Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Organizadores: Antonio Rodrigues Ferreira Júnior Ana Nery de Castro Feitosa AVANÇOS E DESAFIOS PARA A SAÚDE E COLETIVIDADE NA CONTEMPORANEIDADE AVANÇOS E DESAFIOS PARA A SAÚDE E COLETIVIDADE NA CONTEMPORANEIDADE Antonio Rodrigues Ferreira Júnior Ana Nery de Castro Feitosa (Organizadores) AVANÇOS E DESAFIOS PARA A SAÚDE E COLETIVIDADE NA CONTEMPORANEIDADE 1ª Edição Quipá Editora 2020 Copyright © dos autores e autoras. Todos os direitos reservados. Esta obra é publicada em acesso aberto. O conteúdo dos capítulos, os dados apresentados, bem como a revisão ortográfica e gramatical, são de responsabilidade de seus autores, detentores de todos os Direitos Autorais, que permitem o download e o compartilhamento, com a devida atribuição de crédito, mas sem que seja possível alterar a obra, de nenhuma forma, ou utilizá-la para fins comerciais. CONSELHO EDITORIAL Editor-chefe: Me. Adriano Monteiro de Oliveira, Quipá Editora Dra. Anny Kariny Feitosa, Instituto Federal do Ceará (IFCE) / Dra. Elaine Carvalho de Lima, Instituto Federal do Amazonas (IFAM)/ Dra. Érica C. L. Machado, Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)/ Dra. Harine Matos Maciel, Instituto Federal do Ceará (IFCE) / Dra. Mônica Siqueira Damasceno, Instituto Federal do Ceará (IFCE). Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) ________________________________________________________________________ A946 ______________________________________________________________________ Elaborada por Rosana de Vasconcelos Sousa ― CRB-3/1409 Obra publicada pela Quipá Editora em dezembro de 2020. Avanços e desafios para a saúde e coletividade na contemporaneidade / Organizado por Antonio Rodrigues Ferreira Júnior e Ana Nery de Castro Feitosa. ― Fortaleza : Quipá Editora, 2020. 289 p. : il. ISBN 978-65-89091-14-1 DOI doi.org/10.36599/qped-ed1.013 1. Saúde coletiva. 2. Saúde pública. 3. Sistema Único de Saúde. I. Ferreira Júnior, Antonio Rodrigues. II. Feitosa, Ana Nery de Castro. III. Título. CDD 614 SUMÁRIO APRESENTAÇÃO........................................................................................10 CAPÍTULO 1..............................................................................................11 DESAFIOS E PERSPECTIVAS DA GESTÃO COLEGIADA DO SUS NO CEARÁ Josete Malheiro Tavares Carlos Garcia Filho CAPÍTULO 2.............................................................................................23 COLONIALISMOS E DESIGUALDADES SOCIAIS EM SAÚDE: O DIÁLOGO NECESSÁRIO ENTRE ANTROPOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA CRÍTICA LATINO AMERICANA Anaxsuell Fernando da Silva CAPÍTULO 3.............................................................................................35 ATUAÇÃO DA FISIOTERAPIA NA LINHA DE CUIDADO DO AVC – HOSPITAL REGIONAL DO CARIRI Maria Angela Lopes Pereira Pinheiro Suianne Ferreira Soares Alencar Lívia Maria dos Santos Landim Moisés Sampaio da Silva CAPÍTULO 4.............................................................................................46 ESPIRITUALIDADE E SUA INTERFACE COM A SAÚDE: UMA REVISÃO Adriano Monteiro de Oliveira CAPÍTULO 5.............................................................................................56 O IMPACTO DA CONSULTORIA EM FARMÁCIAS DE PEQUENO PORTE Thiáskara Yris de Souza Morais Renata Macêdo Leite João Henrique de Lima Silva Ana Balbina Gomes Silva CAPÍTULO 6..............................................................................................71 AS PESSOAS QUE VIVEM COM DIABETES E HIPERTENSÃO: O OLHAR DO ENFERMEIRO A PARTIR DA VISITA DOMICILIAR Mikaelly dos Santos Lima Ana Karoline Barros Bezerra Alexandra da Silva Lima Vieira Maria Rocineide Ferreira da Silva CAPÍTULO 7..............................................................................................87 ANÁLISE DOCUMENTAL DE PROJETOS POLÍTICOS PEDAGÓGICOS DE CURSOS DE GRADUAÇÃO SOBRE VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA A MULHER Francisca Alanny Rocha Aguiar Raimunda Magalhães da Silva Antonio Rodrigues Ferreira Júnior João Víctor Lira Dourado CAPÍTULO 8...........................................................................................108 PERSPECTIVAS DA FORMAÇÃO DO ENFERMEIRO E SUAS CONTRIBUIÇÕES PARA A COMPREENSÃO DA SAÚDE COLETIVA Daniele Keuly Martins da Silva Débora Pena Batista e Silva CAPÍTULO 9............................................................................................120 EDUCAÇÃO EM SAÚDE BUCAL: PLANEJAMENTO DE ESTRATÉGIAS PARA PREVENÇÃO DE CÁRIE EM CRIANÇAS NA ESCOLA Isabele Mendes Portella David Gomes Araújo Júnior Karina Oliveira de Mesquita Antonio Rodrigues Ferreira Júnior CAPÍTULO 10...........................................................................................138 HISTERIA OU PSICOSE: UM ESTUDO DE CASO SOBRE QUESTÕES DE DIAGNÓSTICO Lívia Lopes Custódio Rachel Marinho Aquino Cavalcanti Ilvana Lima Verde Gomes CAPÍTULO 11...........................................................................................154 PESQUISA SOBRE POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA NO CENTRO DE FORTALEZA: APRESENTANDO SEUS COSTUMES E COMPORTAMENTOS E NECESSIDADE DE POLÍTICAS PÚBLICAS Luciana Camila dos Santos Brandão Frei Nailson Antônio Neo da Silva Hellayne Viana Oliveira CAPÍTULO 12...........................................................................................165 QUEM SÃO E COMO PENSAM AS DOULAS QUE PARTICIPARAM DA CONVENÇÃO NACIONAL DAS DOULAS EM 2019 Luciana Camila dos Santos Brandão Morgana Eneile Tavares de Almeida Patrícia Lima Rodrigues Antonio Rodrigues Ferreira Júnior CAPÍTULO 13...........................................................................................181 PRINCIPAIS TRANSTORNOS ALIMENTARES DA INFÂNCIA E OS FATORES ASSOCIADOS Rodrigo Freitas da Costa Joseline Maria Alves Gomes Recamonde Nayara Aguiar Silva Ana Nery de Castro Feitosa CAPÍTULO 14...........................................................................................191 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SOBRE O CORAÇÃO E A CIRURGIA CARDÍACA: UM ESTUDO COM PACIENTES INTERNADOS EM HOSPITAIS GERAIS Thalita Saramago de Souza Pamela Staliano CAPÍTULO 15..........................................................................................203 PERFIL SOCIODEMOGRÁFICO DE MULHERES COM DEPRESSÃO PUERPERAL EM UM MUNICÍPIO DO CEARÁ Iana Freire Rodrigues Maria Eunice Nogueira Galeno Roberta Nunes Rosalice Araújo de Sousa Albuquerque CAPÍTULO 16..........................................................................................213 CONTRIBUIÇÕES DA PSICOMOTRICIDADE PARA A SAÚDE MENTAL DO IDOSO: REVISÃO DA LITERATURA Maria Silane Sousa e Silva CAPÍTULO 17..........................................................................................223 CÂNCER DE MAMA: O IMPACTO DO DIAGNÓSTICO E O APOIO MULTIDISCIPLINAR-FAMILIAR Maria Adey de Castro Feitosa José Kleidir de Castro Feitosa CAPÍTULO 18..........................................................................................237 A REGULAÇÃO EM SAÚDE E O ACESSO NO SUS Joana Gurgel Holanda Filha Josete Malheiro Tavares Geovana Maria Santana Malheiro Lucas Cavalcanti Lima Mônica Suely Paula da Silva Raimundo Ribeiro Lopes Neto CAPÍTULO 19..........................................................................................248 AURICULOTERAPIA: CONSULTAS DE ENFERMEIROS EM UM GRUPO TERAPÊUTICO DE APOIO AO LUTO Ana Karla Ramalho Paixão Ângela Maria Alves e Souza José Evangleyson de Paiva Girão Marilac Fernandes da Cruz CAPÍTULO 20..........................................................................................260 QUESTÃO SOCIAL E SAÚDE MENTAL NA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA: UM OLHAR SOBRE O CAPS INFANTIL III EM FORTALEZA/CE Grayceane Gomes da Silva Ana Célia Santiago CAPÍTULO 21..........................................................................................272GRUPO DE TERAPIA OCUPACIONAL EM PSICOGERIATRIA EM UM HOSPITAL GERAL: RELATO DE EXPERIÊNCIA Ana Nery de Castro Feitosa Francisca Gabriela Paiva Leitão Quézia Franco Uchoa da Silva SOBRE OS AUTORES.................................................................