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79 FISIOLOGIA APLICADA E PSICOBIOLOGIA Unidade II 5 SISTEMA ENDÓCRINO Vimos anteriormente que uma das formas de comunicação das células umas com as outras é através de mensageiros moleculares, os hormônios. Hormônios são mensageiros químicos secretados no sangue por células endócrinas ou por neurônios especializados, podendo ser transportados a alvos distantes, onde exercem seus efeitos em baixíssimas concentrações (10-9 a 10-12 M). Aqueles que são liberados na circulação atuam sobre todo o organismo e são conhecidos como hormônios endócrinos. Os que atuam na região em que são liberados são os parácrinos. A figura a seguir resume alguns dos hormônios produzidos em nosso organismo, bem como os órgãos que os produzem. Hipotálamo GHRH GnRH TRH CRH Hipófise Posterior Vasopressina Ocitocina Anterior ACTH GH TSH Gonadotrofinas Glândulas tireoides T3 e T4 Calcitonina Glândulas adrenais Córtex Cortisol Aldosterona Androgênios Medula Adrenalina Glândulas paratireoides Hormônio da paratireoide Coração Hormônio natriurético TGI Gastrina, secretina Ilhotas pancreáticas Insulina, glucagon Gônadas Andrógenos, progesterona e estrogênios Figura 43 – Hormônios endócrinos e tecidos que os produzem. ACTH: hormônio adrenocorticotrófico; GH: hormônio do crescimento; TSH: hormônio tireoestimulante; T3: triiodotironina; T4: tiroxina; GHRH: hormônio liberador de GH; GnRH: hormônio liberador de gonadotrofinas; TRH: hormônio liberador de tireotrofinas; CRH: hormônio liberador de corticotrofinas; TGI: trato gastrointestinal O hipotálamo, que está localizado no SNC, conforme vimos anteriormente, libera peptídeos que atuam sobre a hipófise (também chamada de pituitária) e controlam a liberação dos hormônios estimuladores da tireoide, dos hormônios gonadais e dos hormônios liberadores de glicocorticoides. Há também a liberação de uma amina – a dopamina, que inibe a liberação de prolactina pela hipófise. A função da prolactina é estimular as glândulas mamárias a iniciar a lactação. Na realidade, o hipotálamo não atua como uma glândula clássica, visto que os compostos que ele produz agem diretamente sobre a hipófise, que libera uma série de hormônios que controlam as demais glândulas. 80 Unidade II A essa comunicação entre hipotálamo, hipófise e tecido-alvo é dado o nome de eixo – portanto, existe um eixo chamado hipotálamo-hipófise-tireoide, outro denominado hipotálamo-hipófise-adrenal e ainda o hipotálamo-hipófise-gônadas. Esse é um sistema de controle; os hormônios produzidos pelas glândulas-alvo, ao circularem, informam ao hipotálamo e aos outros locais que sua missão foi cumprida. Nesse momento, a produção dos fatores liberadores cessa, resultando em uma diminuição da liberação dos hormônios da hipófise. Esse mecanismo de controle é conhecido como feedback negativo ou retroalimentação negativa. Vamos ver com mais detalhes a comunicação que ocorre entre hipotálamo e hipófise. A glândula hipófise é constituída por um lobo anterior (adeno-hipófise) e um lobo posterior (neuro-hipófise), os quais possuem origens embrionárias diferentes. A adeno-hipófise é uma glândula que, quando estimulada pelos hormônios hipotalâmicos, produz e libera seis hormônios que estimulam outras glândulas endócrinas e tecidos periféricos. Esses hormônios são um mecanismo de controle para o sistema endócrino como um todo (veja a figura a seguir). A neuro-hipófise secreta dois tipos de hormônios, mas não os produz. Em vez disso, eles são produzidos por neurônios especializados que vão do hipotálamo até a neuro-hipófise, conforme a figura a seguir demonstra: Neurônios hipotalâmicos (secretam hormônios de liberação) Núcleo paraventricular Veia porta hipofisária Plexo capilar primárioNúcleo supraóptico Neuro-hipófise Células secretórias Adeno-hipófise Ocitocina Vasopressina Veia Prolactina TSH ACTH GH FSH LH Dopamina Prolactina Mamas TRH TSH GHRH GH CRH ACTH GnRH FSH LH Hormônios da adeno-hipófise Alvos endócrinos e seus hormônios Alvos não endócrinos Glândula tireoide T3 T4 Córtex da adrenal Fígado Cortisol IGF ♀♂ Androgênios Células germinativas das gônadas Vários tecidos Estrogênios Progesterona Células endócrinas das gônadas Figura 44 – Resumo da secreção hormonal pelo adeno-hipófise e pela neuro-hipófise 81 FISIOLOGIA APLICADA E PSICOBIOLOGIA Classificação dos hormônios Os hormônios podem ser classificados quimicamente em três classes principais: • hormônios peptídicos, compostos por aminoácidos; • hormônios esteroides, derivados do colesterol; • hormônios derivados do aminoácido tirosina. A maior parte dos hormônios são peptídeos ou proteínas. Inicialmente o pré-pró-hormônio é sintetizado no retículo endoplasmático rugoso (RER). O pré-pró-hormônio é uma cadeia peptídica que possui uma região denominada peptídeo sinal, que permite que essa molécula seja direcionada ao complexo de Golgi. Uma vez no complexo de Golgi, a sequência sinal é removida e a molécula passa a se chamar pró-hormônio. O pró-hormônio é então armazenado em uma vesícula secretora juntamente com uma enzima proteolítica (enzima que “corta” proteínas em locais específicos) que separa o pró-hormônio em hormônio e outros fragmentos. A vesícula sofre exocitose dependente de cálcio sob demanda. Um exemplo de hormônio peptídico é a insulina. Peptídeos e proteínas são moléculas grandes incapazes de atravessar a membrana plasmática livremente. Portanto, para que os hormônios peptídicos possam exercer seus efeitos, é necessário que eles reconheçam receptores de membrana específicos. A ligação do hormônio ao receptor promove a ativação de vias de sinalização dentro da célula, essas vias são chamadas de sistemas de segundos mensageiros (o primeiro mensageiro é o hormônio). Os hormônios esteroides são derivados do colesterol. Três tipos de hormônios esteroides são sintetizados no córtex da glândula adrenal. As gônadas produzem os hormônios esteroides sexuais (estrogênios, progesterona e androgênios). Na mulher grávida, a placenta também produz hormônios esteroides. Observação O colesterol é uma molécula presente na membrana plasmática, onde é importante para garantir sua fluidez. Dessa forma, os hormônios que são sintetizados a partir do colesterol também terão essa natureza lipofílica e a capacidade de se difundir com facilidade através da membrana plasmática. São hormônios sintetizados sob demanda, ou seja, as células não fazem armazenamento dessa classe de hormônios. A maior parte dos hormônios é transportada no sangue por proteínas transportadoras (como a albumina) e apenas uma quantidade muito pequena é transportada livremente. Apenas os hormônios livres são biologicamente ativos. 82 Unidade II Os hormônios esteroides exercem seus efeitos por se ligarem a receptores nucleares (localizados dentro do núcleo das células) ou citoplasmáticos (localizados no citoplasma das células), com os quais formam um complexo que atua como fator de transcrição, ou seja, o complexo formado entre o hormônio e o receptor é capaz de interagir com o DNA e ativar a síntese de novas proteínas. Esta classe de hormônios pode atuar também sobre receptores de membrana, promovendo respostas imediatas. Existem duas classes de hormônios derivados do aminoácido tirosina: as catecolaminas e os hormônios da tireoide. As catecolaminas são dopamina, noradrenalina e adrenalina. Os hormônios tireoidianos são triiodotironina e tiroxina. Tirosina é o aminoácido precursor das catecolaminas e dos hormônios da tireoide. Hormônios da tireoide são sintetizados a partir de duas tirosinas e átomos de iodo (I). Catecolaminas são produzidas pela modificação das cadeias laterais da tirosina. HO I I I I I I I HO HO HO O O HO HO HO HO HO C C C C C C H C C C O O O OH OH OH H H H H H H H H H H H H H H H H H H H CH3 N N N N N N C C C C C C H H H H OH OH H H H H H H Tiroxina (tetra-iodotironina, T4) Tri-iodotironina(T3) Dopamina Noradrenalina Adrenalina Figura 45 – Hormônios derivados do aminoácido tirosina O quadro a seguir apresenta um resumo dos hormônios produzidos, a glândula ou tecido de origem e a principal função que exercem: 83 FISIOLOGIA APLICADA E PSICOBIOLOGIA Quadro 4 – Principais hormônios e suas funções Glândula/tecido Hormônio Principal função Hipotálamo TRH (hormônio liberador de tireotrofina) Aumenta a liberação de hormônio estimulante da tireoide (TSH) e prolactina CRH (hormônio liberador de corticotrofina) Libera o hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) GHRH (hormônio liberador de hormônio do crescimento) Libera o hormônio do crescimento Somatostatina Inibe a liberação do hormônio do crescimento GnRH (hormônio liberador de gonadotrofina) Libera LH e FSH dopamina Dopamina Inibe a liberação de prolactina Adeno-hipófise GH (hormônio do crescimento) Aumenta a síntese proteica e o crescimento da maioria das células e tecidos TSH (hormônio estimulante de tireoide) Aumenta a síntese e a secreção dos hormônios da tireoide Prolactina Promove o desenvolvimento das mamas e secreção do leite FSH (hormônio folículo estimulante) Atua sobre ovários e testículos LH (hormônio luteinizante) Aumenta a síntese de testosterona e a formação do corpo lúteo, estrógeno e progesterona Neuro-hipófise ADH (hormônio antidiurético) Aumenta a reabsorção de água pelos rins e causa vasoconstricção e aumento da pressão arterial Ocitocina Estimula a ejeção de leite e a contração do útero Tireoide T4 (tiroxina) e T3 (triiodotironina) Aumenta o metabolismo Córtex adrenal Cortisol Promove efeitos diversos na dependência da concentração. Prepara o acordar, além de ter ação anti-inflamatória Aldosterona Atua na reabsorção de sódio e secreção de potássio e íons hidrogênio Medula adrenal Adrenalina e noradrenalina Apresenta o mesmo efeito da estimulação simpática Pâncreas Insulina (células beta) Promove a entrada de glicose nas células Glucacon (células alfa) Aumenta a síntese e a liberação