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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS FACULDADE DE FARMÁCIA (FF/UFG) Caso Clínico 2 - Hematologia Clínica Lorena Mendes Soares Goiânia 2022 1. Caso C.T.F.M., 56 anos, sexo masculino, compareceu ao ambulatório do HC, queixando de parestesia dos membros inferiores, fraqueza, cansaço, dispneia, dor de cabeça e perda de apetite. Relatou que fez cirurgia bariátrica há seis meses. O médico que o examinou observou palidez cutâneo-mucosa e língua lisa. Para elucidação diagnóstica foram solicitados exames complementares, que apresentaram os seguintes resultados: Exames Resultado Referência Ferritina 300 mcg/L 20 a 250 mcg/L Ferro sérico 150 mcg/dL 37 a 145 mcg/dL Vitamina B12 103 pg/mL 200 a 950 pg/mL Ácido Fólico 10 ng/mL 3,0 a 17 ng/mL Eritrograma Série Branca Ht = 35,7 Hm = 3,4 x 106/mm3 Hb = 10,7 g/dL VCM = 105 fL HCM = 32 pg CHCM = 30% RDW = 16,8% Desvio a direita 42,0 a 52,0% 4,5 a 5,5 x 106/mm3 14,0 a 16,0 g/dL 80 a 100 fL 27 a 32 pg 32 a 36% 11,6 a 14,8% Ausência de desvio Microscopia: 2. Qual o problema do paciente Os sinais clínicos, o índice de B12 baixo, a anemia macrocítica, os neutrófilos hipersegmentados e a anisocitose sugerem uma anemia megaloblástica. 3. Discussão A anemia megaloblástica é caracterizada por um aumento de todas as células do corpo, incluindo as células da medula óssea. Nessa anemia, há diminuição da capacidade celular de sintetizar ácido desoxirribonucleico, resultando em anormalidades hematológicas no sangue periférico e na própria medula. Duas vitaminas são necessárias para a síntese normal de DNA e hematopoiese: vitamina 9, conhecida como ácido fólico, e vitamina B12, conhecida como cobalamina. Se algum desses fatores for deficiente, os glóbulos vermelhos não podem produzir DNA. A deficiência de vitamina B12 pode interferir no metabolismo da homocisteína e nas reações de metilação do organismo, levando a distúrbios hematológicos, neurológicos e cardiovasculares (MONTEIRO et al, 2019). A classificação morfológica é baseada nos índices hematimétricos, o volume corpuscular médio – VCM e hemoglobina corpuscular média – HCM. Do ponto de vista morfológico, as anemias podem ser classificadas em: microcíticas e hipocrômicas – VCM e HCM baixos, macrocíticas e normocrômicas – VCM alto e HCM normal e normocíticas enormocrômicas – VCM e HCM normais (MONTEIRO et al, 2019). Nas anemias por deficiência de vitamina B12 e/ou ácido fólico, o VCM é maior que 100 fL e não há reticulocitose, representando anemia megaloblástica. O diagnóstico depende da avaliação das alterações morfológicas características no sangue periférico e na medula óssea, mas é necessário definir com precisão a deficiência vitamínica que causa a anemia. Um diagnóstico diferencial entre deficiência de vitamina B12 ou folato é essencial para uma terapia adequada (MONTEIRO et al, 2019). Temos também uma alteração clássica, a hipersegmentação do núcleo em divisão, que afeta três linhagens hematopoiéticas: as linhagens vermelha, granulocítica e megacariocítica. O esfregaço de sangue mostra alterações eritrocitárias como macro-ovalócitos e graus extremos de anisocitose e poiquilocitose com esquistócitos, eritroblastos e até megaloblastos, dependendo do grau de anemia. A pancitopenia ocorre no hemograma devido à redução da concentração de hemácias, leucócitos e plaquetas, e a gravidade da anemia megaloblástica aumenta com a cronicidade da doença (MONTEIRO et al, 2019). Após a cirurgia bariátrica podem ocorrer alterações nutricionais que se manifestam em semanas ou meses. As carências nutricionais estão relacionadas a mudanças fisiológicas e anatômicas que prejudicam a absorção e ingestão de macro e micronutrientes (REGINALDO; SILVA, 2014). A cobalamina é uma vitamina hidrossolúvel, está