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apostila de antrolpologia

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2 
 
Antropologia 
 
 
 
Instituição Credenciada pelo MEC – Portaria 4.385/05 
 
 
 
 
 
 
 
Unis - MG 
Centro Universitário do Sul de Minas 
Unidade de Gestão da Educação a Distância – GEaD 
Av. Cel. José Alves, 256 - Vila Pinto 
Varginha - MG - 37010-540 
 
 
 
 
 
 
 
Mantida pela 
Fundação de Ensino e Pesquisa do Sul de Minas – FEPESMIG 
Varginha/MG 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Todos os direitos desta edição reservados ao Unis - MG. 
É proibida a duplicação ou reprodução deste volume, ou parte do mesmo, sob qualquer meio, 
sem autorização expressa do Unis - MG. 
 
 
 
3 
 
Antropologia 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
306 
F383g. FERREIRA, Paulo de Tarso Motta 
Guia de Estudo – Antropologia - Paulo de Tarso 
Motta Ferreira. Varginha: GEaD - UNIS/MG, 
2007. 
76 p. 
 
1.Antropologia. 2. Cultura 3. Homem I. Título. 
Atualizado em Janeiro de 2012 pelo professor Ariovaldo Francisco 
Da Silva 
 
4 
 
Antropologia 
 
 
 
 
 
REITOR 
Prof. Ms. Stefano Barra Gazzola 
 
GESTOR 
Prof. Ms. Wanderson Gomes de Souza 
 
Supervisora Técnica 
Profª. Ms. Simone de Paula Teodoro Moreira 
 
Design Instrucional 
Prof. Celso Augusto dos Santos Gomes 
Rogério Martins Soares 
 
Coord. do Núcleo de Recursos Tecnológicos 
Lúcio Henrique de Oliveira 
 
Coordenadora do Núcleo Pedagógico 
Terezinha Nunes Gomes Garcia 
 
Revisão Ortográfica / Gramatical 
 
 
 
 
 
 
 
 
Autor 
PROF. PAULO DE TARSO MOTTA FERREIRA 
Com formação inicial em História, é especialista em História do Brasil e Avaliação Escolar, 
respectivamente pela PUC-BH e UNI-BH. Professor há vinte anos de Ensino fundamental e 
médio, ministra conteúdos na área das ciências humanas nas universidades da região e profere 
palestras sobre educação e avaliação escolar nas instituições de ensino públicas e privadas 
 
5 
 
Antropologia 
ÍCONES 
 
REALIZE. Determina a existência de atividade a ser realizada. 
Este ícone indica que há um exercício, uma tarefa ou uma prática para ser 
realizada. Fique atento a ele. 
 
PESQUISE. Indica a exigência de pesquisa a ser realizada na busca por mais 
informação. 
 
PENSE. Indica que você deve refletir sobre o assunto abordado para responder a 
um questionamento. 
 
CONCLUSÃO. Todas as conclusões sejam de idéias, partes ou unidades do 
curso virão precedidas desse ícone. 
 
IMPORTANTE. Aponta uma observação significativa. Pode ser encarado 
como um sinal de alerta que o orienta para prestar atenção à informação 
indicada. 
 
HIPERLINK. Indica um link (ligação), seja ele para outra página do módulo 
impresso ou endereço de Internet. 
 
EXEMPLO. Esse ícone será usado sempre que houver necessidade de 
exemplificar um caso, uma situação ou conceito que está sendo descrito ou 
estudado. 
 
SUGESTÃO DE LEITURA. Indica textos de referência utilizados no curso e 
também faz sugestões para leitura complementar. 
 
APLICAÇÃO PROFISSIONAL. Indica uma aplicação prática de uso 
profissional ligada ao que está sendo estudado. 
 
CHECKLIST ou PROCEDIMENTO. Indica um conjunto de ações para fins 
de verificação de uma rotina ou um procedimento (passo a passo) para a 
realização de uma tarefa. 
 
SAIBA MAIS. Apresenta informações adicionais sobre o tema abordado de 
forma a possibilitar a obtenção de novas informações ao que já foi referenciado. 
 
REVENDO. Indica a necessidade de rever conceitos estudados anteriormente. 
 
 
 
 
 
6 
 
Antropologia 
Sumário 
Apresentação ..................................................................................................................................................... 7 
Introdução ......................................................................................................................................................... 8 
Ementa............................................................................................................................................................... 9 
Objetivos ........................................................................................................................................................... 9 
1 - O QUE É O HOMEM? ............................................................................................................................. 10 
1.1 O Homem E Seus Temperamentos ......................................................................................................... 11 
2 - A FIGURA DO MAU SELVAGEM E DO BOM CIVILIZADO ......................................................... 15 
3. A FIGURA DO BOM SELVAGEM E DO MAU CIVILIZADO .......................................................... 21 
4. A CONTRIBUIÇÃO DA ANTROPOLOGIA PARA SE ENTENDER O HOMEM E SUA 
DIVERSIDADE SÓCIO-CULTURAL ........................................................................................................ 28 
5. O HOMEM: UM SER DE CULTURA .................................................................................................... 32 
6. O HOMEM: UM SER EM EVOLUÇÃO ................................................................................................ 37 
7. O HOMEM: UM SER ÉTICO E CONSCIENTE ................................................................................... 40 
8. O HOMEM: UM SER PEDAGÓGICO ................................................................................................... 45 
9. O HOMEM NA PERSPECTIVA EVOLUCIONISTA ........................................................................... 48 
9. O HOMEM NA PERSPECTIVA FUNCIONALISTA ........................................................................... 50 
10. O HOMEM NA PERSPECTIVA ESTRUTURALISTA ...................................................................... 53 
11. AS CULTURAS PARALELAS ............................................................................................................... 58 
12. A CULTURA AFRO-BRASILEIRA ...................................................................................................... 63 
13. MULTICULTURALIDADE NA INFÂNCIA E NA FAMÍLIA ......................................................... 67 
13. ANTROPOLOGIA, GLOBALIZAÇÃO E EDUCAÇÃO .................................................................... 69 
14. ANTROPOLOGIA PÓS-MODERNA.................................................................................................... 72 
REFERÊNCIAS ............................................................................................................................................. 76 
 
 
 
 
7 
 
Antropologia 
Apresentação 
 
Sejam Bem-vindos! 
A intenção da disciplina é colocá-los para pensar sobre você e o outro, aquele que faz 
parte do mundo que o cerca. 
É uma oportunidade ímpar de sair um pouco da aridez do cotidiano, sem tirar os pés do 
chão. 
Vocês perceberão que o material alterna em textos mais leves com uma pitada sutil de 
humor e textos mais densos como exige o universo acadêmico. 
É claro que, na nossa convivência, através do ambiente de rede, vamos nos tornando 
mais próximos, resultando em bate-papos virtuais que tendem a amenizar a aridez de algumas 
partes do conteúdo. 
Confesso que é uma experiência nova para mim, entretanto desejada já há algum tempo. 
Não escrevi textos muito longos para não entediar além da conta. Contemplei o 
conteúdo de forma sintética e prática. 
Sucesso e boa sorte na caminhada ! 
Um abraço, 
 
Prof. Paulo de Tarso 
 
Caros alunos, também quero desejar a todos que iniciarão essa disciplina, que se sintam 
a vontade para nos consultar sempre que houver necessidade. Espero que esse guia possa ser 
um início para uma pesquisa mais detalhada em relação ao homem e seu situar em um 
contexto social. 
Prof.Ari 
 
8 
 
Antropologia 
Introdução 
A disciplina Antropologia tem por objetivo mostrar que o homem é um ser social, 
político,cultural, pedagógico, consciente e em permanente evolução, capaz de reavaliar a sua 
caminhada e rever os seus conceitos sem, no entanto, descaracterizar-se ou abandonar as suas 
origens. É um ser permeado por rupturas e permanências constantes, indo do coerente ao 
incoerente na luta pela preservação de seus valores e costumes. 
É uma oportunidade para perceber a complexidade e profundidade do outro com o qual 
lidamos todos os dias e que, em sua essência, é uma matéria-prima a ser lapidada pela 
preciosidade de sua existência. Sim, eu sei, você deve estar pensando que estou me referindo 
a máxima de que ninguém é uma tábua rasa
1
, e estou mesmo. Muitas vezes, aquele que 
consideramos ignorante para o nosso meio é um mestre em seu meio, o qual também 
ignoramos e até tememos. 
Acredito que lidar com a antropologia é resgatar a ardência perdida pelos anos difíceis 
em que o homem era visto como um ser assujeitado, ou seja, sem condições de expressar seus 
desejos e angústias. É uma forma de enxergar o outro através dele e não do nosso próprio 
umbigo. É nos libertarmos de padrões preconceituosos de comportamento e pensamento, para 
observarmos as habilidades do outro e a melhor forma de transformá-las em competências. 
Aconselho você a ler e reler cada parágrafo, internalizá-lo, mas sem aquela atitude de 
que já sabia e que é apenas teoria. É preciso transportar a teoria para dentro de nós, filtrando-a 
para a prática e aplicando-a para revê-la ou confirmá-la. Não tenha vergonha, se necessário, 
de pedir ajuda e reler a mesma frase uma, duas, dez vezes se preciso. Os textos foram escritos 
de forma mais sintética para isso mesmo. 
Você se sentirá dentro do texto em algumas vezes e fora dele em outras. Não há nenhum 
problema nisso. Quero que você perceba que o outro é tão único quanto você, e que cada um 
tem o seu tempo para aprender ou para cair a ficha, como se diz na gíria. Não tem problema, 
respire fundo e continue. Quero que acredite que pode aprender e evoluir no mundo 
acadêmico, assim como o aluno pode ser alguém na vida, como costumavam dizer meus avós, 
portanto, todos nós podemos aprender e melhorar. 
 
PESQUISE. Após essa introdução, como poderemos definir o conceito: 
―Antropologia‖? 
 
1
 Vázio de informações, e que necessita ser preenchido. 
 
9 
 
Antropologia 
 
 
 
 
 
Ementa 
 
A análise antropológica da alteridade e da diversidade cultural negro, ìndio. A produção 
cultural, a expressão e a ordenação do real. O simbólico e sua importância no meio cultural. 
O pluralismo cultural. O poder simbólico e suas relações com o mundo. O preconceito e suas 
variáveis: a auto-afirmação e a inserção social, a discriminação, a exclusão e a marginalização 
cultural. O símbolo e os meios de comunicação. A dimensão simbólica das interações sociais. 
Cultura e identidade social. Fundamentos antropológicos da comunicação. Comunicação 
social e pesquisa antropológica. 
 