de glicose do fígado para o sangue Paratireoide PTH (hormônio paratireoide) Controla a concentração plasmática de cálcio por aumentar a absorção nos intestinos e rins e liberar cálcio dos ossos Testículo Testosterona Promove o desenvolvimento do aparelho reprodutivo e das características secundárias masculinas Ovário Estrógeno Promove o desenvolvimento do aparelho reprodutivo, da mama e das características secundárias femininas Progesterona Participa do processo de menstruação e fixação do embrião Placenta HCG (gonadotrofina coriônica humana) Promove o crescimento do corpo lúteo Rim Renina É uma enzima envolvida no controle da pressão arterial Coração Eritropoietina Controla a produção de hemácias Fator natriurético atrial Aumenta a excreção de sódio pelos rins e reduz a pressão arterial Estômago Gastrina Estimula a liberação de HCl no estômago Intestino delgado Secretina Estimula as células acinares do pâncreas a liberar bicarbonato e água Colecistoquinina Estimula a contração da vesícula biliar e a liberação de enzimas do pâncreas Adipócitos Leptina Inibe o apetite e estimula a termogênese 84 Unidade II Hormônios podem atuar em receptores acoplados à proteína G, receptores-tirosina quinase ou receptores intracelulares. • Receptores acoplados à proteína G: como exemplo de hormônios que atuam através de GPCRs, temos adrenalina, noradrenalina e glucagon. • Receptores de tirosina quinase: são receptores que sinalizam síntese proteica. A insulina é um hormônio que atua nesses receptores. • Receptores intracelulares: localizam-se no citoplasma e o complexo hormônio-receptor é capaz de atuar como fator de transcrição, comandando a síntese de novas proteínas. Existem receptores intracelulares seletivos para cada um dos hormônios e os pacotes de proteínas transcritos são específicos e controlados ao longo do tempo. Para ter a dimensão dessa ação, pense o que ocorre na puberdade, quando grandes quantidades de proteínas são transcritas sob a sinalização do estrógeno (meninas) e testosterona (meninos). O estudo da fisiologia e da farmacologia dos receptores tem sido a base para grandes avanços terapêuticos. Conforme Goodman (2001), a regulação das funções celulares por hormônios inclui aspectos da neurobiologia, biologia celular, imunologia e biologia do desenvolvimento. A função do sistema endócrino é coordenar e integrar a atividade celular no corpo, regulando a função de células e órgãos à distância. Nós podemos destacar as seguintes missões fisiológicas para o sistema endócrino: • Regulação do balanço de sódio e água: preservação do volume/pressão necessário para perfusão tecidual. • Regulação do balanço de cálcio: preservação das concentrações do fluido extracelular requeridas para manter a integridade da membrana, sinalização intracelular, homeostase, preservação da integridade dos ossos, entre outras. • Regulação do balanço de energia: preservar, acessar e interconverter combustíveis para suprir as demandas de energia. • Coordenação de processos para lidar com ambientes hostis. • Coordenação do crescimento e desenvolvimento. • Coordenação de processos associados à reprodução e lactação. A partir dessa perspectiva, fica claro que pelo menos algum aspecto de virtualmente todo sistema fisiológico está dentro do domínio do controle endócrino. Nenhum único hormônio ou glândula endócrina pode completar nenhuma dessas missões sozinho, e virtualmente cada hormônio participa no 85 FISIOLOGIA APLICADA E PSICOBIOLOGIA cumprimento de múltiplas missões. Consequentemente, é preciso saber não apenas como os hormônios agem, mas também como eles interagem. Alguns conceitos básicos transcendem a ampla gama de ações fisiológicas dos hormônios e podem fornecer uma base para o entendimento da regulação hormonal. Muitos desses conceitos são também as bases para o diagnóstico e tratamento de distúrbios endócrinos. 5.1 Controle da secreção hormonal Compreender o feedback negativo está no cerne da compreensão dos sistemas de controle endócrino. A essência do controle por feedback negativo da secreção hormonal é que alguma consequência da secreção bloqueia ou amortece a secreção adicional. O modelo representado garantiria a constância de um parâmetro regulado em algum ponto de ajuste e permite adaptação às mudanças nas demandas ambientais. Como as células respondem ao hormônio? A responsividade das células-alvo à estimulação por seus hormônios não é constante, podendo variar largamente em diferentes estados fisiológicos e sendo geralmente ajustada pelas ações dos outros hormônios ou agentes locais parácrinos ou autócrinos, bem como pelo hormônio primário. O determinante mais óbvio da magnitude da resposta é a concentração do hormônio que está disponível para se ligar aos receptores. Essa concentração, por sua vez, é determinada pelas taxas de: • secreção hormonal; • entrega pela circulação até a superfície-alvo; • degradação ou excreção do hormônio. De igual importância à concentração do hormônio é o número de células-alvo competentes que expressam receptores funcionais. A sensibilidade das células-alvo ao estímulo hormonal não é constante e depende de alguns fatores, como: • o número de receptores funcionais que são expressos; • a afinidade do receptor ao hormônio; • o status dos mecanismos de intracelulares após a ligação do ligante ao receptor; • o status e abundância das moléculas efetoras. A sensibilidade a um hormônio é geralmente definida como a concentração necessária para produzir metade da resposta máxima. A sensibilidade do órgão-alvo não é constante e é geralmente ajustada de acordo com circunstâncias fisiológicas. A seguir vamos abordar com mais detalhes a fisiologia dos diferentes hormônios. 86 Unidade II 5.2 Energética e metabolismo As células precisam gerenciar uma variedade de funções, e a maioria dessas funções requerem energia. No nosso organismo, a energia é gasta para realização de trabalho biológico. As principaisformas de trabalho biológico são: • Trabalho de transporte de substâncias de um lado da membrana para o outro. • Trabalho mecânico, como o realizado para contração muscular. • Trabalho químico, que permite crescimento, manutenção e armazenamento de informação e energia. Mas como as células obtêm energia? E como elas usam essa energia da forma mais eficiente possível? As células não podem gerar energia sem localizarem uma fonte no ambiente. As células humanas, que são eucarióticas, buscam sua energia em forma de comida, enquanto as células de plantas usam a luz do sol para sintetizar sua fonte de energia através da fotossíntese (veja a figura a seguir). Energia da luz do sol Glicose e ATP Oxigênio Dióxido de carbono Água Figura 46 – A figura ilustra o processo de fotossíntese. As plantas utilizam água, dióxido de carbono (CO2) e a energia solar e, através da fotossíntese, os convertem em oxigênio (O2) e moléculas que armazenam energia, como o amido De fato, o sol é a fonte primordial de energia para quase todas as células, uma vez que procariotos fotossintéticos, algas e plantas usam a energia solar para produzir moléculas orgânicas complexas, das quais outras células se utilizam para obter a energia requerida para sustentar seu crescimento, metabolismo e reprodução. 87 FISIOLOGIA APLICADA E PSICOBIOLOGIA Os nutrientes celulares vêm de muitas formas, incluindo açúcares e gorduras. Para prover uma célula com energia, essas moléculas precisam passar através da membrana celular. Como as células transformam nutrientes em energia usável? Moléculas de alimentos complexas como açúcares, gorduras e proteínas são fontes ricas de energia para as células porque muita da energia usada para formar essas moléculas é literalmente estocada nas ligações químicas que as formam. Os cientistas podem medir a quantidade de energia estocada nos alimentos usando um dispositivo chamado calorímetro. Com essa técnica, a comida é colocada dentro do aparelho e aquecida até queimar. O excesso de calor liberado pela reação é diretamente proporcional à quantidade de energia contida na comida. É assim que se determina a quantidade de calorias daquelas tabelas nutricionais das embalagens dos alimentos. Observação Uma caloria é definida como a quantidade de calor necessária para aquecer em 1 ºC a temperatura de 1 g de água. No nosso organismo, é claro, as células não funcionam como calorímetros. Em vez de queimarem toda a sua energia em uma reação enorme, as células liberam a energia dos alimentos através de uma série de reações de oxidação. Observação Oxidação descreve um tipo de reação química nas quais elétrons são transferidos de uma molécula para outra, mudando a composição e o conteúdo de energia tanto da molécula aceptora quanto da molécula doadora. Uma molécula redutora é aquela que tem tendência a doar elétrons, enquanto uma molécula oxidante tem tendência a receber elétrons. As moléculas de comida agem como doadores de elétrons. Durante cada reação de oxidação envolvida na quebra dos alimentos, o produto da reação possui conteúdo menor de energia que a molécula que a precedeu na via. Ao mesmo tempo, moléculas aceptoras de elétrons capturam uma parte dessa energia e a estocam para uso posterior. Eventualmente, quando os átomos de carbono de uma molécula de alimento complexa são totalmente oxidados, eles são liberados na forma de dióxido de carbono (que vai ser liberado depois na expiração). 