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1 COMPETÊNCIAS CENTRAIS: ESTUDOS DE CASO Material extraído de: JANUZZI, U. A.; CÂMARA, M. G. Um Estudo dos Modelos Atuais Predominantes da Redes de Firmas e suas Competências Centrais. UEL, 2010. INTRODUÇÃO Apesar de a teoria econômica ter dado maior atenção ao fenômeno de redes de firmas somente a partir do final dos anos 1980, não se pode reconhecer a sua existência somente a partir desse período. A formação de redes de firmas é um fenômeno antigo que remonta ao início do século XX, como um mecanismo que permitiu viabilizar as economias de escala e de escopo1 da pequena produção artesanal. Freeman (1991) consegue expressar uma definição clara e generalizada de rede de firmas: “rede é um conjunto fechado de conexões seletivas e explícitas, com parceiros preferenciais num espaço de complementaridade de ativos e relacionamento de mercados da firma, tendo como maior objetivo à redução da incerteza. Incluem-se também nesta definição os relacionamentos informais ou de natureza tácita das redes”. (FREEMAN, 1991: pp. 449-514) Atualmente, com o advento de sucessivas inovações tecnológicas em todos os segmentos que envolvem uma organização, os modelos de rede de firmas se multiplicaram e também se inovaram. O objetivo da rede de firmas mudou em função do fato de que o mundo vive atualmente um novo paradigma econômico e tecnológico no qual a matéria-prima básica é a informação. A produção se organiza de forma mais flexível e globalizada, através de uma padronização das tecnologias e do consumo. A organização do presente estudo, caracterizado unicamente de caráter bibliográfico, enfoca inicialmente a definição, características, modelos e diferentes concepções de redes de firma. Na sequência, o estudo foca a evolução dois modelos específicos de rede. Em seguida o estudo faz uma abordagem sobre a influência da inovação tecnológica em ambientes de redes de firma e, se fixa na abordagem da inovação tecnológica em um modelo específico de rede. Busca-se, por fim, comprovar os objetivos propostos para este estudo através do relato de três casos atuais de redes de firma. 1 A EVOLUÇÃO DE DOIS MODELOS DE REDE A primeira concepção de redes de firmas do início do século XX foi em plena hegemonia fordista, onde a forma de produzir era predominantemente 1 De acordo com KUPFER & HASENCLEVER (2002), existe economia de escopo quando é mais barato produzir dois produtos juntamente (produção conjunta) do que produzi-los separadamente. Fator de importância particular para explicar economias de escopo é a presença de matérias-primas comuns na fabricação de dois ou mais produtos, assim como as complementaridades na sua produção. 2 marcada por características paradigmáticas, tais como: economia de escala, alta padronização e especialização nos processos, departamentalização e hierarquias bem definidas. Ao contrário desta rigidez no qual os contratos de produção são elementos fundamentais, o modelo de rede surge como uma proposta alternativa, baseando-se em um alto grau de informalidade no transito dos fluxos entre os pontos. Nos modelos originários predominantemente no Japão e na Itália, as ligações são determinadas muito mais pelas relações de parentesco e de confiança, nas quais o elemento cultural predomina sobre as relações contratuais formais. Devido à sua característica de distribuição de custos entre os seus pontos, o modelo de rede proporcionava na época uma alternativa vantajosa, com flexibilidade praticamente impossível no modelo fordista, conseguindo desta forma viabilizar a produção de baixa escala, de caráter artesanal e, ao mesmo tempo, economias de escopo, alcançando relativo sucesso frente ao modelo fordista. O modelo originário na Itália é identificado por vários autores como Distritos Industriais e segue as características dos clusters, já o modelo originário no Japão é baseado nas redes Keiretsu e se identifica com os modelos de subcontratação (FREEMAN, 1991: pp. 499-514). Este modelo caracteriza-se pela presença de relações de cooperação entre fornecedores, clientes e produtores, podendo envolver vários níveis. Incorpora, dentre outras tendências, o alargamento da duração dos acordos entre empresas, uma nova repartição de tarefas entre o contratante e as empresas subcontratadas, uma intensificação de cooperação técnica e do intercambio de informações entre os agentes e, por fim, uma redução dos números de subcontratados diretos em favor de praticas de cooperação mais interativa com os subcontratados principais. Ambos os modelos - o italiano e o japonês - tiveram suas origens em elementos culturais regionais e de parentescos. 