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As derivações na Libras Assim como as línguas orais, as línguas de sinais também são objeto de estudo para análises morfológicas que explicam não apenas as classes de palavras que a compõem, como sua estrutura e o processo de formação de seus vocábulos (FERNANDES, 2003; QUADROS; KARNOPP, 2004). Dessa forma, nesta webaula, começaremos compreendendo as derivações na Libras, e, na sequência, veremos as incorporações na Libras e a formação de sinais compostos. Segundo Fernandes (2003), uma das diferenças entre o estudo morfológico da língua portuguesa e da Libras refere-se ao fato de a Libras ser sintética, característica também vislumbrada em línguas como o grego e o latim. Por essa razão, a Libras não possui artigos ou uma ampla lista de preposições e conjunções. Quadros e Karnopp (2004) destacam que uma das maiores funções da morfologia se fundamenta na mudança de classe, ou seja, quando a ideia inerente em uma palavra é projetada em outra classe gramatical como, por exemplo, na derivação de nomes e verbos “fábrica” e “fabrica”, ou com o acréscimo do su�xo “nte” para “fabricante”. Em Libras, a derivação também é um aspecto morfológico frequente e pode ser observado em sinais, como, por exemplo, em CADEIRA e SENTAR, ou CASA e MORAR, ou BANHEIRO e URINAR. Especialistas a�rmam que, durante esse processo de derivação, os sinais são muito semelhantes e podem ser confundidos, mas que o grande diferencial consiste no padrão do movimento, isto é, o movimento dos substantivos é curto e repetido ao passo que o movimento dos verbos é mais longo (QUADROS; KARNOPP, 2004; QUADROS; PIMENTA, 2008; CHOI et al., 2011). Sinal da Libras para CADEIRA Fonte: elaborada pelo autor. Libras – Língua Brasileira de Sinais Morfologia da Libras Você sabia que seu material didático é interativo e multimídia? Isso signi�ca que você pode interagir com o conteúdo de diversas formas, a qualquer hora e lugar. Na versão impressa, porém, alguns conteúdos interativos �cam desabilitados. Por essa razão, �que atento: sempre que possível, opte pela versão digital. Bons estudos! A formação de sinais compostos A composição integra a morfologia da língua portuguesa e pode ser testemunhada em palavras como “ciclovia” e “aguardente”. Linguisticamente, Quadros e Karnopp (2004) descrevem que a composição ocorre quando uma base se une à outra, e então pode ser um substantivo acrescido a outro substantivo, como em “sofá-cama”, “peixe- espada” e “couve-�or”; ou um substantivo somado a um adjetivo, como em “obra-prima”, “erva-doce” e “amor- perfeito”; ou da junção de um verbo com um substantivo, por exemplo, em “guarda-chuva”, “cata-vento” e “vira- lata”. De maneira semelhante, em Libras nos deparamos com os substantivos compostos, ou, como são conhecidos, “sinais compostos”. Exemplos desses são os sinais para PÁGINA, que se estruturam com a união dos sinais LIVRO e NÚMERO, ou ESCOLA, composto pelos sinais CASA e ESTUDAR. O mesmo pode ser conferido nos sinais de ANIMAIS, resultado da junção dos sinais LEÃO e VÁRI@S, ou FRUTAS, composto dos sinais MAÇÃ e VÁRI@S. Sinal da Libras para PÁGINA (LIVRO+NÚMERO) Fonte: elaborada pelo autor. De acordo com Quadros e Karnopp (2004, p. 106) “tanto no português quanto na língua de sinais brasileira, o distanciamento do signi�cado do todo e o signi�cado das partes é normal nas formas compostas pela própria função da nomeação”; logo, com a junção de duas partes é possível que se obtenha como resultados novos conceitos muito diferentes das partes que os formaram, sobretudo se lidarem com a composição metafórica, como, por exemplo, em língua portuguesa ocorre nos compostos pé de moleque ou olho de sogra, que não têm nenhuma relação com as partes do corpo humano. As incorporações na Libras Outro objeto de estudo da morfologia da Libras e que também propicia a criação de novos sinais diz respeito à incorporação de argumento, de numeral e de negação. Na incorporação de argumento, o verbo se adapta ao objeto que sofre a ação, projetando sobre o sinal suas características visuais e espaciais (CHOI et al., 2011). Logo, o sinal de ABRIR, por exemplo, não é localizado em Libras sem que se aplique a um objeto ao qual ele possa incorporar suas características, tal como em ABRIR (um evento), ABRIR (a porta), ABRIR (a lata de refrigerante) ou ABRIR (o livro). Sinal da Libras para ABRIR (um evento) Fonte: elaborada pelo autor. Por sua vez, a incorporação de numeral é frequentemente marcada com a alteração da con�guração de mão, mantendo parâmetros como localização, movimento, orientação das palmas e expressões não manuais. Nesse caso, a con�guração de mão se altera no formato do número representado, por exemplo, em UMA-HORA, DUAS- HORAS, TRÊS-HORAS ou QUATRO-HORAS, em que uma das mãos carrega o signi�cado do numeral. Sinal da Libras para UMA-HORA Fonte: elaborada pelo autor. Em geral, a incorporação de numeral é utilizada apenas até o número quatro, aplicada em sinais, como, por exemplo, DIAS, MESES e ANOS. A partir do cinco, Quadros e Karnopp (2004) descrevem que os usuários nativos da Libras tendem a utilizar, por exemplo, em CINCO-HORAS o numeral CINCO, acrescido do sinal de HORA no singular. Mas nem sempre os morfemas estarão presos à con�guração de mão de um numeral explicitamente marcada e serão aplicadas aos termos relacionados. Esse é o caso do sinal de ANTEONTEM, que deriva do sinal de ONTEM, com a pequena distinção da con�guração de mão, mas totalmente diferentes do sinal de HOJE e AMANHÃ. Sinal da Libras para ANTEONTEM Fonte: elaborada pelo autor. A incorporação de negação também é um fenômeno recorrente em Libras. Nesse sentido, a negação pode ser indicada a partir da alteração do movimento do sinal, direcionando-o para fora, como ocorre nos sinais GOSTAR e NÃO-GOSTAR, ou QUERER e NÃO-QUERER, ou SABER e NÃO-SABER. Sinal da Libras para GOSTAR Fonte: elaborada pelo autor. Há ainda os sinais que incorporam a negativa usando apenas o meneio da cabeça de um lado para o outro, agregado a uma expressão negativa, como nos casos dos sinais ENTENDER e NÃO-ENTENDER ou CONHECER e NÃO CONHECER. Em outras situações, a forma negativa pode se distinguir da forma positiva com a alteração do movimento e da localização, como em TER e NÃO-TER, ou alterando vários parâmetros, como em PODER e NÃO-PODER. Uma outra forma de incorporar a negação ao sinal é o acréscimo do sinal “NÃO”, feito com o dedo indicador e com a expressão facial negativa. 1x Nesta webaula, o aprendizado sobre os estudos morfológicos da Libras colaborou para a compreensão da Libras como um sistema linguístico independente e autônomo, com organização e características próprias. Nesse sentido, enquanto língua natural, a Libras se assemelha à língua portuguesa, pois é passiva de análise e descrição linguística, além de ambas pertencerem à comunidade brasileira.
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