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CBCE Políticas públicas de esporte e lazer

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revista brasileira de
CIÊNCIAS DO ESPORTE
Campinas, v. 24, n. 3, p. 7-210, maio 2003
ISSN 0101-3289
ISSN 0101-3289
REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS DO ESPORTE
Campinas, v. 24, n. 3, p. 7-210, maio 2003
INFORMAÇÕES
www.cbce.org.br
Revista Brasileira de Ciências do Esporte (ISSN 0101-3289) é uma publicação oficial do Colégio
Brasileiro de Ciências do Esporte (CBCE), com periodicidade quadrimestral, editada pelo CBCE e
pela editora Autores Associados. Indexada: Sibradid, Sportsearch, Sport Discus, Ulrich’s International
Periodicals, Catálogo Coletivo Nacional de Publicações Seriadas (CCN).
EDITORIA
SE – CBCE – ES
EDITOR EXECUTIVO
Amarílio Ferreira Neto
APOIO AO EDITOR
Ana Claudia Silverio Nascimento
CONSELHO EDITORIAL
Dr. Antonio Carlos Bramante-Unicamp
Dra. Celi Nelza Zülke Taffarel-UFBA
Dr. Dartagnan Pinto Guedes-UEL
Dr. Eduardo Kokubun-Unesp
Dr. Elenor Kunz-UFSC
Dr. Go Tani-USP
Dr. Valter Bracht-Ufes
Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 7-210, maio 2003
E-MAIL DO EDITOR
 afneto@starmedia.com
 amarilio.neto@bol.com.br
CONSULTORES
 Sócios pesquisadores doutores do CBCE
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
 Dulce Inês L. dos S. Augusto
 dulce@fef.unicamp.br
APOIO FINANCEIRO
CO-EDIÇÃO
 CBCE-Editora Autores Associados
REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS DO ESPORTE
ISSN 0101-3289
REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS DO ESPORTE
Campinas, v. 24, n. 3, p. 7-210, maio 2003
Temática
Políticas Públicas em Educação Física,
Esporte e Lazer
Uma editora educativa a serviço da cultura brasileira
Av. Albino J. B. de Oliveira, 901 – CEP 13085-510
Campinas - SP – Pabx/Fax: (19) 3289-5930
e-mail: editora@autoresassociados.com.br
Catálogo on-line: www.autoresassociados.com.br
Conselho Editorial “Prof. Casemiro dos Reis Filho”
Dermeval Saviani
Gilberta S. de M. Jannuzzi
Maria Aparecida Motta
Walter E. Garcia
Diretor Executivo
Flávio Baldy dos Reis
Diretora Editorial
Gilberta S. de M. Jannuzzi
Coordenadora Editorial
Érica Bombardi
Assistente Editorial
Aline Marques
REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS DO ESPORTE, Campinas, Colégio
 Brasileiro de Ciências do Esporte, 1979.
 Quadrimestral
 ISSN 0101-3289
 Co-Edição: Autores Associados
 Políticas Públicas em Educação
 Física, Esporte e Lazer
CDD. 613.7
796
Diagramação e Composição
Ednilson Tristão
Revisão
Daniela Lellis Gonçalves
Cleide Salme Ferreira
Erika G. de F. e Silva
Capa
Criação e leiaute a partir de pintura de Marcello
Guasti, Renaioli al lavoro, 1953-54
Milton José de Almeida
Arte-final
Érica Bombardi
Impressão e Acabamento
Gráfica Paym
COMERCIALIZAÇÃO E ASSINATURA
Editora Autores Associados Ltda.
Av. Albino J. B. de Oliveira, 901 – Campinas - SP
CEP 13085-510 – Pabx/Fax: (19) 3289-5930
e-mail: editora@autoresassociados.com.br
Catálogo on-line: www.autoresassociados.com.br
SUMÁRIO
EDITORIAL 7
[Editorial]
ARTIGOS ORIGINAIS
[Articles]
POLÍTICA DO CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA: LIMITES E PERSPECTIVAS 9
[Politics of the federal council of physical education: limits and perspectives]
Renato Sampaio Sadi
O ESPAÇO NA CONSTRUÇÃO DE UMA POLÍTICA DE LAZER – ESTUDANDO
SOROCABA/SP 23
[The space in the construction of a leisure policy – studing Sorocaba city]
Elcie Helena Costa Rodrigues e Antonio Carlos Bramante
POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA, ESPORTE E LAZER: TENSÕES E DESAFIOS
DE UM PROJETO CONTRA-HEGEMÔNICO NO DISTRITO FEDERAL, 1995 – 1998 39
[Public policy on physical education, sport and leisure: tensions and challenges of a project against
ruling class of the capital city, 1995 – 1998]
Roberto Liáo Junior
A EDUCAÇÃO FÍSICA NO CONTEXTO DA POLÍTICA DE EDUCAÇÃO MUNICIPAL:
ANALISANDO A EXPERIÊNCIA DO MUNICÍPIO DE CAMARAGIBE-PE 53
[Physical education in the context of a municipal education policy: reviewing the experience of
Camaragibe (PE) municipality]
Ana Lúcia Felix dos Santos
A NOVA POLÍTICA PARA O ENSINO MÉDIO: UM ESTUDO DA EDUCAÇÃO FÍSICA
A PARTIR DAS NOVAS DIRETRIZES E DOS NOVOS PROJETOS PEDAGÓGICOS 71
[The new politics for the high school education: a physical education study from the new
guidelines and the new pedagogical projects]
Carmem Elisa Henn Brandl
A POLÍTICA DE ESPORTE ESCOLAR NO BRASIL: A PSEUDOVALORIZAÇÃO DA
EDUCAÇÃO FÍSICA 87
[The school sports policy in Brazil: the pseudovaluation of the physical education]
Valter Bracht e Felipe Quintão de Almeida
REFLEXÕES ACERCA DAS POLÍTICAS DE PROMOÇÃO DE ATIVIDADE FÍSICA E SAÚDE:
UMA QUESTÃO HISTÓRICA 103
[Some thoughts on the promotion of physical activity and health: a historical approach]
Leandro Nogueira e Alexandre Palma
O PEDAÇO SITIADO: CIDADE, CULTURA E LAZER EM TEMPOS DE GLOBALIZAÇÃO 121
[The pedaço besieged: city, culture and leisure in the globalization time]
Fernando Mascarenhas
ESPORTE ENTRE OS ÍNDIOS KADIWÉU 145
[Sport in Kadiwéu indians]
Marina Vinha e Maria Beatriz Rocha Ferreira
A GINÁSTICA NO PERCURSO ESCOLAR DOS INGRESSANTES DOS CURSOS DE
LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO FÍSICA DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ
E DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS 159
[The gymnastic in the previous school history of the physical education course freshman students
in the State University of Maringá and State University of Campinas]
Ieda Parra Barbosa Rinaldi e Elizabeth Paoliello Machado de Souza
A GINÁSTICA ARTÍSTICA NO BRASIL: REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO PROFISSIONAL 175
[Coaching education and artistic gymnastics in Brazil: reflecting over the professional preparation]
Myrian Nunomura e Vilma Leni Nista-Piccolo
UM OLHAR ACERCA DA PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NA ÁREA DA CIÊNCIA 195
DO ESPORTE: TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS
[An approach on knowledge production in sport science: tendencies and perspectives]
Antonia Dalla Pria Bankoff et al.
NORMAS PARA PUBLICAÇÃO 209
[Rules for publication]
7Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 7-8, maio 2003
EDITORIAL
Optar por fazer e manter um periódico científico com número temático não
é compromisso fácil de ser consolidado. Já se vão cerca de 15 anos das primeiras
iniciativas temáticas no âmbito da Revista Brasileira de Ciências do Esporte (RBCE).
Os sucessos e os insucessos desse processo podem ser flagrados com precisão no
que está impresso, especialmente na qualidade datada de cada número temático
veiculado, bem como nos editoriais quando não foi possível viabilizar diversos nú-
meros temáticos, geralmente por falta de produção.
Como se sabe, os números temáticos na Revista antecedem aos grupos de
trabalhos temáticos (GTTs) no interior do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte
(CBCE) e deveriam em tese representar, atualmente, no conjunto das ações im-
plantadas pela entidade, mais uma contribuição para a consolidação da RBCE como
periódico científico de maior expressão do Brasil, conforme Qualis Capes – 2001,
como também fortalecer os GTTs já existentes e colaborar no estímulo à criação de
outros. Deve-se estar atento, sempre, para temáticas relevantes/estratégicas ao
avanço do conhecimento da área com repercussão na formação e consolidação de
novos campos de pesquisa.
Mas qual é a configuração efetivada de números temáticos pela RBCE? Po-
dem ser identificadas três formas básicas de editoração: a) definir a temática e coor-
denador do número que tem a função de articular as colaborações (exemplo: O
que é deficiência?; Lazer como tema e CBCE: 10 anos – A educação física face a
nova LDB); b) definir temática e aguardar demanda espontânea com o processo
coordenado pelo editor (exemplo: O que é motricidade humana?; O dirigente
desportivo; Educação física: ensino; Aprendizagem motora; Atividade física e saúde;
currículo; metodologia); e c) definir temática, possibilitar indução de colaboração e
demanda espontânea, cumprir os critérios dos indexadores e agências avaliadoras
de periódicos (exemplo: Epistemologia e educação física; Saúde e qualidade de
vida; Formação profissional docente e prática educativa em educação física; As Car-
8 Rev.Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 7-8, maio 2003
tas Brasileiras de Educação Física; Educação Física Escolar; Atividade Física e Enve-
lhecimento; Bases Biológicas da Educação Física e Esporte; Pós-graduação em Edu-
cação Física).
