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1 SUMÁRIO 1 A CHEGADA DOS EUROPEUS AO CONTINENTE QUE HOJE CHAMAMOS DE AMÉRICA ........................................................................................ 2 2 ETNOCENTRISMO E O ABANDONO SALUTAR DO BRASIL ENTRE 1500 E 1530 6 2.1 O “Achamento” ..................................................................................... 6 2.2 Etnocentrismo ...................................................................................... 8 2.3 Os Tupiniquins ................................................................................... 10 2.4 Primeiras Expedições ......................................................................... 11 3 O BRASIL NOS QUADROS DO SISTEMA COLONIAL MERCANTILISTA 13 4 CONTESTAÇÕES AO SISTEMA COLONIAL .......................................... 20 5 A EXPANSÃO COLONIZADORA E A FIXAÇÃO DOS LIMITES .............. 27 BIBLIOGRAFIA ............................................................................................... 32 6 LEITURA COMPLEMENTAR .................................................................... 35 2 1 A CHEGADA DOS EUROPEUS AO CONTINENTE QUE HOJE CHAMAMOS DE AMÉRICA Fonte: construindohistoriahoje.blogspot.com.br A região da cidade de Jerusalém, na Palestina, onde atualmente fica o Estado de Israel é sagrada para os fiéis das três mais importantes religiões (ditas) monoteístas do mundo: o judaísmo, o cristianismo e o islamismo. Desde épocas muito remotas, judeus, cristãos e muçulmanos fazem peregrinações a Jerusalém para venerar os Lugares Santos de suas respectivas fés. Na Idade Média – e ainda hoje, em certa medida – os cristãos em geral acreditavam que os lugares onde os santos viveram, os objetos por eles usados e o que restava de seus corpos (as chamadas “Relíquias”) possuíam poderes milagrosos, como a cura de enfermos e a salvação para os pecadores. Havia vários lugares de veneração espalhadas por todo o mundo cristão, mas a Terra Santa, onde Jesus viveu, pregou e foi supliciado, era considerado o mais sagrado de todos. Para os judeus, Jerusalém é a principal cidade de sua antiga pátria e ali se encontram vários locais sagrados, principalmente o “Muro das Lamentações”, ruínas do Templo de Salomão destruído pelos romanos no primeiro século de nossa era. Para os cristãos, é reverenciada por ter sido o local no qual Jesus de Nazaré viveu abc Realce abc Realce 3 durante os três últimos anos de sua vida, pregou, fez discípulos e foi crucificado. Para os muçulmanos, Jerusalém é uma Cidade Santa porque foi dali, da “Cúpula do Rochedo”, situada no coração de Jerusalém – reza a Tradição que ainda é possível ver a marca do casco do cavalo alado que o levou – que Maomé subiu ao céu. Apesar da grande distância da Europa Ocidental, muitos peregrinos faziam uma longa e arriscada jornada para chegar a Jerusalém. Alguns iam primeiro para Roma e, em seguida, partiam de algum porto italiano para Constantinopla, capital do Império Romano do Oriente ou Império Bizantino e, de lá, para a Palestina. As pessoas mais pobres percorriam todo o trajeto a pé. Os Europeus dependiam visceralmente das especiarias encontradas nas Índias (nome dado vagamente a toda a região sudeste do continente asiático). Em particular nos períodos mais quentes do ano as especiarias ou temperos (cravo, canela, noz moscada, pimenta...) eram fundamentais para a conservação e aprimoramento do sabor dos alimentos. A mesma rota usada pelos Peregrinos era também a rota dos mercadores (hoje eufemisticamente conhecidos como comerciantes) que iam da Palestina às Índias por terra e lá, trocavam produtos europeus pelas especiarias. Não raro, simplesmente saqueavam vilarejos hindus de suas riquezas e as vendiam na Europa com lucro de 100%, independente da desgraça causada no local do saqueio. Após longo período de cerco, em 1453 as poderosas muralhas de Constantinopla caíram sob o poder dos canhões de Maomé III. A “Queda de Constantinopla” e sua ocupação pelos turcos otomanos (muçulmanos) marca o fim do Império Romano do Oriente. Muitos sábios migraram de Constantinopla para Roma, Veneza e Gênova, na península Itálica e ajudaram, com seus aportes, a incrementar o Renascimento Europeu. Com as rotas terrestres para as Índias completamente bloqueadas pois os inimigos mortais dos Europeus Ocidentais ocupavam toda a Palestina e até Constantinopla (hoje Istambul, na atual Turquia), além disso as disputas entre Católicos e Protestantes no Segundo Cisma do Cristianismo tornava a Europa Central uma área consideravelmente perigosa para os mercadores católicos da Península Ibérica. Era necessário encontrar um "Caminho Marítimo" para "as Índias". As viagens navais daqueles tempos podem ser comparadas – grosso modo – às viagens espaciais da era moderna. Inicialmente, somente Portugueses e abc Realce abc Realce abc Realce 4 Espanhóis dispunham dos conhecimentos técnicos necessários à construção de grandes embarcações e, com o auxílio de instrumentos aprendidos com os muçulmanos (como o astrolábio, por exemplo, instrumento fundamental ao fiel muçulmano para localizar a direção da cidade de Meca para suas preces diárias mesmo em dias nublados ou durante a noite) podiam navegar e orientar-se pelas estrelas, mesmo à noite. Fonte: brasilescola.uol.com.br Após a Unificação do Reino de Espanha com o casamento de Fernando de Aragão com Isabel de Castela que possibilitou a união de forças necessárias à retomada de Granada, ao sul da Espanha (os muçulmanos ocuparam toda a Península Ibérica por cerca de 700 anos, daí muito de sua influência aparece na cultura daqueles povos e dos latino-americanos, nós, que descendemos deles) um navegador genovês (nascido em Gênova, na Península Itálica) chamado Cristóvão Colombo conseguiu os recursos necessários a subvencionar sua ambiciosa viagem de circunavegação – dar uma volta à Terra, que, já se sabia, era redonda – e chegar “ao Levante, viajando na direção do Sol Poente”. Só não contava mesmo encontrar um continente inteiro no meio do caminho - sorte dele, aliás, que não contava com suprimentos, equipamentos e tripulação suficientemente motivada e crédula para chegar tão longe quanto a China, na hipótese de o Continente que hoje chamamos de América não existisse... abc Realce 5 No entretempo os Portugueses chegavam às Índias circunavegando o Continente Africano em viagens, para a época, cheias de perigos e aventuras. Após muitos contratempos Colombo chega às ilhas do Caribe e imagina haver chegado às ilhas de “Cipango” – nome pelo qual o Japão era conhecido – e, como Marco Polo 300 anos antes, embora viajando na direção contrária, chegar até o “Império Katai” – como era conhecida a China. Índios do Caribe faziam referência a um "Grande Reino" no Continente (referiam-se à Confederação Azteca) que Colombo interpretou como sendo o famoso "Império Catai" encontrado por Marco Polo 250 anos antes. Toma posse de todas as terras encontradas em nome dos reis Cristãos de Aragão e Castela – independentemente de serem terras habitadas por outros seres humanos, que receberam o nome de “índios” pois que se imaginava estar chegando às Índias. Colombo morreu acreditando haver descoberto uma rota marítima para as Índias, navegando em linha reta na direção do Sol Poente. Naquela época, era totalmente desconhecida a existência de um Continente inteiro e habitado por milhares de Nações de Seres Humanos diferentes no caminho entre a Europa e a Ásia. Este continente recebeu o nome de “América” pois foi o florentino (nascido em Florença, na Península Itálica) Américo Vespúcio, que navegou, estudando todo o litoral destas terras recém encontradas, o descobridor de que se tratava de um “Mundo Novo” – Mundus Novus é o título do Trabalho em que registra oficialmente, pela primeira vez na história do Ocidente, que havia um continente inteiroentre a Europa e a Ásia, continente que, como se disse, em sua homenagem leva o nome de “América”. Fonte: schafergabriel.blogspot.com.br abc Realce abc Realce abc Realce abc Realce 6 2 ETNOCENTRISMO E O ABANDONO SALUTAR DO BRASIL ENTRE 1500 E 1530 Fonte: www.resumoescolar.com.br O interesse pelo Oriente – a armada de Pedro Álvares Cabral, em verdade, dirigia-se às “Índias” mas, seja acaso, tormentas, calmarias ou por propósito (o mais provável) chegou ao Brasil em 1500. Apesar de ter tomado posse da terra em nome do rei de Portugal, o principal interesse da monarquia, enfatize-se estava voltado para o Oriente, onde estavam as tão cobiçadas especiarias. 