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See discussions, stats, and author profiles for this publication at: https://www.researchgate.net/publication/325857576 Métodos e Técnicas de Pesquisa Book · June 2018 CITATIONS 0 READS 18,785 1 author: Orestes Trevisol Neto Universidade do Estado de Santa Catarina, Pinhalzino, Brasil 16 PUBLICATIONS 10 CITATIONS SEE PROFILE All content following this page was uploaded by Orestes Trevisol Neto on 19 June 2018. The user has requested enhancement of the downloaded file. https://www.researchgate.net/publication/325857576_Metodos_e_Tecnicas_de_Pesquisa?enrichId=rgreq-fa3b66488413ebc92bea5b03f3922c6f-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMyNTg1NzU3NjtBUzo2MzkzMTU0NTM0MTk1MjBAMTUyOTQzNjA5MDQyNA%3D%3D&el=1_x_2&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/publication/325857576_Metodos_e_Tecnicas_de_Pesquisa?enrichId=rgreq-fa3b66488413ebc92bea5b03f3922c6f-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMyNTg1NzU3NjtBUzo2MzkzMTU0NTM0MTk1MjBAMTUyOTQzNjA5MDQyNA%3D%3D&el=1_x_3&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/?enrichId=rgreq-fa3b66488413ebc92bea5b03f3922c6f-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMyNTg1NzU3NjtBUzo2MzkzMTU0NTM0MTk1MjBAMTUyOTQzNjA5MDQyNA%3D%3D&el=1_x_1&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/profile/Orestes_Trevisol_Neto?enrichId=rgreq-fa3b66488413ebc92bea5b03f3922c6f-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMyNTg1NzU3NjtBUzo2MzkzMTU0NTM0MTk1MjBAMTUyOTQzNjA5MDQyNA%3D%3D&el=1_x_4&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/profile/Orestes_Trevisol_Neto?enrichId=rgreq-fa3b66488413ebc92bea5b03f3922c6f-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMyNTg1NzU3NjtBUzo2MzkzMTU0NTM0MTk1MjBAMTUyOTQzNjA5MDQyNA%3D%3D&el=1_x_5&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/profile/Orestes_Trevisol_Neto?enrichId=rgreq-fa3b66488413ebc92bea5b03f3922c6f-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMyNTg1NzU3NjtBUzo2MzkzMTU0NTM0MTk1MjBAMTUyOTQzNjA5MDQyNA%3D%3D&el=1_x_7&_esc=publicationCoverPdf https://www.researchgate.net/profile/Orestes_Trevisol_Neto?enrichId=rgreq-fa3b66488413ebc92bea5b03f3922c6f-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzMyNTg1NzU3NjtBUzo2MzkzMTU0NTM0MTk1MjBAMTUyOTQzNjA5MDQyNA%3D%3D&el=1_x_10&_esc=publicationCoverPdf Métodos e Técnicas de Pesquisa Componente curricular na modalidade de educação a distância Orestes Trevisol Neto Técnico em Administração pela Escola Técnica da Universidade Federal do Paraná (UFPR), graduado em Biblioteconomia pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), mestre em Ciência da Informação (UFSC). Foi tutor presencial do curso de especialização em Gestão de Bibliotecas Escolares UAB/CIN/UFSC, polo Florianópolis. É Professor no curso de Biblioteconomia EaD da Universidade Comunitária da Região de Chapecó (UNOCHAPECÓ) e bibliotecário da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), em Pinhalzinho. É avaliador da Revista ACB. Possui conhecimento em Comunicação Científica, Bibliometria, Cienciometria e Institucionalização Científica e também na área de Moda, enquanto campo de conhecimento. Compõe o grupo de pesquisa Núcleo de Estudos em Informação e Mediações Comunicacionais Contemporâneas (NEIMCOC). Chapecó, 2017 Reitor Claudio Alcides Jacoski Vice-Reitora de Pesquisa, Extensão e Pós-Graduação Silvana Muraro Wildner Vice-Reitor de Planejamento e Desenvolvimento Márcio da Paixão Rodrigues Vice-Reitor de Administração José Alexandre de Toni Coordenador Geral: Paulo Sergio Jordani Revisão: Juliane Fernanda Kuhn de Castro, Kauana Pagliocchi Gomes Assistente Administrativo: Manon Aparecida Pereira de Jesus Capa: Marcela do Prado, Juliane Fernanda Kuhn de Castro Diagramação: Marcela do Prado, Roberta Rodrigues Kunst Av. Sen. Attílio Fontana, 591-E - Bairro Efapi - Chapecó (SC) CEP 89809-000 - Caixa Postal 1141 - Fone: (49) 3321 8088 E-mail: unovirtual@unochapeco.edu.br Home Page: www.unochapeco.edu.br/ead Não estão autorizadas nenhuma forma de reprodução, parcial ou integral deste material, sem autorização expressa do autor e da UnochapecóVirtual Coordenação: Rosane Natalina Meneghetti Silveira Comercial: Luana Paula Biazus Assistente editorial: Caroline Kirschner Conselho Editorial: (2016-2018) Titulares: Murilo Cesar Costelli (presidente), Clodoaldo Antônio de Sá (vice- presidente), Rosane Natalina Meneghetti Silveira, Cesar da Silva Camargo, Giana Vargas Mores, Silvana Terezinha Winckler, Silvana Muraro Wildner, Ricardo Rezer, Rodrigo Barichello, Mauro Antonio Dall Agnol, Claudio Machado Maia. Suplentes: Arlene Anélia Renk, Fátima Ferretti, Fernando Tosini, Rodrigo Oliveira de Oliveira, Irme Salete Bonamigo, Maria Assunta Busato. Ficha catalográfica _______________________________________________________________ Trevisol Neto, Orestes T814m Métodos e técnicas de pesquisa / Orestes Trevisol Neto. -- Chapecó, SC : Argos, 2017. 96 p. : il. ; 28 cm. -- (EaD ; 32) Inclui bibliografias ISBN 978-85-7897-209-7 1. Pesquisa - Metodologia. I. Título. CDD 21 -- 001.42 _______________________________________________________________ Catalogação elaborada por Daniele Lopes CRB 14/989 Biblioteca Central da Unochapecó Métodos e Técnicas de Pesquisa CARTA AO ESTUDANTE Seja bem-vindo! Você está recebendo o livro do componente curricular de Métodos e Técnicas de Pesquisa. No atual cenário educacional, em que, cada vez mais, as pessoas buscam por uma formação complementar e há a inserção massiva das tecnologias de informação e comunicação, a modalidade de educação a distância é vislumbrada como uma importante contribuição à expansão do ensino superior no país, que permite formas alternativas de geração e disseminação do conhecimento. A educação a distância tem sido importante para atingir um grande contingente de estudantes de vários locais, com disponibilidade de tempo para o estudo diversa, além daqueles que não têm a possibilidade de deslocamento até uma instituição de ensino superior todos os dias. Desta forma, a Unochapecó, comprometida com o desenvolvimento do ensino superior, vê a educação a distância como um aporte para a transformação dos métodos de ensino em uma proposta inovadora. Levando em consideração o pressuposto da necessidade de autodesenvolvimento do estudante da modalidade de educação a distância, este material foi elaborado de forma dialógica, baseada em uma linguagem clara e pertinente aos estudos, além de permitir vários momentos de aprofundamento do conteúdo ao estudante, através da mobilidade do para outros meios (como filmes, livros, sites). Temos como princípio a responsabilidade e o desafio de oferecer uma formação de qualidade, para tanto, a cada novo material, você está convidado a encaminhar sugestões de melhoria para nossa equipe, sempre que julgar relevante. Lembre-se: a equipe da UnochapecóVirtual estará à disposição sempre que necessitar de um auxílio, pois assumimos um compromisso com você e com o conhecimento. Acreditamos no seu sucesso! Núcleo de Educação a Distância UnochapecóVirtual Métodos e Técnicas de Pesquisa SUMÁRIO APRESENTAÇÃO ..............................................................................7 UNIDADE 1 CIÊNCIA, CONHECIMENTO CIENTÍFICO E O DESENVOLVIMENTO DA CIÊNCIA ....................................................9 1 INTRODUÇÃO ................................................................................11 2 O QUE É CIÊNCIA? .........................................................................11 3 A CIÊNCIA E SEUS PERÍODOS ........................................................14 4 SENSO COMUM E CONHECIMENTO CIENTÍFICO ............................18 5 A CLASSIFICAÇÃO DA CIÊNCIA ......................................................20 6 O DESENVOLVIMENTO DA CIÊNCIA E AS RELAÇÕES DE PODER ENTRE AGENTES CIENTÍFICOS NA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO .......22 REFERÊNCIAS ....................................................................................27 UNIDADE 2 PESQUISA, SUAS CLASSIFICAÇÕES E O MÉTODOCIENTÍFICO ....................................................................................31 1 INTRODUÇÃO ................................................................................33 2 O QUE É PESQUISA? ......................................................................33 3 PESQUISA BÁSICA (PURA) E PESQUISA APLICADA .........................38 4 A CLASSIFICAÇÃO DA PESQUISA QUANTO AO PROBLEMA, OBJETIVOS E OS PROCEDIMENTOS TÉCNICOS ....................................................39 4.1 Pesquisa quantitativa, qualitativa e pesquisa quali- quantitativa ..................................................................................39 4.2 Pesquisa exploratória, descritiva e explicativa .......................41 4.3 Classificação da pesquisa conforme os procedimentos técnicos empregados ..................................................................................46 4.3.1 Pesquisa bibliográfica ..................................................46 4.3.2 Pesquisa documental ....................................................47 4.3.3 Pesquisa