88 Unidade II As células não usam energia das reações de oxidação assim que ela é liberada. Em vez disso, elas a convertem em moléculas pequenas ricas em energia, como a adenosina trifosfato (ATP) e a nicotinamida adenina dinucleotídeo (NADH), que podem ser usadas para potencializar o metabolismo e sintetizar novos componentes celulares. Além disso, proteínas chamadas enzimas usam essa energia química para acelerar (catalisar) reações químicas dentro da célula. Observação As enzimas não forçam a reação a acontecer. Elas simplesmente diminuem a barreira energética requerida para uma reação começar. Quais vias específicas a célula usa? Um diagrama da estrutura básica do ATP está representado a seguir: Adenina Adenosina Três grupos fosfato (PO4 2-) Ligação de alta energia P P PRibose Figura 47 – Uma molécula de ATP. A palavra adenosina se refere à molécula de adenina mais o açúcar ribose. A ligação entre o segundo e o terceiro fosfatos é uma ligação de alta energia A molécula de ATP consiste da base nitrogenada adenina (representada em azul), a ribose (representada em rosa) e três grupos fosfato. A ligação fosfato de alta energia é a chave para o potencial de armazenamento de energia dessa molécula. ATP é a molécula carreadora de energia mais abundante nas células. A via energética particular que uma célula utiliza depende em grande parte de a célula ser eucariótica ou procariótica. Células eucarióticas, como as células do nosso corpo, usam três principais processos para transformar a energia guardada em ligações químicas de moléculas em formas mais utilizáveis de energia. O primeiro processo na via de energética de eucariotos é a glicólise, que literalmente significa “quebra da glicose”. Durante a glicólise, moléculas de glicose são quebradas e convertidas em duas moléculas de piruvato. Uma vez que cada molécula de glicose possui seis carbonos, cada piruvato resultante contém três carbonos. A glicólise é na verdade uma série de dez reações químicas que fazem uso de duas moléculas de ATP para iniciar e produzem ao final quatro moléculas de ATP, ou seja, seu saldo é 89 FISIOLOGIA APLICADA E PSICOBIOLOGIA de duas moléculas de ATP. Duas moléculas de NADH também são produzidas; essas moléculas servem como carreadores de elétrons para outras reações químicas na célula, conforme veremos adiante. A glicólise é um processo conservado, o que significa que ocorre em quase todas as células procarióticas e eucarióticas. É um processo que ocorre totalmente no citoplasma e não requer oxigênio para acontecer. Entretanto, o destino do piruvato produzido durante a glicólise depende de se o oxigênio está presente ou não. Na ausência do oxigênio o piruvato não pode ser completamente oxidado a CO2, então vários produtos intermediários são gerados, e esse processo recebe o nome de fermentação. Por exemplo, quando os níveis de oxigênio estão baixos, as células do músculo esquelético usam a glicose para suprir suas demandas por energia. Nesse contexto, o piruvato gerado a partir da glicose é convertido em um intermediário conhecido como lactato (fermentação lática), que pode fazer com que a pessoa sinta que os músculos estão “queimando”. De forma semelhante, em leveduras, que são organismos eucarióticos unicelulares, a ausência de oxigênio faz com que o álcool seja gerado como intermediário (fermentação alcoólica). Saiba mais Você pode ler mais sobre fermentação em: SILVA, J. S.; JESUS, J. C.; COUTO, S. Noções sobre fermentação e produção de álcool na fazenda. 2010. Disponível em: ftp://ftp.ufv.br/dea/poscolheita/ Produ%E7%E3o%20de%20%C1lcool%20Combust%EDvel%20na%20 Fazenda %20e%20em%20Sistema%20Cooperativo/Cap%EDtulo%201.pdf. Acesso em: 18 jan. 2020. Por outro lado, quando o oxigênio está disponível, os piruvatos produzidos pela glicólise seguem um outro processo, que ocorre dentro da mitocôndria. Esse processo é chamado de respiração celular, uma vez que requer oxigênio e é capaz de gerar cerca de 15 vezes mais energia do que a fermentação. H2O H2O CO2 CO2 O2 O2 ADP NAD+ NADH Intermediários Nutrientes e moléculas contendo carbono Mirerais Compostos nitrogenados Fatores de crescimentos Macromoléculas Anabolismo Catabolismo ATP Figura 48 – Metabolismo em uma célula eucariótica: glicólise, ciclo do ácido cítrico e fosforilação oxidativa. A glicólise ocorre no citoplasma. Dentro da mitocôndria, o ciclo do ácido cítrico ocorre na matriz mitocondrial e o metabolismo oxidativo ocorre na membrana mitocondrial interna90 Unidade II Como as células guardam energia? Quando a energia é abundante, as células eucarióticas sintetizam moléculas grandes e ricas em energia para guardar como estoque. Os açúcares e gorduras resultantes (polissacarídeos e lipídios) são então armazenados dentro das células. As células animais podem sintetizar polímeros ramificados de glicose conhecidos como glicogênio. Quando houver necessidade de obtenção de energia rápida, a célula pode mobilizar essas partículas. Atletas que consomem massa na noite anterior a uma competição estão tentando aumentar suas reservas de glicogênio. Sob circunstâncias normais, o estoque de glicogênio em humanos é suficiente para proporcionar a quantidade de energia necessária para um dia. As plantas não produzem glicogênio, mas produzem outro polímero de glicose, o amido. Ainda, tanto células de plantas como de animais estocam energia transformando açúcares em gorduras. Um grama de gordura contém quase seis vezes mais energia do que a mesma quantidade de glicogênio, mas a energia da gordura é menos prontamente disponível do que a energia do glicogênio. Cada mecanismo de estoque é importante porque as células precisam de depósitos de energia rápidos e de longo prazo. As gorduras são estocadas em gotículas no citoplasma dos adipócitos, que são células especializadas nesse tipo de armazenamento. Humanos geralmente estocam gordura suficiente para suprir suas células com energia por várias semanas. Então, quando nos alimentamos, transformamos a energia química das moléculas do alimento em um outro tipo de energia química (o ATP), que poderá ser usado para realizar trabalho – lembrando que, uma vez gerado, o ATP funciona como reserva energética de tempo curto. Para armazenar energia por longos períodos, nosso organismo sintetiza moléculas de glicogênio e lipídios. Observação De acordo com a Primeira Lei da Termodinâmica, um sistema não pode criar ou consumir energia, apenas transformá-la ou armazená-la. No nosso organismo, a energia dos alimentos é transformada em energia armazenada e na energia utilizada para realizar trabalho (processos celulares). Interessantemente, a utilização desta energia não produz apenas trabalho, calor também é perdido nesse processo. Para contrapor essa produção de calor a partir da realização de trabalho é necessário que existam mecanismos de regulação da temperatura corporal. Conforme vimos anteriormente, a estrutura que funciona como um termostato é o hipotálamo, localizado no SNC. Ele recebe informações dos termorreceptores internos e externos e determina respostas a variações de temperatura, tais como vasodilatação ou vasoconstricção, sudorese e termogênese com ou sem tremor. A necessidade energética diária de uma pessoa, denominada consumo calórico, varia de acordo com a necessidade e a atividade do corpo. Por exemplo, homens atletas de alto rendimento podem necessitar 91 FISIOLOGIA APLICADA E PSICOBIOLOGIA mais de 10.000 kcal. Por outro lado, um homem pesando 70 kg desempenhando uma atividade normal pode exigir somente 2.000 kcal/dia. Saiba mais Veja a reportagem a seguir sobre a dieta do atleta Michael Phelps na época do seu auge de rendimento em campeonatos: BARBOSA, D. A dieta de Michael Phelps – o maior medalhista olímpico. Exame, 13 ago. 2016. Disponível em: https://exame.abril.com.br/estilo-de- vida/a-dieta-de-michael-phelps-o-maior-medalhista-olimpico/. Acesso em: 24 jan. 2020. 5.2.1 Hormônios que coordenam o metabolismo O pâncreas funciona tanto como uma glândula exócrina quanto como uma glândula endócrina. Uma glândula exócrina secreta fluidos pra outras áreas dentro ou fora do corpo através de tubos. No caso do pâncreas, o fluido é o suco pancreático secretado no duodeno através do ducto pancreático. No seu papel de glândula endócrina, o pâncreas também secreta hormônios diretamente na corrente sanguínea. Essa função endócrina é realizada por aglomerados de células que estão espalhadas pelo pâncreas como pequenas ilhas, as quais são chamadas de ilhotas de Lagerhans. As ilhotas de Langerhans incluem as células α, que secretam glucagon, e as células β, que secretam insulina (veja a figura a seguir). Diversos hormônios podem aumentar os níveis de glicose plasmáticos (adrenalina, GH, glucagon, glicocorticoide, hormônios da tireoide), mas apenas a insulina é capaz de reduzi-los. Ducto colédoco Ducto pancreático (a) Anatomia bruta (b) As ilhotas de Langerhans que constituem o pâncreas endócrino Células exócrinas Células endócrinas Ilhotas de Langerhans Capilar As células alfa secretam glucagon As células beta secretam insulina e amilina As células D secretam somatostatina Intestino delgado (duodeno) Pâncreas Figura 49 – Representação esquemática das ilhotas pancreáticas responsáveis pela secreção dos hormônios. As células β (beta) produzem e secretam insulina. As células α (alfa) produzem e secretam glucagon. Por sua vez, as células D produzem somatostatina 92 Unidade II A maioria das células usa glicose para síntese de ATP, mas existem outras moléculas igualmente importantes para manutenção da homeostase do organismo. A maioria das células no corpo humano possui mitocôndria, suprimento adequado de oxigênio e acesso aos três tipos de combustível (carboidratos, lipídios e proteínas). Como essas células escolhem qual combustível usar? O tipo de combustível muda de acordo com a função celular e contexto fisiológico. Virtualmente, todas as células são capazes de captar e utilizar a glicose. O que regula a taxa de captação de glicose é primariamente a concentração de glicose no sangue. A glicose entra na célula via transportadores específicos (GLUTs) localizados na membrana celular. Existem vários tipos de GLUTs, variando na especificidade tecidual e sua afinidade em relação à glicose. Músculo esquelético e tecido adiposo possuem GLUT4, um tipo de GLUT que está presente na membrana plasmática apenas quando a concentração de glicose é alta. A presença desse tipo