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1 2 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ................................................................................... 3 2 DEPENDÊNCIA QUÍMICA DEPENDÊNCIA QUÍMICA: A EVOLUÇÃO DO CONCEITO .............................................................................................. 4 3 COMPREENSÕES PSICOLÓGICAS ................................................ 9 3.1 Terapia Cognitivo-Comportamental e Tratamento de Dependência Química 11 3.2 Semelhanças Entre Os Critérios Cid-10 e Dsm-5 ..................... 16 4 FATORES ASSOCIADOS AO USO DE DROGAS .......................... 17 5 DEPENDÊNCIA QUÍMICA: MODELOS TEÓRICOS ....................... 20 6 DEPENDÊNCIA FÍSICA E PSÍQUICA ............................................. 26 7 CLASSIFICAÇÃO DAS SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS ................. 28 7.1 Substâncias Depressoras do Sistema Nervoso Central ............ 30 7.2 Substâncias Estimulantes do Sistema Nervoso Central ............ 31 7.3 Substâncias Perturbadoras do Sistema Nervoso Central.......... 32 8 TEORIA E TÉCNICA COGNITIVA APLICADA À DEPENDÊNCIA QUÍMICA ...................................................................................................... 33 9 TÉCNICAS UTILIZADAS PELA TERAPIA COGNITIVA .................. 37 10 BIBLIOGRAFIA ................................................................................ 47 3 1 INTRODUÇÃO Prezado aluno! O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 4 2 DEPENDÊNCIA QUÍMICA DEPENDÊNCIA QUÍMICA: A EVOLUÇÃO DO CONCEITO Fonte: pixabay.com Uma relação de dependência se estabelece quando há um investimento desproporcional do sujeito sobre um objeto específico, de tal forma que, esse envolvimento prejudique a participação em outras esferas da vida do sujeito (laboral, afetiva, social) (MORGADO, 1985 apud SOUZA, 2017). Ao se tornar o órgão responsável pelos assuntos relacionados às substâncias psicoativas, a Organização Mundial de Saúde (OMS), antes de buscar medidas para lidar com o problema da dependência, deu início a produção de definições que objetivavam designar o consumo compulsivo de uma determinada substância e suas características. A partir dessas definições, surgiam também, formas diferentes de abordar o fenômeno (BERRIDGE, 1994 apud SOUZA, 2017). Inicialmente, houve uma separação dos conceitos de hábito e vício, e posteriormente sua substituição pelo conceito de dependência, devido à conotação moral imbuída no termo vício. Surge então, a proposta de diferenciar 5 as drogas que produziam apenas dependência física, das que produziam apenas dependência psicológica. Por observar o consumo compulsivo de substâncias que aparentemente não produziam dependência, bem como, casos em que ocorriam a interrupção do uso, sem grandes dificuldades, de substâncias como a morfina, que se associavam a grave dependência física (CRUZ, 2002 apud SOUZA, 2017). Duas situações específicas nos servem para ilustrar a diferenciação feita sobre as dependências físicas e psicológicas. Durante a Guerra de Trincheira, o tratamento das neuroses de guerra motivou pesquisas que levaram ao reconhecimento dos fatores psicológicos envolvidos na dependência. Refutando o argumento sustentado pelas teorias da degeneração hereditária, que defendiam a existência de uma causa orgânica, transmitida hereditariamente. Influência que se manteve presente durante várias décadas no pensamento psiquiátrico (DRUMONND, 1992; STONE, 1985 apud BERRIDGE, 1994 apud SOUZA, 2017). Da mesma maneira, um estudo emblemático realizado com soldados enviados à Guerra do Vietnã, constatou que durante o período da guerra, 43% da amostra (13.760 soldados) consumia alguma substância psicoativa, e dentro desse percentual, 20% tornou-se dependente de heroína, reconhecida pela alta capacidade de causar dependência. No entanto, ao contrário do esperado, ou seja, a permanência dessas taxas após o regresso da tropa, o que ocorreu foi que dos 20% de soldados que haviam se tornado dependentes, apenas 1% manteve-se nessa condição. Esses resultados apontaram para a evidente importância do contexto sociocultural, no estabelecimento de relações de dependência com determinada substância psicoativa (ROBIN e col. 1974 apud MORGADO, 1985 apud SOUZA, 2017). Ainda assim, mesmo com as descobertas envolvendo a dependência, as mudanças das definições oficiais adotadas não representavam as evoluções obtidas no entendimento do fenômeno, já que mantiveram o postulado de que eram as propriedades farmacológicas que engendravam a dependência (MORGADO, 1985 apud SOUZA, 2017). 6 Na década de 50, a influência das tendências científicas enfatizava o nível bioquímico da dependência, acarretando num postulado que atrelavam, em grande parte, os fenômenos da dependência às propriedades farmacológicas das substâncias psicoativas (BERRIDGE, 1994; MORGADO, 1985 apud SOUZA, 2017). Por sua vez, as críticas embasadas por evidências que invalidavam esse pensamento, impulsionaram a continuidade na formulação de conceitos que visassem abranger todos os fatores (biológicos, psicológicos e sociais) envolvidos no desenvolvimento e estabelecimento do problema (CALANCA, 1991 apud SOUZA, 2017). Frente a essa situação é importante trazermos as tentativas sociológicas de definir a dependência, que nos ajudam a ampliar o entendimento do problema, para além do sujeito em sua dimensão biológica. As perspectivas mediacionais, destacavam as desigualdades das estruturas sociais, que criariam condições para o desenvolvimento e manutenção da dependência. Na perspectiva construcionista, a dependência é entendida como um conceito cultural, que envolve uma variedade de significados e funções, independente das sequelas fisiológicas que muitas definições apresentam (BABOR, 1994 apud SOUZA, 2017). De acordo com essa compreensão, não existiriam droga a priori, pois são a atividade simbólica e o conjunto das motivações do consumidor, que transformariam uma substância psicoativa em droga. Esta perspectiva privilegia a noção do sujeito ativo e não, necessariamente, dotado de uma personalidade patogênica (BUCHER, 1992; MACRAE, 2001 apud SOUZA, 2017). A terceira e última perspectiva chamada é chamada de rotuladora, e se relaciona com a anterior (construcionista), ao apresentar a dependência em termos do que seria o papel do doente, criado pelas expectativas sociais. Essas expectativas interfeririam no comportamento, no padrão de uso e no estabelecimento da dependência, a medida em que o sujeito que faz o uso de alguma substância psicoativa, aceitasse o rótulo que lhe é conferido. (BABOR, 1994 apud SOUZA, 2017). Ao dispor de recursos teóricos imprescindíveis, a abordagem sociocultural contribuiu para uma compreensão interdisciplinar da questão através das 7 análises sociais e históricas, que devem ser estudadas em consonância com as interpretaçõesbiológicas e psicológicas, evitando uma abordagem unidimensional (BUCHER, 1992 apud SOUZA, 2017). No conceito de farmacodependência, desenvolvido em 1969, os fatores sociais ainda não são mencionados entre causas: Estado psíquico e algumas vezes físico resultante da interação entre um organismo vivo e uma substância, caracterizado por modificações de comportamento e outras reações, que sempre incluem um impulso a utilizar a substância de modo contínuo ou periódico, com a finalidade de experimentar seus efeitos psíquicos e, algumas vezes, de evitar o desconforto da privação. A tolerância pode estar presente ou não (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 1969 apud SILVEIRA, 1996 apud SOUZA, 2017). Atualmente, a mudança é percebida nos fatores considerados pela OMS prejuízos sociais, ocupacionais e psicológicos, além dos fisiológicos para o estabelecimento do diagnóstico de dependência. Porém, o reconhecimento da complementaridade entre os fatores biopsicossociais, na configuração de um consumo compulsivo de uma ou mais substâncias, não foram suficientes para mudar o pensamento hegemônico, de que cabem as abordagens biológicas (médicas e farmacológicas) o papel de tratar a questão (CRUZ, 2002 apud SOUZA, 2017). Dalgalarrondo (2008 apud SILVA; et al., 2020), define dependência como a apresentação de um padrão mal adaptativo no uso de substâncias em que há repercussões psicológicas, físicas