experimental .................................................47 4.3.4 Levantamento ou survey .............................................48 4.3.5 Estudo de caso ............................................................49 4.3.6 Pesquisa ex-post-facto..................................................49 4.3.7 Pesquisa-ação ..............................................................50 4.3.8 Pesquisa participante ...................................................50 5 O QUE É MÉTODO CIENTÍFICO? .....................................................51 5.1 Métodos de abordagem .........................................................52 5.1.1 Método dedutivo ..........................................................53 5.1.2 Método indutivo ...........................................................53 5.1.3 Método hipotético-dedutivo ........................................54 Métodos e Técnicas de Pesquisa6 5.1.4 Método dialético ..........................................................55 5.1.5 Método fenomenológico ..............................................56 5.2 Métodos de procedimento .....................................................56 REFERÊNCIAS ....................................................................................60 UNIDADE 3 ETAPAS E ELEMENTOS DA PESQUISA CIENTÍFICA ......63 1 INTRODUÇÃO ................................................................................65 2 ESCOLHA DO TEMA .......................................................................65 3 REVISÃO DE LITERATURA ...............................................................66 4 JUSTIFICATIVA ...............................................................................67 5 FORMULAÇÃO DO PROBLEMA ......................................................68 6 DETERMINAÇÃO DE OBJETIVOS ....................................................69 7 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS.............................................70 8 TESTE DE INSTRUMENTOS .............................................................74 9 CRONOGRAMA ..............................................................................74 10 COLETA DE DADOS ......................................................................74 11 TABULAÇÃO DE DADOS ...............................................................74 12 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ...................................75 13 CONCLUSÃO DA ANÁLISE DOS RESULTADOS ..............................75 14 REDAÇÃO E APRESENTAÇÃO DO TRABALHO CIENTÍFICO ...........75 REFERÊNCIAS ....................................................................................80 UNIDADE 4 A COMUNICAÇÃO CIENTÍFICA....................................83 1 INTRODUÇÃO ................................................................................85 2 A COMUNICAÇÃO NA CIÊNCIA: O SURGIMENTO DOS PERIÓDICOS CIENTÍFICOS .....................................................................................85 3 OS CANAIS DE COMUNICAÇÃO: INFORMAL E FORMAL ................88 4 O MOVIMENTO DE ACESSO ABERTO NA COMUNICAÇÃO CIENTÍFICA ........................................................................................90 REFERÊNCIAS ....................................................................................94 Métodos e Técnicas de Pesquisa APRESENTAÇÃO Prezado aluno de Biblioteconomia! Bem-vindo ao componente curricular de Métodos e Técnicas de pesquisa, aqui procuraremos introduzi-lo no universo científico, em específico no processo de pesquisa, destacando as etapas que envolvem a construção do conhecimento científico. Desenvolver pesquisa é uma atividade complexa, na qual, ao longo da jornada acadêmica, vamos aprimorando nossa capacidade crítica e investigativa. Para desenvolver uma pesquisa, primeiramente, é preciso um problema a ser investigado, o que denota uma pergunta que não dispõe de resposta. Diante desse questionamento, determinamos os objetivos que desejamos alcançar, bem como os procedimentos metodológicos que permitam atingir tais objetivos. Nesse processo investigativo, adotamos métodos e técnicas que embasarão a pesquisa. Depois de ter levantado os dados, analisado e discutido com a literatura científica, cabe ao pesquisador comunicar os resultados obtidos com os pares por meio da publicação de artigos científicos, trabalhos apresentados em eventos ou livros. Assim, nesse componente curricular, você, aluno, deve ser capaz de compreender a dinâmica que envolve a produção e comunicação do conhecimento científico. O componente curricular de Métodos e Técnicas de Pesquisa traz em sua ementa os seguintes itens: as orientações metodológicas; os métodos de pesquisa; o planejamento da pesquisa e as técnicas empíricas; a pesquisa qualitativa e quantitativa; redação técnico-científica. O conteúdo do componente curricular foi organizado em quatro unidades. Na primeira unidade abordaremos os atributos da ciência; conhecimento científico e senso comum; ciência formal e ciência factual; paradigma científico, ciência normal e ciência revolucionária; campo científico e capital científico. Na segunda unidade estudaremos a noção de pesquisa e método científico, veremos a classificação das pesquisas diante de seus objetivos e procedimentos técnicos, bem como os métodos de abordagem e métodos de procedimentos. Na terceira unidade falaremos sobre planejamento, execução e relatório final de pesquisa; escolha do tema; revisão de literatura; justificativa; formulação do problema; determinação dos objetivos; procedimentos metodológicos; teste de instrumentos; cronograma; coleta de dados; tabulação de dados; análise e discussão dos resultados; redação e apresentação do trabalho científico. Na quarta unidade, encerramos o componente curricular tratando da comunicação científica, em específico, abordamos o surgimento dos periódicos científicos, a importância da revisão por pares e os canais formais e informais na comunicação científica. Por fim, destacamos o acesso aberto na comunicação científica e os periódicos da Biblioteconomia e Ciência da Informação. Lembramos que é importante que o aluno faça as leituras indicadas, além do livro didático, ampliando o leque de conhecimentos e completando sua formação. Métodos e Técnicas de Pesquisa8 A seguir, apresentamos o cronograma do componente curricular para que você possa acompanhar o andamento de seus estudos. Carga horária Unidade 10 h Unidade 1. Ciência, conhecimento científico e o desenvolvimento da ciência 10 h Unidade 2. Pesquisa, suas classificações e método científico 10 h Unidade 3. Etapas e elementos da pesquisa 10 h Unidade 4. A comunicação científica Por gentileza, leia com atenção todo o material didático e demais orientações! Bom estudo! Orestes Trevisol Neto Unidade 1 Ciência, Conhecimento Científico e o Desenvolvimento da Ciência Objetivo: • Apresentar a noção de ciência e como ocorre seu desenvolvimento; • Caracterizar osdiferentes períodos da ciência; • Destacar as diferenças entre senso comum e conhecimento científico; • Apresentar a classificação das ciências; • Espera-se que o aluno entenda o que é ciência, sua classificação e como ocorre o desenvolvimento científico, percebendo os diferentes períodos transcorridos e sendo capaz de distinguir senso comum de conhecimento científico. Conteúdo programático: • Atributos da ciência; • Conhecimento científico, senso comum; • Ciência formal e ciência factual; • Paradigma, ciência normal e ciência revolucionária; • Campo científico, capital científico. Métodos e Técnicas de Pesquisa10 Faça aqui seu planejamento de estudos Métodos e Técnicas de Pesquisa 11 1 INTRODUÇÃO Prezado estudante, nesta unidade buscaremos explorar o conceito de ciência, pautando os diferentes períodos científicos percorridos no desenvolvimento histórico da sociedade. Atrelado a esse olhar geral, reforçamos a noção de conhecimento científico e apresentamos a classificação macro da ciência, também procuramos explicitar como a ciência se desenvolve utilizando os pressupostos teóricos de Thomas Kuhn, relacionando com a noção de campo científico postulado por Pierre Bourdieu, o qual deflagra as relações de poder e interesse travados pelos cientistas na construção do conhecimento científico. Ao ingressar na universidade, você, estudante, passa a fazer parte do universo científico, para tanto, precisa entender os valores que permeiam a atividade e a lógica científica. Ao longo de sua jornada acadêmica estará em contato constante com o conhecimento científico e propriamente com a ciência, seja por meio das atividades de ensino e aprendizagem, seja no momento de desenvolver uma pesquisa científica, no chamado Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). Assim, esperamos que no final dessa unidade você entenda como opera a ciência, quais são seus atributos e qual o seu objetivo final. Percebendo a importância da ciência e do conhecimento científico diante das explicações dos fenômenos naturais e sociais. 