……………..278 ÍNDICE REMISSIVO APRESENTAÇÃO Este livro aborda estudos na área de saúde, buscando analisar os desafios e compreender os avanços para a coletividade, na contemporaneidade. Seus capítulos versam sobre temas variados, pois a ideia central era a de produzir um livro contendo conteúdos teórico- científicos de relevância e com multidisciplinaridade para a área da saúde. Deste modo, a obra aborda os desafios na gestão colegiada do Sistema Único de Saúde, no Estado do Ceará, sob a perspectiva de diferentes gestores, bem como apresenta diversos estudos em saúde mental, saúde bucal, gerontologia, dentre outros temas, que trazem contribuições importantes para o setor. A partir de olhares das mais variadas formações, médicos, enfermeiros, assistentes sociais, odontólogos, psicólogos, terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas, dentre outros profissionais, contribuíram com a construção desta coletânea, que traz à tona uma gama de pesquisas, que, ora reforçam ideias consolidadas, ora apresentam estudos originais, apontando alguns avanços e relatando dificuldades, mas sempre com o intuito de aprimorar a literatura da área, disponibilizando conhecimento sobre práticas, gestão, pesquisa e ensino em saúde. Desejamos uma excelente leitura a todos. Os organizadores. 10 CAPÍTULO 1 DESAFIOS E PERSPECTIVAS DA GESTÃO COLEGIADA DO SUS NO CEARÁ Josete Malheiro Tavares Carlos Garcia Filho RESUMO O presente trabalho retrata em parte a análise do discurso de atores vivos participantes do processo de construção da Gestão Colegiada do Sistema Único de Saúde-SUS. É parte importante de pesquisa realizada para a dissertação de mestrado do primeiro autor, que estudou a linha do tempo da Comissão Intergestores Bipartite do Ceará-CIB-CE. Abordagem de natureza qualitativa, com utilização de técnicas de imagem e áudio em entrevistas semiestruturadas, gravadas, observados os princípios de eticidade, tendo como objetivos analisar sob variados olhares a percepção da estruturação das instâncias de pactuação e implementação das políticas públicas de saúde, concomitante ao surgimento e efetivação do SUS. A amostra foi composta por um grupo de gestores e ex-gestores de representação da gestão estadual e dos municípios, através do Conselho das Secretarias Municipais de Saúde do Ceará- COSEMSCE, em diferentes cortes temporais, de atuação profissional e de gênero, para se obter um olhar plural, de modo a aferir como cada um enxerga os desafios futuros da gestão colegiada da saúde neste Estado. Palavras-Chaves: Sistema Único de Saúde, Gestão do SUS, Gestão Colegiada: Regionalização, Saúde Pública. INTRODUÇÃO A consolidação do Sistema Único de Saúde-SUS tem evidenciado desafios em todos os níveis, dentre eles, destaca-se a implantação dos mecanismos de gestão colegiada. Um olhar histórico, identificando os principais atores e eventos a partir da Comissão Intergestores Bipartite do Ceará-CIB-CE, revela-se oportuno para compreender como ocorrem as articulações e mediações técnicas, administrativas e políticas para efetivação da gestão colegiada da saúde. Ao propor o registro de entrevistas com personalidades que tiveram atuação estratégica e decisiva na gestão colegiada do SUS no Ceará, seja pela Secretaria de 11 Estado da Saúde-SESA, pelas Secretarias Municipais de Saúde-SMS ou pelo Conselho das Secretarias Municipais de Saúde do Ceará-COSEMS/CE, busca-se a compreensão do funcionamento das instâncias colegiadas. A descentralização política e administrativa do SUS se estabeleceu como uma das principais bandeiras da Reforma Sanitária Brasileira, no que se convencionou como o movimento contra hegemônico da centralidade representada pela estrutura do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social- INAMPS (MOREIRA; RIBEIRO; OUVERNEY, 2017). A redemocratização ensejou um movimento municipalista vigoroso. De 1990 a 2016 foram criados mais de 1000 municípios no Brasil (saindo de 4.491 para 5.570), um acréscimo da ordem de 24% de novos entes subnacionais incorporados ao pacto federativo com ampla autonomia política. Por vez, a grande maioria dos novos municípios não se originou com a capacidade de geração de renda e emprego, o que os levou a dependência do Governo Federal. No setor saúde, estas contradições ainda hoje não foram superadas, tornando-se um processo inacabado e de difícil sustentabilidade (MOREIRA; RIBEIRO; OUVERNEY, 2017). No caso específico do Ceará, observa-se um protagonismo da SESA seguido pelas SMS no desenvolvimento de instâncias de participação social e gestão colegiada da saúde fortalecendo, portanto o processo de descentralização e municipalização das políticas de saúde. O Conselho Estadual de Saúde-CESAU foi reformulado nos termos da nova legislação em 1989. Nesse mesmo ano, o COSEMS/CE foi instituído, por ocasião da 1ª Conferência Estadual de Saúde, realizada em Aracati, sendo incialmente denominado Conesems. Seu primeiro presidente foi o médico sanitarista Antônio Carlile de Holanda Lavor, um dos entrevistados nessa pesquisa. A CIB-CE foi instituída em 1993, quando houve a primeira reunião, durante a gestão da então Secretária de Estado da Saúde, Ana Maria Cavalcante e Silva, tendo a seguinte composição: três membros da gestão estadual e três da gestão municipal, cada integrante com respectivo suplente. Dentre os representantes da gestão estadual, José Alexandre Mont’Alverne, entrevistado nessa pesquisa, esteve presente por um longo período desde a primeira reunião. A representação dos municípios era liderada por Luis Odorico Monteiro de Andrade, também entrevistado nesse estudo, então presidente do Conesems e Raimundo Bezerra, Secretário de Saúde de Fortaleza. Esse artigo tem como objetivo analisar os desafios e perspectivas da gestão colegiada do SUS no Ceará a partir do olhar de atores que estiveram presentes nesse processo durante os últimos 25 anos. 12 MÉTODO Essa investigação com abordagem qualitativa utilizou como instrumentos para investigação: 1- aplicação de entrevistas semiestruturadas registradas em vídeo com quinze gestores e ex-gestores de saúde considerados relevantes para a compreensão da gestão colegiada em saúde no Ceará; e 2- pesquisa documental no arquivo de revistas Sustentação do COSEMS/CE para coleta