e sociais resultado da interação entre o ser humano e uma substância psicoativa. O Manual de Diagnóstico e Estatística da Associação Psiquiátrica Americana (DSM-IV) define a dependência como um padrão mal adaptativo do uso de substâncias, levando a prejuízo ou sofrimento clinicamente significativo, caracterizado pela presença de três ou mais dos critérios a seguir, pelo período de um ano: tolerância (necessidade de quantidades maiores para obtenção do mesmo efeito ou menor intensidade do efeito com a dose habitual); abstinência (síndrome com sinais e sintomas típicos de cada substância, que são aliviados pelo consumo); consumo por período de tempo mais prolongado e em quantidades maiores que o planejado; desejo persistente de uso e incapacidade para controlá-lo; muito tempo gasto em atividades para obtenção da substância; redução do círculo social em função do uso 8 da substância; persistência do uso da substância, apesar de prejuízos clínicos (FIDALGO, 2012 apud SILVA; et al., 2020). Conforme Fidalgo (2012 apud SILVA; et al., 2020), “A dependência é um fenômeno complexo, com diversas variáveis envolvidas, dessa forma, não existe uma explicação etiológica simples e que consiga contemplar todas as facetas do problema”. Para Dawes (2000 apud SILVA; et al., 2020), não existe única razão que explique, para todas as pessoas, o porquê do uso abusivo e dependência de drogas, tendo em vista que pode se dar por múltiplos fatores. A dependência inclui fenômenos como a tolerância, sintomas de abstinência, uso continuo ou muito frequente de quantidades significativas da substância, geralmente maiores que as pretendidas pelo sujeito (DALGALARRONDO, 2008 apud SILVA; et al., 2020). Sendo assim, pontua-se Araújo: Mesmo que a utilização de uma droga tenha como efeito direto o prazer, trará outras consequências não tão positivas que fazem que seja criado um dilema quanto à repetição deste comportamento, sendo justamente este espaço entre o desejo e sua realização um dos focos terapêuticos na área da dependência química (ARAUJO, et al. 2008 apud SILVA; et al., 2020). Ainda como afirma Dalgalarrondo (2008 apud SILVA; et al., 2020), existem períodos de aumento e de diminuição no uso, assim como de abstinência e recaídas. Vai se intensificando uma redução dos interesses do indivíduo por questões não relacionadas à substância, redução no repertório, passando o sujeito a dedicar todo seu tempo e sua energia para localizá-la, adquiri-la e consumi-la, que tipicamente assume esse estreito repertório de interesses, vindo a abandonar outras atividades sociais, pessoais e ocupacionais que não envolvam o consumo (DALGALARRONDO, 2008 apud SILVA; et al., 2020). Quanto ao desejo, Araújo (2008 apud SILVA; et al., 2020), afirma que não há como dissociá-lo de sua realização ou da crença que se tem a respeito do que esta realização trará como resultado, sendo claro que é possível que ocorra 9 a fissura por uma determinada substância sem que haja a intenção de utilizá-la, como por exemplo, pessoas que estão tentando se manter em abstinência. 3 COMPREENSÕES PSICOLÓGICAS Fonte:alessandrouniclinicas.com.br Formada por sistemas teóricos distintos, a psicologia não dispõe de uma teoria comum sobre a (s) causa (s) da dependência de substâncias psicoativas. Como resultado, encontramos a elaboração de diferentes hipóteses, que dão destaque a determinados elementos, de acordo com sua leitura acerca do funcionamento psíquico e/ou as relações estabelecidas entre os homens e o meio. Contudo, as teorias da personalidade (modelo psicanalítico) e de aprendizagem (modelo comportamental) se destacaram na produção de possíveis explicações para uma conduta adicta. De forma resumida, nos modelos psicanalíticos, a dependência é compreendida como um sintoma e não necessariamente como causa. Na tentativa de viver continuamente sobre o domínio do princípio do prazer, o sujeito incorpora a sua rotina um hábito de 10 consumo de substâncias psicoativas que vem a gerar a dependência (MOTA, 2007 apud SOUZA, 2017). Por sua vez, no modelo inspirado nas teorias de aprendizagem, a dependência se originaria a partir de uma estratégia habitual de automedicação, na tentativa de debelar sentimentos como ansiedade, raiva ou depressão (MOTA, 2007 apud SOUZA, 2017). Na abordagem sistêmica, o foco da atenção terapêutica recai sobre as relações interpessoais que se dão no seio familiar, entendida como um sistema de forças (SEADI, 2007 apud SOUZA, 2017). Nessa perspectiva, o conceito de dependência é entendido enquanto um mecanismo natural de adaptação, em que o sujeito busca uma solução para questões que exigem uma resposta adaptada. Desta maneira, recorre-se a droga como algo que irá conferir ao sujeito uma competência relacional que lhe falta em determinados contextos (SUDBRACK, 2000 apud SOUZA, 2017). Outra visão, dentro da abordagem sistêmica, enxerga o sujeito dependente como portador do sintoma da disfunção familiar, que contribui para a manutenção da mesma, na medida em que seu consumo retira o foco dos problemas relacionais existentes entre os outros membros da família (ORTH, 2005 apud SOUZA, 2017). Na abordagem fenomenológico-existencial, a dependência constitui-se como uma possibilidade de escolha dentre as possíveis disponíveis no mundo. Essa escolha, pelo uso de psicoativos, é tida como inautêntica e deliberada, ao transferir para a droga o seu projeto de existir (OLIVEIRA, 2007 apud SOUZA, 2017). Para a Gestalt-terapia, de base fenomenológica- existencial, as pessoas reconhecidas como dependentes, estão fora de seu equilíbrio ótimo, frequentemente incapazes de perceber quais as suas necessidades. Ocorrendo então, alterações nos processos funcionais de contato e afastando, distorcendo a existência do sujeito enquanto ser unificado (TELLEGEN, 1984; PIMENTEL, 2003 Apud OLIVEIRA, 2007 apud SOUZA, 2017). Com o foco na reestruturação de cognições disfuncionais, a teoria cognitiva acredita que a dependência é resultado da interação entre o contato 11 inicial com a droga e as cognições que se formarão por influência das crenças básicas (SILVA; SERRA, 2004 apud SOUZA, 2017). A partir de crenças básicas disfuncionais, o sujeito faz suposições de como deverá agir diante de situações específicas, criando uma espécie de ciclo, repetindo o mesmo comportamento em ocasiões similares. Para aliviar o desconforto, em decorrência dos sentimentos suscitados pelacrença básica disfuncional, criam-se então as chamadas estratégias compensatórias. Nesse caso o consumo de uma substância psicoativa, como estratégia compensatória, poderá desenvolver um novo grupo de crenças que manterá relação com a crença básica (SILVA, 2004 apud SOUZA, 2017). 3.1 Terapia Cognitivo-Comportamental e Tratamento de Dependência Química Segundo SOUZA (2017), para a teoria comportamental, todo comportamento é consequência da interação do indivíduo com seu ambiente. São os eventos ambientais que determinam o comportamento, e não a consciência e o autocontrole. No modelo do reforço, a manutenção e a extinção de determinados comportamentos são explicadas pelos conceitos de reforço e punição. Pensando no consumo de substâncias psicoativas, estas são entendida como um estímulo cuja função dependerá das consequências produzidas e do contexto em que é administrada. A repetição do consumo ocorreria pelo papel reforçador da substancia, ou seja, a substancia pode desempenhar um papel de reforçador positivo, onde o aumento da probabilidade de repetir o uso estaria relacionado às consequências recompensadoras, prazerosas, desse consumo. Na função de reforçador negativo, o aumento do consumo da substância se justificaria pela retirada de algo aversivo, desagradável, à exemplo, afastar/ aliviar os sintomas da abstinência (GARCIAMIJARES; SILVA, 2006 apud SOUZA, 2017). 