Pode-se afirmar, pelo que foi impresso na RBCE, após a criação dos GTTs
(1997) e a desejável contribuição mútua entre tais mecanismos de disseminação do
conhecimento da área acadêmica da educação física, que a produção científica
divulgada no âmbito dos GTTs, apenas, minoritariamente tem sido encaminhada
para análise e possível publicação na RBCE. Esse fato incontestável requer uma
detida discussão acerca da atual política científica ou, melhor dizendo, da maneira
como vêm sendo estabelecidos os GTTs e suas práticas no interior do CBCE. É
inevitável a aplicação de maior rigor na definição das temáticas da RBCE, uma vez
que sua consolidação como periódico de referência depende em grande medida
desse processo que envolve necessariamente a comunidade científica qualificada
pela formação acadêmica, pela experiência de pesquisa, pelo conhecimento cir-
cunstanciado das vicissitudes da área. Tudo isso tem como eixo a especificidade e as
lutas históricas submetidas à crítica e autocrítica que os novos tempos político-aca-
dêmicos exigem.
Mais uma evidência desse processo possível é este número sobre Políticas
Públicas em Educação Física, Esporte e Lazer. Inicialmente, essa temática foi previs-
ta para maio de 2001, mas não tivemos sequer material para análise. Resolveu-se,
então, pela relevância do tema, fazer nova investida, o que viabilizou o recebimen-
to de 19 artigos referentes à temática. Desses artigos, oito foram aprovados. A fim
de completar o exemplar, recorreu-se a quatro artigos, igualmente aprovados, oriun-
dos da demanda não temática. Essa saída tem sido a regra na prática impressa dos
números temáticos nos últimos 15 anos, com acentuada melhoria de qualidade do
processo de feitura da RBCE.
Assim, neste número, indicou-se o processo e o resultado que deve, agora, ser
lido, criticado, autocriticado... enfim, prima-se aqui pela busca incessante da melhor
qualidade possível das práticas da comunidade científica na consolidação da RBCE e
dos GTTs do CBCE.
Amarílio Ferreira Neto
Editor da RBCE
9Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 9-22, maio 2003
POLÍTICA DO CONSELHO FEDERAL DE
EDUCAÇÃO FÍSICA: LIMITES E PERSPECTIVAS
Dr. RENATO SAMPAIO SADI
Faculdade de Educação Física – Universidade Federal de Goiás - UFG
E-mail: renatoejoana@bol.com.br
RESUMO
O presente artigo é parte integrante do projeto de pesquisa, Educação Física, Trabalho e
Profissão iniciado em 2002, na FEF–UFG. O estudo objetiva a discussão e revisão da política
conduzida pelo Conselho Federal de Educação Física. Utilizando-se de referenciais teóricos
que problematizam categorias como trabalho, profissão, experiência, inclusão /exclusão, com-
petência e empregabilidade, a investigação apresenta a legislação pertinente à temática da
regulamentação da profissão educação física e as relações com a política do Conselho Profis-
sional de Educação Física. Analisa os discursos, mudanças e ajustes políticos, propaganda,
formação e intenções de projeto. Os resultados sugerem a retomada do debate acadêmico /
político sobre intervenção profissional.
PALAVRAS-CHAVE: Política; trabalho; profissão; experiência; regulamentação da profissão de
educação física.
10 Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 9-22, maio 2003
INTRODUÇÃO
A política de um Conselho Profissional, nem sempre visível aos olhos da socieda-
de, muitas vezes mal compreendida pelos próprios agentes envolvidos, indica elementos
para a análise das ações e do discurso do processo político conduzido e, conseqüente-
mente, retoma o debate sobre o papel do polêmico Conselho Federal de Educação
Física – Confef ou Sistema Confef/Cref e a lei n. 9.696/98 que o criou.
A teoria existente sobre o assunto, após denunciar os problemas da nova configu-
ração da educação física brasileira, necessita pesquisar os determinantes da categoria
trabalho, implicados na profissão recém-constituída. Isso se justifica pelo fato de que um
novo rumo, no campo das políticas sociais, se apresenta com a chegada de Luiz Inácio
Lula da Silva à presidência da República. Afinal, é possível democratizar educação física e
esporte em nosso país? Quem tem legitimidade para isso? Quais serão as relações
políticas do Conselho Federal de Educação Física com o governo Lula?
Para responder tais questões a política do Conselho Federal de Educação Física
precisa ser investigada. Este texto tem como objetivo: extrair as principais características
do conturbado processo de regulamentação do profissional de educação física, recupe-
rando a recente história que polarizou e dividiu a área; decifrar a retórica do público/
privado apoiando-se nos documentos socializados pelo Conselho; (re)elaborar a crítica,
dotando-a de fundamentação teórica e apontando os reais contornos entre limites e
perspectivas na política do Conselho; contribuir para a retomada do debate sobre o papel
do Sistema Confef/Cref na educação física brasileira.
PRESSUPOSTOS TEÓRICOS
A intervenção profissional da educação física, na visão expressa por este estudo,
deve ser subsidiada por dois eixos de fundamentação: de um lado, pela discussão sobre
a categoria trabalho, as formações no, pelo e do trabalho, bem como as implicações do
mundo do trabalho, mercado de trabalho, emprego e desemprego; de outro, pelo
conceito de profissão como suporte complementar.
De fato, o que mais chamou atenção da sociedade (e do parlamento que aprovou
a lei) foi o perigo representado por leigos que, em tese, seriam os responsáveis por danos
na saúde coletiva, após exercícios físicos mal orientados (cf. Sautchuk, 2002, p. 179).
Todavia, as críticas construídas contra tal argumentação reforçaram a perspectiva de expe-
riência nas várias atividades pertinentes à educação física, nas quais os trabalhadores
(professores) e a comunidade que participa precisam ser respeitados.
Historicamente constituído por objetivações humanas, o conceito de experiência
acumulou, através do ser social, as relações naturais dos objetos para os homens e, inver-
samente, dos homens para os objetos. Assim, a experiência é necessariamente uma cons-
11Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 9-22, maio 2003
trução social adquirida e herdada da humanidade. Uma riqueza da essência humana, dos
sentidos humanos e práticos como a vontade, o amor, o cheirar, o ouvir etc. A formação
dos sentidos humanos é, portanto, histórica e o conceito de experiência, uma das chaves
teóricas para a compreensão das mudanças no mundo do trabalho. (cf. Marx, 1974, p. 19).
Diferente do conceito de experiência profissional, baseado no livre jogo do mer-
cado, a experiência das ocupações, ofícios, atividades e profissões, isto é, do trabalho
como relação social, implica objetivações humanas não consolidadas. Nesse sentido é a
prática que fornece os principais elementos de intervenção profissional para a busca da
teoria, e não o contrário. Na prática, os sujeitos apropriam-se dos possíveis projetos para
sua emancipação; articulam os saberes da cultura; manipulam os fazeres adquiridos pelas
velhas gerações, tanto espontaneamente como em forma de luta social; registram mo-
dos de operar e refletir. Ao se confundir com o trabalho, a experiência evidencia seu
estágio de desenvolvimento da humanidade, isto é, os homens são o que são por
participarem como trabalho do processo civilizatório de seu tempo, sendo a solução dos
obstáculos somente possível com a enérgica força da prática.
Uma outra argumentação para fundamentar a análise da política do Sistema Confef/
Cref são as novas esferas de atuação da educação física. Espaços não ocupados pelo
capital que podem ser aproveitados mediante a invasão/exploração, num primeiro mo-
mento com baixa concorrência, o que permite não só obter altas taxas de retorno
econômico como também formar novas atitudes,novas necessidades e desejos (cf.
Fernández Enguita, 1993, p. 273).
A síntese de tal problemática é a recombinação de duas estratégias de extração de
valor: a mais-valia absoluta, apoiada na extensão da jornada de trabalho, e a mais-valia
relativa, sustentada pela intensificação da produtividade. Soma-se a tais explicações a
possibilidade concreta de expansão do capitalismo hoje, ainda que problemas financeiros
se apresentem no projeto do neoliberalismo. O que se verifica é a busca de renovação/
oxigenação do desenvolvimento através de novos espaços, isto é, através da exploração
de novas esferas de produção e consumo (cf. Harvey, 1989, p. 174)1.
As considerações que se seguem sobre a política do Sistema Confef/Cref indi-
cam, no processo em curso, os registros factuais e a crítica como método de análise.
1. A expansão do mercado de atividade física e saúde é divulgada pelo Sistema Confef/Cref que
enfatiza e promove o crescimento/desenvolvimento de academias de ginástica, como por
exemplo o 1 Encontro de Proprietários de Academias, realizado no Rio de Janeiro em julho de
2002. Registra-se ainda um aumento no número de convenções de fitness, cursos de nutrição
aplicada ao alto rendimento, mergulho, personal training e novas modalidades de hidroginástica
e musculação (Programas Nacionais de Extensão Universitária – Universidade Gama Filho,
UGF e Universidade das Faculdades Metropolitanas Unidas, UniFMU, todos com a marca do
Conselho Federal e Regionais de Educação Física. Informe Phorte, www.phorte.com).
12 Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 9-22, maio 2003
Indiretamente, apontam também as possibilidades concretas da área em promover mu-
danças, gerar novos conhecimentos, (re)elaborar sua política interna e influir nas decisões
maiores da política educacional. (cf. Sadi, 2002, p. 19).
POLÍTICA DO CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA
Desde que a lei n. 9.696/98 foi promulgada, (concedendo ao conselho federal e
regionais de educação física poderes para a definição de rumos normativos, legislativos,
administrativos e, indiretamente, de formação), a área convive com um campo de contra-
dições, que, se de um lado a obriga participar de inúmeros debates sobre o papel social
de educação física, de outro, a fragmenta e sufoca com as restrições estabelecidas pelo
formato imposto a partir desta nova ordenação profissional.
