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Apostila-Complete-Baralho-Cigano

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Como Trabalhar no dia a dia
Baralho ou Tarot?
Tarot é o nome que se dá ao tradicional Tarot contendo 78 cartas.
Porém em algumas regiões da França e com alguns tutores mais 
antigos é muito comum, serem chamados "Tarot Lenormand", 
pois acredita-se que qualquer instrumento divinatório com 
cartas seja designado "Tarot". Então perdoem me os mais 
tradicionais, quando refiro-me ao baralho como Tarot, é apenas um 
costume que tive com os tutores nesses anos.
Respeito ao óraculo
Devemos inicialmente, ter em mente que o baralho é um método 
de autoajuda, e não devemos profaná-lo, fazendo a ele, 
perguntas irrelevantes ou de futilidades, um bom exemplo disso é 
"devo trair meu marido", está pergunta profana o baralho, pois é 
algo que você deve decidir por si, dentro da sua moral e costumes. O 
Baralho é um bom conselheiro, mas não devemos ficar 
escravizados de seus conselhos, devemos sempre lembrar, que 
seu uso terapêutico, o ajuda a ter mais firmeza em suas decisões, 
mas ele não deve ser o mestre de sua vida e tomar as decisões 
que cabem a ti, tomá-las Lembre-se de respeitá-lo e agradecê-lo 
ao fim de cada consulta ou auto-consulta, mantê-lo limpo e bem 
guardado.
Respeito a outros oraculistas
Devemos ser cientes que, cada oraculista, muitas vezes vê em de 
outras escolas, e métodos de aprendizado, não existe certo ou 
errado, "Verdadeiro/Real método", e sim aquele que cada um 
aprendeu, e funciona para si e seus demais (Pois o oráculo, 
sempre ira funcionar, independente de cada escola seguida), 
lembre-se de respeitar seus colegas oraculistas, e pegar deles, 
aquilo que lhe for útil e coerente.
Concentração e Corte do Baralho
É importante que você, esteja relaxado no momento em que for 
fazer um atendimento, ou uma leitura para um consulente, 
lembre-se, sua energia influência na leitura, então, não faça a 
leitura irritado ou com pressa. Tenha o seu método de 
relaxamento, uma respiração, um chá, uma reza, meditação, o que 
mais lhe é agradável fazer, para conectar-se ao divino e sentir-se 
em paz, para ai sim, iniciar o seu trabalho junto ao baralho.
O Corte
É importante sempre embaralhar muito bem o baralho antes de 
iniciar uma leitura, o corte deve ser feito da maneira que você achar 
melhor, não existe maneira certa de onde tirar as cartas para 
iniciar uma tiragem, você pode pegar do meio do baralho, em cima, 
em baixo, sequencial, a resposta será dada independente da 
ordem de tiragem do baralho.
As cartas devem ser dispostas com seus símbolos abaixados, 
sendo revelados apenas no momento que você começar a leitura.
Seu consulente deve fazer o corte e embaralhamento, e o 
cartomante deverá organizar as cartas na disposição correta de 
cada método de tiragem, dentro da ordem de tiragem do 
consulente.
Como perguntar ao baralho
As perguntas devem ser simples e concisas, não precisam vir de 
uma história que vem da infância do consulente , até o momento 
atual, precisam ser objetivas, então temos como exemplo
"Devo procurar uma mudança de emprego, dentro de 2 meses"
"Ficarei desempregado?"
"Estou noiva, e estamos tendo problemas financeiros, nosso 
casamento ira ocorrer neste ano ainda?"
Etc...
Fique sempre muito claro, que é importante, que o consulente lhe 
passe informações, pois isso ajuda na melhor interpretação das 
cartas, por exemplo, se o consulente procura um novo trabalho, é 
importante saber se ele está tendo dificuldades nesse trabalho 
atual.
Se a pessoa procura um novo amor, se ela já está em um 
relacionamento ou "rolo"...
O Oraculista não é um "adivinho", precisamos de informações para 
poder sim, darmos uma melhor resposta baseado nas cartas que 
teremos em nossas mãos.
O que evitar?
Você, como oraculista, deve ter o bom senso de saber dizer ao seu 
consulente o que não se deve perguntar, pois determinadas 
coisas, não são parte do direito sair dizendo as pessoas, como por 
exemplo, uma pergunta sobre morte, não lhe cabe o direito de 
responder algo que está na mão do criador, então tenha em 
mente, que perguntas sobre
Morte
Traição
Desejo de vingança (do seu consulente para com os outros)
Devem ser banidas, pois, traição necessita de diálogo, uma 
pessoa, que está em um relacionamento, aonde acontece esse 
tipo de dúvida, deve ser resolvido dentro de sua casa, com 
diálogo, se isso não ocorre, a pessoa já tem problemas graves o 
suficiente para que você lhe responda algo, que lhe traga mais, e que 
novamente não lhe é de seu direito.
Não invente, não adicione informações que você não sabe, apenas 
para criar clientela, isso a longo e a curto prazo, lhe gera apenas 
carga astral a qual você não tem necessidade alguma de ter. Seja 
verdadeiro, e responda apenas aquilo que você realmente saiba e 
que esteja descrito no baralho.
Um fundamento muito importante na Bruxaria é, aquilo que 
fazemos de mal, volta x 7 a nós mesmos, então, saiba realmente o 
que a pergunta que você está respondendo, é realmente necessária, 
dentro das leis do criador, e se lhe cabem o direito de respondê-la
É muito importante que não façamos um desserviço aos oráculos, 
que a muito são ridicularizados, respeitando-o e trazendo como 
resposta coisas verdadeiras, e não invencionices para termos 
status como grandes oraculistas, o trabalho do oráculo é auxiliar, e 
não criar falsas esperanças, afim de deixar-nos famosos.
Limpeza do Baralho
Normalmente, é comum, termos 2 baralhos, uma para a /o
consulente em geral, e o nosso pessoal.
O nosso Baralho pessoal, após consagrado, é imantado com nossa 
energia a cada vez que o utilizamos, o deixando cada vez mais 
sintonizados com nós mesmos, ele é normalmente utilizado 
apenas por nós, sem que ninguém mais o utilize.
Agora, quando nós utilizamos o baralho para trabalhos com 
consulente diversa, é muito importante limpar o baralho, a fim 
que não tenha energias demais acumuladas nele, essa limpeza 
deve ser feita de uma maneira muito simples, um copo com sal 
grosso e água, deixe seu baralho (completo, fora da caixa) em 
cima desse copo (cuidado para não deixar seu baralho cair nele! ), 
e você deve pedir que a força daqueles elementos (água e o sal), 
limpem seu baralho e descarreguem toda a energia dos 
consulentes que ali podem ter acumuladas. Deixe de um dia para 
o outro, se você quiser, deixe uma vela branca próximo (cuidado para 
não atear fogo em nada), pedindo que a chama da vela ajude a 
purificar aquela limpeza.
Meu costume, é de fazer isso uma vez por semana, mas você deve 
fazer quando sentir necessidade.
Luciana Kluki
Artista plástica e Terapeuta alternativa.
Estudou Petit Lenormand e Tarot tradicional na França e no Brasil, com 
variados Tutores e métodos. Aprendeu que o mais importante do oráculo, é 
respeitar o método de cada um, entendendo que, tudo que é guiado pelo 
Lenormand, ira funcionar, inevitavelmente, a energia do oraculo nunca "da 
um ponto sem nó"
Faço consultas com Petit Lenormand, via skype, caso tenha interesse, você 
pode entrar em contato comigo, via Facebook : 
https://www.facebook.com/carrocacigana
Ou pelo e-mail : lucianakluki@gmail.com
Curso: Petit Lenormand (Baralho Cigano)
Eadeptus http://eadeptus.com.br/ 
Método Francês
Ferradura
7 Cartas - Tiradas aleatoriamente pelo consulente
Devem ser dispostas pelo oraculista da forma descrita acima, deverão ser tiradas de uma única 
vez, a qualquer ordem de embaralhamento feito pelo consulente.
Essa tirada pode ser feita para perguntas com validade de até 6 meses ao máximo.
A leitura deve ser feita da seguinte maneira
Carta número 1 - Momento atual do consulente
Carta número 2 - Momento da pergunta, o exato momento em que o consulente está lhe 
consultando
Carta número 3 - Elementos que levaram a evolução do motivo da pergunta
Carta número 4 - Conselho do baralho para resolução da questão
Carta número 5 - Como o consulente deve agir sobre sua pergunta
Carta número 6 - Obstáculos (seja você mesmo, ou terceiros) e/ou adversidades que podem 
surgir no trajeto
Carta número 7 - Vitória final, como será o desfechoda pergunta
2 Triângulos
7 Cartas, devem ser dispostas pelo oraculista da forma descrita acima, deverão ser tiradas de 
uma única vez, a qualquer ordem de embaralhamento feito pelo consulente.
A validade dessa pergunta pode ser determinada pelo consulente, por exemplo 3 meses, 6 
meses, 12 meses. 
Deverá ser lida da seguinte maneira:
Em sua ordem numérica, partindo de baixo para cima, mas iniciando sempre de carta número 1
Carta número 1 - Representa o seu consulente, quem ele é.
as cartas inferiores - 5-6-7 - São as cartas desfavoráveis ao consulente, lembre-se, toda a leitura 
deve ser feita, correlacionando com a carta número que representa o seu consulente então 
teremos
Cartas desfavoráveis as consulente, baseado em sua pergunta
5 - 6 - 7
São cartas negativas, momento que o consulente precisa pensar em seus obstáculos (que podem 
ser internos ou externos)
O Triangulo superior (Cartas 2-3-4) São as cartas favoráveis o que o consulente tem para reverter 
sua atual situação.
LEMBRE-SE essa tirada deve ser feita, como a ordem descrita (disposição de cartas, seguindo a 
numeração de sua ordem)
MÉTODO BRASILEIRO
3 cartas 
Passado/Presente/Futuro
Baralho deve ser embaralhado pelo consulente e o mesmo, deve dispor as cartas na ordem mais 
relevante, as perguntas, podem ser feitas para períodos de até 12 meses.
Deve ser lido, primeiramente
Carta número 1 - Baseando se no passado, tendo como base a pergunta do consulente
Carta número 2 - Presente, o momento atual ao qual ele se refere em sua pergunta
Carta número 3 - O que pode mudar em sua atual/passada situação
Pergunta e Resposta
Baseando em 3 cartas que se correlacionam, você deverá encontrar uma única resposta ao seu 
consulente
Baralho deve ser embaralhado pelo consulente e o mesmo, deve dispor as cartas na ordem mais 
relevante, as perguntas, podem ser feitas para períodos de até 12 meses.
Baseando-se na ordem que o consulente predispôs as cartas, o oraculista, ira ler e interpretar as 
cartas, trazendo uma resposta para a pergunta do consulente.