12 Entretanto, o modelo do reforço possui restrições para explicar a dependência. Se o comportamento não é controlado somente pelos reforçadores, mas também pelos punidores (que diminuem a probabilidade do comportamento), como justificar a manutenção do comportamento de consumir substâncias psicoativas, quando as consequências aversivas (na saúde, trabalho, família) são maiores do que os reforços propiciados pelo consumo (GARCIA-MIJARES; SILVA 2006 apud SOUZA, 2017)? Frente a essas objeções, teorias atuais da dependência que entendem o problema como resultante de um processo de aprendizagem, onde a substância e os estímulos associados a seus efeitos adquirem controle potente sobre o comportamento, são propostas para explicar a etiologia da dependência. Apresentaremos essas teorias, que se diferenciam quanto aos processos de aprendizagem envolvidos (GARCIA-MIJARES; SILVA 2006 apud SOUZA, 2017). A teoria comportamental como escolha, desenvolvida por Heyman (1996 apud GARCIAMIJARES; SILVA, 2006 apud SOUZA, 2017), entende que a dependência é um processo em que o consumo repetido da substância, diminui progressivamente o valor reforçador de outras atividades, por serem as substâncias psicoativas um reforçador atípico (GARCIA-MIJARES; SILVA 2006 apud SOUZA, 2017). A estratégia de escolha que controla o comportamento do indivíduo é base da explicação para o desenvolvimento da dependência. Nesses casos, o sujeito se vale da estratégia de melhoração (sic), que tem como objetivo obter o maior benefício no momento, ou seja, escolhem-se as alternativas, que possuam maior taxa de reforço local. A escolha em recorrer a essa estratégia varia de acordo com as contingências. (GARCIA-MIJARES; SILVA 2006 apud SOUZA, 2017). Outra teoria que visa explicar a dependência é a teoria da sensibilização, que propõe que a dependência acontece porque a administração repetida de uma substância psicoativa causa mudanças cerebrais (sensibilização neural), que tornam os sistemas associados à motivação, hipersensíveis aos efeitos das 13 substâncias. Desta forma, qualquer estímulo associado à substância psicoativa acarretará num comportamento de procura e consumo da substância (GARCIAMIJARES; SILVA, 2006 apud SOUZA, 2017). Fonte: pixabay.com Por fim, a teoria neurobiológica de Kalivas e outros (2005 apud GARCIA- MIJARES; SILVA, 2006 apud SOUZA, 2017), integra as duas primeiras, descrevendo as mudanças no circuito do reforço que acontecem no processo de dependência. O consumo repetido de psicoativos produziria mudanças no sistema nervoso, em vias dopaminérgicas e glutamatérgicas especificas, que ocasionariam a diminuição do valor reforçador de estímulos naturais, com o aumento da resposta à estímulos associados com a substancia, alterando o comportamento de escolha (GARCIA-MIJARES; SILVA, 2006 apud SOUZA, 2017). No que concernem as técnicas, a abordagem comportamental possui grande reconhecimento no tratamento da dependência, sendo largamente 14 recomendados por guias terapêuticos médicos, pela sua aceitabilidade na área psiquiátrica (SONENREICH; ESTEVÃO; FILHO, 2000 apud SOUZA, 2017). É importante ressaltar a existência de diversas terapias denominadas cognitivo comportamentais, havendo em comum entre elas a influência da cognição sobre o comportamento e a modificação do comportamento que pode ser realizado por mudanças cognitivas (MARQUES; SILVA, 2000 apud SOUZA, 2017). Entretanto, mesmo com o reconhecimento e a recomendação sobre a utilização das técnicas oriundas das teorias comportamentais e cognitivas, nos casos de dependência de álcool, cerca de 50 a 60% dos pacientes não se beneficiam desses procedimentos (RAMOS; WOITOWITZ, 2004 apud SOUZA, 2017). Para nós, esse tipo de dado é importante na medida em que aponta para a necessidade de produção de explicações plurais, que explorem elementos distintos do fenômeno, e assim, contribuam na construção de propostas terapêuticas capazes de agregar aqueles que não se beneficiem dos métodos padrões. A Terapia Cognitiva utiliza o conceito da estrutura “biopsicossocial” na determinação e compreensão dos fenômenos relativos a psicologia humana, no entanto constitui-se como uma abordagem que focaliza o trabalho sobre os fatores cognitivos da psicopatologia (BAHLS; NAVOLAR, 2004 apud SILVA; et al., 2020). Entre as principais formas de tratamento destacadas por Correa (2003) para a dependência de substâncias psicoativas estão a intervenção farmacológica, psicoterapia individual, psicoterapia de grupo, psicoterapia familiar, grupos de ajuda mútua, entrevista motivacional, prevenção de recaída e treinamento de habilidades sociais (THS). Vázquez e Becoña (1996 apud SILVA; et al., 2020 apud SILVA; et al., 2020) destacaram o papel das terapias cognitivo-comportamentais e o papel das terapias farmacológicas em termos de eficácia e de estabilidade. Em relação à eficácia, os resultados indicaram que as terapias cognitivo-comportamentais são eficazes mesmo sem o uso de medicamentos; já os medicamentos, na ausência das terapias cognitivo comportamentais não se mostraram tão eficazes. 15 Mesmo que a utilização de uma droga tenha como efeito direto o prazer, trará outras consequências não tão positivas que fazem que seja criado um dilema quanto à repetição deste comportamento, sendo justamente este espaço entre o desejo e sua realização um dos focos terapêuticos na área da dependência química anteriores (ARAUJO, et al. 2008 apud SILVA; et al., 2020). Assim como afirmam Alverson et al. (2000 apud SILVA; et al., 2020), o envolvimento com a substância acaba por tornar-se compulsório, o processo de recuperação implica em desenvolver-se afetivamente com outras atividades e desenvolver relações afetivas com pessoas significativas reconquistando, assim a autoestima Diante de um paciente que faz uso de substâncias, é importante a caracterização detalhada do consumo, questionando, para todas as drogas consumidas: as motivações do uso; a quantidade utilizada; o padrão de uso; os aspectos circunstanciais do uso; os efeitos obtidos e o sentimento pós-uso (FIDALGO, 2012 apud SILVA; et al., 2020). Araújo (2008 apud SILVA; et al., 2020), observa que, na prática clínica, e pelas pesquisas realizadas na área de dependência química, que a terapia cognitivo-comportamental associada à farmacoterapia, ao utilizar o modelo biopsicossocial, são as mais indicadas para o tratamento destaclientela, apresentando bons subsídios teóricos e práticos. 16 3.2 Semelhanças Entre Os Critérios Cid-10 e Dsm-5 Fonte: supera.org.br Conforme FERRI; et al (2016), como pode ser visto na comparação entre as duas classificações, os itens abordados são praticamente idênticos, mudando 17 apenas a forma da redação. Os dois sistemas (CID-10 e DSM-5) também diferem na terminologia: a CID-10 classifica os usuários com problema em uso nocivo (ou prejudicial harmful use, em inglês) ou dependência. O DSM-V classifica em “transtornos do uso de substâncias”. Outro aspecto fundamental: nenhum dos dois critérios menciona a quantidade ingerida de álcool ou de qualquer outra droga, pois esse aspecto é extremamente variado e está relacionado a diferenças individuais. 4 FATORES ASSOCIADOS AO USO DE DROGAS Fonte: pixabay.com Conforme BITTENCOURT; et al., (2015) a adolescência é um momento de grande impacto no desenvolvimento humano, e se molda como período crucial no que tange ao uso de drogas. De acordo com o Ministério da Saúde, a adolescência corresponde à faixa etária entre 10 e 20 anos – conforme critério definido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) – e consiste em um 18 processo de emancipação afetado por diversos fatores nos quais atitudes, hábitos e comportamentos se encontram em transformação. Os primeiros contatos com o álcool e outras drogas ocorrem, geralmente, durante esse período, no qual as estruturas cerebrais responsáveis pela percepção temporal e pelo controle de impulsos estão ainda em amadurecimento. A satisfação imediata proporcionada pelo uso de substâncias psicoativas (SPA) vem ao encontro do comportamento impulsivo e do imediatismo muitas vezes presentes nos jovens dessa faixa etária. Tal fato, somado às transformações físicas e psíquicas e aos conflitos com o meio familiar e social, acaba por aprofundar a vulnerabilidade inerente a essa população específica, afirma BITTENCOURT; et al., (2015). Conforme Levinas (apud BITTENCOURT; et al., (2015 p.312) define vulnerabilidade como condição de todo ser humano, na medida em que todos estamos expostos ao outro e ao mundo, e por eles somos responsáveis. A fim de precisar o uso do termo “vulnerabilidade” e como seu conceito vem sendo aplicado e compreendido pela bioética, Neves parte do reconhecimento da vulnerabilidade, estendendo tal entendimento à apuração da existência de grupos e indivíduos especialmente vulneráveis, os quais devem ser protegidos em razão de sua condição agravada por circunstâncias e situações específicas. Essa mesma distinção é feita, pela bioética da proteção, que diferencia essas duas condições por meio dos termos “vulnerável” e “vulnerado”. Um dos principais aspectos da formação da identidade é a capacidade de se ver como um indivíduo único e desempenhar um papel na estrutura familiar ou comunitária. Alguns adolescentes inicialmente usaram álcool e drogas para entretenimento. Se essas substâncias não forem usadas, alguns desses adolescentes terão dificuldade em manter relacionamentos emocionais, o que torna mais difícil construir relacionamentos mais fortes. Os eventos que marcam a transição da adolescência para a vida adulta podem não ser biológicos ou de idade, mas sociais, como o início da vida sexual, a composição familiar ou a entrada no mercado de trabalho. 