 
 
Objetivos 
 Provocar uma reflexão sobre a dimensão e complexidade da existência humana. 
 Estabelecer o diálogo entre antropologia e educação. 
 Desvelar as possíveis culturas da infância e da família como forma de construção dos 
modos de vida diferentes e não inferiores. 
 Desvelar a riqueza da cultura afro-brasileira em sua diversidade e multiculturalidade. 
 Suscitar a discussão sobre o homem regional e global no contexto do século XXI. 
 
 
 
 
 
 
10 
 
Antropologia 
1 - O QUE É O HOMEM? 
 
 
 
 
No nosso dia a dia, estamos habituados a nos deparar com problemas concretos e de 
respostas concretas. Portanto, não temos tempo e paciência para ficar pensando quem somos, 
o que queremos e para onde vamos. Quem tem que trabalhar, arrumar a casa, pagar as contas, 
pegar os filhos na escola, engolir os sapos do dia-a-dia não pode se dar ao luxo de ficar 
filosofando sobre as coisas do mundo. Mas aí é que cometemos uma falha irreparável, pois 
aquele que está ao meu lado é essencialmente diferente de mim, seja meu filho, irmão, 
marido, esposa, amigo, conhecido ou o companheiro de curso. Ora, se o outro é, por essência, 
diferente de mim, como posso saber se estou somando na vida das pessoas ou prejudicando-as 
com minhas atitudes e intenções, mesmo achando que sou do bem? Como eu não penso sobre 
mim não tenho como pensar sobre os outros, portanto eu apenas vivo e, na maioria das vezes, 
não percebo o que está rolando, como dizem os jovens. 
Bem, entender que o outro é tão complexo quanto eu mesmo é um grande passo para 
lidar com as diferenças. Não estou falando de passar a mão na cabeça dos outros como se 
fossem coitadinhos, mas enxergá-los como homens. Em grego, homem significa semelhante, 
portanto, enxergar o outro como meu semelhante, embora único, não é uma tarefa fácil. 
 Por causa disso, apelei para alguns ícones da filosofia para me ajudar, para definirmos 
o homem: 
 Segundo a Bíblia, para Deus: ―façamos o homem à nossa imagem e semelhança‖. 
Então, somos um pouco de Deus na vida de cada pessoa. 
 Já para Homero somos como folhas na floresta que o vento a uns dispersa e a outros 
permite brotar no tempo da primavera, portanto, enquanto uma geração cresce a outra 
desaparece. 
 Para Aristóteles, somos ―um animal racional‖. 
 Para Giordano Bruno, o homem é o ―cidadão de dois mundos‖, o eterno e o terreno. 
 Para Hobbes, o homem é ―o lobo do próprio homem‖, capaz de aniquilar o outro 
enquanto ser livre, se não for controlado pela educação e pelo Estado. 
 Para Kierkegaard, o homem é uma ―relação que se relaciona consigo mesma‖. 
 Para Karl Marx, não passa de um ―conjunto de relações sociais‖. 
O QUE É O HOMEM? 
 
11 
 
Antropologia 
 Para Nietzsche, o homem é ―o animal doente‖, chegando a afirmar que em nós muita 
coisa ainda é verme, que nós somos mais macacos que os macacos, que somos um 
cabo sobre o abismo e por aí vai. 
 Para Jean Paul Sartre o homem é uma ―paixão inútil‖. 
 
Bem, você já percebeu que não há consenso sobre o que vem a ser o homem. Portanto, 
o outro com o qual nos relacionamos é um universo à parte, do bem e do mal, otimista e 
depressivo, feliz e triste, vitorioso e fracassado, coerente e incoerente e por aí afora. 
 
Proclamaioverbojesus.blog.terra.com.br 
 
1.1 O Homem E Seus Temperamentos 
 HIPÓCRATES 
Hipócrates, o pai da Medicina, classificou o homem em quatro temperamentos. São 
eles: 
1) Sanguíneo (popular e festivo) 
2) Colérico (forte e ativo) 
3) Melancólico (Perfeito e criativo) 
4) Fleumático (Sereno, nivelador e pacífico) 
 
Para ele, cada um de nós possui um temperamento dominante e outro secundário, além 
de termos características de cada um em menor proporção. 
Seja qual for o seu temperamento, procure observar seus amigos e perceberá que 
possuem algumas das características apresentadas acima, o que dificulta o relacionamento de 
 
12 
 
Antropologia 
vocês. Exemplo: como você detesta a desorganização de seu marido que é muito popular e 
festivo e nunca termina o que começa. Para você que é colérica e tem tudo planejado é o fim 
da picada. E a sua esposa que por ser melancólica nada está bom. Por mais que você se 
esforce, sempre falta alguma coisa. Você que é sanguíneo quer morrer de ódio, pois você já 
está fervendo e ela colocando defeito em tudo. 
Nossa primeira aula está acabando, e eu espero que você tenha parado para refletir que 
não é fácil entender quem somos nem tampouco o que os outros são. E é esse o papel da 
antropologia, tentar perceber o homem em sua riqueza de aspectos, sob as quais ele pode ser 
investigado. E o papel da educação é transmitir a esse homem a sua herança cultural, para que 
ele a preserve e a transforme se necessário. Por isso a educação é um ato antropológico de 
vida. É o homem em toda a sua magnitude de mente, alma e corpo através do tempo. E o 
nosso papel enquanto seres humanos educadores é conhecer, valorizar,compreender, 
interagir, modificar e lidar com as diferenças como se não fossem fatores de inferioridade ou 
de desprestígio, mas de originalidade e de desenvolvimento de novas habilidades. 
 
 
CONVIVER COM DIFERENÇAS 
Um caminho para entender pessoas. 
A teoria dos quatro temperamentos foi criada por Hipócrates 
(4OO anos antes de Cristo). Nenhuma pessoa é padrão de um 
comportamento único'. Nenhum homem é uma ilha! 
 
 
Cada um de nós temos: 
 Um temperamento dominante. 
 Um temperamento secundário 
 Traços de outros temperamentos. 
 Os quatros temperamentos. 
 Sanguíneo ( popular - festivo) 
 Colérico ( Forte - Ativo) 
 Melancólico (Perfeito - Criativo) 
 Fleumático (Sereno - Pacifico) 
 
 
 
 
13 
 
Antropologia 
 
 SANGUÍNEO - popular, festivo. 
Personalidade. Atraente. Divertido. Extrovertido. Otimista. Entusiasmado. Movido pela 
Emoção. 
Carismático. Aprecia a vida. Fala demais. Atrai e faz amigos. Gosta do Convívio Social. 
Egoista. Desorganizado. Imaturo.Agitado. Fala sem pensar. Pouco Prático. Faz projetos 
mirabolantes, mas não executa. Tem pouca memória. Tem iniciativa... 
Como conviver com eles?.... Ajude a realizar seus projetos. Ajude a dizer não. Elogie-o, 
dê-lhe presentes. Aprecie seu bom humor. 
Seu lema: A VIDA É UMA FESTA! 
 
 COLÉRICO - forte, ativo. 
Auto-suficiente. Lider nato. Independente. Decidido. Muito Prático. Vontade 
forte. Organizado. Aventureiro. Raciocínio Rápido. Trabalhador compulsivo. Firmeza 
inabalável. Solitário. Poucos amigos. Adora desafios. Mandão. Corajoso. Não é dado 
a análise. Não demonstra emoção. 
Como conviver com eles?....Reconheça sua liderança.Emenda que ele não quer 
magoar. Repsite seu desejo de isolamento.Aceite sua frieza. 
Seu lema: FAÇA DO MEU JEITO, E AGORA! 
 
 MELANCÓLICO - perfeito, criativo. 
Perfeccionista. Acomodado. Sério. Analítico. Bem dotado. Organizado. Metódico. 
Prevenido. Gosta de Silêncio. Exigente. Sensível. Emotivo sabe ouvir. Aprecia a natureza. 
Desconfiado. 
Tem compaixão. Pensativo. Introvertido. Artístico. Deprime facilmente.Adia tudo para 
sair perfeito. 
Inseguro. Fiel. Confiável. Foge da realidade pela prática do devaneio. 
Como conviver com eles?....Anime-o para que fique mais ativo. Respeite seus 
momentos de silêncio. Relaxe seus padrões. Ajude-o a olhar o lado bom das coisas. Elogie-o 
para elevar sua autonomia. 
Seu lema: SE É PARA FAZER, VOU FAZER BEM FEITO. 
 
 FLEUMÁTICO - sereno, pacifico. 
Amortecedor de emoções. Nivelador. Calmo. Imperturbável. Sociável. Equilibrado. 
Ótima memória. Pensamento organizado. Simpático. Humilde. Manso. Pacificador. De bom 
 
14 
 
Antropologia 
coração. Adaptado e feliz com a vida. Raramente revela seus sentimentos. Sabe ouvir. Prático. 
Eficiente. Bom conselheiro. Indeciso. Resistente a mudanças. Metódico. 
Como conviver com eles?....Respeite seu ritmo. Não cobre dele muito entusiasmo. 
Ajude-o a dizer não, pois ele não diz por medo de magoar. Estimule a tomar decisões. 
Seu lema: NÃO VALE A PENA ME ALTERAR POR ISTO... 
 
 
Esses quatro tipos de TEMPERAMENTOS estabelecem nas 
ações um equilíbrio. Em suas experiências, você detectou 
essas situações? Como você lidou com elas? Portanto, esses 
comportamentos demonstram as diferenças que existem em 
cada ser humano que encontramos em nossas caminhadas, 
portanto, convém que olhemos sempre além do imediato. 
 
