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ARTIGO OS DIREITOS FUNDAMENTAIS E O CONTRATO A PERSPECTIVA DE CLAUSWILHELM CANARIS

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Os direitos fundamentais e o contrato: a perspectiva de 
Claus-Wilhelm Canaris 
 
 
Página 1 
OS DIREITOS FUNDAMENTAIS E O CONTRATO: A PERSPECTIVA DE 
CLAUS-WILHELM CANARIS 
 
Fundamental rights and the contract: the Claus-Wilhelm Canaris perspective 
Revista de Direito Privado | vol. 83/2017 | p. 161 - 178 | Nov / 2017 
DTR\2017\6769 
 ___________________________________________________________________________ 
Rosana de Souza Kim Jobim 
Mestranda em Direito do Trabalho pela UFRGS. Especialista em Direito do Trabalho e 
Processo do Trabalho. Advogada. rosanajobim@yahoo.com.br 
 
Marcio Félix Jobim 
Mestre em Direito Privado e Especialista em Direito do Consumidor e Direitos 
Fundamentais e estudante de Filosofia pela UFRGS. Advogado. 
marcio@jobimesalzano.com.br 
 
Área do Direito: Constitucional; Civil; Fundamentos do Direito 
 
Resumo: Este trabalho trata da intersecção dos direitos fundamentais com o direito 
privado, de forma mais específica, ocupa-se do contrato como elemento fundamental do 
direito privado. O estudo terá por base a análise das teorias que buscaram explicar a 
relação entre os direitos fundamentais e o direito privado, dessa forma inicia-se com a 
Teoria da eficácia horizontal dos Direitos Fundamentais e Direito Privado, a Teoria da 
eficácia direta (Imediata) e a Teoria da eficácia indireta (Mediata). Na sequência, analisa a 
Teoria dos deveres de proteção de Claus-Wilhelm Canaris, a qual aborda os traços gerais 
da teoria dos deveres de proteção e os contratos. Por fim, conclui-se que a teoria de 
Claus-Wilhelm Canaris utiliza-se de menos pressupostos teóricos, primando pela 
simplicidade, para explicar o fenômeno da eficácia dos direitos fundamentais no direito 
privado. 
 
Palavras-chave: Direitos fundamentais - Direito privado - Contrato - Eficácia - 
Claus-Wilhelm Canaris 
 
Abstract: This work studies the intersection of fundamental rights with private law, more 
specifically, deals with the contract as a fundamental element of private law. The study will 
be based on the analysis of theories that seek to explain the relationship between 
fundamental rights and private law, starting with the Theory of Horizontal effect of 
Fundamental Rights and Private right, the Theory of Direct Effect (or immediate effect) and 
the Theory of Indirect Effect (or mediate effect). Then it analyzes Claus-Wilhelm Canaris's 
Theory of Protection Duties, which approaches the general features of the Protection Duties 
Theory and the contracts. Finally, it concluded that Claus-Wilhelm Canaris's theory uses 
less theoretical presuppositions, emphasizing simplicity, to explain the phenomenon of the 
effect of fundamental rights in private law. 
 
 Keywords: Fundamental rights - Private law - Contract - Efficiency - Claus-Wilhelm 
 
Os direitos fundamentais e o contrato: a perspectiva de 
Claus-Wilhelm Canaris 
 
 
Página 2 
Canaris 
 
Sumário: 
1 Introdução - 2 Teorias da eficácia horizontal dos direitos fundamentais e direito privado 
- 3 A teoria dos deveres de proteção de Claus-Wilhelm Canaris - 4 Conclusão - 5 
Referências 
 
1 Introdução 
O presente trabalho ocupa-se da intersecção dos direitos fundamentais com o direito 
privado, mais especificamente, com o contrato, instituto que, junto com a família e a 
propriedade, formam a tríade fundamental do direito privado. 
Para tanto, o trabalho se ocupará com a análise das teorias que buscaram explicar a 
relação entre os direitos fundamentais e o direito privado, estando, dessa forma, assim 
organizado: primeiro serão repassadas as teorias tradicionais da eficácia horizontal dos 
direitos fundamentais, a saber: a teoria da eficácia direta e a teoria da eficácia indireta; 
após, será analisada a teoria desenvolvida por Claus-Wilhelm Canaris, a qual se denomina 
teoria dos deveres de proteção. 
2 Teorias da eficácia horizontal dos direitos fundamentais e direito privado 
O desenvolvimento da teoria da eficácia horizontal dos direitos fundamentais deu-se na 
Alemanha, nos anos 1950 e 1960. Como motivos, para isso, podem ser elencados, sem 
pretensão de exaustão, a notória capacidade dos juristas alemães de assimilar e 
equacionar problemas jurídicos e a intensificação do estudo dos direitos fundamentais após 
o regime nacional socialista, sobretudo através do reconhecimento da dignidade como 
valor imanente e inviolável do ser humano.1 
Foi no campo do direito do trabalho que o tema adquiriu impulso oficial,2 tendo grande 
discussão no direito contratual, da concorrência, no direito de família e sucessões. Os 
motivos apontados para o protagonismo do direito do trabalho no nascedouro da teoria são 
a desigualdade de poder, típica das relações de trabalho, e, consequentemente, a restrição 
de direitos fundamentais da parte mais vulnerável, no caso, os trabalhadores. Esse 
desequilíbrio foi vislumbrado em outras relações privadas, ampliando a extensão dos 
estudos. 
O tema gera muitas discussões e dúvidas no sentido de até que ponto os direitos 
fundamentais podem, de certo modo, restringir a liberdade de contratar, a autonomia 
privada. Apenas o ponto de partida é certo: queira ou não queira, os direitos fundamentais 
desenvolvem efeitos em todos os ordenamentos jurídicos.3 
No Brasil, o tema foi, ainda que discretamente, abordado por Couto e Silva, em 1976, 
quando abordou a necessidade de regulamentação das cláusulas contratuais pela 
legislação.4 Hodiernamente, trata-se de tema latente entre os juristas brasileiros. 
Passa-se a apresentar as teorias que defendem uma eficácia horizontal dos direitos 
fundamentais no direito privado. 
2.1 Teoria da eficácia direta (imediata) 
 