4 Cartas
Baseando-se em 3 cartas + 1 para conselho para trazer a ajuda ao consulente
O consulente ira fazer sua pergunta, e dispor de 3 cartas em cima da mesa, o oraculista ira 
responder sua leitura diante das 3 cartas que estão dispostas, e ao terminar essa leitura, devera 
então pedir o conselho do baralho, onde nosso consulente, ira pegar mais uma carta do baralho, 
e dispor a mesa, essa quarta carta, ira ser lida como um conselho do baralho, para a "solução" da 
pergunta feita pelo consulente.
Luciana Kluki
Artista plástica e Terapeuta alternativa.
Estudou Petit Lenormand e Tarot tradicional na França e no Brasil, com 
variados Tutores e métodos. Aprendeu que o mais importante do oráculo, é 
respeitar o método de cada um, entendendo que, tudo que é guiado pelo 
Lenormand, ira funcionar, inevitável mente, a energia do oráculo nunca "da 
um ponto sem nó"
Faço consultas com Petit Lenormand, via skype, caso tenha interesse, você 
pode entrar em contato comigo, via Facebook : 
https://www.facebook.com/carrocacigana
Ou pelo e-mail : lucianakluki@gmail.com
Curso: Petit Lenormand (Baralho Cigano)
Eadeptus http://eadeptus.com.br/ 
 
Mlle Lenormand: Profetisa ou feiticeira?
Ronald Decker, Thierry Depaulis e Michael Dummet
Gostaria de partilhar com todos os estudantes, profissionais, pesquisadores e apaixonados, a
tradução do capítulo 6, Mlle Lenormand: Prophet or Sorcerer? do livro A Wicked Pack of Cards ­
The Orignis of the Occult Tarot, de Ronald Decker, Thierry Depaulis e Michael Dummet ­ St.
Martin’s Press – New York – 1996, três das maiores referências mundiais na história das cartas.
O texto é a biografia mais completa e fidedigna de Mlle. Lenormand, trazendo informações
importantes sobre sua vida, sua forma de trabalho e as ferramentas que utilizava no seu ofício,
bem como a relação de seu nome com baralhos como o Grand Jeu, Petit Lenormand e outros.
Esse texto é muito importante para compreendermos a história do baralho Petiit Lenormand e até
que ponto ele, realmente, estaria ou não, ligado à Mlle Lenormand.
Além disso, teremos a oportunidade de conhecer a vida da Sibila dos Salões e de como construiu
a sua imagem e fama através de inteligentes e ousadas formas de marketing pessoal, valendo­se
de plágios e inverdades, tornando difícil separar de si, a realidade da fantasia.
De qualquer forma, sua fama é inegável: foi a mais célebre e famosa cartomante da história!
Tradução e apresentação de Alexsander Lepletier
 
Mademoiselle Lenormand
“Mlle Lenormand, a célebre mística francesa, marcou profundamente a história, de forma que a
mera referência à sua passagem seria supérflua. Basta dizer que foi Mlle. Lenormand que previu
para Napoleão sua fenomenal ascensão e sua posterior queda repentina. Mlle Lenormand foi
uma das grandes profetisas vivas, tendo sido reconhecida pela nobreza da Europa.” É dessa
forma que um baralho de 52 cartas, fabricado pela The United States Playing Card Company of
Cinccinati, chamado Gypsy Witch, é apresentado em seu folheto.
O nome de Mlle Lenormand é, provavelmente, mais conhecido que o de Etteilla e seus
discípulos. Não só foi a vidente mais popular das primeiras décadas do século XIX, como se
mantém como a adivinha mais célebre de todos os tempos. Sua popularidade parece dever­se
bastante aos seus escritos, nos quais diz ter estado com pessoas famosas e ter ser tornado a
confidente da Imperatriz Josefina, de quem publicou as alegadas “memórias secretas”. Embora
sejam praticamente esquecidos hoje em dia, Mlle. Lenormand escreveu quatorze livros, nenhum
sobre suas teorias do Tarô ou métodos de cartomancia, e sim sobre sua carreira e suas ligações
com pessoas importantes. Sua preocupação não era a de popularizar uma teoria ou sistema
práticos, mas propagar a crença em seus poderes como uma sibila.
Senhorita Lenormand
 
Retrato de Marie­Anne Lenormand
Apesar disso, seu nome ainda é associado a um estranho conjunto de cartas, o Grand Jeu de
Mlle. Lenormand, ainda produzido pela Grimaud, a principal empresa francesa fabricante de
cartas. Embora esse baralho, bastante popular, tenha 54 cartas, sendo 52 cartas “normais” e
duas figuras extras, ele tem sido confundido, algumas vezes, com um baralho de Tarô, como
deixam claro os títulos de dois livros recentes: Le Tarot de Mlle Lenormand (Paris, 1989), de
Dicta e Françoise, e Votre Personalité Révélée par Le Tarot de Mlle Lenormand (Paris, 1992) de
Carole Sédillot. O mesmo acontece com uma derivação da tradição Lenormand, o “Petit
Lenormand”. Nesse caso, o baralho é composto de 36 cartas e ainda é produzido no países
germânicos, onde parece ser uma especialidade local.
É fácil compreender que o Grand Jeu de Mlle. Lenormand e seus primos alemães não têm
relação alguma com o tarô. Que os últimos não têm nada a ver com Mlle. Lenormand será
claramente explicado e mostraremos que a sibila não era tão interessada em previsões através
de cartas. Marie­Anne Lenormand (1772­1843) é, finalmente, a figura mais proeminente de uma
época que assistiu os últimos magos fora de moda darem lugar aos modernos oraculistas que
parecem ter proliferado sob o reinado de Napoleão (1804­15).
O começo de Mademoiselle Lenormand
Apesar de clamar às “altas ciências”, a primeira principal ocupação de Etteilla, que era prever o
futuro com as cartas, teve suas raízes na sociedade francesa. Embora uma lei punisse “pessoas
fizessem da adivinhação e prognósticos ou interpretação de sonhos” seu ofício, Paris estava
cheia de cartomantes durante os primeiros anos do século XIX. Uma notícia de 1804 diz: “A
polícia repreende leitores de cartas (“ tireurs de cartes”) em vão, pois surgem novos todos os
dias.” Os arquivos de polícia revelam muitas dessas pessoas a quem Éloïse Mozzani evidencia
num dos mais bem documentados capítulos de seu livro (Mozzani, 1988, capítulo XV, Les tireurs
des cartes sous Napoléon). Cidadão “Irénée” anunciava, em 1802, que ele continuava a ler
cartas, oferecendo explorar o passado,descrever o presente e prever o futuro graças aos seus
estudo da arte da Necromancia. Ele tinha, ainda, segredos exclusivos, como ler a clara de um
ovo e a borra do café, além vender água­de­colônia. Detido, Irénée confessou se chamar Bonier.
Outra busca policial feita no apartamento de uma mulher chamada Gilbert, no mesmo, ano,
revelou que ela possuía três baralhos, incluindo um que se chamava “Thot”’. Um homem
chamado Lyonnais predizia o futuro na rue de Bucy. Quando a polícia chegou, apreendeu “dois
baralhos contendo figuras estranhas, cada um”.
Madame Lacoste, a mulher Grangou, o cidadão Meyer, Mademoiselle Virignie, os Somonets,
Madame Lebrun, a viúva Chevalier, sob o pseudônimo de “Madame Renard” – Madame Raposa
– são somente alguns poucos nomes dentre os muitos praticantes citados por Mozzani que foram
detidos e presos por curtos períodos pela polícia durante os anos de 1801­9. Mlle Lenormand era
exatamente do mesmo tipo, exceto por ter escrito muitos livros. Isso fez uma grande diferença.
Embora tenha enchido seus livros com episódios de sua vida e as pessoas com quem encontrou
e, embora muitas obras tenham sido publicadas ao longo de sua carreira (há, pelo menos, seis
biografias, sem mencionarmos notas em dicionários), não é fácil delinear a vida real de Mlle
Lenormand. Muitas de suas afirmações são ilegítimas, muitas de suas biografias são forjadas,
reconhecidas ou não. Logo após sua morte em 1843, três livros foram publicados. O primeiro
deles, La Sibylle de XIXe siècle, consiste no que pretende serem profecias feitas pela própria
Mlle Lenormand, escrito pouco antes de sua morte, com um comentário sobre elas e uma
pequena biografia da autora (a biografia é anônima).
O autor do comentário intitula­se Hortensius Flamel, um pseudônimo, obviamente. O nome
Flamel é claramente emprestado do célebre suposto alquimista do século XVI, Nicolas Flamel,
mas o primeiro nome soa estranho. A identidade de Hortensius Flamel tem sido sujeita a muita
discussão; devemos deixar nossas considerações sobre o assunto até o próximo capítulo.
Parágrafos inteiros da biografia, incluídos no livro, são repetições, palavra por palavra, de uma
carta anteriormente publicada numa revista semanal chamada Le Tam­Tam (nº 29 de 9­15 de
julho de 1843). Essa carta foi enviada ao editor por um senhor chamado Monsieur Alboise e
alega ser baseada em documentos não publicados vindos de Alençon, local de nascimento da
sibila.
Alboise – Jules­Édouard Alboise (ou Alboize) du (ou de) Pujol (1805­54) – foi um colaborador
permanente da revista, como é indicado na página principal. Ele era um dramaturgo,
administrador de teatro, autor (sempre como colaborador) de pobres vaudevilles e superficiais
romances de época. De acordo com a nota sobre “Lenormand” no Nouvelle Biographie Génerale
(Vol. 29, 1859), Alboise du Pujol era um parente de Mlle Lenormand, que teria casado com sua
sobrinha e herdado papéis particulares a partir dos quais planejava publicar um “Memorial”.
Porém, sua morte, como foi dito, impediu­o de realizar o projeto.
Logo após, em 1843, Francis Girauld, um poeta obscuro, publicou Mademoiselle Lenormand: sa
biographie, ses prédictions extraordinaires, ao qual ele adicionou uma “introdução filosófica nas
ciências ocultas”, apresentando a história da adivinhação, leitura de mãos, cartomancia com os
Tarôs Egípcios e o Jogo de Picket “como explicado pelas profetisas do século XIX”. A capa alega
que é a única biografia “oficial”. A introdução e explicação da cartomancia com o Tarô são
plagiados de Julia Orsini, Le Grand Etteilla ou l’art de tirer les cartes, publicados em Lille em
1838, enquanto a biografia é amplamente derivada de “La Sibylle du XIXe siècle” para os
primeiros anos e dos escritos de Mlle Lenormand.
Ainda no mesmo ano, uma voz cética foi erguida por Louis Du Bois num folheto de 20 páginas
intitulado De Mademoiselle Lenormand et de ses deux biographies, récemment publiées (“Sobre
Mlle Lenormand e suas duas biografias recentemente publicadas”, Paris 1843). Baseado no livro
de Girault, o autor ataca, impiedosamente, a veracidade de Mlle Lenormand e suas afirmações
de ter feito profecias acertadas, sem oferecer evidências sólidas. Du Bois, que se denominava
bibliotecário da École centrale de l’Órne (i.e. o departamento do qual Alençon é a capital), abre
seu panfleto declarando que Marie­Anne Lenormand não nasceu em 1772, como afirmado, tanto
por Girault, como em La sibylle de XIXe siècle, mas a 16 de setembro de 1768, porém, mais uma
vez, sem citar qualquer evidência.