de transportador na membrana aumenta a taxa de captação de glicose em 20 a 30 vezes em ambos os tecidos, aumentando a quantidade de glicose disponível para a geração de energia. Portanto, logo após as refeições, a glicose é a fonte de energia primária no músculo esquelético e no tecido adiposo. Além disso, a quebra da glicose, além de contribuir para síntese de ATP, gera compostos que podem ser usados para síntese de outras moléculas. Portanto, a escolha da glicose como substrato primário é muito importante para células que crescem e se dividem rápido. Exemplos dessas células são as células-tronco e células epiteliais. Outro fator que afeta o metabolismo é o estado nutricional do indivíduo, jejum ou alimentado. Após uma refeição rica em carboidratos, a concentração de glicose sanguínea aumenta e uma grande quantidade de glicose é captada pelos hepatócitos (células do fígado) via GLUT2. Esse tipo de transportador possui afinidade muito baixa em relação à glicose e é efetivo apenas quando a concentração de glicose é alta. Portanto, durante o estado alimentado, o fígado responde diretamente aos níveis plasmáticos de glicose, aumentando a captação dela. Além da geração de energia, a glicose será utilizada pelos hepatócitos para síntese de glicogênio e gordura. Este cenário fica ainda mais interessante quando consideramos a maneira pela qual os hormônios influenciam o metabolismo de energia. Células humanas e tecidos se adaptam às demandas metabólicas internas de muitas formas, principalmente em resposta a hormônios e estímulos nervosos. Níveis elevados de glicose estimulam as células β pancreáticas a secretar insulina na corrente sanguínea (veja a figura a seguir). Virtualmente, todas as células respondem à insulina, portanto, durante o estado alimentado, o metabolismo é coordenado pela insulina. 93 FISIOLOGIA APLICADA E PSICOBIOLOGIA Canal de K+ sensível à ATP Canal de Ca2+ Secreção de insulina estimulada pela glicose ATP: ADP 1 2 3 4 GLUT2 GlicoseInsulina Figura 50 – Mecanismo de secreção de insulina pelas células β pancreáticas. Níveis aumentados de glicose na circulação levam ao aumento da captação de glicose pelas células beta do pâncreas através dos transportadores GLUT2. Aumento da glicose intracelular promove aumento da produção de ATP e aumento na taxa ATP/ADP (1). A taxa ATP/ADP aumentada promove fechamento dos canais de potássio e despolarização da célula (2). A despolarização da célula abre canais de cálcio (3) e a entrada de cálcio na célula promove a secreção de insulina (4) Após o consumo de uma refeição rica em carboidratos, a concentração de glicose sanguínea aumenta e atinge seu pico em aproximadamente uma hora. Após, começa a declinar e retorna ao nível basal em cerca de duas horas. Um exemplo extraordinário de como a insulina estimula a captação de glicose é o que ocorre no músculo esquelético e tecido adiposo, acompanhado pela atividade do GLUT4. Na ausência de insulina, esses transportadores estão localizados dentro de vesículas e não contribuem para captação de glicose nessas células. A ação da insulina induz o movimento desses transportadores para a membrana plasmática, aumentando a captação e o consumo de glicose (veja a figura a seguir). À medida que os níveis plasmáticos de glicose vão voltando ao basal, a insulina diminui e aumenta o estímulo para liberação de um outro hormônio, o glucagon, hormônio secretado pelas células α-pancreáticas. Portanto, o hormônio que coordena o metabolismo no jejum é o glucagon. Como consequência, o GLUT4 fica dentro das vesículas, e a captação de glicose pelo músculo e pelo tecido adiposo é reduzida. Agora que a disponibilidade de glicose para esses tecidos diminuiu, eles voltam a usar lipídios como fonte de energia (veja a figura a seguir). GLTU4 1 2 3 ativa inibe Glicose α α β β Insulina se liga Receptor tirosina quinase O receptor ativado pode ativar outras proteínas - Aumenta absorção de glicose - Sintese de glicogênio - Sintese de proteína - Sintese de lipídios - Quebra de glicogênio e lipidios - Gliconeogênese- Não em células do figado Cascata de sinalização Processos anabólicos:Mobiliza GLUT4: Processos catabólicos: Fígado, músculo e tecido adiposo Músculo e tecido adiposo Figura 51 – Mecanismo de ação da insulina 94 Unidade II Entretanto, células como as hemácias só podem usar glicose como combustível (já que elas não possuem mitocôndria) e o cérebro tem uma alta demanda de glicose em condições fisiológicas (já que os ácidos graxos não atravessam a barreira hematoencefálica). Portanto, mesmo durante o jejum, os níveis de glicose plasmáticos precisam ser mantidos constantes (veja a figura a seguir). O órgão responsável pela manutenção dos níveis plasmáticos de glicose no plasma é o fígado. O fígado armazena glicogênio para suprir as demandas de glicose do corpo, de forma que este corresponde a 6% da massa do fígado, mas os estoques de glicogênio são capazes de suprir as demandas do organismo por um período de 12 a 18 horas de jejum. Outro mecanismo é necessário para a manutenção dos níveis plasmáticos de glicose para os períodos de jejum mais prolongados. Esse processo é chamado de gliconeogênese, a síntese de glicose a partir de substratos que não são carboidratos, como os aminoácidos, por exemplo. O fígado é o principal órgão onde a gliconeogênese ocorre, mas o rim também pode usar essa via caso o jejum se estenda por muito tempo. Insulina e glucagon, produzidos pelo pâncreas, e cortisol, produzido pelas glândulas adrenais, possuem funções importantes no controle do uso de proteína para síntese de glicose pelo fígado, já que não existe um estoque de proteína; caso seja necessário usar proteína para síntese de glicose, ela será mobilizada de tecidos como o músculo esquelético, ocorrendo, portanto, perda de massa muscular. Receptor acoplado à proteína G O receptor ativado pode ativar outras proteínas Processos catabólicos: - Quebra de glicogênio e lipídios - Gliconeogênese Glucagon (baixa concentração de glicose) Insulina (alta concentração de glicose) Processos anabólicos: - Síntese de glicogênio - Síntese de proteína - Síntese de lipídios Cascata de sinalização ativa inibe Adenilato ciclase Glucagon se liga1 2 3 Figura 52 – Mecanismo de ação do glucagon 5.2.2 Regulação do apetite Alterações em fatores que controlam a ingestão de comida e a regulação do metabolismo estão relacionados a condições como obesidade, diabetes tipo 2 e síndrome metabólica, além de alguns tipos de câncer. 95 FISIOLOGIA APLICADA E PSICOBIOLOGIA O peso corporal depende do balanço entre a consumo de fontes de energia e o gasto dessa energia. O aumento da ingestão de alimentos associada ao baixo gasto energético por um período longo resulta em obesidade. A obesidade tem se tornado um importante problema para a saúde pública e está associada à baixa expectativa de vida. A ingestão de alimentos é controlada por sinais centrais e periféricos. Centralmente, a ingestão de comida é controlada pelo hipotálamo, pelo tronco encefálico e por um sistema de sinalização endocanabinoide; perifericamente, pelo trato gastrointestinal e pelo tecido adiposo. A ingestão de alimentos também é influenciada por mecanismos comportamentais, sensoriais, autonômicos, nutricionais e endócrinos. Saiba mais Você pode saber mais sobre o sistema endocanabinoide em: FRANCISCHETTI, E. A.; ABREU, V. G. O sistema endocanabinóide: nova perspectiva no controle de fatores de risco cardiometabólico. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, n. 87, p. 548-558, 2006. Disponível em: http:// www.scielo.br/pdf/abc/v87n4/23.pdf. Acesso em: 24 jan. 2020. A saciação é o ato de se sentir satisfeito durante uma refeição, enquanto saciedade é o período sem fome entre as refeições. Os mecanismos que controlam o tamanho da refeição (saciação) e os que controlam o intervalo entre as refeições (saciedade) são diferentes. A saciação é produzida por substâncias secretadas pelas células do trato gastrointestinal a partir da chegada do alimento. A saciedade depende de moléculas secretadas pelo trato gastrointestinal e tecido adiposo. Portanto, o controle do apetite depende de fatores neuronais, fatores endócrinos e adipocitários e fatores intestinais (HALPERN; RODRIGUES; COSTA, 2004): • Fatores neuronais: o hipotálamo regula o apetite através de neuropeptídeos orexígenos (indutores de apetite) e anorexígenos (inibidores de apetite). Os neuropeptídeos orexígenos são o neuropeptídeo Y (NPY) e o peptídeo agouti (AgRP), já os neuropeptídios anorexígenos são o hormônio alfa-melanócito estimulador (Alfa-MSH) e o transcrito relacionado à cocaína e à anfetamina (CART) e a pró-opiomelanocortina (POMC). Os neurônios que secretam esses neuropeptídios interagem uns com os outros e com sinais periféricos (como a leptina, insulina, grelina e glicocorticoides), regulando, dessa forma, o controle alimentar e o gasto energético. Os receptores para esses sinais estão concentrados em uma região do hipotálamo chamada de núcleo paraventricular (PVN). • Fatores endócrinos e adipocitários: a leptina, produzida no tecido adiposo branco, atua em receptores no hipotálamo para promover a sensação de saciedade. A leptina atua no sistema 96 Unidade II nervoso central inibindo a atividade dos neurônios que produzem NPY/AGRP (efeito orexígeno) e estimulando a atividade de neurônios produtores de POMC ou CART (efeito anorexígeno). A insulina é produzida pelas células beta do pâncreas, e a sua concentração sérica também é proporcional à adiposidade. A insulina interfere na secreção de entero-hormônios como o peptídeo tipo glucagon (do inglês, GLP 1), que atua inibindo o esvaziamento gástrico e, assim, promovendo uma sensação de saciedade prolongada. • Fatores intestinais: a presença de alimento no trato gastrintestinal contribui para a modulação do apetite. O trato gastrointestinal possui diferentes tipos de células secretoras de peptídeos que, juntamentecom outros sinais, regulam o processo digestivo e atuam no sistema nervoso central para a regulação da fome e da saciedade. Evidências demonstram que a saciedade prandial (após se alimentar) é atribuída predominantemente à ação da colecistocinina (CCK), que é liberada pelas células do trato gastrointestinal em resposta à presença de gordura e proteína. A CCK também induz a secreção pancreática, a secreção biliar e a contração vesicular. Outro inibidor da ingestão alimentar é o peptídeo YY (PYY), expresso pelas células da mucosa intestinal. A oxintomodulina foi recentemente identificada como um supressor da ingestão alimentar a curto prazo. Esse peptídeo é secretado na porção distal do intestino e parece agir diretamente nos centros hipotalâmicos para diminuir o apetite, diminuir a ingestão calórica e diminuir os níveis séricos de grelina. A grelina é secretada por células da mucosa gástrica e é um dos mais importantes sinalizadores para o início da ingestão alimentar. Sua concentração mantém-se alta nos períodos de jejum e nos períodos que antecedem as refeições, caindo imediatamente após a alimentação, o que também sugere um controle neural. A grelina, além de aumentar o apetite, também estimula as secreções digestivas e a motilidade gástrica. 