Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
DESCRIÇÃO Abordagem do ensino da leitura e da escrita a partir do eixo da oralidade e da perspectiva da multimodalidade e do multiletramento. PROPÓSITO Compreender o eixo da oralidade e a perspectiva da multimodalidade e do multiletramento na aprendizagem da leitura e da escrita para ampliar o conhecimento sobre os processos de alfabetização e letramento. PREPARAÇÃO Tenha em mãos um dicionário para consultar os termos específicos e os principais conceitos dos estudos da linguagem e da alfabetização. Na internet você pode acessar o Dicionário de Termos Linguísticos , hospedado no Portal da Língua Portuguesa, e o Glossário CEALE , hospedado no portal da UFMG. OBJETIVOS MÓDULO 1 Reconhecer a perspectiva do multiletramento no ensino da oralidade, leitura e escrita MÓDULO 2 Identificar a oralidade como eixo do processo de leitura e escrita MÓDULO 3 Reconhecer recursos multissemióticos possíveis na alfabetização INTRODUÇÃO Ensinar e aprender a ler e a escrever deve ser exatamente o mesmo processo como era décadas atrás, antes da cultura digital? Qual o lugar da oralidade no aprendizado da leitura e da escrita? Como os multiletramentos impactam ou desafiam o processo de alfabetização e letramento? Essas são algumas das questões que norteiam o estudo que você vai realizar a partir deste conteúdo, trabalhando o processo de alfabetização e letramento desde uma perspectiva que integre oralidade, leitura e escrita. No módulo 1, teremos o desafio de realizar uma reflexão sobre escrita, oralidade e multiletramentos. No módulo 2, continuaremos discutindo a escrita/produção autoral (narrativas de si) nos anos iniciais, em especial na alfabetização, como mola mestra para um trabalho autoral e o trabalho com a oralidade dos textos do folclore e saberes populares desde a alfabetização. No módulo 3, apresentamos alguns recursos e mídias disponíveis para pensarmos a escrita, a leitura e a oralidade em multimodalidades e no contexto da diversidade. Vamos aos nossos estudos! MÓDULO 1 Reconhecer a perspectiva do multiletramento no ensino da oralidade, leitura e escrita LER E ESCREVER EM TEMPOS DIGITAIS O aprendizado da leitura e da escrita é um importante desafio que pode ser assumido por meio do multiletramento. A mistura de imagem, som, escrita e outros signos ou linguagens pode contribuir para a significação do todo, para a análise e a produção de textos e de sentidos, em um processo menos desintegrado. Por isso mesmo, podemos reconhecer a importância de políticas públicas que façam chegar à escola os recursos de mídias, assim como os livros impressos chegam hoje às escolas por meio das políticas nacionais. Pensar a escola, o ensino e as políticas públicas na terceira década do século XXI é pensar as mudanças que a escrita, a leitura e a oralidade tiveram nos últimos tempos. As crianças de 6 e 7 anos que estão na alfabetização são reconhecidas como a segunda ou terceira geração dos nascidos digitais, são aquelas que deveriam estar imersas nessa cultura. A tela digital sensível ao toque pode ser uma experiência anterior ao livro impresso para algumas crianças dessa geração. Imagem: Shutterstock.com Mas esse olhar para o mundo digital nem sempre esteve presente na escola por diversos fatores, que aqui não abordaremos. A pandemia da Covid-19, no entanto, mudou o percurso do ensino como um todo, em especial o de leitura e escrita, pois houve uma aceleração na adoção de recursos digitais, forçando um repensar do ensino, em especial do ensino de língua. ATENÇÃO Analisar o ensino da leitura e escrita na escola não mais é refletir apenas sobre as marcas pretas no papel branco que a tinta da caneta ou o grafite deixam. Para além desse lugar da leitura e da escrita, temos os “usuários” digitais que nos cobram e nos pedem um trabalho crítico de uso, produção e análise do mundo digital na escola, desde a alfabetização. A produção e a recepção não estão mais separadas. Fica mais difícil separar leitura e escrita. Lemos e escrevemos quase ao mesmo tempo. Temos processos de leitura e escrita de uma multiplicidade de textos e de variadas modalidades, forçando-nos a aprender diferentes letramentos e semioses. Sem perder de vista essa realidade e contexto, vamos iniciar nosso estudo sobre o eixo da oralidade no aprendizado da leitura e da escrita. LINGUAGEM E ORALIDADE A necessidade que o ser humano tem de se comunicar deu origem aos vários esquemas de linguagem que conhecemos atualmente, tanto escritos quanto orais, gestuais, imagéticos e de outros tipos. Quando sentimos necessidade de transmitir uma mensagem, nosso pensamento se organiza para que consigamos transmitir a mensagem de forma compreensível a quem ouve, sente ou vê. Nossas “narrativas”, “argumentos” ou “descrições” têm início, meio, fim e funcionalidades. A experiência e a intenção de transmitir uma mensagem dá corpo a um texto falado, escrito ou multissemiótico. Contudo, antes da intencionalidade da mensagem estão postos os sentidos da vida de quem fala, escreve, produz, analisa e interpreta. Isso tem a ver com um sentido mais amplo de linguagem ou língua, não restrito a um sistema de códigos ou apenas a aspectos técnicos da comunicação. Imagem: Shutterstock.com Tomaremos aqui o conceito de língua como interação, manifestando-se nas relações e práticas sociais, em diversos contextos ou situações. Interações situadas de linguagem ou práticas locais, que buscam os sentidos gerados no aqui e agora, implicam as práticas de uso da linguagem em que é fundamental o contexto local para explicar/analisar os significados, e não apenas uma busca por um sistema de língua abstrato que faça a língua ter algum sentido anterior ao seu uso. Os sentidos são situados, únicos, o que põe em destaque os sujeitos e os contextos históricos. Produzir sentidos nesse tempo semiótico, ou seja, em que os símbolos são múltiplos e em constantes alterações de sentidos, algumas vezes para um mesmo símbolo, exige dos sujeitos cada vez mais habilidades sociais e “performances identitárias” no uso da linguagem. Muitas vezes, os materiais escolares, especialmente livros didáticos, condensam o ensino de língua na primazia ao texto escrito, com um apagamento das outras modalidades textuais. A cultura letrada em que estamos imersos, tendo a escrita como a centralidade do saber e de sua organização, acaba nos levando a um pensamento e a práticas escolares que enfatizam o ensino/aprendizagem da escrita, frequentemente deixando de lado outras importantes manifestações ou modalidades de linguagem, como a oralidade. ORALIDADE E MULTIMODALIDADE É simples entender que o trabalho com a oralidade na escola tem pouco relevo. Percebemos que o espaço e o tempo para oralidade nas propostas curriculares têm ênfase na educação infantil. Na educação infantil tem a hora da “rodinha”, da novidade, o que muitas vezes acaba sendo descontinuado na alfabetização, e “a conversa” passa a dar lugar unicamente a conteúdos e informações. Foto: Shutterstock.com Foto: Shutterstock.com À medida que a escolarização aumenta, esse espaço diminui para mais atividades de análise do escrito, sendo até mesmo considerado perda de tempo ficar conversando. Esse apagamento das falas das crianças nos espaços escolares à medida que avançam na escolarização vão silenciando em função de mais conteúdos escolarizados, que demandariam mais tempo/aula em atividades e exercícios do escrito, muito mais do que a escrita do aprendiz (BARREIROS, 2006, p. 46). Muitos professores questionam: se as crianças já têm a competência de falar, por que precisaríamos ensinar? A escrita não é o que deveria ser a exclusiva preocupação do ensino escolar? Esses questionamentos nos mostram que acabamos opondo língua oral à língua escrita, esquecendo que os gêneros são “multi”, são interseccionados, principalmente na sociedade letrada. Oralidade e escrita são modalidades que se complementam, não substituem uma à outra. Sabemos que o mundo é multimodale que nossas práticas comunicativas, por explorarem esse universo, também o são. As crianças, mesmo antes de irem à escola, ou paralelamente às atividades escolares, interagem explorando múltiplas linguagens, que incluem gestos e objetos em sua comunicação verbal e o desenho. Explorar, em atividades na sala de aula, desde a alfabetização, a música, a dança, os gestos e as mímicas é não esquecer que somos seres de muitas linguagens, que podem aparecer isoladamente (uma música, um quadro, uma mímica) ou em combinação: dançamos ao som de uma música, musicamos um poema, compomos a letra para uma música, combinamos gestos e expressões faciais. Para além da dualidade oralidade x