 
 
15 
 
Antropologia 
2 - A FIGURA DO MAU SELVAGEM E DO BOM CIVILIZADO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Darwinismo.wordpress.com 
 
Por incrível que possa parecer a você, durante muito tempo nem os próprios homens de 
algumas regiões ou culturas foram considerados como homens, portanto, como iguais. 
A extrema diversidade das sociedades humanas raramente apareceu aos homens como 
um fato, e sim como uma aberração, exigindo uma justificação. A antiguidade grega 
designava sob o nome de bárbaro tudo o que não participava da civilização helênica (apelido 
para grego). 
No Renascimento, nos séculos XVII e XVIII falavam de naturais ou de selvagens (isto 
é, seres da floresta), opondo assim a animalidade à humanidade. O termo primitivos é que 
triunfará no século XIX, enquanto optamos preferencialmente na época atual pelo de 
subdesenvolvidos. 
Essa atitude que consiste em expulsar da cultura (isto é, para a natureza) todos aqueles 
que não participam da faixa de humanidade ou civilidade à qual pertencemos e com a qual 
nos identificamos, é, como lembra Lévi-Strauss, a mais comum a toda a humanidade, e, em 
especial, a mais característica dos "selvagens". 
Entre os critérios utilizados a partir do século XIV pelos europeus para julgar se convém 
conferir aos nativos (americanos ou africanos) um estatuto humano, além do critério 
A FIGURA DO MAU SELVAGEM E DO BOM 
CIVILIZADO 
 
16 
 
Antropologia 
religioso, e que pede, na configuração na qual nos situamos, uma resposta negativa ("sem 
religião nenhuma", são "mais diabos"), citaremos: 
 a aparência física: eles estão nus ou "vestidos de peles de animais"; 
 os comportamentos alimentares: eles "comem carne crua", e todo o imaginário do 
canibalismo que irá aqui se elaborar; 
 a inteligência tal como pode ser apreendida a partir da linguagem: eles falam "uma 
língua ininteligível". 
Assim, não acreditando em Deus, não tendo alma, não tendo acesso à linguagem, sendo 
assustadoramente feio e alimentando-se como um animal, o selvagem é apreendido nos 
modos de uma besta ou animal. E esse discurso sobre a alteridade, que recorre constantemente 
à metáfora zoológica, abre o grande leque das ausências: sem moral, sem religião, sem lei, 
sem escrita, sem Estado, sem consciência, sem razão, sem objetivo, sem arte, sem passado, 
sem futuro. Cornelius de Pauw acrescentará até, no século XVIII: "sem barba", "sem 
sobrancelhas", "sem pêlos", "sem espírito" "sem ardor para com sua fêmea"(se duvidava até 
da virilidade dos nativos, pode ?). 
 
 
 
PESQUISE. Como definiremos o conceito alteridade? 
 
Então:... Vamos definir? 
 
É a grande glória e a honra de nossos reis e dos espanhóis, escreve Gomara em sua 
História Geral dos índios, ter feito aceitar aos índios um único Deus, uma única fé e um único 
batismo e ter tirado deles a idolatria, os sacrifícios humanos, o canibalismo, a sodomia; e ainda 
outros grandes e maus pecados, que nosso bom Deus detesta e que pune. Da mesma forma, 
tiramos deles a poligamia, velho costume e prazer de todos esses homens sensuais; mostramo-
lhes o alfabeto sem o qual os homens são como animais e o uso do ferro que é tão necessário 
ao homem. Também lhes mostramos vários bons hábitos, artes, costumes policiados para po-
der melhor viver. Tudo isso — e até cada uma dessas coisas — vale mais que as penas, as 
pérolas, o ouro que tomamos deles, ainda mais porque não utilizavam esses metais como 
moeda. 
Escreve na mesma época (1555) Oviedo em sua História das índias. 
As pessoas desse país, por sua natureza, são tão ociosas, 
viciosas, de pouco trabalho, melancólicas, covardes, sujas, de má 
 
17 
 
Antropologia 
condição, mentirosas, de mole constância e firmeza (. . .). Nosso 
Senhor permitiu, para os grandes, abomináveis pecados dessas 
pessoas selvagens, rústicas e bestiais, que fossem atirados e banidos 
da superfície da Terra... 
 
Opiniões desse tipo são inumeráveis, e passaram tranquilamente para nossa época. No 
século XIX, Stanley, 
2
em seu livro dedicado à pesquisa de Livingstone, compara os africanos 
aos "macacos de um jardim zoológico‖. 
Mais dois textos irão deter mais demoradamente nossa atenção, por nos parecerem 
muito reveladores desse pensamento que faz do selvagem o inverso do civilizado. São as 
Pesquisas sobre os Americanos ou Relatos Interessantes para servir à História da Espécie 
Humana, de Cornelius de Pauw, publicado em 1774, e a famosa Introdução à Filosofia da 
História, de Hegel. 
1) DePauw nos propõe suas reflexões sobre os índios da América do Norte. Sua 
convicção é a de que, sobre estes últimos, a influência da natureza é total, ou mais precisa-
mente negativa. Se essa raça inferior não tem história e está para sempre condenada por seu 
estado "degenerado" a permanecer fora do movimento da História, a razão deve ser atribuída 
ao clima de uma extrema umidade: 
Deve existir, na organização dos americanos, uma causa 
qualquer que embrutece sua sensibilidade e seu espírito. A qualidade 
do clima, a grosseria de seus humores, o vício radical do sangue, a 
constituição de seu temperamento excessivamente ―fleumático‖ 
(Lembra, sereno e pacífico) podem ter diminuído o tom e o 
saracoteio dos nervos desses homens embrutecidos. 
 
Eles têm, prossegue Pauw, um "temperamento tão úmido quanto o ar e a terra onde 
vegetam", o que explica que eles não tenham nenhum desejo sexual. Em suma, são "infelizes 
que suportam todo o peso da vida agreste na escuridão das florestas, parecem mais animais do 
que vegetais". Após a degenerescência ligada a um "vício de constituição física", Pauw chega 
à degradação moral. É a quinta parte do livro, cuja primeira seção é intitulada: "O gênio 
embrutecido dos Americanos". 
 
 
2
 Nome do livro: Explorações na África, Pelo Dr. David Livingstone, e Outros, Fornecendo um Relato Completo 
da Expedição de Pesquisa de Stanley-Livingstone, sob o Patrocínio do New York Herald, conforme Fornecido 
pelo Dr. Livingstone e o Sr. Stanley. 
 
 
18 
 
Antropologia 
A insensibilidade, escreve nosso autor, é neles um vício de sua 
constituição alterada; eles são de uma preguiça imperdoável, não 
inventam nada, não empreendem nada, e não estendem a esfera de 
sua concepção, além do que vêem pusilânimes, covardes, irritados, 
sem nobreza de espírito, o desânimo e a falta absoluta daquilo que 
constitui o animal racional os tornam inúteis para si mesmos e para a 
sociedade. Enfim, os californianos vegetam mais do que vivem, e 
somos tentados a recusar-lhes uma alma. 
 
Essa separação entre um estado de natureza concebido 
 
por Pauw como 
irremediavelmente imutável, e o estado de civilização pode ser visualizado num mapa-mundi. 
No século X V II I , a enciclopédia efetua dois traçados: um longitudinal, que passa por Londres 
e Paris, situando de um lado a Europa, a África e a Ásia, de outro a América, e um latitudinal 
dividindo o que se encontra ao norte e ao sul do equador. Mas, enquanto para Buffon
3
, a 
proximidade ou o afastamento da linha equatorial são explicativos não apenas da constituição 
física mas do moral dos povos, o autor das Pesquisas Filosóficas sobre os Americanos escolhe 
claramente o critério latitudinal, fundamento aos seus olhos da distribuição da população 
mundial, distribuição essa não cultural e sim natural da civilização e da barbárie: "A natureza 
tirou tudo de um hemisfério deste globo para dá-lo ao outro". "A diferença entre um 
hemisfério e o outro (o Antigo e o Novo Mundo) é total, tão grande quanto poderia ser e 
quanto podemos imaginá-la": de um lado, a humanidade, e de outro, a "estupidez na qual 
vegetam" esses seres indiferenciados: 
Igualmente bárbaros, vivendo igualmente da caça e da pesca, em 
países frios, estéreis, cobertos de florestas, que desproporção se 
queria imaginar entre eles? Onde se sentem as mesmas necessidades, 
onde os meios de satisfazê-los são os mesmos, onde as influências do 
ar são tão semelhantes, é possível haver contradição nos costumes ou 
variações nas idéias? 
 
Pauw responde, evidentemente, de forma negativa. Os indígenas americanos vivem 
em um "estado de embrutecimento" geral. Tão degenerados uns quanto os outros, seria 
 
3
 Georges-Louis Leclerc, conde de Buffon (Montbard, 7 de Setembro de 1707 - Paris, 16 de Abril de 1788) foi 
um naturalista, matemático e escritor francês. As suas teorias influenciaram duas gerações de naturalistas, entre 
os quais se contam Jean-Baptiste de Lamarck e Charles Darwin. A localidade de Buffon, na Côte-d'Or, foi o 
senhorio da família Leclerc. 
 
http://pt.wikipedia.org/wiki/Montbard
http://pt.wikipedia.org/wiki/7_de_Setembro
http://pt.wikipedia.org/wiki/1707
http://pt.wikipedia.org/wiki/Paris
http://pt.wikipedia.org/wiki/16_de_Abril
http://pt.wikipedia.org/wiki/1788
http://pt.wikipedia.org/wiki/Naturalista
http://pt.wikipedia.org/wiki/Matem%C3%A1tico
http://pt.wikipedia.org/wiki/Escritor
http://pt.wikipedia.org/wiki/Fran%C3%A7a
http://pt.wikipedia.org/wiki/Jean-Baptiste_de_Lamarck
http://pt.wikipedia.org/wiki/Charles_Darwin
http://pt.wikipedia.org/wiki/Buffon
http://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%B4te-d%27Or
 
