A presença de escritos na vida social ou escolar e as tec- 
nologias têm modificado as fronteiras entre a escrita e a oralidade: fala-se a distância 
(por telefone), a pessoas ausentes (recados na secretária eletrônica); dialoga-se por 
escrito (através de emails, chats, tweets). O oral passa a deixar seus traços em regis- 
tros escritos e os numerosos escritos podem ser efêmeros como a fala. A grande di- 
ferença entre os modos de funcionamento oral e escrito deve ser relativizada quando 
as sociedades se tornam letradas. Além disso, a existência da escrita não é marco 
para estabelecer o fim de algumas práticas sociais que ocorrem numa cultura típica 
da oralidade. 
 
 
 
AS LÍNGUAS DO BRASIL 
 
 
No Brasil se fala português, certo? Sim, esse é o idioma falado pela maioria das 
pessoas que aqui vivem. No entanto, em nosso território convivem falantes de línguas 
indígenas, de imigração, de fronteira e de sinais. Em razão das relações entre seus 
falantes, essas línguas influenciam-se e modificam-se. Nós figuramos entre os países 
de maior diversidade linguística do mundo. Estima-se que cerca de 250 línguas 
20 
 
 
são faladas no país, entre línguas indígenas, de imigração, de sinais e de comunida- 
des afro-brasileiras. 
De acordo com o levantamento do Censo Demográfico de 2010, do Instituto 
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 274 línguas são faladas por indígenas de 
305 etnias diferentes. No entanto, esse resultado foi considerado inflacionado por in- 
cluir nomes de etnias ou mesmo línguas que já não são mais faladas. “Temos apenas 
uma estimativa do número de línguas faladas no Brasil. Em relação às línguas indíge- 
nas, os dados do Censo são maiores daqueles que os pesquisadores costumam re- 
produzir, que é em torno de 180 línguas indígenas. Além dessas pesquisas mostram 
que há 56 línguas faladas por descendentes de imigrantes que vivem no Brasil há pelo 
menos três gerações”, diz Rosângela Morello, coordenadora-geral do Instituto de In- 
vestigação e Desenvolvimento em Política Linguística (Ipol). 
 
 
 
 
Com tanta diversidade, o Brasil tem suas particularidades linguísticas, já que 
as línguas são objetos históricos e estão sempre relacionadas aos seus falantes. A 
maioria da população brasileira é monolíngue, isto é, fala apenas o português, que é 
a sua língua materna e também a língua franca, oficial e nacional do país. 
Contudo, não é possível dizer que somos um país monolíngue, já que temos 
cenários multilíngues, ou seja, grupos populacionais que falam línguas maternas dife- 
rentes, mas são capazes de se comunicar em outra língua. Há também grupos que 
21 
 
 
além de suas línguas maternas utilizam outras línguas para a comunicação, como 
ocorre em São Gabriel da Cachoeira (AM), onde convivem falantes de quatro línguas 
oficiais: português, nheengatu, tucano e baníua. 
 
 
Fonte: plataformadoletramento.org.br 
 
 
“As três possibilidades – monolinguismo, multilinguismo e plurilinguismo – se 
entrelaçam no Brasil, mas podemos afirmar que o Brasil é um país multilíngue que 
inclui espaços onde há plurilinguismo. Por sua vez, o país tem uma única língua oficial 
e nacional, que é a língua portuguesa", analisa Eduardo Guimarães, professor de Se- 
mântica do Departamento de Linguística do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) 
da Universidade de Campinas. “Há cidades em que se fala outra língua, mas normal- 
mente é o português que sempre predomina no espaço de línguas das cidades. Os 
mecanismos de ensino de línguas são elementos decisivos no modo de distribuição e 
funcionamento das línguas. ” 
http://www.plataformadoletramento.org.br/
22 
 
 
 
 
Fonte: .plataformadoletramento.org.brApesar da enorme diversidade linguística no Brasil, a relação dos falantes e de 
suas línguas é desigual em comparação à língua portuguesa. A percepção dominante, 
inclusive, é de que aqui se fala apenas uma língua. Considerando a importância de 
conhecer essa diversidade e de preservar tantas línguas com alto risco de desapare- 
cimento, foi criado, por meio do Decreto Federal 7.387/2010, que institui o Inventário 
Nacional da Diversidade Linguística (INDL), um instrumento para inserir as línguas 
como referência cultural brasileira, administrado pelo Instituto do Patrimônio Histórico 
e Artístico Nacional (Iphan). 
http://www.plataformadoletramento.org.br/
23 
 
 
 
 
Fonte: plataformadoletramento.org.br 
 
 
“O contingente populacional que fala outras línguas é numericamente pouco 
expressivo em relação ao quantitativo de falantes de português. Esse desequilíbrio, 
sobretudo das línguas indígenas e das línguas de imigração, torna o português uma 
espécie de ameaça à preservação dessas outras línguas, pois o português é o veículo 
por excelência de comunicação em todos os campos da nossa sociedade. Isso leva 
ao desestímulo e ao paulatino abandono da utilização das línguas maternas”. 
http://www.plataformadoletramento.org.br/
24 
 
 
 
 
Fonte: plataformadoletramento.org.br 
 
 
 
 
OS CONDICIONAMENTOS SOCIAIS E ESTILÍSTICOS' 
 