2 O QUE É CIÊNCIA? Não há uma definição exata/clara de ciência, mas o entendimento que se tem dessa está muito próximo da definição de conhecimento científico. Assim, a ciência é uma forma de conhecimento que objetiva formular leis que regem os fenômenos. Tais leis descrevem os fenômenos, são comprováveis por meio de observação/ experimentação e podem prever acontecimentos futuros com base na probabilidade. A partir dos seus atributos a ciência é caracterizada como uma forma de conhecimento objetivo, racional, sistemático, geral, verificável e falível. Portanto, diante desses enunciados é possível distinguir ciência de não ciência (GIL, 2010). Se analisarmos o aspecto etimológico da palavra ciência (scire) seu significado representa saber/conhecer. Porém, a ciência pode ser considerada sob três aspectos: “[...] conhecimento ou sistema de enunciados provisoriamente estabelecidos – recebe o nome de conhecimento científico; como busca da verdade e produtora de ideias – é a investigação científica; como produtora de bens materiais – é a tecnologia.” Observamos que esses aspectos estão intimamente ligados e denotam um sentido amplo de ciência (BARROS; LEHFELD, 2000, p. 47). Sob uma perspectiva sociológica, a ciência é considerada uma atividade social desenvolvida por grupos de indivíduos e instituições. Cada grupo, especializado em determinado campo de conhecimento, estipula seus objetos de estudo/metodologias e adota teorias e terminologias próprias. Os indivíduos participantes desse processo Métodos e Técnicas de Pesquisa12 são tradicionalmente denominados de cientistas, pesquisadores que objetivam realizar novas descobertas científicas e gerar novos conhecimentos. O conhecimento científico é um produto dessa atividade. Targino (2000) lembra que a ciência é uma instituição social, dinâmica e contínua, sua finalidade consiste em desvendar e compreender a natureza e seus fenômenos por meio de metodologias seguras e sistemáticas. Os resultados de pesquisas são provisórios e seus sistemas explicativos não são permanentes, refletindo a dinamicidade da ciência. Os resultados científicos são transformados ao longo do tempo, de acordo com novas descobertas e acréscimos cognitivos. Os constructos científicos ampliam continuamente as fronteiras do conhecimento. Ao longo dos séculos a ciência influenciou a humanidade, criando/alterando convicções, modificando os hábitos e gerando leis. Colaborando com as ideias expostas, a palavra ciência pode ser utilizada em muitos sentidos, como, por exemplo, para apontar: (1) um conjunto de métodos característicos por meio dos quais o conhecimento é certificado; (2) um estoque de conhecimento acumulado que se origina da aplicação desses métodos; (3) um conjunto de valores e costumes culturais que governam as atividades denominadas científicas; ou (4) qualquer combinação das três anteriores. (MERTON, 2013, p. 183). Na visão de Ziman (1979), a ciência é um produto da consciência humana, apresentando escopo e conteúdo bem definidos, como também praticantes profissionais que fundamentam suas atividades por meio da avaliação, da crítica, da aprovação e cooperação. A ciência é “precisa, metódica, acadêmica, lógica e prática” (ZIMAN, 1979, p. 17). Em sua concepção, a ciência é o conhecimento científico publicado, resultante do consenso da comunidade científica. No entendimento de Volpato (2015, p. 28-29), a ciência pode ser considerada a partir de dois referenciais: “a) a forma como construímos o conhecimento e b) o conjunto de conhecimento produzido”. Para alcançar status de ciência o conhecimento deve estar pautado no método científico e “[...] os preceitos necessários para construir o conhecimento científico são: ser sustentado por base empírica; e essa base empírica deve ser universal, i,e., obtida ou percebida, no mínimo, por quaisquer cientistas da área [...]” (VOLPATO, 2015, p. 28-29), aspectos esses que definem a essência do método científico. No entanto, o autor explica que fazer ciência vai além da utilização do método científico, ao se produzir conhecimento é necessário conectá-lo com a “[...] rede de conhecimento existente, seja corroborando-os, modificando-os ou eliminando- os.” (VOLPATO, 2015, p. 30). Além disso, é preciso considerar o conhecimento científico como eternamente provisório, pois novas descobertas científicas podem alterar a maneira como compreendemos e explicamos os fatos e fenômenos. Tais preceitos caracterizam o uso do método científico no fazer da ciência “[...] entendida epistemologicamente como essa rede de conhecimento que nos fornece entendimento sobre o mundo natural.” (VOLPATO, 2015, p. 30). Cabe aos cientistas construir explicações gerais sobre o mundo natural, ou seja, propor teorias científicas. Métodos e Técnicas de Pesquisa 13 Nos livros de metodologia científica encontramos as seguintes definições para ciência: Ander-Egg (1978, p. 15) entende a ciência como “[...] um conjunto de conhecimentos racionais, certos ou prováveis, obtidos metodicamente sistematizados e verificáveis, que fazem referência a objetos de uma mesma natureza.” Tomando uma definição mais precisa, Trujillo (1974, p. 8) afirma que “[...] a ciência é todo um conjunto de atitudes e atividades racionais, dirigidas ao sistemático conhecimento com objeto limitado, capaz de ser submetido à verificação.” Diante dos conceitos expostos convém caracterizar a ciência como: [...] um pensamento racional, objetivo, lógico e confiável, ter como particularidade o ser sistemático, exato e falível, não final e definitivo, pois deve ser verificável, isto é, submetido a experimentação para a comprovação de seus enunciados e hipóteses, procurando-se as relações causais; destaca-se, também, a importância da metodologia que, em última análise, determinará a própria possibilidade de experimentação. (MARCONI; LAKATOS, 2011, p. 23). Diante das concepções expostas, é possível perceber que aciência tem como objetivo a construção de um conhecimento seguro, verificável, por meio de caminhos (métodos) que atestem sua confiabilidade, esse conhecimento é analisado de forma crítica por todos que se dedicam no fazer da ciência, ou seja, a ciência é feita de maneira coletiva e universal. A ciência pode ser desenvolvida tanto em laboratórios, a partir de experimentos e testes de materiais, quanto a partir da confrontação de teorias relacionadas à observação dos fatos e fenômenos sociais. Assim, a ciência engloba tanto as ciências naturais/exatas quanto as ciências sociais/humanas. Por fim, é importante salientar que os objetivos da ciência são determinados pela “[...] necessidade que o homem possui de compreender e controlar a natureza das coisas e do universo, compreendendo-as naquilo que elas encerram de certo, evidente e verdadeiro.” (BARROS; LEHFELD, 2000, p. 46-47). Saiba mais Agora que você já sabe o que é ciência, assista ao vídeo em que a professora Dra. Luciana Massi discute a noção de ciência, enfatizando as visões distorcidas frequentemente associadas a essa atividade: https://youtu.be/ZYz0O8gFbyQ. Na sequência, será apresentando um breve relato do desenvolvimento da ciência ao longo da história da humanidade, iniciamos no período grego e chegamos na contemporaneidade. É importante perceber as mudanças que ocorrem na forma de construir o conhecimento. Métodos e Técnicas de Pesquisa14 3 A CIÊNCIA E SEUS PERÍODOS Ao longo da história da humanidade a ciência passou por diferentes períodos, por diferentes concepções, paradigmas e modelos teóricos. Podemos dividir a ciência em três tempos: Ciência Grega, que inicia no século VIII a.C. até o final do século XVI; Ciência Moderna, que data do século XVII até o início do século XX; e Ciência Contemporânea, que emerge no início do século XXI até a atualidade (KÖCHE, 2013). Faremos uma breve retomada de cada período. Primeiro período (Ciência Grega): dentre os anos de VIII a.C. e IV a.C. na Antiguidade, na Grécia o conhecimento científico foi desenvolvido pela filosofia, a ciência era conhecida como filosofia da natureza no qual sua preocupação concentrava- se na busca do saber, na compreensão da natureza das coisas e do homem. Nesse contexto, os filósofos pré-socráticos (Tales de Mileto, Anaximandro, Pitágoras, Heráclito, Empédocles, Anaxágoras e Demócrito) rompem com uma concepção de mundo caótico embasado na mitologia e inserem a ideia de cosmos, nele, as forças espirituais e sobrenaturais exercidas pelos Deuses são desconsideradas diante dos fenômenos que aconteciam no mundo, passa a imperar a ideia de uma ordem natural no universo, sendo ordenada por princípios e leis inerentes à natureza. Assim, os fenômenos estavam relacionados à natureza, sendo possível conhecê-los e prevê-los usando da especulação racional para se chegar à sabedoria. Os pressupostos dos pré- socráticos prevaleceram por mais de 2000 anos (KÖCHE, 2013). Em seguida, surge o modelo platônico, nele “[...] o real não está na empiria, nos fatos e fenômenos percebidos pelos sentidos. O verdadeiro mundo o mundo platônico é o das ideias, que contém os modelos e as essências de como as aparências devem se estruturar.” (KÖCHE, 2013, p. 45). Na sequência desponta a concepção aristotélica que predominou do século IV a.C. até o século XVII, aqui a ciência é fruto da elaboração do entendimento em colaboração