Para além do sentido arbitrário do Sistema Confef/Cref, que como qualquer
Conselho Profissional se resguarda na reserva de mercado, há que se evidenciar a
generalidade da lei n. 9.696/98, isto é, seu caráter difuso e confuso, contido em apenas
seis artigos.
A regulamentação profissional de diversas áreas está presente na legislação que
criou seus conselhos profissionais. Assim, foram constituídas, por exemplo, as seguintes
profissões regulamentadas: farmácia (lei n. 3.820/60 – 40 artigos), engenharia, arquite-
tura e agronomia (lei n. 5.194/66 – 93 artigos), medicina veterinária (lei n. 5.517/68 –
43 artigos), fisioterapia e terapia ocupacional (lei n. 6.316/75 – 25 artigos), nutrição (lei
n. 6.583/78 – 29 artigos), serviço social (lei n. 8.662/93 – 21 artigos) e advocacia
(estatuto-lei n. 8.906/94 – 158 artigos).
A abrangência da lei n. 9.696/98, comprovada pela inexpressiva quantidade de
artigos, ainda esbarra na amplitude do conceito de atividade física, imputando a este toda
e qualquer atividade contida numa suposta educação física generalizada, isto é, socializada
na população brasileira.
Nesta lógica, tudo passa a ser educação física. As tradições culturais da capoeira,
das lutas e artes marciais, da dança e da ioga tendem a ser submetidas à fiscalização dos
conselhos de educação física, pois o entendimento é de que tais atividades, dominante-
mente, são compostas de exercícios físicos conduzidos por intervenção pedagógica2.
2. A justificativa do projeto de lei n. 4.680/01 (regulamentação das atividades profissionais de ioga,
criação dos conselhos federal e regionais de ioga) após abordar o processo histórico e multimilenar
da filosofia da Índia, introduzida no Brasil há mais de 50 anos, destacando sua importância nos
cursos de extensão universitária, desde a década de 1970 é clara: “Não pode o Yôga ficar
sujeito aos órgãos fiscalizadores de educação física, como propõem alguns, pelas profundas
diferenças entre essas duas profissões”. Ver também projeto de lei n. 3.559/00, que propõe
uma alteração na n. lei 9.696/98, visando excluir do registro e da fiscalização dos conselhos
13Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 9-22, maio 2003
O sentido abrangente e genérico da lei, que em sua época não previu as atribui-
ções próprias dos profissionais de educação física, na verdade, reforçou/aprofundou
uma distinção (já existente) entre professor e profissional de educação física. Tal polariza-
ção restringe o primeiro às atividades de docência e o segundo, à perspectiva liberal de
profissão.
As ações do Conselho Federal de Educação Física são balizadas pela seguinte pla-
taforma política: 1 – exclusão dos chamados leigos pela equivocada compreensão de que
o conhecimento científico não advém da experiência, promoção de obstáculos às artes e
à cultura; 2 – elitização da educação física em atividades individualizadas e o conseqüente
abandono das práticas de experiência coletiva acumulada na escola e na comunidade; 3 –
(re)conceituação do objeto de estudo e intervenção profissional, denominado educação
física; 4 – configuração de um novo espaço institucional, virgem e potente para a explora-
ção mercantil, baseado na obtenção de credencial conferida pelo Conselho3.
O trabalhador é convocado para assumir o papel de profissional liberal, de iniciativa
privada; a experiência é transformada em competência para a empregabilidade, isto é, para
o manter-se no mercado. O caráter reducionista de competência, ou seja, o agir com efi-
ciência, é metamorfoseado pelo processo atual de qualificação para o trabalho. Assim,
amplia-se a idéia de competência, agregando a ela os seguintes fatores: domínio de lingua-
gens; compreensão de fenômenos; enfrentamento de situações-problema; construção de
argumentação; elaboração de propostas. Esta aparente ampliação indica que a flexibilidade
apregoada se refere a um horizonte instrumental e, na melhor das hipóteses, dentro de uma
conformada educação técnica de resultados (cf. David, 2002, p. 124).
Descarta-se, portanto, a experiência como aglutinadora dos saberes historica-
mente acumulados e impõe-se, como necessidade fundamental, um saber científico e
ético preparado para o consumo. Tal saber é composto pela articulação de saberes
próprios da subárea – atividade física e saúde, desprezando-se os demais componentes
do saber próprio da educação física como área das ciências humanas ou ciências da
educação.
de educação física as tradições culturais, mestres, instrutores e monitores de iniciação e especi-
alização desportiva e professores do ensino formal.
3. Na área da dança, o Conselho Federal de Educação Física sofreu as seguintes derrotas: recusa
ao projeto de lei n. 2.939/00, que previa a dança vinculada e submetida ao Sistema Confef/
Cref; intensa mobilização dos trabalhadores em dança – sindicatos de dança e fóruns amplia-
dos de dança; parecer do Ministério Público de São Paulo, n. 88/02, que confirma o artista,
bailarino ou dançarino, baseado na lei n. 6.533/78, como apto a ministrar aulas de dança em
academias ou escolas de dança. Outras derrotas como a ação do Ministério Público Federal
pedindo o fechamento do Conselho Regional de Educação Física – Cref 1, (ver em Renan
Almeida, 2002).
14 Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 9-22, maio 2003
As provas contundentes de que o Sistema Confef/Cref está interessado em
abarcar um maior número de associados de qualquer maneira e em qualquer tempo
foram apresentadas à comunidade científica da área no transcorrer do ano letivo de
2002. Mesmo em período anterior (2000/2001) é possível estabelecer a política de
ingerência do Conselho Federal de EducaçãoFísica em questões de formação: nos dois
encontros de dirigentes de cursos de educação física, realizados em Belo Horizonte
(2000) e Rio de Janeiro (2002) e nas semelhanças de redação (e conteúdo) entre a
resolução n. 046/02 (Confef) e o parecer n. 0138/02 (Conselho Nacional de Educa-
ção). O que se objetiva com isso? Avançar sobre o espaço escolar e não-escolar,
desenvolvê-los e devolvê-los ao público/privado com a marca da renovação democrá-
tica e ética daqueles que nos novos tempos desejam se ver livres do carimbo opressor
que outrora lhes era latente.
O processo de ajuste político perseguido bem como a busca de fundamentação
e apoios são relatados nas justificativas do Documento de Intervenção Profissional, que
foi deliberado na plenária do Confef em 16 de dezembro de 2001 e transformado na
resolução n. 046/02.
Desde a criação do Confef buscou-se identificar, junto à comunidade acadêmica, cien-
tífica, intelectual e profissional, quais as intervenções e atuações conjunturais específicas
para o Profissional de Educação Física. Possuíamos a convicção de que, primeiramente
deveria ser definido o Código de Ética Profissional e elaborada a Carta Brasileira de
Educação Física [...] No ano de 2001, o Plenário do Confef designou uma Comissão
Especial para estudar a questão da Intervenção Profissional [...] A construção do
Documento de Intervenção Profissional tornou-se imprescindível, à medida que o
Conselho Nacional de Educação – CNE, aponta com novos rumos através das Dire-
trizes Curriculares que, inclusive, repercutirão na formação dos Profissionais de Educa-
ção Física. Impossível estabelecer uma formação fundamentada nos princípios de qua-
lidade, competência e ética, sem a Identificação para qual Intervenção Profissional se
destina essa preparação.
Uma vez que a realidade não pode ser produto único do pensamento, mas
síntese contraditória e complexa de múltiplas determinações, a política conduzida pelo
Conselho Federal de Educação Física vem sofrendo ajustes conforme se sedimenta
o processo de regulamentação profissional. Num primeiro momento, baseou-se na
opressão, ameaça e repressão aos contrários à sua ideologia. Intimidou estudantes e
professores com a obrigatoriedade do registro profissional, cooptou dirigentes e di-
retores de faculdades de educação física, impôs sua plataforma política pela força da
lei. Já num segundo e atual momento, vive uma espécie de manutenção de suas es-
truturas, conseguidas por uma política de contenção que é baseada em legislação
restritiva, arbitrária e de exclusão, que inibe a consolidação de avanços progressistas
15Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 9-22, maio 2003
na área (embora com nova roupagem) e, de certa forma, paralisa o pensamento
crítico4.
Mudanças políticas, todavia, não significam alteração dos rumos do projeto políti-
co. Estes mantêm-se intactos, pois a sobrevivência do Conselho implica adesões e
filiações. Em 1999, o Conselho editou vinte portarias nomeando mobilizadores para as
diversas regiões do país. Nos dois anos seguintes, consolidou tal iniciativa, registrando a
nomeação dos membros efetivos e suplentes e divulgando o nome de todos os profis-
sionais filiados. Em 2002, (re)orientando sua política, na tentativa de equiparar a profissão
no conjunto de profissões regulamentadas, dotando-a de potencial democrático, o Con-
selho participou das seguintes movimentações: 1 – elaboração final do Código de Ética;
2 – elaboração e divulgação do documento de Intervenção Profissional; 3 – participação
no Conselho Nacional de Esporte e na Câmara Setorial de Esporte; 4 – nova Classifica-
ção Brasileira de Ocupações, CBO; 5 – promoção da educação física escolar com
campanhas de filiação em massa5.
REGULAMENTAÇÃO PROFISSIONAL E RECONHECIMENTO DA PROFISSÃO
O discurso sobre a defesa da sociedade alia-se ao discurso das oportunidades e
benefícios do profissional que se registrar. O Conselho Federal de Educação Física tenta
persuadir os futuros formandos através da idéia de que sua profissão será repleta de gló-
rias, pois uma nova fase inaugura-se para a educação física brasileira, a da consolidação de
uma trabalho que já deu bons resultados. A obrigação ao registro com o respaldo da so-
ciedade pelo reconhecimento da profissão é uma bandeira viva do Conselho, que atrai
adeptos e defensores, de um lado, pela força do argumento, de outro, pelo argumento
da força6.