5.3 Glândulas adrenais As glândulas adrenais, localizadas acima dos rins, são formadas por regiões denominadas córtex e medula, sendo que cada uma secreta hormônios diferentes. O córtex adrenal secreta hormônios esteroides (sintetizados a partir do colesterol). O córtex da adrenal possui três camadas e cada uma delas produz hormônios diferentes (glicocorticoides, mineralocorticoides e androgênios). Os glicocorticoides estão relacionados com a mobilização da glicose para dentro da corrente sanguínea, por isso seu nome tem o prefixo glico. Eles também suprimem inflamações e outras respostas do sistema imune. São amplamente utilizados em medicamentos. Os mineralocorticoides influenciam no equilíbrio entre a água e sódio no corpo. O hormônio mais importante dessa categoria é a aldosterona. A aldosterona afeta o túbulo renal de modo que a absorção de sódio na corrente sanguínea seja realizada. Isso mantém mais água na corrente sanguínea e reduz o volume de urina, mantendo um volume maior de fluidos no corpo. 97 FISIOLOGIA APLICADA E PSICOBIOLOGIA Os androgênios são geralmente referidos como hormônios masculinos, mas são produzidos no córtex adrenal tanto em homens quanto em mulheres. A medula da adrenal produz adrenalina, hormônio que é liberado em maior quantidade quando há sinalização do sistema nervoso simpático. Lembrete Esse sistema está ativo quando você está assustado, animado ou no meio de uma atividade estressante. Um resumo dos hormônios produzidos pelas glândulas adrenais pode ser encontrado na figura a seguir: Córtex Medula Catecolaminas Produtos do córtex da adrenal Córtex Zona glomerulosa - Mineralocorticoides Zona fasciculada - Glicocorticoides Zona reticulada - Androgênios Zona glomerulosa Mineralocorticoides Aldosterona: Aumenta reabsorção de Na+ e K+ no título distal e ducto coletor Zona fasciculada Clicocorticoides Cortisol: Aumenta gliconeogênese e glicogênese Inibe respostas inflamatórias Mantém a resposta vascular às catecolaminas Liberação aumenta em resposta ao estresse Zona reticulada Androgênios DHEA e Androstenediona: São convertidos em testosterona e estradiol Córtex da Adrenal Colesterol ACTH Figura 53 – Hormônios do córtex da adrenal 5.3.1 Hormônios do córtex da adrenal As glândulas adrenais humanas produzem vários esteroides de 19 carbonos (C19). Entre esses hormônios, é importante destacar a deidroepiandrosterona (DHEA) e a adrostenediona. Eles possuem pouca atividade androgênica e são convertidos em testosterona e estrogênios, ou em aldosterona e cortisol. 98 Unidade II A secreção de esteroides é diretamente dependente de síntese “de novo”, uma vez que não existem hormônios pré-sintetizados no córtex da adrenal. Colesterol é o precursor comum desses hormônios. Ele é estocado em gotículas de lipídios no citoplasma e deve ser transportado para a membrana mitocondrial externa para iniciar a produção de esteroides. Androstenediona Estrona Estradiol Progesterona Corticosterona Aldosterona Cortisol Colesterol Testosterona DHT DHEA Figura 54 – Síntese dos hormônios derivados do colesterol Observação Adrenarca precoce é uma condição que promove o aparecimento de pelos púbicos ou axilares antes de 8 anos em meninas ou 9 anos em meninos associado a altos níveis séricos de DHEA e testosterona. 5.3.2 Eixo hipotálamo-pituitária-adrenal O eixo hipotálamo-pituitária-adrenal (HPA) regula os níveis circulantes de hormônios glicocorticoides e é o principal sistema neuroendócrino em mamíferos que proporciona uma resposta rápida e defesa contra o estresse. O eixo HPA inicia com o hormônio liberador de corticotrofinas (CRH), que é secretado pelo hipotálamo. O CRH estimula a adeno-hipófise a secretar hormônio adrenocorticotrófico (ACTH). O ACTH, por sua vez, atua no córtex da glândula suprarrenal para promover a síntese e a liberação de cortisol. O cortisol, então, atua como um sinal de retroalimentação negativa, inibindo a secreção de ACTH e de CRH. 99 FISIOLOGIA APLICADA E PSICOBIOLOGIA Glicocorticoides (cortisol em humanos) são hormônios que regulam múltiplas funções fisiológicas, incluindo metabolismo de glicose, lipídios e proteínas. Esses hormônios são sintetizados na zona fasciculada do córtex da adrenal. Os glicocorticoides também exercem ações anti-inflamatórias e imunossupressoras e podem afetar humor e função cognitiva. Sob condições basais (sem estresse), a dinâmica do eixo HPA é caracterizada pelos ritmos circadianos (variação da concentração entre dia e noite) e ultradianos (variação da concentração ao longo das horas de um mesmo dia). A secreção de cortisol é contínua e possui um forte ritmo diurno. O pico da secreção geralmente ocorre pela manhã e diminui durante a noite (veja a figura a seguir). A atividade do eixo aumenta em resposta ao estresse. Uma vez na circulação, glicocorticoides acessam os tecidos-alvo, como fígado, cérebro, coração e tecido vascular. noite dia 2412 208 1640 0 4 8 co rt iso l p la sm át ic o (u g/ 10 0 m l) 12 16 20 horas Figura 55 – Variações ultradianas da concentração plasmática de colesterol Vimos que o glucagon é um hormônio importante para regulação da glicemia durante o jejum. Na ausência de cortisol, entretanto, o glucagon é incapaz de responder adequadamente a um desafio hipoglicêmico. Estados de excesso de cortisol ou de deficiência causam alterações no humor, assim como alterações de memória e de aprendizagem. 5.4 Hormônios da tireoide A tireoide está localizada no pescoço (veja a figura a seguir). O eixo hipotálamo-adenohipófise-tireoide regula a produção dos hormônios da tireoide. Nesse eixo, o hipotálamo libera o hormônio liberador de tireotrofinas (TRH). O TRH estimula a adeno-hipófise a secretar o hormônio estimulante da tireoide (TSH). O TSH, por sua vez, estimula a tireoide a secretar seus hormônios. Os hormônios da tireoide incluem a tiroxina (T4) e a triiodotironina (T3) – os números representam a quantidade de átomos de iodo em cada hormônio, conforme vimos anteriormente. 100 Unidade II Glândula tireoide Figura 56 – Localização da glândula tireoide As funções dos hormônios tireoidianos são vitais para o desenvolvimento do sistema nervoso, crescimento linear, metabolismo energético e termogênese, metabolismo hepático de nutrientes, balanço de fluidos e sistema cardiovascular. Caso exista um excesso no nível desses hormônios, o corpo consumirá energia como se estivesse excessivamente ativo, mesmo estando em repouso, promovendo sensação de cansaço. Pode haver também sintomas como taquicardia, globos oculares salientes e um aumento na tireoide. A doença de Graves é um tipo de hipertireoidismo que pode produzir tais sintomas. Poroutro lado, caso o nível hormonal da tireoide esteja muito baixo, a pessoa poderá sofrer uma queda no metabolismo, que por sua vez pode causar indiferença, queda na temperatura corporal, edema e redução na transpiração. Liberação tônica Hipotálamo Adeno-hipófise Controle da secreção da tireoide TRH TSH Glândula tireoide Efeitos metabólicos sistêmicos Legenda Estímulo Centro integrador I Sinal de saída Alvo Resposta sistêmica T4, T3 T4, T3 Retroalim entação negativa Figura 57 – Eixo hipotálamo-adeno-hipófise-tireoide 101 FISIOLOGIA APLICADA E PSICOBIOLOGIA A tireoide do adulto tem aproximadamente 20 g. A unidade secretora é o folículo tireoidiano, e o T4 é o principal hormônio produzido pela tireoide, mas o T3 é a forma biologicamente mais ativa. Uma vez produzido e liberado na circulação, T4 pode ser convertido em T3 para produzir efeitos biológicos. Os hormômios da tireoide são sintetizados a partir de iodo e tirosina Sangue Na+ T3 T3 I- II I I II I I I I I I I- T3 T4 T4 T4 Um simporte Na+-I- traz I- para o interior da célula. O transportador pendrina move o I- para o coloide A célula folicular sinteriza enzimas e tireoglobulina e as libera para o coloide T3 e T4 livres entram na circulação As enzimas intracelulares separam T3 e T4 da proteína (tireoglobulina) Síntese proteica NIS 1 1 2 2 4 3 5 6 Enzimas, tireoglobulina Células foliculares Tireoglobulina 2 tirosinas + 4 HO OH OH OH NH2 NH2 NH2 H H H H H H H H H O O O C C C C C C C C C O O HO HO 2 tirosinas + 3 Tirosina Tri-iodotironina (T3) Tiroxina (T4) Coloide + Tirosina Legenda MIT = monoiodotirosina DIT = diiodotirosina T3 = triiodotironina T4 = tiroxina + MIT MIT DIT T3 T4 MIT + DIT DIT + DIT Pendrina A tireoglobulina é capturada de volta para dentro da célula em vesículas A tireoide peroxidase adiciona iodo à tirosina para formar T3 e T4 Figura 58 – Síntese dos hormônios tireoidianos 5.4.1 Hipertireoidismo Uma pessoa cuja tireoide secreta hormônios em excesso sofre de hipertireoidismo. Os hormônios da tireoide em excesso causam alterações no metabolismo, no sistema nervoso e no coração. Problemas com a secreção dos hormônios da tireoide podem surgir na própria glândula tireoide ou ao longo da via de controle (veja a figura anterior). A ação excessiva do TSH sob a tireoide causa o crescimento das células foliculares. Em situações patológicas com níveis elevados de TSH, a glândula tireoide aumenta de tamanho, uma condição conhecida como bócio. Um grande bócio pode pesar centenas de gramas e muitas vezes contornar o pescoço (veja a figura a seguir). 