Dois anos depois, Narcisse­Honoré Cellier du Fayel, “professeur à l’Àthénée royal, directeur du
jornal Le génie des Femmes,publicou La vérité sur Mademoiselle Lenormand (Cellier du Fayel,
1845), contando como conheceu Mlle Lenormand em seus últimos anos. Embora, primeiramente
cético, foi convencido pelos seus talentos, tornando­se um amigo íntimo. Sua descrição é mais
plausível que as anteriores e soa honesta a maioria das vezes.
Logo apareceram biografias em dicionários como o Dictionnaire des sciences occultes de Abbé
Migne, (1855), no Nouvelle Biographie Générale depuis les temps plus reculés jusqu’à nos jours
(Vol. 29, 1859) de Firmin­Didot, e na nova edição de Biographie Universelle Ancienne et Moderne
(Vol. 24, c.1860), de Michaud. Elas refletem opiniões muito diferentes: as ferozes notas de Collin
de Plancy são equilibradas pela biografia mais complacente assinada por L. Boyeldieu d’Auvigny
no dicionário de Lecanu. Porém, Lecanu, ansioso por mostrar distanciamento, acrescentou
comentários críticos. A Nouvelle Biographie oferece uma nota favorável pela Ed. de Manne, mas
a Biographie universelle é duramente crítica sob a caneta de Du Bois.
Mademoiselle (Senhorita) Lenormand
A Senhorita (Mlle.) Lenormand, além da prática da cartomancia, publicou vários livros.
Outra parte não tão grandiosa foi pesquisada, em 1911, por Alfred Marquiset em seu La célèbre
Mademoiselle Lenormand. Marquiset é bastante sarcástico, mas bem divertido. Porém, seu livro
é o mais bem documentado até agora. Ele usou arquivos policiais bem como dedicatórias e
manuscritos. O livro mais recente sobre Mlle Lenormand, Mademoiselle Lenormand: la reine de
la voyance (1990), de Dicta Dimitriads, não traz informações reais, sendo fortemente
romanceado e usando, ainda, as mesmas histórias confusas e supersticiosas como fizeram
Flamel, Girauld e outros, de forma a apresentar sua heroína de forma bajuladora. Não é surpresa
que a biografia de Marquiset não seja nem mencionada!
Marie­Anne Lenormand nasceu em Alençon, na Normandia, em 27 de Maio de 1772. Até mesmo
sua chegada ao mundo é cercada de controvérsia. Como vimos, um de seus muitos biógrafos
mantém que ela nasceu a 16 de setembro de 1768. Algumas décadas mais tarde, Ed. de Manne
apresentou a sua data completa de nascimento, contradizendo Du Bois. Pesquisas recentes nos
livros paroquiais de Alençon confirmaram que Marie­Anne­Adelaïde Lenormand nasceu e foi
batizada no mesmo dia, 27 de maio de 1772. Seu pai, Jean­Louis­Antoine Lenormand era um
comerciante de tecidos e morreu no ano seguinte. Sua mãe, Marie­Anne Gilbert, com quem
Jean­Louis Lenormand casara em 1767, teve outro marido em 1774, Isaac Rosay–Desfontaines.
Infelizmente, ela faleceu em 1777, deixando Marie­Anne órfã aos 5 anos de idade. Isaac Rosay
casou­se de novo e mais outra vez em 1779, pois a segunda faleceu. Dessa forma, Marie­Anne
Lenormand era uma estranha para os seus pais legais.
De acordo com a carta de Alboise para a Le Tam­Tam, reproduzida por Flamel e Girauld. Marie­
Anne deixou Alençon, indo para Paris, Não é certo se ela se juntou ao seu padrasto, Isaac
Rosay­Desfountaines, que tinha se estabelecido lá e aberto uma loja na rue du Colombier, ou
outro comerciante – talvez com a indicação de Isaac – ou, ainda, se ela foi simplesmente atraída
pela capital e saiu sem planos. Uma vez em Paris, é dito que reencontrou um conterrâneo,
Jacques­René Hébert, que se tornaria famoso entre 1790 e 1794 com o seu Le Père Duchese, o
mais bruto e violentojornal do período revolucionário. Ela se apaixonou por ele? Não há nada
certo, mas não é provável que tenham sido amantes uma vez que a última confidente de Mlle
Lenormand, N.­H. Cellier du Fayel, revela que ela morreu “em sua pureza natural de
nascimento”.
Nada muito confiável pode ser estabelecido sobre os anos seguintes. De acordo com Dimitriadis,
que não só confia em Flamel e Giraud, mas acrescenta muitos detalhes ainda desconhecidos,
Marie­Anne Lenormand estava vivendo em precárias condições quando decidiu deixar Paris para
ir para Londres e visitar o célebre Dr. Gaal, com quem se encontrou em setembro de 1789.
Entretanto, Du Bois e Cellier apontaram que Gaal não só era desconhecido naquela época, como
nem tinha deixado sua terra natal, a Alemanha. Além disso, ele não tinha exposto em francês
suas pesquisas sobre crânios até 1808. Mesmo sendo uma profetisa, não seria razoável que a
jovem Mlle Lenormand tenha ouvido falar das teorias de Gaal em 1789! Também é uma
extravagante superstição que ela tenha viajado sozinha para outro país aos dezessete anos.
Marie­Anne Lenormand nos diz que em 1793 ela era secretária de Monsieur d’Amerval de la
Saussotte. Numa longa nota nos seus Souvenirs prophétiques d’une sibylle, ela explica como
d’Amerval de La Saussotte, um opositor da realeza, planejou ajudar a rainha Marie­Antoinette a
escapar da prisão. Marie­Anne se juntou ao plano, mas somente teve sucesso em encontrar­se
com a rainha na prisão. Maria Antonieta, ela conta, tinha um baralho para ler a sorte.
Infelizmente, como mostra Alfred Marquiset, tudo nessa história é uma farsa. Mlle Lenormand
usou a moldura de um caso real – o “Caso dos Cravos” – e, simplesmente, mudou os nomes,
colocando o seu no lugar de um homem chamado Gonse e acrescentando alguns detalhes.
A seguir, encontramos Marie­Anne sendo detida na companhia de François Flammermont e
Louise Gilbert. De acordo com um documento arquivado reproduzido por Cellier du Fayel em
1845, eles foram sentenciados à prisão e multados em 10 livres no dia 20 de Floréal do ano II (9
de maio de 1794) por serem “diseurs de bonne fortune” (leitores da sorte). O ato menciona que
eles usavam “convites” e “cartas”. Todavia, Alfred Marquiset mostrou dúvidas quanto a esse
documento que foi publicado somente em 1845 e “deve ter vindo direto da fábrica Lenormand”.
No seu livro de 1814, Mlle Lenormand queixou­se de ter sido presa “sob o terrível sistema do
Terror” (ou seja, 1794); mas ela explica a sua estadia na prisão por “ter pregado uma
contrarrevolução”!
A primeira evidência documentada que temos de Mlle Lenormand é nada mais que um jornal
diário chamado Le mot à l’orreille, ou le Don Quichotte des dames (“A palavra no ouvido, ou Don
Quixote das senhoras”), cuja primeira edição apareceu no dia 11º Vendémiaire, ano VI (2 de
outubro de 1797). Era uma gazeta simples, cheia de humor e notícias do Conseil des Cinq­Cents
(Parlamento). A única alusão à divinação é a “previsão” do tempo na sua quinta edição. Le mot à
l’oreille não parece ter tido muito sucesso: depois de oito edições, Mlle Lenormand desistiu.
Todavia, é interessante ler que ela é “editora­proprietária” – na verdade ela se coloca como
‘rédactrice’, o que nos leva a crer que ela escreveu todos os artigos ­ e que seu endereço seja
“1153 rue de Tournon, Faubourg Saint­Germain”.
É provável que esse seja o atual nº 5 da mesma rua. Embora a rue de Tournon não tenha
mudado desde aqueles dias — muitos dos edifícios são do final do século XVIII — a numeração
atual só foi introduzida em 1805. Antes disso, eram usados sistemas diferentes baseados em
todo o distrito envolvendo números altos. É verdade que Jacques­René Hérbert tinha seu
negócio lá até 1792. Foi inferido que Marie­Anne Lenormand foi a sucessora de Herbert em sua
loja, mas não temos indícios reais de sua situação durante a revolução. Cellier du Fayel cita que
ela só se estabeleceu em 1799 (embora saibamos que ela já havia se estabelecido lá desde
1797), acrescentando que o número 1153 rue de Tournon se tornaria o número 9. Para
Marquiset, ela viveu no número 9 “por volta de 1798”, mudando­se depois para o número 5. Mas,
numa carta que Mlle Lenormand enviou à Imperatriz no dia 28 de novembro de 1804, ela ainda
dá o endereço como “rue de Tournon nº 1153, fabourg Saint­Germain”. A situação se torna
complicada com o arranjo das premissas: nº 5 e nº 7 de um prédio com três lojas e uma entrada
principal. Uma vez numerado ‘5’, a localização na rue de Tournon permaneceria o endereço da
célebre sibila até seus últimos dias.
Lenormand e Robespierre
Lenormand atende Robespierre, um dos líderes da Revolução Frances (1789­1799)
Já era Mlle Lenormand popular? Não há evidências, a não ser em seus próprios escritos. Ela
realmente leu a sorte para o conde de Provença, que se tornaria o Rei Luís XVIII, bem como para
Mirabeau, general Hoche, Camille Desmoulins, Danton, Saint­Just, Marat, Barras, Robespierre,
Talleyrand, o ator Talma e, por último, mas não pior, Joséphine de Beauharnais? Louis du Bois
demonstrou que isso seria logicamente impossível para muitos deles, já em 1843. Cellier du
Flamel duvidou de qualquer celebridade. Para ele, Marie­Anne Lenormand viveu humildemente
até 1800.
Alfred Marquiset ofereceu uma boa reconstrução hipotética da ascensão de Mlle Lenormand: “O
primeiro lugar em que fez suas tentativas foi nos barcos das lavadeiras, sempre apaixonadas
uma “necromancia”. Por alguns centavos elas a alimentava com maravilhosas esperanças e elas
não resistiriam a contar aos seus clientes tais maravilhas. Passo a passo, ela chegou aos
comerciantes, então à burguesia e às mulheres do mundo através de suas criadas. Daí até a alta
sociedade só era preciso mais um passo. Encontrando­se com pessoas de alto nível, Mlle
Lenormand aprimorou sua educação preocupando­se com o conhecimento específico que
precisaria para o seu ofício. Desenvolvendo sua astúcia normanda, ela pôde arrumar relações
secretas em todos os lugares e deslumbrar, frequentemente, com suas revelações, tendo pago
para isso de seu próprio bolso”.