2.1 O “Achamento” A Carta de Pero Vaz de Caminha fala em “achamento” destas terras, não fala em “descobrimento” ou “casualidade”. Tudo indica que, realmente, procuravam alguma terra, e a acabaram “achando”... O relato abaixo permite-nos uma ideia de como aconteceu este “achamento” segundo relatos de marujos da esquadra cabralina. Na terça-feira à tarde, foram os grandes emaranhados de “ervas compridas a que os mareantes dão o nome de rabo-de-asno”. Surgiram flutuando ao lado das naus e sumiram no horizonte. Na quarta-feira pela manhã, o vôo dos fura-buchos – uma espécie de gaivota – rompeu o silêncio dos mares e dos céus, reafirmando a certeza abc Realce abc Realce 7 de que a terra se encontrava próxima. Ao entardecer, silhuetados contra o fulgor do crepúsculo, delinearam-se os contornos arredondados de “um grande monte”, cercado por terras planas, vestidas de um arvoredo denso e majestoso. Era 22 de abril ale 1500. Depois de 44 dias de viagem, a frota de Pedro Álvares Cabral vislumbrava terra – mais com alívio e prazer do que com surpresa ou espanto. Nos nove dias seguintes, nas enseadas generosas rio sul da Bahia, os 13 navios da maior amada já enviada às índias pela rota descoberta por Vasco da Gama permaneceriam reconhecendo a nova terra e seus habitantes. Fonte: historiadetodosgeralebrasileiracomrafael.wordpress.com O primeiro contato, amistoso como os demais, deu-se já no dia seguinte, quinta-feira, 23 de abril. O capitão Nicolau Coelho, veterano das Índias e companheiro de Gama, foi a terra, em um batel, e deparou com 18 homens “pardos, nus, com arcos e setas nas mãos”. Coelho deu-lhes um gorro vermelho, uma carapuça de linho e um sombreiro preto. Em troca, recebeu um cocar de plumas e um colar de contas brancas. O Brasil, batizado Ilha de Vera Cruz, entrava, naquele instante, no curso da História. O descobrimento oficial do país está registrado com minúcia. Poucas são as nações que possuem uma “certidão de nascimento” tão precisa e fluente quanto a carta que Pero Vaz de Caminha enviou ao rei de Portugal, dom Manuel, relatando o “achamento” da nova terra. Ainda assim, uma dúvida paira sobre o amplo desvio de abc Realce 8 rota que conduziu a armada de Cabral muito mais para oeste do que o necessário para chegar à Índia. Teria sido o descobrimento do Brasil um mero acaso? É provável que a questão jamais venha a ser esclarecida. No entanto, a assinaturas do Tratado de Tordesilhas, que, seis anos antes, dera si Portugal a posse das terras que ficassem a 370 léguas (em torno de 2.000 quilômetros) a oeste de Cabo Verde explique a naturalidade com que a nova terra foi avistada, o conhecimento preciso das correntes e das rotas, as condições climáticas durante a viagem e a alta probabilidade de que o país já tivesse sido avistado anteriormente parecem ser a garantia de que o desembarque, naquela manhã de abril de 1500, foi mera formalidade: Cabral poderia estar apenas tomando posse de uma terra que os portugueses já conheciam, embora superficialmente. Uma terra pela qual ainda demorariam cerca de meio século para se interessarem de fato. Fonte: www.youtube.com 2.2 Etnocentrismo Todas as culturas e civilizações humanas partilham algumas coisas em comum; por exemplo, tanto Esquimós, quanto Bosquímanos, Tupinambás, Astecas, Zulus, Mongóis, Japoneses e Europeus consideram a própria cultura ou civilização superior abc Realce 9 a todas as demais. Para os Ibéricos (Portugueses e Espanhóis) cristãos, com seu elã vital de "propagar o cristianismo católico" iam além e consideravam sua cultura ou civilização "a única válida" a exemplo dos estadunidenses hoje em dia, no século XXI. Aquela visão tacanha não permitiu ver a tremenda diversidade cultural entre as mais distintas civilizações e povos diferentes que aqui viviam: Tupinambás, Carijós, Tupiniquins, Ianomamis, Guaranis... Todos eram "índios sem cultura, sem rei nem lei" e tinham de receber a cultura e a religião ibéricas - a alternativa era a morte ("Ficar entre a cruz e a espada" tem precisamente este significado, por sinal). Fonte: fabiopestanaramos.blogspot.com.br Apenas a título de ilustração ou curiosidade, todas as civilizações humanas têm a sua própria forma fazer sacrifícios humanos. Hoje em dia, nos EUA, a moda é julgar formalmente e, o considerado "culpado" de algo como "crime hediondo" é sacrificado através do uso da Cadeira Elétrica, da Forca ou da Injeção Letal. Na Península Ibérica ao tempo da conquista colonial do Brasil eram também muito comuns os sacrifícios humanos. A Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, nome eufemístico da Santa Inquisição, julgava - aplicando violentos métodos de tortura física e psicológica, extraindo confissões as mais diversas - e, ao término dos trabalhos, "abandonava ao braço secular" o corpo da vítima a ser sacrificada indicando como deveria ser. Um método muito popular de Sacrifício Humano na Península Ibérica ao tempo da abc Realce abc Realce abc Realce abc Realce 10 conquista colonial era a fogueira. A vítima era queimada numa fogueira, em geral ainda em vida (como ocorreu com Giordano Bruno, por exemplo); em alguns casos eram garroteados - mortos por enforcamento através de um garrote em torno da garganta - e, a seguir, incinerados para delírio da plateia. Também no continente que hoje chamamos América, nos tempos da conquista colonial, se praticava o sacrifício humano: inimigos derrotados eram mortos e sua carne, devorada pelos vencedores - um ritual nem tão raro nem tão comum quanto os Sacrifícios Humanos perpetrados na Europa cristã, naturalmente. Mas uns não consideravam aos outros como praticando esse tipo de coisa... Agora, imagine que você desse de presente para um grupo de índios da Amazônia (onde não há eletricidade, água encanada, saneamento básico ou mesmo respeito por parte da FUNAI - Funerária Nacional de Índios) um computador de último tipo, capaz de pegar o sinal da Internet por satélite e funcionar a bateria. Diante de tal peça, os Ianomami, respeitosos, o enfeitariam com penas, colocariam outros adereços comuns e deixariam o computador em exibição, todo enfeitado, a quem desejasse olhar. Estranho? E nós que pegamos seus instrumentos de trabalho - como arco-e- flexa, por exemplo - e penduramos como enfeite em nossas paredes? Qual a grande diferença? Enfim, em última instância, no mundo humano e sendo o ser humano como é, vence sempre quem dispõe de maior poderio bélico, não aquele povo que manifesta um tipo superior de moralidade. Assim, hoje já não há quase nada de cultura nativa neste país. Os "índios" foram convertidos ou assassinados. 2.3 Os Tupiniquins Ao longo dos dez dias que passou no Brasil, a armada de Cabral tomou contato com cerca de 500 nativos. Eram, se saberia depois, tupiniquins – uma das tribos do grupo tupi-guarani que, no início do século 16, ocupava quase todo o litoral do Brasil. Os tupis-guaranis tinham chegado à região numa série de migrações de fundo religioso (em busca da “Terra sem Males”, no começo da Era Cristã). Os tupiniquins viriam no sul da Bahia e nas cercanias de Santos e Bertioga, em São Paulo. Eram uns 85 mil.Por volta de abc Realce abc Realce abc Realce 11 1530, uniram-se aos portugueses na guerra contra os tupinambás-tamoios, aliados dos franceses. Foi uma aliança inútil: em 1570 já estavam praticamente extintos, massacrados por Mem de Sá, terceiro governador-geral do Brasil. Fonte: pt.wikipedia.org 2.4 Primeiras Expedições O Brasil, ao contrário do Oriente, não possuía, em princípio, nenhum atrativo do ponto de vista comercial. Ao longo do período pré-colonial foram, entretanto, enviadas várias expedições a nosso pais. Primeiras expedições – Entre 1501 e 1502, Portugal enviou a primeira expedição com a finalidade de explorar e reconhecer o litoral brasileiro. Essa expedição, da qual se desconhece o nome do comandante, foi responsável pelo batismo de inúmeros lugares: cabo de S. Tomé, cabo Frio, São Vicente, etc. Com certeza, nessa expedição viajou o florentino Américo Vespúcio, que, posteriormente, em carta ao governante de Florença, Lourenço de Médici, irá declarar que não encontrou aqui nada de aproveitável. Apesar disso, constata a existência do pau- brasil, madeira tintorial conhecida dos europeus desde a Idade Média, que até então era importada do Oriente. abc Realce abc Realce abc Realce 12 O pau-brasil – As primeiras atividades econômicas concentraram-se, pois, na extração daquela madeira, segundo o regime de estanco, isto é, sua exploração estava sob-regime de monopólio régio. Como era costume, o rei colocou em concorrência o contrato de sua exploração, que foi arrematada por um consórcio de mercadores de Lisboa chefiado pelo cristão novo Fernão de Noronha, em 1502. No ano seguinte (1503) Fernão de Noronha montou uma expedição pata a extração do pau-brasil e fez o primeiro carregamento do produto. No Brasil, foram estabelecidas então as feitorias, que eram lugares fortificados e funcionavam, ao mesmo tempo, como depósito de madeira. O pau-brasil era explorado através do escambo, no qual os indígenas forneciam a mão de obra para corte e transporte da madeira em troca de objetos de pouco valor para os portugueses. Brasil 1570. Padres solicitam às Autoridades portuguesas - a Metrópole do Brasil na época - que enviem órfãs para se casar com os rudes trabalhadores que aqui moravam pois estavam obcecados - como usualmente os padres sempre são - com a sexualidade dos trabalhadores que, além de os afastar da missa, produzia uma indesejável quantidade de mestiços e a prioridade então era o "branqueamento da pele". O filme DESMUNDO revela de maneira realista o choque cultural entre meninas profundamente religiosas e seus maridos, brutais, acostumados com a dureza do trabalho e a lidar com o trabalho escravo. A maioria "amolece" a esposa como um domador de cavalos. Algumas se suicidam tentando voltar - a nado - a Portugal, algumas enlouquecem. A maioria, como desde sempre em terra brasilis, "se acomoda" à situação. Alain Fresnot explorou