 
Weinreich, Labov e Herzog (1968), ao postularem a noção de comunidade de 
fala, a justificam em termos de que "as estruturas variáveis contidas na língua são 
determinadas por funções sociais" (p.188 grifo meu), destacando que "fatores linguís- 
ticos e sociais estão fortemente inter-relacionados no desenvolvimento de uma mu- 
dança linguística"(op. dt). Nessa mesma direção, Labov (1972) aponta como uma das 
propriedades de uma variável sociolinguística que a "distribuição do traço deve ser 
altamente estratificado"(p. 08). Observa-se, assim, uma correlação sistemática entre 
a estratificação social e o uso variável da língua. 
Segundo Figueroa, Labov "mantém a posição realista de que o contexto social 
é formado por fatos sociais que atuam sobre o indivíduo, mas que não são criados 
pelo indivíduo", entendendo como fato social "uma forma de comportamento, que é 
geral na sociedade e exerce condicionamento sobre os indivíduos; mas esse condici- 
onamento é peculiar em termos de geralmente ser inconsciente e, portanto, não poder 
agir diretamente" (p. 72). 
http://www.plataformadoletramento.org.br/
25 
 
 
Nos moldes labovianos, através da linguagem é possível tirar "um retrato" da 
realidade social. Em outras palavras, o indivíduo se identifica ao falar ("função de iden- 
tificação", cf. Labov 1978). Desse modo, o determinismo soda/preconizado por Wein- 
reich, Labov e Herzog (1968) estaria mantido. Mas isso deve ser visto com reservas 
diante de indagações como: até que ponto se pode dizer que o uso de certa estrutura 
linguística define o grupo ao qual a pessoa "genuinamente" pertenceria? O uso "cons- 
ciente" do [r] em posição pós-vocálica pelos empregados da loja de padrão alto, por 
exemplo, não identifica necessariamente as características sociais "naturais" do fa- 
lante, podendo esse ser "enquadrado" em um grupo social diferente daquele ao qual 
realmente pertence. 
Assim, através do uso "consciente" de certas formas, o falante" pode mostrar 
características sociais tais que lhe permitam ser "identificado" como pertencendo a um 
grupo X (embora de fato pertença ao grupo Y), e isso romperia com a perspectiva 
determinística de que o contexto social determina a linguagem. Essa questão, entre- 
tanto, deve ser examinada sob a ótica da variação estilística, o que será discutido 
adiante. 
Por outro lado, Weiner & Labov (1983) mostram, em seu estudo da passiva 
sem agente, que a variação entre o uso da construção passiva e da ativa em inglês 
não é sensível a fatores sociais, sendo condicionado apenas por fatores de natureza 
linguística. Nesse caso, uma das exigências originariamente formuladas para se ca- 
racterizar uma variável linguística - a de que a mesma fosse estratificada -, deixou de 
ser atendida. Como fica, então, a questão do condicionamento social, nesse caso? 
Para Labov (1972), os indivíduos variam seu modo de falar conforme a situação em 
que se encontram", considerando a relação entre diferentes estilos (informal, cuidado, 
de leitura, etc.) e diferentes usos linguísticos, no que diz respeito especialmente à 
atenção e ao monitoramento 
Retomando o exemplo anterior, o uso do [r] pelos Working Papear em linguís- 
tica, UFSÇ N.8,2004 136 - Cristine Gorski Severo diferentes grupos sociais mostram 
também a relação entre fatores estilísticos (fala cuidada ou não) e a pronúncia ou não 
da vibrante. Nesse caso, teríamos o que Labov (1978) chama de "função de acomo- 
26 
 
 
dação"" da linguagem, em que o falante se adequa à situação comunicativa. Posteri- 
ormente, Labov (2003) amplia sua noção de variação estilística, postulando que as 
variações linguísticas no indivíduo de acordo com o contexto, são determinadas por 
três aspectos: as relações entre os interlocutores, particularmente as relações de po- 
der e solidariedade entre eles; o contexto social mais amplo - escola, trabalho, vizi- 
nhança; e o tópico" (p234). Desse modo, a par de condicionamentos sociais (normal- 
mente inconscientes), que podem ser observados na comunidade de fala, existem 
também condicionamentos estilísticos, que operam no plano individual, no âmbito das 
escolhas linguísticas conscientes. 
Apesar de a noção de sociedade e suas implicações ser explorada de forma 
diferenciada pelos autores aqui discutidos, com enfoque ora em aspectos concernen- 
tes à realidade social; ora no contexto histórico social e no conceito de competência 
comunicativa; ora na noção de comunidade de fala, estratificação social e estilo, pa- 
rece possível abstrair as especificidades de enfoque e tecer considerações de caráter 
comparativo mais geral entre os autores e suas respectivas visões de linguagem e 
sociedade, na tentativa de evidenciar qual o tipo de relação que permeia o binômio 
em questão, a partir de uma hipótese determinística. 
Na formulação de Sapir-Whorf, a maneira pela qual a linguagem determina for- 
mas de percepção do mundo e o próprio mundo é identificada na literatura como de- 
terminismo linguístico. Todavia, o desencontro entre linguagem e cultura em termos 
de evolução (mudança), conforme apontado por Sapir, é um indício de que tal deter- 
minismo deve ser amenizado. 
Na proposta de Hymes, o papel atribuído à influência do contexto social/cultural 
sobre os usos linguísticos parece apontar para a direção do que se poderia chamar 
de um certo determinismo social- originado pelo contexto. O falante seria dotado de 
competência comunicativa para se adequar linguisticamente a diferentes situações 
comunicativas. Pode-se dizer que esse mesmo tipo de relação entre contexto e lin- 
guagem sustenta o que Labov chama de condicionamento estilístico. Contudo, dife- 
rentemente de Hymes, que prioriza o contexto, Labov considera a função de "acomo- 
dação" como secundária, o que parece colocar em segundo plano a importância das 
interações sociais no uso linguístico. 
27 
 
 
Esse aparente paradoxo deve-se ao fato de que o papel de adequação ao 
contexto cabe ao indivíduo. Na teoria sociolinguística de Labov, percebem-se implica- 
ções determinísticas de diferentes tipos e em diferentes graus. Ao caracterizar a co- 
munidade de fila-os lócus do objeto de estudo variacionista -, o autor atribui um im- 
portante papel à língua (uma mesma gramática recobrindo usos variáveis implica uma 
mesma comunidade de fala, segundo Guy), de tal modo que uma comunidade de fala 
poderia ser delimitada por certos usos linguísticos, entre outras propriedades (um 
certo determinismo linguístico). 
 