de textos sobre a gestão colegiada no Ceará. A interpretação dos resultados foi realizada por meio da análise de discurso a partir das recomendações de Orlandi (2013), que sugere uma integração das abordagens nos planos da Psicanálise, da Linguística e da História, numa perspectiva crítica. A utilização de métodos visuais em pesquisa qualitativa é reconhecida por Prosser (2011) como uma tendência em crescimento na pesquisa qualitativa, principalmente após a década de 2000. O autor aponta a ubiquidade da imagem na contemporaneidade como um dos desafios para os pesquisadores, que devem buscar novas estratégias para compreender os fenômenos em uma sociedade que vem sendo dominada pela imagem em detrimento da linguagem verbal e textual. Nessa investigação, o registro das entrevistas em vídeo foi utilizado não apenas para aprofundar as possibilidades de análise do discurso dos sujeitos, agregando gestos e expressões faciais, mas, principalmente para ser a base do documentário Gestão Colegiada do SUS: a linha do tempo, disponível no site do COSEMS/CE. Participantes A seleção intencional dos participantes buscou incluir personagensque vivenciaram esse processo em diferentes recortes temporais nas três últimas décadas. A seleção buscou equilíbrio não apenas cronológico, mas também de posicionamento político, procurando estabelecer uma visão plural do processo investigado. O quadro 1 apresenta os personagens entrevistados e descreve sua formação de base e papéis institucionais desempenhados. Quadro 1 – Descrição dos personagens Nome Formação de Base Papel Institucional Atual Antônio Carlile de Holanda Lavor Médico Coordenação da FIOCRUZ-CE Henrique Jorge Javi de Físico Secretário da Saúde do Ceará 13 Sousa José Alexandre Mont’alverne Médico Servidor Estadual José Policarpo de Araújo Barbosa Médico Servidor Estadual Jurandi Frutuoso da Silva Médico Secretário Executivo do CONASS Leni Lúcia Leal Nobre Cirurgiã Dentista Docente Escola de Saúde Pública do Ceará Lilian Amorim Beltrão Médica Secretária Adjunta da SESA Luís Odorico Monteiro de Andrade Médico Deputado Federal Maria do Carmo Xavier Queiroz Terapeuta Ocupacional Secretária Executiva do COSEMS/CE Mario Lucio Martildes Ramalho Cirurgião Dentista Secretário Municipal de Saúde de Eusébio- CE Moacir Soares de Sousa Pedagogo Secretário Municipal de Saúde de Caucaia- CE Olímpia Maria de Azevedo Enfermeira Secretária Adjunta de Saúde de Pacatuba- CE Sayonara de Moura Cidade Fisioterapeuta Secretária Municipal de Saúde de Cedro- CE Vera Maria Câmara Coelho Economista Secretária Executiva da CIB-CE Wilames Freire Bezerra Cirurgião Dentista Secretário Municipal de Saúde de Pacatuba-CE Fonte: Elaborado pelos autores. Observa-se no quadro 1 que existe um equilíbrio quanto ao gênero dos entrevistados. Predominam os profissionais de saúde, principalmente médicos e dentistas, embora existam personagens com formação em economia, pedagogia e física. Entre as profissões da saúde, a maior quantidade de representantes concentra- se nas carreiras mais tradicionais. Os papéis institucionais desempenhados mostram que um mesmo ator pode circular por muitas das instituições envolvidas na gestão colegiada do SUS e assumir diferentes funções nela. Essa possibilidade, provavelmente, enriquece o repertório de seu discurso, pois, em sua história profissional, os personagens experimentaram diferentes pontos de vista e períodos históricos da gestão colegiada. Documentos O principal canal de comunicação mantido pelo COSEMS/CE é a revista Sustentação. Esse periódico, editado quadrimestral ou semestralmente, foi concebido com o propósito de contribuir para o fortalecimento da gestão do SUS no Ceará, divulgando para os gestores opiniões de especialistas em políticas e gestão em saúde e experiências municipais exitosas em saúde pública. 14 Procedimentos A primeira etapa da pesquisa foi a definição dos entrevistados, a realização dos convites para participação e o agendamento das entrevistas pelo pesquisador. A segunda etapa consistiu no registro em vídeo de cada entrevista. Essa etapa exigiu a mobilização de dois jornalistas profissionais para captação de áudio e imagens, incluindo apoio para iluminação adequada. Um dos pesquisadores conduziu as entrevistas por meio de três perguntas previamente estabelecidas e sugerindo que os personagens utilizassem até cinco minutos para responder cada uma delas. Não ocorreram interrupções dos entrevistados pelo pesquisador durante as gravações. Na terceira etapa, os autores buscaram textos relacionados à gestão colegiada do SUS no Ceará no arquivo de revistas Sustentação do COSEMS/CE. Inicialmente, o sumário de cada revista foi avaliado para busca de matérias sobre gestão colegiada. Esses textos foram fotocopiados e utilizados para constituir um corpus. Esse material foi utilizado como apoio para a discussão sobre a história da gestão colegiada. Dimensão ética O trabalho obedece à Resolução 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde-CNS. Essa pesquisa foi aprovada no Comitê de Ética em Pesquisa-CEP da UECE, por meio do Parecer Nº 2.335.640, de 18 de outubro de 2017, como também pelo Comitê de Ética em Pesquisa da SESA, por meio do Parecer nº 2.372.997 de 09 de novembro de 2017. Os participantes foram convidados a contribuir com essa investigação e, após anuência inicial, os procedimentos de pesquisa foram explicados de maneira pormenorizada e as dúvidas foram esclarecidas. Por fim, o participante assinou o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e Termo de Autorização do Uso de Imagem. RESULTADOS E DISCUSSÃO Para Shimizu et al. (2017) a gestão descentralizada da saúde conferiu aos municípios brasileiros maior protagonismo na ampliação do acesso aos serviços de saúde, principalmente na atenção básica e melhoria dos indicadores de saúde, embora persistam desigualdades de natureza políticas, técnicas, financeiras, que limitam ou inibem a autonomia local, tornando a descentralização um processo complexo e inacabado. 15 As relações intergovernamentais e a autonomia local são relacionadas à eleição de prioridades, descentralização de decisões e responsabilidades quanto a elaboração do planejamento, alocação de recursos nas regiões para os governos estaduais e municipais, delimitação de regiões de saúde compartilhando identidade cultural, econômica, social, comunicação, infraestrutura e transporte (RIBEIRO; TANAKA; DENIS, 2017). Bretas Júnior e Shimizu (2017) inscrevem governança regional em saúde como estratégia para estabelecer a cogestão intergovernamental nas regiões de saúde e o justo partilhamento de responsabilidades entre os entes federados, dentro do pacto federativo no Brasil. Desse modo, segundo Ribeiro, Tanaka e Denis (2017), a gestão colegiada da saúde reflete um tipo de governança pública, em que os agentes públicos trabalham coletivamente e de formas distintas, mediante processos, regras, e provisionamento de bens públicos, organizados numa rede regionalizada de atenção à saúde. Os agentes se reúnem periodicamente para a tomada de decisões, de modo multilateral, respeitando a autonomia e as responsabilidades de cada ente federado. O modelo vigente possui três níveis de gestão colegiada: regional, estadual e nacional. O esforço