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Trabalho - jurisprudências - direito civil

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1) Ementa: 1. ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL (ADPF). PERDA PARCIAL DE OBJETO. RECEBIMENTO, NA PARTE REMANESCENTE, COMO AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. UNIÃO HOMOAFETIVA E SEU RECONHECIMENTO COMO INSTITUTO JURÍDICO. CONVERGÊNCIA DE OBJETOS ENTRE AÇÕES DE NATUREZA ABSTRATA. JULGAMENTO CONJUNTO. Encampação dos fundamentos da ADPF nº 132-RJ pela ADI nº 4.277-DF, com a finalidade de conferir “interpretação conforme à Constituição” ao art. 1.723 do Código Civil. Atendimento das condições da ação. 2. PROIBIÇÃO DE DISCRIMINAÇÃO DAS PESSOAS EM RAZÃO DO SEXO, SEJA NO PLANO DA DICOTOMIA HOMEM/MULHER (GÊNERO), SEJA NO PLANO DA ORIENTAÇÃO SEXUAL DE CADA QUAL DELES. A PROIBIÇÃO DO PRECONCEITO COMO CAPÍTULO DO CONSTITUCIONALISMO FRATERNAL. HOMENAGEM AO PLURALISMO COMO VALOR SÓCIO-POLÍTICO-CULTURAL. LIBERDADE PARA DISPOR DA PRÓPRIA SEXUALIDADE, INSERIDA NA CATEGORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO INDIVÍDUO, EXPRESSÃO QUE É DA AUTONOMIA DE VONTADE. DIREITO À INTIMIDADE E À VIDA PRIVADA. CLÁUSULA PÉTREA. O sexo das pessoas, salvo disposição constitucional expressa ou implícita em sentido contrário, não se presta como fator de desigualação jurídica. Proibição de preconceito, à luz do inciso IV do art. 3º da Constituição Federal, por colidir frontalmente com o objetivo constitucional de “promover o bem de todos”. Silêncio normativo da Carta Magna a respeito do concreto uso do sexo dos indivíduos como saque da kelseniana “norma geral negativa”, segundo a qual “o que não estiver juridicamente proibido, ou obrigado, está juridicamente permitido”. Reconhecimento do direito à preferência sexual como direta emanação do princípio da “dignidade da pessoa humana”: direito a auto-estima no mais elevado ponto da consciência do indivíduo. Direito à busca da felicidade. Salto normativo da proibição do preconceito para a proclamação do direito à liberdade sexual. O concreto uso da sexualidade faz parte da autonomia da vontade das pessoas naturais. Empírico uso da sexualidade nos planos da intimidade e da privacidade constitucionalmente tuteladas. Autonomia da vontade. Cláusula pétrea. 3. TRATAMENTO CONSTITUCIONAL DA INSTITUIÇÃO DA FAMÍLIA. RECONHECIMENTO DE QUE A CONSTITUIÇÃO FEDERAL NÃO EMPRESTA AO SUBSTANTIVO “FAMÍLIA” NENHUM SIGNIFICADO ORTODOXO OU DA PRÓPRIA TÉCNICA JURÍDICA. A FAMÍLIA COMO CATEGORIA SÓCIO-CULTURAL E PRINCÍPIO ESPIRITUAL. DIREITO SUBJETIVO DE CONSTITUIR FAMÍLIA. INTERPRETAÇÃO NÃO-REDUCIONISTA. O caput do art. 226 confere à família, base da sociedade, especial proteção do Estado. Ênfase constitucional à instituição da família. Família em seu coloquial ou proverbial significado de núcleo doméstico, pouco importando se formal ou informalmente constituída, ou se integrada por casais heteroafetivos ou por pares homoafetivos. A Constituição de 1988, ao utilizar-se da expressão “família”, não limita sua formação a casais heteroafetivos nem a formalidade cartorária, celebração civil ou liturgia religiosa. Família como instituição privada que, voluntariamente constituída entre pessoas adultas, mantém com o Estado e a sociedade civil uma necessária relação tricotômica. Núcleo familiar que é o principal lócus institucional de concreção dos direitos fundamentais que a própria Constituição designa por “intimidade e vida privada” (inciso X do art. 5º). Isonomia entre casais heteroafetivos e pares homoafetivos que somente ganha plenitude de sentido se desembocar no igual direito subjetivo à formação de uma autonomizada família. Família como figura central ou continente, de que tudo o mais é conteúdo. Imperiosidade da interpretação não-reducionista do conceito de família como instituição que também se forma por vias distintas do casamento civil. Avanço da Constituição Federal de 1988 no plano dos costumes. Caminhada na direção do pluralismo como categoria sócio-político-cultural. Competência do Supremo Tribunal Federal para manter, interpretativamente, o Texto Magno na posse do seu fundamental atributo da coerência, o que passa pela eliminação de preconceito quanto à orientação sexual das pessoas. 