19 
 
Antropologia 
em vão procurar entre eles variedades distintivas daquilo que se pareceria com uma 
cultura e com uma história. 
Os julgamentos que acabamos de relatar por excessivos que sejam, apenas radicalizam 
idéias compartilhadas por muitas pessoas nessa época. Idéias que serão retomadas e expressas 
nos mesmos termos em 1830 por Hegel, o qual, em sua Introdução à Filosofia da História, 
nos expõe o horror que ele ressente frente ao estado de natureza, que é o desses povos que 
jamais ascenderão à "história" e à "consciência de si". 
Na leitura dessa Introdução, a América do Sul parece mais estúpida ainda do que a do 
Norte. A Ásia, aparentemente, não está muito melhor. Mas é a África, e, em especial, a África 
profunda do interior, onde a civilização nessa época ainda não penetrou, que representa para o 
filósofo a forma mais nitidamente inferior entre todas nessa infra-humanidade: "é o país do 
ouro, fechado sobre si mesmo, o país da infância, que, além do dia e da história consciente, 
está envolto na cor negra da noite". 
Tudo, na África, é nitidamente visto sob o signo da falta absoluta: os "negros" não 
respeitam nada, nem mesmo eles próprios, já que comem carne humana e fazem comércio da 
"carne" de seus próximos. Vivendo em uma ferocidade bestial inconsciente de si mesma, em 
uma selvageria em estado bruto, eles não têm moral, nem instituições sociais, religião ou 
Estado. Petrificados, em uma desordem inexorável
4
, nada, nem mesmo as forças da colonização 
poderão nunca preencher o fosso que os separa da História universal da humanidade. 
Na descrição dessa africanidade estagnante da qual não há absolutamente nada a esperar 
— e que ocupa rigorosamente em Hegel o lugar destinado à indianidade em Pauw —, o autor da 
Fenomenologia do Espírito 
5
vai, vale a pena notar, mais longe que o autor das Pesquisas 
Filosóficas sobre os Americanos. O "negro" nem mesmo se vê atribuir o estatuto de vegetal. 
"Ele cai", escreve Hegel, "para o nível de uma coisa, de um objeto sem valor". 
Você percebeu que a desigualdade entre os homens é fruto de um preconceito de que 
aquele que é diferente de nós é selvagem e bárbaro para o convívio conosco. Portanto, 
historicamente, a cultura de algumas civilizações, no caso a Européia, construiu a falsa idéia 
de que os povos não-europeus são desprovidos de civilidade. Então, digno seria o homem 
civilizado. Mas pergunto: civilizado sob qual cultura ? Ora, um nativo africano, um esquimó 
dos pólos ou um servo medieval são igualmente homens independentemente de seus valores 
ou hábitos. E a criança ou adolescente com o qual lidamos não nos parece muitas vezes esse 
bárbaro selvagem que provém de nosso preconceito, mais do que da própria realidade ? 
 
4
 Inexorável: que não cede. Que não se move à compaixão. Implacável, austero. 
5
 Filósofo - Hegel 
 
20 
 
Antropologia 
De fato , não é moleza entrarmos em nosso eu para revermos uma série de preconceitos 
que estão cristalizados. Mas é preciso estabelecer um ponto de equilíbrio entre os novos 
paradigmas e os tradicionais. No próximo item, veja uma inversão que o fará pensar ainda 
mais. 
 
 
Proposta: Leia a primeiraparte do livro Aprender Antropologia, de 
François Laplantine, intitulado de ―Marcos para uma História do 
Pensamento Antropológico‖, disponível na biblioteca do UNIS, para 
aprofundar a sua reflexão.Caso você queira aprofundar mais nesse 
assunto. Fique a vontade!... 
 
 
 
21 
 
Antropologia 
3. A FIGURA DO BOM SELVAGEM E DO MAU CIVILIZADO 
 
 
 
 
Juntosomos-fortes.blogspot.com 
―Em 2009, na conferência da ONU sobre o clima, em Copenhague...‖ 
 
A figura de uma natureza má na qual vegeta um selvagem embrutecido é eminentemente 
suscetível de se transformar em seu oposto: a da boa natureza dispensando suas benfeitorias 
para um selvagem feliz. Os termos da atribuição permanecem, como veremos, rigorosamente 
idênticos, da mesma forma que o par constituído pelo sujeito do discurso (o civilizado) e seu 
objeto (o natural). Mas efetua-se dessa vez a inversão daquilo que era apreendido como um 
vazio que se torna um cheio (ou plenitude), daquilo que era apreendido como um menos que 
se torna um mais. O caráter privativo dessas sociedades sem escrita, sem tecnologia, sem 
economia, sem religião organizada, sem clero, sem sacerdotes, sem polícia, sem leis, sem 
Estado — acrescentar-se-á, no século XX, sem Complexo de Édipo — não constitui uma 
desvantagem. 
“O Selvagem não é quem pensamos”. 
 
PESQUISE. Se possível assista ao filme: ―Na Natureza Selvagem‖. 
 
 
A FIGURA DO BOM SELVAGEM E DO MAU 
CIVILIZADO 
 
22 
 
Antropologia 
Evidentemente, essa representação concorrente (mas que consiste apenas em inverter a 
atribuição de significações e valores dentro de uma estrutura idêntica) permanece ainda 
bastante rígida na época na qual o Ocidente descobre povos ainda desconhecidos. A figura do 
bom selvagem só encontrará sua formulação mais sistemática e mais radical dois séculos após 
o Renascimento: no rousseauísmo
6
 do século XVIII, e, em seguida, no Romantismo. Não 
deixa porém de estar presente, pelo menos em estado embrionário, na percepção que têm os 
primeiros viajantes. Américo Vespúcio descobre a América: 
As pessoas estão nuas, são bonitas, de pele escura, de corpo 
elegante. . . Nenhum possui qualquer coisa que seja, pois tudo é 
colocado em comum. E os homens tomam por mulheres aquelas que 
lhes agradam, sejam elas sua mãe, sua irmã, ou sua amiga, entre as 
quais eles não fazem diferença. . . Eles vivem cinqüenta anos. E não 
têm governo. 
 
Cristóvão Colombo, aportando no Caribe, descobre também o paraíso: "Eles são muito 
mansos e ignorantes do que é o mal, eles não sabem se matar uns aos outros (. . .) Eu não 
penso que haja no mundo homens melhores, como também não há terra melhor". 
 
 
PENSE. 
O que vocês concluem com a afirmação acima? 
 
Toda a reflexão de Léry e de Montaigne no século XVI sobre os "naturais" baseia-se 
sobre o tema da noção de crueldade respectiva de uns e outros, e, pela primeira vez, instaura-se 
uma crítica da civilização e um elogio da "ingenuidade original" do estado de natureza. Léry, 
entre os Tupinambás, interroga-se sobre o que se passa "aquém", isto é, na Europa. Ele 
escreve, a respeito de "nossos grandes usurários
7
": 
 "Eles são mais cruéis do que os selvagens dos quais estou falando". 
 E Montaigne, sobre esses últimos: "Podemos portanto de fato chamá-los de bárbaros 
quanto às regras da razão, mas não quanto a nós mesmos que os superamos em toda sorte de 
barbárie". Para o autor dos Ensaios, esse estado paradisíaco que teria sido o nosso outrora 
talvez esteja conservado em alguma parte. 
Esse fascínio exercido pelo indígena americano, e em especial por lê Huron, 
protegido da civilização e que nos convida a reencontrar o universo caloroso da natureza, 
 
6
 Filósofo Jean-Jacques Rousseau 
7
 Agiota. Aquele que empresta com usura. Avarento, sovina, ganancioso. 
 
23 
 
Antropologia 
triunfa nos séculos XVII e XVIII. Nas primeiras Relações dos jesuítas que se instalam entre 
os Hurons desde 1626 pode-se ler: 
Eles são afáveis, liberais, moderados. . . Todos os nossos padres 
que freqüentaram os Selvagens consideram que a vida se passa mais 
docemente entre eles do que entre nós". Seu ideal: "viver em comum 
sem processo, contentar-se de pouco sem avareza, ser assíduo no 
trabalho. 
 
Do lado dos livres-pensadores, é o mesmo grito de entusiasmo; La Hontan: 
 
 "Ah! Viva os índios que sem lei, sem prisões e sem torturas passam a vida na doçura, 
na tranquilidade, e gozam de uma felicidade desconhecida dos franceses". 
 
Essa admiração não é compartilhada apenas pelos navegadores estupefatos. O selvagem 
ingressa progressivamente na filosofia — os pensadores das Lumières —, e também nos salões 
literários e nos teatros parisienses. Em 1721, é montado um espetáculo intitulado O Arlequim 
Selvagem. O personagem de um índio trazido para Paris declama no palco: 
 
Vocês são loucos, pois procuram com muito empenho uma 
infinidade de coisas inúteis; vocês são pobres, pois limitam seus bens 
ao dinheiro, em vez de simplesmente gozar da criação, como nós, 
que não queremos nada a fim de desfrutar mais livremente de tudo. 
 
 
PESQUISE. Qual é o nome do autor do espetáculo: O Arlequim 
Selvagem? Quem são Montaigne e Léry? 
 
É a época em que todos querem ver os Indes Galantes que Rameau acabou de escrever, 
a época em que se exibem nas feiras verdadeiros selvagens. Manifestações essas que 
constituem uma verdadeira acusação contra a civilização. Depois, o fascínio pelos índios será 
substituído progressivamente, a partir do fim do século XVIII, pelo charme e prazer idílico que 
provoca o encanto das paisagens e dos habitantes dos mares do sul, dos arquipélagos 
polinésios, em especial Samoa, as ilhas Marquises, a ilha de Páscoa, e sobretudo o Taiti. Aqui 
está, por exemplo, o que escreve Bougainville em sua Viagem ao Redor do Mundo (reed. 
1980): 
 
 
24 
 
Antropologia 
Seja dia ou noite, as casas estão abertas. Cada um colhe as frutas 
na primeira árvore que encontra, ou na casa onde entra. . . Aqui um 
doce ócio é compartilhado pelas mulheres, e o empenho em agradar é 
sua mais preciosa ocupação. Quase todas aquelas ninfas estavam 
nuas. As mulheres pareciam não querer aquilo que elas mais 
desejavam. Tudo lembra a cada instante as doçuras do amor, tudo 
incita ao abandono. 
 
Todos os discursos que acabamos de citar, e, especialmente, os que exaltam a doçura 
das sociedades "selvagens", e, correlativamente, fustigam tudo que pertence ao Ocidente 
ainda são atuais. Se não os fossem, não nos seriam diretamente acessíveis, não nos tocariam 
mais nada. Ora, é precisamente a esse imaginário da viagem, a esse desejo de fazer existir em 
um "alhures" uma sociedade de prazer e de saudade, em suma, uma humanidade convivial, 
cujas virtudes se estendam à magnificência da fauna e da flora (Chateaubriand, Segalen, 
Conrad, Melville. . .), que a etnologia deve grande parte de seu sucesso com o público. 
O tema desses povos que podem eventualmente nos ensinar a viver e dar ao Ocidente 
mortífero lições de grandeza, como acabamos de ver, não é novidade. Mas grande parte do 
público está infinitamente mais disponível agora do que antes para se deixar persuadir às 
sociedades constrangedoras da abstração, do cálculo e da impessoalidade das relações 
humanas. Opõem-se sociedades de solidariedade comunitária, abrigadas na suntuosidade de 
uma natureza generosa. A decepção ligada aos "benefícios" do progresso (nos quais muitos 
entre nós acreditam cada vez menos) bem como a solidão e o anonimato do nosso ambiente de 
vida, fazem com que parte de nossos sonhos só aspirem a se projetar nesse paraíso (perdido) 
dos trópicos ou dos mares do Sul, que o Ocidente teria substituído pelo inferno da sociedade 
tecnológica. 
Mas convém, a meu ver, ir mais longe. O antropólogo, como o militar, é recrutado no 
civil. Ele compartilha com os que pertencem a mesma cultura que a sua, as mesmasinsatisfações, angústias, desejos. Se essa busca do Último dos Moicanos, essa etnologia do 
selvagem do tipo "vento dos coqueiros" (que é na realidade uma etnologia selvagem), contribui 
para a popularidade de nossa disciplina, ela está presente nas motivações dos próprios 
antropólogos. Malinowski terá a franqueza de escrever e será muito criticado por isso: 
Um dos refúgios fora dessa prisão mecânica da cultura é o 
estudo das formas primitivas da vida humana, tais como existem 
ainda nas sociedades longínquas do globo. A antropologia, para mim, 
pelo menos, era uma fuga romântica para longe de nossa cultura 
uniformizada. 
 