4. Os cursos de capacitação, extensão e pós-graduação, chancelados pelo Conselho, procuram
definir um perfil liberal perseguido pela possibilidade de status e melhores vencimentos. São
propagandeados na Revista Enbrac – Encontro Brasil de Atividades Corporais, jornais dos
Conselhos Regionais de Educação Física e Informe Phorte. Insere-se nesta perspectiva o Curso
para Práticos (resolução n. 030/00 – Sistema Confef/Cref) com carga horária mínima de 200
horas de atividade e a inscrição de não-graduados em educação física, na categoria de provisionado
(resolução n. 045/02).
5. Por ocasião do dia do profissional de educação física (1o de setembro) no ano de 2002, o Cref –
7 enviou aos professores do ensino estadual (GO) um convite de filiação, denominado Carta aos
Profissionais de Educação Física de Goiás, um pacote com documentos do Sistema Confef/Cref,
contendo ficha de filiação, revista, Carta Brasileira de Educação Física e Código de Ética.
6. A autonomia profissional não pode ser violada, isto é, ninguém pode ser impedido de exercer
seu trabalho. O inciso XIII do artigo 5º e o parágrafo único do artigo 170 da Constituição
estabelecem o princípio básico da liberdade de exercício de qualquer atividade profissional ou
econômica, desde que lícita. A regulamentação profissional significa restringir o acesso ao
16 Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 9-22, maio 2003
A complexidade da área expressa nas oportunidades de trabalho bem como o
reconhecimento da profissão são aspectos a serem agregados à exclusividade propugnada.
A nova postura ética, na pretensão de contribuir para a transformação das estruturas
injustas da sociedade, apóia-se nos princípios do direito do cidadão à prática esportiva
formal e informal, expressa no artigo 217 da Constituição e na lei n. 9.615/98 – Orga-
nização Geral do Esporte (cf. Barros, 1999, p. 108-109) e no lema constituído para
divulgar os recortes exclusivistas da área: “Quem forma é a Universidade, mas quem
habilita para o exercício da profissão é o Conselho Profissional”.
Faz-se necessária uma ampla campanha de informação e orientação à sociedade para
o fato de se praticar atividade física orientada por Profissional de Educação Física.
Devidamente habilitado, que é aquele que possui Carteira de Identidade do respectivo
Conselho Regional de Educação Física. Para isso existe o Sistema Confef/Cref, que se
constitui em órgão de defesa da sociedade, que pode denunciar e receber as orienta-
ções a respeito do desenvolvimento de atividades físicas. Atividade Física só com
Profissional de Educação Física (Steinhilber, 2002, p. 4).
Aqueles profissionais que não se enquadram na denominação profissional de
educação física estão excluídos dos benefícios e das regalias da categoria profissional.
Assim, a regulamentação do profissional de educação física visa abarcar os territó-
rios escolar e não-escolar. Apesar do extenso contingente de filiados, o professorado de
educação física que atua no ensino formal, isto é, na docência do sistema educacional, não
é obrigado ao registro7. Mesmo assim o Conselho busca legitimidade na via escolar,
divulgando suas ações neste ramo, como por exemplo, a aprovação da lei n. 10.328/01
que introduz a palavra obrigatório, após a expressão curricular, constante do terceiro
parágrafo do artigo 26 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDB n. 9.394/
968. Além disso, atua politicamente na busca de consolidação dos preceitos que exigem
mercado de trabalho para aqueles que, porventura, não preencham os requisitos impostos pela
norma, mas que desenvolvam, por exemplo, sua ocupação comcompetência, mérito pessoal,
habilidade própria ou por um aprendizado social. Regulamentar, portanto, é impor limites,
restingir o exercício da atividade profissional, já valorizada, reconhecida e assegurada constitu-
cionalmente (verbete n. 01 da Comissão de Trabalho de Administração e Serviço Público da
Câmara Federal, 2001).
7. 50 mil filiados, conforme declaração de Jorge Steinhilber, presidente do Sistema Confef/Cref, nú-
mero que não necessariamente reflete adesão ao Conselho pelo fato de existir a obrigatoriedade
da lei (cf. Sautchuk, 2002, p. 191). O Conselho Federal de Educação Física ainda não informou,
a respeito destes dados, quantos são professores de educação física escolar. Ver, ainda, parecer n.
278/00 da Consultoria Jurídica do Ministério da Educação e parecer do Sindicato Nacional dos Do-
centes das Instituições de Ensino Superior – Andes, de 21/06/2000 (www.mncr.rg3.net).
8. Artigo 26 da LDB: A Educação Física, integrada à proposta pedagógica da escola, é componente
curricular obrigatório da Educação Básica.... A obrigatoriedade sem legitimidade implica uma
17Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 9-22, maio 2003
a carteira profissional para fins de concursos públicos e em programas conveniados,
como o realizado com a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo – a retomada da
educação física como componente curricular nas quatro primeiras séries do ensino fun-
damental, sendo ministrada não mais por professor polivalente mas por professor de
educação física9.
Essas ações diante dos mais de 6 milhões de alunos, trarão seguramente benefícios
para nossa sociedade e uma maior importância à nossa profissão. Compromisso e
competência, dentre outros valores que julgamos essenciais para a construção de uma
verdadeira profissão, são metas que devemos buscar. Teremos a frente novos desafios
e deveremos nos unir na busca e na elaboração de um Plano Nacional de Atividade
Física e Esporte, que respeite as diferenças regionais e atenda seus anseios e necessida-
des. A Educação Física tem conquistado a cada dia seu merecido respeito na sociedade,
mas incasáveis devemos continuar na luta... (Mazzonetto, 2002).
Antes de questionar se a sociedade reconhece a educação física, devemos nos
perguntar se ela conhece, ainda que no plano geral, o que ela é e sua importância para a
formação humana. Por hipótese, os determinantes da saúde e atividade física seriam os
elementos mais conhecidos. Isso implicaria, por parte de qualquer política social e/ou
educacional, a manutenção de infra-estrutura adequada, planejamento coletivo e controle
social ampliado, conduzido, de forma participativa, por profissionais de educação.
Para além dos primeiros determinantes, há que se acionar um conjunto comple-
xo de determinações de segunda ordem: a produção de pesquisas na área de educação
Física que reconheçam a escola como unidade de acesso fundamental, a criatividade
crítica do professor de educação física e sua qualificação profissional pelo retorno à
instituição universitária (processo denominado qualificação em serviço ou formação
continuada). Apenas numa etapa posterior a sociedade poderia reconhecê-la, legitimar
suas práticas e envolver-se em projetos multidisciplinares. Entretanto, isso passa pelo
acesso à educação formal (e sua necessária melhoria de qualidade), pelo acesso ao
trabalho, ao esporte e lazer, o que fundamentalmente requer a redução da jornada de
trabalho. As tendências e o conteúdo deste quadro ainda não estão inteiramente dados.
educação física seletiva e de exclusão. Entretanto, o mérito desta lei está no fato de que o Poder
Público é obrigado a oferecer educação física na educação básica, o que, anteriormente, sem a
palavra obrigatório, não ficava claro. Ver ainda R.S. Sadi, 2001, p. 141.
9. A exigência de carteira profissional para fins de concurso público foi pensada pelo Conselho
Federal de Educação Física com base na Constituição do Estado do Rio de Janeiro, artigo 77,
parágrafo 8º, que afirma ser obrigatório as profissões regulamentadas serem chamadas a
participar de todas as fases do processo de concurso público, desde a elaboração dos editais até
a homologação e publicação dos resultados, sempre que nos referidos concursos se exigirem
conhecimentos técnicos dessas categorias.
18 Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 9-22, maio 2003
A própria política do Conselho Federal de Educação Física contribui para retardar o
amadurecimento de uma nova educação física, com qualidade social elevada e a favor do
povo oprimido10.
Os donos do negócio chamado educação física preocupam-se com a administra-
ção de uma nova ordem para o setor, preparado para o desenvolvimento. A política de
propaganda, conduzida por meio de informativos destinados a vender cursos, livros,
vídeos, imagens coloridas, idéias e receitas das atividades envolvidas é uma política auda-
ciosa e competente. Nesse sentido, a perspectiva é de crescimento do setor privado em
detrimento do público. Embora tal política não esteja explícita nos documentos do Con-
selho, as hipóteses de um discurso vago a favor do mercado confirmam a idéia de que o
social vem sendo tratado com o populismo assistencialista dos programas compensató-
rios de educação física, esporte e lazer, como é o caso do Programa Esporte na Escola,
do MET – Ministério do Esporte e Turismo, apoiado pelo Confef11. O setor esportivo é
privilegiado no formato alto rendimento. Utiliza-se o esporte como mito para divulgação
e venda de marcas, desejos, sonhos e outras mercadorias. Assim, figuras de destaque
são apresentadas como modelos do profissional de educação física, como é o caso de
Edson Bispo dos Santos (basquete), Luis Felipe Scolari (futebol), Patrícia Medrado (tênis),
Maria Lenk (natação).
Na mesma direção, o presidente do Conselho Federal de Educação Física, Jorge
Steinhilber, entusiasma-se com a perspectiva de mais mercado para os profissionais. Os
seguintes temas estão na pauta de discussão do sub-grupo Esporte de Base da Câmara
Setorial de Esporte do qual o presidente participa como membro: educação física obriga-
tória; esporte na escola; programas de governo; parceriais com prefeituras e secretarias
estaduais; capacitação de recursos humanos; sub-comissão de esportes da Câmara
Federal e orçamento da União.