19 Quando esta etapa é concluída com sucesso, o adolescente apresenta autocontrole e autoestima. Caso este processo seja interrompido ou distorcido por algum motivo – doença, violência, privação excessiva, uso de drogas – a personalidade resultante pode ser excessivamente dependente de fatores externos, em vez dos internos, na determinação de comportamentos e da identidade. (Scivoletto,2011 apud BITTENCOURT; et al., (2015, p.311). As representações sobre a juventude, a posição social dos jovens e o tratamento que lhes é dado ganham significados específicos em diferentes contextos históricos, sociais e culturais (Peralva,1997 apud Piccolo e Leal, 2011). Conforme proposto por Dias (2006 apud Rapizo,2011), a família é um lugar que se atualizam as tensões sociais. É onde ocorre a aprendizagem social, a distribuição das relações de autoridade e submissão, a definição dos papéis de gênero. Elas suscitam transformações sociais e respondem a essas mudanças em um diálogo constante. A adolescência é um período de vitalidade física e mental, nesta fase, eles precisam de oportunidades para liberar suas energias. Além disso, este é um período crítico para o desenvolvimento de habilidades pessoais e interpessoais e para a aquisição de habilidades de desempenho e de tomada de decisão. 20 5 DEPENDÊNCIA QUÍMICA: MODELOS TEÓRICOS Fonte: pixabay.com A síndrome da dependência é tida como um grupo inter-relacionado de sintomas cognitivos, comportamentais e fisiológicos. As incapacidades relacionadas ao álcool, por outro lado, consistem em disfunções físicas, psicológicas e sociais que se seguem direta ou indiretamente ao uso excessivo da bebida e da dependência. (EDWARDS; LADER, 1994, apud Colett.C; 2010, p.12). Segundo Cordeiro, (2006) diferentes modelos tentam explicar a dependência química. A seguir, são apresentados os mais conhecidos. Modelo moral Para o modelo moral, o uso de substâncias e a dependência química seriam escolhas pessoais. Segundo esse conceito, o consumo seria uma forma de desrespeito às normas, transformando o paciente em um transgressor. Esse entendimento torna o indivíduo sujeito a críticas sobre a doença, sendo ele responsável por ela e, como tal, apto a arcar com todas as consequências em quaisquer situações. Esse modelo muitas vezes faz do paciente intoxicado um 21 alvo de críticas, desatenção e punição em serviços de saúde. São exemplos de pensamentos gerados por essa concepção: “Tanta gente doente e esse aí causando confusão porque bebe” ou “Esse paciente vive chegando drogado no pronto-socorro. Melhor atender rápido e mandar logo embora. ” Afirma, Cordeiro (2006). O modelo moral é uma abordagem em desuso para o tratamento da dependência química. Apenas responsabilizar o paciente pelo quadro de intoxicação não torna o profissional diferente das pessoas em geral (família, empregador, vizinhos), as quais, muitas vezes, já apresentaram esse tipo de postura. O indivíduo é levado a responsabilizar-se como causador da dependência e por mantê-la por não ter a “força de vontade” que promove mudanças comportamentais bem-sucedidas. Afirma, Cordeiro (2006). Segundo PILLON; et al., (2004) neste modelo, os indivíduos são considerados responsáveis tanto pelo início e o desenvolvimento do problema, quanto pelas soluções e acredita-se que necessitam apenas de motivação apropriada. A principal limitação do modelo moral é que as pessoas são levadas a sentir-se culpadas pelo desenvolvimento do problema e a pensar que, de alguma forma, lhes faltam força de vontade ou "fibra moral", por não conseguirem alterar com sucesso seu comportamento. Modelo da temperança ou sobriedade Conforme CORDEIRO (2006), no século XVIII, o consumo de álcool começou a ganhar mais atenção, e quadros de embriaguez passaram a ser considerados doença a partir de trabalhos científicos, como, por exemplo, aqueles publicados por Thomas Trotter. No final do século XIX, nos Estados Unidos, o modelo da temperança ou sobriedade surgiu e teve certa credibilidade até 1933, sendo a primeira tentativa estruturada para entender a etiologia do alcoolismo. Com a utilização desse modelo como forma de entendimento da dependência de álcool, o objetivo do tratamento seria a utilização cautelosa e moderada da substância. 22 O modelo da temperança, diferentemente do modelo moral, não considerava a embriaguez um pecado cometido por falha de caráter do indivíduo, mas um hábito a ser desaprendido. O intuitoseria encontrar um equilíbrio no consumo de álcool, de forma que o sujeito retornasse ao estágio anterior à dependência. Esse modelo servia para entender a dependência de álcool como uma espécie de termômetro físico e moral, afirma CORDEIRO (2006). Segundo CORDEIRO (2006), para Rush, o consumo “começa com uma escolha, torna-se um hábito e, depois, uma necessidade”. Deveria haver uma fronteira entre o consumo adequado e o patológico, e as pessoas que tivessem ultrapassado esse limite deveriam retornar ao consumo sem prejuízo. A Lei Seca, ocorrida entre 1919 e 1932, foi o auge desse movimento, proibindo a fabricação e o consumo de bebidas alcoólicas. Modelo da degenerescência neurológica Segundo CORDEIRO (2006) em 1849, Magnus Huss, na Suécia, publicou um trabalho científico no qual, pela primeira vez, a palavra alcoolismo foi utilizada, e o fenômeno foi entendido como uma patologia. Houve forte tendência a acreditar que o tratamento deveria ser igual ao de outras doenças na época: banhos de vapor, tônicos, uso de sanguessugas, etc. Modelo espiritual Conforme CORDEIRO (2006), em 1935, Bill Wilson e Robert Smith criaram os Alcoólicos Anônimos. A dependência de álcool, nesse modelo, é entendida como uma condição que o indivíduo é incapaz de superar por si só. A esperança de mudança consiste em entregar a vida a uma força superior, e, a partir daí, segui-la rumo à recuperação. Praticar o Programa de 12 Passos é fundamental para a recuperação. A partir do AA, diversas outras irmandades foram criadas seguindo, basicamente, a programação dos 12 passos. O Al-Anon e o Alateen foram criados para familiares de dependentes de álcool; além desses, há o NA (Narcóticos Anônimos), o DASA (Dependentes de 23 Amor e Sexo Anônimos), o Neuróticos Anônimos, o CCA (Comedores Compulsivos Anônimos) e muitos outros, afirma CORDEIRO (2006). Modelo psicológico São apresentadas a seguir diversas escolas de pensamento voltadas ao modelo psicológico que tentam explicar o surgimento da dependência química, afirma CORDEIRO (2006): Condicionamento clássico – As situações do cotidiano provocam estímulos, produzindo respostas no indivíduo, afirma CORDEIRO (2006). Condicionamento operante – O consumo de substâncias psicoativas – produzindo bem-estar, relaxamento e quadros de euforia ou retirando sensações de ansiedade e mal-estar (reforços positivos e negativos) – resultaria em padrões de comportamento, conforme CORDEIRO (2006). Modelo cognitivo-comportamental – Busca ressaltar a importância dos processos mentais sobre os comportamentos. O esforço do modelo volta- se para o entendimento das expectativas do indivíduo acerca dos efeitos do álcool e de outras substâncias. Expectativas positivas podem promover consumos mais pesados. O modelo de prevenção de recaída ressalta a importância dos processos cognitivos na evocação ou evitação da recaída. Os enfoques voltados para a teoria comportamental surgiram na primeira metade dos séculos XX, com Pavlov e Skinner, e preconizavam que situações capazes de prover o indivíduo de prazer e recompensa geram reforço positivo, aumentando as chances de manutenção do comportamento. Quando a pessoa aprende que o consumo de álcool é capaz de trazer alívio diante de situações estressantes, aumentam as chances de manter o comportamento para situações desse tipo e generalizá-lo para outras. Afirma CORDEIRO (2006). 