 
Fonte: opera10.com.br 
 
 
Por sua vez, os falantes de uma comunidadeoperam com regras linguísticas 
variáveis, e a seleção das variantes pode ser socialmente condicionada por fatores 
que dizem respeito à estratificação social (um certo determinismo social). A escolha 
das variantes pode ser também estilisticamente condicionada por fatores de natureza 
contextuai (um certo determinismo linguístico). Concluindo, tento responder, em ter- 
mos amplos, as questões colocadas na introdução do trabalho: a sociedade determina 
a linguagem" - do ponto de vista do contexto e da estratificação social e estilo, segundo 
Hymes e Labov, respectivamente; a linguagem determina a sociedade - na produção 
e representação da realidade social e na delimitação de uma comunidade de fala, de 
acordo com Sapir-Whorf e Labov (Guy), respectivamente; as relações entre linguagem 
28 
 
 
e sociedade são permeadas por um certo determinismo nas três perspectivas WORI- 
CING PAPERs EM LINGÜÍSTICA, UFSÇ N.8, 2004 138 - Cristine Gorski Severo aqui 
analisadas, sendo que há uma aproximação maior entre as postulações de Hymes e 
Labov. Esse determinismo parece atuar unilateralmente em Sapir e Whorf (linguagem 
à realidade social) e em Hymes (contexto social à linguagem), mas parece ser bilateral 
em Labov (fatores sociais e estilísticos à linguagem; e linguagem à comunidade de 
fala). Daí a indagação que fica em suspenso: não haveria em Labov uma certa dialé- 
tica? 
 
 
 
PLURALIDADE LINGUÍSTICA 
 
 
A língua não é, como muitos acreditam, uma entidade imutável, homogênea, 
que paira por sobre os falantes. Pelo contrário, todas as línguas vivas mudam no de- 
correr do tempo e o processo em si nunca para. Ou seja, a mudança linguística é 
universal, contínua, gradual e dinâmica, embora apresente considerável regularidade. 
A crença em uma língua estática e imutável está ligada principalmente à nor- 
matividade da gramática tradicional, que remota à Grécia Antiga, numa época em que 
os estudiosos estavam interessados principalmente em explicar a linguagem usada 
nos textos dos autores clássicos e em preservar a língua grega da "corrupção" e do 
"mau uso". A língua escrita - especialmente a dos clássicos - era tão valorizada que 
era considerada mais pura, mais bonita e mais correta do que qualquer outro tipo de 
linguagem. 
A linguística moderna, no entanto, prioriza a língua falada em relação à língua 
escrita por vários motivos, dentre eles pelo fato de que todas as sociedades humanas 
conhecidas possuem a capacidade da fala, mas nem todas possuem a escrita. Anali- 
sando a nossa própria sociedade, podemos concluir que a escrita pertence a poucos, 
uma vez que grande parte da população brasileira é constituída por analfabetos ou 
semianalfabetos e que mesmo os que tiveram acesso à escola não a usam muito. 
29 
 
 
Além da língua falada ser mais utilizada do que a escrita e atingir muito mais 
situações, o ser humano a adquire naturalmente, sem precisar de treinamento espe- 
cial. Apenas em contato com o modelo, ou seja, apenas exposta a uma determinada 
língua, qualquer criança normal é capaz de falar essa língua e compreendê-la perfei- 
tamente nas mais variadas situações e em um período de tempo muito curto. Aos três 
anos, mais ou menos, uma criança já adquiriu quase todas as regras de sua língua, 
podendo ser considerada um falante competente da comunidade linguística da qual 
faz parte. Mesmo quando parece que ela não conhece a sua língua nativa, o dizer, por 
exemplo, "eu di" ou "eu fazi" no lugar de "eu dei" e "eu fiz", a criança está mos- trando 
que sabe muito sobre ela, pois já compreendeu que o passado, no português, termina 
regularmente com "i" e está aplicando uma regra geral da língua em vez de aplicar 
uma particular. 
O processo de aquisição da escrita difere do da fala no sentido de não ser 
natural. Crianças que têm mais contato com a escrita sem dúvida a aprendem mais 
fácil e rapidamente, mas ainda assim necessitam de algum tipo de instrução. Quanto 
à homogeneidade, as pessoas de uma mesma comunidade linguística podem até pen- 
sar que falam exatamente a mesma língua, mas isso não é verdade. As diferenças 
linguísticas podem ser percebidas em todas as línguas do mundo, mesmo em peque- 
nas comunidades de fala, nos níveis fonéticos, fonológico, morfológico, sintático ou 
semântico. Por exemplo, a palavra "porta" pode ser pronunciada de várias maneiras, 
tais como poxta, pota ou pôrta; a palavra "mulher" pode ser pronunciada "muié"; as 
frases "Maria assistiu ao filme" e "faz dois anos que parei de fumar" também podem 
ser ditas "Maria assistiu o filme" e "fazem dois anos que parei de fumar", respectiva- 
mente. 
Na verdade, toda língua é um conjunto heterogêneo e diversificado porque as 
sociedades humanas têm experiências históricas, sociais, culturais e políticas diferen- 
tes e essas experiências se refletirão no comportamento linguístico de seus membros. 
A variação linguística, portanto, é inerente a toda e qualquer língua viva do mundo. 
Isso significa que as línguas variam no tempo, nos espaços geográfico e social e tam- 
bém de acordo com a situação em que o falante se encontra. 
30 
 