com a experiência sensível, resultante da abstração indutiva. Assim, o método aristotélico tem como base a análise da “[...] realidade através de suas partes e princípios que podem ser observados, para em seguida, postular seus princípios universais, expressos na forma de juízos, encadeados logicamente entre si.” (KÖCHE, 2013, p. 47). Essa concepção de ciência contribui para construção de um conhecimento próximo da realidade, uma vez que se pauta na observação. Na ciência grega o processo de descoberta não tem destaque, pois o foco era justificar e demonstrar os princípios universais, então, “[...] o conhecimento científico era demonstrado como certo e necessário através de argumentos lógicos [...] ” e o valor das explicações estava na argumentação. Portanto, os gregos fizeram uma ciência do discurso e qualitativa, sem que houvesse o tratamento do problema que desencadeia a investigação, a preocupação residiu na demonstração da verdade racional no plano sintático (KÖCHE, 2013, p. 47-48). Segundo período (Ciência Moderna): a ciência moderna é marcada pela oposição à ciência grega (filosofia) e ao dogmatismo religioso. É a partir do século XV que os modelos platônico e aristotélico são severamente atacados, principalmente Métodos e Técnicas de Pesquisa 15 no século XVII. Em meio ao Renascimento e à Revolução Científica é introduzida a experimentação científica, ocasionando uma mudança de compreensão e concepção teórica de mundo, de ciência, do que vem a ser a verdade, o conhecimento e o método. Nesse contexto, Galileu e Bacon passam a rejeitar o modelo aristotélico (KÖCHE, 2013). Bacon advogou que preceitos de ordem filosófica, religiosa e cultural deveriam ser ignorados no fazer científico, uma vez que distorciam e impediam a verdadeira visão de mundo. No seu entendimento cabia à experiência confirmar a verdade, o verdadeiro caminho para o conhecimento era o da indução experimental, assim, Bacon propôs o método científico, por meio dele se chegaria ao conhecimento. O referido método é composto pelos seguintes passos: experimentação, formulação de hipóteses, repetição da experimentação por outros cientistas, repetição do experimento para a testagem das hipóteses, por fim, formulação das generalizações e leis (KÖCHE, 2013). Na ciência moderna o método silogístico grego é substituído pelo método científico-experimental. Assim, “[...] o critério de verdade, para a ciência moderna, passaria a ser o da correspondência entre o conteúdo dos enunciados e a evidência dos fatos (verdade semântica).” (KÖCHE, 2013, p. 52). É válido destacar a participação importante de Galileu na revolução científica moderna, ao introduzir a “[...] matemática e a geometria como linguagens da ciência e o teste quantitativo-experimental das suposições teóricas como mecanismo necessário para avaliar a veracidade das hipóteses e estimular a verdade científica [...]” (KÖCHE, 2013, p. 52), alterando a forma de produzir e justificar o conhecimento científico. É característica desse período a aplicação de procedimentos experimentais e matemáticos, e o despontar de uma concepção de mundo mecanicista e determinista. Newton, por sua vez, faz uma interpretação do método científico sob um viés indutivista e positivista, recusando o uso de hipóteses apriorísticas. No seu entendimento as hipóteses deveriam ser extraídas da experimentação pela indução, as leis e teorias se originavam dos fatos, “[...] isto é: em física, toda proposição deveria ser tirada dos fenômenos pela observação e generalizados por indução.” (KÖCHE, 2013, p. 55). Nesse modelo as hipóteses são colocadas à prova e seriam aceitas pela ciência as que tivessem confirmação do método experimental. Contudo, observamos que o método científico na modernidade está relacionado a procedimentos de experimentação que permitem o acesso à realidade, assim, são criados critérios que determinam julgar quando há ou não o acesso à realidade (KÖCHE, 2013). Na ciência moderna acreditou-se que o método científico-experimental indutivo chegaria a verdades exatas, verificadas e confirmadas pelos fatos, e o crescimento da ciência seria de forma acumulativa diante da superposição de verdades demonstradas pelas provas geradas pela observação e experimentos. Foi postulado que o único conhecimento válido é o científico (cientificismo) e que a ciência tudo pode desvendar e conhecer. É nesse contexto que o modelo científico da física passa a ser adotado por outras áreas de conhecimento na busca por status científico. Observamos, então, o desenvolvimento de uma ciênciaquantitativa e experimental (KÖCHE, 2013). É válido ressaltar que no século XVII a ciência recebeu influência dos valores puritanos, refletindo aspectos na sua constituição. Na sociedade inglesa, o aumento Métodos e Técnicas de Pesquisa16 do interesse pela ciência esteve relacionado à glorificação divina e ao bem-estar social, havia um temor que o ócio dos indivíduos pudesse originar pensamentos pecaminosos e desnecessários. Por meio dessa influência puritana, a ciência incorporou o utilitarismo e o empirismo em suas práticas, exaltando, assim, a racionalidade, “[...] a combinação de racionalismo e empirismo que é tão pronunciada na ética puritana constituiu a essência do espírito da ciência moderna.” (MERTON, 2013, p. 23). Portanto, os conhecimentos teológicos se tornaram insuficientes para responder questões científicas, pois os fatos devem ser comprovados por meio da observação, experimentação e ancorados por uma ótica racional, a fé já não bastava (MERTON, 2013). No mais, os puritanos instituíram academias nas quais a ênfase estava direcionada para ciência e tecnologia, relacionando-as com questões práticas da vida. Em suas academias/centros educacionais tinham destaque as disciplinas de mecânica, hidrostática, física, anatomia e astronomia. Tais estudos se realizavam com a ajuda de experimentos e observações reais, reforçando, assim, a aplicação prática dos ensinamentos. A educação puritana estava ligada à vida e seus assuntos tinham um cunho prático, diferente do ensino desenvolvido nas universidades católicas que focavam uma educação clássica, teológica, com estudos culturais e pouco úteis (MERTON, 2013). Nesse sentido, Burke (2003) enfatiza que no século XVII assistimos ao surgimento dos institutos de pesquisa, do pesquisador profissional e da própria ideia de pesquisa. Entre os séculos XVII e XVIII são criadas organizações de fomento à pesquisa e fundadas as academias de artes, engenharia e medicina. Nesse período utilizaram-se regularmente os termos investigação e experimento, o que denota a consciência de certos grupos sobre a “[...] necessidade de buscas para que o conhecimento fosse sistemático, profissional, útil e cooperativo.” (BURKE, 2003, p. 48-49). Observa-se que é na modernidade que a ciência se constitui e se institucionaliza. Nesse período o modelo de construção de conhecimento teve como base a experimentação e observação, estando vigente um modelo positivista de ciência. Terceiro período (Ciência Contemporânea): no início do século XX as contribuições teóricas de Einstein e Popper são fundamentais para a transformação da ideia de ciência e do método científico. A ciência contemporânea rompe com a noção de ciência moderna para a qual a investigação tem um olhar objetivo dos fenômenos e cabe a ela apenas descrever a realidade de forma isenta, sem influência das ideias pessoais. Na contemporaneidade, a ciência é a proposta de uma interpretação, faz-se uma analogia na qual o cientista se aproxima de um artista e não de um fotógrafo. Nesse pensamento, o progresso científico deixa de ser acumulativo e passa a acontecer por meio de revoluções científicas e o método experimental indutivo deixa de ser um critério para definir o que é ciência e o que não é ciência (KÖCHE, 2013). Renegado o método científico indutivo e positivista, a ciência contemporânea passa a ser vista com um olhar crítico, sendo interpretada e compreendida por meio do método hipotético-dedutivo, que tem como fundamento a testagem das hipóteses na tentativa de falseamento, para assim aceitá-las ou refutá-las. Assim, o processo Métodos e Técnicas de Pesquisa 17 de conhecer é resultante do questionamento feito pelo sujeito que coloca em dúvida o conhecimento já existente. “Na ciência contemporânea, a pesquisa é um processo decorrente da identificação de dúvidas e da necessidade de elaborar e construir respostas para esclarecê-las.” (KÖCHE, 2013, p. 71). Köche (2013, p. 71) explica que “[...] a investigação científica se desenvolve, portanto, porque há a necessidade de construir e testar uma possível resposta ou solução para um problema, decorrente de algum fato ou de algum conjunto de conhecimentos teóricos.” As soluções elaboradas para o problema apresentam-se como modelos hipotéticos, ideias que devem ser testadas e criticadas com base no conhecimento disponível. No método dedutivo a intenção é sempre colocar a hipótese a prova confrontando-a com hipóteses concorrentes. As hipóteses são elaboradas pelo pesquisador e levam em conta o domínio teórico que esse possui em seu campo de atuação, a lógica da pesquisa volta-se