este tema brilhantemente no filme "Desmundo". abc Realce abc Realce abc Realce abc Realce 13 3 O BRASIL NOS QUADROS DO SISTEMA COLONIAL MERCANTILISTA Fonte: www.clickescolar.com.br O sistema colonial é o conjunto de relações entre as metrópoles e suas respectivas colônias em uma determinada época histórica. O sistema colonial que nos interessa abrangeu o período entre o século XVI e o século XVII, ou seja, faz parte do Antigo Regime da época moderna e é conhecido como antigo sistema colonial. Segundo o seu modelo teórico típico, a colônia deveria ser um local de consumo (mercado) para os produtos metropolitanos, de fornecimento de artigos para a metrópole e de ocupação para os trabalhadores da metrópole. Em outras palavras, dentro da lógica do “Sistema Colonial Mercantilista” tradicional, a colônia existia para desenvolver a metrópole, principalmente através do acúmulo de riquezas, seja através do extrativismo ou de práticas agrícolas mais ou menos sofisticadas. Uma Colônia de Exploração, como foi o caso do Brasil para Portugal, tem basicamente três características, conhecidas pelo termo técnico de “plantation”: _ Latifúndio: as terras são distribuídas em grandes propriedades rurais _ Monocultura voltada ao mercado exterior: há um “produto-rei” em torno do qual toda a produção da colônia se concentra (no caso brasileiro, ora é o açúcar, ora abc Realce abc Realce abc Realce 14 a borracha, ora o café...) para a exportação e enriquecimento da metrópole, em detrimento da produção para o consumo ou o mercado interno. _ Mão de obra escrava: o negro africano era trazido sobre o mar entre cadeias e, além de ser mercadoria cara, era uma mercadoria que gerava riqueza com o seu trabalho. O sentido da colonização – A atividade colonizadora europeia aparece como desdobramento da expansão puramente comercial. Passou-se da circulação (comércio) para a produção, No caso português, esse movimento realizou-se através da agricultura tropical. Os dois tipos de atividade, circulação e produção, coexistiram. Isso significa que a economia colonial ficou atrelada ao comércio europeu. Segundo Caio Prado Jr., o sentido da colonização era explícito: "fornecer produtos tropicais e minerais para o mercado externo". Assim, o antigo sistema colonial apareceu como elemento da expansão mercantil da Europa, regulado pelos Interesses da burguesia comercial. A consequência lógica, segundo Fernando A. Novais, foi à colônia transformar-se em instrumento de poder da metrópole, o fio condutor, a prática mercantilista, visara essencialmente o poder do próprio Estado. As razões da colonização – A centralização do poder foi condição para os países saírem em busca de novos mercados, organizando-se, assim, as bases do absolutismo e do capitalismo comercial. Com isso, surgiram rivalidades entre os países. Portugal e Espanha ficaram ameaçados pelo crescimento de outras potências. Acordos anteriores, como o Tratado de Tordesilhas (1494) entre Portugal e a Espanha, começaram a ser questionados pelos países em expansão. A descoberta de ouro e prata no México e no Peru funcionou como estímulo ao início da colonização portuguesa. Outro fator que obrigou Portugal a investir na América foi a crise do comércio indiano. A frágil burguesia lusitana dependia cada vez abc Realce abc Realce abc Realce abc Realce 15 mais da distribuição dos produtos orientais feita pelos comerciantes flamengos (Flandres), que impunham os preços e acumulavam os lucros. Capitanias hereditárias – Em 1532, quando se encontrava em São Vicente, Martim Afonso recebeu uma carta do rei anunciando o povoamento do Brasil através da criação das capitanias hereditárias. Esse sistema já havia sido utilizado com êxito nas possessões portuguesas das ilhas do Atlântico (Madeira, Cabo Verde, São Tomé e Açores). O Brasil foi dividido em 14 capitanias hereditárias, 15 lotes (São Vicente estava dividida em 2 lotes) e 12 donatários (Pero Lopes de Sousa era donatário de 3 capitanias: Itamaracá, Santo Amaro e Santana). Porém, a primeira doação ocorreu apenas em 1534. Fonte: pt.wikipedia.org Entre os donatários não figurava nenhum nome da alta nobreza ou do grande comércio de Portugal, o que mostrava que a empresa não tinha suficiente atrativo econômico. Somente a pequena nobreza, cuja fortuna se devia ao Oriente, aqui aportou, arriscando seus recursos. Traziam nas mãos dois documentos reais: a carta abc Realce abc Realce 16 de doação e os forais. No primeiro o rei declarava a doação e tudo o que ela implicava. O segundo era uma espécie de código tributário que estabelecia os impostos. Nesses dois documentos o rei praticamente abria mão de sua soberania e conferia aos donatários poderes amplíssimos. E tinha de ser assim, pois aos donatários cabia a responsabilidade de povoar e desenvolver a terra à própria custa. O regime de capitaniashereditárias desse modo, transferia para a iniciativa privada a tarefa de colonizar o Brasil. Entretanto, devido ao tamanho da obrigação e à falta de recursos, a maioria fracassou. Sem contar aqueles que preferiram não arriscar a sua fortuna e jamais chegaram a tomar posse de sua capitania. No final, das catorze capitanias, apenas Pernambuco teve êxito, além do sucesso temporário de São Vicente. Quanto às demais capitanias, malograram e alguns dos donatários não só perderam seus bens como também a própria vida. Estava claro que o povoamento e colonização através da iniciativa particular era inviável. Não só devido à hostilidade dos índios, mas também pela distância em relação à metrópole, e sobretudo, pelo elevado investimento requerido. Governo geral (1549) – Em 1548, diante do fracasso das capitanias, a Coroa portuguesa decidiu tomar medidas concretas para viabilizar a colonização. Naquele ano foi criado o governo-geral com base num instrumento jurídico denominado Regimento de 1548 ou Regimento de Tomé de Sousa. O objetivo da criação do governo-geral era o de centralizar política e administrativamente a colônia, mas sem abolir o regime das capitanias. No regimento o rei declarava que o governo-geral tinha como função coordenar a colonização fortalecendo as capitanias contra as ações adversas, destacando-se particularmente a luta contra os tupinambás. A compra da capitania da Bahia pelo rei, transformando-a numa capitania real é sede do governo-geral foi o primeiro passo para a transformação sucessiva das demais capitanias hereditárias em capitanias reais, Por fim, no século XVIII, durante o reinado de D. José I (1750 - 1777) é do seu ministro marquês de Pombal, as capitanias hereditárias foram extintas abc Realce abc Realce abc Realce abc Realce abc Realce abc Realce 17 Com a criação do governo-geral, estabeleceram-se também cargos de assessoria: ouvidor-mor (justiça), provedor-mor (fazenda) e capitão-mor (defesa). Cada um desses cargos possuía, ademais, um regimento próprio e, no campo restrito de sua competência era a autoridade máxima da colônia. Assim, com a criação do governo-geral, desfazia-se juridicamente a supremacia do donatário. Tomé de Sousa (1549-1553) – O primeiro governador-geral foi Tomé de Sousa. Com ele vieram todos os funcionários necessários à administração e também os primeiros jesuítas chefiados por Manuel da Nóbrega. Começava, então, a obra evangelizadora dos indígenas e, em 1551, criava-se em Salvador o primeiro bispado no Brasil, sendo o primeiro bispo D. Pero Fernandes Sardinha. Com o segundo governador viria ainda outro contingente de jesuítas, entre eles, José de Anchieta. Fonte: brasillhistoria.blogspot.com.br Apesar de representar diretamente a Coroa, algumas capitanias relutaram em acatar a autoridade do governador-geral tais como as de Porto Seguro, Espírito Santo, Ilhéus, São Vicente e Pernambuco. Esta última, de Duarte Coelho, foi a que mais se abc Realce abc Realce abc Realce 18 ressentiu da intromissão do governo-geral. Recusando a autoridade do governador- geral o donatário de Pernambuco apelou para o rei, que o favoreceu reafirmando a sua autonomia. Consolidação do governo-geral – Duarte da Costa (1553 – 1558), que viera em substituição a Tomé de Sousa, enfrentou várias crises e sua estada no Brasil foi bastante conturbada. Desentendeu-se com o bispo D. Pero Fernandes Sardinha e teve de enfrentar os primeiros conflitos entre colonos e jesuítas acerca da escravidão indígena. Além disso, foi durante o seu governo que a França começou a tentativa de implantação da França Antártica no Rio de Janeiro. Esses problemas foram solucionados pelo terceiro governador-geral, Mem de Sá (1558-1572). Com ele, finalmente, se consolidou o governo-geral e os franceses foram expulsos. Predomínio dos poderes locais – Todavia, apesar da tendência centralizadora do governo-geral, a centralização jamais foi completa na colônia. Vários obstáculos podem ser mencionados. O primeiro deles estava na própria característica econômica da colônia. A sua economia era de exportação, voltada para o mercado externo. O comércio entre as capitanias era praticamente nulo. Além disso, as vias de comunicação inter-regionais eram inexistentes ou muito precárias. Daí a predominância dos poderes locais representados pelos grandes proprietários. Até meados do século XVII, as câmaras municipais eram ocupadas e dominadas por esses grandes