escrita ou do continuum em que temos de algum modo um extremo com mais oralidade e outro com mais escrita, trabalhamos aqui com a concepção de que o texto é multimodal e intersecciona-se em diferentes gêneros. A língua que acontece no cotidiano real, na nossa vida fora dos bancos escolares, é plural, diversa e, também, em gêneros que não são “puros”. Na nossa sociedade grafocêntrica (centrada na grafia/escrita, em que a escrita permeia as relações sociais), a relação entre gêneros orais e gêneros escritos não precisa ser uma relação dicotômica. É antes uma relação de continuidade e de efeito mútuo, isto é, gêneros orais podem sustentar gêneros escritos; gêneros escritos podem sustentar gêneros orais. Eles estão em mútua interdependência, cada gênero oral que entra na escola, em geral, pressupõe a escrita, assim como cada gênero escrito trabalhado na escola pressupõe o oral. Então, de uma certa maneira, essa é uma distinção relativamente artificial, pois há um entrelaçamento contínuo. Não temos a “pureza” nos gêneros em uso, porque mesmo em uma categoria de gênero oral poderemos ter um texto mais formal. EXEMPLO A palestra é um texto oral mais formal, no entanto, é possível que nessa formalidade da palestra tenhamos momentos descontraídos, com o palestrante contando “causo”, manifestando uma oralidade mais informal. Além disso, cada gênero oral pode também ser sustentado por outro gênero oral. Cada gênero é sempre também objeto de outros gêneros de alguma maneira. Explorar em atividades de ensino as intersecções dos gêneros, mais do que suas identidades “puras”, é um exercício que a escola exigirá de nossos alunos para que aprendam as diferentes disciplinas do currículo escolar. As diversas linguagens e modalidades podem conviver com a escrita. Se no ensino da língua separamos as linguagens, nas diferentes áreas de conhecimento percebemos o uso das diferentes linguagens para o aprendizado. Como aprender Geografia senão com a leitura de mapas? Como avançar nos estudos sem os gráficos ou infográficos? Como construir conhecimentos sobre o corpo humano e fenômenos da natureza sem os desenhos, as imagens animadas e outros recursos visuais? Imagem: Shutterstock.com Devemos explorar na escola as diversas linguagens, integrando linguagens visuais, sonoras e verbais, sem nos restringirmos à modalidade escrita. Por isso, estamos apostando em um trabalho que, desde cedo, seja em linguagens visuais, escritas, orais ou corporais, produz sentido na alfabetização. A MULTIMODALIDADE NÃO É NOVA Ao caminharmos pela rua, encontramos outdoors nas estradas, sinais e placas de trânsitos, pequenos painéis de propagandas em movimento, ouvimos música ou alguma programação usando um celular ou outra mídia – estamos desse modo lidando com linguagens e textos multimodais. São textos compostos por diversas linguagens, pois incorporam recursos verbais, imagéticos (como cores, formas, texturas), animações, sons etc. Foto: Shutterstock.com Mesmo um texto que parece monomodal – como uma página em preto e branco, escrita com uma única fonte – explora recursos multimodais, uma vez que traz a cor da página, a cor da fonte, a escolha da fonte (o que por si já permite ao leitor fazer muitas inferências), o espaçamento, a forma de alinhar o texto, os recuos e pés de página, negritos, itálicos, entre outros elementos que nos mostram que não há ali apenas uma modalidade sendo explorada (ARAÚJO; FRADE; COSCARELLI, 2020, p. 6). A vida na sociedade moderna é marcada por situações de comunicação em que vários tipos de linguagem são usados ao mesmo tempo. Exploramos cotidianamente esses múltiplos recursos semióticos, na maioria das vezes, sem nos dar conta deles separadamente. As noções de cultura visual e visualidade nos ajudam a entender a perspectiva multimodal, no sentido em que esclarecem a forma pela qual valorizamos o contato com o mundo e até a nossa ação no mundo. Os nossos valores, que se concretizam nas práticas de leitura e de ação, determinam e, ao mesmo tempo, dependem dos significados criados por palavras e imagens em conjunto. Somente no “todo” serão criados os sentidos. Os coloridos que nos cercam muitas vezes são intencionais e não meramente ilustrativos. Devemos debater em sala de aula o uso das imagens que constroem os textos diferenciando daquelas que algumas vezes “apenas” ilustram as páginas de livros didáticos, por exemplo. INTERNET É DIVERSÃO OU ESTUDO? A crença de que crianças e jovens sabem mexer em celulares e tablets (muito provavelmente verdadeira) não se revela quando esse uso se faz na escola, pois o uso desses recursos digitais para o entretenimento geralmente é menos explorado pela escola, dando lugar a um uso voltado para leitura de textos e outras atividades da aula “padrão”, que é apenas transportada para a tela pequena do celular. A linguagem multissemiótica, que antes acessávamos pela comunicação de massa da televisão e do cinema, atualmente está ao alcance facilmente pelo smartphone. No mesmo equipamento, também podemos trabalhar com linguagens e texto híbridos ou multissemióticos. Podemos alterar imagens, recriar, mudar cenários, inventar contextos. As crianças também já experimentam essas linguagens multimodais nas diferentes redes sociais. Foto: Shutterstock.com Trabalhar com multiletramentos pode ou não envolver (normalmente envolverá) o uso de novas tecnologias de comunicação e de informação (“novos letramentos”), mas caracteriza-se como um trabalho que parte das culturas de referência do alunado (popular, local, de massa) e de gêneros, mídias e linguagens por eles conhecidos para buscar um enfoque crítico, pluralista, ético e democrático — que envolva agência — de textos/discursos que ampliem o repertório cultural, na direção de outros letramentos, valorizados (como é o caso dos trabalhos com obras de arte valorizadas) ou desvalorizados (como é o caso do trabalho com memes ). NOVOS E MULTILETRAMENTOS Assista ao vídeo sobre multiletramentos com a professora Jonê Baião. Conforme você pôde conferir no vídeo, temos uma “nova mentalidade” no trabalho com o texto, estamos expostos e lidamos com os diversos “textos/discursos” na esfera social. Existem vários textos multimodais que as crianças produzem, há vários textos multimodais nos livros didáticos, informativos e literários, nas histórias em quadrinhos e tudo isso configura uma percepção e uma sensibilidade que o professor e as crianças já têm, intuitivamente. É preciso tornar isso mais evidente nas práticas de leitura e escrita e aproveitar o que cada velho e novo recurso tem a oferecer, sobretudo em tempos de confluência de recursos da era digital (ARAÚJO; FRADE; COSCARELLI, 2020, p. 10). Imagem: Pixabay Mona Lisa de máscara. Podemos exemplificar o retrabalho com textos e diferentes linguagens a partir das artes visuais. O famoso quadro da Mona Lisa, de Leonardo da Vinci (1452-1519), tem ganhado outros significados a cada vez que é retextualizado nas mídias sociais. Essa “divulgação” e ressignificação da obra original dialoga muito com os contextos culturais: Mona Lisa com máscaras em tempos de pandemia; Mona Lisa mais gorda/ mais velha/descabelada... Há recriações na forma de memes , articulando imagem e escrita, e recriações a partir de modificações de aspectosou elementos da pintura. Vemos que esses textos multissemióticos, aos quais inclusive nossas crianças estão expostas desde cedo, têm muitos elementos, palavras, imagens, ícones, movimentos e links que também precisam ser explorados nas práticas de aprendizado da língua. A cultura dos memes (cultura digital do riso) e o sentido de humor crítico que a eles se agrega muito nos faz refletir sobre cultura, diversidade, política, sociedade e outros aspectos importantes para pensarmos no ensino. SAIBA MAIS O meme é uma expressão característica da cultura digital ou da cibercultura. Geralmente anônimo ou com autoria difícil de definir, o meme tem sua criação de forma colaborativa, crescendo e se espalhando espontaneamente. As redes sociais são o lugar privilegiado de sua circulação. Diante desse contexto de linguagens plurais e formas inovadoras do texto, nossos alunos devem se constituir em leitores críticos e transformadores, com a contribuição decisiva de uma escola que promova a reflexão sobre o consumo e a produção nas redes sociais e em outras mídias. Assim, é preciso trabalhar com os gêneros textuais ou gêneros do discurso, focando nas características estáveis que definem gêneros como notícias, tiras em quadrinho, receitas, editoriais, blogs, memes etc. ATENÇÃO Também é necessário não apenas olhar para o modo como os gêneros se articulam ou se misturam entre si, limitando-se algumas