A vidente de Joséphine
No dia 2 de maio de 1801, Marie­Anne Lenormand foi convidada a ir até La Malmaison, a
residência de Joséphine de Beauharnais, numa aldeia a oeste de Paris. Marie­Josèphe­Rose
Tascher de La Pagerie, a primeira esposa de Napoleão Bonaparte, nasceu na Ilha da Martinica
em 1763. Ela se casou com Alexandre de Beauharais em 1779, então, depois da morte de
Beharnais em 1794, casou com Bonaparte em 1796. Como o convite foi anônimo, Mlle
Lenormand não tinha a menor ideia de quem encontraria. Foi pela sua arte da quiromancia que
ela identificou Joséphine – a quem, aparentemente, não reconhecera, apesar dos seus primeiros
contatos durante o Terror. Não somente estava ela diante da esposa do primeiro cônsul, como o
próprio Napoleão Bonaparte estava lá. O único problema é que nossa única fonte disso é o
próprio livro de Mlle Lenormand, “Les Oracle sibyllins…” de 1817.
Lenormand e Josephine
Lenormand faz pevisões para Josephine, esposa de Napoleão Bonaparte
É incerto que ela tenha mesmo se tornado parte das relações de Joséphine, uma vez que Alfred
Marquiset cita um cartão­postal de 28 de novembro de 1804 na qual Mlle Lenormand dirige­se à
Imperatriz como uma “sybille [sic para sybille] française”, “implorando humildemente à Sua
Majestade Imperial para em sua bondade conceder­lhe um grande favor: o 'livro do destino’
disse­lhe ‘que receberia um pequeno trabalho de sua digníssima pessoa”.
Mais uma vez, é difícil separar o que é verdade e o que pura invenção. Mademoiselle Ducrest,
que visitava Joséphine de Beauharnais frequentemente, concorda que ela tinha inclinações para
superstições e adivinhação. Alfred Marquiset também se refere à Duquesa d’Abramtès e à
‘Mademoiselle Avrillon’, ambas dando evidência de que Josephine teria consultado Mlle
Lenormand, diretamente ou através de um mensageiro. Todavia, historiadores provaram que as
duas últimas foram forjadas como muitas outras memórias no período Napoleônico. O que é
óbvio é queMarie­Anne Lenormand se aproveitou bastante da situação. Não só contou sobre
seus alegados encontros com Joséphine com riqueza de detalhes em muitos de seus livros,
como ainda publicou Mémoires Historiques et secrets de l’imperatrice Joséphine, Marie­Rose
Tascher de La Pagerie, em duas edições, 1820 e 1827, orgulhando­se de ter sido confidente e
conselheira de Joséphine.
Relatos mais sérios evidenciam grandes contrastes. Um documento policial relata: “há multidões
na Lenormand, a famosa leitora de cartas da rue de Tournon”, e acrescenta que Metternich, o
estadista austríaco, então embaixador em Paris, visitou­a em 1808. Jacques­Barthélémy
Salgues, no seu Des erreurs et des préjugés répandus dans la société (“Dos erros e preconceitos
na sociedade”) foi forçado a confessar que “longas filas de carruagens” esperavam em frente à
“famosa senhorita L.R.”, significando Lenormand. Então, Mlle Lenormand estava em voga e rica.
Parece que ela comprou uma casa de campo em Migneaux (perto de Poissy, Yvelines), por volta
de 1802 e, provavelmente, mais tarde, um apartamento na rue de la Santé, em Paris. Talleyrand,
Mme de Staël e Talma podem tê­la consultado.
Mas há um lado negro. No seu L’hermite de la chausée d’Antin, Victor­Étienne Jouy conta: “Há
uma sibila moderna em Paris cuja reputação e sustento se baseiam somente na credulidade
infantil das mulheres da melhor sociedade…”, “é no centro de Paris, na rue de Tournon, no
enigmático letreiro do Bureau de Correspondence générale”. Os arquivos policiais revelam que
ela era constantemente detida e presa. Em dezembro de 1803 ela foi mandada para a prisão no
“Madelonnetes” por sua “sala de estar ser um antro de conspiradores”. Os relatos policiais
multiplicaram. Em setembro de 1804 conta­se que “Mlle Lenormand, que reside na rue de
Tournon engana tolos todos os dias”.
O grande assunto de 1809 foi o divórcio de Napoleão de Joséphine. Mlle Lenormand foi detida
em 15 de dezembro como consta nos relatórios policiais. “A mulher Normand [sic], que ganha a
vida lendo a sorte, foi presa. Quase todo o tribunal costumava consultá­la sobre atualidades. Ela
fez horóscopos para as pessoas mais importantes e ganhava mais de 20.000 francos por ano
com o ofício”. Mas temos outra testemunha: a própria Marie­Anne Lenormand. Ela usou um livro
de 602 páginas (Les souvenirs prophétiques d’une sibylle…), publicado em 1814, para nos dizer
porquê e como ela foi para cadeia por alguns dias em 1809. Ela foi interrogada sobre seus
clientes, técnicas e previsões e, então, liberada. A verdadeira razão da sua detenção, ela conta,
foi por ter previsto o divórcio de Napoleão de Joséphine e tentado impedi­lo. Desde então, a
polícia pareceu deixá­la em paz.
Lenormand recebe ordem de prisão
A cartomante Lenomand recebeu várias ordens de prisão
Em 1812­13, Mlle Lenormand tinha uma livraria na rue du Petit­Lion­Saint­Sulpice (ou Petit­
Bourbon­Saint­Sulpice, a rua próxima, depois da Tournon), que deve ter comprado de um antigo
livreiro, Fréchet, em cerca de 1810. Foi nesse endereço que ela publicou seus primeiros livros.
Le souvenirs prophétiques foi publicado “à Paris, chez l’autir, rue de Tournon, nº 5, et à son
magasin de librairie, rue du Petit­Bourbon­St­Sulpice, nº1 ("pode ser adquirido com o autor,… e
em sua livraria… "). O livro foi editado por Lenormant, um editor que não tem qualquer relação
com Marie­Anne. A gravura mostra a chegada dos policiais na sala de consultas de Mlle
Lenormand. Um prefácio (Petit avant­tout) apresenta o livro que é organizado como uma história
sequencial: primeiro, Ma vision, então Le réveil ("O despertar"), Le depart, ("A partida"), Premier
interrogatoire ("Primeiro interrogatório"), Deuxième interrogatoire, seguido pelos onze dias de sua
prisão, algumas “reflexões”, “uma palavra no ouvido”, o “billet doux”, uma viagem ao inferno, uma
Description de l’île d’Elbe e, por último, mas não menos importante, algumas 282 páginas de
notas!
Como podem imaginar, não precisamos resumir esse livro sufocante cujo propósito era mostrar o
quão brilhante ela se comportou e o quão ridícula foi à polícia e, é claro, promover sua arte e
previsões. Nesse fluxo de situações falsas e digressões históricas, ainda assim conseguimos
pegar algumas das técnicas divinatórias da sibila. Em “Le rèveil” (pp.8­9) ela lista alguns de seus
instrumentos, os quais explica em generosas notas: O espelho flamejante de Luca Gaurico, as
trinta e três varetas gregas, sua “cabale de 99 de Zoroastre”, sem mencionar seus grimórios, sua
varinha divinatória, seu precioso talismã… Mas a primeira pergunta dos policiais é sobre leitura
de cartas: “Vou faites le cartes (26)?” (“Você lê as cartas?”). Na sua resposta ela lhe oferece uma
leitura. Mas a promissora nota 26 é decepcionante. Estranhamente, Mlle Lenormand insere um
conto popular conhecido como “A história de Grenadier Richard”, onde um soldado assiste uma
missa com um baralho de cartas na mão e, quando repreendido, explica que cada carta tem um
significado bíblico. No segundo interrogatório, ela é, mais uma vez questionada sobre as cartas.
Marie­Anne Lenormand encontra uma oportunidade de nos contar a origem das cartas de jogar
na sua nota número 31, referindo­se ao Abbé de Longuerue e a Jacquemin Gringonneur.
Surpreendentemente, não há uma nota sequer sobre o tarô em toda a obra!
O livro foi um evento único. Reviews apareceram no Le Nain Jaune de 20 de março de 1815 e no
Le Journal des Débats, onde Hofman, seu editor, publicou uma série de artigos em agosto e
começo de setembro de 1815. Marie­Anne Lenormand respondeu no Le Courrier de 20 de
setembro.
A volta dos Bourbons
Marie­Anne Lenormand sempre alegou ser da realeza. Não só tinha simpatia pela família real em
1793 como, é claro, previu a Restauração de 1814­15 (mas não previu os “Cem dias de
Napoleão”!). Era de se esperar que, depois de um pequeno livro celebrando o aniversário da
morte de Joséphine, ela publicou La sibylle au tombeau de Louis XVI (A sibila no túmulo de Louis
XVI, Paris, 1816), onde ela se encontra com um anjo que lhe narra a batalha de Waterloo através
de um generoso vasto relato!… Logo depois, em 1817, Les oracle sibyllins foi publicado. Esse
volumoso livro é a continuação do seu Souvenirs prophétiques e no mesmo estilo, ela tenta
provar que previu a queda de Napoleão. Nós sabemos que o imperador gostava de ler as obras
de Mlle Lenormand, mas que não acreditava na bizarra visão que tinha. Ela revela um pouco de
sua técnica e, particularmente, seu método de leitura de cartas. Ela, claramente, usa um jogo de
piquet, ex. baralho de 32 cartas. Ela cortava três vezes e dispunha as cartas em oito montes.
Então, começava a leitura. Apesar de citar as cartas que tirou para a leitura, ela não tem
problemas em descrever seus significados!
Algumas linhas à frente ela dá mais explicações: “O Rei de Espadas, junto com o 8 de ouros,
significa que um homem habilidoso parou julgamentos, se possível, o avanço de uma doença…
Felizmente, o 9 de copas, que está no topo, diz que verá, rapidamente, o fim de suas cruéis
preocupações” (pp. 151­2). Como se pode ver, seu sistema é bem simples, sem nenhuma teoria
elaborada. Uma grande revelação nos espera na página 159: O uso de cartas de tarô – escrito
tharots, na época – é, finalmente, mencionado por Mlle Lenormand. Como sempre, ela é bem
vaga: “O Louco, que estou tirando de sua mão significa que seus projetos são insustentáveis”, diz
ela (p.159). E então: “Mas eu vejo o Diabo ao lado da Morte” (p. 160). Nenhum significado é
dado, mas uma vez que o consulente bateu em sua mesa e derrubou suas “78 cartas de tharot”,
podemos supor que não foram boas notícias. Os nomes das cartas de tarô mencionadas por Mlle
Lenormand não podem ser encontradas no Grand Etteilla I, onde são chamadas,
respectivamente: Folie, Force majeure e Mortalité. Fol, Diable e Mort são nomes clássicos no tarô
de Marselha.