102 Unidade II Figura 59 – Bócio Entretanto, a presença do bócio não é suficiente para fechar um diagnóstico. Veremos que o bócio também pode estar presente em indivíduos com hipotireoidismo. Os efeitos do excesso de hormônios da tireoide sobre o sistema nervoso incluem reflexos hiperexcitáveis e transtornos psicológicos, desde irritabilidade e iznsônia até psicose. Um sinal comum de hipertireoidismo é o batimento cardíaco rápido e o aumento da força de contração. A causa mais comum de hipertireoidismo é a doença de Graves. Nessa condição, o corpo produz, indevidamente, anticorpos que imitam a ação do TSH. Como características clínicas o paciente terá níveis altos de T3 e T4, bócio por hiperestimulação da glândula e baixas concentrações de TSH por feedback negativo. A doença de Graves é frequentemente acompanhada por exoftalmia, uma aparência de olhos saltados causada pelo aumento dos músculos e tecidos na orbita mediado por reação imune. 5.4.2 Hipotireoidismo A diminuição da secreção dos hormônios da tireoide diminui a taxa metabólica e o consumo de oxigênio. Os pacientes tornam-se intolerantes ao frio, visto que eles produzem menos calor interno. Um quadro de hipotireoidismo que foi muito comum no passado é o hipotireoidismo por deficiência de iodo proveniente da alimentação. Nesse caso, mesmo que haja estimulação da tireoide pelo TSH, ela não conseguirá sintetizar os hormônios (que levam iodo na sua composição). Assim, os níveis de T3 e T4 estarão baixos nesses indivíduos, e o hipotálamo e a adeno-hipófise entendem que precisam estimular mais a tireoide, que não será capaz de sintetizar seus hormônios pela ausência de iodo. Assim, esses 103 FISIOLOGIA APLICADA E PSICOBIOLOGIA indivíduos terão hipotireoidismo (pela falta de T3 e T4) e bócio (pelo excesso de estimulação da tireoide). Esse problema foi contornado pela adição de iodo ao sal de cozinha comum. Atualmente, sabe-se que quadros de hipotireoidismo são mais comuns em indivíduos que fizeram a retirada da tireoide por algum problema (um câncer, por exemplo) e ainda estão se adaptando à terapia medicamentosa. 5.5 Hormônio do crescimento O crescimento em seres humanos é um processo que inicia antes do nascimento. Em crianças não ocorre de forma constante, havendo períodos de picos de crescimento e desenvolvimento rápidos. O crescimento normal é um processo complexo que depende de diversos fatores: • Secreção normal do hormônio do crescimento (GH) e outros hormônios (hormônios da tireoide, insulina e hormônios sexuais na puberdade). • Uma dieta adequada que inclua proteínas, energia (ingestão calórica) suficiente, vitaminas e minerais. • Ausência de estresse crônico. Vimos que o estresse está associado ao aumento dos níveis de cortisol, o qual possui efeitos que inibem o crescimento. Embora o pico de secreção de GH seja na infância, sua secreção ocorre por toda a vida. Os estímulos para a secreção de GH são integrados no hipotálamo, o qual secreta no sistema hipotálamo-adenohipófise o hormônio liberador do hormônio do crescimento (GHRH) e o hormônio inibidor do hormônio do crescimento, mais conhecido como somatostatina (SS). Os pulsos do GHRH proveniente do hipotálamo estimulam a liberação de GH pela adeno-hipófise. Metabolicamente, o hormônio GH promove a síntese proteica, uma parte essencial do crescimento dos tecidos. Os distúrbios que refletem as ações do hormônio do crescimento são mais evidentes em crianças. Deficiências graves do GH na infância levam ao nanismo, que pode resultar de um problema na síntese do hormônio do crescimento ou com receptores defeituosos de GH. No extremo oposto, a hipersecreção do hormônio de crescimento em crianças leva ao gigantismo. Uma vez que o crescimento ósseo cessa no final da adolescência, o hormônio do crescimento não pode aumentar mais a estatura. Contudo, o GH pode continuar atuando na cartilagem e nos tecidos moles. Os adultos com secreção excessiva de hormônio do crescimento desenvolvem uma condição chamada de acromegalia, caracterizada pelo alongamento da mandíbula, expressões faciais grosseiras e crescimento das mãos e dos pés (veja a figura a seguir). 104 Unidade II Figura 60 – Paciente com acromegalia 5.6 Hormônios da paratireoide Quatro pequenas glândulas endócrinas, chamadas de glândulas paratireoides, são conectadas à tireoide. Apesar dessa relação anatômica, as glândulas paratireoides são totalmente independentes e desempenham funções diferentes da tireoide. Essas glândulas secretam paratormônio (PTH), que aumenta os níveis de cálcio no sangue. O cálcio é indispensável em tarefas como contração muscular, transmissão nervosa e coagulação sanguínea. Caso haja pouco cálcio no sangue, os músculos serão incapazes de se mover de forma suave. O PTH previne que os níveis plasmáticos de cálcio caiam. A maior parte do cálcio do corpo – 99%, ou aproximadamente 1,1 kg – é encontrada nos ossos. Entretanto, a concentração plasmática de Ca2+ é a mais crítica para os processos celulares citados. A homeostasia do cálcio segue o princípio de balanço mostrado a seguir: 105 FISIOLOGIA APLICADA E PSICOBIOLOGIA Para manter o equilíbrio de cálcio, a ingestão de Ca2+ deve ser igual à perda nas fezes e na urina. Intestino delgado Ca2+Cálcio da dieta Cálcio nas fezes Um pouco de cálculoé secretado para o intestino delgado Osso (99%) Células 0,9% LEC (0,1%) Rim Ca2+ [Ca2+] 2,5 mM Ca2+ nos túbulos renais Transporte ativo Gradiente eletroquimico [Ca2+ livre] 0,001 mM Ca2+ na urina Legenda PTH = hormônio da paratireoide Filtração passiva Calcitriol (PTH, prolactina) Calcitonina PTH PTH CalcitoninaCalcitriol Cortisol Figura 61 – Hormônios reguladores da concentração de cálcio plasmático A concentração plasmática de cálcio pode ser regulada a partir da sua deposição ou reabsorção no osso, a partir da absorção pela alimentação e pela eliminação ou reabsorção renal. O PTH atua no osso, no rim e no intestino para aumentar as concentrações plasmáticas de Ca2+. O Ca2+ plasmático elevado atua como retroalimentação negativa e desliga a secreção de PTH. O hormônio da paratireoide aumenta o Ca2+ plasmático de três formas: • o PTH mobiliza cálcio dos ossos; • o PTH aumenta a reabsorção renal de cálcio; • o PTH aumenta indiretamente a absorção intestinal de cálcio pela sua influência na vitamina D3, um processo descrito adiante. 106 Unidade II O calcitriol é um hormônio formado a partir da vitamina D em etapas sequenciais que ocorrem na pele, no fígado e nos rins. O calcitriol é o principal hormônio responsável por aumentar a absorção de Ca2+ a partir do intestino delgado. Além disso, o calcitriol facilita a reabsorção renal de Ca2+ e ajuda a mobilizar Ca2+ para fora do osso. A absorção renal e intestinal de Ca2+ aumenta a concentração plasmática deste, desligando o PTH em uma alça de retroalimentação negativa, que diminui a síntese de calcitriol. A calcitonina é um peptídeo produzido pelas células C da tireoide. As suas ações são opostas as do PTH. A calcitonina é liberada quando as concentrações plasmáticas de Ca2+ aumentam. Experimentos realizados em animais mostram que a calcitonina diminui a reabsorção óssea e aumenta a excreção renal de cálcio. 5.7 Fisiologia aplicada ao exercício físico Os ácidos graxos são a principal fonte de energia do músculo esquelético no repouso e exercício de intensidade moderada. À medida que a intensidade do exercício aumenta, a utilização da glicose como combustível se sobrepõe à dos ácidos graxos. Outros fatores secundários que influenciam a escolha do substrato pelo músculo incluem a duração do exercício, gênero e nível de treinamento. Independentemente de o atleta estar correndo uma maratona ou praticando um esporte de explosão como uma corrida de 100 m, o músculo esquelético é impulsionado por ATP. O estoque de ATP é limitado, de forma que a sua síntese é realizada sob demanda. Entender como isso ocorre é a chave para entender sistemas de energia. Água Hidrólise P H H O P P PATP P P ADP Fosfato EnergiaP P + +H H O P Figura 62 – Hidrólise de ATP 107 FISIOLOGIA APLICADA E PSICOBIOLOGIA Há vários substratos disponíveis para produção de ATP: • Creatina fosfato (veja a figura a seguir). • Carboidratos: são uma fonte rápida de energia. • Lipídios: são uma fonte altamente energética, mas de obtenção lenta. • Proteínas: usadas como fonte de energia apenas em atividade física muito prolongada. PATP P P Energia ADP P P H Fosfato Creatina fosfato Creatina Energia+ +H O P Figura 63 – Geração de ATP a partir de creatina fosfato O estoque de ATP é suficiente para manter nossos músculos em atividade por apenas 5 segundos. Após esse período, a creatina fosfato é usada como substrato para síntese de ATP (conforme a figura anterior), mas a quantidade de creatina fosfato estocada nos músculos só é suficiente para fornecer ATP por 15 segundos. Enquanto o sistema cardiorrespiratório se prepara para fornecer O2 para as demandas metabólicas do exercício, o metabolismo anaeróbico entra em ação. Entretanto, para conseguir realizar exercício por um período mais prolongado, é necessário recorrer ao metabolismo dependente de O2 (aeróbico), capaz de sustentar a atividade física por minutos ou horas. Portanto, em exercícios de alta intensidade e curta duração, os carboidratos serão a fonte preferencial de energia, já durante os exercícios