 
25 
 
Antropologia 
Ora, essa "nostalgia do pré-histórico", de que fala Alfred Métraux 
8
e que esteve na 
origem de sua própria vocação de antropólogo, é encontrada em muitos autores, especialmente 
nas descrições de populações preservadas do contato corruptor com o mundo moderno, 
vivendo na harmonia e na transparência. O qualificativo que fez sucesso para designar o estado 
dessas sociedades, que são caracterizadas pela riqueza das trocas simbólicas, foi certamente o 
de "autêntico" (oposto à alienação das sociedades industriais adiantadas), termo proposto por 
Sapir em 1925, e que é erroneamente atribuído a Lévi-Strauss. A imagem que o ocidental se 
fez da alteridade (e correlativamente de si mesmo) não parou, portanto, de oscilar entre os 
pólos de um verdadeiro movimento pendular. Pensou-se alternadamente que o selvagem: 
 era um monstro, um "animal com figura humana" (Léry), a meio caminho entre a 
animalidade e a humanidade mas também que os monstros éramos nós, sendo que 
ele tinha lições de humanidade a nos dar; 
 levava uma existência infeliz e miserável, ou, pelo contrário, vivia num estado de 
beatitude, adquirindo sem esforços os produtos maravilhosos da natureza, enquanto 
que o Ocidente era, por sua vez, obrigado a assumir as duras tarefas da indústria; 
 era trabalhador e corajoso, ou essencialmente preguiçoso; 
 não tinha alma e não acreditava em nenhum deus, ou era profundamente religioso; 
 vivia num eterno pavor do sobrenatural, ou, ao inverso, na paz e na harmonia; 
 era um anarquista, sempre pronto a massacrar seus semelhantes, ou um comunista 
decidido a tudo compartilhar, até, e inclusive, suas próprias mulheres; 
 era admiravelmente bonito, ou feio; 
 era movido por uma impulsividade criminalmente congênita, quando era legítimo 
temer, ou devia ser considerado como uma criança precisando de proteção; 
 era um embrutecido sexual, levando uma vida de orgia e devassidão permanente, 
ou, pelo contrário, um ser preso, obedecendo estritamente aos tabus e às 
proibições de seu grupo; 
 era atrasado, estúpido e de uma simplicidade brutal, ou profundamente virtuoso e 
eminentemente complexo; 
 
8
 Alfred Métraux (1902 em Lausana, Switzerland- Abril 12, 1963 em Paris, France), descrito frequentemente 
como ―ethnographer ethnographer, ―era um dos antropólogos os mais significativos e dos líderes das direitas 
humanas do vigésimo século. 
 
http://www.multilingualarchive.com/ma/enwiki/pt/1902
http://www.multilingualarchive.com/ma/enwiki/pt/Lausanne
http://www.multilingualarchive.com/ma/enwiki/pt/Switzerland
http://www.multilingualarchive.com/ma/enwiki/pt/April_12
http://www.multilingualarchive.com/ma/enwiki/pt/1963
http://www.multilingualarchive.com/ma/enwiki/pt/Paris
http://www.multilingualarchive.com/ma/enwiki/pt/France
http://www.multilingualarchive.com/ma/enwiki/pt/Ethnography
 
26 
 
Antropologia 
 era um animal, um "vegetal" (de Pauw), uma "coisa", um "objeto sem valor" 
(Hegel), ou participava, pelo contrário, de uma humanidade da qual tinha tudo 
como aprender. 
 
 
Estaria nessas definições as desigualdades entre as culturas e as raças? 
 
Tais são as diferentes construções em presença (nas quais a repulsão se transforma 
rapidamente em fascínio) dessa alteridade fantasmática que não tem muita relação com a 
realidade. O outro — o índio, o taitiano, mais recentemente o basco ou o bretão — é 
simplesmente utilizado como suporte de um imaginário, cujo lugar de referência nunca é a 
América, Taiti, o País Basco ou a Bretanha. São objetos-pretextos que podem ser mobilizados 
tanto com vistas a exploração econômica, quanto ao militarismo político, à conversão religiosa 
ou à emoção estética. Mas, em todos os casos, o outro não é considerado para si mesmo. Mal 
se olha para ele. Olha-se a si mesmo nele. 
Voltemos ao nosso ponto de partida: o Renascimento. Seria em vão, talvez anacrônico
9
, 
descobrir nele o que poderia aparentar-se a um pensamento antropológico, tão problemático, 
como acabamos de observar ainda no final do século XX. Não basta viajar e se surpreender 
com o que se vê, para tornar-se antropólogo (não basta mesmo ter numerosos anos de 
"campo", como se diz hoje). Porém, numerosos viajantes, nessa época, colocam problemas (o 
que não significa uma problemática) aos quais será necessariamente confrontado qualquer 
antropólogo. Eles abrem o caminho daquilo que laboriosamente irá se tornar a antropologia. 
Jean de Léry, entre os indígenas brasileiros, pergunta-se: é preciso rejeitá-los fora da 
humanidade? Considerá-los como virtualidades de cristãos? Ou questionar a visão que temos 
da própria humanidade, isto é, reconhecer que a cultura é plural? Através de muitas 
contradições (a oscilação permanente entre a conversão e o olhar, os objetivos teológicos e os 
que poderíamos chamar de etnográficos, o ponto de vista normativo e o ponto de vista 
narrativo), o autor da Viagem não tem resposta. Mas as questões (e para o que nos interessa 
aqui, mais especificamente a última) estão, no entanto, implicitamente colocadas. Montaigne 
(hoje às vezes criticado), mesmo se o que o preocupa é menos a humanidade dos índios do 
 
9
 Fora do tempo - cronologia 
 
27 
 
Antropologia 
que a inumanidade dos europeus, seguindo, nisso, Léry que transporta para o "Novo Mundo" 
os conflitos do antigo, começa a introduzir a dúvida no edifício do pensamento europeu. 
Ele testemunha o desmoronamento possível deste pensamento, menos inclusive ao 
pronunciar a condenação da civilização do que ao considerar que a "selvageria" não é nem 
inferior nem superior, e sim diferente. 
 
 
REVENDO. Ao terminar essa fala, o que podemos notar, é a grande 
tônica de trabalhar com o que nos é diferente. Portanto, o diferente 
retrata sempre a necessidade de superação e interação. Somente através 
de atitudes de mudanças, que será possível o equilíbrio entre os membros 
das culturas. 
 
 
 
28 
 
Antropologia 
4. A CONTRIBUIÇÃO DA ANTROPOLOGIA PARA SE ENTENDER 
O HOMEM E SUA DIVERSIDADE SÓCIO-CULTURAL 
 
 
A passagem da antropologia social (particularmente desenvolvida na França e mais ainda 
na Inglaterra) para a antropologia (especialmente americana) corresponde a uma mudança 
fundamental de perspectiva. De um lado, a antropologia se torna uma disciplina autônoma, 
totalmente independente da sociologia. De outro, dedica-se uma atenção muito grande menos 
ao funcionamento das instituições do que aos comportamentos dos próprios indivíduos, que 
são considerados reveladores da cultura à qual pertencem. Quanto a isso, uma história da 
antropologia como a de Kardiner e Preble (1966) — que está longe de ser uma das melhores 
histórias de nossa disciplina, mas essa não é a questão — é muito característica dessa atitude 
americana. Trata tanto da personalidade dos principais pesquisadores apresentados, quanto de 
suas idéias. Já de início, coloca o que é uma constante da prática antropológica nos Estados 
Unidos: sua relação à psicologia e à psicanálise. 
Para compreender a especificidade dessa abordagem, freqüentemente qualificada (de 
forma um pouco pejorativa) de "culturalista", parece-me importante especificar bem o 
significado dos conceitos de social e de cultura.1- Social: 
 
O social é a totalidade das relações (relações de produção, de exploração, 
de dominação) que os grupos mantêm entre si dentro de um mesmo conjunto 
(etnia, região, nação. . .) e para com outros conjuntos, também hierarquizados. 
 
2-Cultura: 
 
A cultura por sua vez não é nada mais que o próprio social, mas considerado 
dessa vez sob o ângulo dos caracteres distintivos que apresentam os 
comportamentos individuais dos membros desse grupo, bem como suas 
produções originais (artesanais, artísticas, religiosas). 
 
 
A antropologia social e a antropologia têm portanto um mesmo campo de 
investigação. Além disso, utilizam os mesmos métodos (etnográficos) de 
acesso a esse objeto. 
A CONTRIBUIÇÃO DA ANTROPOLOGIA PARA SE ENTENDER 
O HOMEM E SUA DIVERSIDADE SÓCIO-CULTURAL 
 
29 
 
Antropologia 
 
Etnografia: Ramo da antropologia que trata da origem e filiação de raças e 
 Cultura. 
 Estudo e descrição da cultura de um determinado povo. 
 
Finalmente, são animadas por um objetivo e uma ambição idênticos: a análise 
comparativa. Mas, o que se compara no primeiro caso é o social enquanto sistema de relações 
sociais, sendo que, no segundo, trata-se do social tal como pode ser apreendido através dos 
comportamentos particulares dos membros de um determinado grupo: nossas maneiras 
específicas, enquanto homens e mulheres de uma determinada cultura, de pensar, de 
encontrar, trabalhar, distrair-se, reagir frente aos acontecimentos (por exemplo, o nascimento, 
a doença, a morte). 
É difícil dar uma definição que seja absolutamente satisfatória da cultura. Kroeber, um 
dos mestres da antropologia americana, levantou mais de 50. Propomos esta: a cultura é o 
conjunto dos comportamentos, saberes e saber-fazer característicos de um grupo humano ou 
de uma sociedade dada, sendo essas atividades adquiridas através de um processo de 
aprendizagem, e transmitidas ao conjunto de seus membros. Daí a relação entre educação e 
antropologia. 
 