Outras técnicas divinatórias são mencionadas no resto do livro: économancie (ex.: previsão com
uma bacia de água fresca com folhas de louro e verbena,mais sal!), o aço eléctre (que "só tem
na Europa"), os nove pontos do livro de Thoth (sem qualquer explicação), leitura de mãos, é claro
(com uma grande nota 14), onomancia, com a clara do ovo, chumbo derretido etc. Ela lista o que
trazia consigo: “meus diferentes tharots, meu grande grimório, minhas famosas chaves [de
Salomão], Cornélius Agrippa, minhas varas gregas, meu espelho mágico, o tratado dos sonhos,
segundo Joseph, minha famosa varinha divinatória, 9 dracmas de chumbo fresco, sete pedaços
de cera…, borra de café, o anel cigano” (p. 337). Isso é, no mínimo, a parafernália de uma
feiticeira. Nenhum método cartomântico é apresentado, mas há uma descrição de como Mlle
Lenormand usa as suas varas gregas: “Pego minhas 33 varas gregas e jogo­as aqui e ali, numa
área triangular, porém tiro, com cuidado, o terrível Agamenon e seus seguidores, fazendo isso de
novo, sete vezes” (p. 196).
Em outubro, uma nova oportunidade foi dada à Mlle Lenormand para aumentar sua fama
“internacional”. Para lutar contra Napoleão, o Czar Russo, o Imperador Austríaco e o Rei da
Prússia uniram­se, em 1815, no que foi conhecido como “Sainte­Alliance”. Em outubro e
novembro de 1818 reuniu­se um congresso em Aachen para decidir o futuro da França. Marie­
Anne Lenormand decidiu ir lá por sentir sua presença necessária. Para impressionar os
monarcas a quem iria aconselhar, alugou uma carruagem, deixando Paris em grande ostentação.
Mas foi parada na fronteira pela alfândega belga. O estranho equipamento que funcionários da
alfandega encontraram na bagagem de Mlle Lenormand levantou suspeitas, então ela foi enviada
para Tournai e, então para Mons, para que se descobrisse quais eram os seus planos.
Aparentemente, nada perigoso, pois a liberaram três dias depois. Depois do congresso, foi para
Bruxelas onde, ela nos conta, foi fervorosamente recebida.
Pelo menos todos esses eventos foram assunto para um novo livro que ela própria publicaria no
ano seguinte, embora esteja datado 1818: La sibylle au congès d’Aix­la­Chapelle em 1818, sendo
seu título feito, claramente, a partir do L’observateur au congrès, ou Relation historiques et
anecdotiques du Congrès d’Alaix­la­Chapelle em 1818 (“O observador no congresso, ou
considerações históricas e pessoais do Congresso de Aachen", Paris, A. Eymery, 1818”). O
último livro foi escrito pelo jornalista Charles­Maxime de Villemarest e dá conta da tão comentada
presença de Mlle Lenormand em Aachen, descrevendo como ela, em primeira mão, espalhou
rumores e situações de pessoas bem informadas (pp.151­2). O livro da própria Mlle Lenormand,
por outro lado, é mais um guia turístico, contando como ela foi para Bélgica – sob domínio da
Holanda, então – foi parada pela alfândega e, finalmente, chegou a Achen, da qual oferece uma
descrição completa, emprestada, em grande parte, do Guide des étranger, de J.­B. de Bouge ou
Itinéraires de la ville d’Aix­la­Chapelle (Guia do estrangeiro ou Passeios na cidade de Aachen,
Bruxelas, 1806). Ela fala muito pouco sobre ter encontrado pessoas importantes lá, mas dedica
uma grande parte à descrição de um encontro com um profeta chamado Muller. Muller, tendo­a
convidado a ir à Bruxelas, possibilita que ela termine o livro com um tour pela capital belga.
Tarôs também são usados nesse livro. O índice traz um capítulo promissor intitulado Y a­t­il
quelque de philosophique dans les Tharots? (“Há algo filosófico no Tarô?”). Pelo menos iremos,
aqui, saber o que Mlle Lenormand achava do tarô. Ela nos preparou para isso: Acionando sua
“grande cabale”, ela divide suas figuras egípcias (“mês tableaux égyptiens”) em nove (p. 51). Ela
comenta que, embora um baralho pareça algo frívolo, é merecedor de atenção filosófica. Mais à
frente, ela descreve os utensílios familiares que a cercavam e menciona os tarôs, “figuras
emblemáticas e hieroglíficas” (p. 193). Depois de termos aguentado uma descrição completa de
Aachen, chegamos agora, tremendo de emoção, ao centro da contribuição de Mlle Lenormand
para a teoria do tarô. Decepcionantemente, o capítulo é somente a descrição de seu quarto no
Hôtel de Bellevue. A única frase que ela dedica ao tarô é seguinte: “mês tarots m’offrent de
singulières réflexions” (‘minhas cartas de tarô me oferecem algumas curiosas reflexões’)!
Uma das obras­primas de Mlle Lenormand foi, certamente, Mémoires historiques et secrets de
l’impératrice Joséphine, Marie­Rose Tascher de La Pagerie, première épouse de Napoleon
Bonaparte; orné de cinq gravures, portrait et fac­similé (Paris, 1820, 2 vol.), onde ela conta a vida
da primeira esposa de Napoleão. Não será surpresa se você ouvir dizer que a heroína da história
é, na realidade, Mlle Lenormand no seu papel de confidente e conselheira da imperatriz. Ela não
deixa de mencionar e destacar seus grandes méritos e visões históricas. Alguns meses antes,
um “Prospecto” da assinatura anunciava o livro, alardeando “o luxo da tipografia, as finas
gravuras”. Os compradores podiam assinar “au magasin de libraire, rue du Petit­Bourbon­St­
Sulpice, nº 1”. Essa seria a última menção da livraria de Mlle Lenormand, pois nenhum dos dois
volumes dá esse endereço. Os livros seguintes não o mostram.
Mem,óris históricas e secretas da Imperatriz Joséphine
"Memórias históricas e secretas da Imperartriz Joséphine"
Reprodução do busto da Imperatriz no www.fr.wikipedia.org
O Mémoires historiques et secrets… rapidamente levou a reações negativas. J.­M. Deschamps,
secretária particular de Joséphine, protestou com uma carta bastante sólida no Le Currier
Constitutionnel and Le Courrier Français de 8 de novembro de 1820. Na La Gazzete de France
de 4 de dezembro de 1820, Colnet mostrou que a obra era uma confusão de erros. Embora ela
tente apresentar Joséphine de forma positiva, os admiradores de Napoleão chamaram de traição.
O julgamento de Marquiset é duro: “é um romance cruel”, “quase tudo é falso na obra” e, mais,
“além desses anacronismos, o Mémoires é essencialmente a história de Napoleão sem
imaginação e equivocadamente contada”. Historiadores modernos não são menos críticos. Eles,
geralmente, tomam a obra de Mlle Lenormand sobre Joséphine como puramente um logro. Para
Pr. Jean Tulard eles são “inteiramente apócrifos”.
Apesar disso, o Mémoires historiques deve ter tido algum sucesso e pode ter sido o primeiro
best­seller publicado por Mlle Lenormand. Chegou à segunda edição aumentada com as últimas
palavras de Napoleão em Saint Helena. Sua fama cruzou fronteiras: Mémoires historiques foi
traduzido para o alemão em 1822 sob o título: Historische und geheine Denkwürdigkeiten der
Kaiserin Josephine… ersten Gemahlin Napoleon Bonaparte…, traduzido por August von
Blumröder e publicado pela Sondershausen. Finalmente, uma tradução para o inglês, feita por
Jacob M. Howard apareceu nos Estados Unidos, em 1847, em Chicago e na Filadélfia,
simultaneamente: Historical and secret memoirs of the empress Joséphine (Marie­Rose Tascher
de La Pagerie), firt wife of Napoleão Bonaparte. Translated from the French by M. Howard. Foram
reeditados várias vezes em 1848, 1850, 1852, 1854 e mais tarde, até a virada do século.
Parece que Mlle Lenormand se sentiu humilhada com a reação sarcástica da imprensa
parisiense. Em 25 de fevereiro de 1821 ela deixou Paris e se estabeleceu em Bruxelas. Os
clientes vieram, rapidamente, consultar seus oráculos. Mas a polícia foi igualmente rápida em
prendê­la e Mlle Lenormand foi detida em 18 de abril de 1821. Após prestar depoimentos e
passar por revistas, ela foi indiciada por fraude e levada a julgamento em Louvain. Em 7 de junho
ela foi sentenciada a 1 ano de prisão e multada em 3 florins. Ela entrou com recurso contra a
sentença, sendo novamente levada a julgamento perante a corte de Bruxelas. A sentença de
prisão foi retirada e Mlle Lenormand multada em 15 francos que se recusou a pagar. Livre, Mlle
Lenormand deixou Bruxelas em 15 de agosto de 1821.
Toda essa história deu origem a um novo livro. Souvenirs de la Belgique foi publicado em 1822,
“à Paris, chez l’auteur, rue de Tournon, nº 5, et MM. lesprincipaux libraire de la capitale”. Marie­
Anne Lenormand conta­nos duas memórias de “100 dias de má sorte”, aos quais acrescenta
suas “notas históricas e políticas”. O livro foi ilustrado com um retrato da autora em sua prisão em
Bruxelas. Como nas obras anteriores, há notas de rodapé e finais; há, até mesmo, notas de
rodapé para as notas finais! As 415 páginas são salpicadas com lições de história, digressões de
fatos, e citações em francês, latim e até inglês (sem qualquer referência). É uma narrativa
fantasiosa do que aconteceu do começo ao fim. No seu obsessivo desejo de provar que estava
certa, ela anexa 80 páginas de documentos autênticos (declarações de testemunhas, minutas de
audiências, memorandos que foram publicados em defesa de sua posição).
Todas as “vítimas” mencionaram cartas comuns e de tarô usadas para previsões. Como em seu
Sibylle au congrès d’Aix­la­chapelle, Mlle Lenormand evita responder perguntas diretas sobre o
tarô. No capítulo intitulado Mon interrogatoire (“Meu interrogatório”), onde ela reporta perguntas e
respostas à sua maneira, um consulente pergunta: “O que esses tharots, que parecem ter
hieróglifos, significam?” (p.39). Mas sua reposta tem a ver com quiromancia!
De volta a Paris, Marie­Anne Lenormand dedicou­se a escrever uma pilha de livros, os quais
aparecem em várias listas em suas obras publicadas. Em outubro de 1824, logo após a morte de
Louis XVIII, ela publicou uma visão do “anjo protetor da França no túmulo de Louis XVIII”, no qual
previu um longo e feliz reinado de Carlos X – que foi deposto pela Revolução de 1830. A morte
do Czar Alexander I, em 1825 inspirou um novo canto na obra de Catherine II em seu túmulo. Ela
oferece uma assinatura de quarenta e quatro obras adicionais suas, entre as quais foram
anunciados, mas nunca apareceram, suas próprias memórias e livros sobre o filho de Joséphine,
Eugène de Beauharnais e sobre a Rainha Guilhermina.