proprietários, que se autodenominavam "homens bons". Evolução administrativa até 1580 – D. Luís Fernandes de Vasconcelos, nomeado sucessor de Mem de Sá foi atacado por piratas franceses que impediram a sua chegada ao Brasil. Nessa época, a preocupação com a conquista do Norte fez com que o rei de Portugal, D. Sebastião (1557 - 1578), dividisse, em 1572, o Brasil em dois governos. O norte ficou com D. Luís de Brito e Almeida e o sul com Antônio Salema tendo como capitais, respectivamente, a Bahia e o Rio de Janeiro abc Realce abc Realce abc Realce 19 Em virtude do tamanho do Brasil, almejava-se com essa divisão maior eficiência administrativa. Entretanto, como esse objetivo não fora alcançado, a administração foi reunificada em 1578. O novo governador nomeado, Lourenço da Veiga, governou de 1578 a 1580. Nesta última data, Portugal foi anexado pela Espanha, dando origem à União Ibérica, que perdurou de 1580 a 1640. A crise do Antigo Regime – O declínio da mineração no Brasil coincide, no plano internacional, com a crise do Antigo Regime. Fazendo um balanço de toda a exploração colonial do Brasil, chegamos à melancólica conclusão de que Portugal não foi o principal beneficiário da exploração colonial. Os benefícios da colonização haviam se transferido para outros centros europeus em ascensão: França e, em especial, Inglaterra. De fato, o século XVIII teve a Inglaterra como centro da política internacional e pivô das mudanças estruturais que começavam a afetar profundamente o Antigo Regime. Como nação vitoriosa na esfera econômica, a Inglaterra estava prestes a desencadear a Revolução Industrial, convertendo-se na mais avançada nação burguesa do planeta. A visível transformação econômica foi acompanhada, na segunda metade do século XVIII, por uma ebulição no nível das ideias. Surgiu o Iluminismo e, com essa filosofia, uma nova visão do homem e do mundo. Por trás de todo esse movimento, encontrava-se a burguesia, comandando a crítica ao Antigo Regime e, portanto, à nobreza e ao absolutismo. Mas os filósofos iluministas, como Voltaire e Diderot, seduziram os monarcas absolutistas da Prússia, Áustria, Rússia, Portugal e Espanha. Sem abrir mão do absolutismo, esses monarcas realizaram algumas das reformas recomendadas pelos iluministas, que vieram reforçar o seu poder, uma vez que a modernização empreendida aliviou as tensões sociais. Por se manterem absolutistas e optarem por reformas modernizadoras, aqueles monarcas ficaram conhecidos como déspotas esclarecidos. Esse foi um fenômeno típico da segunda metade do século XVIII. D. José I (1750-1777) e seu ministro, o marquês de Pombal, foram os representantes do despotismo esclarecido em Portugal. abc Realce abc Realce abc Realce abc Realce abc Realce 20 4 CONTESTAÇÕES AO SISTEMA COLONIAL Fonte: www.estudopratico.com.br Contradições do sistema colonial – O sistema colonial possuía dois eixos contraditórios. De um lado, senhores e escravos; de outro, colônia e metrópole. No Brasil, esse sistema ganhou a forma típica de escravismo colonial, e esse caráter simultaneamente escravista e colonial não foi desfeito ao mesmo tempo. Primeiro, romperam-se os laços coloniais e, muito mais tarde, aboliu-se a escravidão. Alguns historiadores, em data mais recente, afirmaram que o escravismo, e não o caráter colonial,vem a ser o traço definidor mais importante da sociedade. Por isso não dão muita importância à independência do Brasil. Para eles, o fato decisivo é a abolição da escravidão, em 1888. E um exagero: a superação da ordem colonial (o processo de independência) foi um fenômeno de grande importância e não tem sentido minimizá-lo em favor de outro, que foi a abolição da escravatura. De fato, nas inúmeras rebeliões ocorridas antes da independência, raras foram as que colocaram em xeque o escravismo. A maioria contestava diretamente o regime colonial a que o Brasil estava submetido, e muitas pessoas arriscaram a própria vida abc Realce abc Realce 21 para aboli-lo. E isso tem a sua importância histórica. Ninguém estava lutando contra uma ficção, mas contra algo muito real: a opressão e exploração coloniais. No entanto, aqueles historiadores não deixam de ter razão. Se prestarmos atenção apenas à luta pela emancipação, deixamos de lado as camadas populares e os escravos, pois a obra emancipadora foi, no Brasil, produto das elites. Não se deve esquecer que os de baixo estavam tão insatisfeitos com o regime colonial quanto com a dominação dos senhores de escravos. Tendo em vista, portanto, essa dupla contradição do sistema colonial, examinemos o processo emancipacionista. A primeira constatação importante é a de que o rompimento dos laços coloniais decorreu do próprio funcionamento do sistema: para explorar a colônia é preciso, antes de tudo, desenvolvê-la. Porém, à medida que a colônia se desenvolve, engendra interesses próprios que passam a divergir dos da metrópole. Esse é o momento em que os próprios colonos tomam consciência da exploração e de si próprios como colonos. Por isso mesmo, serão os integrantes da camada dominante os primeiros a alcançarem de forma aguda essa consciência e, em regra, serão eles os dirigentes desse movimento de emancipação. Isso não impediu, todavia, que as contradições sociais internas da colônia se aguçassem paralelamente à luta contra a metrópole, de modo que a ruptura dos laços coloniais poderia ser acompanhada, ao menos como possibilidade, de uma convulsão social. Examinando em conjunto o processo emancipacionista da América, verifica-se que, em geral, a independência não se fez acompanhar de uma revolução social. A única exceção foi o Haiti, colônia francesa que, em 1792, libertou-se da metrópole através de uma vasta rebelião escrava, extinguindo, ao mesmo tempo, a escravidão. Nos demais países, a independência não alterou em nada a estrutura social, que, no caso brasileiro, era escravista. Porém, isso não significa que a possibilidade de uma revolução social não esteve presente, de modo quase permanente, nas revoltas anticolonialistas. O sentido das rebeliões coloniais – As primeiras rebeliões anticolonialistas surgiram nos fins do século XVII e início do seguinte e foram resultado direto abc Realce abc Realce 22 da nova política colonial adotada por Portugal depois da Restauração (1640). Nesse contexto, as contradições entre metrópole e colônia se manifestaram de diversas maneiras: de um lado, como protesto ao regime comercial monopolista, como na Revolta de Beckman (1684), no Maranhão; de outro, como uma guerra entre senhores e escravos fugitivos, como em Palmares (1694), em Alagoas; mas também como conflito entre senhores de engenho e mercadores, como na Guerra dos Mascates (1709-1711), em Pernambuco; e, enfim, como reação à opressão fiscal, exemplificada pela Revolta de Vila Rica (1720), em Minas. Todas essas rebeliões tiveram por base a contradição metrópole-colônia e, no caso de Palmares, senhores escravos. Entretanto, cada rebelião possuía o seu caráter específico e apresentou grande complexidade. Porém, as rebeliões coloniais até o início do século XVIII não chegaram a propor claramente a emancipação política como solução. Elas só terão esse caráter com a Inconfidência Mineira (1789) e a Conjuração Baiana ou dos Alfaiates (1798). As primeiras manifestações anticolonialistas. Nos primeiros tempos da colonização, a contradição entre metrópole e colônia era latente e existia apenas em potencial. Na realidade, a colônia era vista como um prolongamento da metrópole, e os interesses não eram, de início, conflitantes. Na fase da montagem da economia colonial inexistia, na prática, divergências entre colonos e o Estado metropolitano. Porém, à medida que o processo colonizador avançou e se consolidou, os interesses tornaram-se conflitantes. Ora, isso é perfeitamente compreensível, pois a metrópole não tem o que explorar se a riqueza não for produzida. Uma vez produzida, a luta pela sua posse é desencadeada. Na segunda metade do século XVII, com a Restauração (1640) e a expulsão dos holandeses (1654), a divergência de interesses entre colônia e metrópole tornou- se evidente. A opressão colonial começou a ser sentida com a criação das Companhias de Comércio, às quais a metrópole concedeu monopólio do comércio colonial. A própria administração portuguesa ganhou um novo contorno com a criação do Conselho Ultramarino. abc Realce abc Realce abc Realce 23 Assim, à medida que o Estado português torna-se clara e conscientemente colonialista, no Brasil desenvolve-se uma consciência anticolonialista. Revolta de Beckman (1684) – Em meados do século XVII, o Maranhão estava com problemas devido à dificuldade de escoar a sua produção e de obter gêneros metropolitanos e, sobretudo, escravos. Fonte: estudapelaweb.blogspot.com.br A criação da Companhia do Comércio do Estado do Maranhão em 1682, que tinha por objetivo precisamente resolver tais problemas, veio agravar ainda mais a situação. Em princípio, essa companhia deveria não apenas adquirir a produção açucareis como também fornecer gêneros metropolitanos e escravos. Porém, visto que a ela fora concedido o monopólio tanto da venda de escravos e produtos metropolitanos, como da compra do açúcar, os colonos ficaram sujeitos aos preços arbitrariamente estabelecidos