4. UNIÃO ESTÁVEL. NORMAÇÃO CONSTITUCIONAL REFERIDA A HOMEM E MULHER, MAS APENAS PARA ESPECIAL PROTEÇÃO DESTA ÚLTIMA. FOCADO PROPÓSITO CONSTITUCIONAL DE ESTABELECER RELAÇÕES JURÍDICAS HORIZONTAIS OU SEM HIERARQUIA ENTRE AS DUAS TIPOLOGIAS DO GÊNERO HUMANO. IDENTIDADE CONSTITUCIONAL DOS CONCEITOS DE “ENTIDADE FAMILIAR” E “FAMÍLIA”. A referência constitucional à dualidade básica homem/mulher, no § 3º do seu art. 226, deve-se ao centrado intuito de não se perder a menor oportunidade para favorecer relações jurídicas horizontais ou sem hierarquia no âmbito das sociedades domésticas. Reforço normativo a um mais eficiente combate à renitência patriarcal dos costumes brasileiros. Impossibilidade de uso da letra da Constituição para ressuscitar o art. 175 da Carta de 1967/1969. Não há como fazer rolar a cabeça do art. 226 no patíbulo do seu parágrafo terceiro. Dispositivo que, ao utilizar da terminologia “entidade familiar”, não pretendeu diferenciá-la da “família”. Inexistência de hierarquia ou diferença de qualidade jurídica entre as duas formas de constituição de um novo e autonomizado núcleo doméstico. Emprego do fraseado “entidade familiar” como sinônimo perfeito de família. A Constituição não interdita a formação de família por pessoas do mesmo sexo. Consagração do juízo de que não se proíbe nada a ninguém senão em face de um direito ou de proteção de um legítimo interesse de outrem, ou de toda a sociedade, o que não se dá na hipótese sub judice. Inexistência do direito dos indivíduos heteroafetivos à sua não-equiparação jurídica com os indivíduos homoafetivos. Aplicabilidade do § 2º do art. 5º da Constituição Federal, a evidenciar que outros direitos e garantias, não expressamente listados na Constituição, emergem “do regime e dos princípios por ela adotados”, verbis: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.5. DIVERGÊNCIAS LATERAIS QUANTO À FUNDAMENTAÇÃO DO ACÓRDÃO. Anotação de que os Ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Cezar Peluso convergiram no particular entendimento da impossibilidade de ortodoxo enquadramento da união homoafetiva nas espécies de família constitucionalmente estabelecidas. Sem embargo, reconheceram a união entre parceiros do mesmo sexo como uma nova forma de entidade familiar. Matéria aberta à conformação legislativa, sem prejuízo do reconhecimento da imediata auto-aplicabilidade da Constituição. 6. INTERPRETAÇÃO DO ART. 1.723 DO CÓDIGO CIVIL EM CONFORMIDADE COM A CONSTITUIÇÃO FEDERAL (TÉCNICA DA “INTERPRETAÇÃO CONFORME”). RECONHECIMENTO DA UNIÃO HOMOAFETIVA COMO FAMÍLIA. PROCEDÊNCIA DAS AÇÕES. Ante a possibilidade de interpretação em sentido preconceituoso ou discriminatório do art. 1.723 do Código Civil, não resolúvel à luz dele próprio, faz-se necessária a utilização da técnica de “interpretação conforme à Constituição”. Isso para excluir do dispositivo em causa qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família. Reconhecimento que é de ser feito segundo as mesmas regras e com as mesmas consequências da união estável heteroafetiva.
 (STF - ADI: 4277 DF, Relator: AYRES BRITTO, Data de Julgamento: 05/05/2011, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 14/10/2011)
Tribunal: STF
Dispositivo legal envolvido: artigo 1.723 do CC/2002
Comentários: trata-se de ADI em que o objeto principal do pedido era a interpretação do artigo 1.723 do CC/2002, no sentido de reconhecer a união entre pessoas do mesmo sexo como família. O artigo 226 da Constituição da República de 1988 preconiza que a família goza de proteção estatal, sendo ela formada pela junção de homem e mulher. Contudo, no sentido mais moderno do termo, não se pode deixar de reconhecer os vínculos homoafetivos, tanto entre pessoas do sexo feminino, quanto entre pessoas do sexo masculino.Dessa forma, o STF ao decidir que a união entre pessoas do mesmo sexo também está no conceito de família, faz ele justiça ao caso concreto, protegendo direitos de minorias que não encontram respaldo em outros poderes, posição com a qual concordo, já que se trata de decisão acertada e justa para o atual conceito de família, que é formada não somente pelos laços biológicos, mas sim pelo afeto.