2 INOVAÇÃO TECNOLÓGICA E A FORMAÇÃO DE REDES A constituição de arranjos cooperativos entre firmas, nasce da necessidade de fortalecimento de suas diversas competências, através da capacitação para enfrentar a crescente complexidade do ambiente econômico. Esta crescente busca do fortalecimento, tem acarretado em constantes inovações técnico- produtiva através da crescente necessidade da interação entre todas as firmas participantes da rede. Se antes, no padrão fordista de produção, a cooperação que havia entre as firmas de uma rede estava mais vinculada a uma estratégia competitiva - visando economias de escala e de escopo, não implicando necessariamente inovação tecnológica - atualmente, essa cooperação tomou um sentido mais direcionado para a formação de uma rede de inovadores autônomos. Autônomos no sentido de que as firmas adquirem autonomia para a inovação a partir da rede - ou seja, cada firma consegue os mais diversos ativos necessários para o seu processo de inovação próprio e específico, a partir dos fluxos entre os pontos da rede. O principal objetivo das redes atuais é ampliar a integração e o relacionamento dinâmico entre seus diversos integrantes, numa perspectiva exclusiva de busca e aperfeiçoamento acelerado de tecnologias e de formas de 3 apropriação, através do compartilhamento de recursos e de conhecimentos detidos pelas firmas participantes da rede. Atualmente, as redes de firmas referem-se a configurações de diversas firmas que se articulam em busca de fluxos intra-rede, de ordem logística e primordialmente tecnológica. Esta busca por maiores eficiências organizacionais não implica necessariamente maior proximidade geográfica entre as firmas, uma vez que, as novas tecnologias de informação e comunicação (TIC) atuam no sentido de permitir presenças virtuais dos capitais em qualquer parte do globo. As firmas passam assim a definir estratégias competitivas de natureza global, e não mais estratégias isoladas para mercados nacionais. As redes passam a ser consideradas um elemento relevante para a aquisição, a exploração e o desenvolvimento de novas tecnologias. Sob este aspecto, as redes são mecanismos que facilitam a cumulatividade de conhecimentos e permitem um intenso aprendizado entre os agentes. Por mais que esses agentes estejam formando uma rede com uma perspectiva estratégica em busca de uma dinâmica inovativa maior, os interesses comuns não eliminam eventuais ações não-cooperativas por parte dos agentes. O contrato passa então a ser o elemento central que garante a existência da rede como um todo. Por se tratar de redes cujos fluxos implicam especificidades dos ativos, envolvendo alto valor agregado e riscos elevados, o contrato passou a ser um elemento fundamental para permitir o funcionamento da rede, mesmo que, antes dele, haja ampla relação de confiança mutua. Nessa perspectiva dinâmica, a rede assume necessariamente uma dimensão global. É global porque as redes se formam num novo ambiente econômico mundial de liberalização e de desregulação geral dos mercados. Isto permite as estruturas oligopolistas adotarem estratégias e comportamentos globais. Essa dinamização e inserção global das redes de firmas decorrem do fato de que o mundo vive atualmenteum novo paradigma econômico e tecnológico. Trata-se de um agrupamento de inovações técnicas, organizacionais e administrativas inter-relacionadas que resultam numa nova gama de produtos e de sistemas, mas também e, sobretudo, na dinâmica da estrutura dos custos relativos de todos os insumos para a produção. Antes, a dinâmica econômica era dada por um paradigma assentado em insumos energéticos de baixo custo, em excesso de trabalho não-qualificado e em tecnologias eletromecânicas. Já neste novo paradigma, a dinâmica é dada predominantemente pela alta qualificação do trabalho e pelos insumos informacionais de baixo custo, derivados do avanço da tecnologia microeletrônica e das telecomunicações (CASTELLS, 1991, p.284). 