pela companhia, o que já era motivo de insatisfação. Essa insatisfação converteu-se em aberta rebelião porque, além disso, a companhia não cumpriu o seu compromisso de abastecer adequadamente o Maranhão com bens metropolitanos e escravos. A revolta eclodiu em 1684 liderada por Manuel Beckman, um abastado senhor de engenho. Os revoltosos propunham a abolição do monopólio da companhia e uma abc Realce abc Realce abc Realce 24 relação comercial mais justa. Em sinal de protesto, o governo local foi deposto, os armazéns da companhia saqueados e os jesuítas, velhos inimigos dos colonos por impedirem a escravização do índio, foram expulsos. Sob a direção de Manuel Beckman foi composto um governo provisório, e seu irmão, Tomás Beckman, foi enviado a Lisboa para apresentar as reivindicações dos revoltosos. Estas não foram atendidas e Tomás Beckman foi preso e recambiado para o Brasil, na frota em que veio o novo governador, Gomes Freire de Andrade. Este desembarcou no Maranhão, onde foi recebido com obediência, e, em seguida, reconduziu as autoridades depostas. Manuel Beckman fugiu e quando planejava libertar o irmão do cárcere foi traído por um afilhado. Beckman foi preso e executado. Apesar do fracasso, esse foi o primeiro movimento anticolonial organizado, embora não tivesse ocorrido aos dirigentes do movimento a independência da colônia em relação a Portugal, ou seja, a condição colonial não foi questionada. Quilombo dos Palmares (1630-1694) – No Brasil, a exploração colonial resumia-se, em última análise, na exploração do trabalho escravo pelo senhor. Devido ao caráter colonial dessa exploração, é verdade que o próprio senhor não ficava com todo o produto do trabalho escravo. Boa parte da riqueza ia para o Estado na forma de impostos e, também, para os cofres dos comerciantes portugueses.Daí a razão da revolta dos senhores contra o sistema colonial e as autoridades que o representavam. Mas não apenas a camada dominante que se rebelava. Também os escravos elaboraram meios de resistir contra o seu opressor imediato, isto é, o senhor. Fonte: cultura.culturamix.com abc Realce abc Realce 25 A resistência dos escravos assumiu formas muito variadas: fuga, suicídio, assassinato, passividade no trabalho, etc. Em qualquer uma dessas formas, o escravo negava a sua condição e se contrapunha ao funcionamento do sistema como um todo. A fuga, entretanto, foi a mais significativa forma de resistência e rebeldia. Não pela fuga em si, mas pelas suas consequências: os fugitivos se reuniam e se organizavam em núcleos fortificados no sertão, desafiando as autoridades coloniais. Observemos que, no combate à rebeldia escrava, aliavam-se senhores e autoridades coloniais. Esses núcleos eram formados por pequenas unidades, os mocambos (reunião de casas), que, no conjunto, formavam os quilombos. Cada mocambo possuía um chefe, que, por sua vez, obedecia ao chefe do quilombo, denominado zumbi. Os moradores dos quilombos eram conhecidos como quilombolas. Eles se dedicavam ao trabalho agrícola e chegavam a estabelecer relações comerciais com os povoados vizinhos. Palmares foi o maior quilombo formado no Brasil. Localizava-se no estado atual de Alagoas e deve o seu nome à grande quantidade de palmeiras existentes na região. Sua origem situa-se no início do século XVII, mas foi a partir de 1630, quando a conquista holandesa desorganizou os engenhos, que a fuga maciça de escravos tornou Palmares um quilombo de grandes proporções. Em 1675, a sua população foi avaliada em 20 ou 30 mil habitantes. Com a expulsão dos holandeses em 1654 e a escassez de mão de obra aliada ao fato de Palmares funcionar como polo de atração para outros escravos, estimulando a sua fuga, as autoridades coloniais, apoiadas pelos senhores, decidiram pela sua destruição. Várias expedições foram feitas contra ele, mas nenhuma delas teve sucesso. Foram contratados então os serviços de um veterano bandeirante, Domingos Jorge Velho. Apoiado por abundante material bélico e homens, o bandeirante contratado conseguiu finalmente destruir Palmares em 1694. Todavia, o chefe do quilombo, Zumbi, não foi capturado na ocasião. Somente um ano depois foi encontrado e executado. Guerra dos Mascates (1709-1711) – A Guerra dos Mascates ocorreu em Pernambuco e, aparentemente, foi um conflito entre senhores de engenho de abc Realce abc Realce abc Realce 26 Olinda e comerciantes do Recife. Estes últimos, denominados "mascates", eram, em sua maioria, portugueses. Fonte: ven1.blogspot.com.br Antes da ocupação holandesa, Recife era um povoado sem maior expressão. O principal núcleo urbano era Olinda, ao qual Recife encontrava-se subordinado. Porém, depois da expulsão dos holandeses, Recife tornou-se um centro comercial, graças ao seu porto excelente, e recebeu um grande afluxo de comerciantes portugueses. Olinda era uma cidade tradicionalmente dominada pelos senhores de engenho. O desenvolvimento de Recife, cidade controlada pelos comerciantes, testemunhava o crescimento do comércio, cuja importância sobrepujou a atividade produtiva agroindustrial açucareis, à qual se dedicavam os senhores de engenho olindenses. O orgulho desses senhores havia sido abalado seriamente desde que a concorrência antilhana havia colocado em crise a produção açucareis do nordeste. Mas ainda eram poderosos, visto que controlavam a Câmara Municipal de Olinda. À medida que Recife cresceu em importância, os mercadores começaram a reivindicar a sua autonomia político-administrativa, procurando libertar-se de Olinda e da autoridade de sua Câmara Municipal. A reivindicação dos recifenses foi parcialmente atendida em 1703, com a conquista do direito de representação na 27 Câmara de Olinda. Entretanto, o forte controle exercido pelos senhores sobre a Câmara tornou esse direito, na prática, letra morta. A grande vitória dos recifenses ocorreu com a criação de sua Câmara Municipal em 1709, que libertava, definitivamente, os comerciantes da autoridade política olindense. Inconformados, os senhores de engenho de Olinda, utilizando vários pretextos (a demarcação dos limites entre os dois municípios, por exemplo), re- solveram fazer uso da força para sabotar as pretensões dos recifenses. Depois de muita luta, que contou com a intervenção das autoridades coloniais, finalmente em 1711 o fato se consumou: Recife foi equiparada a Olinda. Assim terminou a Guerra dos Mascates. Com a vitória dos comerciantes, essa guerra apenas reafirmava o predomínio do capital mercantil (comércio) sobre a produção colonial. E isso já era fato, uma vez que os senhores de engenho eram frequentemente devedores dos mascates. Portanto, a equiparação política das duas cidades tinha fortes razões econômicas e obedecia à lógica do sistema colonial. 5 A EXPANSÃO COLONIZADORA E A FIXAÇÃO DOS LIMITES Tratados luso-espanhóis – Portugal e a Espanha, os pioneiros da expansão ultramarina, a fim de garantir a possessão dos territórios descobertos recorreram à autoridade do papa para legitimá-los. Assim, no Ocidente foi estabelecido inicialmente a Bula Inter-Coetera (1493), um meridiano que passava a 100 léguas a oeste de Cabo Verde dividindo domínios portugueses e espanhóis. O meridiano da Bula Inter-Coetera não permitia a inclusão do Brasil como domínio português. No ano seguinte, uma nova divisão foi negociada, dando origem ao Tratado de Tordesilhas (1494), que estipulou um meridiano a 370 léguas a oeste de Cabo Verde, ampliando o domínio português, incluindo desta vez parte do que seria mais tarde o Brasil. Não tardou que a emergência de novas potências europeias (Holanda, França, Inglaterra) viesse a contestar a partilha do mundo pelas nações ibéricas. Assim, a alteração do quadro internacional no início do século XVI forçou Portugal e a Espanha abc Realce 28 a adotarem uma atitude mais efetiva em relação à América. A colonização, como vimos, viabilizou a posse efetiva. A ocupação do litoral: a expansão oficial – Mesmo depois de decidida a ocupação efetiva do Brasil pela colonização, o litoral não deixou de ser constantemente ameaçado, principalmente pelos franceses. A dificuldade em desalojá-los foi devida, em grande parte, à sua aliança com os tupinambás, inimigos mortais dos tupiniquins, aliados dos portugueses. Por isso, a conquista do litoral deveu-se à conjugação de ações militares e religiosas. Através das primeiras repelia-se o rival e, em seguida, fundava-se um forte para guarnecer a região. Depois eram enviadas missões religiosas a fim de pacificar os indígenas. Porém, quando estes se mostravam excessivamente rebeldes, utilizava-se a força pura e simples para reduzi-los à submissão. À medida que a colonização avançava, os franceses foram sendo repelidos para o norte, onde procuravam ainda extrair o pau-brasil. Assim, sucessivamente foram sendo conquistados Sergipe Del Rei, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará, Maranhão e, finalmente, o Grão Pará, cuja conquista completa dar-se-ia somente em meados do século XVII. Antes, porém, de serem repelidos para o Pará, os franceses tentaram ainda fundar no Maranhão a França Equinocial, em 1612, erguendo o forte de São Luís, num derradeiro esforço para preservar uma colônia no Brasil. Depois da conquista do Pará, os franceses finalmente iriam se estabelecer