24 Modelo psicanalítico: A dependência de substâncias estaria ligada a tentativas de retorno a estados prazerosos infantis. A doença é explicada a partir da “hipótese da automedicação” a interações disfuncionais na primeira infância, como vulnerabilidade no desenvolvimento da autoestima, construção de relacionamentos e de intimidade problemáticos, habilidade de autoproteção com prejuízos e déficits de tolerância aos afetos, conforme CORDEIRO (2006). Modelo de aprendizado social: Discorda que o indivíduo nasça dependente. O aprendizado não é só do contexto da substância, mas do que ela pode proporcionar ao indivíduo. O modelo sociocultural apresenta uma visão mais ampla sobre o papel da sociedade e das subculturas na modelagem dos padrões individuais de consumo, pois propõe intervenções macrossociais para atuar nas questões das substâncias (p. ex., aumento de preços, normas claras sobre o consumo, cumprimento de punições previstas, proibição de anúncios, etc.) segundo, CORDEIRO (2006). Modelo sistêmico: O comportamento individual é parte interativa de um sistema social mais amplo, no qual a família se destaca. No entendimento das atitudes do dependente, consideram-se seus relacionamentos (nos vários níveis). O sistema (família) tende a manter um equilíbrio – muitas vezes precário – que resiste às mudanças. O modelo propõe que a dependência química é um distúrbio familiar, e a mudança de comportamento do dependente provocaria desagrado ou resistência da família. A terapia familiar é um instrumento indicado para alcançar o sucesso terapêutico, afirma CORDEIRO (2006). Modelo biológico Segundo CORDEIRO (2006), o modelo biológico ganhou novo fôlego na década de 1970 e envolveu a etiologia com a fisiologia e a genética. O transtorno relacionado ao consumo de substâncias seria primário e independente de outras 25 condições. Esse modelo estuda a herança genética e a constituição biológica do indivíduo e como tais características determinam o surgimento da dependência. Estudos com famílias, gêmeos e adoção enfatizam a importância das características biológicas dos indivíduos para o surgimento desse processo, como, por exemplo, estudos com gêmeos idênticos separados na infância e adotados por famílias com diferentes características evoluindo para quadros de dependência química na idade adulta. Na década de 1970, a Organização Mundial da Saúde (OMS) desenvolveu uma nova conceituação sobre a dependência química, considerando-a como uma síndrome que obedece uma continuidade de gravidade. Além disso, estabeleceu uma distinção entre consumo abusivo e dependência, afirma CORDEIRO (2006). Modelo biopsicossocial Segundo esse modelo, uma multifatoriedade está envolvida no surgimento da dependência química. As diferentes teorias associadas seriam necessárias para determinar a doença, e o indivíduo não teria apenas uma única causa para explicar o desenvolvimento, o curso e o prognóstico do problema. A substância seria apenas um dos fatores de uma tríade que incluiria o indivíduo e a sociedade de que faz parte e na qual a substância se encontra, conforme CORDEIRO (2006). 26 6 DEPENDÊNCIA FÍSICA E PSÍQUICA Fonte: pixabay.com A dependência física ocorre pela adaptação das células à presença de substâncias químicas reassumindo sua função parcialmente normal. Para que o organismo responda de maneira semelhante à primeira exposição à droga, doses cada vez maiores são necessárias. A dependência celular também implica uma adaptação de células isoladas à presença da droga em seu ambiente, mas neste caso a adaptação é tão severa que a célula não pode funcionar normalmente na ausência da droga (Edwards; Lader, 1994, apud Colett.C; 2010). Depois que a dependência orgânica é instalada, as células não funcionarão "normalmente" quando há a ausência da droga. Essa disfunção celular é chamada de síndrome de abstinência, o que significa que o corpo não pode manter seu próprio estado sem a adição de álcool e / ou drogas. Essa síndrome é caracterizada por sinais e sintomas como: delirium tremens, ou seja, tremor intenso e alucinações. 27 Inicialmente, os sintomas são mais leves, menos comuns e ainda não afetam a capacidade do indivíduo de manter relacionamentos sociais e produtivos; ansiedade, insônia e irritação podem ser atribuídas a outros fatores diários. Os sintomas mais perceptíveis, segundo Focchi(2001, p. 3 apud Colett.C; 2010), são: físicos (tremores, náuseas, vômitos, sudorese, cefaleia, câimbras, tontura); afetivos (irritabilidade, ansiedade, fraqueza, inquietação, depressão); senso percepção (pesadelos, ilusões, alucinações visuais, auditivas ou tácteis). Portanto, o organismo possui uma certa tolerância à dependência física. A tolerância é a capacidade das células funcionarem com a ingestão de doses em maiores ou menores quantidades e com maior ou menor frequência. Já a dependência física é caracterizada pelos sintomas estereotipados, pois, ao ingerir doses elevadas, o funcionamento neuronal fica alterado, afirma apud Colett.C; (2010). Há também dependência psicológica, que na verdade é impossível de medir porque contém coisas subjetivas. Os usuários terão comportamentos de busca de drogas. Portanto, pode-se dizer que a relação de dependência está relacionada aos valores internos e externos do ser humano, pois o vício não é apenas desencadeado por diferentes aspectos da personalidade, mas também desencadeado por uma sociedade que historicamente busca novos prazeres. 28 7 CLASSIFICAÇÃO DAS SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS Fonte: tercerangel.org Antes de classificar as substâncias psicotrópicas, é necessário compreender alguns conceitos sistematizados pela Organização Mundial da Saúde (OMS): Droga: “qualquer entidade química ou mistura de entidades (outras que não aquelas necessárias para a manutenção da saúde, como, por exemplo, água e oxigênio) que alteram a função biológica e possivelmente a sua estrutura”. Drogas psicoativas: “são aquelas que alteram comportamento, humor e cognição”. Os principais efeitos nocivos do uso de substâncias podem ser divididos em quatro categorias. Primeiro, temos efeitos crônicos na saúde. No caso do álcool, inclui cirrose hepática e muitas outras doenças crônicas; no caso do tabaco fumado na forma de cigarros, inclui câncer de pulmão, enfisema e outras doenças crônicas. Em muitos países, o uso de heroína injetável e o uso de agulhas compartilhadas são importantes transportadores para a transmissão 29 de patógenos infecciosos, como o HIV e os vírus da hepatite B e C. Em segundo lugar, a substância tem efeitos agudos ou de curto prazo para a saúde em drogas como opióides e álcool, principalmente incluindo overdose de drogas. Esta categoria também inclui acidentes causados pelo efeito da substância na coordenação física, concentração e discriminação sob as condições de qualidade necessárias. Nesta categoria, os acidentes causados por dirigir um veículo após o consumo de álcool ou outras substâncias são muito evidentes, mas também estão incluídos outros acidentes, suicídio e (pelo menos no caso do álcool) agressão. O terceiro e o quarto tipos de efeitos prejudiciais incluem consequências sociais prejudiciais: problemas sociais graves, como separação ou detenção repentina, e problemas sociais de longo prazo, como capacidade insuficiente relacionada ao trabalho ou papéis familiares. Drogas psicotrópicas: “Eles desempenham um papel no sistema nervoso central, produzem mudanças no comportamento, humor e cognição, têm um grande efeito de aprimoramento e, portanto, estão sujeitos ao autogerenciamento. ” Portanto, os psicotrópicos são substâncias que podem causar dependência. O primeiro grupo são as drogas que reduzem a atividade cerebral, ou seja, reduzem a função cerebral, o que significa que as pessoas que usam essa droga "não se interessam" pelas coisas e "aos poucos" se "desconectam". É por isso que essas drogas são chamadas de inibidores da atividade do sistema nervoso central (SNC - o sistema nervoso central é a parte localizada dentro da caixa do crânio; o cérebro é o principal órgão do sistema). Na segunda categoria das drogas psicotrópicas, essas drogas agem aumentando nossa atividade cerebral, ou seja, estimulam a função, de forma que as pessoas que usam essas drogas fiquem em um estado "ligado" e "elétrico" sem dormir. É por isso que essas drogas são chamadas de estimulantes da atividade do sistema nervoso central. Existe uma terceira classe de drogas que atuam alterando qualitativamente a atividade do cérebro. Portanto, não se trata de mudanças 30 quantitativas (como aumentar ou diminuir a atividade cerebral). Aqui, mudança é qualidade. O cérebro começa a não funcionar adequadamente e a mente humana ficando “perturbada”. Portanto, a terceira categoria de medicamentos é chamada de distúrbio de atividade da doença central. 