2.1 As competências Centrais Prahalad e Hamel (1990) destacam como fundamental nas organizações, a habilidade de identificar, cultivar e explorar as competências centrais que possibilitam o crescimento, fazendo com que tenham que, permanentemente, repensar o conceito corporativo em si. Eles reforçam que a tarefa crítica das firmas, deve ser de criar produtos que serão aqueles que oferecerão funcionalidade com altíssimo valor agregado para o cliente. Para tal, o pensamento com foco na inovação passa a ser uma arma essencial para a conquista desse novo cenário. Nesse sentido, devem ser gerados mecanismos 4 para possibilitar a revisão do desenvolvimento dos produtos e das competências centrais. A competitividade da organização, na visão de curto prazo, deriva da relação preço/performance dos atributos dos produtos, o que permite sustentação junto ao mercado ou clientela ativa. Em compensação, no longo prazo, a competitividade está associada à capacidade de se construir as competências centrais que possam gerar produtos a custos menores e mais rapidamente que os concorrentes, tornando esse um fator de diferenciação para garantir atuação no mercado. Sendo assim, as verdadeiras fontes da vantagem competitiva estão na habilidade da gerência em consolidar as tecnologias corporativas e habilidades operacionais em competências, que possam permitir autonomia a organizações isoladas, para se adaptarem, rapidamente, a cenários dinâmicos de oportunidades. Considerando todos estes aspectos, conclui-se que competências centrais significam o aprendizado coletivo da organização, principalmente, referente à coordenação de diversas habilidades da produção e à integração das várias correntes de tecnologia dominadas. Quando se define que as competências centrais envolvem a busca do equilíbrio entre as várias correntes de tecnologia, também se refere à organização do trabalho ou de sua gestão e à entrega de valor, de forma decisiva. O domínio de uma competência central permite o potencial acesso de mercados variados, sem necessariamente, envolver esforço volumoso de recursos em P&D ou fazer com que se conquiste a integração vertical. Outro fator de domínio de competência supõe um grau de dificuldade elevado o bastante para que a concorrência possa imitar. Os autores ainda destacam mais dois aspectos fundamentais ligados as competências centrais: - O primeiro está associado à ligação entre as competências centrais e os produtos finais, denominada produtos centrais. Para manter liderança nas áreas de competências centrais escolhidas, as organizações buscam maximizar a sua fatia de mercado com seus produtos centrais. Manter esse domínio com produtos centrais dá o poder à organização de moldar a evolução das características dos produtos. - O outro ponto esta ligado à pessoas-chave. A gerência é preparada para disputar recursos financeiros de seu grupo, porém, nunca disputa pessoas-chave. Para os autores, as pessoas-chave, as competências centrais, devem ser consideradas ativos corporativos a serem desdobrados ou alocados pela gestão corporativa. De acordo com Venkatesan (1992), as competências essenciais de uma organização, são difíceis de serem imitadas pela concorrência, porém elas devem ser inovadas e reinventadas constantemente. Existem circunstâncias em que é prudente abandoná-las. Mesmo que a nova tecnologia seja desenvolvida externamente, ela sempre pode ser aprendida. Embora muitas competências tradicionais possam desgastar-se ou tornar-se uma commodity, as organizações têm profunda relutância em abandonar o que era um subsistema essencial. A implicação mais direta desse novo paradigma tecnológico para a natureza das redes de firmas está na banalização das economias de escala e na 5 viabilização das economias de escopo. Em outros termos, a flexibilidade decorrente das novas tecnologias viabiliza a produção em escalas cada vez menores. Se anteriormente a rede se justificava pela divisão de custos e pela busca de flexibilidade da pequena produção de natureza artesanal, para fazer frente a produção em massa, a partir das novas tecnologias, essas condições se difundem para a economia como um todo, de tal forma que todos podem ter acesso a equipamentos sofisticados e flexíveis com preços decrescentes. Portanto, se no padrão fordista a flexibilidade e, conseqüentemente, as economias de escala e escopo eram viabilizadas pela conformação de redes, no novo paradigma essa flexibilidade passou a ser viabilizada pelas novas tecnologias para todos os níveis de produção. É importante destacar que nesta nova perspectiva de rede, todas as formas de classificação de tipos de rede não são mutuamente excludentes. Antes pelo contrário, as firmas que participam de acordos e contratos, podendo estar envolvidas em várias outras organizações de rede com diversas outras firmas. Além disso, as grandes firmas costumam, numa mesma categoria, ter vários tipos de acordos. 