De acordo com Dicta Dimitriadis, Mlle Lenormand viajou para Londres, de novo, em 1822 e
juntou­se a uma sociedade chamada “Membros of Mercurii” e chegou a dirigir uma revista
intitulada “The Straggling astrologers of the 19th century”, em 1824. Tudo isso é contradito por
uma carta de Mlle Lenormand em 20 de janeiro de 1823 para Messrs. Truttel e Würtz,
comerciantes de livros, em Paris, negociando a venda de três dúzias de cópias de seu
“Souvenirs de la Belgique” por 178 francos e esperando aumentar os negócios com eles durante
“esse ano, 1823”. É difícil imaginar como ela poderia viver em Londres entre 1822 e 1824,
quando estava publicando seu Souvenirs de la Belgique (1822), em Paris, e então, L’ange
protecteur de la France ao tombeau de Louis XVIII (1824)! Como era de se esperar, ela nunca
fez alusão a essas maravilhosas aventuras em suas publicações posteriores.
Seus últimos anos
Depois da Revolução de julho de 1830, um monarca novo, mais liberal, ocupou o trono francês.
Contrariamente às suas previsões, seis anos antes, Carlos X foi expulso da França e seu primo
Louis­Philippe se tornou rei da França. Marie­Anne Lenormand era monarquista, mas parece ter
sido apoiadora dos antigos Bourbons. Sua fama estava minguando, também, apesar do apoio de
Guizot, um dos mais influentes ministros do governo e Émelie de Girardin, uma dos principais
nomes da imprensa. Ela, também, converteu Narcisse­Honoré Cellier du Fayel, um próspero
advogado que queria encontrar­se com a “charlatã”. Cellier du Fayel foi convencido por seus
oráculos e, em pouco tempo, tornou­se seu confidente e biógrafo.
Na sua Biografia de 1843, Francis Girault nos conta como, em 1835, chegou à sala de consulta
de Mlle Lenormand uma mulher velha e pobre, desconhecida por ela. A mulher confessou ser a
viúva de Fouquier­Tinville, o sinistro promotor público da Revolução Francesa que foi
guilhotinado em 1795. Claro que ela teve muito o que falar e seus escritos secretos eram de
grande interesse para a sibila. Mas essa vem a ser outra farsa: como lembra Alfred Marquiset,
Mme Fourquier­Tinville morrera sete anos antes!
A veia literária de Marie­Anne Lenormand ainda não tinha se esgotado. Entre 1831 e 1833,
quatro últimos livros foram lançados pela sua "fábrica" e muitos outros foram anunciados.
Publicado em janeiro de 1831 e dedicado, L’ombre de Henri IV au palais d’Orléans (“A sombra de
Henri IV no palácio de Orleans [ex.: o Palais­Royal]”.) uma mistura chata de visões, diálogos e
aulas de histórias e notas de rodapé para mostrar o quão precisa era a sua previsão de eventos
de 20­22 de dezembro e que deveriam ter aparecido em 20 de dezembro de 1830. Se tivessem,
poderíamos, finalmente, ter testado as extraordinárias profecias de Olivarius, de 1542. Philippe­
Dieudonné­Noël Olivarius, ela nos conta em suas notas de rodapé (2), página 16, escreveu 919
previsões até 1982. Ela se orgulha de ter comprado esse único manuscrito que foi caçado “em
todas as bibliotecas”. O próprio Papa maravilhou­se. Cinco livros são reproduzidos em L’ombre
de Henri IV (pp. 18­28), com notas explicando o significado de “algumas velhas expressões
francesas”.
Lenormand na prisão
Essa não foi a primeira vez que Mlle Lenormand falou sobre esse mago desconhecido. Ela já
tinha publicado uma de suas previsões em 1820, no “Mémoires historiques et secrets…”. De
acordo com ela, é Napoleão quem é mencionado na profecia de Olivárius para Marie­Anne em
1814. Mais livros foram publicados nos próximos livros: um em “Le petit homme rouge au
château des Tulieries” (julho, 1831), outro em “Manifeste des dieux sur les affaires de France”
(janeiro, 1832) e os livros 8 a 10 foram apresentados no último livro publicado por Mlle
Lenormand, “Arrêt suprême des dieux de l’Olympe”, data em 28 de fevereiro de 1833.
O ridículo “estilo literário antigo” dos textos de Olivarius é tão obviamente forjado que Alfred
Marquiset dedicou um apêndice inteiro para revelar esse “attrape­nigaud” (charlatanismo,
impostura). Ele não só mostra que não há qualquer verdade nas afirmações de Lenormand, mas
que o logro foi desenvolvido por outros escritores. Henri Dujardin, L’oracle pour 1840 (Paris,
1839), diz que conhece três pessoas chamadas Olivarius, das quais, um deixou um livro, “Petri
Joannis Olivarii Valentini de prophetia et spiritu profético liber”, publicado em Basel, em 1543, a
ser encontrado na Biblioteca Real sob inventário número Z 985. Você se surpreenderia se
ouvisse que essa referência é falsa? Um dos outros dois Olivarius foi Philipe­Dieudonné­Noël,
cujo texto é, atualmente, apresentado como um livro publicado em 1544 e intitulado “Prévisions
d’un solitaire”, e um terceiro escreveu o celebrado “Prophétie d’Orval” (outra profecia forjada que
foi publicada pela primeira vez no Journal des villes et des campagnes de 20 de junho de 1839).
Eugène Bareste deu mais crédito ao Olivarius em seu popular “Prophéties: La fin des temps,
avec une notice”, do qual foram publicadas quatro edições, em 1840.
Le petit homme rouge au château des Tuileries; La vérité à Holy­Rood; Prédictions etc ("O
pequeno homem vermelho no castelo de Tuileries"; "A Verdade em Holy­Rood"; "Previsões” etc),
publicados em julho de 1831, introduzem um novo profeta: o Petit Homme Rouge (O Pequeno
Homem Vermelho). Em 1831, Marie­Anne Lenormand nos conta que uma velha e curvada
mulher apareceu no castelo de Tuileries laçando maldições contra os Bourbons. Ela era a
encarnação da República de 1793. O Petit Homme Rouge estava lá e replicou. Sua longa fala
revelou que era o organizador de todos os eventos passados desde 1789. Por que Louis XVI
perdeu o trono? Porque Blondinet (“loiro”), por entendermos ser esse seu nome, decidiu que o rei
não mais poderia reinar. Quem protegeu Napoleão? O pequeno homem vermelho, é claro! Os
leitores dos Oráculos Sibilinos de Mlle Lenormand repararam que o pequeno homem vermelho
tinha sido mencionado na obra (p.340).
De fato, Marie­Anne Lenormand não inventou o Petit Homme Rouge. Provavelmente, ela teve a
ideia a partir de um curto folheto contra Napoleão, publicado em 1814 e intitulado “Le petit
homme rouge”.As seis páginas descrevem a última assembleia de Napoleão encontrando­se
nas Tuilleries e a chegada de um pequeno homem vermelho, um gênio aterrorizante, um ‘homem
de fogo’, cujo contato queimava quem o tocava. Essa criatura infernal estava lá para levar
Napoleão para o Inferno. O Petit Homme Rouge fez outra aparição algum tempo depois do livro
de Mlle Lenormand. Messrs de Pixérécourt, Brazier e Carmouche escreveram uma peça com o
mesmo nome: Le petit homme rouge, folie­féerie romantique em quatre actes et vaudevilles,
imitée du genre anglais (Vaudeville de quatro atos loucos e extravagantes, em estilo inglês),
apresentada no Théâtre de la Gaieté, em março de 1832. A música era de Alexandre Piccini.
Aventuras foram publicadas, anonimamente, em 1843 sob o título Memoirs et prophéties du petit
homme rouge, par une sybille [sic], depuis la Saint­Barthélemy jusqu’à la nuit des temps. Como
veremos mais tarde, Paul Christian iria ressuscitá­lo num livro publicado em 1863: L’homme
rouge des Tuileries.
Novas revelações e previsões foram publicadas em 1832 com o Manifeste des dieux sur les
affaires de France: apparition de S.A.R. la feue Mme la duchesse douairière d'Orléans (Marie­
Louise­Adélaïde de Bourbon­Pentièvre), descendante de Louis XIV à son fils Louis­Philippe Ier,
roi des Français, Révélations (Manifesto dos deuses sobre os negócios franceses: aparição de
S.A.R a última viúva de Orléans, descendente de Luis XIV, para seu filho Louis­Philippe I, Rei da
França. Revelações), publicado em 21 de janeiro de 1832 por Mlle Lenormand, “editeur­libraire” e
Dondey Duprey père et fils, que foram os tipógrafos de parceiros de Mlle Lenormand desde 1824.
Embora amparados por mais páginas das profecias de Olivarius, essas recomendações foram
publicadas em fevereiro de 1833 sob o título Arrêt suprême des dieux de l’Olympe em faveur de
Mme la duchesse de Berry et de son filleul le duc d’Aumale d’Orleans (Henri Eugène­Philippe­
Louis).(Decreto supremo dos deuses do olimpo em afilhado, duque de Aumale­Orléans...) “Essa
pequena brochura [ela nos avisa na contracapa da folha de rosto] foi anunciada para 19 de
novembro de 1832. Amigos não oficiais me fizeram retirar a promessa de adiar essa publicação
até 28 de fevereiro de 1833. “Já basta, disse um deles, que você foi capaz de prever o
nascimento do Duque de Bordeaux, o nobre heroísmo de sua mãe”. É certo: Mme a Duquesa de
Berry será resgatada de Blaye”.
Marie­Caroline, Duquesa de Berry tentou incitar algumas províncias contra Louis­Philippe, em
1832; ela foi detida e presa em Blaye, perto de Bourdeaux. Porém, uma vez mais Mlle
Lenormand não previu o fim burlesco dessa ventura fadada ao fracasso. Ela não soube que a
duquesa estava, secretamente, grávida – não de seu marido legítimo, uma vez que o Duque de
Berry tinha sido assassinado em 1820. Em 1833, alguns meses após o livro ser publicado, a
Duquesa de Berry deu a luz a uma filha inesperada que escandalizou muitas pessoas e
desacreditou a causa Legitimista por muitos anos. Poderia, muito bem, ter desacreditado Mlle
Lenormand uma vez que esse seria o seu último livro.
Todavia, muitos outros escritos estavam sendo preparados. Na lista onde registra seus trabalhos
publicados, Marie­Anne Lenormand anuncia alguns novos livros por vir: “Les mystères de Blaye”,
“Jeanne d’Arc au Louvre”, com o horóscopo da Duquesa de Berry, “La sibylle à Londres”, “Louise
Wilhelmine de Prusse, ou les infortunes d’une grande reine”, com o qual já nos deparamos,
“Anecdotes historiques, politiques, etc. sur la reine d’Angleterre” (Caroline­Amélie­Elisabeth de
Brunswick); “Particularités secretes sur la princese Caroline d’Anglaterre, première épouse de
S.A.R. le prince de Saxe­Cobourg”, o qual jamais nos consolaremos de ter perdido, e, por último
o há muito esperado “Mémoires historiques, politiques, souvenirs, confessions, correspondances
secretes de Mlle Lenormand”, cujos dez volumes, infelizmente nunca apareceram.