 
Detenhamo-nos um pouco para sublinhar que, a nosso ver, apenas a 
noção de cultura, ao contrário do da sociedade, é estritamente humana. 
 
 
Você concorda com essa afirmação? 
 
 
 
 
 
 
 
 
30 
 
Antropologia 
 
Da mesma forma que existe (isso não é mais sequer discutido hoje) um pensamento e 
uma linguagem entre os animais, existem sociedades animais e até formas de sociabilidade 
animal, que podem ser regidas por modos de interação antagônicas
10
 ou comunitárias, bem 
como de modos de organização complexos (em função das faixas de idade, dos grupos 
sexuais, da divisão hierarquizada do trabalho). Indo até mais adiante, existe o que hoje não se 
hesita mais em chamar de sociologia celular. Assim, o que distingue a sociedade humana da 
sociedade animal, e até da sociedade celular, não é de forma alguma a transmissão das 
informações, a divisão do trabalho, a especialização hierárquica das tarefas (tudo isso existe 
não apenas entre os animais, mas dentro de uma única célula!), e sim essa forma de 
comunicação propriamente cultural que se dá através da troca não mais de signos e sim de 
símbolos, e por elaboração das atividades rituais aferentes a estes. Pois, pelo que se sabe, se 
os animais são capazes de muitas coisas, nunca se viu algum soprar as velas de seu bolo de 
aniversário. É a razão pela qual, se pode haver uma sociologia animal (e até, repetimo-lo, 
celular), a antropologia é por sua vez especificamente humana. 
Fechemos aqui esse parêntese, que não nos afasta de forma alguma do nosso propósito, 
mas, pelo contrário, define-o melhor, e examinemos mais adiante os traços marcantes dessa 
antropologia que qualifica a si própria de cultural. Deter-nos-emos em três deles, que estão, 
como veremos, estreitamente ligados entre si. 
1) A antropologia estuda os caracteres distintivos das condutas dos seres humanos, 
pertencendo a uma mesma cultura, considerada como uma totalidade irredutível à 
outra. Atenta às descontinuidades (temporais, mas sobretudo espaciais), salienta a 
originalidade de tudo que devemos à sociedade à qual pertencemos. 
2) Ela conduz essa pesquisa a partir da observação direta dos comportamentos dos 
indivíduos, tais como se elaboram em interação com o grupo e o meio no qual 
nascem e crescem esses indivíduos. Procurando compreender a natureza dos 
processos de aquisição e transmissão pelo indivíduo de uma cultura, sempre 
singular (a forma como esta não apenas informa, mas modela o comportamento dos 
indivíduos, sem que estes o percebam), várias preocupações são comuns aos 
psicólogos, psicanalistas e psiquiatras. Utiliza-se, portanto, freqüentemente, os 
modelos conceituais destes, bem como suas técnicas de investigação (por exemplo, 
os testes projetivos, utilizados pela primeira vez em etnologia por Cora du Bois). 
 
10
 Contrárias, opostas. (Michaelis Dicionário Escolar Língua Portuguesa) 
 
31 
 
Antropologia 
Assim, esse campo de pesquisa, designado pela expressão "cultura e personalidade", 
extremamente desenvolvido nos Estados Unidos e relativamente negligenciado na 
França e Grã-Bretanha, impõe-se, a partir dos anos 30, como uma das áreas da 
antropologia na qual a colaboração pluridisciplinar se torna sistemática. 
3) Finalmente, a antropologia estuda o social em sua evolução, e, particularmente, sob 
o ângulo dos processos de contato, difusão, interação e aculturação, isto é, de 
adoção (ou imposição) das normas de uma cultura por outra. 
 
 
32 
 
Antropologia 
5. O HOMEM: UM SER DE CULTURA 
 
 
 
 
Um certo número de obras representativas dessa abordagem — escritas em sua maior 
parte por americanos — merece ser citado. 
 1927: Margaret Mead publica Corning of Age in Samoa, que será retomado em 
Hábitos e Sexualidade na Oceania, em 1935, um livro que foi um marco. 
 1934: Amostras de Civilização, de Ruth Benedict, certamente a obra mais 
característica do culturalismo americano; 
 1939: Kardiner, O Indivíduo e Sua Sociedade; 
 1943: Roheim, Origem e Função da Cultura, que desenvolve a idéia de que a 
cultura é uma sublimação decorrente da imperfeição do feto humano ao nascer. 
 
O que mostram essas diferentes obras, sempre baseadas em numerosas observações, é 
que convém não atribuir à natureza o que diz respeito à cultura; ou seja, não considerar 
como universal o que é relativo. 
Essa compreensão da irredutível diversidade das culturas — que é o eixo central da 
antropologia — aparece ao mesmo tempo: 
a.) ao nível dos traços singulares dos comportamentos; 
b.) ao nível da totalidade da nossa personalidade cultural, qualificada por Kardiner de 
"personalidade de base". Como essa corrente de pesquisa, que procuraremos apresentar o 
mais fielmente possível, multiplicaremos os exemplos. 
 
1) A variação cultural pode ser encontrada em cada um dos aspectos de nossas 
atividades. Assim, até na maneira em que descansamos. Nas sociedades nas quais os homens 
dormem diretamente no solo, dificilmente suportam a maciez de um colchão. Inversamente, 
sentimos dificuldade em dormir em uma rede, e não nos passaria pela cabeça descansar, como 
alguns na Ásia, apoiando-nos em uma só perna. 
Tomemos um outro exemplo: a divisão do trabalho entre os sexos. Nas sociedades do 
oeste africano, as mulheres se dedicam à cerâmica, enquanto os homens vão para a roça, 
quando, na ilha de Alor, são as mulheres que cultivam a terra, enquanto os homens cuidam da 
O HOMEM: UM SER DE CULTURA 
 
33 
 
Antropologia 
educação das crianças. Assim também é na sociedade Chaumbuli, na qual os homens se 
dedicam aos filhos, enquanto as mulheres vão pescar. 
Consideremos agora os comportamentos adotados para penetrar nos edifícios religiosos. 
Na Europa, ao penetrar numa igreja, observamos que os fiéis tiram o chapéu e permanecem 
com os sapatos. Inversamente, em uma mesquita,os muçulmanos tiram os sapatos e 
permanecem com o chapéu. 
As formas de hospitalidade também testemunham uma extrema diversidade, podendo, 
como no exemplo acima, consistir na inversão pura e simples daquilo que tomávamos 
espontaneamente por natural. Assim, em Baúle (Costa do Marfim), como hóspede, o convite de 
uma refeição é preparada em sua homenagem, mas deve ser consumida isoladamente, isto é, 
em um cômodo e separadamente dos hospedeiros, enquanto estes, por outro lado, reservavam 
um presente muito inesperado para um ocidental, que não era nada menos que a filha mais 
bonita da casa. 
Diferenças significativas, decorrentes da cultura à qual pertencemos, podem também ser 
encontradas nos menores detalhes dos nossos comportamentos mais cotidianos. Assim, nas 
sociedades árabes, sul-americanas e sul-européias, desviar o olhar é considerado como um sinal 
de má educação, enquanto que nas sociedades asiáticas e norte-européias, olhar fixamente 
alguém, com insistência, causa um incômodo que se traduz por uma impressão de ameaça e 
agressividade. 
A saudação visual consistindo em levantar rapidamente as sobrancelhas, acenar a cabeça 
e sorrir, assinala um encontro amigável na Nova Guiné ou na Europa, mas é censurada por ser 
considerada indecente no Japão. As trocas de contatos cutâneos entre dois interlocutores são 
extremamente reduzidas nos países anglo-saxônicos, assim como no Japão. Impõe-se pelo 
contrário, como expressão normal do prazer de encontrar o outro nas sociedades mediterrâneas 
e sul-americanas. Esses mesmos interlocutores, sentados no terraço de um bar ou passeando 
na rua, irão manter um certo espaço entre si na Europa do Norte ou na Ásia, sob pena de 
sentir um certo mal-estar; tenderão a diminuir a distância que os separa nas sociedades árabes 
ou latino-americanas. 
Finalmente, as formas de comportamento sexual detiveram particularmente a atenção dos 
observadores. De um lado, a educação sexual é eminentemente variável de uma sociedade 
para outra. Na Melanésia, por exemplo, meninos e meninas são, na idade da puberdade, 
iniciados nas técnicas amorosas por monitores experimentados, enquanto os Vluria da índia 
(cf. Elwin, 1959) institucionalizavam essa prática preservando um espaço (por assim dizer, 
 
34 
 
Antropologia 
uma casa da juventude) que tem como objetivo encorajar os jogos sexuais. Por outro lado, os 
rituais amorosos são profundamente diferentes, não apenas de uma civilização para outra, mas 
dentro de uma mesma civilização. Aqui está um exemplo recolhido por Margaret Mead que 
merece ser relatado. 
Durante a última guerra mundial, soldados americanos estavam mobilizados na Grã-
Bretanha. Esses soldados e as jovens inglesas que freqüentavam acusavam-se mutuamente de 
má educação nas relações amorosas. Os soldados americanos consideravam as inglesas 
mulheres levianas; as inglesas achavam que os americanos comportavam-se como marginais. 
Cada um dos grupos reagia normalmente, mas a norma era diferente de uma cultura para 
outra: para os americanos, o beijo, que intervém muito cedo nas relações de namoro, não tinha 
grandes consequências, enquanto que, para as inglesas, era a última etapa antes do ato sexual. 
As inglesas ficavam, portanto, chocadas que os americanos quisessem beijá-las tão 
precipitadamente; e estes não entendiam que as inglesas fugissem deles por causa de um ato tão 
insignificante quanto um beijo na boca, ou que passassem tão rapidamente para a etapa 
seguinte, quando tinham aceito o beijo. Quiproquós 
11
desse tipo pontuam nossas relações 
interculturais. 
 