10. A Carta Brasileira de Educação Física, conhecida como Carta do Confef, mesmo conceituando
qualidade como necessidade social e avançando na discussão de política social para a área, é
omissa quanto aos papéis, tarefas, projetos de inclusão que poderiam ser alavancados por um
conselho profissional. Nesta Carta ressalta-se, mais uma vez, os interesses do Conselho na
educação física escolar, evidenciados no item 6, Da indispensabilidade de uma Educação Física de
qualidade nas escolas (Carta Brasileira de Educação Física, 2000, p. 6).
11. O ex-ministro do Esporte e Turismo Carlos Melles afirmou no lançamento do programa que o
objetivo da universalização da prática esportiva é o surgimento de talentos. Esta concepção de
esporte reproduz a hierarquia e a seletividade em detrimento da participação ativa da maioria
dos usuários/alunos. Exclui os considerados menos habilidosos e aqueles que, não tendo alcan-
çado as metas/marcas desejáveis, desistem. Como os interesses se voltam para a divulgação de
uma marca, as preocupações com a pedagogia do esporte existem na medida em que os
profissionais (técnicos esportivos, preparadores físicos etc.) conseguirem vitórias em suas equi-
pes esportivas, situação propícia para a elevação do status profissional (Informe Phorte, n. 10,
ano 3, 2001, p. 8).
19Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 9-22, maio 2003
Cabe salientar que a bandeira da justiça social alavancada por uma educação de
qualidade foi apropriada pelo Sistema Confef/Cref que a utiliza para mostrar revitaliza-
ção democrática à sociedade e à comunidade da área, isto é, sua forma ousada e arro-
jada de enfrentar os desafios da atualidade. O conjunto de reivindicações do campo
centro-esquerda foramassimilados pela nova direita, tornando o discurso sedutor e
dúbio, pois na falta de maiores esclarecimentos, valem as idéias de que o mundo mu-
dou, de que as pessoas estão incluídas, de que o que falta é maior organização e admi-
nistração dos serviços em geral. Tais cortes ideológicos, presentes no discurso e nos
documentos do Conselho, imprimem uma imagem de renovação, aparentemente re-
volucionária.
A educação física brasileira está preparada para a democratização do Conselho
Profissional? O Sistema Confef/Cref está apto a assumir as bandeiras democráticas de
inclusão e encaminhar pautas sociais? Diante da mudança de página na história do Brasil –
governo popular e progressista – qual o significado de um Conselho Profissional para a
educação física brasileira?
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A expectativa, criada pelo Sistema Confef/Cref, quanto à possíveis melhorias na
área profissional ainda não foi atendida em sua plenitude. A frustração disseminada em
amplas camadas do professorado brasileiro faz crescer as posições divergentes e contrá-
rias à regulamentação. Nesse campo, situam-se pensamentos de uma oposição ora
negativa, ora propositiva, articulados a projetos educacionais distintos e com tendência à
unificação contra o Conselho. São representantes legítimos de tais pensamentos o Mo-
vimento Nacional Contra a Regulamentação – MNCR, o Movimento Estudantil de
Educação Física – MEEF, a Executiva Nacional de Estudantes de Educação Física – ExNEEF,
grupo de militantes independentes localizados no interior do Colégio Brasileiro de Ciên-
cias do Esporte – CBCE, e Frente Unida Pela Autonomia Profissional da Educação e das
Tradições Culturais, que agrega trabalhadores das artes marciais, capoeira, dança e lutas.
Todos os grupos podem revelar fragilidade e oportunismo quando a desarticulação e
desajuste de táticas se sobrepõe à uma política de unidade da educação física brasileira.
Sautchuk (2002, p. 185) observa que:
É bastante provável que a fraca resistência entre os grupos que têm a mobilização
como característica de seu posicionamento dentro do campo da Educação Física advenha
do simples fato de que, mesmo externando uma opinião contrária à regulamentação,
muitos agentes viam com bons olhos a possibilidade de fazer uso do prestígio. Desse
modo era-lhes possível esperar um aumento em seu capital simbólico sem prejudicar
a manutenção de determinada posição (que é sempre política) dentro do campo.
20 Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 9-22, maio 2003
Para os defensores da regulamentação, interessados em novas filiações para ga-
rantia de seu projeto, as contradições políticas apresentam-se quando se observa, de um
lado, a crise econômica e a necessidade de inclusão no emprego, de outro, o impasse, a
insegurança e o medo do desemprego. É importante frisar que, diferente de outros
conselhos profissionais, que pautaram sua política pelo fechamento de sindicatos de sua
área (e por uma perspectiva de inclusão dos trabalhadores) como o serviço social, por
exemplo, o Sistema Confef/Cref adota a exclusão, o medo e a punição como elos
políticos da regulamentação, fazendo neutralizar a crise do mundo do trabalho. Segundo
o Dieese,
As disparidades de renda familiar foram, ao longo dos anos 90, agravadas pelo
crescente desemprego [...] Cerca de um quinto da população economicamente ativa
do conjunto de regiões onde o levantamento é realizado, não tinha emprego; boa
parcela estava desempregada há mais de um ano. A parcela que se manteve ocupada,
ou que conquistou nova ocupação, também viu as condições de trabalho se deteriora-
rem no período. Contratos de trabalho, modificações na legislação trabalhista, entre
outros fatores, aprofundaram o caráter heterogêneo do mercado de trabalho nacional
[...] A insegurança no emprego aumentou. O que antes era um paradigma de relações
de trabalho, o emprego por tempo integral, de longa duração, protegido pela legisla-
ção trabalhista e pelos contratos de trabalho acordados pelos sindicatos, passa na
década de 90 por uma implacável demolição. Os vínculos vulneráveis vão aumentan-
do sua participação no mercado de trabalho. Crescem o assalariamento sem carteira
assinada, o trabalho de autônomos que operam em condições precárias, o emprego
doméstico, a ocupação de crianças e idosos. O núcleo protegido dos empregos diminui
e aumenta a margem dos vulnaráveis (Dieese, 2002, p. 2).
Evidencia-se, nesse formato de crise, o sofrimento dos trabalhadores que, apesar
da luta por uma vida melhor, não conseguem galgar postos mais elevados de qualificação
profissional. Suas conquistas históricas, ameaçadas pelo paradigma da flexibilidade do
trabalho são ainda rotuladas como regalias. Assim, a característica da desregulamentação,
um dos pilares centrais do neoliberalismo, nada tem a ver com a regulamentação da
profissão educação física. Apoiando-se na doutrina neoliberal, o Sistema Confef/Cref
objetiva uma profissão na qual o indivíduo seja proprietário de sua força de trabalho,
transitando no mercado da empregabilidade que supõe, ora a venda do serviço em
condições ótimas de retorno econômico, ora a escassez da procura.
Por fim, a política analisada deve ser vista como processo que conjuga o negativo
e o positivo nas determinações históricas e no vir-a-ser da área de educação física, um
processo inacabado que teve intensa movimentação no período 1998-2002.
21Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 9-22, maio 2003
Politics of the federal council of physical education:
limits and perspectives
ABSTRACT: The present article is integral part of the research project Physical education, Work
and Profession begun in 2002, in FEF – UFG. The study aims at the discussion and revision of
the politics driven by Federal Council of Physical Education. Being used of theoretical referenciais
that problematize categories as work, profession, experience, inclusion/exclusion, competence
and employment, the investigation presents the pertinent legislation to the theme of profissional
physical education’s regulation and the relationships with the politics of Professional Council of
Physical education. It analyzes the speeches, changes and political adjustments, marketing,
formation and project intentions. The results suggest the retaking of academic /politics discussions
about professional intervention.
KEY-WORDS: Politics; work; profession; experience; regulation of the profession of physical
education.
La política del concilio federal de educación física: los límites y
perspectivas
RESUMEN: El artículo presente es la parte íntegra del proyecto de la investigación Educación
Física, Trabajo y Profesión empezada en 2002, en FEF – UFG. El estudio apunta a la discusión
y revisión de la política manejadas por el Concilio Federal de Educación Física. Usándose de
referenciales teoricos que problematizan categorías como el trabajo, profesión, experiencia,
inclusión/exclusión, competencia y empregabilidad, la investigación presenta la legislación per-
tinente al tema de la regulación profesional de educación física y las relaciones con la política
de Concilio Profesional de Educación Física. Analiza los discursos, cambios y ajustes políticos,
propaganda, formación e intenciones del proyecto. Los resultados hacen pensar en recobrar el
debate académico/político sobre la intervención profesional.
PALABRAS CLAVES: La política; el trabajo; la profesión; la experiencia; la regulación de la
profesión de educación física.
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STEINHILBER, J. Notícias do Confef. Informe PHORTE, ano 4, n. 11, p. 4, abr. 2002.
Recebido: 28 nov. 2002
Aprovado: 9 jan. 2003
Endereço para correspondência
Renato Sampaio Sadi
Faculdade de Educação Física – UFG
Campus II – Setor Samambaia
Goiânia – Goiás
CEP 74001-970
23Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 23-37, maio 2003
O ESPAÇO NA CONSTRUÇÃO DE
UMA POLÍTICA DE LAZER – ESTUDANDO
SOROCABA/SP
Ms. ELCIE HELENA COSTA RODRIGUES
E-mail: elcie_helena@yahoo.com
Dr. ANTONIO CARLOS BRAMANTE
Faculdade de Educação Física – Unicamp
E-mail: bramante@uol.com.br
RESUMO
A proposta deste estudo foi discutir a questão urbana da cidade de Sorocaba focalizando o
direito ao “espaço” do lazer. Levou-se em conta, além dos traçados arquitetônicos, os fatores
históricos, econômicos, políticos e sociais, que interferiram ao longo do seu processo de ocu-
pação, identificando qual o peso da importância do lazer em toda a legislação que ordena o
planejamento urbano, e em que medida Sorocaba possui planejamento de espaços de lazer.