 
Podemos exemplificar a variação temporal com a forma "você", que passou por 
uma grande transformação ao longo do tempo. No século XII, as pessoas diziam 
"vossa mercê" e hoje, na linguagem falada, e mesmo na escrita informal, encontramos 
"cê", que não é a melhor nem a pior que "você" ou "vossa mercê", embora entre os 
não-linguistas a tendência seja a de considerá-la ruim, feira ou deteriorada. Isso acon- 
tece porque a sociedade normalmente é conservadora e demora para aceitar as mu- 
danças, inclusive as linguísticas. 
O espaço linguístico também produz variação em um momento sincrônico de 
uma língua, o que pode ser explicado tanto pela existência de limites físicos como 
montanhas, mares ou rios que separam uma comunidade linguística de outra, como 
pela ideia de "rede de comunicação". Considerando-se uma população espalhada em 
um determinado espaço geográfico, uma pessoa se comunicará mais com aqueles 
que estão mais próximos a ela do que com as que se encontram mais distantes. Ha- 
verá, assim, um padrão de maior densidade de comunicação entre os indivíduos que 
estão mais próximos e de menor densidade de comunicação entre os que se encon- 
tram mais distantes. A maior densidade provocará maior interação entre as pessoas 
e, consequentemente, as formas linguísticas de uns se estenderão aos membros do 
grupo mais denso (que estão mais próximos) do que aos membros dos agrupamentos 
mais distantes. Aparecerão, dessa maneira, em cada região, diferentes variedades. 
No Brasil, por exemplo, a fala da região nordestina se caracteriza pela abertura das 
vogais pretônicas "e" e "o", como em "mérgulho" e "cólete", normalmente fechadas em 
outras regiões. Há lugares onde se diz ‘’tomati’’, pimênta e kaska. 
As variações também podem ser notadas nas estruturas sintáticas ou no nível 
lexical. Assim, conforme a região, encontramos "nós fomos ir embora" em vez de "nós 
fomos embora" e a banana pode ser "anã", "nanica" ou "d'água". 
31 
 
 
 
 
Fonte: descomplica.com.br 
 
 
A densidade de comunicação também pode explicar as variedades linguísticas 
que existem entre os diferentes grupos sociais, uma vez que cada um formará a sua 
própria rede de comunicação. Assim, sociedades rurais e urbanas são importantes 
fatores sociais, bem como sexo, idade, escolaridade, classe socioeconômica, dentre 
outros. Sabemos, por exemplo, que pessoas que vivem nas áreas urbanas falam va- 
riedades diferentes dos falantes do meio rural, onde são comuns formas como "nóis 
vai" ou "eles prantô" em oposição às formas padrão "nós vamos" e "eles plantaram", 
mais características das regiões urbanas. 
As mulheres, por outro lado, são linguisticamente mais conservadoras e geral- 
mente mais sensíveis à norma culta do que os homens, além de usarem expressões 
e até entonações mais associadasà feminilidade, enquanto os homens, de modo ge- 
ral, distanciam-se da norma padrão e usam formas que acentuam sua masculinidade. 
Segundo Possenti, "muitos meninos não podem usar a chamada linguagem correta 
na escola, sob pena de serem marcados pelos colegas, porque em nossa sociedade 
a correção é considerada uma marca feminina". Os grupos etários também diferem 
linguisticamente: os mais jovens, por exemplo, tendem a ser menos conservadores 
que os mais velhos e isso se refletirá na sua maneira de falar. 
A escolaridade também é um fator muito relevante na questão da variação lin- 
guísticas e, em nosso país, está diretamente relacionada à classe socioeconômica, 
32 
 
 
porque os que têm acesso à escola pertencem, de modo geral, ao grupo socioeconô- 
mico mais privilegiado. Dessa maneira, as pessoas pertencentes aos estratos sociais 
mais altos tendem a usar mais as formas padrão do português do que aquelas dos 
grupos menos privilegiados e menos escolarizados. 
A língua varia, ainda, de acordo com a situação em que o falante se encontra. 
Situações formais exigem uma variedade de língua mais cuidada, uma vez que a so- 
ciedade impõe certas regras sociais - e, consequentemente, linguísticas - que espera 
ver cumpridas, e que qualquer desrespeito a essas regras pode provocar não só o 
constrangimento ao falante como também a sua não-aceitação pelo grupo. Linguisti- 
camente, porém, todas as formas associadas a grupos sociais e a diferentes situações 
são igualmente perfeitas. Nenhuma é melhor, ou mais correta ou mais bonita que ou- 
tra, embora umas tenham prestígio social e outras não tenham, e embora algumas 
possam ser mais adequadas a certas situações sociais que outras. 
A aceitação ou não de certas formas linguísticas por parte da comunidade fa- 
lante está relacionada com o significado social que lhe é imposto pelo grupo que as 
usam, ou seja, estão relacionadas com o conjunto de valores que simbolizam e que 
se uso comunica. Algumas variedades são estigmatizadas ou ridicularizadas não por- 
que são feias, incorretas ou ruins em si, mas porque a sociedade, preconceituosa- 
mente, associa seu uso a situações e/ou grupos sociais com valores negativos. Cien- 
tificamente, porém, todas as variedades de uma língua qualquer são igualmente con- 
sideradas, porque possuem uma gramática, ou seja, todas possuem regras, todas têm 
organização e todas são funcionais. 
A escola, de modo geral e tradicionalmente, tem desconsiderado a questão da 
variação linguística e dos usos das variedades pela comunidade falante, o que é bas- 
tante grave, já que muito do que é classificado como problema de fala e escrita, prin- 
cipalmente na alfabetização, está diretamente relacionado ao fenômeno. O professor 
alfabetizador, geralmente imbuído dos conceitos da gramática tradicional, atribui va- 
lores de certo e errado aos textos de seus alunos, desconsiderando que as crianças, 
nesta fase, além de não possuir o domínio do sistema gráfico e das complexidades 
que lhe são características, tende a escrever conforme o seu dialeto regional e/ou 
social. 
33 
 