7.1 Substâncias Depressoras do Sistema Nervoso Central Fonte: pt.slideshare.net Drogas depressivas do sistema nervoso central (SNC) reduzem a atividade do sistema e retardam sua função. Com efeito, as consequências desse fenômeno são sonolência, desatenção, movimentos mentais lentos, reflexos enfraquecidos e uma sensação de relaxamento e tranquilidade. As seguintes substâncias se enquadram nesta categoria: Benzodiazepínicos Álcool Solventes Opiáceos 31 7.2 Substâncias Estimulantes do Sistema Nervoso Central Fonte: slideplayer.com.br As substâncias estimulantes do sistema nervoso central aceleram as atividades do sistema nervoso central, o que leva à aceleração das atividades psicomotoras. Essa excitação excessiva aumenta o estado de alerta e a concentração, reduz o sono e o apetite, produz euforia e causa irritabilidade. As substâncias pertencentes a esta categoria são as seguintes. Cocaína e crack Anfetaminas Tabaco 32 Fonte:proavirtualg10.pbworks.com 7.3 Substâncias Perturbadoras do Sistema Nervoso Central As substâncias que interferem no SNC podem causar distúrbios da atividade cerebral, resultando em alucinações que geralmente são de natureza visual. São consideradas drogas psicoticomiméticas porque mimetizam o estado psicótico (delírios, alucinações, perda do conceito de realidade) do indivíduo que as usa. As seguintes substâncias se enquadram nesta categoria: Cannabis LSD Cogumelos Anticolinérgicos 33 Fonte: extremosbioquimica.spot.com 8 TEORIA E TÉCNICA COGNITIVA APLICADA À DEPENDÊNCIA QUÍMICA Segundo SILVA; et al., (2004) a TC é uma abordagem estruturada ou semiestruturada, diretiva, ativa e de prazo limitado. Ela se fundamenta na racionalidade teórica de que o afeto e o comportamento de um indivíduo são, em grande parte, determinados pelo modo como ele estrutura o mundo. Neste sentido, mais importante do que a situação real, é a avaliação que o indivíduo faz a respeito dela. Uma mesma situação pode, portanto, desencadear diferentes emoções (tristeza, raiva, ansiedade, etc). Por exemplo, imaginemos um indivíduo que chega à garagem do seu prédio e percebe que esqueceu as chaves do carro no apartamento. Ele pode avaliar esta situação de várias maneiras. Exemplifiquemos duas: 1) Ao perceber que está sem as chaves, ele pode pensar que é uma pessoa “azarada” e que seu dia começara ruim; a emoção que acompanha essa avaliação é tristeza e desânimo. Com este sentimento, seu desempenho no trabalho tende a ser baixo, afirma SILVA; et al., (2004). 34 2) Ele pode, ao contrário, pensar que, se subir ao apartamento para pegar as chaves, vai se atrasar. A emoção que ocorre neste caso é ansiedade. Ele chega ao trabalho tão ansioso que não consegue seguir a programação do dia: seu desempenho também cai. O objetivo da TC é reestruturar as cognições disfuncionais e dar flexibilidade cognitiva no momento de avaliar situações específicas. Como a exemplificada acima. A TC visa à resolução de problemas focais, objetivando, em última análise, dotar o paciente de estratégias cognitivas para perceber e responder ao real de forma funcional, afirma SILVA; et al., (2004). Fonte: alessandrouniclinicas.com.br Segundo SILVA; et al., (2004) a TC contrasta com a BT por dar maiorênfase às experiências internas (pensamentos, sentimentos, desejos). O terapeuta cognitivo formula as ideias e crenças disfuncionais do paciente sobre si, sobre suas experiências e sobre seu futuro em hipóteses e, então, testa a validade dessas hipóteses de uma forma objetiva e sistemática. Segundo COSTA (2018), Beck preconiza que as crenças adictivas giram em torno da busca de prazer, da solução de problemas e do alívio do desconforto 35 e variam de pessoa para pessoa e com o tipo de droga preferida. Entre as crenças adictivas, cita: • a droga é necessária para manter o equilíbrio psicológico ou emocional; • a droga melhorará o funcionamento social e intelectual; • a droga trará prazer e excitação; • a droga fornecerá força e poder; • a droga terá efeito calmante; • a droga trará alívio para a monotonia, ansiedade, tensão e depressão; • sem o uso da droga, o craving – fissura – continuará, indefinidamente e cada vez mais forte. Em oposição às crenças adictivas, os pacientes apresentam crenças de controle, aquelas que diminuem a possibilidade do uso e abuso de substâncias. Os dependentes lidam com situações mistas, ou seja, convivem com a coexistência de crenças adictivas e crenças de controle. Afirma SILVA; et al., (2004). Os pilares conceituais da prática de TC são os seguintes: - Esquemas e Crenças Básicas Segundo SILVA; et al., (2004) os Esquemas são estruturas psíquicas que contêm avaliações firmemente estabelecidas. O Esquema, se traduzido em palavras, forma criações hipotéticas chamadas de Crenças Básicas. As Crenças Básicas, quando disfuncionais, caracterizam-se por serem irracionais, supercentralizadas e rígidas. Levam a sofrimento psíquico e comportamentos mal adaptados, além de impedirem a realização de metas. Segundo Beck, as Crenças Básicas disfuncionais podem ser classificadas em dois tipos: 1) Crenças de Desamparo e 2) Crenças de “Não ser querido”. 36 - Pensamentos automáticos Afirma SILVA; et al., (2004), as Crenças Centrais Básicas são avaliações genéricas sobre si mesmo, sobre o outro e sobre a relação com o mundo que o cerca. Na maioria das vezes, tais crenças não são conhecidas e claras para o indivíduo (são inconsciente) mas, sob determinadas circunstâncias, influenciam a percepção sobre as coisas e é expressa como pensamento automático, específico a uma situação. Os pensamentos automáticos derivam de um “erro” cognitivo e têm íntima relação com as crenças. - Estratégia compensatória Conforme SILVA; et al., (2004), são comportamentos que visam aliviar ou anular os pensamentos automáticos e emoções negativas. Por exemplo, imaginemos um paciente músico, diante de uma situação na qual vai se apresentar publicamente. Ocorre-lhe um pensamento: “Vou errar”. Lembrando que o pensamento automático é uma constatação inflexível, o paciente sente-se triste, com medo e ansioso. Ele, então, faz uma suposição: “se eu beber, conseguirei ficar menos ansioso e poderei me apresentar”. Pede uma bebida alcoólica e bebe. O comportamento de busca e ingestão do álcool é um exemplo de Estratégia Compensatória. Poderíamos nos perguntar: por que esse conjunto de cognições ocorreu? Uma explicação possível seria a seguinte: o fato de ser exposto a essa situação ativou, neste paciente, um Esquema disfuncional que, em palavras, seria: “Sou inadequado“; “Sou incapaz”. A partir desta ativação, desencadeou- se todo o processo cognitivo descrito. O terapeuta cognitivo chega a hipóteses semelhantes à descrita acima ao longo do processo terapêutico. Ele vai testando, reconstruindo suas hipóteses e se aproximando da Estrutura Cognitiva do paciente. Essa construção da hipótese cognitiva global é chamada de Conceituação Cognitiva, afirma SILVA; et al., (2004). 37 - Conceituação Cognitiva Segundo SILVA; et al., (2004) a Conceituação Cognitiva é uma hipótese sobre pensamentos, suposições, emoções e crenças do paciente. Ela pode ser reformulada no decorrer da terapia, à medida que novas informações e evidências vão se reunindo. 