2) O peso da cultura não se manifesta apenas nas formas diversificadas de 
comportamentos e atividades facilmente localizáveis de uma sociedade para outra (como 
a alimentação, o habitat, a maneira de se vestir, os jogos), mas também nas estruturas 
perceptivas, cognitivas e afetivas, constitutivas da própria personalidade. 
A antropologia foi assim levada a retomar, nos fundamentos da observação e da análise 
etnopsicológica, o que os folcloristas, mas também os escritores, (Chateaubriand, Georges 
Sand.) chamavam de "alma" ou "gênio" de um povo. Assim, tentou evidenciar a preocupação 
dos japoneses em nunca perder a face em sociedade, sob pena de um desmoronamento da per-
sonalidade que se traduz por um sentimento de vergonha e culpa extremo, ou ainda, o receio 
dos franceses frente à natureza que deve ser domesticada pela razão; receio que se expressa 
tanto no caráter "bem-comportado" dos nossos contos populares (sempre menos 
extravagantes que os contos escandinavos, russos ou alemães) quanto em nossos jardins, 
qualificados precisamente de "jardins à francesa". 
Mas é sobretudo ao estudo das formas contrastadas da personalidade nos povos das 
sociedades "tradicionais" que a antropologia deve a sua fama. Margaret Mead (1969), ao 
 
11
 Equívoco; confusão de uma coisa com outra. Situação cômica resultante de equívoco. 
 
35 
 
Antropologia 
confrontar duas populações vizinhas da Nova Guiné, considera que uma, a dos doces e ternos 
Arapesh, só deseja paz e serenidade, enquanto a outra, a dos violentos Mundugumor, é 
comandada por uma agressividade propriamente canibal. O que é então considerado como 
personalidade desviante entre os primeiros (o indivíduo violento), aparecerá, entre os 
segundos, como perfeitamente normal, isto é conforme ao ideal do grupo, e inversamente. Na 
mesma ótica, Ruth Benedict (1950) opõe a sociedade "apoloniana" dos índios Pueblos do 
Novo México à exaltação e rivalidade permanentes que mantêm entre si os habitantes da ilha 
de Dobu, este povo de feiticeiros (R. Fortune, 1972). Se houver, entre estes, indivíduos que 
não tenham nenhum sentimento de suspeição, nenhum gosto pelo roubo, e detestem brigar, não 
deixarão de aparecer como marginais, enquanto estariam perfeitamente bem adaptados (e 
considerados como conformistas) na sociedade pueblo. 
A partir de exemplos desse tipo, Ruth Benedict elabora sua teoria do "arco cultural". 
Cada cultura realiza uma escolha. Valoriza um determinado segmento do grande arco de 
círculo das possibilidades, da humanidade. Encoraja um certo número de comportamentos em 
detrimento de outros que se vêem censurados. Através de um processo de seleção (não 
biológico, mas cultural), todos os membros de uma mesma sociedade compartilham um certo 
número de preocupações, sentem as mesmas inclinações e aversões. O que caracteriza uma 
determinada sociedade é uma "configuração cultural", uma lógica que se encontra ao mesmo 
tempo na especificidade das instituições e na dos comportamentos. Toda cultura persegue um 
objetivo, desconhecido dos indivíduos. Cada um de nós possui em si todas as tendências, mas 
a cultura à qual pertencemos realiza uma seleção. As instituições (e, em especial, as 
instituições educativas: famílias, escolas, ritos de iniciação) pretendem — inconscientemente 
— fazer com que os indivíduos se conformem aos valores próprios de cada cultura. 
Críticas, frequentemente severas, não faltaram ao culturalismo americano, que está 
longe de fazer a unanimidade entre os antropólogos, sobretudo na França onde o mínimo que 
se pode dizer é que não tem boa reputação. Trabalhando com uma abordagem muito empírica 
(a localização das funções, dos conflitos e das significações, em detrimento da investigação 
das normas, das regras e dos sistemas, de acordo com os termos de Michel Foucault aos quais 
nos referimos acima), tende a efetuar uma redução dos comportamentos humanos a tipos, e a 
esboçar tipologias que devem muito mais à intuição e à própria personalidade do pesquisador, 
do que à construção rigorosa de um objeto científico. Além disso, e em conseqüência mesmo 
dos pressupostos que são seus (a observação daquilo que, em uma sociedade, é manifesto, em 
detrimento daquilo que é recalcado e inconsciente), desenvolve uma concepção do relativismo 
 
36 
 
Antropologiacultural (expressão forjada por Herskovitz) que o impede de dar o passo que separa o estudo 
das variações culturais da análise da variabilidade da cultura. 
 Discussões acadêmicas a parte, podemos notar que a Antropologia contribuiu de 
maneira decisiva para compreendermos que o mundo que nos cerca é essencialmente e 
simultaneamente igual e diferente de nós, mas, como já citamos anteriormente, nem 
superior ou inferior, apenas diferente. Isso não quer dizer que o homem não evolua, como 
veremos a seguir. 
 
 
37 
 
Antropologia 
 6. O HOMEM: UM SER EM EVOLUÇÃO 
 
 
A evolução humana é independente da sua vontade. O que quero dizer é que o homem é 
capaz de evoluir mesmo não optando por isso. Por exemplo, na Idade Média, entendida por 
muitos como a Idade das Trevas (uma alusão à idéia de que nada evoluiu durante mil anos), o 
homem foi capaz de evoluir em vários setores, mesmo com todo o controle da fé e dos 
senhores feudais. O comércio renasceu e se modernizou, surgiu o renascimento cultural e 
científico, a burguesia se formou e as cidades ressurgiram quase que das cinzas. Portanto, 
duvidar que o homem nada produziu em mil anos é suspeitar da sua própria capacidade 
inventiva. 
Resumindo, mesmo em condições adversas, o homem é capaz de criar, produzir e 
inovar. É assim que o homem produz a sua cultura e a transmite às futuras gerações através da 
educação. Tudo bem, eu sei que você já ouviu falar que a educação surgiu com as primeiras 
civilizações como uma forma do Estado controlar as diferenças sociais, a escrita, a difusão 
das informações e a produção da ciência. Ou seja, a educação foi uma arma em poder do 
Estado para transmitir as futuras gerações o que elas deveriam saber e preservar sem direito 
de questionar ou pensar. Está certo, você deve estar pensando que a educação alienou as 
sociedades primitivas e continua alienando hoje. Porém, a educação é uma faca de dois 
gumes, porque o processo de construção de conhecimento ou a aprendizagem não está sob 
controle do educador. Essa é a grande questão da educação atual. Os, educadores, não sabem 
cientificamente como interferir na construção do conhecimento dos educandos, porque não 
sabem como ele acontece. Ora, então, um aluno é capaz de processar o conhecimento 
independentemente da vontade e intervenção de um outro. O lado bom da coisa é que se 
configura aí uma certa liberdade de pensamento. Tal liberdade é essencial para que as pessoas 
formem a sua própria opinião sobre si mesmo e o mundo que o cerca. É por isso que o ser 
humano não pára de evoluir. Se não há como controlá-lo absolutamente, não há como impedir 
que mude de opinião, repense seus conceitos e construa novos conhecimentos. 
Divirta-se um pouco com o ensaio abaixo de Ziraldo e Darcy Ribeiro sobre as 
vantagens e desvantagens da evolução humana. 
 Os homens em sua evolução foram ganhando coisas e perdendo coisas. Algumas 
perdas foram graves. Os ganhos foram poucos. 
O HOMEM: UM SER EM EVOLUÇÃO 
 
38 
 
Antropologia 
O olfato, por exemplo, foi uma perda essencial. Qualquer bicho tem faro melhor que o 
nosso, se orienta por ele para procurar comida e namorada. Andam até no escuro, guiados 
pêlos cheiros. 
Grave, também, foi a perda do focinho e o encolhimento da boca, mas teve a vantagem 
de permitir que a gente abandonasse o hábito de usar a boca antiga para carregar as coisas. 
Para isso, começamos a usar as mãos, que também se aperfeiçoaram com o polegar, que 
permite manipulações delicadas. 
A perda do pelame foi lamentabilíssima. Um cachorro ou um macaco, ao natural, quer 
dizer, nus, estão vestidos. Nós, nuelos, provocamos escândalos. Isso porque nos faltam os 
pêlos, que é a vestimenta natural dos seres. Sem eles, tem-se que fabricar roupa e também 
que ficar na moda, sobretudo as mulheres, o que fica muito caro. 
A perda mais grave, a meu juízo, foi a do belo rabão dos macacos. Trocamos o rabo 
pela bunda acolchoada que temos. Mau negócio. Nada podia ser mais útil do que bons rabos. 
Com eles, nos verteríamos em primatas desbundados. A única vantagem que trouxe foi nos 
dar a possibilidade de usar cadeiras para sentar, mas não seria ruim sentar no rabo 
enrodilhado no chão. Pense só na beleza que seria passear, pulando de galho em galho, com 
a garantia que o rabo dá para se equilibrar. Melhor, ainda, seria nas fábricas, nas escolas, 
em toda parte, os seres providos de rabos teriam os pés e as mãos livres para fazer coisas. A 
professora, por exemplo, ficaria controlando a turma, pendurada pelo rabo no lustre. Em 
lugar de carteiras, teríamos traves, de parede a parede, onde o pessoal se dependuraria, 
liberando as patas e as mãos para o trabalho. Dependurado nas traves, você podia segurar o 
livro com a mão esquerda, pegar a caneta com a mão direita, usar a pata esquerda para 
consultar o dicionário e, ainda, a pata direita para coçar a orelha. Formidável, não é? 
A perda mais radical foi a da posição quadrúpede, que usamos durante muitos milhões 
de anos, para a posição ereta. Como quadrúpedes, púnhamos as quatro patas no chão, o que 
dava muito mais solidez. Sobre duas patas, ficamos sempre meio desequilibrados e, depois, 
quando se perde uma, fica muito complicado viver e trabalhar. A consequência principal da 
adoção da posição bípede foi a dor ciática, que castiga demais os velhos. É uma dor terrível 
no traseiro. Dizem que é a saudade da nossa posição quadrúpede, porque, enquanto 
tínhamos quatro patas no chão, as vísceras se dependuravam na espinha, postas em posição 
vertical. 
 