	2) Ementa: Recurso Extraordinário. Repercussão Geral reconhecida. Direito Civil e Constitucional. Conflito entre paternidades socioafetiva e biológica. Paradigma do casamento. Superação pela Constituição de 1988. Eixo central do Direito de Família: deslocamento para o plano constitucional. Sobreprincípio da dignidade humana (art. 1º, III, da CRFB). Superação de óbices legais ao pleno desenvolvimento das famílias. Direito à busca da felicidade. Princípio constitucional implícito. Indivíduo como centro do ordenamento jurídico-político. Impossibilidade de redução das realidades familiares a modelos pré-concebidos. Atipicidade constitucional do conceito de entidades familiares. União estável (art. 226, § 3º, CRFB) e família monoparental (art. 226, § 4º, CRFB). Vedação à discriminação e hierarquização entre espécies de filiação (art. 227, § 6º, CRFB). Parentalidade presuntiva, biológica ou afetiva. Necessidade de tutela jurídica ampla. Multiplicidade de vínculos parentais. Reconhecimento concomitante. Possibilidade. Pluriparentalidade. Princípio da paternidade responsável (art. 226, § 7º, CRFB). Recurso a que se nega provimento. Fixação de tese para aplicação a casos semelhantes 
(BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Tribunal Pleno. Recurso Extraordinário 898.060/SC. Relator Ministro Luiz Fux. Julgado em 21/9/2016. Publicado em 24/8/2017).
Tribunal: STF
Dispositivos legais: artigos 1º, III, 226 e 227, todos da Constituição da República de 1988
Comentários: seguindo na mesma linha do papel contra majoritário visto na ADI 4277, principalmente em Direito de Família, coube ao Supremo Tribunal Federal, a partir da ementa desse Recurso Extraordinário, chancelar a possibilidade de um mesmo filho ou filha possuir, em seus registros, a paternidade biológica e a paternidade afetiva. Antes de mais nada, a multiparentalidade é um direito dado aos filhos para escolherem, pelo afeto, quem desejam ter como família. É um instituto que já ocorria com bastante frequência, mas que não constava com amparo legal no Código Civil de 2002. Por isso, pautado nos princípios da dignidade da pessoa humana, no melhor interesse e no afeto, este a mola mestra do Direito de Família moderno, a decisão se mostra justa e apta a efetivar direitos que antes não tinham respaldo na legislação, devendo ser aplicado para pessoas que efetivamente tenham convivido com terceiros e escolham os mesmos para constituírem a sua família afetiva. É uma decisão com a qual concordo e que merece mais estudos por parte dos operadores jurídicos.
	3) RECURSO ESPECIAL Nº 1.845.416 - MS (2019/0150046-0) 
RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE
R.P/ACÓRDÃO : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : VERA LUCIA FERREIRA LOURENÇO
ADVOGADO : LUIS FERNANDO LOPES ORTIZ - MS012082
RECORRENTE : MARLIZETE FERREIRA LOURENCO RODRIGUES ADVOGADOS : ROBERTO SANTOS CUNHA - MS008974
BRUNO GALEANO MOURÃO - MS014509
LORENA IBRAHIM BARBOSA - MS011676
RECORRIDO : JOSÉ MANUEL DIAS ALVES
ADVOGADOS : JOÃO PAULO SALES DELMONDES - MS017876
MARCELA SALES DOS SANTOS - MS021291
INTERES. : JOSE FERNANDO FERREIRA LOURENCO
INTERES. : GISELLE MARIA FERREIRA LOURENÇO
INTERES. : EURIDES CANDIDO BASSANULPHO E SILVA – ESPÓLIO
Ementa: CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA E DAS SUCESSÕES. OMISSÕES E CONTRADIÇÕES. INOCORRÊNCIA. QUESTÕES EXAMINADAS E COERENTEMENTE FUNDAMENTADAS. ERRO, FRAUDE, DOLO OU SUB-ROGAÇÃO DE BENS PARTICULARES. QUESTÃO NÃO RECONHECIDA PELO ACÓRDÃO RECORRIDO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA 7/STJ. FORMALIZAÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL. DESNECESSIDADE. CARACTERIZAÇÃO QUE INDEPENDE DE FORMA. EFEITOS PATRIMONIAIS DA UNIÃO ESTÁVEL. REGIME DE BENS. APLICABILIDADE DA REGRA DO ART. 1.725 DO CC/2002 E DO REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL, NA AUSÊNCIA DE DISPOSIÇÃO EXPRESSA E ESCRITA DAS PARTES. SUBMISSÃO AO REGIME DE BENS IMPOSITIVAMENTE ESTABELECIDO PELO LEGISLADOR. AUSÊNCIA DE LACUNA NORMATIVA QUE SUSTENTE A TESE DE AUSÊNCIA DE REGIME DE BENS. CELEBRAÇÃO DE ESCRITURA PÚBLICA DE INCOMUNICABILIDADE PATRIMONIAL COM EFICÁCIA RETROATIVA. IMPOSSIBILIDADE, POIS CONFIGURADA A ALTERAÇÃO DE REGIME COM EFICÁCIA EX-TUNC, AINDA QUE SOB O RÓTULO DE MERA DECLARAÇÃO DE FATO PRÉ-EXISTENTE. 1- Os propósitos recursais consistem em definir, para além da alegada negativa de prestação jurisdicional: (i) se houve erro, fraude, dolo ou aquisição de bens particulares sub-rogados e de efetiva participação da companheira; (ii) se a escritura pública de reconhecimento de união estável e declaração de incomunicabilidade de patrimônio firmada entre as partes teria se limitado a reconhecer situação fática pretérita, a existência de união estável sob o regime da separação total de bens, e não a alterar, com eficácia retroativa, o regime de bens anteriormente existente. 2- Inexistem omissões e contradições no acórdão que examina amplamente tanto no voto vencedor, quanto no voto vencido, todas as questões suscitadas pelas partes. 