Os direitos fundamentais e o contrato: a perspectiva de 
Claus-Wilhelm Canaris 
 
 
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A teoria da eficácia direta (imediata) dos direitos fundamentais no direito privado sustenta 
que os direitos fundamentais vinculam os particulares independentemente de qualquer 
outra mediação normativa. Dessa forma, a eficácia normativa dos direitos fundamentais se 
irradiaria diretamente da Constituição, tanto na linha vertical, cobrindo a relação 
Estado/cidadão, quanto na linha horizontal, cobrindo a relação cidadão/cidadão. 
Pode-se dizer que o berço da teoria da eficácia direta pode ser encontrado na obra “A 
Dignidade Humana” (1954) de Carl Nipperdey, cuja tese central foi posteriormente 
reforçada por Walter Leisner, em “Direitos fundamentais e Direito Privado” (1960).5 
Nipperdey6 identifica, analisando o conteúdo dos tipos de direitos fundamentais, um tipo 
de direito que não se esgota na relação entre estado/cidadão, tendo, ao contrário, um 
escopo de aplicação mais ampla, na medida em que opera como princípio estruturante da 
sociedade. Segundo o autor, 
(...) também nesse reconhecimento de institutos jurídicos com seu efeito vinculativo para 
o estado e o tráfego do direito privado não se esgota a função das determinações 
mencionadas no catálogo de direitos fundamentais. Uma série toda delas tem, ademais, a 
função importante de proposições de ordem ou normas de princípio, portanto, normas 
objetivas para o ordenamento jurídico total. Elas vinculam, por isso, também o tráfego do 
direito privado imediatamente, isto é, não primeiro com base em leis que foram, pelo dador 
de leis ordinário, em execução da norma de princípio, promulgadas. 
Na síntese de Ingo Wolfgang Sarlet7, 
(...) a concepção de uma vinculação direta dos particulares a direitos fundamentais 
encontra respaldo no argumento de acordo com o qual, em virtude de os direitos 
fundamentais constituírem normas expressando valores aplicáveis para toda a ordem 
jurídica, como decorrência do princípio da unidade da ordem jurídica, bem como em 
virtude do postulado da força normativa da Constituição (...). 
Há, na fundamentação dada pela teoria da eficácia imediata por Carl Nipperddey,8 um 
caráter ético, na medida em que os direitos fundamentais seriama expressão de valores 
assumidos pela sociedade, razão por que não poderiam ter seus efeitos limitados à relação 
entre o Estado e o particular. O autor considera que, “Sobretudo, não se deveria ignorar, 
que os direitos fundamentais, em todo o caso, muitos deles, são tão fortemente a 
expressão geral de princípios, que têm de existir em uma sociedade bem, justa, liberal e 
socialmente ordenada, que seu efeito não pode ser limitado à relação de estado e cidadão, 
mas também tem de valer para os consortes jurídicos uns com os outros”. 
A teoria da eficácia direta foi adotada pela jurisprudência do Tribunal Federal do Trabalho 
(Bundesarbeitesgericht – BAG) que sustentou que muitos dos direitos fundamentais não 
devem somente garantir a liberdade perante o poder estatal, mas também nas relações 
privadas, de forma que os negócios jurídicos privados não poderiam entrar em contradição 
com a ordem pública. 
O tema ganhou debate na Alemanha, sobretudo, a partir do debate sobre a impossibilidade 
de diferenciação de salários entre homens e mulheres frente a trabalho de mesma 
natureza, surgindo o princípio da igualdade salarial (Grundsatz der Lohngleigchheit). O 
Tribunal Federal do Trabalho alemão aplicou esse princípio, pela primeira vez, em 1955 
 
Os direitos fundamentais e o contrato: a perspectiva de 
Claus-Wilhelm Canaris 
 
 
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(igualdade de salários vinculando o setor público e os contratos coletivos de trabalho). 
Outro exemplo de aplicabilidade direta dos direitos fundamentais no âmbito do contrato do 
trabalho deu-se no caso das cláusulas de celibato de enfermeiras, de 1957. Nesse caso a 
jurisprudência reconheceu, com base nos preceitos constitucionais, sem invocação de 
nenhuma norma ordinária, que a cláusula contratual que previa a extinção do contrato de 
trabalho de enfermeiras de um hospital privado, caso estas viessem a contrair matrimônio, 
foi reconhecida como inválida pelo Tribunal Federal do Trabalho, sob o argumento de que 
“elas violavam a proteção do matrimônio e da família, a dignidade humana e a garantia de 
livre desenvolvimento da personalidade”.9 
Conforme recapitula Marcelo Schenk Duque,10“A argumentação do BAG seguiu a linha das 
decisões já aqui citadas, citando a característica dos direitos fundamentais como preceitos 
ordenadores da vida social, com significado direto para as relações privadas, e, 
especificamente, o fato de que acordos e negócios jurídicos-privados em geral não podem 
situar-se em contradição com aquilo que se pode denominar arranjo estrutural ou ordem 
pública de um ordenamento jurídico-estatal concreto”. 
A partir da jurisprudência do Tribunal Federal do Trabalho, a teoria se fortaleceu: 
existiriam, segundo essa Corte, princípios de ordem para a vida social que têm “significado 
imediato” para o tráfego jurídico dos cidadãos.11 Posteriormente, o próprio Tribunal passou 
a se questionar sobre a aplicabilidade direta dos direitos fundamentais. 
Necessário registrar que esta teoria sustenta que não são todos os direitos fundamentais 
que teriam eficácia direta no âmbito das relações privadas, mas, tão somente, aqueles 
princípios ligados diretamente ao princípio da dignidade humana. Desta forma, apesar da 
diferenciação de eficácias a depender do conteúdo, quase todos os direitos fundamentais 
podem ser conectados à proteção da dignidade humana, de forma a generalizar essa 
aplicação. 
Walter Leisner12 propôs uma teoria para amenizar a aplicação direta da eficácia dos direitos 
fundamentais na relação privada, sobretudo em relação à autonomia. Para isso, distinguiu 
Leisner entre a irradiação de efeitos dos direitos fundamentais no campo contratual e no 
campo extracontratual. Para ele, ainda que os direitos fundamentais tenham eficácia 
direta, eles podem ser renunciados no âmbito do exercício da autonomia privada, 
observando-se que essa renúncia não poderia ser ilimitada, e que a relação jurídica em que 
ocorra não poderia ser desequilibrada, ou assimétrica. 
De forma a organizar as premissas da teoria da eficácia direta, Wilson Steinmz13 assim as 
pontua: “(i) As normas de direitos fundamentais conferem ao particular (indivíduo, 
cidadão) uma posição jurídica oponível não só ao Estado, mas também aos demais 
particulares. Trata-se do status socialis de que fala Nipperdey, uma posição jurídica que 
autoriza o particular a elevar uma pretensão de respeito contra todos. (ii) Os direitos 
fundamentais são e atuam como direitos subjetivos constitucionais independentemente de 
serem públicos ou privados. (iii) Como direitos subjetivos constitucionais, a não ser que o 
Poder Constituinte tenha disposto o contrário, operam eficácia independentemente da 
existência de regelações legislativas específicas ou do recurso interpretativo-aplicativo das 
cláusulas gerais do direito privado”. 
 