39 
 
Antropologia 
Levantando os braços, as vértebras se comprimem umas nas outras, o que provoca 
aquela dor insuportável. O ganho único foi a possibilidade de subir escadas. Você acha que 
valeu a pena? 
Bem ,não preciso dizer que pensar sobre a evolução humana e o que o homem é capaz 
de fazer é assustador. Porém, o que quero com esse texto é mobilizar você para compreender 
que o homem é capaz de reavaliar a si mesmo e ao mundo que o cerca de uma forma livre e 
democrática. Mas, para isso, o educador/profissional deve ser o provedor dessas condições , 
enxergando um campeão enquanto a maioria vê apenas uma criança ou um aborrecente. 
Não desistir do outro é não desistir de você mesmo. Ora, se o homem é capaz de evoluir 
sobre as mais áridas condições, por que não podemos interferir na realidade daqueles que 
pretendemos ajudar ? Já sei, você vai dizer que eu mesmo afirmei que não podemos interferir 
no processo de construção do conhecimento, que o outro goza de certa liberdade para isso, 
entretanto, todos nós precisamos de referências de pensamento, trabalho e vida. Ninguém é 
uma ilha completa e cresce isolado do mundo que o cerca. O meio interfere na construção do 
conhecimento de uma pessoa, assim como a genética e ao que tem acesso. É uma soma de 
fatores que se entrelaçam para edificar um homem. E o seu papel (você que está lendo o 
texto) é o de ser esse agente de contato dele com o mundo que o cerca, através da sua conduta 
profissional. 
 
40 
 
Antropologia 
7. O HOMEM: UM SER ÉTICO E CONSCIENTE 
 
 
 
O homem não está "ligado ao meio ambiente", não vive na imediatidade. Sempre "se 
distanciou", vive na mediação da liberdade, formando o seu mundo humano, cultural. Face 
a essa distinção, que caracteriza a existência humana em geral, há uma segunda distinção, 
que pertence ao indivíduo como tal. Embora ele viva num mundo humano comum e esteja 
enredado na sua comunidade, ele se distingue de tudo que não é ele; sabe que ele é "ele-
mesmo". Essa experiência fundamental exprimimos com a palavra "eu". Cada um de nós se 
experimenta como este "eu", único e irrepetível. Quando perguntamos: O que é o homem?, 
então perguntamos conjuntamente: O que sou eu? Não atingiríamos o que é propriamente 
ser homem, se cada um de nós não se conhecesse e compreendesse como um "eu", se não 
tivesse essa auto-experiência original.No mundo inteiro, só há um único ponto que me pertence de modo primordial: sou eu 
mesmo. É o espaço iluminado da minha consciência, em que estou junto de mim e em que 
o mundo penetra na luz do meu conhecimento. E é o espaço da liberdade, em que 
disponho sobre mim mesmo, em que me posso e devo decidir e em que estou entregue à 
minha responsabilidade, sem poder escapar. 
Este ponto — meu "eu" — necessariamente é o centro do meu mundo, a partir do 
qual eu vejo e compreendo tudo o mais. Isto não é "egoísmo", no sentido moral do termo, 
mas simplesmente um fenômeno fundamental da auto-experiência humana. Só posso conhecer a 
partir de mim mesmo a realidade e, portanto, experimentar-me como o centro do meu 
mundo. 
Daí resulta a grandeza e dignidade do homem, porque o "eu", e irrepetível, não pode ser 
substituído por nada e por ninguém. Mas também se revela a sua pequenez, pois esse "eu" é 
apenas um ponto na incomensurável totalidade do ser e do acontecer, do mundo e da 
história. O indivíduo, limitado no espaço e no tempo, se sente como que perdido na 
realidade global. 
O que significa o termo "eu"? Pode significar duas coisas: eu-centro e eu-
totalidade: Eu conheço, eu quero. . . Mas também posso dizer: eu ando na rua, eu sou 
O HOMEM: UM SER ÉTICO E CONSCIENTE 
 
41 
 
Antropologia 
empurrado no ônibus. . . No segundo caso, temos um "eu" mais amplo, pois inclui o meu 
corpo pelo qual o eu-centro se exprime, se realiza e se situa no mundo. 
O "eu", no sentido de eu-centro, nunca é dado em si mesmo, de modo imediato; não é 
cognoscível objetivamente, mas somente com-dado atematicamente em cada ato consciente. 
É com-experimentado e com-conhecido em cada ato, enquanto eu o realizo como meu ato. 
Por isso forma uma evidência original e imediata, que também se mantém na dúvida 
— como viram AGOSTINHO e DESCARTES. E KANT esclareceu que toda a 
multiplicidade do conhecimento objetivo, enquanto é "meu conhecimento", é condicionada 
por um princípio último de unidade: o "eu penso". 
Vamos desenvolver este assunto, tratando da consciência, que é a propriedade mais 
característica do "eu". 
Na nossa vida, a consciência de objeto está, tematicamente, em primeiro plano. 
Percebemos coisas e fatos. Pensando, esforçando-nos, agindo, estamos dirigidos ao outro. O 
outro é o "tema" da intenção, é o conteúdo "temático" (tético, posicional) dos nossos atos. 
Mas o outro somente nos é dado enquanto o aprendemos com os nossos atos. Só conheço algo 
quando eu o conheço, quando o torno objeto por um ato meu. 
Isso significa que a nossa consciência de objeto é condicionada e sustentada pela 
consciência de ato. Sempre que conheço algo, sei, eu conheço. Esse saber não é dado 
tematicamente em toda clareza como um conteúdo objetivo, mas é com-dado imediatamente e 
pode ser tematizado pela reflexão sobre o ato. 
Na consciência, percebemos uma pluralidade e uma diversidade DOS ATOS, que se 
sucedem num fluxo permanente. Contudo, os atos não estão isolados, porque na sua 
multiplicidade há, simultaneamente, consciência de unidade. É uma pluralidade unida, porque 
cada ato é dado como elemento no fluxo da "minha consciência" e experimentado como 
"meu ato". Isso mostra que na base da unidade da consciência deve haver um princípio de 
unidade, um elemento que constitui a unidade e que se mantém idêntico na pluralidade. Esse 
princípio de unidade dos "meus atos" se denomina "eu". Assim, o desenvolvimento inteiro da 
consciência é condicionado, sustentado e penetrado pela consciência do eu, que sempre e 
necessariamente é com-dada em cada ato. 
Mas o "eu" não é perceptível diretamente em si mesmo. Só o experimentamos como 
centro-de-atos não-objetivo, como origem e fundamento da unidade do acontecer inteiro da 
consciência. Por isso, não pode ser pensado como sendo ele mesmo um ato. Max SCHELER 
o faz: compreende o "espírito como ato, como acontecer, e não como ser, como substância. 
 
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Antropologia 
Contudo, segundo ele, o acontecer espiritual é referido a um centro, que se mantém inalterado 
no decurso dos atos, denominado "pessoa" . Em todo caso, o desenvolvimento da consciência 
pressupõe um centro-de-atos como seu fundamento. Pois eu me experimento como o mesmo 
sujeito de atos sucessivos. Eu sou o mesmo "eu" que leio, passeio, vejo TV etc, o mesmo 
ontem e hoje. 
KANT fez a célebre distinção entre eu empírico e eu transcendental. O eu empírico é o 
eu ou sujeito, enquanto se exprime e se experiência na realização de seus atos conscientes; é a 
totalidade concreta de minha auto-experiência consciente. O eu transcendental, ao contrário, é 
o último ponto de unidade, que precede a toda experiência, também a auto-experiência, mas é 
a condição de possibilidade disso, que todos os conteúdos da experiência são dados na 
unidade da "minha" consciência. Para KANT, é o puro "eu penso", não como conteúdo 
empírico, mas como grandeza transcendental-apriórica, isto é, como "apercepção 
transcendental", que é o princípio da "unidade transcendental da autoconsciência". Portanto, é 
válida a idéia de que o "eu" pode ser estudado em vários níveis de profundidade. 
Vejamos o mesmo assunto sob um outro prisma (Cf. B. MONDIN, O Homem, quem é 
ele?, p. 96-105). Os filósofos de quase todas as correntes aceitam a diferença entre 
autoconsciência concomitante e autoconsciência reflexiva. 
Quando a consciência está voltada para o outro, a um objeto, tem concomitantemente 
("obliquamente", diziam os Escolásticos) uma consciência de si mesma: Quando vejo este 
texto, percebo concomitantemente que eu o vejo. O próprio termo 'consciência’ designa isto: 
enquanto tenho "ciência" de algo, tenho consciência de mim mesmo. O conteúdo imediato de 
autoconsciência indireta é a parte do sujeito envolta na respectiva ação: vista, mão, etc... 
Mas vai em direção ao sujeito inteiro. Esse último, todavia, não é apreendido como algo 
de preciso, com limites bem delineados, mas como algo de confuso. 
A autoconsciência reflexiva é o momento do conhecimento, em que o sujeito não se 
concentra sobre o objeto, mas sobre o seu ato e sobre si mesmo. Presto atenção sobre o meu 
ato de ver este texto, sobre mim mesmo que estou vendo. A reflexão é um dobrar-se sobre si 
mesmo. Mais exatamente: o todo se dobra sobre si mesmo e não uma parte sobre parte 
sobre outra parte. O todo como que se duplica, continuando a ser o mesmo. È sujeito e 
objeto ao mesmo tempo. A expressão lingüística é o pronome reflexivo: conhecer-se, 
amar-se a si mesmo etc, ou o prefixo "auto" (do grego "autos": o mesmo), como nas 
expressões: autoconsciência, auto-experiência. 
 
43 
 
Antropologia 
 A autoconsciência, concomitante ou reflexiva, não se dissocia da consciência 
objetiva, direta, voltada a um objeto exterior à consciência. A atenção do sujeito a si 
mesmo e ao seu ato é inseparável da consciência de objeto. Mais ainda: o objeto delimita o 
horizonte do meu ato de autoconsciência. Isso é importante para a avaliação do fenômeno da 
reflexão, do exame de consciência, da revisão de vida. Posso refletir-me como "um que 
gosta de música popular". Sou mais do que isso. A reflexão nunca é total: o sujeito nunca se 
agarra totalmente, nunca se recupera na integralidade do seu ser, porque a reflexão se efetua 
no horizonte que lhe é imposto pelo objeto, com que o ato de autoconsciência está ligado. 
Por isto é válido afirmar: Eu sempre sou mais do que sei de mim de modo introspectivo, 
objetivamente. Nunca atinjo o fundo ontológico de mim mesmo, nunca estou totalmente 
auto-iluminado, nunca a presença a mim mesmo é completa. Não há autotransparência 
total. O mesmo vale do elemento volitivo. Nunca tenho pleno domínio de mim mesmo, plena 
autopossessão.

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