nas Guianas, onde não foram mais molestados. No sul, Portugal fundou em 1680 a Colônia do Sacramento, na margem esquerda do rio da Prata, para se contrapor a Buenos Aires do outro lado do estuário do rio. Nessa área, aliás, iria se desenrolar um intenso conflito entre portugueses e espanhóis, além da intervenção de outras potências, como Françae Inglaterra, em virtude da posição estratégica do rio dá Prata, cuja livre navegação era defendida por várias nações. Povoamento do Brasil até meados do século XVII – A colonização do Brasil, que teve como fundamento a agroindústria açucareira, possibilitou a ocupação efetiva do litoral. Durante muito tempo, segundo a expressão famosa de frei 29 Vicente do Salvador, que viveu no século XVII, os colonos limitavam-se a "andar arranhando as terras ao longo do mar como caranguejos". A interiorização da colonização, entretanto, iniciou-se com o desenvolvimento da pecuária nordestina, que foi gradualmente se afastando do litoral açucareiro que lhe dera origem. Seus focos de irradiação foram Bahia e Pernambuco. Seguindo as margens dos rios, o gado iria possibilitar o povoamento do sertão de Pernambuco, Bahia, Alagoas, Sergipe, Rio Grande do Norte, Ceará, Paraíba e Maranhão. Outro importante fator de ocupação do interior foi o bandeirismo, o responsável pela incorporação da maior parcela territorial pertencente à Espanha ao domínio português. O bandeirismo foi um fenômeno tipicamente paulista. A capitania de São Vicente, apesar do relativo sucesso no começo da colonização, terminou por mergulhar num estado de profunda pobreza por causa de sua posição excêntrica em relação ao polo dinâmico do nordeste. A falta de contato com a metrópole estimulou os vicentinos a entrarem para o interior depois de subir a serra do Mar e atingir o planalto de Piratininga. A princípio, tratava-se de encontrar o ouro ou a prata. É a fase do bandeirismo do ouro de lavagem. No início do século XVII, os holandeses ocuparam o nordeste e estenderam o seu domínio sobre a África portuguesa, desencadeando uma crise de mão de obra na parte portuguesa do Brasil. Os engenhos da Bahia passaram a ter dificuldades de reposição de seu estoque de escravos. Para atender a essa procura, os bandeirantes voltaram-se para a captura de índios, dando origem ao bandeirismo de preação. Essa fase culminou com os ataques às missões jesuíticas espanholas do Tape, Itatim e Guairá. Nessas missões (aldeamento de índios para a catequese), havia um número considerável de índios guaranis. Esses aldeamentos foram estabelecidos com o consentimento do rei espanhol, que via neles uma forma de preservar o domínio territorial sulino que lhe pertencia por força do Tratado de Tordesilhas. Contudo, a reunião dos índios nessas reduções atraiu os bandeirantes, que, num único ataque, conseguiam mão de obra abundante e já disciplinada pelos jesuítas. O bandeirismo de preação entrou em declínio tão logo os holandeses foram expulsos e as posições portuguesas na África recuperadas, regularizando o abastecimento de escravos. A partir disso, o bandeirismo tornou a se redefinir. 30 De fato, na segunda metade do século XVII, ao mesmo tempo em que aumentavam a exploração e a opressão coloniais, ficava evidente a divergência de interesses entre metrópole e colônia. Na colônia aumentou a tensão entre escravos e grandes proprietários. Na época da conquista holandesa, ocorreram fugas em massa de escravos, que formaram o mais famoso quilombo, o de Palmares, em Alagoas. Da mesma forma, os indígenas oprimidos organizaram no Rio Grande do Norte a Confederação dos Cariris. Para destruir esses focos de rebelião, os grandes proprietários do nordeste recorreram a esses rústicos bandeirantes que agora passaram a ser utilizados como força repressora. Teve início aí o sertanismo de contrato, a última forma e fase do bandeirismo. Para destruir a resistência do Quilombo dos Palmares e da Confederação dos Cariris foram contratados os serviços de Domingos Jorge Velho. A mineração e o povoamento do Brasil central – Com a mineração deu-se o passo decisivo na ocupação do interior. Com a descoberta de ouro nas Gerais, o centro dinâmico da economia deslocou-se do litoral nordestino para. o centro- sul do Brasil. Além de propiciar a formação de um mercado interno, o polo minerador serviu de elemento articulador da economia colonial, através da pecuária nordestina e sulina. Esta última, ao se desenvolver e se articular com os centros mineiros, criou condições para a efetiva ocupação do Rio Grande do Sul. Fonte: maniadehistoria.wordpress.com 31 A colonização do extremo norte; o vale amazônico – A colonização da Amazônia - que hoje corresponde aos estados do Amazonas e do Pará - foi estimulada pelas preocupações de garantir a posse e o acesso ao rio Amazonas e impedir a presença de rivais de outros países. A base de ocupação se deu através do extrativismo vegetal e do apresamento indígena. O extrativismo vegetal consistiu na exploração das chamadas "drogas do sertão”: cacau, guaraná, borracha, urucu, salsaparrilha, castanha-do-pará, gergelim, noz de pixurim, baunilha, coco, etc. Por isso, a escravidão tinha ali um terreno desfavorável, pois a exploração da Amazônia dependia do bom conhecimento da região. Daí a importância dos índios locais que serviam de guias. A forma predominante que caracterizou a integração da Amazônia ao conjunto da economia colonial foi o estabelecimento das missões jesuíticas, que chegaram a aldear perto de 50 mil índios. 32 BIBLIOGRAFIA ABREU, Capistrano de. Caminhos Antigos e Povoamento do Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Universidade de São Paulo, 1988. – (Coleção Reconquista do Brasil, v. 135). ALGRANTI, Leila Mezan. 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Por certo, também não tinham ciência de que os descendentes desta raça sofrida, viveriam, séculos mais tarde, contribuindo para o mundo das artes, dos esportes, da política, enfim, da vida social brasileira. Dos negros trazidos para o Brasil e feitos escravos, restou sua cultura que orgulha não somente as pessoas que são definidas como descendentes afro- brasileiro, mas a todos os que vivem neste país. São tradições, costumes, fatos e mais uma infinidade de coisas que se transmitem de forma duradoura por várias gerações. Conclui-se que os estudos nas escolas do Brasil se apresentam pouco generosos com relação a trajetória dos negros em nosso país. Não exatamente por omissão, mas pela ausência da conscientização de que o negro foi importante para o Brasil, de que sua cultura deve ser preservada e conhecida, além de que a cultura afrobrasileira é a de todos os que vivem neste país. Vive-se num país aparentemente sem preconceitos raciais. Vibra-se com gols de jogadores negros, com músicas que embalam os momentos inesquecíveis, mas ainda se convive com um preconceito retido no fundo das almas. Seja no tratamento, seja nos espetáculos televisivos ou teatrais, no 36 ambiente de trabalho, sente-se que os espaços ainda não estão devidamente preenchidos por esta parcela tão sofrida da sociedade. Objetivou-se no presente estudo mostrar aos alunos um pouco mais da história do negro no Brasil, sua trajetória, sua vida em nosso país, sua cultura, seus momentos de amargura que não raras vezes se transformavam em danças, músicas e momentos em que esqueciam o sofrimento do dia a dia. Teve-se ainda a intenção de conscientizar sobre o preconceito que existe em nossos dias. Ele está contido nas frases, nas ações, nos espetáculos, ou seja, em tudo que influenciam a mídia. Considera-se ser preciso arrancar as raízes que existem as pessoas que orgulham de ser preconceituosas e não compreendem o negro como um irmão que está do lado do bem. DEFININDO CULTURA A cultura é uma palavra que tem vários significados. Pode ser referente aos conhecimentos que uma pessoa tem sobre artes, ou seja, ligados ao saber como forma geral. No entanto, no sentido que interessa como estudo e pesquisa seu sentido é bem maior. No fim do século XIX começaram a ser definidas as idéias de cultura como o conjunto de modos de pensar, sentir, agir de um determinado grupo de pessoas. Os estudiosos da vida do ser humano e das sociedades acreditam que na base da vida social é que se encontra a capacidade de simbolizar o ser humano, atribuindo a eles as palavras, os gestos, comportamentos, que permitem aos mesmos a transmissão de sentimentos, idéias, e regras estabelecidas. A maneira de como se compartilham os sentidos é o que formam a cultura, com propriedades do seu grupo, fazendo com que se acredite nas mesmas coisas, entenda os mesmos gestos gráficos e saiba se comportar diante de situações diversas. Conforme observa Souza (2008): É claro que muitas vezes pode haver mal-entendidos entre os membros de uma mesma cultura, assim como e possível entender coisas de culturas às quais não pertencemos. Mas no geral, para entendermos bem outra cultura, temos de passar por um aprendizado dos seus códigos básicos, senão estaremos apenas projetando sobe os significados que aprendemos na nossa 37 própria formação, ao longo do nosso processo de socialização, de nos tornarmos parte de um corpo social. A cultura é algo que nos permite fazer parte de um grupo e nos dificulta sermos um