O renome de Mlle Lenormand, embora, provavelmente, em declínio, ainda chamava a atenção
de alguns leitores da sorte. Em 1838, uma Mlle Brunet distribuía panfletos onde se apresentava
como discípula de Mlle Lenormand. Marie­Anne manifestou­se, imediatamente, na la Gazzete
des Tribunaux, lembrando seus leitores que ela não tinha alunos. Então, foi um simples adepto
que publicou, em 1842, Le rèvèlateur du destin ou Livre merveilleux des bramines, pour connaître
le présent, le passé et l’avenir, par um apdete de Mlle Lenormand (“O revelador do destino, ou o
Maravilhoso livro dos Brâmanes, de forma a saber o presente, passado e futuro, por um adepto
de Mlle Lenormand"). Uma simples coleção de oráculos no catálogo da Bibliothèque Nationale
atribuída a Aguste Martres
O fim chegou em 25 de junho de 1843. Marie­Anne Lenormand faleceu em seu apartamento na
rue de la Santé. Seu funeral, em 27 de junho, foi extraordinário. A igreja foi coberta com enfeites,
o carro fúnebre foi puxado por quatro cavalos enfeitados e seguido por cem pessoas! Não restam
dúvidas que essa cerimônia barroca foi cuidadosamente preparada. Foi um acontecimento
importante no mundo da adivinhação: a terra tremeu e tudo saiu do lugar. A jogada de Mlle
Lenormand reviveu o interesse em sua carreira e deu aos jornais boas razões para crônicas
sarcásticas. Um longo artigo, por Jules Jain, apareceu no sério Journal des Débats (de julho de
1843), outro por Léo Lespès, no seu concorrente Le Constitutionnel (suplemente de 16 de julho).
Le Charivari, Le Globe e, pelo menos, outros três publicaram artigos sobre sua vida. Antes de
julho acabar, foram publicadas biografias que analisamos no começo do capítulo. A lenda se
cristalizou e um exército de “alunos”, “adeptos” ou discípulos foram rápidos em se rivalizar.
A sucessão de Mlle Lenormand
O único herdeiro dos bens de Mlle Lenormand foi o seu sobrinho de 37 anos, Michel­Alexandre
Hugo, um segundo tenente da infantaria, filho de sua irmã mais nova, Marthe­Sophie. Sua
fortuna foi estimada em 500.000 francos, mas, na verdade, eram somente 120.000, dos quais
perto de 80.000 foram deixados como heranças pessoais e mais em várias reivindicações
concedidas pelo tribunal. Na edição de 16 de julho, o jornal parisiense Le Charivari publicou um
pequeno artigo sobre a sucessão de Mlle Lenormand, concluindo que ela não tinha nenhum
sucessor (a), porém um grande número de senhoras leitoras da sorte dividiriam a sucessão entre
si. O artigo mostra espanto com o número de profissionais, então, atuando em Paris, que
estabelecia em cerca de 50, que divulgavam seus serviços nos jornais e quem presumia serem
todas mulheres. Ele escolhe três para descrever separadamente. A primeira, Mme Clément,
descrevia os anúncios como “uma encantadora adivinha cuja jovem reputação se equiparava à
de Mlle Lenormand”.
Que ela alegava ter previsto o futuro de Marie­Louise, segunda Imperatriz de Napoleão e de sua
própria queda, isso já sabemos; se assim fosse, ela não poderia ser tão jovem. Ela se
especializou em previsões, por meio de cartas, de desastres grandes e pequenos, vestia manto
preto e capuz vermelho e viveu, segundo o artigo, no andar térreo sob um notário. Infelizmente,
não é dado o seu endereço, mas em 25 de julho, um mês depois da morte de Mlle Lenormand,
Mme Clément reivindicou a sucessão instalando­se no mesmo apartamento térreo na rue de
Tournon, 5, onde a famosa sibila fez suas consultas por muitos anos. Em seu livro, publicado
alguns anos mais tarde, Mlle Lelièvre nos conta como o sobrinho de Mlle Lenormand,
encontrando entre suas coisas, uma carta escrita a ela por Mlle Lelièvre, com bons comentários
acerca do destinatário, escreveu para lhe oferecer uso do apartamento e seu conteúdo; ele
ofereceu, também, convencer os clientes de sua tia a serem transferidos para ela, dizendo que
seria a única capaz de ser sua sucessora. Mlle Lelièvre recusou, sabendo que precisava de mais
estudos e consciente de que nem o apartamento de Mlle Lenormand, nem a sua mobília lhe
concederiam o talento requisitado. De olho em Mme Clément, ela declara que considerariaisso
puro charlatanismo. Evidentemente, o tenente Alexandre Hugo, então, descobriu Mme Clément e
fez­lhe a mesma oferta, que foi prontamente aceita.
As duas outras senhoras descritas pelo Charivari foram Mme Albin e Mme Melchior, ambas tendo
a borra de café como seu oráculo de preferência. Mme Albin era especializada em consultas para
previsão de casamentos, heranças e outros eventos felizes. Mlle Melchior era idosa e dedicava
as manhãs às tarefas domésticas, deixando o fim da tarde para fazer encorajantes previsões por
20 sous a consulta, para sua pobre clientela.
Antes de julho de 1843 terminar, a editora Lange­Lévy publicou La sibylle du XIXe siècle, de
Flamel, já mencionado. Num prefácio, o editor, escrevendo sob o nome de A. Gallus, esclareceu
que, após quarenta e oito horas da morte da sibila, ele recebeu um pequeno caixão de um
remente anônimo. A carta que o acompanhava dizia que, alguns meses antes, Mlle Lenormand,
de quem ele era um amigo próximo, confiou­lhe o caixão, instruindo­lhe a publicar as profecias
manuscritas contida nele após sua morte. Gallus, revelando a crença de que o remetente era um
dos executores testamentários de Mlle Lenormand, explica que publicaria essas grandes
profecias de forma célere. Ele não pondera porque um executor procederia de forma tão
clandestina, nem revela os passos que deu para verificar a autenticidade do manuscrito, mesmo
pela comparação de caligrafia. Ao invés disso, ele convidou Hortensius Flamel, “o célebre autor
de Le Livre rouge”, para escrever um comentário.
A publicação, como um todo, traz os sinais de uma farsa. Flamel pode, possivelmente, ter feito,
ele mesmo, as profecias; mais provavelmente ele pode ter sido colocado como um cúmplice. As
profecias, duas por página, variam em precisão, uma vez que são muito vagas ou muito obscuras
para se provarem erradas. Que o reino se tornaria um Império, pela segunda vez, se provou
correto em poucos anos; que as pessoas viajariam pelo ar demorou mais ainda para se verificar.
Que a Suíça seria invadida por todos os lados e deixaria de existir, em pouco tempo, foi um tiro
fora do alvo; igualmente que a Cruz substituiria o Corão em Constantinopla.
O breve comentário de Flamel é superficial e composto, em grande parte, por generalidades.
“Certas pessoas possuem o poder de prever o futuro, e Mlle Lenormand o tinha em alto nível;
suas previsões eram invariavelmente precisas”. Que comentário mais claro poderia ser feito
sobre profecias já, totalmente, explícitas? Só o último parágrafo do comentário revela um motivo
a mais para a publicação. “Quando ouvimos falar da morte de Mlle Lenormand, nos perguntamos
se uma nova estrela brilharia nos céus proféticos para substituir a que acabara de perecer.
Olhamos e um raio luminoso nos alcançou. Como Arquimedes, o que introduz as ciências
ocultas, eu gritei, “Eureca”. Mme Clément é a nova perita que erguerá, para nós, os véus que
cobrem o futuro”. É de se duvidar que Flamel tivesse o menor interesse no assunto, mas o editor
estava, certamente, interessado em reforçar a alegação de Mme Clément à sucessão. O
comentário de Flamel é seguido por uma biografia de Mlle Lenormand, anônima, que verificamos
ter sido baseada na carta de Alboise de Pujol para o Le Tam­Tam, publicada um mês antes. A
partir dela, ficamos sabendo que ela começava suas consultas perguntando para o consulente
detalhes pessoais, incluindo sua data de nascimento, as iniciais de seu nome de batismo e local
de nascimento, sua cor, animal e flor favoritos e o animal que mais detestava. Também tomamos
ciência das variedades técnicas divinatórias das quais se valia. No meio da biografia, é colocada
uma breve menção a Mme Clément: “Não nos esqueçamos de dizer que já nesse tempo, uma
sibila igualmente famosa, uma estrela dos céus proféticos, proferia seus oráculos e leituras do
futuro. Na Alemanha, Mme Clément previu o futuro de grandeza da Imperatriz Marie­Louise”. A
repetição da frase sobre a nova estrela, sugere que Flamel teve alguma participação na
composição da biografia, que termina com mais um elogio a Mme Clément: “A última sibila não
está morta. Aqui está outra que surge, não menos ilustre, não menos formidável: é a pitonisa de
Delfos, é Mme Clément. Seu tripé está erguido, seu livro do destino, aberto; suas cartas, prontas.
A ela pertence o reino do futuro.”
“Nunca vimos Mme Clément”, continua o autor, “mas ouvimos muito a seu respeito; e o que
ouvimos foi tão extraordinário que seria preciso um volume inteiro para contar… É na caverna da
sibila falecida, na mesma casa onde Mlle Lenormand viveu que a profetisa do momento faz suas
maravilhosas previsões. O passado é de Mlle Lenormand”, conclui seu biógrafo, “o futuro
pertence a essa estrela profética, Mme Clément. Assim com as sibilas, como com os reis: a sibila
morreu, vida longa à sibila”.
Os louvores extravagantes de Mme Clément podem sugerir algum grau de conluio entre o
tenente Hugo e os autores dessa ilegítima obra pós­morte, uma vez que o sucesso de Mme
Clément seria importante para Hugo como beneficiário do aluguel. A suspeita pode ser
equivocada; e a motivação para a vasta promoção de Mme Clément permanece obscura.
Pouco depois, no mesmo ano, foi publicada a biografia de Mlle Lenormand por Francis Girault
plagiada de várias fontes. Girault publicou como apêndice algumas ligações com Alexandre
Hugo. Primeiro, uma carta datada de 22 de julho de Hugo para os editores, Breteau e Pichery,
referindo­se ao livro de Flamel, denunciando as profecias com os mais fortes termos como
“falaciosas” – um julgamento com o qual Du Bois, posteriormente, concordou – e acusando
Breteau e Pichery de publicá­las. Os editores acusados, evidentemente, não viram razão para
resposta, mas Girault respondeu, entregando o manuscrito de sua biografia a Hugo, na rue de
Tournon, 5, negando qualquer responsabilidade pelo livro de Flamel da sua parte ou de Messrs
Breatrau e Pichery. Em sua resposta de 29 de julho, Hugo se desculpou por sua falsa acusação
e aceitou a obra de Girault como a biografia oficial de sua tia.