desenvolvido em cada uma dessas ambiências é conseguir algum grau de consenso e dividir as responsabilidades de modo solidário e compartilhado entre as esferas de governo. No contexto cearense, Goya (1996), em pesquisa realizada com apoio da então Associação dos Municípios do Ceará - AMECE, hoje denominada APRECE, e do Fundo das Nações Unidas para a Infância - UNICEF, assinala que mais de 170 municípios dos 178 existentes em 1987, sequer possuíam uma secretaria municipal de saúde. Fica evidente, portanto, a importância do movimento de descentralização da assistência e gestão da saúde ocorridos durante a década de 1990. Como a gestão colegiada do SUS pode enfrentar estes cenários de dificuldades, limitações e preservar a continuidade dos serviços de saúde prestados à população de modo continuado? Essas contradições foram motivadoras para realizar esta pesquisa e convergem com o sentimento expresso pelo CONASS: O gestor de saúde é, muitas vezes, uma figura solitária. A despeito da existência formal de estruturas administrativas que em tese deveriam prestar-lhe apoio e assegurar-lhe a necessária segurança técnica e jurídica para a tomada de decisão, o que se vê, no mais das vezes, é que as instâncias de apoio carecem de maior qualificação e os mecanismos de controle são falhos e frequentemente atrasados com relação à velocidade com que os fatos acontecem no âmbito da saúde. Assim, o exercício da gestão em saúde é, antes de tudo, um ato de coragem, pois implica no altíssimo risco de se ver destruído o patrimônio mais importante da vida de qualquer cidadão: seu nome, sua respeitabilidade, sua reputação. 16 Em suma, ser gestor implicaem participar de um projeto de governo como ator social envolvido no interesse coletivo; ter governabilidade (pacto social e sustentabilidade); ter capacidade de gestão (ser dirigente, mediador de interesses, executor e avaliador) (CONASS, 2016, p.133). O ano de 2016 encerrou com dois temas importantes sendo discutidos nas instâncias colegiadas do SUS: a reformulação da Política Nacional de Atenção Básica- PNAB e o chamado Caixa Único, um esforço concentrado das três esferas de governo que buscam simplificar o sistema de financiamento do SUS no país. Henrique Jorge Javi de Sousa, atual secretário de estado da saúde, descreve o quanto tem sido importante a história de estruturação da CIB no Ceará, destacando o nível de amadurecimento das discussões que são tratadas atualmente, sem deixar de reconhecer as muitas dificuldades a enfrentar, mas aludindo ao processo colaborativo estabelecido entre o estado e os municípios. Odorico Monteiro alerta que a experiência da gestão compartilhada sofre um esgotamento, não somente no Ceará, mas no Brasil, afirma que esse modelo é vítima do sucesso, apesar de reconhecer que o Brasil tem sido referência internacional por ter feito a descentralização política, administrativa e financeira do setor saúde e para isso as comissões intergestores foram extremamente importantes, embora muitas vezes não sejam geradas responsabilidades definidas. Aponta, como fragilidade, não haver um mecanismo de construção solidária, seja nas metas ou nos indicadores. As pactuações feitas estão muito mais ligadas ao orçamento do Ministério da Saúde e do Estado e como estes vão distribuir o dinheiro para o conjunto dos municípios, que é a grande base, seguida pelos estados que formam uma segunda base. Afirma que esse modelo estagnou e, se não houver uma mudança, poderá haver o que chama de “um apagão no processo de municipalização do SUS”. Salienta que as novas realidades demográfica, epidemiológica, de inovação e incorporação tecnológica na saúde, além do ativismo jurídico, sem uma gestão solidária da judicialização na saúde, poderão colocar o SUS em colapso. Como saída sugere transformar o Contrato Organizativo de Ação Pública-COAP em lei, pela qual a descentralização da saúde passaria a ser organizada, estruturada e apoiada com base em um contrato. Afirma que o modelo de CIT, de CIB e de CIR foi o modelo do século XX, e que ele teve um papel importante, só que o estado do século XXI é o estado contratual, diz, sendo necessário contratualizar as responsabilidades sanitárias, as responsabilidades do financiamento numa perspectiva ascendente, descente e oblíqua, sempre levando em conta as necessidades da população. Refere a autoria de outro projeto de lei, que trata do Plano Decenal da Saúde, proposta defendida para salvaguardar o SUS da instabilidade política e econômica, quando 17 lembra que ultimamente o Brasil teve um ministro da saúde por ano, sendo praticamente impossível dar sequência às políticas de saúde de modo continuado diante de tamanha fragilidade de ordem política e administrativa. Reconhecendo que no modelo atual foi muito importante nas últimas três décadas, mas não produziu definição clara das responsabilidades solidárias entres os entes federados, pelo que aponta o seu esgotamento e sugere sua reinvenção. Indaga qual é a responsabilidade solidária entre o secretário de estado, o governador e os prefeitos? Qual a responsabilidade solidária entre o presidente da república e os governadores? Defende que esse pacto seja assumido por prefeitos, governadores e pelo presidente da república de modo formal, assinado e com base num orçamento real, regido por lei específica. Moacir Soares retoma sua vivência acumulada na gestão colegiada para manifestar otimismo com o futuro. Aponta que os organismos representativos e colegiados do SUS continuarão tendo papel determinante por se basearem no exercício do contraditório e ser deste ambiente que emergem as melhores decisões, sobretudo no Ceará, que amadureceu na consolidação do SUS no esteio deste modelo. Para ele as instâncias colegiadas não retrocederão. Para Henrique Javi o pioneirismo aumenta a responsabilidade de o Ceará continuar na vanguarda. Relembra a assinatura do COAP como demonstração de maturidade do que foi construído até aqui. Como perspectiva de futuro, prega a necessidade de consolidar o fortalecimento adquirido para prevenir ataques ou o que chama de “falácias”. Para o entrevistado, não é toda instituição que tem a condição de reunir 184 municípios e o Estado do Ceará com debates importantes sobre o rumo do SUS de modo regular. Acredita também que, com condições de trabalho adequado, esse modelo produzirá bons resultados. Aponta a necessidade de melhor interação com a população para que esta perceba a importância que o SUS tem na vida das pessoas, em contraponto ao que chama de inverdades apontadas para o funcionamento inadequado ou falta de gestão na saúde. Conclui reconhecendo sempre haver necessidade de melhorias na gestão, mas faz a defesa do arcabouço estruturado da gestão colegiada no Ceará. Wilames Freire diz esperar uma maior interação entre a gestão e a academia, buscando identificar o que há de inovador para implantar novas políticas, novas formas de gestão, fortalecimento das regiões de saúde e aprimorar a implementação das ações e serviços de saúde. Para atingir esses objetivos considera necessário um maior empoderamento e fortalecimento das câmaras técnicas da CIB-CE. Na sua visão de futuro, espera ter capacidade de interpretação e se aproximar do que a academia está 18 produzindo de