 
Mattoso Câmara Jr., em um artigo denominado "Erros de escolares como sin- 
tomas de tendências linguísticas no português do Rio de Janeiro", apresenta resulta- 
dos parciais de análises de textos em que mostra que a oralidade e a percepção fo- 
nética estão presentes na produção escrita dos alunos. 
Luiz Carlos Cagliari, em Alfabetização e linguística, afirma que as crianças re- 
lacionam a fala e a escrita ortográfica a todo momento e que seus erros não são frutos 
de distração, irreflexão ou descuido. Para ele, os alunos aprendem a escrever produ- 
zindo textos espontâneos, aplicam nessa tarefa um trabalho de reflexão muito grande 
e se apegam a regras que revelam usos possíveis do sistema de escrita do português. 
Essas regras são tiradas dos usos ortográficos que o próprio sistema de escrita tem 
ou de realidades fonéticas, num esforço da criança para aplicar uma relação entre 
letra e som que nem sempre é previsível, mas que também não é aleatória.3 
 
 
 
TIPOS DE VARIEDADES LINGUÍSTICAS 
 
 
Variedades geográficas 
 
 
Varia conforme o lugar, a região ou pais em que é desenvolvida. As mudanças 
de tipo geográfico se chamam dialetos. Diz-se que uma língua é um conjunto de dia- 
letos cujos falantes podem se entender. 
Exemplos: “menino” é dito no Sudeste.” Guri” para os gaúchos e “piá” para os 
paranaenses. 
 
Variedades históricas 
 
Ela varia com o tempo, com o desenvolvimento da história. Como por exemplo, 
a palavra “Você”, que antes era “vosmecê” e que agora, diante da linguagem reduzida 
no meio eletrônico, é apenas “VC”. 
 
 
3 Texto adaptado: www.scielo.br 
http://www.scielo.br/
34 
 
 
Variedades sociais 
 
Os fatores podem variar dependendo da classe social, educação (alfabetizado 
e analfabeto), profissão (médico e economista), idade (criança e idoso), procedência 
étnica, etc. É aquela pertencente a um grupo específico de pessoas. 
Gírias usadas por grupos como jogadores de “games”, surfistas etc. Temos a 
linguagem coloquial, usada no dia a dia das pessoas; Jargões usados por profissio- 
nais como médicos, técnicos de informática, advogados e a linguagem formal, usada 
pelas pessoas que tem uma maior classe social. 
Variedades situacionais 
 
Incluem as modificações na linguagem decorrentes do grau de formalidade da 
situação ou das circunstâncias em que se encontra o falante. Ocorre de acordo com 
o contexto o qual está inserido, por exemplo, as situações formais e informais. 
Exemplo: Conversa em uma rede social será informal. Em uma entrevista de 
emprego será formal 
E você, qual o concurso você vai fazer? Deixe um comentário para mim, pois 
posso fazer postagens direcionadas para ele e te ajudar mais. Aproveita também para 
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4 Texto extraído: www.centraldefavoritos.com.br 
http://www.centraldefavoritos.com.br/
35 
 
 
 
 
Fonte: mscamp.wordpress.com 
 
 
 
 
PRECONCEITO LNGUÍSTICO E PRÁTICAS DISCURSIVAS ESCOLARES 
 
 
O termo preconceito designa uma atitude prévia que assumimos diante de uma 
pessoa (ou de um grupo social), antes de interagirmos com ela ou de conhecê-la, uma 
atitude que, embora individual, reflete as ideias que circulam na sociedade e na cultura 
em que vivemos. Assim como uma pessoa pode sofrer preconceito por ser mulher, 
pobre, negra, indígena, homossexual, nordestina, deficiente física, estrangeira etc., 
também pode receber avaliações negativas por causa da língua que fala ou do modo 
como fala sua língua. 
O preconceito linguístico resulta da comparação indevida entre o modelo idea- 
lizado de língua que se apresenta nas gramáticas normativas e nos dicionários e os 
modos de falar reais das pessoas que vivem na sociedade, modos de falar que são 
muitos e bem diferentes entre si. Essa língua idealizada se inspira na literatura con- 
sagrada, nas opções subjetivas dos próprios gramáticos e dicionaristas, nas regras da 
gramática latina (que serviu durante séculos como modelo para a produção das 
gramáticas das línguas modernas) etc. No caso brasileiro, essa língua idealizada tem 
36 
 