membro integral de um grupo que não o nosso, a não ser que nos transformemos radicalmente. (SOUZA, 2008, p. 87) O Brasil é um país rico em diversidade cultural. Consequências de uma colonização construída por diversos povos que aqui se integraram trazendo juntamente com suas esperanças e planos, o seu patrimônio cultura. Nosso povo adotou essas culturas em sua bagagem cultural, na música, na religião, no modo de falar. Pode-se definir, em nível de Brasil, que a cultura que cerca seus habitantes é uma herança social provinda dos portugueses, italianos, espanhóis, índios e negros. Sobretudo os últimos deixaram sua cultura evidente principalmente considerando sua trajetória pelo Brasil, sua história carregada de sofrimentos e preconceitos que se perpetuam, ao lado da cultura, até os dias de hoje. A história do negro no Brasil, contada nas escolas, em sua maioria, vale-se de descrever o período da escravidão e os horrores do caminho percorrido, e menciona superficialmente a cultura afro- brasileira e a tradição negra. Araujo definiu: Penso, por fim, na ambiguidade desta nossa história de que são vítimas os negros, numa sociedade que os exclui dos benefícios da vida social, mas que, no entanto, consome os deuses do candomblé, a música, a dança, a comida, a festa, todas as festas de negros, esquecida de suas origens. E penso também em como, em vez de registrar simplesmente o fracasso dos negros frente às tantas e inumeráveis injustiças sofridas, esta história termina por registrar a sua vitória e a sua vingança, em tudo o que eles foram capazes de fazer para incorporar-se à cultura brasileira. Uma cultura que guarda, através de sua história, um rastro profundo de negros africanos e brasileiros, mulatos e cafuzos, construtores silenciosos de nossa identidade. E não se pode dizer que não houve afetividade ou cumplicidade nessa relação. A mestiçagem é a maior prova dessa história de pura sedução, da sedução suscitada pela diferença, que ameaça e atrai, mas acaba sendo incorporada como convívio tenso e sedutor, em todos os momentos da nossa vida. Tudo isso é memória. Tudo isso faz parte da nossa história. Uma história escamoteada que já não poderá mais ficar esquecida pela história oficial. (ARAUJO. 2007, p.5) Já foi escrito por vários autores que o Brasil é um país culturalmente pobre e que a cultura não é valorizada. Segundo eles, as escolas se restringem a assegurar aos alunos um pouco sobre os índios, o que apesar de ser importante não é suficiente para se ensinar aos alunos, conceito de cultura de um país. Perguntam onde está a cultura dos portugueses, italianos, japoneses, alemães que está limitada ao seu meio, 38 sem que as demais regiões tenham conhecimento dela. Novamente se salienta a cultua afro-brasileira como a que deixou mais marcas e que se vê na quase totalidadedo país. Para se falar sobre a cultura afro-brasileira não se poderia deixar de mencionar o período escravo que se constitui numa mancha difícil de apagar. É impossível se falar sobre a cultura dos negros, sua passagem pelo Brasil e seus dias atuais se não for escrito sobre a escravidão e suas consequências. Este estudo pretende abranger, entre outros assuntos, a escravidão, seus conhecidos males, sua travessia pelo Atlântico, seu período angustiante, a abolição, suas consequências imprevisíveis e a trajetória dos negros após a liberdade. É importante salientar que o Brasil carrega um amargo detalhe na sua História; foi a última nação do mundo a abolir a escravidão. A ESCRAVIDÃO COMO MÃO DE OBRA Para se falar sobre a cultura afro-brasileira não se poderia deixar de mencionar o período escravo que se constitui numa mancha difícil de apagar. É impossível se falar sobre a cultura dos negros, sua passagem pelo Brasil e seus dias atuais se não for escrito sobre a escravidão e suas consequências. Este estudo pretende abranger, entre outros assuntos, a escravidão, seus conhecidos males, sua travessia pelo Atlântico, O índio brasileiro era tão desprezível na avaliação portuguesa que o preço de cada um não ultrapassava a casa dos quatro mil-réis, enquanto o negro nunca era vendido por menos de cem milréis, isto no início da escravidão. Eram, pois, os africanos, mercadoria de alto valor na época. Para isso concorria, de certo, sua fácil adaptação a faina agrícola, uma vez que, acostumados a outras condições de vida, decorrentes de civilização maias adiantada, seus hábitos e temperamento muito diferiam do nomadismo indígena. [...] (LUNA, 1968, p. 16) Mais tarde, aproximadamente na década de 1690, as regiões de Angola e de Costa da Mina forneceram escravos para o Brasil. Os provenientes da Costa da Mina se destinaram em especial à Bahia, enquanto que os que vieram de Angola foram localizados na região do Rio de Janeiro. No século XIX, foram exportados para o Atlântico, aproximadamente 3,5 milhões de escravos. Na primeira metade do século XX a região Centro Ocidental da África exportou 1,5 milhão, tendo a triste marca de ser o maior fornecedor de cativos. As exportações de escravos passaram a ser cada vez mais lucrativas e na região acima se iniciou uma escassez de pessoas. Começaram então as capturas por outras regiões, desde 39 a costa até as savanas. Os portugueses comerciavam os escravos principalmente nas regiões de Luanda e Benguela, nas quais os capturados eram trocados por tecidos, armamentos e por aguardente brasileira. As negociações envolviam várias etapas, eram lentas e com gestos cheios de significados simbólicos. Os navios tinham que pagar taxas de ancoragem, e os capitães ofereciam presentes para os chefes locais ou para os representas dos reis, que moraram no interior do continente. Estes geralmente eram presenteados com tecidos finos, como brocados, veludos e sedas, com botas de couro, chapéus emplumados, casacos agaloados, punhais e espadas trabalhadas, pipas de bebidas destiladas, cavalos e uma variedade de produtos que indicavam prestigio. (Souza, 2008, p. 59) O processo de ancoragem e da negociação dominava um grande espaço de tempo. A cada dia as trocas de escravos por mercadorias se arrastavam. Devido a este processo lento um navio poderia levar até seis meses para completar a carga e retornar ao ponto de origem. As regiões onde viviam os que foram escravizados e trazidos para o Brasil, possuíam costumes, línguas, organizações de sociedade, religiões completamente diferentes umas das outras. Quando eram condenados pelas rígidas leis da sua sociedade, capturados nas pequenas aldeias, ou até mesmo nas pequenas guerras, nos caminhos que percorriam, quase indiferentes ao que se passava, viam perspectiva de incertezas. Souza descreve que (2008, p.84): “Além de serem afastados das aldeias nas quais cresceram e que eram o centro de seu universo, muito poucas vezes conseguiam se manter próximas de conhecidos e familiares mesmo quando todos eram capturados juntos”. Depois de capturados, em sua terra de origem, os que seriam vendidos, eram ligados, uns aos outros com elos de ferro que impediam as possíveis tentativas de fuga. Iniciavam a marcha até o porto, muitas vezes açoitados. O alimento e a água eram insuficientes, pois não se podia gastar muito tempo para alimentação, diante da pressa dos compradores. Os maus tratos e indiferença por suas vidas ocasionavam muitas mortes pelo caminho. Essas, quando ocorriam, o cadáver era desprendido da argola de ferro e jogado em um ponto qualquer do caminho. Os que sobreviviam eram levados ao navio, atirados nos porões onde os espaços eram mínimos e tão escuros que não se sabia se era dia ou noite. 40 Empilhados nos porões, recebendo parcas rações de comida e de água, era natural que o morticínio fosse acentuado. Perdia-se, invariavelmente, 10% da carga, na melhor das hipóteses, e casos houve em que morreu a metade dos indivíduos transportados. Amontoados no porão, quando o navio jogava, a massa de corpos negros agitava-se como um formigueiro, para beber um pouco desse ar lúgubre que se escoava pela estilha gradeada de ferro. (MACEDO, apud. MARTINS, 1974, p. 29) É importante mencionar que na medida em que a caravana de escravos se aproximava do local de embarque, o número deles crescia, com a adesão obrigatória de novos negros nas feiras. Por serem pessoas com culturas diferentes era natural que se sentissem sozinhas na nova etapa da vida que se iniciava, uma vez que os escravos trazidos não se destinavam a uma só região. Infelizmente sobraram poucos, quase inexistentes relatos dos que viverem os horrores da travessia nos navios negreiros. Enquanto isso, nas livrarias, sobram obras que tentam explicar, com lógica, a prática deste transporte e da escravidão. Logo que eram capturados e negociados com os europeus, começavam as privações. Por medida de economia recebiam uma alimentação ínfima, composta de um pouco de carne seca, farinha de mandioca e arroz. A TRAVESSIA DO ATLÂNTICO E A CHEGADA DOS AFRICANOS AO BRASIL A média de escravos em cada porão dos navios negreiros eram de 440 pessoas. A viagem durava em média 43 dias, caso a viagem partisse do centro sul da África. Nas partidas de Moçambique dobravam os dias da viagem assim como as mortes que podiam chegar a 20%. Nos porões dos navios, a falta de alimentação e o contato muito próximo, uma vez que viajavam