Constatou-se que o lazer não é reconhecido como uma das funções sociais da cidade, não
havendo um conceito claro de lazer no seu planejamento urbano. Uma das conseqüências
disso foi que os espaços para os lazeres hoje existentes se consumaram, primordialmente, de
forma não planejada.
PALAVRAS-CHAVE: Política pública; lazer e espaço.
24 Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 23-37, maio 2003
INTRODUÇÃO
O presente artigo foi elaborado a partir da pesquisa realizada durante o
mestrado em educação física da Faculdade de Educação Física da Universidade Es-
tadual de Campinas, enfatizando algumas discussões e reflexões sobre o espaço
como um dos pilares de uma política setorial de lazer. Precisamente, o objeto de
estudo foi a política setorial de lazer do município de Sorocaba.
Distante da capital do estado quase 100 km, Sorocaba possui cerca de 500
mil habitantes, com uma proporção equilibrada de homens e mulheres, e 99% da
população reside em zona urbana (IBGE, 2000). As atividades econômicas giram
na esfera industrial, comercial e de serviços, atraindo a atenção como pólo regional.
Com seus 348 anos de existência, a cidade transita entre a nostalgia de uma rica
história e os avanços voltados para um futuro moderno.
 Será necessário descrever a trajetória de Sorocaba, enfocando seu espaço,
para fundamentar a adequada compreensão da história do seu desenvolvimento no
lazer. Esta reflexão pressupõe que o lazer, enquanto experiência humana, acontece
num dado espaço, reconhecido como um dos componentes conceituais deste cam-
po de intervenção, ao lado principalmente de dois outros construtos: tempo e
atitude. Este espaço será contextualizado na cidade, a qual tem no lazer uma de
suas funções.
A cidade não se limita à percepção da materialidade de paradigmas físicos, de
curvas e relevos, de prédios e vias de circulação, mas é composta, principalmente,
de seus habitantes. Assim, um cidadão, além de seu sentido social, político e econô-
mico, pode ser também um citadino, aquele que vive e dá sentido e vida a uma
cidade (Ferreira, 1999).
A proposta deste estudo foi discutir a questão urbana sob o foco do direito
ao “espaço” do lazer, levando-se em conta, além dos traçados arquitetônicos, os
fatores históricos, econômicos, políticos e sociais, que interferiram ao longo desse
processo, identificando qual o peso da importância do lazer em toda a legislação
que ordena o planejamento urbano da cidade e em que medida Sorocaba possui
planejamento de espaços de lazer.
LAZER: UMA FUNÇÃO SOCIAL DA CIDADE
Para o estudo apropriado cumpre entender a cidade como espaço que, além
de transpor os limiares físicos, não pode existir sem o tempo que lhe dá sentido e
historicidade. Na visão de Santos (1997), uma dimensão não acontece sem a outra,
realizando a composição inseparável da própria geografia com a história.
25Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 23-37, maio 2003
Os estudos sobre o urbanismo e arquitetura com freqüência tangenciam a
temática do lazer, enfatizando a importância do entretenimento da chamada in-
dústria cultural. Neste contexto, cabe explorar a Carta de Atenas, que tratou de
maneira fundamental a questão do lazer no âmbito destes campos de conheci-
mento, elevando-o à condição de “função” da cidade, contribuindo para a possibi-
lidade de se opor à opressão do trabalho e à excessiva massa urbanizada de pré-
dios e espaços da cidade. Esse documento traçou uma radiografia da cidade,
sugerindo caminhos e alertando para cuidados no planejamento urbano (Le
Corbusier, 1964).
A carta faz menção à relevância do plano diretor, no qual o interesse coletivo
deve suplantar o individual, preconizando que os instrumentos de medida dos ar-
quitetos devem pautar-se nos valores humanos, tomando a moradia como célula
do processo de urbanização. Segundo a carta, o crescimento da cidade deverá
estar atento à preservação de suas condições naturais, com a presença indispensá-
vel do sol, espaço e vegetação, fortalecendo a interface com o lazer.
Nesta perspectiva, os valores e os diversos aspectos da experiência de lazer
a serem observados envolvem as dimensões do espaço, tempo e atitude, como
afirmado no início, buscando explorar desde o objetivo ao subjetivo e do quantita-
tivo ao qualitativo. Alguns estudiosos do lazer, entre os quais Dumazedier (1974),
Marcellino (1990) e Bramante (1998), têm se orientado para o eixo “atitude”, le-
vando-se em conta a subjetividade na escolha de seu lazer. O sentido de lazer
assumido neste estudo é inspirado nas idéias de Bramante (1998):
O lazer se traduz por uma dimensão privilegiada da expressão humana dentro de um
tempo conquistado, materializada através de uma experiência pessoal criativa, de prazer e
que não se repete no tempo/espaço, cujo eixo principal é a ludicidade. Ela é enriquecida
pelo seu potencial socializador e determinada, predominantemente, por uma grande
motivação intrínseca e realizada dentro de um contexto marcado pela percepção de li-
berdade. É feita por amor, pode transcender a existência, e muitas vezes, chega a aproxi-
mar-se de um ato de fé. Sua vivência está relacionada a oportunidades de acesso aos bens
culturais, os quais são determinados, via de regra, por fatores sócio-político-econômicos e
influenciados por fatores ambientais (p. 9).
Considerar o lazer uma “dimensão privilegiada da expressão humana” não
elimina as outras como, por exemplo, o trabalho mas explicita que em suas vivências
o indivíduo se coloca, se expressa e se desenvolve de forma singular. Na própria
prática de lazer é possível ter experiências carregadas de sentidos e emoções
incomuns e pouco presentesem outros campos da vida, o que dá ao lazer essa
dimensão tão especial.
26 Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 23-37, maio 2003
ESPAÇO: UMA DIMENSÃO DO LAZER
O lazer acontece por uma permissão do tempo e uma vontade interna do
praticante e é, inevitavelmente, vivenciado em algum lugar. À primeira vista, o espa-
ço parece aspecto menor que envolve o tema lazer. Porém, o ambiente físico influen-
cia, muito além de sua materialidade, sustentado em valores éticos e estéticos de
qualquer local.
Por local, entende-se onde o indivíduo está. Em alguns momentos será a resi-
dência diante da TV; em outras situações, será o mundo visto através da janela de uma
aeronave ou num ambiente plural que poderia ser qualquer lugar: shopping, praça,
praia, calçadão. Lá onde as pessoas se transportam, se expressam, interagem, têm a
visão de dois pontos: sua origem, de onde vêm o, e o futuro, o para onde se dirigem.
Nesta perspectiva, cabe mencionar algumas considerações de Morin (1975),
que ressignifica o espaço (e de certa forma, o próprio tempo) a partir dos avanços
tecnológicos da sociedade do século XX, anunciando a criação de uma terceira
cultura, a chamada cultura de massa, “oriunda da imprensa, do cinema, do rádio, da
televisão, que surge, desenvolve-se ao lado das culturas clássicas” (p.10). A conse-
qüência disso é que as sociedades modernas se tornam policulturais.
Estes novos meios de comunicação de massa criaram uma “sociedade do
espetáculo” que, em seu lazer moderno, redimensiona não somente o tempo, que
não é mais só para o repouso e a recuperação, como também para o consumo,
reordenando simultaneamente o espaço da ocorrência dos fatos (Debord, 1997).
Morin (1975) sustenta um aparente paradoxo
O espetáculo moderno é ao mesmo tempo a maior presença e a maior ausência. É insu-
ficiência, passividade, errância 1 televisual, e ao mesmo tempo, participação na multiplicidade
do real e do imaginário (p. 59).
O autor alerta sobre o risco do empobrecimento da convivência com os
pares que esta vivência televisual pode ocasionar, pois dilui a presença que está sem-
pre atraída para “outro lugar”, algo que ele denomina como uma espécie de
voyeurismo, no qual o indivíduo está descolado fisicamente do espetáculo, reduzido
a um estado de passividade. Morin (1975) compara ainda a experiência de assistir TV
à prática do turismo. O turista moderno é um espectador em movimento, dirigido
1. Errância – é o hábito de vagar, do nômade que vagueia (Dicionário Novo Aurélio Século XXI, 1999)
assim, inspira o conceito de circulação e movimento por vários lugares e caminhos. Pode-se afirmar
que esta “errância televisiva” ganhou mais agilidade com o chamado “efeito zapping” proporcionado
com o advento do controle remoto e pelo aumento do número de canais a serem “visitados”.
27Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 23-37, maio 2003
pelos guias de viagens a roteiros de paisagens preestabelecidas, como num espetá-
culo, que se preocupa em “registrar” (fotografar) mais do que ver e experimentar.
Neste contexto, vale a alusão da residência como um dos principais centros
de lazer da atualidade (Bramante, 1992), convivendo com inúmeras possibilidades,
particularmente diante da TV, que a sociedade do delivery tem consumido horas de
lazer, teletransportando-se para todos os lugares e recebendo informações de to-
dos os cantos. Sem contar a internet, de acessibilidade popular crescente amplifi-
cando este fenômeno.
Estas considerações têm o propósito de dimensionar que, assim como a
percepção do tempo se transformou, a compreensão de espaço igualmente sofreu
significativas mudanças, colocando estas novas leituras da realidade da cidade.
Dentro do conjunto das políticas sociais, uma política setorial de lazer ocor-
rerá em meio a estas transformações no ambiente, mediando contradições e para-
doxos. Se os espaços e a forma de percebê-los se modificam, o mesmo ocorre
com os lazeres. Isso sem perder de vista o desafio de incluir o indivíduo no coletivo
por meio de uma experiência pessoal, que, por isso mesmo, terá sentidos e per-
cepções diferentes. Aí reside sua riqueza.