vezes à (re)produção de gêneros legitimados pela escola. Devemos abrir espaço para “as inovações e desestabilizações que processos de mistura e transgressão imprimem aos textos da contemporaneidade”. Isso implica um “posicionamento crítico em relação aos significados construídos às margens do que a escola valida como práticas de letramento aceitáveis” (OLIVEIRA; SZUNDY, 2014, p. 201). VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. OS PROCESSOS DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO DEVEM SER DESENVOLVIDOS A PARTIR DO RECONHECIMENTO DE QUE O MULTILETRAMENTO E A MULTIMODALIDADE SÃO PERSPECTIVAS FUNDAMENTAIS NO ENSINO E APRENDIZADO DA LÍNGUA. ASSIM, MARQUE A ALTERNATIVA QUE APRESENTA UMA AFIRMAÇÃO QUE JUSTIFICATIVA OU REFORÇA O RECONHECIMENTO DA PERTINÊNCIA DO MULTILETRAMENTO NO TRABALHO COM A ORALIDADE, A LEITURA E A ESCRITA. A) A produção de textos e sua recepção ou leitura são cada vez mais especializadas e separadas. B) Com as mídias digitais, cada vez mais leitura e escrita são processos separados e pouco articulados. C) A linguagem que a escola deve trabalhar é a escrita, não devendo incorporar elementos de outras linguagens distintas da linguagem verbal. D) No contexto das mídias digitais e da diversidade de textos e modalidades de linguagem, cada vez mais lemos e escrevemos ao mesmo tempo. E) A linguagem escrita e falada, desde muito tempo, é a principal forma de comunicação, o que dispensa o uso e estudo de outras formas de produzir sentido. 2. ANALISE AS AFIRMATIVAS A SEGUIR: I- AS TECNOLOGIAS DIGITAIS SÃO A ÚNICA RAZÃO PARA SE TRABALHAR COM LINGUAGEM MULTISSEMIÓTICA E MULTILETRAMENTOS, POIS OS TEXTOS IMPRESSOS SÃO SEMPRE ESCOLARES E MONOMODAIS. II- OS TEXTOS HÍBRIDOS E AS DIVERSAS MODALIDADES DE LINGUAGEM ESTÃO MAIS ACESSÍVEIS COM AS MÍDIAS DIGITAIS, DEMANDANDO UMA ABORDAGEM DA ALFABETIZAÇÃO A PARTIR DO MULTILETRAMENTO. III – AS CRIANÇAS QUE INTERAGEM NOS MEIOS DIGITAIS JÁ EXPERIMENTAM A MISTURA E INTEGRAÇÃO DE LINGUAGENS MULTIMODAIS, POR ISSO O APRENDIZADO DA ESCRITA E DA LEITURA DEVE LEVAR EM CONTA ESSES NOVOS MEIOS E AS CULTURAS DE REFERÊNCIA DOS ALUNOS. IV- TRABALHAR COM A DIVERSIDADE DE TEXTOS E AS LINGUAGENS DOS MEIOS DIGITAIS POSSIBILITA AMPLIAR O REPERTÓRIO CULTURAL DAS CRIANÇAS, O QUE DEVE SER REALIZADO DESDE UMA PERSPECTIVA CRÍTICA, PLURALISTA, ÉTICA E DEMOCRÁTICA. ESTÁ CORRETO APENAS O QUE SE AFIRMA EM: A) I e II. B) I e III. C) I, II e IV. D) I, III e IV. E) II, III e IV. GABARITO 1. Os processos de alfabetização e letramento devem ser desenvolvidos a partir do reconhecimento de que o multiletramento e a multimodalidade são perspectivas fundamentais no ensino e aprendizado da língua. Assim, marque a alternativa que apresenta uma afirmação que justificativa ou reforça o reconhecimento da pertinência do multiletramento no trabalho com a oralidade, a leitura e a escrita. A alternativa "D " está correta. A linguagem verbal, priorizada ao longo do tempo pela escola, é uma linguagem que possui modalidades, como a escrita e a oralidade. Mas, para além dessas modalidades, há uma diversidade de linguagens e modalidades que permitem a expressão, a comunicação e a interação. Com as tecnologias digitais, a articulação e a integração entre diferentes linguagens e modalidades ficaram ainda mais evidentes. No caso da linguagem verbal, por exemplo, cada vez mais percebemos que a produção de um texto (escrita) e sua recepção (leitura) são processos integrados, lemos e escrevemos o tempo inteiro nas redes sociais, por exemplo. 2. Analise as afirmativas a seguir: I- As tecnologias digitais são a única razão para se trabalhar com linguagem multissemiótica e multiletramentos, pois os textos impressos são sempre escolares e monomodais. II- Os textos híbridos e as diversas modalidades de linguagem estão mais acessíveis com as mídias digitais, demandando uma abordagem da alfabetização a partir do multiletramento. III – As crianças que interagem nos meios digitais já experimentam a mistura e integração de linguagens multimodais, por isso o aprendizado da escrita e da leitura deve levar em conta esses novos meios e as culturas de referência dos alunos. IV- Trabalhar com a diversidade de textos e as linguagens dos meios digitais possibilita ampliar o repertório cultural das crianças, o que deve ser realizado desde uma perspectiva crítica, pluralista, ética e democrática. Está correto apenas o que se afirma em: A alternativa "E " está correta. A multimodalidade nas linguagens é anterior à internet ou aos meios digitais, pois mesmo no texto impresso, por exemplo, encontramos a presença da oralidade em alguns casos, a predominância da escrita e a possibilidade de integração com linguagens visuais. Ainda antes das mídias digitais, o rádio, o cinema e a televisão também se constituíam em diferentes modalidades de linguagem e comunicação, muitas vezes utilizadas na Educação. Com a internet, porém, a hibridização de linguagens e modalidades ficou mais fácil e presente. Assim, no trabalho com a escrita e a leitura, é preciso também se valer das diversas formas de produzir sentido, integrando diferentes linguagens no aprendizado da oralidade, da leitura e da escrita. MÓDULO 2 Identificar a oralidade como eixo do processo de leitura e escrita ORALIDADE COMO PONTO DE PARTIDA A produção de sentidos para a construção do texto é a mola propulsora da intenção de transmitir mensagens por meio das várias formas de linguagem. É aquilo que vivemos e sentimos que nos move a nos comunicar. Em uma sala de aula de uma turma de alfabetização, isso se concretiza nas vivências de alunos e professores. Onde encontrarão o fio condutor para dar sentido ao que se produz nas aulas senão nas próprias experiências? Foto: Shutterstock.com Paulo Freire (1921-1997) mostrou isso em seu trabalho de alfabetizar adultos trabalhadores, ocasião em que buscava as motivações para a escrita da vida cotidiana desses trabalhadores. Antes, contudo, Freire (1998) ouvia suas experiências e as aproveitava como situações de aprendizagem Mas como dar sentido à aprendizagem de leitura e escrita sem que se ouça e se aproveite a experiência dos aprendizes? A oralidade, o trabalho com a língua oral, pode ser um ponto de partida. ORALIDADE, CONTEXTO E HISTÓRIA DE VIDA Imagem: Acervo da Fundação Reginaldo e Beth Bertholino, São Paulo / Wikimedia Commons / Domínio público. Anchieta e Nóbrega na cabana de Pindobuçu, Benedito Calixto, 1927. Sabemos que, na história dos métodos de alfabetização, houve abordagens que foram desde a centralização na soletração até o entendimentoda escrita e da leitura a partir de práticas sociais. Uma análise histórica pode mostrar a existência desses métodos de alfabetização no Brasil, começando com os Jesuítas, por ocasião da vinda dos portugueses para cá, até os dias atuais. Mas o que queremos enfatizar, nesse contexto, é a importância da oralidade para a construção do saber da leitura e da escrita. Como nosso interesse é na oralidade e sua relação com a aprendizagem da leitura e da escrita, sem ignorar a existência de uma trajetória histórica envolvendo os métodos, pensemos nas práticas que envolvem a expressão oral na sala de aula da alfabetização. ATENÇÃO Quando falamos em oralidade e expressão oral, estamos nos referindo às falas diretas ou indiretas dos estudantes em processo de alfabetização. Falas, narrativas, que podem nos revelar situações de vida importantes para motivar a aprendizagem. Cabe, então, ao professor saber ouvir essas falas e aproveitá-las na elaboração dos planos de ensino. Lembrar-se de que o planejamento é sempre flexível e vai auxiliar essa escuta. A trajetória da escritora brasileira Conceição Evaristo pode nos ajudar a ilustrar essa situação. Mediante obras literárias, ela trouxe à tona as dificuldades vividas por crianças negras no interior de uma instituição escolar eurocêntrica, que não levava (ou leva?) em conta as vivências das crianças. Veja um dos poemas de Conceição, que você encontra declamado pela própria autora no vídeo Ocupação Conceição Evaristo (2017) , disponível no canal do Itaú Cultural no YouTube: Foto: Walter Craveiro /Flip /Fotos Públicas Conceição Evaristo, 15ª Festa Literária Internacional de Paraty Flip: Mesa 17 – Amadas. Vozes-Mulheres A voz de minha bisavó ecoou criança nos porões do navio. ecoou lamentos de uma infância perdida. A voz de minha avó ecoou obediência aos brancos-donos de tudo. A voz de minha mãe ecoou baixinho revolta no fundo das cozinhas alheias debaixo das trouxas roupagens sujas dos brancos pelo caminho empoeirado rumo à favela A minha voz ainda ecoa versos perplexos com rimas de sangue e fome. A voz de minha filha recolhe todas as