3- Dado que o acórdão recorrido não reconheceu a existência de erro, fraude ao direito sucessório, dolo ou aquisição de patrimônio por meio de bens particulares sub-rogados e de efetiva participação da companheira, descabe o reexame dessa questão no âmbito do recurso especial diante da necessidade de novo e profundo reexame dos fatos e das provas, expediente vedado pela Súmula 7/STJ. 4- Conquanto não haja a exigência legal de formalização da união estável como pressuposto de sua existência, é certo que a ausência dessa formalidade poderá gerar consequências aos efeitos patrimoniais da relação mantida pelas partes, sobretudo quanto às matérias que o legislador, subtraindo parte dessa autonomia, entendeu por bem disciplinar. 5- A regra do art. 1.725 do CC/2002 concretiza essa premissa, uma vez que o legislador, como forma de estimular a formalização das relações convivências, previu que, embora seja dado aos companheiros o poder de livremente dispor sobre o regime de bens que regerá a união estável, haverá a intervenção estatal impositiva na definição do regime de bens se porventura não houver a disposição, expressa e escrita, dos conviventes acerca da matéria. 6- Em razão da interpretação do art. 1.725 do CC/2002, decorre a conclusão de que não é possível a celebração de escritura pública modificativa do regime de bens da união estável com eficácia retroativa, especialmente porque a ausência de contrato escrito convivencial não pode ser equiparada à ausência de regime de bens na união estável não formalizada, inexistindo lacuna normativa suscetível de ulterior declaração com eficácia retroativa. 7- Em suma, às uniões estáveis não contratualizadas ou contratualizadas sem dispor sobre o regime de bens, aplica-se o regime legal da comunhão parcial de bens do art. 1.725 do CC/2002, não se admitindo que uma escritura pública de reconhecimento de união estável e declaração de incomunicabilidade de patrimônio seja considerada mera declaração de fato pré-existente, a saber, que a incomunicabilidade era algo existente desde o princípio da união estável, porque se trata, em verdade, de inadmissível alteração de regime de bens com eficácia ex tunc. 8- Na hipótese, a união estável mantida entre as partes entre os anos de 1980 e 2015 sempre esteve submetida ao regime normativamente instituído durante sua vigência, seja sob a perspectiva da partilha igualitária mediante comprovação do esforço comum (Súmula 380/STF), seja sob a perspectiva da partilha igualitária com presunção legal de esforço comum (art. 5º, caput, da Lei nº 9.278/96), seja ainda sob a perspectiva de um verdadeiro regime de comunhão parcial de bens semelhante ao adotado no casamento (art. 1.725 do CC/2002).9- Recurso especial conhecido e parcialmenteprovido
Tribunal: SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REsp nº 1845416/MS (2019/0150046-0).
Dispositivos legais: artigo 1725 do CC/2002
Comentários: trata-se de decisão proferida pelo STJ, pela sua Terceira Turma, que reconheceu a impossibilidade de se ter eficácia retroativa a escritura pública firmada ainda em 2015, onde os companheiros reconheceram a união estável formalizada a 35 anos e fixaram o regime de separação de bens constituídos durante a relação. Os Ministros entenderam que a formalização posterior da união estável, adotando-se regime distinto do previsto no Código Civil de 2002 (regime da comunhão parcial de bens), tem equivalência com a modificação de regime, o que faz surtir efeitos somente a partir da formalização do pacto e não podendo retroagir a data anterior. A decisão proferida pelo STJ parte da ideia de que o silêncio adotado pelos companheiros não significa a ausência de regime de bens, já que a legislação do Código Civil prevê, em seu artigo 1640, que na falta de pacto ou acordo, vigorará o regime da comunhão parcial de bens. A decisão é justa e parte da ideia de proteção da vontade das partes e de se evitar manobras ardilosas que possam impactar diretamente na definição de bens que serão destinados a ambas as partes e até mesmo aos herdeiros, em eventual falecimento de algum dos conviventes.
	4) Ementa Oficial: RECURSO ESPECIAL. CIVIL. FAMÍLIA. RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL POS MORTEM. ENTIDADE FAMILIAR QUE SE CARACTERIZA PELA CONVIVÊNCIA PÚBLICA, CONTÍNUA, DURADOURA E COM OBJETIVO DE CONSTITUIR FAMÍLIA (ANIMUS FAMILIAE). DOIS MESES DE RELACIONAMENTO, SENDO DUAS SEMANAS DE COABITAÇÃO. TEMPO INSUFICIENTE PARA SE DEMONSTRAR A ESTABILIDADE NECESSÁRIA PARA RECONHECIMENTO DA UNIÃO DE FATO. 1. O Código Civil definiu a união estável como entidade familiar entre o homem e a mulher, "configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família" (art. 1.723). 2. Em relação à exigência de estabilidade para configuração da união estável, apesar de não haver previsão de um prazo mínimo, exige a norma que a convivência seja duradoura, em período suficiente a demonstrar a intenção de constituir família, permitindo que se dividam alegrias e tristezas, que se compartilhem dificuldades e projetos de vida, sendo necessário um tempo razoável de relacionamento. 3. Na hipótese, o relacionamento do casal teve um tempo muito exíguo de duração - apenas dois meses de namoro, sendo duas semanas em coabitação -, que não permite a configuração da estabilidade necessária para o reconhecimento da união estável. Esta nasce de um ato-fato jurídico: a convivência duradoura com intuito de constituir família. Portanto, não há falar em comunhão de vidas entre duas pessoas, no sentido material e imaterial, numa relação de apenas duas semanas. 4. Recurso especial provido.