para criar hipóteses e submetê-las à crítica com o intuito de avaliar sua validade, ou seja, a correspondência com os fatos (verdades semânticas). No entanto, no desenvolver da pesquisa caminhos variados podem ser seguidos pelos pesquisadores para produzir uma explicação (KÖCHE, 2013). Deve ficar claro que no contexto contemporâneo a ciência é percebida como uma “[...] investigação constante, em contínua construção e reconstrução, tanto das suas teorias quanto dos seus processos de investigação. A ciência não é um sistema de enunciados certos ou verdadeiros.” (KÖCHE, 2013, p. 77). O aspecto transitório do conhecimento tem como base a submissão permanente à crítica e o fato de ser um produto criativo do espírito humano, da sua imaginação. Köche (2013, p. 78) afirma que para existir ciência são necessários dois aspectos: “[...] um subjetivo, o que cria, o que projeta, o que constrói com imaginação a representação do seu mundo segundo as necessidades internas do pesquisador, e outro objetivo, o que serve de teste, de confronto.” Em ambos os aspectos existem leis e o objetivo é conhecê-las, considerando a constante transformação do conhecimento científico (KÖCHE, 2013). O conhecimento científico torna-se seguro/confiável pelo seu caráter metódico, reflexo da preocupação constante pelo aperfeiçoamento e correção dos métodos de investigação. Cada área de conhecimento adota métodos que são mais confiáveis, os quais permitem a eliminação de erros e possibilitam que a comunidade científica exerça a crítica. No entanto, não existe mais a pretensão de taxar o conhecimento como verdadeiro, uma vez que esse é falível e a ciência passa a ser entendida como um processo de investigação consciente de suas limitações, capaz de rever e renovar seus métodos e teorias sob um olhar crítico (KÖCHE, 2013). Diante do exposto, é possível perceber que, ao longo dos séculos, o caminho e a lógica utilizados na construção do conhecimento sofreram alterações, levando em consideração as transformações sociais de cada período, se há uma mudança de método, isso reflete a forma de encarar a ciência e produzir conhecimento. Métodos e Técnicas de Pesquisa18 4 SENSO COMUM E CONHECIMENTO CIENTÍFICO Ao longo da vida as pessoas se apropriam do conhecimento para tomar decisões, desde as atividades mais simples até as mais complexas recorremos ao conhecimento em suas diferentes formas, seja ele oriundo do senso comum ou fruto da atividade científica (KÖCHE, 2013). O que distingue o senso comum do conhecimento científico “é a forma, o modo ou método e os instrumentos do ‘conhecer’”, isso representa a maneira de se chegar ao conhecimento. Destacamos que ambos os tipos de conhecimentos podem ser verdadeiros, pois um mesmo objeto ou fenômeno podem ser matéria de interesse e observação tanto para o cientista quanto para o homem comum (MARCONI; LAKATOS, 2011, p. 17). O modo mais convencional do homem interpretar a si mesmo e o universo tem como base o senso comum (conhecimento empírico ou conhecimento popular). Esse conhecimento se processa em consequência da resolução de problemas imediatos enfrentados no cotidiano, sendo elaborado de forma espontânea e intuitiva, sem aprofundamento racional e crítico. Seu carácter utilitarista se distancia da explicação e compreensão a respeito das relações entre os fatos e fenômenos. Por exemplo,sabe- se que o Chá de Marcela ajuda a aliviar a dor de estômago, no entanto, as pessoas desconhecem a composição química da erva, as dosagens corretas e possíveis efeitos colaterais (KÖCHE, 2013). O senso comum é um tipo de conhecimento superficial e subjetivo relacionado com as crenças e convicções pessoais, subordinado ao envolvimento afetivo e emotivo, incapaz de ser submetido à crítica isenta de interpretações pessoais. Sua linguagem não é especializada, apresenta conceitos e termos vagos que não são previamente definidos pelos sujeitos, não são claros e podem variar de um contexto para outro, adquirindo diferentes significados a partir das pessoas e grupos que os utilizam. Em resumo, esse conhecimento é empírico e assistemático, desenvolve-se naturalmente à medida que a vida acontece, é passado de geração em geração e leva em consideração as experiências de vida das pessoas (KÖCHE, 2013). Por sua vez, o conhecimento científico emerge na tentativa do homem de otimizar sua racionalidade ao “[...] propor uma forma sistemática, metódica e crítica da sua função de desvelar o mundo, compreendê-lo, explicá-lo e domina-lo.” (KÖCHE, 2013, p. 29). Esse conhecimento vai além da resolução de problemas de ordem prática, pois o homem deseja compreender a cadeia de relações existentes entre os fatos e fenômenos, conhecendo, assim, seus princípios explicativos (por que e como). O conhecimento é considerado científico quando segue o método científico, isso pressupõe um “[...] procedimento de passos e rotinas específicas que indica como a ciência deve ser feita para ser ciência.” (KÖCHE, 2013, p. 34), apresentando ideais de objetividade e racionalidade. Durante seu processo de construção é preciso se fundamentar em conceitos, teorias e leis, ao mesmo tempo, é necessário demostrar o caminho para sua obtenção. O conhecimento científico é revisado pelos pares através de uma avaliação crítica intersubjetiva, ao mesmo tempo em que seus enunciados podem ser testados através Métodos e Técnicas de Pesquisa 19 de experimentos. Esse conhecimento apresenta uma linguagem especializada entre os membros da comunidade científica, isso significa que seus conceitos devem ser coesos e universais para todos que pertencem a uma mesma especialidade científica (KÖCHE, 2013). Em resumo, o conhecimento científico caracteriza-se por ser sistemático, universal (generalizável), verificável, falível, hipotético e aproximadamente exato (MARCONI; LAKATOS, 2011). Assim, o conhecimento científico tenta se aproximar de uma verdade, mas reconhece suas limitações e está em constante transformação, uma vez que a cada nova pesquisa novos conhecimentos são gerados, ocasionando uma revisão e acréscimo no fundo coletivo de saberes existente. Santos (1989) esclarece que o conhecimento científico não surgiu espontaneamente, mas sim como uma tentativa para atestar o que é racional e verdadeiro. Para o conhecimento possuir um caráter científico, esse deve ser produzido a partir de uma metodologia, amparado por um arcabouço teórico, no qual estão presentes as teorias que sustentaram o processo de pesquisa, descritas as etapas de pesquisa, explanados seus objetivos e resultados. O que confere cientificidade ao conhecimento é a aceitação da comunidade científica. A avaliação e o reconhecimento dos pares são fundamentais nesse processo. Para fortalecer as diferenças entre senso comum e conhecimento científico, vejamos o Quadro 1, no qual há uma comparação das características desses dois conhecimentos. Quadro 1 - Senso comum x conhecimento científico Senso comum ou conhecimento popular Conhecimento científico Valorativo Reflexivo Assistemático Verificável Falível Inexato Real (factual) Contingente Sistemático Verificável Falível Aproximadamente exato Fonte: adaptado de Marconi e Lakatos (2011, p. 18 apud TRUJILLO, 1974, p. 11). Acabamos de abordar dois tipos de conhecimento que são de interesse especial do componente curricular de Métodos e Técnicas de Pesquisa, mas, além desses, podemos citar o conhecimento filosófico e o religioso que foram apresentados no componente curricular de Iniciação Científica. Métodos e Técnicas de Pesquisa20 Diferenciado o conhecimento científico de senso comum, a seguir apresentamos uma classificação geral da ciência, visto que as diversas áreas e especialidades do saber se constituíram em torno de objeto de estudo ou tema. 5 A CLASSIFICAÇÃO DA CIÊNCIA A ciência é composta por diversos ramos de estudo e especialidades, nesse sentido, podemos classificar a ciência de acordo com a sua complexidade e conteúdo: objeto/tema, diferenças de enunciados e metodologia. Essa necessidade de classificar a ciência decorreu da complexidade do universo e da variedade de fenômenos que nele se manifestam, relacionados ao interesse do homem em estudá-los, entendê-los e explica-los (MARCONI; LAKATOS, 2011). De maneira geral, as ciências podem ser classificadas em duas grandes categorias, formal e factual, e a partir dessas podem ser subdivididas em subcategorias, conforme apresentado na Figura 1. Figura 1 - Classificação da ciência CIÊNCIAS FORMAIS FACTUAIS LÓGICA MATEMÁTICA NATURAIS SOCIAIS Física Química Biologia Antropologia Direito Economia Política Sociologia Psciologia Fonte: Marconi e Lakatos (2011, p. 28). Saiba mais Para relembrar das características inerentes aos tipos de conhecimento assista à videoaula ministrada pela Professora Dra. Cristina Pátaro, que pontua as particularidades de cada tipo de conhecimento: https://www.youtube.com/watch?v=QbwdHHfAOS0. Métodos e Técnicas de Pesquisa 21 A principal característica que distingue as ciências reside no seu objeto de estudo, as ciências formais se voltam para o estudo das ideias, enquanto as ciências factuais se voltam para o estudo dos fatos. Enquadradas como ciência