nossas vozes recolhe em si as vozes mudas caladas engasgadas nas gargantas. A voz de minha filha recolhe em si a fala e o ato. O ontem – o hoje – o agora. Na voz de minha filha se fará ouvir a ressonância O eco da vida-liberdade. (EVARISTO, Conceição. Poemas de recordação e outros movimentos. Rio de Janeiro: Malê, 2017. p. 10-11). A HISTÓRIA DA PERSONAGEM MARIA-NOVA No romance Becos da memória , publicado em 2017, Conceição Evaristo traz a personagem Maria-Nova, uma menina negra que frequentava o segundo ano ginasial. Sendo mais velha que os colegas, encontrava-se fora da faixa etária para a turma; além disso, sofria com as dificuldades que o ser negra e pobre lhe trazia. A personagem de Conceição Evaristo traz importantes reflexões a serem feitas em relação aos modos de ensinar da escola. Maria-Nova é uma personagem revolucionária, tendo em vista os questionamentos trazidos por ela em relação ao sistema educacional e à forma como os conteúdos escolares eram escolhidos, prescritos, organizados e ensinados. Maria-Nova aponta para a necessidade de contar a história do seu povo, decidindo fazer isso por meio da escrita. Contudo, essa escrita dependia do conhecimento escolar para existir. Conhecimento escolar que Maria-Nova tinha dificuldade de acompanhar, tendo em vista a situação vivida pela sua família, pela sua gente, precariamente instalada em favelas e em lugares com pouco ou nenhum acesso a recursos básicos de sobrevivência. A menina sofria, ainda, a ameaça de ter que abandonar a escola por causa do movimento de desfavelização. O lugar onde a menina morava deixaria de existir e ela precisaria se mudar e, consequentemente, abandonar a escola. Essa vontade que Maria-Nova tinha de escrever a história do seu povo, de contar outra história que não a história da escola, que era a história instituída por um poder branco que já se encontrava instaurado, era uma atitude transgressora no sentido de fazer ouvir, não somente as vontades e percepções das crianças de família branca e economicamente “poderosas”, mas também de se fazer ouvir as necessidades daquele que quer aprender, mas que não tem acesso aos mesmos bens culturais, já que lhe falta o básico para sobreviver. Foto: Shutterstock.com Relatos da história de Maria-Nova no livro Becos da memória de Conceição Evaristo mostram exemplos nos quais se subentende que Maria-Nova gostava de aprender e gostava de estudar, mas que não gostava de ir à escola porque a escola não a acolhia em suas necessidades. Desse modo, Maria-Nova passa a levantar a bandeira da urgência de uma educação que respeitasse outras formas de ser, de pensar e de agir no mundo. Assim, ocorre a consciência a respeito das opressões e das violências sofridas pelo negro no Brasil. Estamos aqui falando de toda criança que não consegue alcançar o conhecimento produzido na escola e pela escola por se tratar de um conhecimento alheio à sua experiência, alheio aos seus interesses, alheio à sua vida. Assim, é necessária uma organização dos “conteúdos” a serem ensinados, trabalhados em uma sala de aula, de modo que se dê prioridade ao que motiva a aprendizagem, ou seja, a experiência de vida dos estudantes. ATENÇÃO Se Paulo Freire (1998) utilizava as palavras do contexto de trabalho de seus alunos trabalhadores, utilizemos nós as palavras do cotidiano de nossos estudantes, de crianças, jovens, adultos ou idosos. O trabalho com a oralidade deverá ser aquele que dá sentido ao que é ensinado, por esse motivo é necessário um parêntese em relação a alguns métodos de alfabetização que dizem valorizar a oralidade sem, contudo, trabalhar a atribuição de sentidos e significados ao que é ensinado. Voltando à experiência de Maria-Nova, no livro de Conceição Evaristo, observamos, também, que a questão da oralidade está presente não apenas na leitura dos textos que já existem na literatura. A personagem desejava contar a história do seu povo por meio da escrita, contudo ela considerava que essa história já existia. Era uma narração existente que precisava ser transmitida de outra maneira, mas que já era um texto embora não estivesse escrito. É dessa concepção de oralidade que queremos falar aqui. A oralidade de um povo que traz a experiência da criança, do jovem, do adulto ou idoso. A oralidade que é vivência de quem vai aprender na escola. É essa oralidade que vai ser transformada no conhecimento de leitura e escrita na alfabetização, embora, para Conceição Evaristo, ela mesma já seja um texto. ORALIDADE E ORALIZAÇÃO O contrário dessa oralidade podemos chamar de oralização. Tendo em vista que um texto escrito já pode ter sido oralidade de alguém, quando esse texto é lido, ele é apenas oralizado. Ele já está construído, já está pronto e quem o lê o oraliza simplesmente. Assim, a oralização seria vocalizar ou colocar voz nas palavras escritas. Oralidade e oralização diferem em conceito, tendo em vista que a oralidade está presente nas tradições de um povo, está presente quando se transmite histórias de pai para filho, de geração para geração. Oralidade Está presente no folclore, nas cantigas, nas brincadeiras, nas músicas de ninar, nas parlendas. Tudo o que se transmite oralmente pela cultura popular é oralidade que pode ser escrita ou não. Tudo o que se transmite pela via oral, não só as narrações, mas experiências também, podemos chamar de oralidade. Oralização Embora não deva ser desvalorizada, é meramente o ato de ler escritas prontas, textos escritos por outros, embora possam ser vários tipos de textos como parlendas, adivinhas, músicas de ninar e outros textos do folclore e da literatura. Algumas vezes não são produções de quem lê. O trabalho de Conceição Evaristo na obra Becos da memória traz também a questão da oralidade como fundamento. Silva, Oliveira e Fiorotti (2019, p. 6) explicamque a obra aponta para a consciência das opressões vivenciadas pelos negros como fundamental para a liberdade e a visibilidade deles. Tal consciência seria garantida por meio da narrativa dessas opressões, violências e da escravidão contada por aqueles que realmente a experimentaram e a conhecem. Por isso, “Maria-Nova sonha com a possibilidade de colocar no papel essa história, que já está escrita no seu corpo negro, uma história grande e bem diferente da que ela leu na escola, nascida das pessoas de sua cor”. De acordo com a própria Conceição Evaristo, a gênese de sua escrita estava no acúmulo de tudo o que ela havia ouvido e vivido desde a infância. O acúmulo de palavras, de histórias, de vivências. Tudo vinha do seu cotidiano, das histórias que ouvia das mulheres que dela cuidavam, de mulheres negras lavadeiras, mulheres simples, marcadas pelo preconceito que a escravidão tinha deixado por herança para ela. Cercada por essas mulheres negras fortes e trabalhadoras, Conceição Evaristo cresce e cria um legado literário que é seu, que a ensina a viver em um mundo escasso de oportunidades para crianças como ela. Ainda por estar sempre cercada dessas mulheres, Conceição Evaristo se pergunta como as histórias cotidianas daquelas mulheres contadas umas para as outras, em forma de lamentos, murmúrios ou gargalhadas, deixariam de ser histórias orais e passariam a ser escritas? Indaga, ainda, quando aquelas mulheres conseguiriam fazer um movimento de escrita, assumindo o protagonismo de suas próprias histórias? Foto: Shutterstock.com O QUE LEVARIA DETERMINADAS MULHERES, NASCIDAS E CRIADAS EM AMBIENTES NÃO LETRADOS, E QUANDO MUITO, SEMIALFABETIZADOS, A ROMPEREM COM A PASSIVIDADE DA LEITURA E BUSCAREM O MOVIMENTO DA ESCRITA? (EVARISTO, 2020, p. 53) Essa parte da fala da autora nos remete a um sentido de oralidade que, talvez, ainda pareça novo: a oralidade como insubordinação. Uma insubordinação traduzida na escrita. Uma insubordinação não no sentido de desobediência a regras sociais ou de convívio social, mas insubordinação no sentido de contar a história daqueles que foram silenciados por uma sociedade elitista e eurocentrada. Poder contar a história daqueles que tiveram seus direitos negados ou que nunca tiveram direito algum. Conforme a própria autora explica, trata-se de uma insubordinação que se manifesta a partir de uma escrita que até pode ferir “as normas cultas” da língua, como acontece com a escritora e compositora Carolina Maria de Jesus (1914-1977), ou se evidencia também “pela escolha da matéria narrada” (EVARISTO, 2020, p. 54). O LEGADO DA ORALIDADE PARA A ALFABETIZAÇÃO NA ESCOLA Temos agora em mente o que é oralidade e como ela se diferencia da oralização. Conseguimos perceber que a oralidade vem, na verdade, da existência humana, da vivência do aprendiz da língua com seus pares. Ninguém é desprovido de