(REsp 1761887/MS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 06/08/2019, DJe 24/09/2019)
Tribunal: SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REsp 1761887/MS (2018/0118417-0)
Dispositivos legais: artigo 1723 do CC/2002
Comentários: trata-se de decisão proferida pelo STJ, através da sua Quarta Turma, a respeito do instituto jurídico da união estável. Antes de mais nada, a união estável é caracterizada por pessoas que convivem, de forma contínua, duradoura, pública, com o objetivo de constituir família. Pela redação do artigo 1723 do CC/2002, o legislador não trouxe prazo mínimo para que esse instituto pudesse ser caracterizado, deixando ao caso concreto e aos elementos juntados no pedido a possível caracterização ou não da união estável. Na presente decisão aqui comentada, o que se notou foi um pedido com pouco tempo de convivência, não tendo, na visão dos julgadores, situação apta a ensejar a aplicação do artigo 1723 do CC/2002. Concordo em partes com o julgado, já que não é somente pelo tempo que a união estável deve ser caracterizada, mas sim pela afetividade e entrega feita por parte de ambas as pessoas, além de outros elementos que precisam ser avaliados.
	5) Ementa: RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL. ANIMAL DE ESTIMAÇÃO. AQUISIÇÃO NA CONSTÂNCIA DO RELACIONAMENTO. INTENSO AFETO DOS COMPANHEIROS PELO ANIMAL. DIREITO DE VISITAS. POSSIBILIDADE, A DEPENDER DO CASO CONCRETO. 1. Inicialmente, deve ser afastada qualquer alegação de que a discussão envolvendo a entidade familiar e o seu animal de estimação é menor, ou se trata de mera futilidade a ocupar o tempo desta Corte. Ao contrário, é cada vez mais recorrente no mundo da pós-modernidade e envolve questão bastante delicada, examinada tanto pelo ângulo da afetividade em relação ao animal, como também pela necessidade de sua preservação como mandamento constitucional (art. 225, § 1, inciso VII - "proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade"). 2. O Código Civil, ao definir a natureza jurídica dos animais, tipificou-os como coisas e, por conseguinte, objetos de propriedade, não lhes atribuindo a qualidade de pessoas, não sendo dotados de personalidade jurídica nem podendo ser considerados sujeitos de direitos. Na forma da lei civil, o só fato de o animal ser tido como de estimação, recebendo o afeto da entidade familiar, não pode vir a alterar sua substância, a ponto de converter a sua natureza jurídica. 3. No entanto, os animais de companhia possuem valor subjetivo único e peculiar, aflorando sentimentos bastante íntimos em seus donos, totalmente diversos de qualquer outro tipo de propriedade privada. Dessarte, o regramento jurídico dos bens não se vem mostrando suficiente para resolver, de forma satisfatória, a disputa familiar envolvendo os pets, visto que não se trata de simples discussão atinente à posse e à propriedade. 4. Por sua vez, a guarda propriamente dita - inerente ao poder familiar - instituto, por essência, de direito de família, não pode ser simples e fielmente subvertida para definir o direito dos consortes, por meio do enquadramento de seus animais de estimação, notadamente porque é um munus exercido no interesse tanto dos pais quanto do filho. Não se trata de uma faculdade, e sim de um direito, em que se impõe aos pais a observância dos deveres inerentes ao poder familiar. 5. A ordem jurídica não pode, simplesmente, desprezar o relevo da relação do homem com seu animal de estimação, sobretudo nos tempos atuais. Deve-se ter como norte o fato, cultural e da pós-modernidade, de que há uma disputa dentro da entidade familiar em que prepondera o afeto de ambos os cônjuges pelo animal. Portanto, a solução deve perpassar pela preservação e garantia dos direitos à pessoa humana, mais precisamente, o âmago de sua dignidade. 6. Os animais de companhia são seres que, inevitavelmente, possuem natureza especial e, como ser senciente - dotados de sensibilidade, sentindo as mesmas dores e necessidades biopsicológicas dos animais racionais -, também devem ter o seu bem-estar considerado. 7. Assim, na dissolução da entidade familiar em que haja algum conflito em relação ao animal de estimação, independentemente da qualificação jurídica a ser adotada, a resolução deverá buscar atender, sempre a depender do caso em concreto, aos fins sociais, atentando para a própria evolução da sociedade, com a proteção do ser humano e do seu vínculo afetivo com o animal. 8. Na hipótese, o Tribunal de origem reconheceu que a cadela fora adquirida na constância da união estável e que estaria demonstrada a relação de afeto entre o recorrente e o animal de estimação, reconhecendo o seu direito de visitas ao animal, o que deve ser mantido. 9. Recurso especial não provido. 