 
um componente a mais: o português europeu do século XIX. Tudo isso torna simples- 
mente impossível que alguém escreva e, principalmente, fale segundo essas regras 
normativas, porque elas descrevem e, sobretudo, prescrevem uma língua artificial, 
ultrapassada, que não reflete os usos reais de nenhuma comunidade atual falante de 
português, nem no Brasil, nem em Portugal, nem em qualquer outro lugar do mundo 
onde a língua é falada. 
Mas a principal fonte de preconceito linguístico, no Brasil, está na comparação 
que as pessoas da classe média urbana das regiões mais desenvolvidas fazem entre 
seu modo de falar e o modo de falar dos indivíduos de outras classes sociais e das 
outras regiões.Esse preconceito se vale de dois rótulos: o “errado” e o “feio” que, 
mesmo sem nenhum fundamento real, já se solidificaram como estereótipos. Quando 
analisado de perto, o preconceito linguístico deixa claro que o que está em jogo não 
é a língua, pois o modo de falar é apenas um pretexto para discriminar um indivíduo 
ou um grupo social por suas características socioculturais e socioeconômicas: gênero, 
raça, classe social, grau de instrução, nível de renda etc. 
A instituição escolar tem sido há séculos a principal agência de manutenção e 
difusão do preconceito linguístico e de outras formas de discriminação. Uma formação 
docente adequada, com base nos avanços das ciências da linguagem e com vistas à 
criação de uma sociedade democrática e igualitária, é um passo importante na crítica 
e na desconstrução desse círculo vicioso. 
 
 
 
O ENSINO DAS VARIAÇÕES LINGUÍSTICAS E MULTICULTURAIS NOS ANOS 
INICIAIS 
 
 
As aulas de Língua Portuguesa costumam centrar-se no ensino da gramática, 
ensinando centenas de regras, que muitas vezes se distanciam da realidade dos fa- 
lantes brasileiros. Com isso, causam certa antipatia por parte dos estudantes, pois 
eles se sentem como aprendizes de um idioma estrangeiro que, por mais que se es- 
forcem, dificilmente chegarão à fluência. Para Antunes (2003, p. 40): 
37 
 
 
O conhecimento teórico disponível a muitos professores, em geral, se limita 
a noções e regras gramaticais apenas, como se tudo o que é uma língua em 
funcionamento coubesse dentro do que é uma gramática. Teorias linguísticas 
do uso da prosódia, de morfossintaxe, da semântica, da pragmática, teorias 
do texto, concepções de leitura, de escrita, concepções, enfim, acerca do uso 
interativo e funcional das línguas, é o que pode embasar um trabalho verda- 
deiramente eficaz do professor de português. 
 
Para Terra (2008), “a gramática normativa apresenta características semelhan- 
tes aos códigos de natureza ética ou moral, que nos impõem o que devemos ou não 
fazer, o que é permitido e o que é proibido” (Terra, 2008, p 53). Sendo assim, parece 
tornar o ensino autoritário e descontextualizado com a prática linguística de muitos 
estudantes, que têm que decorar as regras para realização de uma prova, mas que, 
na sua vida, muitas delas não serão utilizadas. De que adianta ter centenas de regras 
gramaticais, as quais não representam o modo como a grande massa dos falantes 
brasileiros usa a língua? Muitas dessas regras, no entanto, para os dias atuais, são 
obsoletas. É o que pensa Terra (2008, p. 59) quando nos diz que: 
 
Dado o caráter estático da norma e o caráter dinâmico da fala, a distância 
entre ambas é, em cada momento maior. A fala, por ser a realização concreta 
da língua, representando sua diversidade, evolui a cada instante, 
acompanhando as transformações da sociedade. 
 
Ensina-se a língua portuguesa como se fosse só gramática, tudo que uma lín- 
gua tem de riqueza e dinamismo é posto em segundo plano. Alguns professores ques- 
tionam: por que os estudantes não gostam da Língua Portuguesa? “O que a escola 
ensina não é a língua, mas a nomenclatura. As aulas de Língua Portuguesa costumam 
se caracterizar por ensinar o nome das coisas” (Terra, 2008, p 79). Pressupõe-se que 
o mais importante da língua não é ensinado. O seu uso social e a funcionalidade entre 
os homens que a utilizam parecem não ser lembrados durante as aulas. 
Estas mesmas aulas de português, quando dispõem de tempo para o ensino 
das variações linguísticas, o fazem de maneira intolerante, como aponta Bagno (2008, 
p. 16): 
 
É preciso evitar a prática distorcida de apresentar a variação como se ela 
existisse apenas nos meios rurais ou menos escolarizados, como se também 
não houvesse variação (e mudança) linguística entre os falantes urbanos, so- 
cialmente prestigiados e altamente escolarizados, inclusive nos gêneros es- 
critos mais monitorados. 
38 
 
 
 
Considerando as variações como algo que compromete a existência da Língua 
Portuguesa, os próprios livros didáticos contribuem para agravar esta situação, favo- 
recendo umas variações e criticando outras. Bagno (2008, p. 16) defende que: 
Todos os aprendizes devem ter acesso às variedades linguísticas urbanas de 
prestígio, não porque sejam as únicas formas “certas” de falar e de escrever, 
mas porque constituem, junto com outros bens sociais, um direito do cidadão, 
de modo que ele possa se inserir plenamente na vida urbana contemporânea, 
ter acesso aos bens culturais mais valorizados e dispor dos mesmos recursos 
de expressão verbal (oral e escrita) dos membros das elites socioculturais e 
socioeconômicas. 
 
O ensino da Língua Portuguesa necessita com urgência de uma reorganização, 
não só no ensino das variações linguísticas, como em todas as áreas, como defendem 
os Parâmetros Curriculares Nacionais da Língua Portuguesa (PCNs): 
Essas evidências de fracasso escolar apontam à necessidade de reestrutu- 
ração do ensino de Língua Portuguesa, com o objetivo de encontrar formas 
de garantir, de fato, a aprendizagem da leitura e da escrita (Secretaria de 
Educação Fundamental,1997, p. 19). 
 