amontoados, o calor e a exposição dos corpos àquela situação degradante, fizeram com que se disseminassem as doenças. Uma das doenças mais comuns era o escorbuto, contraída pela falta de vitamina C. Apesar de, no início do século XIX, as condições das embarcações terem melhorado um pouco, comparando-se com os séculos anteriores, pois passaram a contar com a presença de ao menos um cirurgião-barbeiro, de capelães, de uma botica, além da separação entre homens e mulheres, as viagens continuavam sendo muito penosas, com porões superlotados de africanos, que se apertavam para conseguir dormir durante meses sobre o chão duro. Eles passavam quase todo o tempo acorrentados e, no momento do embarque, ou ainda nos barracões costumavam ter o corpo marcado a ferro quente com as iniciais ou símbolos dos proprietários. (MATTOS, 2007, p. 100) 41 Havia ainda o medo crucial do comandante do barco e de seus auxiliares, de uma revolta dos negros. Estes passaram, apesar do sacrifício da viagem, a contar com solidariedade entre eles, levada pelo convívio prolongando. Chegavam a cogitar um motim e para que isso fosse evitado, era destacado algum tripulante capaz de entender o assunto travado entre os escravos. O primeiro passo para se alterar a trajetória dos africanos no Brasil, foi a Lei Eusébio de Queiróz, promulgada pelo mesmo, então Ministro da Justiça entre1848 e 1852. Aprovadaem 4 de setembro de 1850 devido a pressão exercida pela Inglaterra, que foi o principal motivo para que a lei fosse sancionada. No entanto os efeitos imediatos da lei não foram alcançados rapidamente, chegando a haver uma intensificação na entrada de africanos ilegalmente no Brasil, após a promulgação da Lei. As pressões se tornaram mais intensas e o tráfico interno de escravos continuou nas províncias do Rio de Janeiro e São Paulo, que eram os mais produtivos no que se refere ao cultivo do café. Os motivos alegados pelo então Ministro, para sua Lei, não se revelavam simplesmente por questões humanitárias. Explicando as razões, explanava que centenas de fazendeiros, em especial os do “Norte do Império” atravessavam um período de dificuldades com dívidas contraídas com traficantes de escravos. Havia, em sua maioria, os que hipotecaram suas fazendas com grandes traficantes portugueses. Alegava assim que as possibilidades eram imensas de grandes propriedades territoriais saírem das mãos de seus legítimos donos e se transformarem em territórios de especuladores e traficantes. Referia-se assim aos portugueses numa clara alusão às possibilidades de os lusos voltarem a ameaçar a soberania nacional. Outra razão demonstrada por Eusébio de Queiroz para sua Lei era a de que se Império continuasse autorizando a entrada de cativos africanos em grande quantidade, como até então, poderia haver um desequilíbrio quantitativo entre pessoas livres e escravos, o que ameaçaria os brancos. A sociedade ficaria desprotegida diante do grande número de escravos que poderiam, a qualquer momento, rebelar-se e sua insurreição espalharia o terror entre os cidadãos. Luna descreve: 42 A importação não cessou até as vésperas da Abolição. Embora vigorassem leis proibitivas, os negreiros sempre encontravam meios de burlá-las, geralmente, com a complacência das próprias autoridades, o que não é de estranhar, sabendo-se que a classe dominante era constituída de senhores de escravos, fazendeiros de café e donos de engenhos, seus parentes e aderentes, transformados, de uma hora para outra, em nobres da Colônia e do Império [...] (LUNA, 1968, p.98) OS ESCRAVOS NOS PORTOS BRASILEIROS Depois da incerta e terrível viagem chegavam os africanos aos portos do Brasil. Eram retirados dos porões e repartidos aos lotes independentemente de serem ou não da mesma região, parentes, pais, mães filhos ou não. Não se dava importância a estes fatos, era como se eles não tivessem alma, sentimento, amor ou fossem insensíveis a dor, a fome, aos maus tratos. Os traficantes sempre traziam alguns escravos a mais, em número superior as encomendas para serem vendidos nas feiras ou leilões. Desembarcavam quase sem roupas, com apenas uma faixa de tecido cobrindo uma parte do corpo. Os cabelos e a barba eram cortados, determinava-se que tomassem um banho, recebiam algumas toscas roupas de tecido grosseiro, para que melhorassem a aparência e pudessem alcançar um maior preço no Mercado. Este era um imenso rancho, semelhante a uma cocheira. Os que apresentavam um quadro de debilidade em virtude de doenças adquiridas no transporte eram isolados e recebiam cuidados, para mais tarde, serem oferecidos aos compradores. No Rio de Janeiro o Mercado ficava em Valongo, próximo da Praça Mauá. À porta do Mercado colocavam um cartaz onde se anunciava: “negros fortes, bons e moços, chegados na última nau.” (MACEDO, 1974) A chegada dos compradores fazia parte de um ritual considerado inconcebível nos dias de hoje; os músculos dos negros eram apalpados, tinham os lábios levantados para o exame dos dentes e eram obrigados a saltar, dançar, para que fosse examinado seu vigor físico. A arte de comprar exigia experiência do comprador. Havia a prova do suor. O comprador passava o dedo pelo corpo do escravo exposto e lambia para sentir se era suor verdadeiro ou efeito de algum óleo para tornar a pele brilhante, uma vez que o suor na pele do escravo representava bom estado de saúde. Sua barriga era apertada 43 para detectar dor que manifestasse alguma doença, seu peito era escutado, todo o corpo examinado. Quando se tratava de mulher, os seios eram bem examinados pois poderia vir a servir como ama de leite e bem assim as nádegas. Tinha-se interesse em negras do traseiro grande, bem servido de carnes, porque isso era – diziam – indicio de força, saúde e qualidade de boa parideira, capaz de dar novos escravos ao senhor. (MACEDO, 1974, p. 32) Alguns africanos, no caso de serem descartados, eram levados em comboios em barcos ou a pé, em direção às cidades do interior onde seriam vendidos a tropeiros, a preços menores, configurando-se assim o tráfico interno de escravos. O preço dos escravos era definido pelo sexo, idade e especialização, mas dependia, sobretudo, de sua condição física. O destino dessas peças estava nas mãos dos senhores, que podiam alugar, vender, hipotecar, segurar ou penhorar suas novas propriedades. O preço dos escravos variou muito durante os quatro séculos de sua comercialização. Após o final do tráfico, em 1850, o valor dos cativos dobrou, quase inviabilizando a sua utilização. Um escravo homem e adulto podia valer mais do que uma casa na cidade ou três toneladas de café. (MOURA, 1996) O INÍCIO DA NOVA VIDA ESCRAVA Os senhores nomeavam os africanos que eram comprados e passavam a ser mercadoria, da seguinte maneira. Os que não entendiam, não falavam português e desconheciam os costumes da terra, eram considerados os boçais. Os que aprendiam a língua portuguesa, os costumes da nova terra e desempenhavam as funções que lhe eram determinadas eram chamados de ladinos. Os que nasciam no Brasil e tinham o português como sua primeira língua falada e se comportavam dentro dos padrões portugueses, diante de seus donos, eram chamados de crioulos. No século XIX, a maioria era levada para trabalhar nas plantações de café. “Mas também as cidades, a essa altura, maiores e com mais necessidade de trabalhadores, absorviam-nos em grande quantidade”. (SOUZA, 2008) O mundo dos escravos se resumia ao trabalho, único, estafante e obrigatório. No entanto, havia os que possuíam alguma habilidade, ou a adquiriam e eram os escravos urbanos, mais bem tratados. É interessante salientar que, diante da mão de 44 obra escrava, tornou-se uma efetiva desonra uma pessoa livre trabalhar, principalmente em funções mais modestas. Entretanto, os escravos que trabalhavam nas regiões rurais se constituíam na maioria. As condições de se conseguir uma alforria eram remotas e o poder, autoridade e crueldade dos seus proprietários desconheciam limites. A jornada de trabalho era extensa a qual se iniciava antes do nascer do sol e terminava às onze da noite, nas épocas de colheitas. Havia ainda os que se tornavam escravos domésticos. Eram escolhidos conforme sua aparência e eram bem vestidos. Esse é o universo das mucamas, pajens, amas-de-leite, amas-secas, cozinheiras, cocheiros, lavadeiras, copeiros e garotos de recado. No entanto, esses cativos representavam uma minoria e não raro distanciavamse dos demais. Uma velha ladainha dizia: Negro no eito vira copeiro, não óia mais pra seu parceiro. (MOURA, 1996, p.12) Outro fato digno de descrição era a desproporção entre homens e mulheres escravos. Este fato dificultava os casamentos entre eles, sendo as uniões pouco toleradas pelos senhores. No entanto, em 1869 foi criada uma lei que proibia que o marido fosse separado da mulher e dos filhos com idade inferior a quinze anos. O escravo era considerado um patrimônio, uma demonstração de ostentação. Perder um escravo significa um prejuízo de grandes proporções. Em 1863 funcionava no Rio de Janeiro a Cia. Mútua de Seguro de Vida dos Escravos, que se incumbia do ressarcimento, ao senhor, dos prejuízos causados por alguma eventual perda. Nos conventos havia escravos e Nóbrega,
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