3 O MODELO DE SUBCONTRATAÇÃO E A INOVAÇÃO TECNOLÓGICA Na sequência, Hammer (2002) e Dell (1999) citam três experiências recentes de formação de redes de subcontratação, que servem como modelos das práticas atuais. Nestes exemplos as redes se baseiam, principalmente no compartilhamento de informações e operações entre as organizações, no sentido de facilitar a cadeia de suprimentos em busca de uma operação enxuta e de baixo custo. De acordo com Hammer, após travar várias guerras de produtividade, ao entrar na década de 1990, a maior parte das empresas norte americanas pareciam estar muito satisfeitas com o enxugamento de suas operações. Com as inovadoras ferramentas e práticas dos Sistemas de Gestão da Qualidade difundidas pelas empresas japonesas, os processos foram reformulados, reduziram-se os custos indiretos, eliminaram-se atividades supérfluas e houve incremento na qualidade dos produtos e serviços, pondo fim à erros e informações confusas. Embora seja verdade que as empresas fizeram um ótimo trabalho dinamizando seus processos internos, também é verdade que os processos que partilham - e que demandam interações com outras empresas – continuavam, em grande parte, em estado caótico. Especificamente os processos de gestão da cadeia de suprimentos das indústrias, conhecido como procurement. Este processo envolve, desde o processo de execução de pedidos de insumos da linha de produção, passando pelos processos de cotação, compras, toda a logísticas de envio e recebimento dos pedidos, até a sua distribuição interna. A falta de coordenação entre os vários processos comuns de uma empresa acaba duplicando um número enorme de atividades. No momento em que todas essas atividades e dados passam de uma empresa para outra, é comum a ocorrência de erros, inconsistências e confusões, o que só aumenta o volume de trabalho perdido. Além disso, são inúmeros os funcionários incumbidos de lidar com essa massa incômoda de interações entre as empresas. Todas essas deficiências acarretam em elevados custos, prejudicando os resultados das empresas. 6 Estas mesmas empresas, consideradas eficientes na época, descobriram que toda esta conquista intrafirma era só o começo de novos desafios e a dinamização dos processos compartilhadoscom outras firmas era o próximo grande passo para a redução de custos. De acordo com Hammer (2002), “É nesse campo que se darão as guerras de produtividade do século XXI. Serão vitoriosas as empresas que derem um novo enfoque aos negócios, trabalhando em íntima associação com seus parceiros na execução de projetos e na administração de processos que se expandirão para todo o tecido corporativo. Serão essas as organizações que darão o salto da eficiência para a supereficiência”. (HAMMER, 2002: p.48) 3.1 Os Casos GEON, HP e DELL Hammer cita dois exemplos de sucesso na integração dos processos de procurement com os seus parceiros, formando uma rede supereficiente utilizando o que havia de mais inovador na tecnologia da informação, criando uma nova ferramenta que traria enormes vantagens competitivas para estas empresas, o e- procurement. O caso GEON: Para se ter uma idéia mais clara do custo assombroso resultante da falta de coordenação nos processos comuns a várias empresas - e como vale a pena integrá-los - basta observar o que fez a Geon, empresa química de Ohio (USA), maior fabricante mundial de PVC. Ao longo da maior parte dos anos 90, a Geon caracterizou-se pela verticalização de suas atividades. À exemplo do que fizeram muitas empresas em meados dos anos 90, a Geon procurou concentrar suas energias na derrubada das muralhas que separavam suas diversas unidades internas com o propósito de reduzir custos. Ao permitir que as informações e transações fluíssem com mais facilidade entre os diferentes setores da organização, o percentual de pedidos atendidos com pontualidade cresceu significativamente, os níveis de estoque caíram bruscamente e, consequentemente, a lucratividade disparou. Foi então que, em 1999, a empresa deu os primeiros passos rumo a uma mudança estratégica fundamental. A empresa decidiu se concentrar totalmente em suas competências centrais, para isso ela iniciou um