presente nos alimentos de origem animal, principalmente na carne, leite e ovos. Esta vitamina também é sintetizada por bactérias intestinais (REGINALDO; SILVA, 2014). A cobalamina é liberada no estômago pela digestão de proteínas de origem animal, logo após é capturada pela proteína R, e em seguida é degradada pelas proteases pancreáticas que fazem a transferência da molécula de cobalamina para o fator intrínseco (FI) liberado pelas células parietais do estômago. A deficiência da vitamina B12 é muito frequente após o método bypass gástrico em y de Roux (BGYR), devido às alterações anatômicas do estômago e intestino (REGINALDO; SILVA, 2014). As anemias megaloblástica, perniciosa e ferropriva podem ocorrer após a CB no método restritivo dissabsortivo devido à exclusão do duodeno e jejuno proximal, que são locais de absorção. Muitas vezes a hemoglobina se encontra em níveis normais e a transferrina está baixa, devido à deficiência de ferro. A Carência de vitamina B12 após cirurgia bariátrica no método BGYR, ferritina sérica representa os estoques de ferro corporal, sendo assim seu valor diminuído em pacientes após BGYR sugere depleção dos estoques de ferro como implicação da inadequada ingestão oral ou a deficiente absorção (REGINALDO; SILVA, 2014). 4. Exames Complementares A dosagem de vitamina B12 sérica é o teste mais utilizado para diagnosticar deficiência de vitamina B12,tem menor custo e ser mais conhecido. Os níveis de vitamina B12 séricos são considerados baixos quando sua concentração é inferior a 200pg/mL (GARAY, 2006). Entretanto, esse exame apresenta limitações de sensibilidade e muitas controvérsias sobre sua especificidade (REGINALDO; SILVA, 2014). O mielograma, vai confirmar as alterações megaloblásticas. O quadro citológico medular é muito característico e quando a punção é realizada precocemente, antes do uso de medicamentos com vitamina B12 ou ácido fólico, o diagnóstico de anemia megaloblástica pode ser confirmado com segurança (REGINALDO; SILVA, 2014). Na medula óssea observa-se intensa hiperplasia, com acentuada hiperplasia da linhagem eritróide que é composta por megaloblastos, diminuição do número de precursores maduros da série branca, diminuição dos megacariócitos, que se apresentam mais basofílicos e hiperlobulados. Além disso, há grandes quantidades de aberrações citológicas, como megaloblastos gigantes ou com núcleos polilobulados, binucleados, contendo múltiplos micronúcleos, pontes citoplasmáticas e nucleares, cariorréxis (REGINALDO; SILVA, 2014). 5. Diagnóstico O diagnóstico de anemia megaloblástica dependerá do quadro clínico por vezes sugestivo, mas os dados observados nem sempre são suficientes para concluir o diagnóstico. É necessário observar as alterações morfológicas, características no sangue periférico e na medula óssea. Além das alterações morfológicas específicas do hemograma e mielograma, são necessários outros exames: cobalamina sérica, folato sérico e/ou eritrocitário, metilmalonato urinário e níveis de homocisteína (MONTEIRO et al, 2019). 6. Tratamento O acompanhamento do nutricionista após a cirurgia é extremamente importante, pois ele vai indicar a suplementação da cobalamina, bem como de outras vitaminas, já que a capacidade gástrica está diminuída, e logo sua ingestão a partir da alimentação é escassa. Com a suplementação os pacientes terão chances reduzidas de desenvolver os danos ocasionados em consequência desta carência. 7. Referências MONTEIRO, M.D.; FERREIRA, N.F.; MARINS, F.R.; ASSIS, I.B. Anemia Megaloblástica: Revisão de Literatura. Revista Saúde em Foco. Ed. 11. 2019. REGINALDO, G.J. SILVA, A.F. Carência de Vitamina B12 Após Cirurgia Bariátrica no Método BGYR. Revista Saúde e Pesquisa, v. 7, n. 3, p. 487-494. 2014.
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