oralidade, mas pode ser desprovido da oralização dos textos escolares. É essa oralidade que queremos aproveitar nas salas de aula das turmas de alfabetização quando levamos as brincadeiras, as músicas, as cantigas do folclore brasileiro, quando trabalhamos com as lendas, seja da Iara, do Curupira, do Saci ou outra história de nosso folclore e cultura. Foto: Comunicação MST / Fotos Públicas Centenário de Paulo Freire é tema de leitura e arte por crianças “Sem Terrinha”. Levamos para dentro da sala de aula a oralidade de um povo, assim como Conceição Evaristo levava para a escola a oralidade do seu próprio povo. Assim, também Paulo Freire (1998), ao utilizar palavras do cotidiano dos trabalhadores em suas aulas de alfabetização, valorizava essa mesma oralidade, porque trabalhava com palavras que produziam sentido na vida daquelas pessoas. A aprendizagem tinha significado. Não era um mero conjunto de informações soltas e alheias à vida. Paulo Freire valorizava a construção oral do povo e ajudava a transformar em oralizações os textos escritos que seus alunos encontravam pelos caminhos da vida. E é nessa perspectiva que queremos trabalhar aqui. TRABALHANDO COM TEXTOS ORAIS PARA A CONSTRUÇÃO DO TEXTO ESCRITO Travaglia et al . (2013, p. 4), em estudos sobre o que seriam os gêneros orais, estabeleceram que o gênero oral tem como suporte a voz humana, sendo “produzido para ser realizado oralmente, utilizando-se a voz humana independentemente de ter ou não uma versão escrita”. Assim, o simples fato de realizarmos a leitura de um texto escrito não o transforma em um texto de gênero oral. A partir de Travaglia (2007), podemos organizar os gêneros textuais orais em esferas de atividade humana nas quais são produzidos. Consideremos apenas algumas delas, especificamente aquelas que interessam ao ensino da leitura e da escrita. Esfera das relações do dia a dia Nesta esfera, o autor coloca os textos orais que utilizamos no dia a dia para resolver as problemáticas do nosso cotidiano. Incluídos aí estão a fofoca, a entrevista de emprego, os conselhos, as discussões, os recados, a cantiga de ninar do nosso folclore, o convite, a reclamação etc. Esfera do entretenimento e da literatura Nesta esfera, também vemos incluídos alguns dos gêneros que fazem parte do nosso folclore, como as cantigas de roda, as adivinhas, o repente. E ainda outros gêneros, como a peça de teatro, a anedota, a comédia, a narração esportiva, radiofônica, televisionada, a telenovela, a locução de um rodeio, a música, e assim por diante. Esfera escolar e acadêmica Aqui estão incluídos avisos e comunicados feitos em sala de aula por professores, pela direção, pela secretaria e pelos próprios alunos. As palestras, conferências e exposições orais durante as aulas também estão incluídas, assim como os debates, as arguições, as entrevistas de pesquisa e a prova oral. Esfera comercial e industrial Temos o leilão, o atendimento de call center , as transações de compra e venda, a entrevista, pesquisa de preço e opinião e o bordão do camelô. Esferas diversas Onde se encontram importantes gêneros para a utilização nas salas de aula de alfabetização: o depoimento, o relato de experiências de vida, os agradecimentos, a dramatização, a profissão de fé, as instruções, os avisos. Observamos nessas cinco esferas selecionadas que os gêneros textuais orais elencados são oriundos do cotidiano da atividade humana mais comum e corriqueira e, por esse motivo, mais interessantes para o ensino da leitura e da escrita. Assim como vimos em Conceição Evaristo, a experiência dá significado para aprendizagem. O interesse para aprender vem do interesse pela vida, do mesmo modo que os trabalhadores de Paulo Freire aprendiam com as palavras do seu cotidiano. Observamos que Travaglia (2007, p. 40) ainda descreve as características essenciais dos textos do gênero oral: O conteúdo temático. A estrutura composicional. Os objetivos e funções sociocomunicativas. As características da superfície linguística, geralmente com relação a outros parâmetros. As condições de produção. Foto: Shutterstock.com Assim, é possível identificar que tipos de texto oral favorecem a aprendizagem na alfabetização e que atividades podem potencializar o ensino. Traremos aqui o exemplo da parlenda como texto de gênero oral muito utilizado em aulas de turmas de alfabetização de crianças. TRABALHANDO COM PARLENDAS A parlenda é um rico e lúdico enunciado pedagógico que diverte e ensina pela sua forma rítmica, sonora e motora, uma vez que envolve as condições linguísticas e socioculturais dos seres humanos (BESERRA; RODRIGUES, 2010). A parlenda é um tipo de texto da tradição oral muito próximo do contexto infantil, contribuindo diretamente para a interação e a diversão. As parlendas, assim, são textos que fazem parte do universo sociocultural das crianças e, por isso, podem ser bastante proveitosas na prática pedagógica, permitindo que o aluno tenha experiência com a leitura antes mesmo de saber ler formalmente (BESERRA; RODRIGUES, 2010). É possível trabalharcom a oralidade de textos de parlendas em sala de aula de modo lúdico, através da brincadeira, a fim de que a criança tenha o texto de cor e consiga, depois de aprender oralmente, identificar palavras e frases desse texto nas posições em que se encontram na escrita. Foto: Shutterstock.com O trabalho com a oralidade a partir das parlendas também pode mobilizar as habilidades no uso da linguagem oral e gestual ou corporal, trabalhando sincronia de movimentos e como as palavras rimadas obrigam o uso da memória e de conhecimentos diversos. A brincadeira com uma parlenda em sala de aula também permite atividades nas quais as crianças demonstram notada alegria juntamente com seu esforço para lembrar dos movimentos e das palavras da brincadeira. TRABALHANDO COM A ESCRITA DE SI Outro gênero que tem se destacado ultimamente como capaz de contribuir positivamente para o processo de desenvolvimento da coesão e coerência da linguagem oral e da linguagem escrita está relacionado com as escritas de si, as escritas de experiências, que têm suas origens na oralidade. Como temos visto até aqui, a necessidade de transmitir uma mensagem ou uma ideia é que nos faz construir textos orais e/ou escritos. Por essa mesma necessidade, e juntando a isso a necessidade de deixar registrada a sua própria existência na tentativa também de se compreender nesse mundo e demarcar-se como uma personalidade que dele faz parte, há algum tempo as pessoas criaram o hábito de escrever diários e agendas. Com as mídias digitais, a escrita dos diários e das agendas saem do papel e ganham as páginas virtuais. Atualmente temos os diários eletrônicos ou virtuais, como os blogs, que são fáceis de serem utilizados, acessados e montados, tendo em vista que a própria ferramenta orienta a sua construção. Pimentel (2011) define o blog da seguinte maneira: A escrita de si, que era uma escrita íntima e que servia para que o sujeito fosse capaz de compreender a si mesmo, passou, a partir deste momento, a ser publicizada numa rede com milhares de leitores. Foto: Shutterstock.com O blog, por ser uma ferramenta “multifuncional ”, permite o acesso a vários outros tipos de mídias, que utilizam imagem, som e vídeo, possibilitando a presença da oralidade. Dinamizam as escritas de si, alterando também os seus objetivos, sua intencionalidade. Se por um lado podia parecer negativa a ideia de ter a vida íntima exposta na rede para milhares de usuários, por outro lado, são abertas novas possibilidades para a exploração do texto oral. Recordando Conceição Evaristo, podemos perceber a importância de trabalhar com os blogs nas salas de aula de alfabetização ou de ensino de Língua Portuguesa, tendo em vista que continuamos lidando com a produção do sentido daquilo que se aprende. O uso das tecnologias na sala de aula não deve ser meramente um meio de modernizar uma metodologia de ensino “tradicional”, mas deve dar corpo e vida ao conhecimento. ATENÇÃO Em vez de utilizar a tela do tablet para ler os textos que estariam nos livros didáticos ou que seriam passados no quadro negro ou branco, o ensino preocupado com os sentidos atribuídos ao conhecimento e à aprendizagem precisa estar focado no como e no quando usar as tecnologias na sala de aula. Ainda mais importante é que esse ensino se aproprie das escritas de si contidas no desejo de se projetar nesse mundo que cada estudante tem como ferramenta pedagógica. Construir o conhecimento no lugar de trabalhar somente com o que está pronto e permitir-se ouvir as necessárias falas dos estudantes. Foto: Shutterstock.com Em pesquisa focada na produção oral e escrita de crianças, Hartmann (2015, p. 48) levantou a importância de ouvir o que as crianças têm a dizer a respeito de si mesmas, conforme ela mesma indaga e responde: “O que é preciso para que uma criança conte uma história? Penso que o fundamental nessa resposta é: alguém que a escute – o que inclui ouvintes tão diversos quanto: outras crianças, adultos, animais de estimação ou mesmo seus bonecos preferidos”. Em sua pesquisa, Hartmann (2015, p. 54) utilizou uma estratégia de contação de histórias que estimulasse as crianças a contarem as histórias de suas vidas. Depois de registradas as histórias orais das crianças, os textos eram transcritos e devolvidos para que cada um pudesse corrigir ou fazer ajustes de acordo com o que achasse necessário, desse modo, “ao receberem o material impresso com suas narrativas, as crianças visualizavam concretamente sua autoria. A materialidade da escrita legitimava, assim, a criança como autora”. Em um tempo de uma hora e meia por semana, Hartmann (2015) realizava, por meio de um jogo, uma contação de história feita por ela mesma, e ouvia as histórias de quem quisesse se expressar. Essa ação resultou na coleta de lindas narrativas orais feitas pelas crianças, oriundas de sua imaginação e que serviam de motivação para a construção de conhecimentos diversos na escola, em especial, de leitura e de escrita, na medida em que aquelas crianças passaram a se reconhecer autoras de seus objetos de estudo. ORALIDADE COMO PONTO DE PARTIDA Assista ao vídeo sobre o trabalho com oralidade em sala de aula apresentado pela professora Cláudia Barreiros. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. A APRENDIZAGEM DA LEITURA E DA ESCRITA DEVE SE DESENVOLVER A PARTIR DO EIXO DA ORALIDADE. NESSE SENTIDO, É CORRETO AFIRMAR QUE A) oralidade e expressão oral na alfabetização correspondem apenas à leitura em voz alta. B) as falas diretas e indiretas dos alunos no processo de alfabetização devem estar incluídas no planejamento do professor C) as narrativas, diferentemente das falas espontâneas, não se constituem em recurso para a alfabetização. D) as falas dos alunos são importantes porque revelam suas deficiências e devem ser utilizadas principalmente para reprovar suas situações de vida. E) embora as falas dos alunos tenham algum valor, os planos de ensino devem estar focados na escrita apenas. 2. ASSINALE A ALTERNATIVA QUE APRESENTA PRINCIPALMENTE GÊNEROS ORAIS OU POSSIBILIDADES DE TRABALHO COM A ORALIDADE NO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO QUE VOCÊ ESTUDOU NESTE MÓDULO. A) Parlendas e narrativas de si. B) Narrativas e texto dissertativo. C) Contação de história e desenho. D) Leitura silenciosa e ditado. E) Ditado e música. GABARITO 1. A aprendizagem da leitura e da escrita deve se desenvolver a partir do eixo da oralidade. Nesse sentido, é correto afirmar que A alternativa "B " está correta. As diversas manifestações orais dos alunos no processo de alfabetização devem ser trabalhadas pelos professores, pois essas falas contribuem para o professor conhecer a realidade da qual o aluno vem e, também, podem ser usadas para motivar o aprendizado da língua. 2. Assinale a alternativa que apresenta principalmente gêneros orais ou possibilidades de trabalho com a oralidade no processo de alfabetização que você estudou neste módulo. A alternativa "A " está correta. Entre as diversas possibilidades de trabalho com a oralidade na aprendizagem da leitura e da escrita, temos as atividades desenvolvidas a partir das parlendas, integrando de forma lúdica linguagem oral, gestual e outros recursos, e das narrativas de si, integrando escrita com oralidade a partir das experiências reais das crianças. MÓDULO 3 Reconhecer recursos multissemióticos possíveis na alfabetização DIVERSIDADE DE LINGUAGENS E DE RECURSOS A aprendizagem da leitura e da escrita pode se valer de recursos que mobilizam diferentes linguagens, trazendo para o ambiente da sala de aula uma diversidade de textos e diferentes suportes materiais para esses textos. Para além dos livros impressos, que já trabalham com a linguagem verbal e visual, e outros recursos materiais que contribuem para a construção de um ambiente alfabetizador, como cartazes e jogos que apresentam o universo da escrita, é possível utilizar a linguagem audiovisual e os recursos da linguagem hipermidiática, a linguagem das mídias digitais.Assim, seja por meio de recursos impressos, analógicos ou digitais, pode-se trabalhar com a oralidade, a música, a dança, as imagens, as cores, as formas e outras diversas maneiras de se expressar e interagir, em uma relação com a cultura da escrita. Essa abordagem nos aponta a pertinência de se trabalhar com textos multimodais num contexto de multiletramentos. Foto: Shutterstock.com Isso implica reconhecer que os textos podem articular diferentes modalidades da mesma linguagem. Assim, a oralidade e a escrita são modalidades que podem estar presentes na produção e recepção de um texto verbal. Mas também são possíveis textos que associam diferentes linguagens, como acontece com uma música, articulando linguagem verbal e sonora, ou um documentário em vídeo, que pode mesclar oralidade, escrita, música, imagens, animações e outras linguagens. ATENÇÃO Em uma cultura hipermidiática, as crianças estão expostas a esse universo plural de linguagens e textos, ou hipertexto. Desse modo, a escola precisa trazer para o processo de alfabetização e de letramento essa diversidade de linguagens e recursos. Mas a abordagem a partir da diversidade não deve se limitar aos recursos e às linguagens. Também devemos integrar no ambiente escolar outras diversidades. Por isso, vamos apresentar algumas sugestões para se trabalhar com recursos semióticos, começando com algumas considerações sobre a diversidade na escola. ORALIDADES DIVERSAS NA ESCOLA Cada vez mais celebramos as iniciativas na legislação que trazem para o interior da escola crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos, que, muitas vezes, foram excluídos de diversas formas. Foto: Shutterstock.com Ao contarmos em nossas salas de aula com estudantes surdos, por exemplo, precisamos estar atentos ao fato de que a LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais) é a língua da oralidade desses sujeitos. Precisamos igualmente compreender que a LIBRAS não é Língua Portuguesa: suas estruturas são muito distintas. Se na oralidade de ouvintes o corpo e a expressão facial são importantes coadjuvantes ao texto fonético codificado que sai de suas bocas, na oralidade de surdos as mãos falam em gestos também codificados e as expressões faciais e o corpo significam ainda mais fortemente. Assim, em todas as etapas da escolarização, a pessoa surda vai enfrentar o desafio de “falar” uma língua e escrever outra. Isso demanda compreensão por parte do docente e um investimento de tempo e esforço a mais para estudante e docente. Demanda a “amorosidade freireana” para construir percursos educativos próprios e apropriados para que essas pessoas possam sentir-se reconhecidas, acolhidas, respeitadas e com seu direito à aprendizagem valorizado. Também crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos autistas estão cada vez mais presentes nos espaços escolares como cidadãos igualmente de direitos. Cabe à professora e ao professor entender que o autismo se constitui em um amplo espectro, que garante uma ampla variedade de potencialidades e desafios. Uma das características fortes do autismo é a peculiaridade de sua linguagem. A ecolalia, que consiste na repetição de textos, frases, palavras e sílabas continuadamente, muitas vezes é entendida como uma fala sem sentido. No entanto, no desafio de estruturar uma fala sua para expressar o que sente e pensa, muitas vezes, o autista utiliza enunciados ouvidos e recortados de outros contextos para significar suas próprias experiências. Desse modo, essas ecolalias constituem frequentemente a sua oralidade. E é delas que podemos partir para o aprendizado da leitura e da escrita. Foto: Shutterstock.com Alguns autistas não falam ainda. Alguns talvez nunca cheguem a falar. A escrita, no entanto, tem propiciado que muitos adolescentes, jovens e adultos autistas narrem e analisem suas experiências por meio de blogs e livros autobiográficos. Essas narrativas abrem as portas da interação e permitem que conheçamos um pouco do tipo de encarceramento que relatam vivenciar: uma mente ativa, mas um corpo que não lhes obedece. Os recursos de mídia têm sido grandes aliados também desses sujeitos. Esses relatos mostram pessoas inteligentes e sensíveis, que precisam ser conhecidas a fundo por todos. É nesse contexto que a Psicologia, em especial a Psicanálise, dá