Mlle. Lenormand na leitura das cartas
Mlle. Lenormand não preparou sucessoras
 
Ilustração e legenda adicionada pelo editor do site Clube do Tarô
A esperança de Mme Clément em se tornar tão famosa quanto Mlle Lenormand foi frustrada e se
Lange­Lévy esperava que ela publicasse, com eles, algum livro que escrevera, frustraram­se
também, por ela tê­los publicado por sua conta. Em 1844 ela produziu um livreto de 64 páginas,
Le Corbeau sanglant, ou l’Avenir dévoilé (“O Corvo Sangrento, ou o Futuro Revelado”). O título
se refere, explica Mme Clément, à técnica divinatória romana de examinar as entranhas de um
corvo. A capa traz o endereço da autora, como própria editora, e como “a casa ocupada por Mlle
Lenormand, rue de Tournon, 5”. O frontispício é uma gravura litografada de Mme Clément, uma
bela senhora usando um cocar de aparência Asteca, do qual seu cabelo cai em cachos. O
método divinatório que explica segue diretamente a tradição de Etteilla, as cartas que usava
sendo as do jeu égyptien ou de Thot (o tarô de Etteilla numerado de 1 ao Louco, com 78 cartas).
Ela afirma ser clara ao explicar seu sistema, mas não consegue. A tiragem é simples: as treze
primeiras cartas são viradas e lidas, então dezenove e, finalmente, vinte e uma. As cartas lidas,
são, a cada momento, devolvidas ao maço que é reembaralhado antes de ser tirado o próximo
conjunto de cartas. É dada uma lista se significados das 78 cartas, baseada em Etteilla, porém,
sem qualquer referência à sua posição invertida. Embora o instrumento seja o baralho de Etteilla,
o coração de Mme Clément está na astrologia. As cartas numeradas do naipe de ouros são
identificadas com símbolos “cabalísticos” dos planetas, a cabeça e cauda do dragão e a parte da
fortuna, aos quais são associadas 12 previsões de acordo com as 12 “casas” (signos) zodiacais
em que estiverem. Mme Clément, volta, na segunda parte do livro, ao que acredita ser mais
interessante para o público, um horóscopo para homens e mulheresde acordo com o mês que
nasceram, seguido de uma descrição de vários temperamentos (fleumático, sanguíneo etc) e de
como ler a personalidade pelas características físicas.
Certamente não há, aqui, uma grande sibila: somente uma praticante inexperiente.
Em 1852, Mme Clément publicou outro livreto, Le Flambeau de l’avenir (“A Tocha do futuro”), do
mesmo tamanho, ainda da rue de Tournon, 5, denominado “a antiga livraria de Mlle Lenormand”.
Abaixo do nome da autora está inscrito algo meio patético: “a sucessora de Mlle Lenormand”. A
mesma gravura de Mme Clément meio borrada, forma o frontispício. É interessante ressaltar que
Mme Clément usa, repetidamente, o termo de Etteilla “cartomancia” e, embora o livro seja
supostamente sobre a técnica de “cartomancia”, não há virtualmente nada nele sobre o uso de
cartas. Tal inconsequência só leva à suspeita de que a pobre senhora não está em seu juízo
perfeito. Sob o “sistema” principal ela diz que se deve, primeiro, perguntar ao consulente para
que se conheçam detalhes pessoais do mesmo como o que gosta e o que não gosta (a prática
atribuída à Mlle Lenormand). Ela passa, imediatamente para o segundo “sistema”, que não é
sistema nenhum além de um discurso confuso sobre a astrologia e as virtudes cardinais,
aludindo às obras do “grande Thot”. Ela termina com citações históricas de previsões acertadas.
Em 1847 havia um livro interessante publicado, fora do meio literário cartomântico: Justifications
des sciences divinatoires (“Justificativas das ciências divinatórias”) por Mlle A. Lelièvre. O
catálogo da Bibliothèque Nacionale apresenta o nome do autor como um pseudônimo de Marc­
François Guillois, mas essa atribuição é, praticamente, um absurdo. Pseudônimos ou supostos
pseudônimos são, para bibliotecários, como atribuições de obras de arte a artistas individuais são
para historiadores da arte: eles os investigam religiosamente, mas, quando não há evidências
sólidas, eles irão se valer do mais inconsistente fundamento para uma identificação. Guillois foi o
autor de textos políticos publicados em 1795, 1797, 1801, 1816 e 1831; não há motivos para que
se suspeite dele como autor de obras sobre artes divinatórias em 1847. Além disso, não é
apenas uma questão de pseudônimo. O livro de Mlle Lelièvre é dedicado à condessa Marie
d’Adhémard com expressões da mais profunda gratidão por sua ajuda e amizade, contendo um
amplo conteúdo autobiográfico, dando nomes a várias pessoas como Monsieur Saint­Prix, que,
em 1830 tomou­a como aluna no Théâtre­Français e tratou­a como uma filha (p.49). O livro seria
completamente inútil se tudo isso fosse fictício, mas o endereço da autora está impresso na
capa, de forma que seria fácil identificar qualquer farsa. Não há motivo para não aceitar Mlle
Lelièvre, como um escritor posteriormente o fez, como uma sibila genuína escrevendo sob seu
próprio nome.
A maior preocupação do livro é recontar como Mlle Lelièvre veio, em 1840, a adotar a profissão
de leitora da sorte. Embora Mme Clément em momento algum seja mencionada, denegrir suas
alegações de ser a sucessora de Mlle Lenormand é, claramente, algo secundário. A autora conta
(p.66) como uma amiga sua pede à Mlle Lenormand para tomar Mlle Lelièvre como sua pupila,
mas Mlle Lenormand responde dizendo que não tem alunos. Entretanto, ela permite que Mlle
Lelièvre tire as cartas em sua presença. Numa nota de rodapé, Mlle Lelièvre diz, “Tenho diante
de mim uma carta tirada por uma certa senhora” – certamente, Mme Clément – “afirmando ser
ela a única discípula de Mlle Lenormand. Ela é, meramente, a única a ter reivindicado o título
com o intuito de enganar as pessoas. Essa senhora não é mais discípula de Lenormand que eu
e, talvez, menos”. Já foi dito como, após a morte de Mlle Lenormand, seu sobrinho ofereceu o
apartamento de sua tia à Mlle Lelièvre e ela rejeitou a proposta. O livro foi reeditado no ano
seguinte com um novo título Prophéties de la nouvelle sibylle. Não é apropriado, uma vez que o
livro não contém profecias, mas é obviamente feito para conter a alegação implícita de ser a
verdadeira sucessora de Mlle Lenormand; ela descreve, ingenuamente, como sonhou que Mlle
Lenormand lhe disse “Você me substituirá e seu nome fará o meu ser esquecido”.
Mlle Lelièvre praticava quiromancia e cartomancia, a última tanto com baralho comum, como com
os tarôs egípcios de Etteilla. Seu livro não contém nenhuma instrução para essas artes, depois
de uma longa seção autobiográfica, ele consiste em uma série de casos falando sobre previsões
bem­sucedidas, efetuadas por várias técnicas divinatórias. A seção de cartomancia repete as
fantasias contidas no livro de Frédéric de la Grange, Le grand livre du destin que foi publicado
dois anos antes sobre a história da arte. Marie Ambruget e Fiasson aparecem na obra, como na
obra de la Grange. Sua história sobre o Duque de Orleans, Mariette e Brivazac, é atribuída a
“memórias secretas”. Mlle Lenormand, estamos seguros disso, tinha o livro de Thot sempre sob
seus olhos; nesse caso, Mlle Lelièvre a imita.
De acordo com Éloïse Mozzani, Mlle Lelièvre morreu em 1849. É muito difícil dizer que tanto ela
quanto Mme Clément provaram ser a real sucessora de Mlle Lenormand. Outas cartomantes
fizeram similares alegações com fundamentos menos consistentes. Mme Lacombe, que morreu
em 1846, trabalhava no número 1 da rue Boucher, estabeleceu­se ocupando o lugar de Mlle
Lenormand, enquanto em 1848, Mme Morel divulgava­se numa publicidade impressa como
“amiga íntima e discípula de Mlle Lenormand”, o que nunca foi. Entretanto, não nos surpreende
que em 1854, Mme Eugénie Bonnejoy Pérignon revelou a escolha de Mlle Lenormand de um
sucessor, concedido após sua morte, e que deveria ser provado que não seria nenhuma das
senhoras que se afirmavam como tal, mas um homem. Ele era Edmond; porém sua história está
reservada para o próximo capítulo.
Mlle Lenormand era, realmente, uma “cartomante”?
Marie­Anne Lenormand constantemente se denominava sibila ou “profetisa” (pythonisse) e
costumava sustentar seus livros em suas visões e profecias. Quando se permitia falar sobre suas
técnicas divinatórias ela evocava um impressionante catálogo de instrumentos mágicos: o
espelho flamejante de Luca Gaurico, as trinta e três varas gregas, a “cabale de 99 de Zoroastre”,
alguns grimórios, uma varinha divinatória, seus preciosos talismãs, o aço électre, as chaves de
Salomão, o anel cigano, a(s) flecha(s) de Abaris, uma lupa mágica etc. As cartas não foram
esquecidas, mas não foram, obviamente, colocadas em primeiro lugar. Tarô, sempre escrito
como tharots, não é frequentemente mencionado. Quando elas o usam, é como os outros
instrumentos, de forma confusa e nebulosa, geralmente, qualificada como “misterioso”, “mágico”
etc., o que lhe permite manter tudo muito vago.
Entretanto, vários relatos – registros policiais e publicações literárias – revelam que ela usava
tarôs e cartas comuns como todos os “tireuses de cartes”. Os documentos que foram usados
para acusá­la em Bruxelas, em 1821, e que ela obsequiosamente reproduz no final do seu
Souvenirs de la Belgique, dizem todos que ela recebia seus clientes com cartas comuns e
tharots, dependendo do que pudessem pagar.
Cartas de jogar usuais no século 19 na Europa
 
Exemplo de cartas de jogar na Europa, durante o século 19, utilizáveis por Mlle. Lenormand.
Ilustração das cartas e legendas adicionadas pelo site Clube do Tarô.
No seu L’hermite de la chaussée d’Antin (Paris, 1813), Victor Étienner Jouy explica como ela
operava: “passado, presente e futuro serão expostos juntos sob seus olhos graças a um simples
baralho. Entretanto, devo dizer que essas cartas são muito maiores que as outras, decoradas
com hieróglifos tarotées em forme d’hiéroglyphes]. A feiticeira as embaralha, meditando de forma
edificante, e as combina através das habilidosas combinações de Etteilla”. Outro relato
inesperado é dado pelo Barão Karl August von Malchus (1770­1840). Embora sendo um
economista e estar longe de acreditar em leitura da sorte, Malchus consultou Marie­Anne

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