(REsp 1713167/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 19/06/2018, DJe 09/10/2018)
Tribunal: STJ
Dispositivos legais: artigo 225 da CR/88, artigos 1583 e 1584 do CC/2002
Comentários: trata-se de decisão do STJ, proferido pela sua Quarta Turma, em 2018, onde se teve como discussão principal a guardae direito de visita em relação a animal adquirido na constância de união entre um casal que, após alguns anos de convivência, decidiram se separar. Na fundamentação do voto, nota-se que houve uma apreciação dos animais não mais como simplesmente objetos, pertencente ao mundo das coisas, mas sim como semovente que é dotado de sentimentos e que possui a capacidade de ter vínculos afetivos com os seres humanos. A decisão se mostra também pautada em princípios constitucionais, tais como a dignidade da pessoa humana, da afetividade e do melhor interesse das partes envolvidas. Por isso, concordo com o julgamento, no sentido de ser ele um divisor de águas e um novo tratamento para institutos jurídicos que antes somente possuíam a pessoa como cerne, sem considerar os seus laços e afetos, o que não condiz com a realidade do Direito de Família.
	6) Ementa Oficial: RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA. UNIÃO ESTÁVEL. REGIME DE BENS. COMUNHÃO PARCIAL. PREVIDÊNCIA PRIVADA. MODALIDADE FECHADA. CONTINGÊNCIAS FUTURAS. PARTILHA. ART. 1.659, VII, DO CC/2002. BENEFÍCIO EXCLUÍDO. MEAÇÃO DE DÍVIDA. POSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. FUNDAMENTO AUTÔNOMO. 1. Cinge-se a controvérsia a identificar se o benefício de previdência privada fechada está incluído dentro no rol das exceções do art. 1.659, VII, do CC/2002 e, portanto, é verba excluída da partilha em virtude da dissolução de união estável, que observa, em regra, o regime da comunhão parcial dos bens. 2. A previdência privada possibilita a constituição de reservas para contingências futuras e incertas da vida por meio de entidades organizadas de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social. 3. As entidades fechadas de previdência complementar, sem fins lucrativos, disponibilizam os planos de benefícios de natureza previdenciária apenas aos empregados ou grupo de empresas aos quais estão atrelados e não se confundem com a relação laboral (art. 458, § 2º, VI, da CLT). 4. O artigo 1.659, inciso VII, do CC/2002 expressamente exclui da comunhão de bens as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes, como, por analogia, é o caso da previdência complementar fechada. 5. O equilíbrio financeiro e atuarial é princípio nuclear da previdência complementar fechada, motivo pelo qual permitir o resgate antecipado de renda capitalizada, o que em tese não é possível à luz das normas previdenciárias e estatutárias, em razão do regime de casamento, representaria um novo parâmetro para a realização de cálculo já extremamente complexo e desequilibraria todo o sistema, lesionando participantes e beneficiários, terceiros de boa-fé, que assinaram previamente o contrato de um fundo sem tal previsão. 6. Na partilha, comunicam-se não apenas o patrimônio líquido, mas também as dívidas e os encargos existentes até o momento da separação de fato. 7. Rever a premissa de falta de provas aptas a considerar que os empréstimos beneficiaram a família, demanda o revolvimento do acervo fático-probatório dos autos, o que atrai o óbice da Súmula nº 7 deste Superior Tribunal. 8. Recurso especial não provido.
(REsp 1477937/MG, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/04/2017, DJe 20/06/2017)
Tribunal: STJ
Dispositivos legais: artigo 1659 do CC/2002
Comentários: trata-se de decisão proferida pela Terceira Turma do STJ, que versa sobre a partilha de bens em relação à previdência privada contratada por apenas um dos cônjuges ou conviventes. A controvérsia do caso aqui comentado é se a previdência privada na sua modalidade fechada entra ou não no rol das exceções do artigo 1659, VII, do CC/2002. Antes de mais nada, a previdência privada é uma previdência contratada pela parte, facultativa, complementar ao Regime Geral de Previdência Social, organizada a partir da Lei complementar 109/2001, podendo ser classificada como aberta ou fechada. A previdência privada fechada, contratada para empregados de uma mesma empresa ou grupo de empresas, conta com valores do equilíbrio atuarial, não podendo ser resgatado por vontade de um único participante, o que tornaria o sistema insustentável se assim pudesse ocorrer. É partir dessa ideia que o STJ deixou claro que se aplica a essa previdência as regras do artigo 1659, VII, do CC/2002, vedando-se assim que ela integre o patrimônio partilhável. A decisão é acertada e concordo com ela.