9 TÉCNICAS UTILIZADAS PELA TERAPIA COGNITIVA Conforme SILVA; et al., (2004) as técnicas utilizadas visam identificar, testar a realidade e corrigir as conceituações cognitivas distorcidas. O paciente é instruído sobre seu problema sobre a terapia. A própria terapia é uma experiência de aprendizado para o paciente. Durante o processo terapêutico, o paciente aprende as técnicas utilizadas pelo terapeuta para que se torne o seu próprio terapeuta. As técnicas mais usadas na TCC do dependente químico, embora sejam de uso comum nas terapias cognitivas em geral, serão sucintamente descritas a seguir: Identificação de pensamentos automáticos (PA) Avaliação e questionamento de PA Registro diário de pensamentos automáticos disfuncionais (RPD) Identificação de crenças Avaliação e modificação de crenças Seta descendente Solução de problemas Exame das vantagens e desvantagens Distração, Agendamento e monitorização, Exposição gradual e dificuldade crescente, Experimentos comportamentais, Cartões de enfrentamento, Relaxamento Exercício físico, Dramatização, Treinamento de assertividade, afirma SILVA; et al., (2004). 38 Identificação de pensamentos automáticos (PA) Segundo COSTA (2018), logo após uma importante modificação de humor ou o surgimento de forte vontade de usar a droga, o terapeuta, ou o próprio paciente, deve investigar: o que você estava pensando naquele momento, naquela situação? Que pensamento você acha que lhe passou pela cabeça? Outras perguntas podem auxiliar a identificação do pensamento automático: O que você acha que estava pensando naquela situação? Que pensamento lhe passou pela cabeça? Poderia estar pensando...? Ou? O que essa situação significou para você? Será que você pensou…? (O terapeuta propõe um pensamento neutro ou oposto ao esperado.) Afirma COSTA (2018). Avaliação e questionamento de PA Depois de determinar uma ou mais pensamentos automáticos, o terapeuta ajudará o paciente a avaliar sua precisão, utilidade e consequências. Para tanto, ele usou métodos de questionamento socrático, não só podem guiar os pacientes para tirar suas próprias conclusões, mas também pode treiná-lo para fazer este exercício sozinho. Conforme COSTA (2018) o paciente deve avaliar, de O a 10, o quanto acredita em seu pensamento e depois questioná-lo. As perguntas básicas do questionamento socrático são: Quais as evidências reais a favor deste pensamento? Quais as evidências reais contra este pensamento? Poderia haver outra explicação? Outra hipótese? Se o PA for verdadeiro, o que de pior poderia acontecer? Você conseguiria superar isto? O que de melhor poderia acontecer? Qual o resultado mais provável? O que você deveria fazer a esse respeito? Qual a consequência de você acreditar neste pensamento? O que poderia fazer para modificar este pensamento? O que você diria para um amigo ou parente que estivesse nessa situação? 39 Nem todas as perguntas são sempre feitas e muitas vezes precisam ser ajustadas. Após questionamento e reavaliação, o paciente ainda acreditava em AP. Registro Diário de Pensamentos Disfuncionais (RPD) Segundo COSTA (2018) treinar o paciente e solicitar que ele registre seus pensamentos disfuncionais, no final do dia, de preferência, ainda na vigência do desconforto psicológico, é técnica muito utilizada na TCC. No tratamento dos dependentes químicos, o mesmo é feito em relação às fissuras. Os usuários tendem a seguir usando drogas em função de seus pensamentos automáticos e crenças disfuncionais e das emoções negativas resultantes. O preenchimento do RPD ainda durante a fissura ocupa um tempo no qual pode ocorrer a diminuição da mesma. Além disso, o exame da adequação e da veracidade dos PA pode levar à redução da intensidade da fissura.O preenchimento do RPD como tarefa de casa, no intervalo das sessões, oportuniza ao paciente seguir identificando, avaliando e questionando seus pensamentos automáticos. E permite ao terapeuta ter uma ideia do que realmente ocorre com seu paciente entre as sessões, afirma COSTA (2018). Identificação de crenças Conforme COSTA (2018) as crenças sobre drogas, sobre fissuras e as crenças intermediárias e centrais do paciente podem ser identificadas pelo uso das mesmas técnicas: Observando quando um pensamento automático expressa uma crença; usando a técnica da seta descendente a partir de um PA; examinando diversos PA e encontrando uma temática comum; pinçando uma suposição do paciente e explorando-a; aplicando inventários de crenças sobre uso de drogas e sobre fissuras. 40 Avaliação e modificação de crenças A avaliação e a modificação de crenças é uma atividade central na terapia cognitiva em geral. Na TCC dos dependentes químicos, isso se repete. Crenças centrais e crenças intermediárias identificadas, muitas vezes relacionadas com a comorbidade apresentada pelo paciente (frequentemente transtorno depressivo, transtorno de ansiedade e da personalidade), precisam ser modificadas, para que seja obtida melhora mais duradoura, afirma COSTA (2018). Segundo COSTA (2018) as crenças adictivas identificadas, sejam antecipatórias, de alívio ou permissivas, devem ser modificadas, e crenças de controle devem ser reforçadas, elaboradas e testadas. Para isso, podem ser usados: o questionamento socrático; o exame das vantagens e desvantagens de acreditar na crença; o experimento comportamental; a dramatização. Seta descendente COSTA, (2018) afirma que é uma técnica usada, com frequência, para atingirmos uma crença a partir da identificação de um PA. Parte-se do PA questionando: se isto é verdadeiro, significa o quê? E se isto é verdadeiro, significa o quê? De maneira repetitiva, até que muitas vezes se chega a uma crença central. Exemplo: Pensamento automático: “Não dá para ir a uma festa e não beber”. Se isto é verdade, significa o quê?: “Que eu não consigo me divertir se não beber”. E não se divertir na festa, significa o quê?: “Não vou poder falar com ninguém, dançar”. E se for assim, significa o quê?: “Que eu sou uma porcaria, não sou de nada”. Ser uma porcaria, não ser de nada, significa o quê?: “Que eu sou um incapaz, um fracasso” – a crença central subjacente. 41 Solução de problemas Conforme COSTA (2018), essa técnica básica na TCC e pode ser treinada e utilizada desde o início da terapia. Ela visa a auxiliar o paciente a: identificar e delimitar o problema; pensar nas diversas soluções possíveis (tempestade de ideias); examinar os prós e os contras para cada solução pensada; escolher a melhor solução disponível; colocá-la em prática; avaliar a efetividade e a adequação da solução escolhida. Exame das vantagens e desvantagens É uma técnica utilizada para auxiliar os pacientes na tomada de decisões. O paciente é estimulado a escrever as vantagens e desvantagens de determinada decisão ou comportamento e examiná-las e, então, tomar sua decisão. Pode ser utilizada, também, na análise sobre a conveniência de manter determinada crença ou de aceitar uma crença nova, Segundo COSTA (2018). COSTA (2018) afirma também que na TCC das dependências químicas, ela pode ser usada para examinar as vantagens e desvantagens do uso da droga e da abstinência na motivação do paciente, no trabalho de modificação das crenças adictivas e na elaboração de novas crenças de controle. Os usuários de drogas, tipicamente, mantêm crenças que minimizam as desvantagens do uso e maximizam suas vantagens. Os pacientes são orientados a preencher uma matriz, com quatro áreas, nas quais listarão as vantagens de usar, as desvantagens do uso, as vantagens e as desvantagens da abstinência, conforme COSTA (2018). 42 Distração De acordo com conforme COSTA (2018) esta é uma técnica importante no manejo da ansiedade e da fissura. Nestas condições, ansiosa e fissurada, a pessoa tende a concentrar sua atenção nas várias sensações corporais e nos pensamentos automáticos concomitantes. A “distração” consiste no esforço para mudar o foco da atenção do mundo interno para o ambiente externo. Como exemplos de distração: retirar-se do ambiente, se nele está presente o desencadeante da ansiedade e da fissura; descrever detalhes do meio ambiente (carros, cores, contagens de objetos); envolver-se em diálogo sobre outro tema com pessoa disponível (amigo, familiar, consultor, terapeuta); envolver-se em atividade prática, como tarefa doméstica, arrumação de arquivo, organização de livros, banho; lembrar e executar poema, oração ou música de seu agrado, silenciosamente ou em bom som; envolver-se em atividade lúdica e que requeira atenção: jogos de carta, videogames, palavras cruzadas, quebra- cabeças, jogos de computador, afirma COSTA (2018). Agendamento e monitorização Conforme COSTA (2018) é um método simples e direto. O paciente, concordando em utilizá-lo, recebe uma grade com os sete dias da semana, divididos em intervalos de meia ou uma hora, para registrar – monitorar – as atividades realizadas, o grau de satisfação e de competência percebidos em cada atividade e o estado de humor. Esta técnica visa a: Tornar claro o dia-a-dia do paciente, suas atividades reais durante a semana e como elas relacionam com suas fissuras e com seu uso de drogas; Programar atividades futuras – agendamento partindo do registro das atividades semanais (monitoração) e planejando atividades que o afastem do uso de drogas; Acompanhar o cumprimento das atividades agendadas. 