caminho oposto ao da verticalização, que vinha praticando até então, repassando suas operações de menor escala para firmas menores, transformando-as em importantes fornecedores de matérias primas para a produção dos produtos que ela considerava produtos centrais (core products). Embora as diretrizes adotadas pela Geon fossem estrategicamente sadias, no início foram um desastre no plano operacional. Na verdade, ela ergueu uma muralha enorme entre as firmas no lugar onde havia demolido outra bem menor. O trabalho perdeu coordenação e as informações não eram mais compartilhadas, assinalando com isso à volta de atividades duplicadas, custos indiretos e contratação de pessoal para dar conta das interfaces entre as duas empresas. Do lado da produção, à medida que a Geon e seus fornecedores sabiam cada vez menos o que se passava em seus respectivos controles de 7 estoque, os processos de fabricação tornaram-se mais irregulares, gerando mais atrasos, além de alterações não programadas. Em resumo, a Geon não somente perdeu os benefícios que havia ganhado anteriormente ao integrar os processos de negócios como também - sob vários aspectos - sua situação ficou ainda pior do que antes da derrubada das muralhas internas da empresa. A rápida degradação do desempenho chamou a atenção da gerência para o alto custo dos processos entre firmas sem a necessária coordenação. Em vez de ignorar a ineficiência ou de considerá-la simplesmente uma conseqüência inevitável do trabalho em rede com as outras firmas, a Geon resolveu agir juntamente com elas. Utilizando o que havia de mais inovador em TI, a Geon procurou interligar os processos e as operações computadorizadas responsáveis pelo andamento dos trabalhos. Todos os pontos da rede vincularam de modo muito coeso seu processo de previsões. Agora, no momento em que a Geon utiliza informações colhidas com seus clientes para prognosticar as possíveis demandas de produtos, essa previsão é transmitida via internet para os respectivos fornecedores da rede que, por sua vez, as incorpora às próprias previsões de demanda de insumos. Os processos de execução de pedidos e de expedição agora também caminham lado a lado. Vinte e quatro horas depois de receber uma ordem de compra de um cliente, a Geon executa o pedido especificando os materiais que precisará adquirir dos fornecedores da rede, automaticamente, despacha uma ordem que chega sem intermediações ao sistema e ao setor de execução de pedidos da empresa. Além disso, outras confirmações e conhecimentos, notificações antecipadas de embarque e faturas seguem diretamente dos fornecedores da rede, de volta para a Geon. As funções e o comportamento dos funcionários envolvidos nos processos mudaram radicalmente depois disso. O pessoal da Geon não precisa mais perder tempo tentando adivinhar o que se passa nos processos das outras firmas da rede e vice-versa. Em vez disso, eles podem se concentrar na solução de problemas de um modo que traga benefícios para toda a rede. A Geon deu recentemente mais um passo à frente ao integrar seus processos aos de seus clientes. Foram instalados sensores em alguns dos depósitos de seus principais compradores de modo que a empresa sempre sabe quanto de composto o cliente tem em estoque. No momento em que os estoques caem a um nível predeterminado, a Geon envia automaticamente a quantidade necessária para a reposição, eliminando assim várias das atividades típicas desse processo, como a verificação de estoques e a expedição de ordens de compras. Graças aos esforços da Geon, os processos envolvendo três níveis de negócios (clientes, a Geon e fornecedores) foram integrados. Hoje, todos eles são geridos como se fosse um só, sem nenhum tipo de reserva em relação à empresa a que pertencem e com muito menos atrito, custos indiretos e erros. A Geon concentrou seus esforços naquilo que ela considerou sua core competence trazendo vantagens competitivas para seus produtos e operações em relação aos clientes, já que existe uma commoditização de seus produtos centrais. O caso HP: A Hewlett Packard, empresa global de alta tecnologia, deu um passo ainda mais ousado no trabalho de reestruturação dos processos entre firmas de modo que vem transformando a economia de sua cadeia de fornecedores de matéria-prima. À exemplo da maioria dos fabricantes de 8 computador, a HP vem terceirizando grande parte do processo de produção. Tomando como exemplo o segmento de