	7) Ementa Oficial: RECURSO ESPECIAL - NOMEM IURIS - DEMANDA - PRINCÍPIO ROMANO DA MIHI FACTUM DADO TIBI JUS - APLICAÇÃO - UNIÃO ESTÁVEL - ENTIDADE FAMILIAR - RECONHECIMENTO DO ORDENAMENTO JURÍDICO - REQUISITOS - CONVIVÊNCIA PÚBLICA, CONTÍNUA E DURADOURA - OBJETIVO DE CONSTITUIR FAMÍLIA - DEVERES - ASSISTÊNCIA, GUARDA, SUSTENTO, EDUCAÇÃO DOS FILHOS, LEALDADE E RESPEITO - ARTIGO 1.597, DO CÓDIGO CIVIL - PRESUNÇÃO DE CONCEPÇÃO DOS FILHOS NA CONSTÂNCIA DO CASAMENTO - APLICAÇÃO AO INSTITUTO DA UNIÃO ESTÁVEL - NECESSIDADE - ESFERA DE PROTEÇÃO - PAI COMPANHEIRO - FALECIMENTO - 239 (DUZENTOS E TRINTA E NOVE DIAS) APÓS O NASCIMENTO DE SUA FILHA - PATERNIDADE - DECLARAÇÃO - NECESSIDADE - RECURSO ESPECIAL PROVIDO. I - Desimporta o nomem iuris dado à demanda pois, na realidade, aplica-se-à o adágio romano da mihi factum dado tibi jus. II - O ordenamento jurídico pátrio reconhece, como entidade familiar, a união estável entre pessoas (ut ADPF N. 132/RJ, Rel. Min. Ayres Brito, DJe de 14/10/2011), configurada na convivência pública, contínua e duradoura estabelecida com o objetivo de constituição de família (artigo 1723, do Código Civil), com atenção aos deveres de lealdade, respeito, assistência, de guarda, sustento e educação de filhos (artigo 1724, do Código Civil), de modo a permitir aplicação, às relações patrimoniais, no que couber, das regras pertinentes ao regime de comunhão parcial de bens (artigo 1725, do Código Civil). III - A lei não exige tempo mínimo nem convivência sob o mesmo teto, mas não dispensa outros requisitos para identificação da união estável como entidade ou núcleo familiar, quais sejam: convivência duradoura e pública, ou seja, com notoriedade e continuidade, apoio mútuo, ou assistência mútua, intuito de constituir família, com os deveres de guarda, sustento e de educação dos filhos comuns, se houver, bem como os deveres de lealdade e respeito. IV - Assim, se nosso ordenamento jurídico, notadamente o próprio texto constitucional (art. 226, §3º), admite a união estável e reconhece nela a existência de entidade familiar, nada mais razoável de se conferir interpretação sistemática ao art. 1.597, II, do Código Civil, para que passe a contemplar, também, a presunção de concepção dos filhos na constância de união estável. V - Na espécie, o companheiro da mãe da menor faleceu 239 (duzentos e trinta e nove) dias antes ao seu nascimento. Portanto, dentro da esfera de proteção conferida pelo inciso II do art. 1.597, do Código Civil, que presume concebidos na constância do casamento os filhos nascidos nos trezentos dias subsequentes, entre outras hipóteses, em razão de sua morte. VI - Dessa forma, em homenagem ao texto constitucional (art. 226, §3º) e ao Código Civil (art. 1.723), que conferiram ao instituto da união estável a natureza de entidade familiar, aplica-se as disposições contidas no artigo 1.597, do Código Civil, ao regime de união estável. VII - Recurso especial provido.
(REsp 1194059/SP, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 06/11/2012, DJe 14/11/2012)
Tribunal: STJ
Dispositivos legais: artigos 1597 e 1723, ambos do CC/2002.
Comentários: trata-se de decisão proferida pelo STJ, por meio da Terceira Turma, reconhecendo a presunção de paternidade em caso de união estável. É preciso dizer que o Código Civil de 2002 traz, em seu artigo 1597, II, a presunção de paternidade, após decorridos 300 dias do fim da sociedade conjugal. Contudo, pelos ditames do caput do artigo 1597 do CC/2002, não houve menção à união estável. Contudo, a partir de uma interpretação sistemática da legislação, aliado com a decisão proferida na ADI 4277 e ADPF 132 do STF, a união estável, mesmo que porpessoas do mesmo sexo, é considerado família. Portanto, onde houver o mesmo direito, é preciso que exista a mesma justiça e a mesma decisão. Por isso, concordo com a decisão, já que ela se mostra apta a trazer justiça ao caso concreto.
	8) Ementa Oficial: CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO SUCESSÓRIO. AÇÃO DE INVENTÁRIO E PARTILHA. COMORIÊNCIA ENTRE CÔNJUGES E DESCENDENTES. COLAÇÃO AO INVENTÁRIO DE VALOR EM PLANO DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR PRIVADA ABERTA. NECESSIDADE. REGIME MARCADO PELA LIBERDADE DO INVESTIDOR.