formal, a lógica e a matemática são abstratas, estão na mente humana em um nível conceitual, isso impossibilita a experimentação e validação de suas fórmulas. Em contrapartida, a Física e a Sociologia são ciências factuais, pois lidam com os fatos que ocorrem no mundo, passíveis de experimento e observação na comprovação de suas fórmulas, sendo possível teste de hipóteses (MARCONI; LAKATOS, 2011). Colaborando com essa classificação, Barros e Lehfeld (2000) explicam que as ciências formais utilizam do método dedutivo e, como dito anteriormente, seus objetos de estudo são ideias, imagens mentais, correspondentes às simbologias. Nesse sentido, nada é factual, concreto, experimental e tampouco se utiliza da observação. Por sua vez, as ciências factuais utilizam o método indutivo e seus objetos de estudo são os fatos, processos que se referem às causas naturais e humanas, no qual é possível fazer a experimentação e observação. Essa divisão da ciência leva em consideração alguns aspectos demonstrados no Quadro 2. Quadro 2 - Aspectos relacionados à divisão em ciências formais e factuais ITEM FORMAL FACTUAL Objeto ou tema Enunciados baseados em entidades abstratas Objetos empíricos fenômenos naturais, coisas e processos Enunciados Relações entre símbolos R e l a ç õ e s e n t r e e n t e s , fenômenos, fatos Método de comprovar enunciados Uso da lógica dedutiva para demonstrar seus teoremas Dedução : coe rênc ia do enunciado com um sistema previamente aceito. Não usa Indução Necessita da observação e/ou da experimentação. Manipulação deliberada dos fenômenos e objetos para verificar os fatos. Usa a Indução Grau de suficiência em relação ao conteúdo e ao método de prova Suficiente quanto ao conteúdo e aos métodos de prova Seu conteúdo depende de fatos. Utiliza experimentação (ou observação) para assegurar a validade de suas hipóteses Grau de coerência para alcançar a verdade Coerência do enunciado com um sistema prévio de ideias. A verdade não é absoluta, mas sim relativa ao sistema previamente admiti do. Ex.: geometria euclidiana e não euclidianas A coerência com umsistema previamente aceito é necessária mas não suficiente. A estrutura lógica não é suficiente para garantir a verdade. A experiência garante a verdade sem excluir a possibilidade de que esta possa ser melhorada com a evolução do conhecimento Métodos e Técnicas de Pesquisa22 Resultado alcançado Demonstração ou prova, completa e definitiva Verif icação de hipóteses comprovando ou refutando- as. As hipóteses, comprovadas são provisórias. A verificação é incompleta e, portanto, não definitiva Fonte: adaptado de Marconi e Lakatos (2011). Nesse contexto de classificação, a Biblioteconomia é considerada uma Ciência Social. Contudo, se considerarmos a classificação de áreas do conhecimento adotada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) a Biblioteconomia pertence à grande Área de Ciências Sociais Aplicadas I, estando vinculada à área da Ciência da Informação (CAPES, 2016). Em resumo, os bibliotecários em suas pesquisas científicas tratam de processos e fatos sociais passíveis de observação e experimentação, podendo, assim, formular ou rejeitar hipóteses de pesquisa. 6 O DESENVOLVIMENTO DA CIÊNCIA E AS RELAÇÕES DE PODER ENTRE AGENTES CIENTÍFICOS NA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO Apresentado o conceito de ciência é necessário abordar como a ciência se desenvolve e como se processam as relações entre os cientistas no processo de construção do conhecimento científico. Para tanto, buscamos fundamentação no filósofo do conhecimento, Thomas Kuhn (2009) e no sociólogo da ciência, Pierre Bourdieu (1983; 2004). Ao escrever A estrutura das revoluções científicas, em 1962, o físico Thomas Kuhn apresenta conceitos-chave no entendimento do que é ciência e como ocorrem as transformações científicas. Segundo o autor, o progresso da ciência não acontece com o acúmulo do conhecimento, mas por processos de revolução que representam transformações e mudanças no modo de fazer ciência, assim, os cientistas são levados a rever suas práticas, teorias e problemas de pesquisa. Nesse contexto, propõe a noção de paradigma que norteia o entendimento de ciência, pois são “[...] as realizações científicas universalmente conhecidas que, durante algum tempo, fornecem problemas e soluções modelares para uma comunidade de praticantes de uma ciência.” (KUHN, 2009, p. 13). Os paradigmas compreendem os valores, crenças e modelos compartilhados entre os membros de uma comunidade científica, este perde sua relevância quando não consegue mais responder ou solucionar problemas de pesquisa (KUHN, 2009). As comunidades científicas organizam-se em torno de um paradigma, pois é esse que determina qual o objeto de estudo das pesquisas, quais as teorias e técnicas empregadas, como também define os problemas a serem discutidos. O que aproxima os membros da comunidade (cientistas/pesquisadores) são suas afinidades de pesquisa, interesses e objetivos em comum. Situados em um mesmo contexto, Métodos e Técnicas de Pesquisa 23 familiarizados com os mesmos fenômenos e objetos sua linguagem evolui para um patamar especializado que só é compreendido dentro do limite de cada grupo, pois receberam formação similar e absorveram a mesma literatura (KUHN, 2009). Nesse sentido, os paradigmas governam as práticas científicas e apresentam uma relação direta com o desenvolvimento científico. A ciência se desenvolve por diferentes momentos, no qual velhos paradigmas deixam de vigorar e surgem novos paradigmas que alteram a maneira do cientista perceber os objetos e fenômenos, influenciando o modo de produzir conhecimento. Em consequência disso, ocorrem períodos de ciência normal e períodos de ciência extraordinária (KUHN, 2009). Os períodos denominados de ciência normal não apresentam novidades e descobertas, neles os cientistas estão em sua zona de conforto, desenvolvem suas pesquisas com base em conhecimentos já existentes e, assim, articulam fenômenos e teorias fornecidos pelo paradigma vigente, refletindo e reafirmando o que já se conhece. Os livros constituem os manuais da ciência normal, já que definem e expressam teorias, problemas e métodos de um campo e reforçam o paradigma vigente. Portanto, a ciência normal “[...] significa a pesquisa firmemente baseada em uma ou mais realizações científicas passadas. Essas realizações são reconhecidas durante algum tempo por alguma comunidade científica específica.” (KUHN, 2009, p. 13). Para dar início ao período de ciência extraordinária é preciso a constatação de anomalias, essa provoca uma crise no paradigma existente. Quando uma pesquisa normal não atinge os resultados esperados, isso significa que existe algo de errado que o paradigma existente não dá conta de amparar. Instaurada a crise, um novo paradigma emerge e os pesquisadores passam a adotar novas teorias e renunciam às velhas. As crises abrem caminho para as revoluções científicas, o que Kuhn (2009, p. 125) chama de “[...] episódios de desenvolvimento não cumulativo, nos quais o paradigma mais antigo é total ou parcialmente substituído por um novo, incompatível com o anterior.” O sentimento de funcionamento defeituoso ocasionado pelo paradigma antigo é um pré-requisito para a revolução, esse sentimento é crescente e inicialmente pertence a uma pequena subdivisão da comunidade científica. Ao se adotar um novo paradigma é possível observar um novo mundo, são aceitos novos instrumentos e os olhares são orientados para novas direções. Em meio às revoluções científicas, os cientistas veem coisas novas e diferentes que antes não conseguiam observar devido ao antigo paradigma. Esse período é constituído de ciência extraordinária, no qual se observa uma concorrência entre os paradigmas, assim, a adoção de um novo paradigma pode até conceber uma nova área ou ciência. De forma geral, o que Kuhn (2009) afirma é que a ciência é formada por momentos distintos, caracterizados pela alternância entre ciência normal e ciência extraordinária, no que se referem aos paradigmas, eles governam e modulam as comunidades científicas e suas práticas. A adoção de um novo paradigma influi em mudanças teóricas e práticas, aspectos esses que caracterizam um campo científico. Demonstrada essa noção de desenvolvimento da ciência sob um prisma da filosofia do conhecimento, a seguir veremos que as práticas científicas desempenhadas pelos pesquisadores na construção do conhecimento científico são camufladas Métodos e Técnicas de Pesquisa24 de interesses. Assim, as escolhas dos temas de pesquisa, as técnicas de pesquisa empregadas e as publicações dos resultados das pesquisas refletem estratégias adotadas para aumentar o capital científico dos cientistas/pesquisadores, quando esses detêm prestígio e capital científico significativo passam a ser dominantes em suas áreas, influenciando os demais pares. O sociólogo Pierre Bourdieu (1984) apresenta a noção de campo científico como sendo um espaço de concorrência e disputa entre os cientistas na busca pela autoridade científica, que é definida pela capacidade técnica e poder social dos cientistas. Nessa concepção, a