monitores, a HP transferiu a fabricação dos invólucros, para firmas subcontratadas. Estas firmas compram o invólucro para monitor de um fornecedor de moldagem, que, por sua vez, adquire seu material de uma empresa especializada em compostos de plástico. Essa empresa, por seu turno, compra material de um fabricante de resinas. Essa cadeia de suprimentos é muito fácil de descrever, mas até recentemente era quase impossível de administrar. Em primeiro lugar, porque os fornecedores na extremidade oposta da cadeia não tinham ideia de quantos monitores a empresa realmente precisava. Em geral, nem sequer sabiam quem era a destinatária final de seu produto. Consequentemente, aconteciam muitos casos de falta de alguns produtos ao mesmo tempo em que sobravam outros produtos em alguns pontos da rede. Estas situações obrigavam o consumidor a buscar alternativas fora da rede ocasionando disputas entre fornecedores e a inevitável perda de receita para todos os membros da cadeia de suprimentos. A disparidade de escala dos participantes dessa cadeia é outro fator complicador na rede. A HP e seus fornecedores de primeiro nível são empresas gigantescas. A medida que os níveis vão descendo o porte das firmas participantes vão diminuindo ao mesmo tempo em que a quantidade de firmas vai aumentando. Portanto, o potencial de compras da HP dissipava-se a cada etapa da rede que a separava de seu fornecedor final, impossibilitando a HP rastrear sua qualidade e seu desempenho, bem como preços e prazos. Muita gente espalhada pelas diferentes empresas, utilizando-sede vasta rede de sistemas de informação sem vínculos uns com os outros, tinha de administrar essa massa incômoda de processos a um custo elevado. Em 1999, ciente do problema, a HP resolveu integrar a rede de suprimentos e coordenar a unificação do processo. A empresa assumiu a responsabilidade de fazer com que todas as partes trabalhassem juntas, compartilhando informações e operando de tal forma que garantissem os mais baixos custos e os mais altos níveis de disponibilidade e qualidade por toda a cadeia de suprimentos. O núcleo do novo processo consiste num sistema informatizado montado pela HP para compartilhamento de informações entre todos os participantes. A equipe do e- procurement da HP gerencia todo o processo e monitora a performance dos fornecedores mantendo a oferta e a procura em equilíbrio. Os compradores da empresa, que antigamente se preocupavam estritamente com prazos e condições, viram suas funções ampliadas consideravelmente. O processo integrado aumentou de forma surpreendente a cadeia de suprimentos. Hoje, qualquer modificação nos pedidos da HP é instantaneamente transmitida à cadeia, permitindo que todos reajam prontamente. Uma vez que é responsável pela coordenação de todo o processo, a HP pode também encomendar toda a resina de que necessita diretamente do fornecedor. O fabricante de resina se beneficia com esse novo relacionamento, já que tem a segurança e a facilidade de se relacionar com um grande cliente em vez de vários de pequeno porte. A dinamização do processo de suprimentos tem ajudado a todos os integrantes da rede, mas talvez a HP seja a maior beneficiada com quedas substanciais nos custos em todo o processo, além de ter registrado um incremento das vendas nas áreas nas quais implementou esse novo processo integrado. 9 O Caso DELL: A Dell Computer Corporation é atualmente a maior fabricante de computadores pessoais do mundo. Michael Dell – fundador e maior acionista da empresa - resume o sucesso da empresa em três regras: “vender diretamente (através de vários canais), produzir à medida do cliente, eliminar os estoques e os intermediários. Nós lidamos diretamente com os clientes e os fornecedores”. (DELL et al., 1999: p.19) No início dos negócios, Dell et al (1999) conta que tiveram alguns problemas que afetaram a qualidade dos produtos, alguns produtos apresentavam problemas de compatibilidade com o padrão IBM que já dominava o mercado. Os seus parceiros, fornecedores dos componentes nem sempre respeitavam os padrões estabelecidos de qualidade. Nesta época eles decidiram, passar a desenhar os produtos, bem como desenvolver os próprios modelos, adicionando-lhes os componentes de melhor qualidade e desempenho. De acordo com Dell (1999), o computador PC vai se commoditizar com o tempo, entretanto, o mais importante é que a empresa Dell é uma organização virtual fortemente