as mãos à escola e propõe encararmos a alfabetização de pessoas autistas como um tratamento, uma vez que muitos, embora não comandem tão bem suas falas, consigam comandar a escrita. Nesse movimento, alguns conseguem comandar a fala após a escrita e outros seguirão apenas pela escrita. Essas duas situações desafiantes na relação escrita e oralidade na escola mostram que a interação com a professora e os demais estudantes é uma demanda extra para o processo educativo. Invocando novamente Paulo Freire, sabemos que a educação se dá em um processo de comunhão entre aprendizes e ensinantes. Assim, é preciso que reconheçamos as pessoas surdas e as pessoas autistas como estudantes, alunos, colegas de mesma categoria que os demais. É necessário que cada estudante em nossas classes se sinta igualmente parte do todo da classe e da escola. PROPOSTA E RECURSO PARA TRABALHAR COM ALUNOS SURDOS E AUTISTAS Se você tiver um aluno surdo e/ou um aluno autista em sua classe, todos podem aprender. Você pode fazer uso de cartões de visualização da sequência para treino de atividades da vida diária, um material muito comum e disponível na internet para ajudar os autistas a organizarem rotinas de vida prática. Temos esse cartão a seguir, que compõe uma série de imagens e palavras para ensinar a lavar bem as mãos, estruturando a sequência necessária. Imagem: Laíza Cabral Com esse cartão, todos podem aprender a ler as palavras e imagens e a lavar bem as mãos. O aluno surdo pode ensinar aos colegas como se diz cada etapa dessa sequência em LIBRAS. Desse modo, todos na turma poderão começar a aprender um pouco de LIBRAS também. TRAVA-LÍNGUAS NA ALFABETIZAÇÃO Vamos, agora, apresentar um recurso que integra a oralidade ao aprendizado da escrita de uma forma bem lúdica. Ferreira e Ramos (2010) nos apresentam o trava-língua como um recurso que pode contribuir para o envolvimento dos alunos no aprendizado da língua. A partir de um trava-língua conhecido, é possível “trabalhar a interpretação do trava-língua, criar debates e deixar as crianças articularem opiniões sobre o tema, criar uma brincadeira, apresentar os trava-línguas como origem da cultura popular, o desenvolvimento da linguagem por meio dos fonemas, ritmo, pausa, gestos e entonação de voz, além de incentivar a criatividade das crianças a produzirem novos trava-línguas” (FERREIRA; RAMOS, 2010, p. 57). Imagem: Shutterstock.com Durante o processo de alfabetização, os trava-línguas podem ser convertidos para forma de texto escrito a fim de que as crianças desenvolvam também atividades de leitura do trava- língua, trabalhando as palavras do texto e seus aspectos linguísticos: [OS ALUNOS PODEM ACOMPANHAR] COM O DEDINHO A LEITURA DO TRAVA-LÍNGUA, VISUALIZAR O ALFABETO E RELACIONAR AS PALAVRAS TRABALHADAS NAQUELE CONTEXTO. ALÉM DISSO, O PROFESSOR PODE PARTIR DE UM TRAVA-LÍNGUA E FAZER A CRIANÇA CRIAR OUTRA VERSÃO DO TRAVA-LÍNGUA ANTERIOR. (FERREIRA; RAMOS, 2010, p. 57) RECURSOS AUDIOVISUAIS: USO DO VÍDEO O uso dos vídeos na educação é um recurso didático ao qual se recorre bastante. No processo de alfabetização e de letramento, o uso do vídeo pode contribuir, na verdade, para uma abordagem caracterizada pela multimodalidade e multiletramento. A linguagem audiovisual dos vídeos traz para a sala de aula diferentes modalidades de expressão e interação, podendo integrar oralidade, escrita, imagens e outros recursos comunicacionais. Sugerimos que você assista ao vídeo O tupi que você fala – Cláudio Fragata , disponível no canal da Educa Ativa no YouTube . Nesse vídeo, temos as múltiplas semioses concorrendo à atenção das crianças: Uma história sendo narrada (o recursode ouvir histórias). As imagens do livro dessa história (ver imagens em movimentos). A associação entre imagem e som significando conjuntamente. Uma música cantada e tocada em instrumento violão. O vídeo explora vários recursos e linguagens, como: Abundância do colorido A imagem ou desenho infantil O uso da palavra escrita O uso da palavra falada Todos esses recursos aparentemente não sobrecarregam o receptor/ouvinte, porque são recursos que se comunicam, ou seja, que se articulam. JOGOS INTERATIVOS DIGITAIS É possível elaborar vários jogos ou atividades que “exploram” as palavras da Língua Tupi que apareceram no vídeo/livro. Discutir a cultura dos povos originários para além de uma cultura exótica e comemorativa do dia 19 de abril é exigência curricular já prevista na Lei 11.645/2008. É importante refletir com as crianças, desde a alfabetização, sobre a formação da Língua Portuguesa e as tensões que estão presentes em seu processo formativo, percebendo a Língua Tupi viva em nosso vocabulário e estrutura como disputa linguística importante. Em um exemplo de jogo ou atividade que utiliza recursos digitais, relativamente simples, é preciso encontrar as palavras referentes aos nomes dos animais passando o mouse sobre a sequência de letras que forma a palavra dentro do quadro. Imagem: Laíza Cabral SAIBA MAIS É possível elaborar outros jogos usando inclusive recursos ou plataformas de jogos interativos digitais gratuitos, como Wordwall . Essas plataformas e esses aplicativos são um recurso que o professor pode explorar, criando jogos que trabalhem as atividades de reflexão sobre a língua para a etapa de alfabetização. VÍDEO, MÚSICA E JOGO Há vídeos ou videoclipes que possibilitam trabalhar não somente imagem, oralidade e escrita como também os recursos sonoros da música. Um exemplo é o vídeo Pindorama , que traz um clipe da música Pindorama , interpretada pelo conhecido grupo Palavra Cantada. O vídeo foi produzido pela Fundação Padre Anchieta e é disponibilizado no canal da TV Cultura no YouTube . O vídeo aborda o “evento” do Descobrimento do Brasil, problematizando a visão colonizadora dos europeus que narraram uma parte da história. A partir do trabalho com o vídeo, é possível desenvolver atividades lúdicas e jogos que envolvam o aprendizado inicial da Língua Portuguesa escrita. Um jogo relativamente simples é o de formar palavras presentes na temática do vídeo, a partir do clique em letras do alfabeto, como no exemplo a seguir: Imagem: Laíza Cabral Reprodução do jogo “Nomes da Terra Brasil”. SAIBA MAIS Esses jogos ou atividades podem ser desenvolvidos a partir de aplicativos ou plataformas digitais, como LearningApps. Também é possível criar uma cena para esse “descobrimento” narrado na música Pindorama . Pense os personagens, cenários e os diálogos possíveis. Desafie sua turma a trabalhar em pequenos grupos para fazer pequenas apresentações para a turma. AS PRODUÇÕES DAS CRIANÇAS COMO MATERIAIS DE ANÁLISE As produções das crianças mesmo em materiais como desenho ou modelagem exploram múltiplos sentidos para os conhecimentos que estão sendo produzidos. Como percebemos na imagem a seguir, a criança também experimenta os diferentes recursos a que está exposta, como desenho, cores, letras/palavras. Imagem: Acervo pessoal das autoras (Ana Paula Menezes Andrade; Claudia Hernandez Barreiros Sonco, Jonê Carla Baião) Produção de alunos. Após um debate sobre palavras “poderosas”, a partir da biografia da ativista paquistanesa Malala Yousafzai, a professora propõe que as crianças digam palavras que elas consideram poderosas. Várias palavras são ditas e anotadas no quadro. Depois, as crianças são convidadas a falar do poder de cada palavra e uma pode ser escolhida como a palavra poderosa da turma nesse dia. Uma criança traz a palavra “amizade”, como palavra poderosa para um dia, sendo acolhida pela turma. Observe os desenhos e busque inferir, ler diferentes sentidos para o poder da palavra amizade. Na atividade, é preciso perceber os detalhes dos traços do desenho: A perspectiva. A amizade sinalizada nas mãos dadas e levantadas. As três amigas sinalizadas com seus nomes. Olhando para um futuro? O que mais você exploraria nessa imagem? Explorar as diferentes produções dos alunos para autorreflexão do grupo colabora para as recriações e futuras produções. A autocrítica, a revisão e a análise contribuem para produções cada vez mais críticas de nossos alunos. Atualmente, encontramos uma variedade de materiais nos meios digitais e nas redes sociais. São recursos que podemos explorar de diferentes maneiras e trabalhando diversas linguagens, sejam das artes cênicas, artes manuais, das cores e formas, da palavra falada e escrita, dos gestos, do corpo etc. Explorar esse universo é abrir-se para outras leituras na sala que não a leitura estritamente de letras impressas nos livros ou materiais didáticos. A escolha do termo multiliteracies (traduzido como multiletramentos) está relacionada com a diversidade de linguagens e manifestações culturais, além das diferentes mídias. Assim, diante dessa pluralidade de linguagens e mídias, devemos trabalhar sempre sob a perspectiva da multiplicidade, produzindo sentidos a partir da multimodalidade; ou seja, por meio de práticas que enfatizam a diversidade de linguagens e as formas de interação, que devem ser trabalhadas de modo integrado e simultâneo (MANTOVANI, 2019). RECURSOS MULTISSEMIÓTICOS NA ALFABETIZAÇÃO Assista ao vídeo sobre o uso de recursos multissemióticos na alfabetização com a professora Jonê Baião. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. UMA PROFESSORA EXIBE EM SALA DE AULA, PARA CRIANÇAS QUE ESTÃO SENDO ALFABETIZADAS, O VIDEOCLIPE DE UMA MÚSICA QUE CONTA UMA CONHECIDA HISTÓRIA INFANTIL. PARA SE TRABALHAR A ORALIDADE E O APRENDIZADO DA ESCRITA A PARTIR DA MULTIMODALIDADE E DO MULTILETRAMENTO, QUAL ATIVIDADE MAIS PERTINENTE PODERIA SER DESENVOLVIDA LOGO EM SEGUIDA? A) Convidar as crianças para participarem de um jogo digital interativo em que trabalhariam com a forma escrita de algumas palavras da música cantada no vídeo. B) Levar as crianças para o pátio da escola a fim de procurarem objetos ou imagens que teriam relação com a história cantada. C) Repetir o videoclipe e pedir para as crianças decorarem a letra da história que ouviram. D) Repetir o videoclipe várias vezes até as crianças internalizarem a melodia da música que ouviram. E) Pedir para as crianças desenharem todos os personagens que apareceram no videoclipe. 2. ANALISE AS AFIRMATIVAS A SEGUIR: I- O TRAVA-LÍNGUAS É UM RECURSO QUE PODE SER UTILIZADO NA ALFABETIZAÇÃO A PARTIR DA INTEGRAÇÃO ENTRE ORALIDADE E ESCRITA. II – O TRABALHO COM TRAVA-LÍNGUAS DEVE ESTAR CENTRADO NO DITADO OU NA CÓPIA, POIS O QUE IMPORTA É DESENVOLVER A HABILIDADE MOTORA DA CRIANÇA NA ESCRITA. III – NAS ATIVIDADES COM TRAVA-LÍNGUAS NA ALFABETIZAÇÃO, É POSSÍVEL TRABALHAR COM A INTERPRETAÇÃO DO TRAVA-LÍNGUA, REALIZAR DEBATES SOBRE OS SEUS SENTIDOS, REESCREVER O TRAVA- LÍNGUA E ATÉ RECRIAR OU PRODUZIR NOVOS TRAVA-LÍNGUAS. ESTÁ CORRETO APENAS O QUE SE AFIRMA EM A) I. B) II. C) III. D) I e II. E) I e III. GABARITO 1. Uma professora exibe em sala de aula, para crianças que estão sendo alfabetizadas, o videoclipe de uma música que conta uma conhecida história infantil. Para se trabalhar a oralidade e o aprendizado da escrita a partir da multimodalidade e do multiletramento, qual atividade mais pertinente poderia ser desenvolvida logo em seguida? A alternativa "A " está correta. O trabalho com vídeos em sala de aula é um recurso que permite articular e integrar várias linguagens e modalidades, pois, além das linguagens verbal, sonora e visual presentes no vídeo, é possível também desenvolver jogos ou atividades lúdicas que retomem palavras que foram apresentadas na exibição do vídeo. Essas atividades, inclusive, podem ser realizadas em ambientes digitais, desenvolvendo a aprendizagem a partir damultimodalidade e do multiletramento. 2. Analise as afirmativas a seguir: I- O trava-línguas é um recurso que pode ser utilizado na alfabetização a partir da integração entre oralidade e escrita. II – O trabalho com trava-línguas deve estar centrado no ditado ou na cópia, pois o que importa é desenvolver a habilidade motora da criança na escrita. III – Nas atividades com trava-línguas na alfabetização, é possível trabalhar com a interpretação do trava-língua, realizar debates sobre os seus sentidos, reescrever o trava- língua e até recriar ou produzir novos trava-línguas. Está correto apenas o que se afirma em A alternativa "E " está correta. Trava-línguas são recursos que articulam oralidade e escrita, podendo servir para o desenvolvimento de atividades que explorem aspectos do som e da grafia das palavras, os sentidos das palavras, os aspectos expressivos da língua, como ritmo e entonação, além de outros elementos como o gestual. CONCLUSÃO CONSIDERAÇÕES FINAIS Olhar para a diversidade de textos a que estamos expostos na sociedade multiletrada e multissemiótica em que vivemos nos faz repensar os modos de trabalhar linguagens em sala de aula desde a alfabetização. Desafiamos um pouco aqui o que nós professores podemos (re)pensar sobre as práticas em nossas salas de aula para formação de leitores e criadores críticos de materiais semióticos ou que produzem sentido. Sabemos que muito do que vivemos nos anos de 2020 e 2021, por causa da pandemia de Covid-19 e da necessidade do ensino remoto, fez com que tivéssemos que repensar o ensino e os modos antes canônicos de trabalhar textos em sala de aula. Há muito ainda a conquistar nas políticas públicas para que a escola possa realmente se apropriar desses recursos nas salas de aula, principalmente das escolas públicas, tais como acesso amplo e de qualidade à internet para toda população, equipamentos e aplicativos para as professoras e professores, materiais didáticos financiados por políticas públicas ao modelo do que temos com os programas para os livros na escola, formação docente para o trabalho com o letramento, e mídias digitais com análise crítica para que as nossas crianças e jovens possam sair do lugar de consumidores passivos para serem consumidores e produtores críticos de um mundo que tem produzido a sua história em outros artefatos culturais que não mais o papel e o grafite, entre outros. AVALIAÇÃO DO TEMA: REFERÊNCIAS ARAÚJO, M. D. V.; FRADE, I. C. S. A.; COSCARELLI, C. V. Multimodalidade: aproximações conceituais, produções infantis e propostas pedagógicas no processo de alfabetização. In : Revista Brasileira de Alfabetização, São Paulo, n. 13, 2020. BARREIROS, C. H. Quando a diferença é motivo de tensão: um estudo de currículos praticados em classes iniciais do ensino fundamental. 2006. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Pedagogia, PUC-Rio, Rio de Janeiro, 2006. BESERRA, C. R. G.; RODRIGUES, J. P. Gêneros orais na sala de alfabetização: parlendas. In : Educação e Docência, São José do Rio Preto, v. 1, n. 1, jan.-jun. 2010. FERREIRA, B. A.; RAMOS, F. M. O papel do trava-língua, enquanto gênero oral, na sala de alfabetização. In : Educação e Docência, São José do Rio Preto, v. 1, n. 1, jan.-jun. 2010. EVARISTO, C. Becos da memória. Florianópolis: Mulheres, 2020. SILVA, M. B. L. F.; OLIVEIRA, M. A. C.; FIOROTTI, D. A. Por um ensino de literatura sob o olhar das representações étnico-raciais: análise de Becos da memória, de Conceição Evaristo, e Um defeito de cor, de Ana Maria Gonçalves. In : Itinerarius Reflectionis: Revista Eletrônica de Graduação e Pós-Graduação em Educação. Jataí, vol. 15, n. 4, 2019. FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1998. HARTMANN, L. Equilibristas, viajantes, princesas e poetas: performances orais e escritas de crianças narradoras. In : Revista Boitatá, Londrina, n. 20, jul.-dez. 2015. MANTOVANI, L. Pedagogia dos Multiletramentos: a que se refere? Entretanto, 11 nov. 2019. OLIVEIRA, M. B. F.; SZUNDY, P. T. C. Práticas de multiletramentos na escola: por uma educação responsiva à contemporaneidade. In : Bakhtiniana, São Paulo, v. 9, n. 2, ago.-dez. 2014. PIMENTEL, C. A escrita íntima na internet: do diário ao blog pessoal. In : O Marrare, Revista da Pós-Graduação em Literatura Portuguesa UERJ, Rio de Janeiro, ano 11, n. 14, jan.-jun. 2011. TRAVAGLIA, L. C. A caracterização de categorias de texto: tipos, gêneros e espécies. In : Alfa: Revista de Linguística, São José dos Campos, v. 51, n. 1, jan. 2007. TRAVAGLIA, L. C. et al . Gêneros orais: conceituação e caracterização. In : Anais do SILEL, v. 3, n. 1. XIV Simpósio Nacional de Letras e Linguística e IV Simpósio Internacional de Letras e Linguística. Uberlândia: EDUFU, 2013. EXPLORE+ Assista aos seguintes vídeos no YouTube: CEALE debate – Multiletramentos no ciclo de Alfabetização , palestra seguida de debate com a pesquisadora Roxane Rojo. A oralidade na alfabetização , palestra com as professoras Adriana Limaverde e Maria José Barbosa. Programa Maritaca , no Canal Programa Maritaca, com histórias, brincadeiras e músicas para se trabalhar com as crianças. Leia os seguintes textos: A importância da oralidade no processo de alfabetização , de Clarice Lehnen Wolff e Gracielle Tamiosso Nazari, publicado na Revista Letrônica da PUCRS. Oralidade, escrita e letramento , de Cecília Maria Aldigueri Goulart, publicado pelo MEC no e-book Práticas de leitura e escrita . Acesse: No LearningApps, é possível encontrar jogos prontos e criar outros como ferramenta de aprendizagem. CONTEUDISTA Ana Paula Menezes Andrade CURRÍCULO LATTES Claudia Hernandez Barreiros Sonco CURRÍCULO LATTES Jonê Carla Baião CURRÍCULO LATTES javascript:void(0); javascript:void(0); javascript:void(0);
Compartilhar