A escola não pode discriminar o estudante pelo seu jeito de se comunicar. Pois, 
essa maneira de falar representa muito mais que um processo comunicativo, é a iden- 
tidade do falante. Nela, é possível perceber de onde vem este falante, a que classe 
social pertence, que cultura possui, etc. É de grande relevância para o falante do por- 
tuguês saber identificar e diferenciar sua variação linguística das demais, não para 
desprestigiar, e sim para respeitar e encantar-se com a riqueza que a língua materna 
possui. É uma das propostas dos PCNs da Língua Portuguesa dos anos iniciais: 
 
(...) conhecer e valorizar a pluralidade do patrimônio sociocultural brasileiro, 
bem como aspectos socioculturais de outros povos e nações, posicionando- 
se contra qualquer discriminação baseada em diferenças culturais, de classe 
social, de crenças, de sexo, de etnia ou outras características individuais e 
sociais (Secretaria de Educação Fundamental, 1997, p. 15). 
 
O conhecimento das diversas variações linguísticas também possui sua finali- 
dade para a compreensão da linguagem do cinema, teatro e telenovelas, para a ca- 
racterização do modo de falar dos personagens, que muitas vezes o fazem de forma 
39 
 
 
exagerada e totalmente diferente da realidade, por falta de informação ou intencional- 
mente. Um bom exemplo disso são os sotaques dos personagens nordestinos exibi- 
dos nas novelas, que muitas vezes são exagerados e tornam-se cômicos, represen- 
tando quase sempre pessoas de classes populares e notadamente com pouco nível 
de instrução. Segundo Bagno (2008) esse sotaque deve ser de um nordestino de 
marte. 
Por conta desta ação e do ensino discriminatório, é que o preconceito linguís- 
tico vem se expandindo. Com a mesma importância que o ensino da norma padrão 
representa para qualquer cidadão no seu uso social, as variações não padrão também 
estão presentes. Durante o dia e, dependendo de com quem se fala, é necessário 
mudar o jeito de falar para ser compreendido. É o que acontece com os inúmeros 
gêneros textuais, cada um com sua função para auxiliar a escrita. 
O direito que é dado para todos aprenderem a norma padrão deve ser o 
mesmo para o ensino das variações. O estudante não pode em momento algum sen- 
tir-se linguisticamente inferior, nem superior às outras variações, pois “diferença não 
é deficiência nem inferioridade” (Bagno, 2008, p. 29). O autor ainda defende que: 
 
Seria mais justo e democrático explicar ao aluno que ele pode dizer “bulacha” 
ou “bolacha”, mas que só pode escrever bolacha, porque é necessária uma 
ortografia única para toda a língua, para que todos possam ler e compreender 
o que está escrito (Bagno, 2008, p. 69). 
 
O que se espera da escola e dos docentes é uma mudança nesta concepção 
do que é ensinar uma língua para o próprio falantedo idioma. Que deixe de olhar para 
a gramática como se fosse um livro sagrado e olhe mais para os estudantes de língua 
Portuguesa, não como assassinos da língua, mas sim continuadores. A falta de co- 
nhecimento dos docentes e das escolas de ciências como a Linguística e a Sociolin- 
guística deixa o ensino-aprendizagem da Língua Portuguesa intolerante. A definição 
de Linguística, segundo Cagliari (2007. P. 42) é: 
 
(...) a linguística é o estudo científico da linguagem. Está voltada para a ex- 
plicação de como a linguagem humana funciona e de como são as línguas 
em particular, quer fazendo o trabalho descritivo usando os conhecimentos 
adquiridos para beneficiar outras ciências e artes que usam de algum modo, 
a linguagem falada ou escrita 
40 
 
 
É imprescindível que os estudantes aprendam seu idioma de forma lúdica 
quando for possível ou de maneira prazerosa. Que não se considerem incapazes de 
falar sua própria língua e que vejam que a comunicação humana é um instrumento 
tão poderoso, que pode até resolver conflitos ideológicos, políticos e sociais quando 
se faz necessário um diálogo. É nítido que não só o ensino das variações linguísticas, 
como o de toda Língua Portuguesa está acontecendo de forma descontextualizada, 
para não dizer errada. 
É o que Cagliari (2007) mostra: 
 
Neste país, o aluno passa 8 anos na escola de 1° grau, 3 anos na de 2° grau 
e pode passar mais 4 anos na faculdade, sem contar o ano de cursinho pre- 
paratório e as reprovações [...] e, se um especialista em problemas relacio- 
nados à Língua Portuguesa fizer uma pesquisa séria para ver o que esse 
aluno aprendeu em mais de uma década de estudos, sem dúvidas ficará de- 
cepcionado. Então o que o aluno faz nesses anos todos de escola? Será que 
o ser humano precisa de tanto tempo para aprender tão pouco? O que está 
errado nesta história? (Cagliari, 2007, p. 23). 
 
Parece que a parte pedagógica do ensino não se importa com a bagagem que 
o estudante tem linguisticamente desde que entra na escola. É como se ele tivesse 
que esquecer tudo que já aprendeu socialmente sobre Língua Portuguesa e tenha que 
aprender outra língua que nada tem a ver com a forma que ele se expressa. É funda- 
mental que o docente assume o papel de estudioso, investigador, cientista, buscando 
construir o próprio conhecimento da língua, assumindo uma postura crítica que con- 
sequentemente o auxiliará a ressignificar sua prática, pois segundo Bagno (2008, p. 
115), como docentes devemos: 
 
(...) acionar nosso sendo crítico toda vez que nos depararmos com um co- 
mando gramatical e saber filtrar as informações realmente úteis, deixando de 
lado (e denunciando, de preferência) as afirmações preconceituosas, autori- 
tárias e intolerantes. Da parte do professor em geral, (...) essa mudança de 
atitude deve refletir-se na não-aceitação de dogmas, na adoção de uma nova 
postura (crítica) em relação a seu próprio objeto de trabalho: a norma culta. 
 