Os direitos fundamentais e o contrato: a perspectiva de 
Claus-Wilhelm Canaris 
 
 
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No direito nacional, como defensor da tese, Ingo Wolfgang Sarlet, sem distinção, se as 
partes estão ou não em condições iguais, justificando sua tese no princípio da dignidade 
humana, todavia levando em consideração os diversos graus de eficácia que as normas de 
direitos fundamentais detêm. 
O reconhecimento da teoria da eficácia direta em nosso ordenamento pode ser verificado e 
exemplificado no Recurso Extraordinário 201.819, de relatoria da Min. Ellen Gracie, julgado 
em 11.10.2005, pela 2.ª Turma do Superior Tribunal Federal, no caso de exclusão de um 
sócio de uma entidade privada (União Brasileira de compositores) quando não presente a 
garantia da ampla defesa e do contraditório, atrelada à qualidade da entidade associativa 
ao confundir-se com serviço público por delegação (atividade essencial na cobrança de 
direitos autorais).14 
2.2 Teoria da eficácia indireta (mediata) 
A teoria da eficácia indireta (mediata) dos direitos fundamentais no direito privado foi 
criada pelo jurista Günter Dürig, que, em 1954, defendeu a impossibilidade de contratos 
privados excluírem a possibilidade de livre circulação de uma das partes contratantes. 
Este autor defendia que a aplicação imediata dos direitos fundamentais nas relações 
privadas colidiria com o princípio da dignidade e livre desenvolvimento a personalidade, 
previstos na Lei Fundamental de Bonn. Sua paradigmática formulação afirma que “a 
eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas ocorre de forma indireta, por meio 
da interpretação das cláusulas gerais do direito civil, passíveis e carentes de 
preenchimento valorativo”.15 
Se os direitos fundamentais, vocacionados para uma eficácia vertical entre 
estado/cidadão, valessem com a mesma intensidade também para as relações entre 
privados, o ataque que sofreria o Direito Civil e, sobretudo, a autonomia privada seria 
insustentável. 
O ponto de partida de sua elaboração teórica vem a ser o reconhecimento do valor 
fundamental do direito de liberdade. No dizer de Virgílio Afonso da Silva,16“É esse direito 
que impede que os direitos fundamentais tenham um efeito absoluto nas relações 
privadas, o que significaria um total domínio do direito constitucional sobre o direito 
privado. Segundo Dürig, esse direito geral de liberdade inclui também a liberdade, de que 
devem gozar os participantes em uma relação de direito civil, de evitar as disposições de 
direitos fundamentais, que, para a ação estatal, são incontornáveis. Sem essa liberdade de 
contornar a aplicabilidade dos direitos fundamentais, a liberdade contratual ficaria 
comprometida”. 
Em suma, as cláusulas gerais de Direito Civil que necessitam de preenchimento valorativo 
sofrem o impacto da eficácia indireta dos direitos fundamentais, haja vista a necessidade 
de legislação infraconstitucional para conformar os direitos fundamentais. A concretização 
dos direitos fundamentais, para esta teoria, deverá ocorrer vinculada ao espírito do direito 
privado (autonomia privada). 
Umpensamento chave para esta teoria é a convergência do direito privado para a 
constituição, convergência na interpretação. 
 
Os direitos fundamentais e o contrato: a perspectiva de 
Claus-Wilhelm Canaris 
 
 
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Quando se fala na vinculação dos particulares aos direitos fundamentais, não se trata de 
uma vigência imediata dos direitos de liberdade para o tráfego jurídico privado, mas sim de 
um direcionamento do Direito Civil às decisões de valor expressas pelos direitos 
fundamentais. 
A teoria da eficácia indireta não prega que um tribunal tenha que aplicar um direito 
fundamental ao invés de uma norma civil para a solução de uma controvérsia privada. Pelo 
contrário, da norma civil derivam direitos privados subjetivos orientados aos direitos 
fundamentais, direitos esses que sempre existiram no marco do Direito Civil, ainda que em 
certos casos o texto da norma não lhes oferece um fundamento manifesto. 
A Constituição não pretende substituir a ordem jurídico-privada por princípios carentes de 
execução detalhada, ao contrário visa dar reconhecimento e confirmação da ordem jurídica 
como um todo. 
Esta teoria prega ser necessária uma margem de ação e de liberdade para os particulares, 
com vistas a evitar, através de um intervencionismo asfixiante ou igualitarismo extremo, 
uma afetação no sentimento da liberdade e de iniciativa dos particulares. 
Há uma segunda via de penetração (indireta) dos direitos fundamentais no âmbito privado 
que se dá através do Poder Judiciário, fundamentada na circunstância de que os juízes, por 
um mandamento constitucional (Verfassungsgebot), podem examinar se as disposições de 
Direito Civil que devem ampliar estão influenciadas pelos direitos fundamentais na 
formação de critérios valorativos, que se realizam, sobretudo, mediante as disposições de 
direito privado, que contêm um direito imperativo, e que forma parte da ordem pública em 
sentido amplo. 
Mesmo este caso, em que há a participação de dois particulares e do Poder Judiciário, não 
se confunde com a teoria da eficácia direta, pois para que os juízes extraiam dos direitos 
fundamentais uma eficácia nas relações jurídicos-privadas, estes estarão invariavelmente 
apoiados e condicionados aos limites das cláusulas gerais ou dos conceitos indeterminados 
do Direito Civil. Cláusulas gerais não devem significar que as outras normas de direito 
privado não existem, não tenham validade ou eficácia, de modo a concluir que há um 
repertório limitado de critérios para que se chegue a uma solução normativa para um 
determinado problema inspirando segurança e previsibilidade.17 
O caso Lüth é o marco da propagação jurisprudencial do conceito da eficácia indireta dos 
direitos fundamentais no âmbito jurídico-privado e pela possibilidade de exame 
constitucional das decisões proferidas por tribunais civis. A inovação não foi compreender 
a aceitação dos direitos fundamentais no tráfego das relações privadas, pois a Constituição 
de Weimar já havia dado suporte a isso. A principal inovação, portanto, foi a aceitação de 
que os direitos fundamentais personificam também uma ordem de valores objetiva e que o 
conteúdo jurídico desses direitos se desenvolve indiretamente por meio de prescrições de 
direito privado. 
No momento em que o Estado cumpre o seu dever de configurar o direito privado em 
conformidade com a Constituição, ele se torna ativo na ampliação das liberdades. 
A teoria da eficácia indireta mostra-se como modelo apto a fundamentar, racionalmente, 
uma eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas, sem gerar uma ruptura no 
 