de baixa ou moderada intensidade e de longa duração, os lipídios serão a fonte de energia primordial. Uma vez que o O2 é essencial para que glicose e ácidos graxos sejam usados como combustível com rendimento energético máximo, a taxa de consumo de O2 aumenta durante o exercício. Chamamos de 108 Unidade II VO2 máxima a taxa mais alta de consumo de O2 atingida durante exercício máximo ou exaustivo. Este é considerado o melhor indicador de resistência cardiorrespiratória e condicionamento aeróbico. O exame que permite medir a VO2 máxima se chama ergoespirometria e está ilustrado na figura a seguir: Figura 64 – Ergoespirometria Saiba mais Sabe aquela dor muscular que você sente quando faz algum esforço físico ao qual você não está adaptado? É uma dor que geralmente você começa a sentir no dia seguinte ao esforço e fica ainda mais intensa 48h após você ter feito a atividade? Ela é chamada de dor muscular tardia. Existem diferentes teorias para explicar como ela ocorre, e você pode saber mais em: NASCIMENTO, C. R. V. et al. Dor muscular tardia: etiologia e tratamento. Revista Brasileira de Prescrição e Fisiologia do Exercício, São Paulo, v. 1, n. 2, p. 90-99, mar./abr. 2007. Disponível em: http://www.rbpfex.com.br/ index.php/rbpfex/article/view/21/20. Acesso em: 27 jan. 2020. O sistema cardiovascular desempenha cinco importantes funções durante o exercício: • entrega O2 aos músculos em atividade; • oxigena o sangue levando-o até o pulmão; • transporta o calor para ser dissipado pela pele; • entrega nutrientes e combustível para tecidos em atividade; • transporta hormônios. 109 FISIOLOGIA APLICADA E PSICOBIOLOGIA Aspectos mais importantes a serem analisados com relação à função cardiovascular são: a frequência cardíaca, o volume de ejeção, o débito cardíaco; o fluxo sanguíneo; a pressão sanguínea e o sangue. A frequência cardíaca aumenta mesmo antes do início do exercício; isso é chamado de resposta antecipatória, a qual é mediada por adrenalina e noradrenalina. A fração de ejeção pode aumentar de 50-70 ml/batimento (atletas recreativos em repouso) a 110-130 ml/batimento (atletas recreativos durante o exercício). Esse valor pode ser ainda maior em atletas de elite, chegando a valores de até 220 ml/batimento durante a prática de atividade física. A fração de ejeção é um parâmetro utilizado para o cálculo do débito cardíaco, que é em média de 5 L/min no repouso e pode chegar a 20-40 L/min durante o exercício físico. Observação Débito cardíaco é a quantidade de sangue que sai do coração durante o período de um minuto. Como o débito cardíaco aumenta expressivamente, para evitar um aumento fatal da pressão arterial sistólica, ocorre vasodilatação nos músculos. O resultado é um aumento pequeno na pressão sistólica, enquanto a pressão diastólica quase não se altera. 5.8 Fisiologia aplicada às diferentes fases da vida 5.8.1 Crescimento e desenvolvimento funcional do feto e neonato Conforme Morton e Brodsky (2016), a fisiologia do feto é fundamentalmente diferente do neonato, tanto estrutural quanto funcionalmente. A transição da vida intra para a extrauterina requer etapas rápidas, complexas e bem orquestradas para assegurar a sobrevivência do neonato. O desenvolvimento cardíaco A circulação humana fetal começa com os batimentos cardíacos com aproximadamente 22 dias de gestação. As trocas gasosas são inicialmente realizadas tanto pelo saco vitelínico como pela placenta até que esta se torna dominante na décima semana de gestação. Uma parte do oxigênio proveniente do sangue materno se perde no espaço de trocas gasosas na placenta, de forma que o conteúdo de oxigênio que chega ao feto é menor do que a quantidade de oxigênio presente no sangue materno, promovendo um ambiente de relativa hipóxia. O desenvolvimento pulmonar O desenvolvimento dos pulmões ocorre em duas fases: crescimento e maturação. Duranteambas as fases de desenvolvimento, as células epiteliais pulmonares secretam ativamente um fluido rico em cloreto na árvore brônquica. Isso resulta em acúmulo de fluido dentro das vias aéreas fetais, o qual é crítico para estimular o desenvolvimento dos pulmões. Antes do nascimento, o conteúdo do fluido 110 Unidade II pulmonar é alterado pela expressão de surfactante pelos pneumócitos II em resposta ao aumento dos níveis de cortisol no final do terceiro trimestre. Essas proteínas do surfactante são essenciais para reduzir a tensão superficial e permitir que os pulmões sejam inflados da forma correta após o nascimento. Desenvolvimento endócrino A produção de cortisol aumenta entre a semana 30 e 36 da gestação, e um segundo pico ocorre logo antes do início do trabalho de parto espontâneo. Níveis elevados de cortisol promovem ativação dos hormônios da tireoide e maturação das enzimas do metabolismo hepático de glicose. Desenvolvimento hematológico Entre a segunda e a terceira semana de gestação, o saco vitelínico inicia a eritropoiese. Da quinta semana ao sexto mês de gestação, o fígado se torna a fonte primária de eritropoiese, seguido pela medula óssea, que ficará permanentemente encarregada dessa função após o nascimento. A transição A transição para a vida extrauterina é caracterizada por mudanças nas vias circulatórias, início da ventilação e oxigenação pelos pulmões e muitas mudanças no metabolismo. Muitas mudanças hormonais também são necessárias para uma transição bem-sucedida para a vida extrauterina. A ação combinada do cortisol e dos hormônios da tireoide ativa mecanismos que promovem a reabsorção do fluido pulmonar. A liberação de catecolaminas promove mudanças necessárias na pressão arterial, glicose plasmática e quantidade de ácidos graxos livres. Termorregulação O ambiente extrauterino é relativamente frio para neonatos. Alguns estudos sugerem que isso seja um estímulo para síntese dos hormônios da tireoide pelo bebê. Além disso, uma vez que os neonatos têm pouca capacidade de realizar termogênese por tremor, a presença de tecido adiposo marrom é essencial para geração de calor. A noradrenalina pode estimular essa termogênese, bem como promover vasoconstricção periférica para evitar perda de calor pela pele. 5.8.2 Fisiologia do envelhecimento As pessoas envelhecem em diferentes taxas, e existe variabilidade significativa nas respostas fisiológicas. O marcador do envelhecimento é a diminuição progressiva nas reservas homeostáticas. A maioria dos órgãos mostra uma redução fisiológica na função com o envelhecimento, apesar das taxas variarem entre indivíduos. Existe também uma redução na capacidade de reparo. O risco aumentado da perda de reserva funcional é piorado pelo aumento da prevalência de doenças coexistentes. A compreensão da relação entre envelhecimento fisiológico e patológico é útil na 111 FISIOLOGIA APLICADA E PSICOBIOLOGIA interpretação dos sinais físicos e investigação dos resultados, mas algumas vezes não é uma tarefa muito fácil. Vamos ver a seguir as principais alterações fisiológicas que ocorrem nos diferentes sistemas do organismo humano em decorrência do envelhecimento. Sistema cardiovascular O envelhecimento do sistema cardiovascular resulta em diminuição da eficiência contrátil. Algumas alterações observadas incluem espessamento da parede arterial, mudanças na composição da matriz vascular com aumento da atividade de quebra de colágeno e elastina e aumento do tônus do músculo liso. Essas modificações fazem com que os vasos “endureçam”, resultando em aumento da pressão arterial sistólica, da resistência do sistema vascular e da pós-carga cardíaca. Observação A pressão arterial sistólica corresponde à pressão realizada nas artérias no momento da contração ventricular (sístole), enquanto a pós-carga refere-se à resistência que o sistema vascular oferece à saída do sangue do ventrículo. O aumento da resistência periférica, portanto, faz com que o ventrículo esquerdo tenha que trabalhar mais intensamente para ejetar sangue em na aorta, podendo causar hipertrofia ventricular esquerda. Juntamente com essas mudanças, a atividade da renina plasmática e a concentração de aldosterona diminuem com a idade. Além disso, a resposta da atividade da renina plasmática ao ajuste postural é reduzida ou quase ausente, e a resposta da aldosterona à restrição de sódio também diminui. A hipertrofia ventricular em resposta à pós-carga elevada alonga o tempo de contração, com efeitos subsequentes no ciclo cardíaco. O relaxamento ventricular é atrasado no momento da abertura da válvula mitral, contribuindo para a disfunção diastólica. Lembrete A diástole corresponde ao relaxamento que ocorre após a contração (sístole). Isso quer dizer que o aumento do tempo de contração ventricular acaba retardando o relaxamento do ventrículo. Dessa forma, quando as válvulas mitrais se abrem, o ventrículo ainda não está completamente relaxado e pouco sangue fluirá para os ventrículos nesse momento. Isso irá aumentar o trabalho dos átrios para enviar o sangue ao ventrículo, o que contribui para a correlação positiva entre o tamanho do átrio esquerdo e a idade. 112 Unidade II O débito cardíaco é dependente da frequência cardíaca e do volume sistólico. Com o envelhecimento e as mudanças que vimos anteriormente, o volume sistólico diminui, resultando em uma queda no débito cardíaco. Adicionalmente, existe declínio progressivo no número de células do marcapasso atrial, resultando em uma diminuição da automaticidade intrínseca que pode predispor ao desenvolvimento de distúrbios de condução e ritmo. Sistema nervoso central O envelhecimento produz diminuição na densidade neural. Uma perda de 30% na massa cerebral é estimada na idade de 80 anos, primariamente envolvendo a substância cinzenta. Há redução na produção de importantes neurotransmissores centrais, incluindo catecolaminas, serotonina e acetilcolina, com efeitos secundários no humor, memória e função motora. Existe uma deficiência relacionada à idade dos sítios de recaptação de dopamina e transportadores, em associação à perda de sítios de ligação serotoninérgicos, α2-adrenérgicos, β-adrenérgicos e GABAérgicos. Essas mudanças resultam em redução na capacidade de processamento e memória relacionada à idade. Saiba mais A doença de Alzheimer é uma doença neurodegenerativa que acomete indivíduos adultos com mais de 60 anos. Saiba mais sobre ela em: SERENIKI, A.; VITAL, M. A. B. F. A doença de Alzheimer: aspectos fisiopatológicos e farmacológicos. Revista de Psiquiatria do Rio Grande do Sul, n. 30 (1 Supl.), 2008. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rprs/ v30n1s0/v30n1a02s0.pdf. Acesso em: 27 jan. 2020. BRASIL. Ministério da Saúde. Protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas: doença de Alzheimer. Brasília, [s.d.]. Disponível em: http://portalarquivos2. saude.gov.br/images/pdf/2014/abril/02/pcdt-doenca-de-alzheimer- livro-2013.pdf. Acesso em: 27 jan. 2020. Sistema nervoso periférico Fibras motoras, sensoriais e autonômicas são perdidas. Há redução significativa nas velocidades de condução aferente e eferente, com um declínio progressivo na taxa de processamento dos sinais no tronco encefálico e medula espinal. O número de células musculares inervadas por cada axônio diminui, levando a desnervação e atrofia muscular. 113 FISIOLOGIA APLICADA E PSICOBIOLOGIA Sistema nervoso autônomo Na juventude, o tom autonômico basal é amplamente regulado pela divisão parassimpática. Com o aumento da idade, a saída parassimpática tônica diminui e o tônus simpático aumenta. Aumento da atividade simpática contribui para resistência vascular sistêmica aumentada. A combinação entre as disfunções autonômicas e de barorreflexo relacionadas à idade compromete a homeostase hemodinâmica, o que é evidente em pacientes idosos que fazem uso de diuréticos ou fazem reduzida ingestão de fluidos. Essa disfunção também está associada ao aumento da hipotensão posturale pós-prandial. Rins A massa renal é de aproximadamente 50 g no nascimento, atinge o máximo de 400 g durante a quarta década e então diminui gradualmente para aproximadamente 300 g na nona década. A perda de massa ocorre primariamente no córtex renal, região onde localiza-se a cápsula de Bowman, causando redução da superfície disponível para filtração, contribuindo para diminuição da taxa de filtração glomerular. Há também um aumento da permeabilidade da membrana basal, com consequente aumento na microalbuminúria e proteinúria (índices de quantidade de proteína na urina). Isso ocorre mesmo na ausência de diabetes mellitus, hipertensão e doença renal crônica. A depuração (clearance) é influenciada pelo estado nutricional, ingestão de proteína, massa muscular, peso corporal, gênero e etnia. À medida que as pessoas envelhecem, a massa muscular diminui, bem como a excreção diária de creatinina, acompanhada por uma redução do clearance de creatinina relacionada à idade. Isso significa que a interpretação da TGF estimada precisa ser acompanhada por uma avaliação clínica da massa muscular. Sistema respiratório As alterações que ocorrem com o envelhecimento promovem declínio na elasticidade da caixa torácica, perda de massa muscular e enfraquecimento dos músculos da respiração. A redução na capacidade de aumentar o volume do tórax, promove diminuição da área de superfície alveolar para trocas gasosas. Ou seja, ocorre redução na eficiência da respiração. Sistema gastrointestinal O envelhecimento causa uma variedade de mudanças fisiológicas na orofaringe, esôfago e estômago, aumentando a probabilidade de problemas gastrointestinais. A deglutição é iniciada por controle voluntário e envolve a contração coordenada de músculos esqueléticos. Enquanto o primeiro estágio da deglutição é voluntário, o segundo estágio possui controle neural involuntário, dependente do relaxamento do esfíncter entre a faringe e o esôfago. O próximo passo depende do transporte por movimentos peristálticos. 114 Unidade II Com a idade, contração de relaxamento se tornam dessincronizados, levando a uma deglutição menos eficiente. Outras mudanças com a idade incluem diminuição da secreção de HCl e pepsina, com consequente ligeiro aumento no pH estomacal. Pele Várias mudanças estruturais ocorrem na pele com o envelhecimento em decorrência de uma combinação de mudanças degenerativas progressivas, mudanças fisiológicas intrínsecas e dano ambiental. As mudanças fisiológicas incluem prejuízo na função de barreiras, reduzida renovação de células epidermais e diminuição no número de queratinócitos e fibroblastos. Redução da rede vascular também é observada. A pele torna-se mais sensível e suscetível a lesões como úlceras. A redução da resposta do sistema imunológico torna a pele vulnerável a patologias causadas por fungos e vírus e neoplasias. Sistema endócrino A habilidade dos órgãos-alvo de responderem aos hormônios diminui com a idade. As concentrações de muitos hormônios mudam com a idade, mas com pouca relevância clínica demonstrada. A redução da secreção de testosterona em homens é um fator que contribui para sarcopenia (perda de massa muscular). Termoregulação Uma variedade de mudanças fisiológicas promove redução na termorregulação associada ao envelhecimento. O limiar para detecção de mudanças na temperatura da pele aumenta e está associado com diminuição das respostas vasomotoras, reduzindo a contribuição da pele para conservar ou perder calor. Outros sistemas que normalmente contribuem para aumentar a produção de calor também se tornam menos efetivos, como a eficácia dos tremores e a termogênese hepática. O resultado é que idosos possuem risco maior de sofrer efeitos adversos de ambientes frios. 6 FISIOLOGIA APLICADA À REPRODUÇÃO HUMANA A continuidade da vida depende da capacidade das espécies de se reproduzirem. A reprodução sexuada se inicia com a fusão dos gametas masculino (espermatozoide) e feminino (óvulo), produzidos pelas gônadas e que apresentam metade do número de cromossomos da espécie. A fusão dos gametas dá origem a uma célula diploide (denominada zigoto), que através da embriogênese é capaz de formar um organismo inteiro. Em mamíferos, o sistema reprodutor é composto pelas gônadas (responsáveis pela geração dos gametas), pelos aparelhos reprodutores (de onde os gametas são liberados) e por tecidos acessórios que produzem moléculas reguladoras. O desenvolvimento das gônadas ocorre durante a embriogênese, e a maturação sexual irá ocorrer ao longo do desenvolvimento dos indivíduos sob controle por hormônios específicos que também são responsáveis pela gametogênese (produção de gametas), acasalamento e cuidados com a prole. 115 FISIOLOGIA APLICADA E PSICOBIOLOGIA 6.1 Sistemas reprodutores O sistema reprodutor masculino é composto pelos testículos, epidídimo, ductos deferentes, vesícula seminal, próstata e pênis; já o sistema reprodutor feminino é formado por dois ovários, duas tubas uterinas, útero, vagina e vulva (veja as figuras a seguir). As gônadas, que são os testículos e os ovários, são responsáveis pela produção de gametas masculinos (espermatogênese) e femininos (oogênese), respectivamente. Sínfise púbica (cartilagem) Ureter Bexiga urinária Reto Estas glândulas acessórias contribuem com secreções para o sêmen. Vesícula seminal Próstata Glândula bulbouretral Ducto deferente Ducto ejaculatório Uretra Pênis Epidídimo Escroto O testículo é o local da produção de espermatozoides e de hormônios. Figura 65 – Sistema reprodutor masculino Glândulas mamárias Fímbrias Útero Vagina Canal cervical Colo do úteno (cérvice) Cavidade uterina Tuba uterina Ovário Figura 66 – Sistema reprodutor feminino 116 Unidade II 6.2 Gametogênese A geração dos gametas (gametogênese) ocorre por meioses sucessivas de células germinativas (oogônia e espermatogônia). Uma vez que cada indivíduo é capaz de produzir milhões de gametas geneticamente diferentes e que o número de combinações possíveis dos gametas femininos e masculinos na hora da formação da prole diploide é muito grande, esse tipo de reprodução é fonte de grande variabilidade genômica. Em humanos, a produção dos gametas femininos ocorre durante o desenvolvimento e os óvulos gerados são armazenados até serem necessários. Na vida intrauterina, células germinativas primordiais migram para o ovário em desenvolvimento e diferenciam-se em oogônias. As oogônias passam por mitoses sucessivas até originar o oócito primário. Ainda antes do nascimento, os oócitos iniciam o processo de meiose, que é interrompido na fase de prófase 1. Os oócitos formados são circundados por células que formam um folículo e secretam componentes de matriz extracelular, constituindo uma camada entre o oócito e o folículo, denominada zona pelúcida. As células foliculares (ou granulosas) coordenam a oogênese, retardando a maturação e a liberação do óvulo. Quando os oócitos primários são ativados (por exemplo, na puberdade), a meiose continua de forma assimétrica, levando à formação do oócito secundário (com a maior parte do citoplasma) e do corpúsculo celular primário que, geralmente, é degradado. O oócito secundário sofre então outra divisão meiótica, resultando no óvulo maduro (maior parte do citoplasma) e no segundo corpúsculo celular (que também é degradado). Veja a figura a seguir: A B C D E F G IH 2n 2n n n n n Figura 67 – Resumo do processo de oogênese 117 FISIOLOGIA APLICADA E PSICOBIOLOGIA No sistema reprodutor masculino, os testículos são responsáveis pela produção dos gametas. Os testículos são formados por células de Leydig e de Sertoli e por espermatozoides em várias fases de desenvolvimento. As células de Leydig produzem a testosterona, enquanto as células de Sertoli, localizadas entre as células espermatogênicas, produzem moléculas reguladoras, que controlam a produção de proteínas ligadoras de andrógenos (como a testosterona) e regulam a sensibilidade
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