conhecimento, assim como trazer para o âmbito da CIB as incorporações tecnológicas e tirar proveito disso em favor do SUS. Jurandi Frutuoso alerta sobre as graves ameaças ao SUS numa “travessia” – política, econômica, financeira ou filosófica – na atual e complexa conjuntura nacional e enxerga, nas comissões bipartite, um espaço diferenciado com grande responsabilidade de canalizar energias e fazer discussões responsáveis para futuramente contribuir como mola propulsora que enfrente as questões nacionais. Reputa a CIB-CE como ambiente que pode contribuir muito com o SUS na perspectiva de um sistema único, equânime, eficiente e que atenda o conjunto a população brasileira. Alexandre Mont’Alverne diz que “o futuro se constrói no presente”. Por isso reforça que o atual gestor estadual não tem valorizado o suficiente a CIB-CE e diz que quanto mais crítico o problema, mais necessário é o debate e mais necessário é construir coletivamente as decisões. Defende, portanto, uma revisão dessa postura e sugere que os municípios insistam em garantir que as discussões ocorram nesta ambiência, sob pena de ocorrer um esvaziamento da CIB-CE e reitera que este colegiado não pode ser esvaziado, porque a gestão é predominantemente dos municípios. Remete a um olhar permanente sobre a atenção primária, que concentra parte importante dos recursos financeiros. Em sua opinião, parte da solução dos problemas está aí. Esse é o primeiro acesso da população ao SUS e alerta que não se faz gestão na saúde sem que todos os entes participem dela. Reconhece que o estado cresceu na prestação direta com a gestão dos hospitais terciários regionais, mas alerta que isso pode gerar uma falsa impressão de que se resolverem os problemas de suas unidades de saúde todos os problemas da atenção à saúde do Estado estarão resolvidos. Chama atenção para a necessidade de unir forças, dizendo que não se faz gestão num sistema complexo como o brasileiro sem que todos os entes participem dela, sobretudo num momento como o que se vive no país, onde o desfinanciamentoestá sendo agravado com o congelamento de gastos na saúde. Policarpo Barbosa, observa que numa câmara de gestão estão postos entes federados com interesses e problemas diferentes, que dialogam para um consenso. Afirma que esse modelo está consolidado e tende a ser aprofundado e valorizado. Maria do Carmo Xavier espera o fortalecimento contínuo da gestão colegiada, com aprimoramento técnico das equipes gestoras dos municípios, com o apoio, articulação e respeito às decisões colegiadas, sem interferências indevidas, articulado com os demais órgãos colegiados, de modo a promover o SUS. 19 Leni Lucia aposta numa redefinição das responsabilidades e papeis de cada esfera de gestão, com mais inovação e mais autonomia. Tem a expectativa que o COSEMS possa se fortalecer, que haja melhor qualificação dos gestores. Defende que para ser gestor deveria passar por um processo seletivo. Manifesta alegria ao perceber um movimento de renovação de lideranças, que os gestores estão buscando se aprimorar tecnicamente e enseja um processo formador continuado para estes atores, sobretudo do ente municipal. Mario Lucio discorre sobre a necessidade de superar o papel de cunho cartorial da CIB-CE, tem expectativa de que as pactuações meramente formais sejam superadas e a gestão colegiada seja fortalecida por uma nova prática, onde não haja pactos construídos de forma não dialogada ou em fóruns com limitação da participação. Defende maior atuação pragmática dos profissionais e gestores do SUS na construção de uma agenda democrática, no cotidiano dos serviços de modo a simplificar o seu arcabouço normativo, de maneira dinâmica e afirma existir muita coisa ainda por fazer. Mostra-se esperançoso com os novos gestores, que têm uma contribuição importante a dar, seja com a juventude e o entusiasmo de quem chega, assim como a proximidade com o COSEMS e a SESA para construir novas políticas, novas estratégias, até mesmo em outras áreas, que sigam servindo de referência inclusive de alcance internacional, nesse modelo de organização: “que a gente possa ter a força necessária para promover a aquiescência de todo esse movimento que há em todos os municípios, principalmente nesse momento tão delicado, para preservar esse sistema que é de todo o povo brasileiro”, diz. Olímpia Azevedo mantém tom questionador com relação à necessidade de fortalecer a articulação dos municípios de modo a não aceitar todas as proposições como o Estado quer que seja. Aponta a necessidade de reuniões ampliadas do COSEMS, de eventos descentralizados e de conhecer experiências fora do estado. Todas essas iniciativas buscam fortalecer a posição dos municípios nas negociações que são pactuadas na CIB-CE. Desse modo, ratifica a importância do fortalecimento da gestão colegiada a partir da informação e mobilização permanente. Sayonara Cidade tem a expectativa de que siga o amadurecimento, fortalecimento e qualificação das CIR, sendo, nesse modelo, o espaço adequado de negociação e pactuação de demandas que mantenham sintonia com as necessidades locais e regionais de saúde. Para a entrevistada, a pauta das CIR ainda está muito dissociada da agenda da CIB-CE e sugere alinhar as agendas de modo continuado e permanente, fortalecendo o planejamento regional. 20 Carlile Lavor reconhece a importância da gestão colegiada, mas antevê a necessidade de envolver as casas legislativas, câmaras de vereadores, assembleias legislativas e congresso nacional. Para ele é muito importante avançar na legislação da saúde. O entrevistado afirma que a lei orgânica da saúde é de 1990 e que nesses quase 30 anos decorridos de sua promulgação o cenário brasileiro mudou muito. Defende, portanto uma revisão e readequação das leis que regem o SUS, de modo inclusive a evitar que o poder judiciário se sobreponha a gestão por conta de uma legislação inadequada. Neste quesito, une parte do seu discurso ao que prega Odorico Monteiro. Lilian Amorim revela o desejo de seguir um clima harmonioso de convivência solidária na CIB-CE, mantendo as divergências em um nível civilizado com construção de consensos. Espera o surgimento de novas lideranças, para assumir no futuro próximo a gestão do SUS, em substituição gradativa aos atuais atores que em breve deverão gozar de aposentadoria no curto e médio prazo. Vera Coelho alerta para o momento de muitas fragilidades e ameaças que cercam o SUS, fazendo coro aos discursos de Alexandre Mont’Alverne, Olímpia Azevedo, Odorico Monteiro e Mário Lúcio e Jurandi Frutuoso. Refere que a EC 95 se apresenta como ameaçadora para garantia de direitos no campo da saúde como política de estado. Chama atenção para o aumento de responsabilidades da CIB-CE e a obrigação de estabelecer pactos que possam inovar esse sistema e produzir estratégias que garantam que esses direitos não sejam reduzidos para a população cearense. Para isso sugere que os gestores municipais não podem mais reduzir a sua agenda apenas às demandas municipais, mas antevê necessidade da participação ativa destes atores em grandes movimentos de alcance estadual e nacional em prol do fortalecimento do SUS e assim finaliza: “nós temos que estar, através dessa comissão, envolvendo outros atores da sociedade para