Os direitos fundamentais e o contrato: a perspectiva de 
Claus-Wilhelm Canaris 
 
 
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ordenamento jurídico, por respeitar os seus diferentes níveis. 
O núcleo da teoria da eficácia indireta repousa na constatação de que a influência dos 
direitos fundamentais sobre o direito privado é, em primeiro lugar, uma tarefa para o 
legislador ordinário, vinculado, por sua vez, aos direitos fundamentais, que assumem a 
função de concretizar o conteúdo jurídico desses direitos, demarcando as posições dos 
sujeitos privados garantidas pela Constituição. De forma que a vinculação indireta dos 
particulares é consequência da vinculação direta dos órgãos estatais aos direitos 
fundamentais. 
3 A teoria dos deveres de proteção de Claus-Wilhelm Canaris 
Verifica-se uma tendência doutrinária que busca fundamentar a relação entre os direitos 
fundamentais e o direito privado como uma cristalização do dever de proteção 
(Schutzpflicht) do Estado em relação aos direitos fundamentais, sobretudo na instância 
jus-privada, entre particulares. 
O objetivo deste capítulo é apresentar esta teoria, tal como a concebeu Claus-Wilhelm 
Canaris, ressaltando seus aspectos constituintes, bem como sua utilidade crítica, sob a 
perspectiva da realidade jus-normativa brasileira. 
3.1 Traços gerais da teoria dos deveres de proteção 
Apesar de reconhecer que já tenha sido visitado e revisitado por diversos juristas, 
Claus-Wilhelm Canaris18 pretende dar uma dimensão adicional ao tema da eficácia dos 
direitos fundamentais no direito privado, justificando sua atualidade em razão da profícua 
aplicabilidade da teoria pelo Tribunal Constitucional Alemão19. 
A teoria dos deveres de proteção do Estado parte da compreensão de direitos 
fundamentais como princípios objetivos, que obrigam o Estado a agir, na medida do 
possível, para a realização dos direitos fundamentais. 
Claus-Wilhelm Canaris20 assenta sua teoria sobre três problemas, ou três distinções, que 
formula: (i) o relacionado aos destinatários dos direitos fundamentais; (ii) o relacionado ao 
objeto do exame com base nos direitos fundamentais; e (iii) o relacionado à função dos 
direitos fundamentais. 
Quanto ao primeiro ponto, Canaris distingue a eficácia dos direitos fundamentais em 
relação aos seus destinatários, tema até então negligenciado pela doutrina da eficácia 
frente a terceiros/horizontal (Drittwirkung), seja direta ou indireta. Sua tese defende que 
os direitos fundamentais não vinculam os particulares, mas encontram no Estado deveres 
de proteção, foi guia e pauta da doutrina atual da eficácia horizontal.21 
Na medida em que os direitos fundamentais vinculam diretamente apenas os poderes 
públicos, excluindo-se os sujeitos de Direito Privado, somente se submetem ao controle 
desses direitos os atos estatais, sobretudo leis e decisões judiciais, excluindo-se atos de 
Direito Privado constituídos por negócios jurídicos e atos ilícitos. E para responder a última 
questão, coloca em análise o caso Lüth, argumentando que o caso poderia ter sido 
resolvido de modo diverso: pela atuação dos direitos fundamentais como proibição de 
intervenção. 
 
Os direitos fundamentais e o contrato: a perspectiva de 
Claus-Wilhelm Canaris 
 
 
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Na medida em que o Estado tem o dever de proteger os direitos fundamentais por meio do 
Direito Privado, não se reconhece a eficácia imediata dos direitos fundamentais22 nas 
relações entre privados, antes o dever de o Estado atuar nessas relações, protegendo 
àqueles que tenham seus direitos fundamentais ameaçados de violação. 
Estabelecido ser o Estado o destinatário dos direitos fundamentais, Canaris, como segundo 
ponto, passa a se perguntar sobre qual seria o objeto que é regido pela relação de direitos 
fundamentais: é o ato de órgão público (Estado), ou somente o comportamento de pessoas 
privadas.23 Para Canaris, os atos de Estado submetidos aos efeitos dos direitos 
fundamentais são, predominantemente, dois, a saber, as leis e as sentenças dos tribunais. 
Neste sentido, tanto o Estado, ao legislar, quanto o Estado, ao jurisdicionar, está obrigado 
a observar os limites impostos pelos direitos fundamentais. Para o autor: “Em tais casos 
normas jusprivatistas são aferidas diretamente (isto é, sem mediações) com base nos 
direitos fundamentais. Na minha opinião, nãofaz sentido falar aqui da sua ‘eficácia 
externa’ – como não raras vezes ocorre na Alemanha”.24 
Por último, Canaris pergunta-se, a fim de dar conta, como os direitos fundamentais 
influenciam os contratos, os negócios jurídicos e demais atos de sujeitos privados – e 
Canaris reconhece, explicitamente, essa influência25 – acerca da função ou das funções que 
os direitos fundamentais assumem no sistema jurídico. 
Os direitos fundamentais, nesse sentido, assumem duas funções fundamentais na medida 
em que eles são aplicados no âmbito do direito privado: funcionam como proibições de 
intervenção e direitos de defesa em relação ao Estado (EingriffsverboteundAbwehrrechte), 
servindo à defesa de intervenções por parte do Estado nos itens privados dos cidadãos; e 
como mandamentos de tutela ou deveres de proteção (Schutzgebote), obrigando o Estado 
à proteção dos seus cidadãos.26 
A eficácia mediata dos direitos fundamentais nas relações jus-privadas, para Canaris, 
ocorre por meio de uma aplicação da segunda função, quer dizer, quando o Estado, seja 
por meio do legislador ou do juiz, é chamado a atuar numa relação jus-privada, protegendo 
determinado cidadão, que se vê numa situação em que um direito fundamental seu está 
para ser violado por outro cidadão. 
Para Canaris27, esta teoria mantém a coerência do sistema, explicando como se dá a 
eficácia dos direitos fundamentais no Direito Privado, respeitando a regra de que os 
destinatários dos direitos fundamentais é o Estado. 
Sintetizando a fundamentação da teoria dos deveres de proteção com acuidade, Marcelo 
Schenk Duque28 pondera que “[...] ao reconhecer a pessoa como valor supremo do 
ordenamento, o Estado tem o dever de protegê-la, independentemente do lado do qual 
provenha a agressão, de modo que as relações privadas não podem passar ao largo desse 
dever de proteção estatal”. 
A fundamentação dos deveres de proteção do Estado (deveres fundamentais) pode ser 
reconduzida aos marcos do clássico modelo contratualista do Estado, segundo o qual a 
ampla renúncia ao direito à efetiva autoproteção, condicionada pela transição da situação 
pré-estatal pela estatal, somente pode ser racionalmente justificada se o indivíduo, em 
troca dessa renúncia, obtém um direito à efetiva proteção do Estado. Não se trata da 
 