POLÍTICA URBANA DE SOROCABA: FOCO NO LAZER
O urbanismo surgiu em estreita relação com a arquitetura, tendo como ob-
jetivo estudar a formação e o desenvolvimento das cidades ou das chamadas áreas
urbanas. Sob a perspectiva da planificação e organização espacial, observou-se que
a cidade apresentou diferentes formas e modelos de traçados. O aparecimento de
problemas de saúde pública, saneamento básico, abastecimento, poluição, lazer,
entre outros, provocou a necessidade de planejar o desenvolvimento urbano. Além
disso, os modernos meios de transporte terrestre trouxeram para o tráfego novos
problemas e soluções técnicas (Veríssimo, 2001).
No Brasil, estes códigos reguladores correspondem hoje a planos diretores
de desenvolvimento urbano, lei de perímetro urbano, lei de loteamento, código de
obras e postura, dentre outros, além do Estatuto da Cidade.
HISTÓRIA RECENTE DA OCUPAÇÃO URBANA DE SOROCABA
A pesquisa documental realizada identificou o surgimento em Sorocaba de
ação de política urbana por meio da lei municipal n. 35 de 1948, a qual estabeleceu
uma “faixa comercial central”, visando a melhoria arquitetônica da cidade.
Dois anos depois, foi criado o Código de Obras do Município, uma espécie
de cartilha de definições e medidas dos padrões arquitetônicos e de engenharia.
28 Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 23-37, maio 2003
Tanto em uma como em outro não há menção de “recreação” ou “lazer”, a não ser
que os loteamentos deviam preservar 10% de sua área a “espaço livre”, destinado
a jardins e praças.
Nos anos seguintes, outras leis e atuações tímidas do poder público orienta-
ram o desenvolvimento de uma política urbana do município. Em 1966, o marco
mais relevante no processo de planejamento urbano foi o Código de Arruamento e
Loteamento e o plano diretor. Em suas disposições preliminares foram começados
os conceitos fundamentais para o campo do lazer. Observe-se a nomenclatura a
seguir: “área de recreação – é a reservada para atividades culturais, cívicas, esporti-
vas e contemplativas da população, tais como: praças, bosques, parques e jardins”.
Pode-se dizer que esta lei representou um progresso nesse campo, uma vez que,
administrativamente, a municipalidade reconheceu a função do lazer na cidade.
Contudo, este reconhecimento não se traduziu em ações afirmativas, nem provo-
cou impactos no planejamento e dinamização dos espaços.
Em 1971, foi instituído o Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado (PSDI)
do município de Sorocaba, através da lei n. 1.672. Este documento foi recheado de
avanços conceituais ainda maiores do que o anterior, com a finalidade de “ordenar
e disciplinar o seu desenvolvimento físico, econômico, social e administrativo, de
forma a propiciar o bem-estar da comunidade”. Além disso, reafirmava claramente
as funções consagradas da cidade “de habitar, de circular, de trabalhar e de cultivar
o corpo e o espírito”2.
O documento trata ainda do desenvolvimento social por meio da promoção
integrada de programas e ações, reconhecendo, além da educação, saúde pública,
habitação, as atividades culturais, recreativas, esportivas como estratégias necessá-
rias para a garantia da melhoria da qualidade da vida urbana. Ainda assim, não se
perceberam ações efetivas, permanecendo o discurso distante da prática.
LEGISLAÇÃO URBANA E O LAZER
A Lei Orgânica do município de Sorocaba promulgada em 1990, dispondo
sobre as competências da municipalidade, determina a elaboração de um novo
2. Segundo a PSDI, estas funções demandariam cuidados permanentes que seriam alcançados mediante:
“a) preservação do meio ambiente contra a poluição do ar, do solo, dos mananciais de água e da
paisagem; b) destinação, nas localizações mais adequadas a cada caso, dos terrenos necessários às
diferentes categorias de uso urbano; c) promoção da máxima facilidade de circulação de pessoas e
bens entre os locais dehabitação, de trabalho e de lazer (grifo nosso); d) instalação de serviços
públicos e de equipamentos sociais em quantidade, localizações e padrões que atendam às neces-
sidades da população”.
29Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 23-37, maio 2003
Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado. No âmbito do esporte e lazer, reco-
nhece a necessidade da realização de programas de apoio às práticas desportivas e
a promoção da cultura e recreação, além da proteção do patrimônio histórico,
cultural, artístico, turístico e paisagístico local, provocando uma certa confusão
terminológica e mesmo conceitual, pois, apesar de enumerar diferentes áreas, não
procura defini-las ou mesmo conceituá-las mais precisamente, repetindo equívo-
cos da Constituição do Estado de São Paulo e da União.
O desporto é tratado superficialmente, limitando-se a dizer que “o Municí-
pio fomentará as práticas desportivas formais e não formais como direito de todos”.
O lazer recebe o seguinte enunciado no artigo 158: “o Município incentivará o
lazer, como forma de promoção social”. Merece destaque o parágrafo único que
traz a informação que “todo empreendimento imobiliário ou loteamento, criado a
partir desta lei, deverá obrigatoriamente destinar espaço para a construção de áreas
de esportes e lazer”. Nesta perspectiva, é notória a valorização que se deu ao
componente “espaço” para o lazer, facilitando uma política de lazer para o municí-
pio. Entretanto, não ficam claros nem a quantidade e a qualidade de espaço e nem
que tipo de equipamento de lazer deve ser implantado, uma vez que para este fim
o interesse comunitário deve ser o princípio.
Mais recentemente, já em 2001, surge o chamado Estatuto da Cidade3, es-
tabelecendo diretrizes gerais de uma política urbana para cidades acima de 20 mil
habitantes, visando ordenar o pleno desenvolvimento das “funções sociais da cida-
de” (Estatuto da Cidade, 2001, p. 2). Esta lei estabelece que as futuras gerações têm
direito ao lazer. O lazer é novamente abordado no capítulo que trata Do direito à
preempção, quando o poder público poderá desapropriar espaços urbanos “para
criação de espaços públicos de lazer e áreas verdes”. Mais uma vez, observa-se que
o lazer é apenas uma intenção de um “vir-a-ser”. Se de um lado demonstra consciên-
cia em preservar os direitos das novas gerações, de outro parece esquecer as pes-
soas que vivem no hoje, inclusive por que, mesmo que se faça alguma coisa, será
necessário “aguardar” uma eventual desapropriação.
Outro documento importante a ser analisado é o Plano Diretor de Sorocaba,
o qual apresenta pequenos avanços de nomenclatura ao assumir os termos “recrea-
ção, lazer e turismo”. Em seu anexo – Relatório Técnico – embora as palavras
iniciais alertem sobre os perigos de se tentar abranger “erroneamente tudo”, o
3. O chamado Estatuto da Cidade regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição brasileira e teve
o início de suas discussões no Congresso Nacional em 1989 (Projeto de Lei do Senado n. 181) e
1990 (n. 5.788, na Câmara dos Deputados) e promulgado em 2001.
30 Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 23-37, maio 2003
texto ressente-se da inclusão de abordagens conceituais mais específicas sobre o
lazer4.
O lazer permanece quase imperceptível e só recebeu mínimo tratamento
ao lado das questões do meio ambiente, que, aliás, chegaram a ser abordadas até
no detalhamento de se preocupar com programas de educação ambiental, com
sugestões específicas, fato que merece reconhecimento. Ao contrário, é possível
interpretar que, de forma subliminar, o lazer aparece associado a atividades que
causam “incômodo” como, por exemplo, pelo ruído causado por várias atividades,
realizadas em bares ginásios, eventos, shows e festividades.
Nos itens “Loteamento fechado” e “Edificações em gleba”, não se percebe
garantia da destinação de área para equipamentos de lazer (pracinhas de bairro,
playground, quadra, como também pista de caminhada e ciclovias) que poderiam
ser definidas quando da elaboração do traçado original do empreendimento, in-
clusive dentro das possibilidades, indicando sua implantação de acordo com o
relevo. É comum às áreas destinadas ao sistema de áreas verdes e de lazer serem
as parcelas que apresentam o maior grau de dificuldade e “inutilidade” para a cons-
trução civil, igualmente limitando por vezes sua plena utilização para finalidades
lúdicas.
Sobre as áreas verdes, também constantes no documento e com grande
potencial de uso para fins de lazer, não foi possível identificar o seu entendimento
nesse campo, enquanto operação urbana possível. Fica novamente vago o
direcionamento que se pretende dar ao acesso como garantia ao direito ao lazer.
Diante das indefinições, no geral este processo parece ficar à mercê do “bom sen-
so” do mercado. Já no específico, ao se falar em nome do lazer para todos, poten-
cializa-se a exclusão, uma vez que os espaços destinados favorecem notadamente
apenas estruturas esportivas, como quadras e campos, em detrimento de outros
interesses do lazer.
Vale dizer que no decorrer de 2001 e 2002, os trabalhos de concepção do
novo plano diretor para Sorocaba envolveram algumas discussões compartilhadas
com profissionais especialistas, diversos grupos e associações civis, bem como intra
e intersecretarias municipais. Contudo, os resultados ainda não foram conclusivos
4. Importa informar, no entanto, que a Secretaria de Esportes e Lazer tomou a iniciativa de apresentar
sugestões conceituais para o texto do plano que se encontra em fase de elaboração. Contraditoria-
mente, apesar de haver natural entendimento de que o lazer constitui-se numa das funções da
cidade os técnicos envolvidos na elaboração desse importante documento para a vida presente e
futura da cidade ainda não tomaram como hábito a construção coletiva e multidisciplinar do conhe-
cimento. Esta fragilidade no desenvolvimento do processo demonstra que a cidade ainda é conce-
bida para a moradia, circulação e trabalho como funções hegemônicas.
31Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 23-37, maio 2003
até a presente data da elaboração deste artigo, encontrando-se na Câmara de Ve-
readores para votação.