integrada, cujo objetivo é criar uma relação em rede de firmas interdependentes com elos de ligação, cujos fluxos são compostos de informações e de mercadorias. Baseado nestas premissas, a empresa Dell adota o modelo direto tanto do lado das vendas como do lado da produção e passa a formar parcerias duradouras com os fornecedores que apresentavam melhores resultados de qualidade e escalas de produção e escopo. A base desta parceria é manter apenas as atividades consideradas core competencies dentro da empresa e apenas terceirizar as demais aos seus parceiros da rede. Com esta nova estratégia, a empresa adotou o conhecido método just-in-time idealizado inicialmente pela Toyota. Trata-se de um sistema em que a produção é desencadeada do final para o inicio. A linha de montagem somente trabalha de acordo com o pedido recebido na expedição do produto final. Ao receber o pedido, a expedição o repassa a etapa imediatamente anterior que faz a mesma coisa com as suas etapas anteriores. Desse modo, o fornecedor deve produzir de acordo com os pedidos da linha de montagem e entregar as peças diretamente na etapa em que ela é utilizada. Organizar a linha de montagem nos termos do just- in-time implica elevada integração e coordenação entre a Empresa e os seus fornecedores. “Como construímos computadores consoante às necessidades específicas dos clientes, não temos estoques elevados. E como os nossos fornecedores entregam os componentes à medida que necessitamos deles, minimizamos os desperdícios. Deste modo, as reduções nos custos podem ser transmitidas rapidamente para os consumidores”. (DELL et al., 1999: p.32) A empresa Dell quebrou um paradigma de custo devido a modularização da estrutura do produto, que facilitava o aspecto, tanto da montagem como da personalização. Neste modelo de integração da empresa Dell, os fabricantes de componentes e módulos que formam a rede com elos supercompetentes, saem ganhando a partir do momento que fornecem para uma empresa que vende muito para o mercado. Ganham em segurança, volume de negócios, demanda estável, menores custos de estoque e maior giro. Este tipo de parceria propicia ao fornecedor uma alavancagem no seu crescimento pelo volume de produção passando ele a canalizar seus investimentos e estratégias focados na sua 10 competência central, o planejamento e a escala de produção, proporcionando ganhos crescentes. O elo de integração entre as firmas que formam esta rede se estende a tal ponto que, a entrega de itens como teclado, mouse, monitor é feita direta no operador logístico, que encontram o console vindo da empresa Dell e se juntam (são cross docados) para seguir seu destino. As competências centrais da empresa Dell estão concentradas mais nas funções de serviços do que industrial, seu foco está nos serviços de montagem, logística, marketing, atualização de tecnologia e assistência técnica visando altíssimo valor agregado ao cliente. As outras empresas concorrentes sempre tiveram dificuldades em seguir este caminho, pois já dispunham de grande estrutura verticalizada baseada no modelo fordista - produção de alta escala com foco no produto e não na demanda - e adotam o sistema empurrado de produção. Todas estas práticas não se encaixam em uma estratégia de venda direta ao cliente, muito menos de forma personalizada. As empresas concorrentes não conseguiam se desvencilhar destas amarras. De acordo com Venkatraman (1994), a empresa Dell ilustra uma forma mais rica de raciocinar sobre o projeto da cadeia de fornecimento, não como uma coleção estática de fornecedores, mas como a competência mais importante da empresa. Boa parte da literatura sobre estratégia empresarial se concentrou na empresa isolada, como a unidade de análise adequada. Segundo essa linha de raciocínio, a cadeia de fornecimento é considerada como um dado, e o desafio se caracteriza sobretudo pela gerência da cadeia: a gestão da rede relevante de firmas e ativos para oferecer valor aos clientes finais. CONCLUSÃO Os dois modelos de rede, objetos de maior aprofundamento neste artigo - o originário da Itália (Distritos Industriais) e o do Japão (Redes de Subcontratação) - mostram características básicas nas suas formações que, apesar de distintas, compreendem as características da maior parte das redes que se encontram atualmente no mercado. Os Distritos Industriais, devido as suas características, mostram-se mais vulneráveis às mudanças externas e, por