Os direitos fundamentais e o contrato: a perspectiva de 
Claus-Wilhelm Canaris 
 
 
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realização da liberdade por meio da lei, mas proteção da liberdade por meio da lei. 
Ferrenho opositor desta teoria, Virgílio Afonso da Silva considera que seus defensores 
priorizam monologicamente a perspectiva histórica do surgimento dos direitos 
fundamentais. Nesse sentido, o autor afirma que, “Segundo a doutrina majoritária, os 
direitos fundamentais surgem, historicamente, nas declarações de direito, com uma 
função bem definida: proteger os indivíduos contra violações por parte do Estado. Essa é a 
sua função essencial, que muitos costumam chamar de clássica. [...] Aqueles autores que 
rejeitam qualquer efeito dos direitos fundamentais nos outros ramos do direito apenas 
radicalizam e absolutizam esse argumento, para sustentar que direitos fundamentais são, 
única e exclusivamente, direitos dos cidadãos contra o Estado. Assim sendo, não produzem 
eles efeitos nas relações dos particulares entre si”. 
Particularidade do pensamento de Claus-Wilhelm Canaris consiste no fato de que o Estado 
tem a função de proteger direitos fundamentais dos particulares contra agressões 
provenientes de outros sujeitos privados, por meio da atuação do legislador e da 
jurisprudência dos tribunais. Inova, sobretudo, ao trazer a figura da proibição da 
insuficiência (Untermaßverbot) como expressão dogmática dos deveres de proteção, no 
contexto da discussão da relação dos direitos fundamentais como direito privado. 
A configuração dúplice assumida pelos direitos fundamentais, geradores de deveres de 
abstenção (negativo) e deveres de proteção (positivo) é bem caracterizada por Ingo 
Wolfgang Sarlet,29 quando diz que “Ao passo que, na sua função como direitos de defesa, 
os direitos fundamentais constituem limites (negativos) à atuação do Poder Público, 
impedindo ingerências indevidas na esfera dos bens jurídicos fundamentais, ao imporem 
deveres de proteção, as normas de direitos fundamentais implicam uma atuação positiva 
do Estado, notadamente obrigando-o a intervir (preventiva ou repressivamente) inclusive 
quando se tratar de agressão oriunda de outros particulares, dever esse que – para além 
de expressamente previsto em alguns preceitos constitucionais contendo normas 
jusfundamentais – pode ser reconduzido ao princípio do Estado de Direito, na medida em 
que o Estado é o detentor do monopólio, tanto da aplicação da força quanto no âmbito da 
solução dos litígios entre os particulares, que (salvo em hipóteses excepcionais, como a da 
legítima defesa) não podem valer-se da força para impedir e, especialmente, corrigir 
agressões oriundas de outros particulares”. 
Dessa forma, quando o Estado cria os pressupostos para a manutenção da liberdade, ele 
assume a obrigação de manter e assegurar esta liberdade. Os deveres de proteção podem 
ser efetivados não apenas pela abstenção em violar os direitos fundamentais, mas, 
igualmente, por meio de intervenções dos poderes públicos, no sentido de garantir esses 
direitos contra ameaças diversas. 
A vantagem da teoria dos deveres de proteção parece se localizar na preservação da 
autonomia do Direito Privado, na medida em que preserva aos sujeitos, no âmbito das 
relações jus-privadas, a capacidade de se autorregularem sem intervenção do Estado – o 
que será melhor explorado no derradeiro capítulo. 
3.2 A teoria dos deveres de proteção e os contratos 
A questão de que se ocupa a derradeira parte deste trabalho trata da força explicativa da 
 
Os direitos fundamentais e o contrato: a perspectiva de 
Claus-Wilhelm Canaris 
 
 
Página 10 
teoria dos deveres de proteção no que concerne ao Direito Privado e, sobretudo, aos 
contratos. 
Um dos problemas subjacentes à aplicação dos direitos fundamentais no Direito Privado 
vem a ser a possibilidade de uma desnaturação da disciplina jus-privatista, com possível 
perda de segurança jurídica, visto que o Direito Privado é a estrutura, os pilares jurídicos 
de uma sociedade. 
Neste sentido, Claus-Wilhelm Canaris30 salienta que a aplicação da teoria da eficácia direta 
teria como consequência a extinção do Direito Privado: “Salta aos olhos que uma aplicação 
consequente dessa doutrina poderia destruir tanto o direito contratual quanto também o 
direito da responsabilidade extracontratual, pois ambos seriam substituídos em larga 
escala pelo direito constitucional. Isso contradiz a autonomia do Direito Privado, 
desenvolvida organicamente no decorrer de muitos séculos [...]”. 
Numa primeira leitura, ninguém se oporia à eficácia, aparentemente, direta de um direito 
fundamental, tal como disciplinado no inc. XXII, do art. 5.º, da CF/1988 (LGL\1988\3), que 
prevê ser “garantido o direito de propriedade”. Afigura-se evidente que, não somente o 
Estado, mas todo e qualquer cidadão deveria respeitar a propriedade alheia, ressalvadas 
algumas excepcionais hipóteses que retiram a antijuridicidade do desrespeito ao bem 
alheio, e.g., crime famélico por parte do particular, ou desapropriação por parte do Estado 
etc. – do que se poderia concluir que tal direito fundamental teria eficácia direta entre os 
particulares. 
No entanto, se alguém tem seu direito de propriedade violado por um terceiro, que não o 
Estado, o direito fundamental à propriedade – previsto constitucionalmente – será exigido 
frente ao Estado-juiz para que este o garanta, reintegrando o ofendido em sua posse, 
numa clara aplicação dos direitos fundamentais enquanto mandamentos de tutela ou 
deveres de proteção (Schutzgebote): quer dizer, Estado, destinatário do direito 
fundamental, tem o dever de restituiro cidadão lesado ao status quo ante. 
Por certo que a relação jus-privada é alcançada pela decisão, sofrendo os efeitos do direito 
fundamental à propriedade. No entanto, na perspectiva de Canaris, a relação jurídica de 
direito fundamental dá-se entre o cidadão, que teve seu direito violado, e o Estado, que 
deverá restituí-lo à situação anterior, garantindo seu direito. 
Os direitos fundamentais agem, dessa forma, como mandamentos de tutela: um dever 
geral de proteção que se fundamenta no princípio do Estado de direito e do monopólio 
estatal do uso de autoridade e de força legítima, cabendo tão somente ao poder público 
afastar as agressões aos direitos dos particulares. 
A mediação realizada pelos tribunais, tendo em vista a influência dos direitos 
fundamentais, encontra eco também no campo dos contratos privados. Nessa disciplina, a 
atuação dos tribunais, na verificação de violação de direitos fundamentais, dar-se-ia por 
meio da revisão de cláusulas que dispusessem indevidamente de direitos fundamentais, ou 
mesmo na interpretação dos negócios jurídicos em conformidade com os ditames 
constitucionais. 
O Tribunal Constitucional Alemão, e.g., declarou a inconstitucionalidade de um dispositivo 
do Código Comercial alemão sob a perspectiva de um dever de proteção da garantia 
 