ESPAÇOS ESPECÍFICOS DO LAZER: MAPEANDO SOROCABA
O esforço deste tópico foi o de levantar principalmente os espaços de lazer
físico-esportivos sob a responsabilidade da Prefeitura Municipal e por conseqüência
pela Secretaria de Esportes e Lazer – Semes, desde as primeiras leis até os dias
atuais.
O primeiro espaço gerenciado pelo poder público, com instalações de gran-
de porte, foi o Ginásio Municipal de Esportes, em 1952. A infra-estrutura física nes-
sa área manteve-se inalterada durante praticamente três décadas, traduzindo uma
certa omissão por parte das gestões que se sucederam. As investigações identifica-
ram que em 1964 foi promulgada a lei que dispunha sobre a construção de 15 cam-
pos de futebol, contribuindo para a ampliação de uma base física alternativa. Atual-
mente, existe cerca de uma centena de áreas espalhadas pela cidade com campos
de futebol de várzea. Oportuno relembrar que esta rede de áreas foi e ainda é fo-
mentada por campeonatos de futebol tradicionais, conhecidos como “varzeanos”.
Na década de 1970, além do estádio municipal, surgiram novos equipamen-
tos de lazer na cidade, centros esportivos 5, com o predomínio do interesse físico-
esportivo, ampliando-se o seu número na década de 1980. Nos anos de 1990, novos
espaços foram implantados, inclusive a partir de parcerias com os governos estadual
e federal, como é o caso do Centro Social Urbano – CSU6. Salienta-se que neste es-
paço está a única piscina pública da cidade, equipamento que por vários períodos
permaneceu desativado. Finalmente, em 2001, um último espaço passou para a
responsabilidade da Secretaria de Esportes e Lazer, uma “herança”: um Centro de
Convivência Esportiva, até então gerenciado pela Secretaria da Cidadania.
No total, a Semes administra, atualmente, 12 próprios esportivos munici-
pais 7, com edificações simples,pouco diversificadas, apresentando defasagem
5. Estes centros esportivos foram criados nos moldes das unidades operacionais do Sesi. O então
secretário da Educação e Saúde da época, professor Otto Wey Netto, tinha sido diretor do Sesi
também durante o período de construção das primeiras unidades. Assim, parece ser possível inferir
que um influenciou o outro na sua concepção e uso.
6. Os centros sociais urbanos foram construídos durante o Governo Geisel (1980) fazendo parte de
um programa de alcance social que se propunha demonstrar a aproximação do estado e sociedade.
Neste caso, deve-se entender o CSU apenas como uma estrutura física, com salas de aula, salão,
campos de futebol, quadra poliesportiva e piscinas (Pereira, 2000).
7. Apesar do lazer no poder público ser bem distinto das práticas esportivas, estes espaços foram
concebidos com os conceitos hegemônicos do esporte, não possuindo espaços de multiuso que
32 Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 23-37, maio 2003
arquitetônica requerendo melhorias e reformas. Cabe destacar que o poder públi-
co possui ainda uma pista de skate e outra de bicicross, em dois centros esportivos
distintos, ambas conceituadas e preparadas para competições oficiais.
Em 1983, como uma forma de descentralizar a infra-estrutura físico-espor-
tiva, a Secretaria de Educação e Cultura implantou três Quintais Comunitários, com
equipamentos recreativos e esportivos que deram, posteriormente, origem a 13
Centros de Convivência Esportiva, sob o comando da então Secretaria de Esportes.
Mais tarde estes equipamentos foram transferidos para a recém-criada Secretaria da
Criança e Adolescência (1993-1996) que os transformou em Centro de Convivên-
cia da Criança e do Adolescente com uma proposta atualizada de co-gestão comu-
nitária. Mais recentemente, esta proposta foi abandonada ao serem transferidos os
equipamentos para a Secretaria da Cidadania, onde se encontram até hoje, com
atendimentos, quando existentes, voltados para atividades de cunho mais social.
Sorocaba tem cinco parques de proporções e vocações diferenciadas. Me-
rece destaque especial Parque Zoológico Municipal Quinzinho de Barros que já foi
referência nacional, o qual também abriga o Museu Histórico Sorocabano. Os de-
mais parques compõem uma rede importante de lazer já que desenvolvem progra-
mas esporádicos com ênfase na educação ambiental. Hoje, a linha de gestão é mais
focada para a conservação e preservação, as quais, apesar de importantes no pro-
cesso da experiência do lazer, não justificam o abandono programático.
No contexto da malha urbana, vale destacar a presença de centenas de áre-
as verdes e institucionais, bem como áreas do sistema de lazer ou recreio. Estas
áreas são, exclusivamente, reservadas para a destinação original prevista nos proje-
tos de loteamentos, segundo o art. 80 da Constituição do Estado de São Paulo
(Cepam, 1999).
A implantação de áreas verdes ganhou relevância nas últimas décadas devido
ao crescimento populacional, pois os interesses que envolvem os negócios imobi-
liários afetam de maneira decisiva a vida da cidade. Esses espaços devem ser preser-
vados para garantir a “destinação original” de uma área livre do sistema de lazer, as
quais não podem ser desafetadas para outras finalidades urbanísticas, o que de-
monstra um certo progresso conceitual ao se considerar que os espaços com áreas
verdes e livres são fundamentais na vida da cidade.
Outro movimento significativo verificado no desenvolvimento urbanístico da
história recente de Sorocaba é a implantação de pistas de caminhada. Destacam-se
três novas áreas da região lindeira da bacia do rio Sorocaba e outros, que recebe-
possibilitassem a realização de experiências de lazer dos diferentes interesses culturais, tais como
teatro, dança, projeção de filmes, festas etc.
33Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 23-37, maio 2003
ram equipamentos de lazer, além de paisagismo e urbanização. Nestes locais per-
cebe-se a atmosfera de um “calçadão” típico do litoral, que favorece o encontro e a
convivência das pessoas.
Em 2002, a administração pública implantou ainda 12 quadras poliesportivas
comunitárias, em diferentes áreas da cidade, que em alguns casos também recebe-
ram pistas de caminhada, diversificando a oferta programática.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O tema espaço suscitou a discussão acerca do planejamento, a legislação, a
concepção dos planos diretores, constituindo uma esfera subjetiva do “vir a ser”,
como também todo mapeamento da ocupação da cidade com seus efeitos objeti-
vos do que “realmente é” ou tem sido.
Acompanhando o desenvolvimento dos espaços de Sorocaba destinados ao
lazer, identifica-se a existência de uma espécie de “elo perdido” na materialização da
intenção de se desenvolver a área, com lento processo de ampliação da base física
pela administração municipal, uma vez que na década de 1970 o poder público
implantava importante programa de lazer com vanguarda conceitual ao eleger a
qualidade de vida como atenção (Sorocaba, 1977).
Cabe notar que estes conceitos eram específicos dentro de uma intervenção
setorial, não influenciando da mesma forma o processo de desenvolvimento urba-
no na ocupação da cidade. Uma cidade que reconhece que também é constituída
de lazer cria ambiente propício para uma dimensão humana privilegiada, ungida da
possibilidade da vivência lúdica.
Nas administrações públicas que se revezaram ao longo das décadas, obser-
va-se o traço comum da dificuldade de instalar pontos fixos (de lazer) que permitam
que ali aconteçam seus fluxos (lúdicos). Pode-se inferir que isso não foi por causa das
orientações partidárias, ideológicas ou programáticas. Apenas não foram priorizadas
por causarem estranheza à lógica do poder público, que tem um certo fascínio por
obras vistosas, bem fixas e candidatas a monumentos de uma época.
Sorocaba locomove-se lentamente nesta seara, mostrando apenas agora al-
guma reação no intuito de valorização dos espaços urbanos e, mesmo assim, no
campo do lazer vacila. Entretanto, algumas experiências apontam para uma sedi-
mentação importante do conceito de que uma cidade deve dar espaço para a fun-
ção do lazer, não só de descanso e de desenvolvimento, mas também da contem-
plação do ócio e divertimento.
Observa-se a implantação gradativa de parques abertos com pistas de cami-
nhada, ampliando o repertório de experiências e grupos atendidos e demonstran-
34 Rev. Bras. Cienc. Esporte, Campinas, v. 24, n. 3, p. 23-37, maio 2003
do resistência ao bordão de que área de lazer é somente campo de futebol. Entre-
tanto, são ações tímidas.
O produto final da nova proposta de plano diretor ainda demonstra o fracas-
so da concepção sobre o processo de gerenciamento da ocupação urbana voltada
para o lazer. Mesmo que se tenha proposto aumento de 10% para 12% de áreas
verdes, conforme a última versão enviada para votação, a decisão persiste numa
lógica perversa. Estas áreas denominadas verdes ou do sistema de lazer destinam-
se, na verdade, a preservar as qualidades de permeabilização do solo. Isto equivale
dizer que não são recomendáveis à construção de estruturas de alvenaria. Assim,
vislumbra-se, pelo menos teoricamente, o determinismo de que somente campos
de futebol gramados e mesmo pistas de caminhada em saibro sejam as instalações
mais adequadas para estas áreas. Está posto o desafio: implantar equipamentos de
lazer construídos nas chamadas áreas institucionais para as quais também se desti-
nam escolas e hospitais. Outra hipótese é valer-se do direito de preempção, com a
desapropriação e respectiva compra de outras áreas permitindo a implantação de
equipamentos de lazer.
Não houve, ao longo destas décadas, representação clara de um conceito
de lazer dentro do planejamento urbano da cidade. Constata-se que o lazer não é
reconhecido como função social da cidade, permanecendo como uma lacuna na
administração pública de Sorocaba. A conseqüência disso é que os espaços para os
lazeres se consumaram, primordialmente, de forma espontânea,

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