que esses ataques ao SUS não se constitua perdas para as próximas gerações”. CONSIDERAÇÕES FINAIS As instâncias de gestão colegiada do SUS assumiram importante protagonismo na construção de consensos para implantar e efetivar as políticas públicas de saúde. De modo especial no Ceará esse processo transcorreu de modo muito intenso e participativo. Num dado momento a gestão estadual exercendo destacada posição de liderança, regência e condução. Por vezes. esse protagonismo foi exercido pelo 21 COSEMSCE, colegiado gestor municipalista que ao tempo e ao seu modo, exerce destacado papel em defesa da agenda municipalista, complementar e solidária ao trabalho exercido pelo estado. Não raro, se deparam com situações divergentes e de conflitos de alcance loco regionais e/ou de natureza política, sendo os colegiados de gestão, a arena adequada para mediação de conflitos e construção de consensos. Este tema é instigante e merece ser aprofundado em outros estudos, mormente em razão das mudanças propostas pela atual gestão estadual, seja pelos novos cenários de crise sanitária ora vivida. Quiçá em breve possamos deter o olhar numa análise complementar sobre o caminhar da gestão colegiada do SUS, contextualizando o cenário de desafios que se apresentaram a partir das mudanças impostas pela pandemia do novo coronavírus, sendo o presente estudo anterior a este período. REFERÊNCIAS BRETAS JUNIOR, Nilo; SHIMIZU, Helena Eri. Reflexão teórica sobre governança nas regiões de saúde. Ciencia & Saude Coletiva, Rio de Janeiro, v. 22, n. 4, p.1085-1095, abr. 2017. GOYA, Neusa. O SUS que funciona no Ceará. Fortaleza: Amece/Unicef, 1996. MOREIRA, Marcelo Rasga; OUVERNEY, Assis Luiz Mafort; RIBEIRO, José Mendes. Obstáculos Políticos à Regionalização do SUS: percepções dos Secretários Municipais de Saúde com assento nas Comissões Intergestores Bipartites. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 22, n. 4, p.1097-1108, abr. 2017. ORLANDI, Eni Puccinelli. Análise de discurso: princípios e procedimentos. Campinas: Pontes, 2013. 100 p. PROSSER, Jon. Visual Methodology: toward a more seeing research. In: DENZIN, Norman K.; LINCOLN, Yvonna S. (Ed.). The sage handbook of qualitative research. 4. ed. Los Angeles: Sage, 2011. p. 479-495. RIBEIRO, Patrícia Tavares; TANAKA, Oswaldo Yoshimi; DENIS, Jean-louis. Governança regional no Sistema Único de Saúde: um ensaio conceitual. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v.22, n. 4, p.1075-1084, abr. 2017. SHIMIZU; Helena Eri et al. O protagonismo dos Conselhos de Secretários Municipais no processo de governança regional. Ciencia & Saude Coletiva, Rio de Janeiro, v. 22, n. 4, p.1131-1140, abr. 2017. 22 CAPÍTULO 2 COLONIALISMOS E DESIGUALDADES SOCIAIS EM SAÚDE: O DIÁLOGO NECESSÁRIO ENTRE ANTROPOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA CRÍTICA LATINO AMERICANA Anaxsuell Fernando da Silva RESUMO Este capítulo pretende problematizar a hegemonia biomédica no campo da saúde e como, no atual cenário, ela se desdobra em desigualdades em saúde. Para tanto, empreende uma revisão bibliográfica com objetivo de explorar fontes e argumentar em torno da necessidade de promover diálogo entre a Antropologia e a Epidemiologia afim de superar tais desigualdade. De maneira mais específica, o argumento se dá em torno das possíveis interconexões entre a Antropologia da saúde e a Epidemiologia Crítica Latino Americana, que ao final do trabalho se apresentará como caminhos medulares para a superação dos Colonialismos biomédicos, superação das desigualdades Sociais em Saúde e construção de uma soberania sanitária com forte conexão com a vida comunitária. Palavras-Chave: Saúde. Antropologia. Epidemiologia. INTRODUÇÃO A crise sanitária do ano de 2020 trouxe à tona um conjunto de transformações ao mundo em que vivemos. Tão rápidas, quanto profundas, estas mudanças socioculturais se espraiaram em diferentes dimensões da vida e suscitaram perplexidade ante sua velocidade e amplitude. Este cenário de emergência em saúde pública impôs esforços de reflexão no sentido de compreender o que se passa no mundo e intervir sobre a realidade. Hegemônico atualmente, o modelo biomédico científico ocidental tem sua gênese associada ao contexto da Revolução Artístico-Cultural, transcorrida a partir do século XVI, no âmbito do Renascimento. René Descartes (1596-1650) definiu o seu “método para bem conduzir a razão e procurar a verdade nas ciências” (Pinto, 2009), isto é, um conjunto de regras que constituem os fundamentos de construção do conhecimento científico no ocidente. De acordo com o método cartesiano, não pode ser 23 aceito, como verdade, nada que não possa ser identificado como tal. Assim, dever-se-ia separar cada elemento ou aspecto do objeto em estudo e examinar em tantas partes quanto sejam possíveis e necessárias para se chegar a uma solução; cabe mencionar também a condução do pensamento de forma ordenada, partindo do simples ao mais complexo; e a necessidade de efetuar uma revisão exaustiva dos diversos componentes de um argumento. Este seu método é apresentado num livro denominado de Discurso do Método, publicado originalmente em 1637. Na esteira deste método ocidental de apreensão do conhecimento, o saber biomédico conceitualizou doença como desajuste ou falha nos mecanismos de adaptação do organismo ou ainda ausência de reação aos estímulos a cuja ação está exposto, um processo que conduz a uma perturbação da estrutura ou da função de um órgão, de um sistema ou de todo o organismo ou de suas funções vitais (Herzlich, 2004). E dedicou-se, progressivamente, ao longo da história da medicina, à explicação da doença. Como desdobramento, este saber biomédico estuda o corpo em partes cada vez menores, compartimentando os saberes e reduzindo a saúde a um funcionamento mecânico (Barros, 2002). Ao refletir sobre a constituição este modelo, Fritjof Capra (1982) criticou a formulação fragmentária do modelo biomédico e argumentou que este se manifesta semelhante a uma teoria mecanicista, na qual o indivíduo humano é visto como corpo- máquina; o médico, por sua vez, atua como um mecânico; e a doença, seria o defeito da máquina. Esta percepção do indivíduo como uma máquina é demarcável historicamente e remonta ao advento do capitalismo. Deste modo, é possível dizer que a intervenção de cuidado é fundada numa concepção que é simultaneamente reducionista e mecanicista. Para Foucault (1979), o cuidado também pode e deve ser compreendido como dispositivo de controle dos corpos circunscritos em um espaço social marcado por relações de poder, neste caso mereceria destaque o poder (bio)médico. Os aspectos socioculturais têm sido, de maneira geral, considerados marginais ou irrelevantes para formulação das intervenções na área da saúde. Usualmente, considera-se apenas aquelas considerações relacionadas ao diagnóstico biomédico. Em direção contrária, desde os anos de 1970 os estudos demonstram a relevância de se pensar o processo saúde-doença desde uma perspectiva sociocultural. Uma vez que se trata de fenômenos complexos que conjugam fatores biológicos, sociológicos, econômicos, ambientais e culturais. A complexidade do objeto implica buscar uma compreensão transversal de saúde. 