Os direitos fundamentais e o contrato: a perspectiva de 
Claus-Wilhelm Canaris 
 
 
Página 11 
constitucional da liberdade de profissão. Trata-se do caso do representante comercial 
(Handeslvertreter-Entscheidung). Neste caso, Neleum, representante comercial de uma 
vinícola, entrou em litígio com a sociedade representada, em vista da rescisão do contrato 
de trabalho. O Código Comercial alemão, no art. 90, a, II, previa a possibilidade de se 
proibir a contratação de um representante comercial, pelo prazo de até 2 anos (pacto de 
não concorrência), sem direito à indenização, na hipótese de prévia rescisão do contrato de 
representação comercial por culpa desse. O Tribunal concluiu que o dispositivo era 
inconstitucional, por violar a liberdade de profissão. 
Verifica-se a conexão entre a decisão do representante comercial e o controle do conteúdo 
jurídico dos contratos privados, surgindo para o Estado uma obrigação de proteção 
derivada da garantia constitucional de liberdade de profissão. Nesta teoria, o Estado deve 
atuar com a finalidade de proteger e fomentar a realização de direitos fundamentais em 
uma conduta que engloba a proteção contra intervenções de terceiros. 
4 Conclusão 
A navalha de Ockhan é uma máxima atribuída ao filósofo medieval Guilherme de Ockhan, 
também chamada de princípio da parcimônia, que simboliza o princípio da simplicidade na 
construção de teorias. Sua formulação mais comum vem a ser: “Entia non sunt 
multiplicandapraeternecessitatem(as entidades não devem multiplicar-se sem 
necessidade)”, mas sua formulação em Ockhan seria esta: “Frustafit per plura quod potest 
fieri per pauciora (é vão fazer com mais o que se pode fazer com menos)”.31 
A navalha pode assumir uma feição ontológica, pela qual se deve acreditar no menor 
número possível de objetos, e uma feição metodológica, pela qual qualquer explicação 
deve apelar ao menor número possível de fatores para explicar o fato em análise.32 
A teoria de Claus-Wilhelm Canaris, nessa perspectiva, aparenta explicar o fenômeno da 
eficácia dos direitos fundamentais no direito privado utilizando-se de menos pressupostos 
teóricos – o que se coaduna com o mandamento de simplicidade, preconizado pela máxima 
de Ockhan – preservando a autonomia teórica e dogmática do direito privado. 
5 Referências 
BRANQUINHO, João; GOMES, Nelson Gonçalves. Enciclopédia de termos lógico-filosóficos. 
São Paulo: Martins Fontes, 2006. 
CANARIS, Claus-Wilhelm. A influência dos direitos fundamentais sobre o direito privado na 
Alemanha. In: SARLET, Ingo Wolfgang. Constituição, direitos fundamentais e direito 
privado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. 
CANARIS, Claus-Wilhelm. A influência dos direitos fundamentais sobre o direito privado na 
Alemanha. Revista Jurídica. São Paulo,v. 312, p. 7-22, out. 2003. 
CANARIS, Claus-Wilhelm. Direitos fundamentais e direito privado. Coimbra: Almedina, 
2006. 
DUQUE, Marcelo Schenk. Direito privado e Constituição: drittwirkung dos direitos 
fundamentais, construção de um modelo de convergência à luz dos contratos de consumo. 
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. 
 
Os direitos fundamentais e o contrato: a perspectiva de 
Claus-Wilhelm Canaris 
 
 
Página 12 
DURIG, Günter. Direitos fundamentais e direito privado. In:HECK, Luiz Afonso. Direitos 
fundamentais e direito privado: textos clássicos. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 
2012. 
GRIGOLEIT, Hans Christophet al. Verbete introdutório de FestschriftfürClaus-Wilhelm 
Canaris: zum 70. Geburtstag zum 70. München: Verlag C.H. Beck, 2007. 
NIPPERDEY, Carl. Direitos fundamentais e direito privado. In: HECK, Luiz Afonso (Org.). 
Direitos fundamentais e direito privado: textos clássicos. Porto Alegre: Sergio Antonio 
Fabris, 2011. 
SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais e direito privado: algumas considerações 
em torno da vinculação dos particulares aos direitos fundamentais. Revista de Direito do 
Consumidor. São Paulo,v. 36, p. 54-104, out.-dez. 2000. 
SILVA, Clovis Veríssimo do Couto e.A obrigação como processo.São Paulo: Bushatsky, 
1976. 
SILVA, Virgílio Afonso da. A constitucionalização do direito: os direitos fundamentais nas 
relações entre os particulares.São Paulo: Malheiros, 2005. 
STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos particulares a direitos fundamentais. São Paulo: 
Malheiros, 2004. 
 
 
1 Reza o artigo primeiro da Constituição da República Federativa da Alemanha que: “Die 
WürdedesMenschensistunantastbar”, quer dizer, “a dignidade humana é inviolável”. 
 
2 DUQUE, Marcelo Schenk. Direito privado e Constituição: drittwirkung dos direitos 
fundamentais, construção de um modelo de convergência à luz dos contratos de consumo. 
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 41. 
 
3 CANARIS, Claus-Wilhelm. A influência dos direitos fundamentais sobre o direito privado 
na Alemanha. Revista Jurídica. São Paulo,v. 312, p. 7-8, out. 2003. 
 