CONTRIBUIÇÃO, DEPÓSITOS, APORTES E RESGATES FLEXÍVEIS. NATUREZA JURÍDICA MULTIFACETADA. SEGURO PREVIDENCIÁRIO. INVESTIMENTO OU APLICAÇÃO FINANCEIRA. DESSEMELHANÇAS ENTRE OS PLANOS DE PREVIDÊNCIA PRIVADA ABERTA E FECHADA, ESTE ÚLTIMO INSUSCETÍVEL DE PARTILHA. NATUREZA SECURITÁRIA E PREVIDENCIÁRIA DOS PLANOS PRIVADOS ABERTOS VERIFICADA APÓS O RECEBIMENTO DOS VALORES ACUMULADOS, FUTURAMENTE E EM PRESTAÇÕES, COMO COMPLEMENTAÇÃO DE RENDA. NATUREZA JURÍDICA DE INVESTIMENTO E APLICAÇÃO FINANCEIRA ANTES DA CONVERSÃO EM RENDA E PENSIONAMENTO AO TITULAR. BEM PERTENCENTE À MEAÇÃO DA CÔNJUGE IGUALMENTE FALECIDA QUE DEVE SER OBJETO DE PARTILHA COM SEUS HERDEIROS ASCENDENTES. 1- Recurso especial interposto em 13/02/2017 e atribuído à Relatora em 02/03/2018. 2- O propósito recursal consiste em definir se deve a inventariante colacionar o valor existente em previdência complementar privada aberta na modalidade PGBL ao inventário do falecido, especialmente na hipótese em que houve comoriência entre o autor da herança, a sua cônjuge e os seus filhos, figurando como herdeiros apenas os ascendentes do casal. 3- Os planos de previdência privada aberta, operados por seguradoras autorizadas pela SUSEP, podem ser objeto de contratação por qualquer pessoa física e jurídica, tratando-se de regime de capitalização no qual cabe ao investidor, com amplíssima liberdade e flexibilidade, deliberar sobre os valores de contribuição, depósitos adicionais, resgates antecipados ou parceladamente até o fim da vida, razão pela qual a sua natureza jurídica ora se assemelha a um seguro previdenciário adicional, ora se assemelha a um investimento ou aplicação financeira. 4- Considerando que os planos de previdência privada aberta, de que são exemplos o VGBL e o PGBL, não apresentam os mesmos entraves de natureza financeira e atuarial que são verificados nos planos de previdência fechada, a eles não se aplicam os óbices à partilha por ocasião da dissolução do vínculo conjugal ou da sucessão, apontados em precedente da 3ª Turma desta Corte (REsp 1.477.937/MG). 5- Embora, de acordo com a SUSEP, o PGBL seja um plano de previdência complementar aberta com cobertura por sobrevivência e o VGBL seja um plano de seguro de pessoa com cobertura por sobrevivência, a natureza securitária e previdenciária complementar desses contratos é marcante no momento em que o investidor passa a receber, a partir de determinada data futura e em prestações periódicas, os valores que acumulou ao longo da vida, como forma de complementação do valor recebido da previdência pública e com o propósito de manter um determinado padrão de vida. 6- Todavia, no período que antecede a percepção dos valores, ou seja, durante as contribuições e formação do patrimônio, com múltiplas possibilidades de depósitos, de aportes diferenciados e de retiradas, inclusive antecipadas, a natureza preponderante do contrato de previdência complementar aberta é de investimento, razão pela qual o valor existente em plano de previdência complementar aberta, antes de sua conversão em renda e pensionamento ao titular, possui natureza de aplicação e investimento, devendo ser objeto de partilha por ocasião da dissolução do vínculo conjugal ou da sucessão por não estar abrangido pela regra do art. 1.659, VII, do CC/2002. 7- Na hipótese, tendo havido a comoriência entre o autor da herança, sua cônjuge e os descendentes, não havendo que se falar, pois, em sucessão entre eles, devem ser chamados à sucessão os seus respectivos herdeiros ascendentes, razão pela qual, sendo induvidosa a conclusão de que o valor existente em previdência complementar privada aberta de titularidade do autor da herança compunha a meação da cônjuge igualmente falecida, a colação do respectivo valor ao inventário é indispensável. 8- Recurso especial conhecido e desprovido.
(REsp 1726577/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/09/2021, DJe 01/10/2021)
Tribunal: STJ
Dispositivos legais: artigo 1659 do CC/2002
Comentários: trata-se de decisão que versa sobre a possibilidade de partilha, em razão da morte, de Plano Gerador de Benefícios Livres (PGBL). O julgado partiu da Terceira Turma do STJ, tendo como relator a Ministra Nancy Andrighi. Anteriormente, no REsp. 1477937/MG, o Tribunal da Cidadania deixou claro que quando se tratasse de previdência privada, na modalidade fechada, por conta de ser ela submetida a um equilíbrio com os demais participantes, não poderia integrar a partilha do casal. Contudo, em relação ao PGBL, que é contratado de forma aberta, privada, complementar ao RGPS, fiscalizada pela SUSEP, trata-se de um investimento que pode ser feito de múltiplas formas, já que pode ser equiparada com aplicação financeira, o que é defendido por parte da doutrina. Por isso, a previdência privada aberta é comunicável e deve ser partilhada quando se tratar de regime da comunhão parcial ou universal de bens, não se amoldando à exceção do artigo 1659, VII, CC/2002, decisão com a qual concordo.

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