24 A antropologia desenvolveu, ao longo das últimas décadas, significativo artefato teórico-metodológico para o estudo das formas de viver, enfermar-se e morrer. Tal repertório possibilita examinar as relações entre os modelos de compreensão no campo da saúde, a organização dos serviços, os programas de prevenção e as intervenções terapêuticas, além dos modelos culturais dos usuários. O discurso antropológico tem apontado os limites da tecnologia biomédica e a insuficiência da abordagem hospitalocêntrica, farmacológica e laboratorial, quando se trata de mudar de forma estado de saúde de uma população. As pesquisas etnográficas têm nos demonstrado que a saúde de uma população é desdobramento do seu modo de vida, do seu entorno social e cultural. Desta maneira, é possível apontar a importância de estabelecer uma relação de complementaridade entre os estudos epidemiológicos e aqueles oriundos das Ciências Sociais (antropológicos, sociológicos e psicológicos) no que diz respeito à saúde. De acordo com Maurício Gomes Pereira (2002), a epidemiologia não é um tema novo, a disciplina acadêmica que utiliza este nome, sim é o que pode ser considerada recente. Trata-se de um conceito que engloba os fatores relacionados com a saúde da população. Esta área do pensamento em saúde congrega métodos e técnicas de três campos do conhecimento: Estatística, Ciências da Saúde e Ciências Sociais para estudar o processo saúde-doença, como este fator é distribuído e seus determinantes (ou, como veremos ao longo deste texto, determinações) na sociedade. Em linhas gerais, a Epidemiologia se define como: ciência que estuda o processo saúde-doença em coletividades humanas, analisando a distribuição e os fatores determinantes das enfermidades, danos à saúde e eventos associados à saúde coletiva, propondo medidas específicas de prevenção, controle ou erradicação de doenças, e fornecendo indicadores que sirvam de suporte ao planejamento, administração e avaliação das ações de saúde (ROUQUAYROL, 2003). Nos estudos epidemiológicos predominam os estudos quantitativos com interesse nas abordagens sobre os comportamentos dos indivíduos. A incidência ou prevalência de uma certa patologia e as características de indivíduos relacionados a ela são determinadas, no intuito de conhecer os perfis de distribuição da patologia em grupos ou fatores de risco associados. Na abordagem sociológica, os problemas de saúde são apreendidos em sua dimensão social e não individual. As Ciências Sociais da saúde investigam a determinação que exercem os contextos social e institucional sobre as enfermidades e os comportamentos delas decorrentes. A antropologia, por exemplo, considera que a saúde e tudo que se relaciona a ela são noções socialmente 25 construídos e culturalmente interpretados (Nichter, 1989). Neste sentido, a perspectiva etnográfica, ou dito de outro modo, a abordagem qualitativa, é empregada para identificar e analisar a mediação que exercemos fatores sociais e culturais na construção de formas características de pensar e agir frente à saúde e à doença. Integrando uma apreensão da dimensão cultural, a antropologia ao lado da epidemiologia, podem contribuir para ampliar o contexto que deve ser levado em consideração na leitura dos processos patológicos. A despeito da evidente necessidade de complementaridade, estes dois campos de conhecimento atuam, geralmente, apartados e disjuntos devido a compartimentalização da produção de saberes em saúde. A profunda dicotomia entre métodos quantitativos e qualitativos ainda afeta o conjunto das ciências da saúde, obscurece a complementaridade dessas duas estratégias de pesquisa. Diversos autores (MINAYO; SANCHES, 1993) sugerem que as perspectivas quantitativas e qualitativas deveriam ser encaradas como perspectivas complementares, como fases sequenciais de um mesmo processo. É nesta direção que este trabalho caminha. Pretendemos, a partir de uma revisão bibliográfica, explorar fontes e argumentar em torno da necessidade de promover diálogo entre a Antropologia e a Epidemiologia. De maneira mais específica, discutiremos as pontes entre a Antropologia da saúde e a Epidemiologia Crítica Latino Americana como caminhos medulares para a superação dos Colonialismos biomédicos e superação das desigualdades Sociais em Saúde. DESENVOLVIMENTO Em junho de 2019, o departamento de população da ONU divulgou1 um conjunto de novas projeções populacionais para sociedade. Naquela ocasião, a população mundial foi estimada em 7,79 bilhões para o ano de 2020 e apontava que chegaríamos ao contingente de 8 bilhões nos próximos três anos. Estes indivíduos que habitam o planeta terra não são iguais. Do ponto de vista espacial, tal população está distribuída em espaços nacionais e continentais que apresentam diferentes configurações demográficas e geopolíticas. Além das notórias diferenças fenotípicas e culturais, identifica-se significativas diferenças socioeconômicas. As clivagens sociais decorrentes das desigualdades são produtos de processos históricos complexos. Algumas destas distinções que poderiam ser apenas diferenças, transmutaram-se em desigualdades 1O Perspectivas Mundiais de População 2019: Destaques e materiais relacionados estão disponíveis em: https://population.un.org/wpp/ 26 devido a relações desiguais de poder as quais limitam o acesso e a posse aos bens, serviços e riqueza que são fruto do trabalho coletivo e acumulado através de gerações, são desigualmente distribuídos (STIGLIZ, 2013; BARRETO, 2017). Estas diferenças, elaboradas e convertidas em desigualdade, frequentemente deslocam-se para exprimir-se na saúde. Tornam-se perceptíveis e modulam desiguais condições de saúde a partir de aspectos raciais, de gênero, de classe e das suas intersecções. Expressam-se tanto em camadas de riscos à saúde, quanto no acesso diferenciado aos recursos disponíveis no sistema de saúde (MARMOT, 2015). Dito de outra maneira, as desigualdades observadas na saúde estão diretamente relacionadas às desigualdades observáveis em outras esferas da vida social. As desigualdades na saúde se materializam em discrepantes níveis de oportunidades de acesso aos avanços científicos e tecnológicos do campo da saúde da sociedade moderna, assim como distintas chances de adoecimento, modos de enfrentamento desta doença e morte (BARRETO, 2017). As desigualdades sociais em saúde estão presentes em todos os países independente do seu poderio econômico, da quantidade de riqueza acumulada. No contexto do capitalismo, desigualdade reafirma-se numa estrutura social perversa. Frequentemente tais desigualdades convertem-se em iniquidades em saúde. Aqui, parece importante pontuar quais seriam as diferenças conceituais entre desigualdades e iniquidades em saúde. Enquanto a primeira diz respeito àquelas diferenças evidentes e mensuráveis presentes tanto nas condições de saúde, quanto relacionadas às diferenças no acesso aos serviços de prevenção, cura ou reabilitação da saúde (desigualdades no cuidado à saúde); Iniquidade em saúde, por sua vez, está relacionada às desigualdades decorrentes de alguma forma de injustiça (CF. KAWACHI, SUBRAMANIAN; ALMEIDA-FILHO, 2002). Em seus escritos, Margareth Whitehead (1992) estabeleceu um vínculo direto entre iniquidade e injustiça. A professora de Saúde