4 SILVA, Clovis Veríssimo do Couto e. A obrigação como processo.São Paulo: Bushatsky, 
1976. p. 23 e ss. 
 
5 Nesse sentido: DUQUE, Marcelo Schenk. Direito privado e Constituição: drittwirkung dos 
direitos fundamentais, construção de um modelo de convergência à luz dos contratos de 
consumo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 103; e STEINMETZ, Wilson. A 
vinculação dos particulares a direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros Editores, 2004. 
p. 164. 
 
6 NIPPERDEY, Carl. Direitos fundamentais e direito privado. In: HECK, Luiz Afonso (Org.). 
Direitos fundamentais e direito privado: textos clássicos. Porto Alegre: Sergio Antonio 
Fabris Editores, 2011. p. 59. 
 
 
Os direitos fundamentais e o contrato: a perspectiva de 
Claus-Wilhelm Canaris 
 
 
Página 13 
7 SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais e direito privado: algumas considerações 
em torno da vinculação dos particulares aos direitos fundamentais. Revista de Direito do 
Consumidor. São Paulo, vol. 36, p. 54-104, out.-dez. 2000. 
 
8 NIPPERDEY, Carl. Direitos fundamentais e direito privado. In: HECK, Luiz Afonso (Org.). 
Direitos fundamentais e direito privado: textos clássicos. Porto Alegre: Sergio Antonio 
Fabris, 2011. p. 62. 
 
9 DUQUE, Marcelo Schenk. Direito privado e Constituição: drittwirkung dos direitos 
fundamentais, construção de um modelo de convergência à luz dos contratos de consumo. 
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 105. 
 
10 DUQUE, Marcelo Schenk. Direito privado e Constituição: drittwirkung dos direitos 
fundamentais, construção de um modelo de convergência à luz dos contratos de consumo. 
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 105. 
 
11 DURIG, Günter. Direitosfundamentais e direito privado. In:HECK, Luiz Afonso. Direitos 
fundamentais e direito privado: textos clássicos. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 
2012. p. 23. 
 
12 DUQUE, Marcelo Schenk. Direito privado e Constituição: drittwirkung dos direitos 
fundamentais, construção de um modelo de convergência à luz dos contratos de consumo. 
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 110. 
 
13 STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos particulares a direitos fundamentais. São Paulo: 
Malheiros, 2004. p. 168. 
 
14 Tendo em vista a relevância do julgado conjugado ao fato de tratar-se de profunda 
análise da questão por nossa Corte Superior, transcrevo a detalhada e elucidativa ementa 
quanto ao tema: “Sociedade civil sem fins lucrativos. União Brasileira de Compositores. 
Exclusão de sócio sem garantia da ampla defesa e do contraditório. Eficácia dos direitos 
fundamentais nas relações privadas. Recurso desprovido. I – Eficácia dos direitos 
fundamentais nas relações privadas. As violações a direitos fundamentais não ocorrem 
somente no âmbito das relações entre o cidadão e o Estado, mas igualmente nas relações 
travadas entre pessoas físicas e jurídicas de direito privado. Assim, os direitos 
fundamentais assegurados pela Constituição vinculam diretamente não apenas os poderes 
públicos, estando direcionados também à proteção dos particulares em face dos poderes 
privados. 
II – Os princípios constitucionais como limite à autonomia privada das associações. A 
ordem jurídico-constitucional brasileira não conferiu a qualquer associação civil a 
possibilidade de agir à revelia dos princípios inscritos nas leis e, em especial, dos 
postulados que têm por fundamento direto o próprio texto da Constituição da República, 
notadamente em tema de proteção às liberdades e garantias fundamentais. O espaço de 
autonomia privada garantido pela Constituição às associações não está imune à incidência 
dos princípios constitucionais que asseguram o respeito aos direitos fundamentais de seus 
 
Os direitos fundamentais e o contrato: a perspectiva de 
Claus-Wilhelm Canaris 
 
 
Página 14 
associados. A autonomia privada, que encontra claras limitações de ordem jurídica, não 
pode ser exercida em detrimento ou desrespeito aos direitos e garantias de terceiros, 
especialmente aqueles positivados em sede constitucional, pois a autonomia da vontade 
não confere aos particulares, no domínio de sua incidência e atuação, o poder de 
transgredir ou de ignorar as restrições postas e definidas pela própria Constituição, cuja 
eficácia e força normativa também se impõem, aos particulares, no âmbito de suas 
relações privadas, em tema de liberdades fundamentais. III – Sociedade civil sem fins 
lucrativos. Entidade que integra espaço público, ainda que não estatal. Atividade de caráter 
público. Exclusão de sócio sem garantia do devido processo legal. Aplicação direta dos 
direitos fundamentais à ampla defesa e ao contraditório. As associações privadas que 
exercem função predominante em determinado âmbito econômico e/ou social, mantendo 
seus associados em relações de dependência econômica e/ou social, integram o que se 
pode denominar de espaço público, ainda que não estatal. A União Brasileira de 
Compositores – UBC, sociedade civil sem fins lucrativos, integra a estrutura do Ecad e, 
portanto, assume posição privilegiada para determinar a extensão do gozo e fruição dos 
direitos autorais de seus associados. A exclusão de sócio do quadro social da UBC, sem 
qualquer garantia de ampla defesa, do contraditório, ou do devido processo constitucional, 
onera consideravelmente o recorrido, o qual fica impossibilitado de perceber os direitos 
autorais relativos à execução de suas obras. A vedação das garantias constitucionais do 
devido processo legal acaba por restringir a própria liberdade de exercício profissional do 
sócio. O caráter público da atividade exercida pela sociedade e a dependência do vínculo 
associativo para o exercício profissional dos seus sócios legitimam, no caso concreto, a 
aplicação direta dos direitos fundamentais concernentes ao devido processo legal, ao 
contraditório e à ampla defesa (art. 5º, LIV e LV, CF/88 (LGL\1988\3)). 
IV – Recurso extraordinário desprovido.” (STF. RE 201.819, rel. Min. Ellen Gracie, j. 
11.10.2005). 
 
 
15 DUQUE, Marcelo Schenk. Direito privado e Constituição: drittwirkung dos direitos 
fundamentais, construção de um modelo de convergência à luz dos contratos de consumo. 
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 196. 
 
16 SILVA, Virgílio Afonso da.A constitucionalização do direito: os direitos fundamentais nas 
relações entre os particulares.São Paulo: Malheiros Editores, 2005. p. 75. 
 
17 Neste sentido: SILVA, Virgílio Afonso da.A constitucionalização do direito: os direitos 
fundamentais nas relações entre os particulares.São Paulo: Malheiros Editores, 2005. p. 
209. 
 