ciência está relacionada com a luta de poderes no meio acadêmico diante da busca pelo reconhecimento científico. O foco da questão não é o cientista singular, mas o campo científico com base nas relações de concorrência que nele se manifestam. No campo científico estão inseridos os cientistas/pesquisadores de diversos níveis e instituições científicas (universidades, associações científicas e instituições de fomento) que juntos constituem, produzem, fomentam e difundem a ciência. Neste campo existem pesquisadores dominantes e cientistas dominados, “[...] os dominantes são aqueles que conseguem impor uma definição da ciência segundo a qual a realização mais perfeita consiste em ter, ser e fazer aquilo que eles têm, são e fazem.” (BOURDIEU, 1983, p. 128). Os pesquisadores dominantes orientam a dinâmica do campo ao indicar o que deve ser pesquisado, onde devem ser publicados os resultadosde pesquisa e quais os objetos de interesse que merecem ser investigados. Na maioria das vezes os pesquisadores dominantes se caracterizam por apresentar um volume expressivo de publicações (livros, artigos), em consequência disso podem ser os autores mais citados em suas respectivas áreas, ou seja, suas ideias e teorias são utilizadas e aceitas como importantes pelos demais cientistas. Em contrapartida, os dominados podem ser considerados como os pesquisadores iniciantes que ainda não possuem um histórico e representatividade pelo pouco tempo de atuação ou pesquisadores com pouca expressividade na área, visto que suas ideias, conceitos e teorias não são bem aceitos pelos demais pares, como fruto disso, enfrentam dificuldades para publicar seus trabalhos e disseminá-los. A relação dominante e dominado tem como base a estrutura do campo, sendo determinada pela distribuição do capital científico, nesse os agentes (pesquisadores e instituições de fomento) caracterizados pelo seu volume de capital determinam como serão distribuídas as posições entre eles. “A estrutura do campo científico se define, a cada momento, pelo estado das relações de força entre os protagonistas em luta, agentes ou instituições, isto é, pela estrutura da distribuição do capital específico [...].” (BOURDIEU, 1983, p. 133). No domínio da pesquisa científica são os agentes que fazem seus os objetos de interesse: [...] os pesquisadores ou as pesquisas dominantes definem o que é, num dado momento do tempo, o conjunto de objetos importantes, isto é, o conjunto das questões que importam para os pesquisadores, sobre as quais eles vão concentrar seus esforços e, se assim posso dizer, compensar determinando uma concentração de esforços de pesquisa. (BOURDIEU, 2004, p. 25). Métodos e Técnicas de Pesquisa 25 O campo científico, segundo Bourdieu (1996, p. 159), exige daqueles que estão nele envolvidos um saber prático das leis de funcionamento desse universo, isto é, “[...] um habitus adquirido pela socialização prévia e/ou por aquela que é praticada no próprio campo.” O habitus funciona como um manual de condutas, permitindo aos participantes do campo científico ter a dimensão do que podem fazer e o que deve ser feito no campo. No geral, todas as práticas científicas estão dirigidas para a obtenção da autoridade científica que se reverte em capital científico. O interesse pela atividade científica apresenta aspectos intrínsecos e extrínsecos, pois não basta uma pesquisa ser atraente e importante somente para quem a realiza, é necessário que ela chame a atenção dos pares e seja reconhecida como importante. Assim, os esforços científicos se organizam tendo por base o que vai proporcionar lucro simbólico, buscam solução para problemas considerados como os mais pertinentes pela comunidade (BOURDIEU, 1983). O capital científico é um poder simbólico, esse se relaciona com o status proporcionado pelos atos de conhecimento e reconhecimento capazes de manipular os meios constitutivos do campo. O reconhecimento consiste nos créditos que uma determinada comunidade de pesquisadores atribui a um cientista pelos seus feitos (BOURDIEU, 2004). Não existe ciência neutra, há sempre interesses envolvidos no desenvolvimento das pesquisas. Segundo Bourdieu (2004, p. 35), “[...] os campos são o lugar de duas formas de poder que correspondem a duas espécies de capital científico [...]”: o poder temporal (político) e o poder específico (prestígio). O primeiro, como seu próprio nome infere, se relaciona com a ocupação de posições representativas nas instituições, tais como: direções de laboratórios, de departamentos, nomeação para comissões etc. O segundo poder é mais independente, está relacionado com o reconhecimento científico proveniente dos pares. Esses dois tipos de capital apresentam leis de acumulação bem distintas: “O capital científico puro adquire-se, principalmente, pelas contribuições reconhecidas ao progresso da ciência, as invenções ou as descobertas.” (BOURDIEU, 2004, p. 36). Um exemplo é a publicação de um artigo em uma revista renomada, respeitada. Já o capital institucionalizado (temporal) é constituído e fortalecido com o tempo, sua aquisição ocorre basicamente por “[...] estratégias políticas (específicas) [...] participação em comissões, bancas (de teses, de concursos), colóquios mais ou menos convencionais no plano científico, cerimonias, reuniões.” (BOURDIEU, 2004, p. 36). O capital científico está no cerne da disputa dos agentes, o capital denota poder e quanto mais se acumula capital mais domínio se exerce sobre o campo científico. Quanto mais capital um cientista acumular mais propriedade esse tem para definir o que é válido ou não em sua área (BOURDIEU, 2004). Na visão de Bourdieu (1983), acreditar na neutralidade genuína dos agentes científicos seria ilusão, o campo é um ambiente de disputa, no qual o cientista que conseguir acumular mais capital científico tem o poder de influenciar todo o campo, sendo facultada competência para agir e falar. Essa hegemonia implica em um estado no qual as novas ideias e concepções são analisadas constantemente e contidas quando Métodos e Técnicas de Pesquisa26 ameaçam os dominantes. Os pesquisadores dominantes visam manter a estrutura do campo a seu favor, suas decisões vão estar pautadas em estratégias políticas e não na noção do bem-estar coletivo dos demais pesquisadores. Aos dominados resta reivindicar e lutar por mais espaço, na medida em que aumentarem seu capital científico e político poderão alterar as estruturas do campo. Síntese Vimos que ciência é uma atividade social desenvolvida por cientistas na tentativa de desvendar, compreender e explicar os fenômenos da natureza e da sociedade. Como produto dessa atividade científica temos a produção do conhecimento científico que se difere do senso comum, tais conhecimentos se aplicam em diferentes contextos. A ciência e, respectivamente, o conhecimento científico são caracterizados como um conhecimento objetivo racional, sistemático, geral, verificável e falível. Ambos se constituem por meio de uma rede universal de saberes que se interliga e se renova diante do acréscimo cognitivo resultante de cada nova pesquisa realizada. Observamos que a concepção de ciência ao longo dos séculos esteve atrelada ao método científico, ou seja, os critérios adotados para considerar o que é digno de ciência e não ciência. Em relação à divisão da ciência, essa pode ser dividida em duas grandes categorias, ciência formal e factual, sendo que a Biblioteconomia integra o grupo das ciências sociais, pertence especificamente à área de Ciência da Informação. Demonstramos num contexto geral como ocorre o desenvolvimento da ciência, destacando a importância dos paradigmas na configuração das comunidades científicas e, respectivamente, sua influência sobre a formação e prática dos cientistas. Contextualizamos as relações de poder travadas entre os cientistas na construção do conhecimento diante da busca pela autoridade/ reconhecimento científico. A ideia de neutralidade na ciência fica fragilizada, pois todas as ações desempenhadas pelos cientistas são motivadas por interesses que implicam na adoção de estratégias que objetivam aumentar o capital científico dos pesquisadores. Métodos e Técnicas de Pesquisa 27 REFERÊNCIAS ANDER-EGG, E. Introducción a las técnicas de investigación social: para trabajadores sociales. 7. ed. Buenos Aires: Humanitas, 1978. BARROS, A. J. da S.; LEHFELD, N. A. de S. Fundamentos de metodologia científica: um guia para a iniciação científica. 2. ed. São Paulo: Pearson Education, 2000. BOURDIEU, P. O campo científico. In: ORTIZ, R. (Org.) Sociologia. São Paulo (SP): Ática, 1983. ______. Razões práticas: sobre a teoria da ação. Campinas: Papirus, 1996. ______. Os usos sociais da ciência: por uma sociologia clínica do campo científico. São Paulo: Editora UNESP, 2004. BURKE, P. Uma história social do conhecimento: de Gutenberga Diderot. Rio de Janeiro: Zahar, 2003. CAPES. Tabela de áreas do conhecimento. 