A escola e os docentes, principalmente dos anos iniciais, estão tão incutidas da 
norma padrão, que parecem acreditar que sua principal função é ensinar a criança a 
falar segundo essa norma. É um terrível engano que podemos cometer se aderirmos 
essa ideia, quando sabemos que isso não corresponde ao que nos diz os PCNs: 
41 
 
 
 
 
 
Não é papel da escola ensinar o aluno a falar: isso é algo que a criança 
aprende muito antes da idade escolar. Talvez por isso, a escola não tenha 
tomado para si a tarefa de ensinar quaisquer usos e formas da língua oral. 
Quando o faz, foi de maneira inadequada: tentou corrigir a fala “errada” dos 
alunos – por não ser coincidente com a variação linguística de prestigio social, 
com a esperança de evitar que escrevesse errado. Reforçou assim o precon- 
ceito contra aqueles que falam diferente da variedade prestigiada. (Secretaria 
de Educação Fundamental, 1997, p. 48) 
 
Se fosse assim, o estudante chegaria ao ambiente escolar mudo e, com o avan- 
çar das séries, começaria a falar como o que acontece com quem está aprendendo 
um novo idioma, como aponta Cagliari (2007, p. 83): 
 
Um aluno na escola não pode chegar à conclusão que seus pais são “burros” 
porque falam errado, não pode achar que as pessoas de sua comunidade são 
incapazes porque falam errado, não têm valor porque falam errado, ao passo 
que a cultura só está com quem fala o dialeto padrão, que a lógica do 
raciocínio só pode ser expressa nessa variedade linguística, que o bom, belo 
e perfeito só pode ser expresso através das “palavras bonitas” do dialeto- 
padrão. 
 
Não se trata de uma apologia ao falar diferente da norma padrão, mas tão só 
de respeitar as variações que não seguem a normatização. Tendo em vista que toda 
sociedade se constitui da individualidade de cada um “não se trata de ensinar a falar 
ou a fala “correta”, mas sim as falas adequadas ao contexto de uso” (Secretaria de 
Educação Fundamental, 1997 p. 22). 
42 
 
 
 
 
Fonte: provafacilnaweb.com.br 
 
 
Uma união entre um homem e uma mulher ganha mais credibilidade quando 
existe uma certidão de casamento. A escravidão só terminou com a assinatura da Lei 
Áurea. Como se percebe a sociedade dá um status de seriedade para a escrita. Por 
ter um papel muito relevante no mundo letrado, como nos diz Cagliari (2007, p. 96): 
“O ensino do português tem sido fortemente dirigido para a escrita, chegando mesmo 
a se preocupar mais com a aparência da escrita do que com o que ela realmente faz 
representar”. Porém, não se pode esquecer que, da mesma forma que a escrita tem 
uma funcionalidade, a fala também tem. É o que afirmam os PCNs: 
 
O domínio da língua, oral e escrita, é fundamental para a participação social 
efetiva, pois é por meio dela que o homem se comunica, tem acesso à infor- 
mação, expressa e defende pontos de vista, partilha ou constrói visões de 
mundo, produz conhecimento. Por isso, ao ensiná-la, a escola tem a respon- 
sabilidade de garantir a todos os seus alunos o acesso aos saberes linguísti- 
cos, necessários para o exercício da cidadania, direito inalienável de todos 
(Secretaria de Educação Fundamental, 1997, p. 19). 
 
Por isso o ensino da Língua Portuguesa concentra-se na escrita (produção tex- 
tual, resolução de questões, leitura silenciosa). Já a fala raramente é trabalhada em 
sala de aula e quando acontece é de forma errônea, criticando a maneira como certo 
grupo social fala. Da mesma forma que não existe variação superior a outra, o mesmo 
ocorre entre a escrita e a fala durante o ensino; as duas têm que ser coniventes no 
43 
 
 
processo de ensino-aprendizagem, uma vez que “pode-se perceber agora que o en- 
sino da Língua Portuguesa não só é problemático pelo que se ensina, mas também é 
falho porque se deixa de ensinar muita coisa” (Cagliari, 2007, 48). 
As aulas de Língua Portuguesa podem dar o direito para o estudante falar, dis- 
cutir seu idioma, brincar com a fonologia das palavras, como acontece com a escrita. 
Diante dos pressupostos, entende-se que as variações linguísticas não são muito 
apreciadas pela escola, por apresentarem características que “promovem” o desvio 
da norma padrão, pois “a escola, como espelho da sociedade, não admite o diferente 
e prefere adotar só as noções de certo e errado, numa falsa visão da realidade” (Ca- 
gliari, 2007, p. 65). Com essa premissa, como o professor dos anos iniciais pode en- 
sinar a Língua Portuguesa, sem desvalorizar as variações linguísticas? 
 
Aprender português (...) não é só aprender como a língua (e suas variedades) 
funcionam, mas também estudar ao máximo os usos linguísticos; e isso não 
significa só aprender a ler e escrever, mas inclui ainda a formação para apren- 
der e usar as variedades linguísticas diferentes, sobretudo o dialeto-padrão. A 
escola dessa forma não só ensinaria português, como desempenharia ainda 
o papel imprescindível de promover socialmente os menos favorecidos pela 
sociedade (Cagliari, 2007, p. 83). 
 
Geralmente, as variações

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