18 Breve nota biográfica. Claus-Wilhelm Canaris nasceu em 1937, na cidade de Legnitz e 
frequentou escolas nas cidades de Koenigsberg, Miesbach e Dusseldorf. Após o Abitur, nos 
anos de 1957-61, ele estudou Direito, Filosofia e Germanística em Paris, Genf e Munique. 
Em Munique ele prestou concurso e tornou-se assistente científico de Karl Larenz, a quem 
a capacidade do jovem jurista já no seu seminário de metodologia jurídica impressionou. 
Rapidamente, Canaris passou a pertencer ao grupo de conversa, ao qual Larenz dedicou 
seu livro doutrinal sobre Metodologia da Ciência Jurídica. Um primeiro fruto das conversas, 
 
Os direitos fundamentais e o contrato: a perspectiva de 
Claus-Wilhelm Canaris 
 
 
Página 15 
reflexões sobre os métodos do conhecimento jurídico, sobre a admissibilidade e limites do 
desenvolvimento jurídico que foi publicado no ano de 1964 (segunda edição no ano de 
1983), foi a dissertação sobre “Die Feststellung von LuckenimGesetz” (A identificação das 
lacunas na lei), sendo considerada uma de suas principais teses. Esta tese visa que os 
princípios de identificação de lacunas, não só as identificam como também antecipam 
(praejudizieren) o seu preenchimento (Ausfuellung). Nesta obra, destaca-se o princípio da 
igualdade para o fechamento de lacunas, podendo ser considerado o berço do seu trabalho 
posterior, qual seja: “SystemdenkenundSystembegriff in der Jurisprudenz”, que Canaris 
desenvolveu para o seu seminário de Habilitação e também teve segunda edição publicada 
em 1983, sendo uma teoria muito conceituada. Lecionou nas universidades de Graz 
(1968), Hamburg (1969) e, posteriormente, substituiu em Munique (1972) seu mestre 
Karl Larenz. Foi professor das cadeiras de Direito Privado, Comercial, Trabalhista e Filosofia 
do Direito na Universidade de Ludwig Maxilimilan de Munique. Possui uma vasta produção 
na área do direito do trabalho. Os tópicos são vastos, a saber: responsabilidade civil em 
atividades de risco; limites de controle nas operações de acordo; disposições coletivas; a 
inserção de condições no direito e coletivo, falta de regulamentação de pequenas 
empresas; continuação de pagamento de salário em caso de empregados doentes 
(“previdência”) dentre outros. Nesse sentido, ler: GRIGOLEIT, Hans Christoph et al. 
Verbete introdutório de FestschriftfürClaus-Wilhelm Canaris: zum 70. Geburtstag zum 70. 
München: Verlag C.H. Beck, 2007. p.VI-X. 
 
19 CANARIS, Claus-Wilhelm. Direitos fundamentais e direito privado. Coimbra: Almedina, 
2006. p. 19-20. 
 
20 CANARIS, Claus-Wilhelm. A influência dos direitos fundamentais sobre o direito privado 
na Alemanha. Revista Jurídica. São Paulo, v. 312, p. 16-19, out. 2003. 
 
21 GRIGOLEIT, Hans Christoph et al. Verbete introdutório de Festschrift für Claus-Wilhelm 
Canaris: zum 70. Geburtstag zum 70. München: Verlag C.H. Beck, 2007. p. VI. 
 
22 Ressalva seja feita à possibilidade de a própria Constituição estabelecer um direito 
fundamental com aplicação imediata entre os particulares, tal como o art.9, inciso III, 
alínea 2, da Lei Fundamental Alemã, e o art. 36, da Constituição Italiana. Nesse sentido, 
CANARIS, Claus-Wilhelm. A influência dos direitos fundamentais sobre o direito privado na 
Alemanha. Revista Jurídica, v. 312, p. 17. São Paulo, out. 2003. 
 
23 CANARIS, Claus-Wilhelm. A influência dos direitos fundamentais sobre o direito privado 
na Alemanha. Revista Jurídica. São Paulo, v. 312, p. 7-22, out. 2003. 
 
24 CANARIS, Claus-Wilhelm. A influência dos direitos fundamentais sobre o direito privado 
na Alemanha. Revista Jurídica. São Paulo, v. 312, p. 18, out. 2003. 
 
25 Afirma Canaris, verbis: “Ao contrário do que ocorre com as leis, verifica-se que os 
contratos, negócios jurídicos e outros atos de sujeitos jusprivatistas não constituem objeto 
de um exame direto com base nos direitos fundamentais, pois as pessoas que executam 
esses atos não são, como já foi exposto, destinatários dos direitos fundamentais. Não 
obstante, os direitos fundamentais também exercem sua influência nestes casos.” (grifo 
 
Os direitos fundamentais e o contrato: a perspectiva de 
Claus-Wilhelm Canaris 
 
 
Página 16 
nosso). CANARIS, Claus-Wilhelm. A influência dos direitos fundamentais sobre o direito 
privado na Alemanha. Revista Jurídica. São Paulo, v. 312, p. 18, out. 2003. 
 
26 CANARIS, Claus-Wilhelm. A influência dos direitos fundamentais sobre o direito privado 
na Alemanha. Revista Jurídica. São Paulo, v. 312, p. 18, out. 2003. 
 
27 CANARIS, Claus-Wilhelm. A influência dos direitos fundamentais sobre o direito privado 
na Alemanha. Revista Jurídica. São Paulo,v. 312, p. 19, out. 2003. 
 
28 DUQUE, Marcelo Schenk. Direito privado e Constituição: drittwirkung dos direitos 
fundamentais, construção de um modelo de convergência à luz dos contratos de consumo. 
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 381. 
 
29 SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais e direito privado: algumas 
considerações em torno da vinculação dos particulares aos direitos fundamentais. Revista 
de Direito do Consumidor. São Paulo, vol. 36, p. 64-75, out.-dez. 2000. 
 
30 CANARIS, Claus-Wilhelm. A influência dos direitos fundamentais sobre o direito privado 
na Alemanha. In: SARLET, Ingo Wolfgang. Constituição, direitos fundamentais e direito 
privado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. 
 
31 Neste sentido, leia-se em BRANQUINHO, João; GOMES, Nelson Gonçalves. Enciclopédia 
de termos lógico-filosóficos. São Paulo: Martins Fontes, 2006. p. 535. 
 
32 BRANQUINHO, João; GOMES, Nelson Gonçalves. Enciclopédia de termos 
lógico-filosóficos. São Paulo: Martins Fontes, 2006. p. 536.

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