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Métodos e Técnicas de Pesquisa 29 Anotações ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ _______________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 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________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ Unidade 2 Pesquisa, suas Classificações e o Método Científico Objetivo: • Compreender a noção de pesquisa e de método científico; • Caracterizar as pesquisas de acordo com objetivos, abordagens e técnicas; • Apresentar os métodos de abordagem e de procedimentos empregados na investigação científica; • Espera-se que o aluno compreenda as noções de pesquisa e método científico, sendo capaz de caracterizar as pesquisas diante de seus objetivos, abordagens, métodos e técnicas. Conteúdo programático: • Pesquisa básica, pesquisa aplicada; • Pesquisa qualitativa, pesquisa quantitativa, quali-quantitativa; • Pesquisa exploratória, pesquisa descritiva, pesquisa explicativa; • Técnicas de pesquisa: bibliográfica, documental, experimental, levantamento, estudo de caso, ex-post-facto, pesquisa-ação e participante; • Método Dedutivo, Método indutivo, Método Hipotético-Dedutivo, Método Dialético, Método Fenomenológico; • Método Histórico, Método Comparativo, Método Monográfico, Método Estatístico, Método Tipológico, Método Funcionalista,Método Estruturalista, Método Experimental, Método Observacional, Método Clínico. Métodos e Técnicas de Pesquisa32 Faça aqui seu planejamento de estudos Métodos e Técnicas de Pesquisa 33 1 INTRODUÇÃO Nesta unidade apresentamos a noção de pesquisa científica que denota um processo de investigação resultante de uma dúvida ou da necessidade de resolver um problema. A finalidade da pesquisa é encontrar soluções e respostas as questões que deram início à investigação, no seu fazer se utilizam de pressupostos científicos e principalmente do método científico. Frequentemente fazemos pesquisas, mas nem todas podem ser categorizadas como científicas, para se enquadrar nesse nível, é necessário haver um problema significativo, objetivos, justificativa, metodologia, fundamentação teórica, coleta de dados, análise e discussão dos resultados e pôr fim à divulgação da pesquisa perante demais pesquisadores. Então, o simples levantamento de informações para dirimir dúvidas não chega a ser uma pesquisa científica, uma vez que não é uma atividade complexa. No que se refere à classificação das pesquisas, veremos que elas são classificadas conforme a sua finalidade, de acordo com os objetivos, abordagem do problema e procedimentos técnicos empregados na investigação. Além disso, ressaltamos que o método científico é fundamental na construção do conhecimento, pois demonstra as operações mentais e técnicas seguidas no processo da pesquisa, por meio do método é possível a verificação. O método contempla tanto etapas mais abstratas da pesquisa como a formulação do problema, hipóteses, assim como partes mais concretas que envolvem a aplicação de procedimentos na coleta de dados. Esperamos que no final desta unidade você entenda o que é pesquisa e suas classificações, percebendo a importância do método na investigação dos fenômenos naturais e sociais. 2 O QUE É PESQUISA? A noção de pesquisa que é apresentada nesta unidade faz referência às atividades desenvolvidas por pesquisadores/cientistas na busca e construção do conhecimento científico, essa atividade visa sanar dúvidas e resolver problemas de ordem científica que se colocam diariamente na vida das pessoas. A pesquisa é motivada pela vontade de conhecer, de saber mais sobre um fato, fenômeno ou objeto. Tradicionalmente as pesquisas científicas são realizadas nas Universidades, nas Instituições de Ensino Superior, nos Centros e Institutos de Pesquisas, tais instituições possuem um quadro profissional qualificado (mestres e doutores) e infraestrutura adequada, incluindo laboratórios, bibliotecas e tecnologias que amparam esse processo. As pesquisas buscam explorar os fenômenos da natureza e atender às necessidades humanas. Como resultado, geram produtos científicos: livros, artigos, dissertações, teses, relatórios de pesquisa etc. Métodos e Técnicas de Pesquisa34 Dependendo da natureza da pesquisa é possível perceber a aplicação do conhecimento gerado, por exemplo, quando se desenvolve um medicamento ou tratamento de saúde. Nesse caso, o conhecimento científico é utilizado na resolução de um problema concreto pelo qual muitas pessoas enfrentam. Saiba mais Vejamos uma matéria que aborda o desenvolvimento de uma vacina contra o vírus da Zika: Butantan fecha parceria com EUA para desenvolver vacina de zika Instituto receberá US$ 3 milhões de órgão do governo americano. Parceria é para desenvolvimento de vacina com vírus inativado. Mariana Lenharo Do G1, em São Paulo O Instituto Butantan fechou, nesta sexta-feira (24), uma parceria com os Estados Unidos e com a Organização Mundial da Saúde (OMS) para o desenvolvimento de uma vacina contra o vírus da zika. O centro de pesquisa brasileiro deve receber US$ 3 milhões da Autoridade de Desenvolvimento e Pesquisa Biomédica Avançada (Barda, na sigla em inglês), órgão ligado ao Departamento de Saúde e Serviços Humanos do governo americano (HHS), para o desenvolvimento de uma vacina de zika com vírus inativado. O HHS é o órgão equivalente ao Ministério da Saúde dos EUA. O investimento faz parte de um acordo já existente entre a Barda e a OMS. Além dos US$ 3 milhões provenientes do órgão americano, a OMS também destinará doações de outros países e organizações privadas para o expandir a capacidade de produção de vacinas do Instituto Butantan. Com o dinheiro, o Butantan poderá comprar equipamentos de laboratório, reagentes, linhagens de células e outros recursos necessários para o desenvolvimento e produção da vacina de zika. A parceria também inclui a cooperação técnica entre pesquisadores da Barda e do Butantan. A expectativa é que a vacina esteja pronta para testes em humanos no primeiro semestre de 2017. Vacina de vírus inativado Segundo o diretor do Instituto Butantan, Jorge Kalil, o desenvolvimento da vacina de vírus inativado contra zika já está em desenvolvimento há alguns meses. Pesquisadores do centro já trabalharam no processo de cultura, purificação e inativação do vírus em laboratório. Na fase atual, roedores devem começar a receber os vírus inativados. O Butantan tem ainda outras três iniciativas de desenvolvimento de vacina contra zika: uma vacina a base de DNA, outra vacina com vírus inativado semelhante à vacina da dengue, além de uma vacina híbrida que tem como base a vacina de sarampo. Métodos e Técnicas de Pesquisa 35 “A resposta tem que ser rápida ou o dano vai estar feito e deixará um legado terrível: as crianças com microcefalia”, diz Kalil. Segundo o diretor, esse desenvolvimento ocorreria de forma mais rápida se houvesse mais recursos disponível. Em fevereiro, o governo federal anunciou um investimento de R$ 8,5 milhões para financiar o desenvolvimento de pesquisas relacionadas à zika no Instituto Butantan. Mas, segundo Kalil, o recurso ainda não foi liberado. Vírus já circula em 61 países Em fevereiro, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou o vírus da zika como emergência de saúde pública global. O vírus foi associado à microcefalia, uma malformação congênita. De acordo com boletim da OMS divulgado na semana passada, 61 países e territórios já registram transmissão continuada do vírus da zika. Além disso, outros 10 países tiveram relato de transmissão de zika de indivíduo para indivíduo, provavelmente por via sexual. O Brasil é o país onde o vírus está mais disseminado, com mais casos de infecção pelo vírus e de microcefalia associada à zika. O país teve 138.108 casos prováveis de zika em 2016 até o dia 7 de maio, segundo o Ministério da Saúde. Em 2016, o país registrou uma morte causada pela doença em um adulto no Rio de Janeiro e, no ano passado, foram 3 mortes de adultos. Ainda segundo a pasta, são 1.616 casos confirmados de microcefalia desde o início das investigações, em 22 de outubro, até 11 de junho, com 73 mortes de bebês. Fonte: Portal de Notícias G1. 27/06/2016 09h39, atualizado em 27/06/2016 11h10. Disponível em: http://g1.globo.com/bemestar/noticia/2016/06/butantan-fecha- parceria-com-eua-para-desenvolver-vacina-de-zika.html. Para desenvolver a vacina foi necessário fazer pesquisa científica, usar e aplicar conhecimentos existentes sobre o assunto, como também submeter a vacina a experimentos e testes que validassem a sua eficácia. A necessidade de fazer a vacina partiu de um problema social e os cientistas/pesquisadores foram levados a propor uma solução. Então, a pesquisa científica está direcionada a propor respostas, gerar conhecimentos que contribuam na solução de problemas no âmbito prático ou teórico. A seguir apresentamos alguns conceitos de pesquisa científica, observamos que os autores citados possuem concepções similares ao ressaltar a adoção de procedimentos racionais, a utilização dos métodos científicos, a avaliação por pares e a publicação dos resultados obtidos nas pesquisas. De forma genérica, pesquisa é a atividade que visa descobrir respostas a algum tipo de indagação, atesta Volpato (2007). Por sua vez, a pesquisa científica é atividade que utiliza
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