43 Segundo COSTA (2018) com a interrupção do uso de drogas, pode-se sobrar muito tempo livre na vida do paciente, e é possível que sua rede social esteja composta exclusivamente por usuários. Esta monitoração servirá como uma linha basal, inicial, para introduzir ou resgatar atividades prazerosas ou gratificantes, assim como planejar, progressivamente, atividades relacionadas com drogas, o que levará o paciente, a médio prazo, a criar uma nova rede social e a organizar um novo estilo de vida. COSTA (2018) afirma que este é um método simples, mas pode ser de difícil implementação, pois exige uma série de habilidades que o paciente talvez nunca tenha desenvolvido. É previsível o surgimento de resistências, sabotagens, evitação passiva, além de sentimentos de desesperança, baixa autoestima, frustração. Cada obstáculo, e os PA com ele relacionados, devem ser abordados à medida que novos passos forem programados. Exposição gradual e dificuldade crescente Segundo COSTA (2018) a busca da vida em abstinência obriga o paciente a algumas tarefas sentidas como muito grandes, muito difíceis e, por isso, desanimadoras. Esta técnica consiste em auxiliar o paciente a dividir esta (grande) tarefa em diversas etapas e acompanhá-lo no planejamento e na execução de cada passo. Exemplo: paciente cocainômano, cujos amigos atuais todos usam a mesma droga, pode decidir (e ser apoiado a) realizar uma tarefa simples, como ir ao cinema com um vizinho ou colega de serviço que não use droga. Após o cumprimento da tarefa, examinado seu sucesso (ou não) e os PA relacionados com sua execução, é decidida a nova tarefa, de maior dificuldade e exposição. 44 Experimentos comportamentais São usados para testar tanto a validade de pensamentos e crenças sobre o uso de drogas como as crenças centrais do paciente. Este escolhe o pensamento ou a crença que quer testar (por sua importância), planeja seu experimento cuidadosamente e o implementa. Posteriormente, examina seus resultados e a possibilidade de modificar sua crença, conforme COSTA (2018). Exemplo: Umpaciente pode ter a crença de que jamais conseguirá se divertir em uma festa sem álcool e cocaína. Programa cuidadosamente sua ida a uma festa de não-usuários de cocaína, planeja abster-se de álcool na festa e, posteriormente, avalia os resultados. Segundo COSTA (2018), um outro paciente pode ter a crença de que perderia todos os seus amigos se parasse de usar maconha. Poderia planejar uma reunião com seus amigos para lhes comunicar que parou de usar a droga e convidá-los a continuarem companheiros em atividades sem drogas. Após algum tempo, seriam examinados os resultados. Quanto aos amigos que perdesse, ele seria estimulado a examinar o significado dessas amizades pré-abstinência. Os amigos que conservasse estariam corrigindo sua crença de que perderia todos os amigos se não usasse maconha, afirma COSTA (2018). Cartões de enfrentamento De acordo com COSTA (2018), são cartões com lembretes que o paciente pode carregar consigo ou afixar em locais frequentemente visíveis (espelho do banheiro, porta da geladeira, agenda, painel do carro). Os lembretes podem ser elaborados na sessão ou pelo paciente, como tarefa de casa. Normalmente constituem: respostas funcionais a pensamentos automáticos disfuncionais ou a crenças sobre drogas (crenças de controle); estratégias de enfrentamento da fissura; pensamentos ou crenças que fortaleçam a motivação. Os cartões de enfrentamento são instrumentos importantes no enfrentamento das fissuras. 45 Relaxamento Segundo COSTA (2018), nos usuários de drogas, com frequência, a ansiedade é um sintoma importante. Alcoolistas e tabagistas muitas vezes relacionam o uso de drogas com sua necessidade de relaxar. Como sintoma de abstinência e na fissura de diversas substâncias, a ansiedade se destaca. Por isso, as técnicas de relaxamento, provendo aos pacientes instrumentos de redução da ansiedade, são úteis no tratamento das dependências. As principais técnicas de relaxamento são de dois tipos: exercícios respiratórios e relaxamento muscular progressivo. Ambas são técnicas nas quais há redução importante da ansiedade, sendo, portanto, úteis nas dependências e no manejo da fissura. O relaxamento, durante a fissura, além de reduzir a ansiedade, fornece ao paciente um intervalo de tempo durante o qual a intensidade da fissura pode diminuir. Além disso, o relaxamento pode permitir ao paciente a elaboração e confirmação de crenças de que ele está no controle e de que é capaz de lidar com sua fissura, afirma COSTA (2018). Exercício físico Conforme COSTA (2018), geralmente os usuários de drogas estão afastados da prática de esportes e de atividades físicas sadias. A introdução de exercícios físicos no tratamento desses pacientes é importante por três aspectos: A prática de exercícios físicos é um importante passo no desenvolvimento de um estilo de vida sem drogas; É instrumento importante no manejo de emoções negativas como ansiedade, insegurança e irritabilidade; Contribui na formação de uma nova a imagem, mais sadia, confirmando crenças mais positivas do paciente a respeito de si mesmo. 46 Dramatização Segundo COSTA (2018), a dramatização (roleplay, encenação) é um recurso que pode ser utilizado nas intervenções de tratamento das sete fases do modelo adictivo, porque se presta aos mais diversos propósitos: obter um PA, provocar reações emocionais, provocar fissura e treinar o seu manejo, questionar PA, avaliar crenças, modificá-las e testar novas crenças, treinar habilidades, etc. O paciente deve ser estimulado e treinado a utilizar a dramatização, e isso é muito facilitado pela participação ativa do terapeuta na sessão, assumindo o papel dos “outros” (patrão, cônjuge, amigo, etc.), bem como o do próprio paciente, quando cabe a este trocar de papel. As técnicas de dramatização podem, com mais facilidade, ser utilizadas em tratamentos em grupo, afirma COSTA (2018). Treinamento de assertividade De acordo com COSTA (2018) espera-se que o indivíduo seja capaz de expressar e defender com clareza e firmeza suas decisões. A fim de capacitá-lo para isso, utilizam-se diversas técnicas: dramatização, solução de problemas, exposição gradual, experimentos comportamentais. A assertividade deve ser dirigida não apenas à capacidade do paciente de “dizer não” ás drogas, mas também às diversas da sua vida – familiar, afetiva, profissional – nas quais o paciente necessita fazer reajustes que, em conjunto, vão configurar uma modificação no seu estilo de vida. 47 10 BIBLIOGRAFIA BITTENCOURT, Ana Luiza Portela; FRANÇA, Lucas Garcia; GOLDIM, José Roberto. Adolescência vulnerável: fatores biopsicossociais relacionados ao uso de drogas, 2015 COLETT, Clarice. Dependência Química E Relações Sociais No Centro de Detenção Provisória De São José Dos Pinhais - PR. Matinhos, 2010. CORDEIRO, Daniel Cruz. DEPENDÊNCIA QUÍMICA: CONCEITUAÇÃO E MODELOS TEÓRICOS, 2006 COSTA, Valter Pereira da Costa. A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), 2018 DA SILVA, Cláudio Jerônimo; SERRA, Ana Maria. Terapias Cognitiva e Cognitivo-Comportamental em Dependência Química. São Paulo, 2004. GALDURÓZ, José Carlos Fernandes; FERRI, Cleusa Pinheiro. Detecção do uso e diagnóstico da dependência de substâncias psicoativas, 2016 PILLON, Sandra Cristina; LUIS, Margarita Antônia Villar. Modelos explicativos para o uso de álcool e drogas e a prática da enfermagem, 2004 SILVA, Poliana Valéria da; ALMEIDA, Hélen Rimet Alves. AS CONTRIBUIÇÕES DA TERAPIA COGNITIVA COMPORTAMETAL NO TRATAMENTO DA DEPENDÊNCIA QUÍMICA, 2020 SOUZA, Amanda Magalhães; COMPREENSÕES PSICOLÓGICAS SOBRE A DEPENDÊNCIA QUÍMICA, 2017
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