isso, buscam suas sobrevivências em um mercado dominado por grandes empresas que competem por preço. Desta forma, as Competências Centrais deste modelo estão voltadas para a produção em larga escala. Estas firmas formam redes, geralmente, em iguais condições, segmentos e tamanhos, tendo como objetivo primário, ganhar poder de barganha, tanto na negociação com fornecedores, como na negociação com os clientes. Ganham forma e volume para se igualarem com os grandes concorrentes. Pode- se citar como exemplo na região de Londrina-Pr, a Rede ALES (Associação Londrinense de Supermercadistas), a rede de farmáciasDrogamais e cooperativas de produtores de laticínios. Nos modelos de Subcontratação, as firmas lideres buscam, sobretudo, a perpetuação ou melhoria de seus posicionamentos, em um ambiente que se mostra cada vez mais globalizado, competitivo e, consequentemente, volátil. Dentro deste contexto, estas firmas são forçadas a adotar uma postura agressiva 11 na busca incansável por constantes transformações e inovações tecnológicas, já que, em um (cada vez mais) curto período de tempo estas inovações tecnológicas tornam-se commoditizadas e disponíveis para todos, a preços acessíveis. Desta forma, as Competências Centrais destas firmas lideres de Redes de Subcontratação estão voltadas para os setores de P&D (pesquisa e desenvolvimento), de vendas e de marketing. Por outro lado, os parceiros menores das Redes de Subcontratação, focam o ganho de escala na produção. Para isso eles buscam modelos enxutos de gestão nos processos e no produto, no sentido de maximizar os lucros com a diminuição dos custos operacionais. Estes valores transformam-se em suas Competências Centrais, já que os setores de venda e P&D estão, em parte, resolvidos nas mãos de seu principal parceiro na rede. Considerando os estudos desenvolvidos neste artigo, chega-se a conclusão que, além das Competências Centrais que cada firma desenvolve individualmente, de acordo com suas respectivas posições na rede, todas as firmas da rede, também desenvolvem em conjunto, Competências Centrais únicas que são essenciais para o sucesso e a própria sobrevivência da Rede. Dell expressa de forma contundente e conclusiva para este artigo, o elo poderoso que existe entre a rede de firmas e suas Competências Centrais no mundo globalizado e altamente competitivo de hoje. De acordo com Dell et al., “a empresa é a sua cadeia de capacidades em constante evolução, ou seja, as suas próprias capacidades, mais as capacidades de todos que com ela negociam. Nenhuma capacidade dura para sempre. Nenhuma capacidade existe por si mesma, isolada das demais. O velho aforismo de que uma cadeia ou corrente é apenas tão forte quanto o seu elo mais fraco é tão verdadeiro nos negócios quanto nos sistemas mecânicos”. (DELL et al., 1999: p. 123) Por fim, a verdadeira Competência Central das firmas que formam uma rede, se concentra justamente na habilidade de planejar e gerenciar o fluxo de relacionamentos, informações e processos da sua própria rede, de modo a atingir os objetivos estabelecidos num mercado onde as forças competitivas estão em constante transformação. A visualização da firma de forma fragmentada, elemento por elemento, proporciona apenas uma percepção limitada e geralmente distorcida dela como um todo. A observação da firma no contexto da sua rede e dos seus detentores de interesses oferece uma visão muito mais completa, uma imagem holística das atividades. BIBLIOGRAFIA CASTELLS, M. Agreement and Innovation: the international dimension of technological change. Nova York: Prentice Hall, 1991. DELL, Michael; FREDMAN, Catherine. Diret from Dell, São Paulo Campus, São Paulo, 1999. 12 FREEMAN, Christopher. Networks of Innovators: a synthesis of research is- sues. 2a Ed. New York, Pinter Publishers, 1991. HAMMER, Michael. A Empresa Supereficiente. Harvard Business Review, abr. 2002. PRAHALAD, C.K.; HAMEL, G. Competindo pelo futuro: estratégias inovadoras para obter o controle do seu setor e criar os mercados de amanhã. Rio de Janeiro: Campus, 1995. ____. The core competence of the corporation. Harvard Business Review, mai./jun. 1990. VENKATESAN, R. Strategic sourcing: to make or not to make. Harvard Business Review. nov./dec. 1992. VENKATRAMAN, N.; IT enabled business transformation: from automation to business scope definition. Sloan Management Review, 1994.
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