Pública da University of Liverpool aponta que a iniquidade pode ser compreendida como uma desigualdade desnecessária e evitável sobre saúde. Na mesma direção, Escorel (2000) argumenta que o termo iniquidade tem uma dimensão política e ética, assim, toda desigualdade redutível é iniqua por ser produto dos conflitos em uma arena permeada por interesses contraditórios. Nos últimos anos, a expansão da subjetividade neoliberal (Dardot & Laval, 2016) marcada pelo individualismo têm sustentado a percepção de que os eventos ocorridos na sociedade são de responsabilidade dos indivíduos neles implicados, rechaçando o caráter coletivo e social da vida. Esta perspectiva de mundo fundamenta a naturalização das desigualdades por parte da sociedade e faz com que os atores 27 políticos as entendam como resultantes de problemas individuais, minimizando as expressões das injustiças e, por conseguinte, colaborando para escassez de políticas e ações governamentais para minimizá-las. A epidemiologia e a antropologia da saúde são disciplinas científicas que buscam por padrões de doenças, comportamento e de modos de enfrentamento da enfermidade. Elas estão separadas por suas histórias e tradição disciplinar – a “Epidemiologia tende a ser mais estatística e quantitativa e a Antropologia, textual e qualitativa” (TROSTLE, 2013, p. 24). Neste trabalho, argumentamos em defesa de um diálogo integrado entre ambas as disciplinas, na mesma direção de outros autores (HAHN, 1995; DRESSLER et al., 1997; BREILH, 1998; IRIART et al., 2002; TROSTLE, 2013; SOUZA, MENDES; CARNUT, 2019). Esta relação de complementaridade entre epidemiologia e antropologia passou a fazer parte do escopo na saúde coletiva, levando em conta a perspectiva de integração metodológica nas investigações em saúde. Em um primeiro momento, as discussões enfatizaram as evidentes dualidades como quantitativo/qualitativo ou objetividade/subjetividade, posicionando o método particular a cada uma das disciplinas em pólos opostos por suas características. O método epidemiológico, com a premissa de separação radical entre sujeito- objeto, engendra-se historicamente sustentada por uma noção ideal de rigor científico, o qual poderia ser mensurado pela objetividade e neutralidade das suas investigações. A epidemiologia trabalha com explicações causais formuladas a partir de pesquisas que se valem de instrumentos como entrevistas estruturadas. Com isso, se busca medir a abrangência e representatividade dos dados obtidos. Por outro lado, o método antropológico desfaz o distanciamento entre sujeito- objeto. A pesquisa etnográfica é concebida a partir da intersubjetividade, do erro e do inesperado e estes aspectos se impõem a qualquer discurso em torno da objetividade. A ênfase está nas histórias de vida, nas relações entre os indivíduos e suas cosmovisões. Assim, por meio da observação participante, a antropologia busca compreender e interpretar o significado das práticas sociais, considerando os distintos contextos culturais em que emergem. Se antes havia disputas de competência a qual buscava definir o melhor método, estas podem ser substituídas por uma perspectiva complexa, inclusiva e de hibridização metodológica. Na medida em que admitimos a possibilidade de integração de métodos, reconhecemos os limites de cada um deles e trabalhamos para conter as lacunas compreensivas que decorremda existência de tais limitações. 28 Obviamente, a integração entre epidemiologia e antropologia é uma oportunidade que não está desprovida de tensões, contradições ou disputas de poder, as quais envolvem sobretudo a maneira como tais disciplinas estruturaram historicamente suas bases conceituais e premissas metodológicas. As experiências de pesquisas em saúde existentes que apontam para uma aproximação entre epidemiologia e antropologia ocorre ao mesmo tempo em que significativas transformações no discurso científico contemporâneo se manifestam, e que geralmente enfatizam, valores mais próximos ao olhar antropológico, caracterizado por abordar mais de perto seus sujeitos de pesquisa, isto é, considera a unidade de situações singulares. Dito de outra maneira, aspectos como subjetividade, autonomia e diferença expressaram-se mais vigorosamente na saúde coletiva por volta de uma década atrás, incidindo nas perspectivas de pesquisa até então hegemônicas na área, as quais privilegiavam a concepção de ciência neutra e objetiva. É importante dizer que não se trata de migrar de um extremo, onde se localiza a objetividade, para outro que seria a subjetividade. Ou transitar do universal para o singular, do quantitativo para o qualitativo. Tampouco operar a partir da dicotomia entre os critérios quantitativos e qualitativos. O desafio que se impõe é mover-se entre os diferentes níveis e modos de compreensão e apreensão da realidade. A integração metodológica pressupõe outra adversidade. As já explicitadas diferenças metodológicas existentes remetem às finalidades da pesquisa e também à construção de seus objetos. Nesta direção, não advogamos pela integração de dois objetos — o epidemiológico e o antropológico. A proposta de integração acredita que a formulação dos problemas de investigação pode ser concebida de maneira integrada. Para que tal ponte entre estes campos de conhecimento se efetive, é preciso que as disciplinas em questão empreendam um movimento autorreflexivo que pretenda repensar as bases nas quais elas estão fundadas. Este movimento tem dado origem a um modo específico de se fazer e pensar epidemiologia, gestado no continente latino- americano. Como já discutimos aqui, a epidemiologia convencional está tradicionalmente assentada no paradigma empírico-funcionalista, e busca traçar a relação entre a saúde e fatores (de risco e proteção) que muitas vezes não se reconectam como as discussões consolidadas no campo das Ciências Sociais. Assim, Jaime Breilh, epidemiológo equatoriano, tem se preocupado, basicamente em retomar a categoria da reprodução social, dos modos de viver, adoecer e morrer como mote analítico para 29 superar os modelos epistêmicos lineares e causalistas que a epidemiologia convencional insiste em reafirmar (BREILH, 2013). É nesta direção, portanto, que, em Breilh, a “determinação social em saúde” junto com as categorias de “reprodução social” e “metabolismo sociedade-natureza” compõem os três eixos a partir dos quais se estruturam o pensamento da epidemiologia crítica latino-americana que emerge na segunda metade do século XX (PEREIRA DE SOUZA, MENDES; CARNUT 2019). Ainda no decorrer dos anos de 1970, a América Latina vivenciou o desenvolvimento de um campo do saber chamado de Medicina Social. Ela se colocava como uma resposta a um modelo desenvolvimentista que vinha sendo implementado de maneira exaustiva nas políticas latino-americanas, e em consequência, produza efeitos marcantes no campo da saúde pública (Nunes, 1994). A ideia que circulava no continente à época era que o crescimento econômico levaria a uma melhora automática das condições de vida e saúde, contudo, o que se averiguou foi o oposto. Ainda que os indicadores macroeconômicos ostentassem melhora, os sociais degringolavam. Um novo cenário se configurava: enquanto os gastos com saúde aumentavam e novas tecnologias floresciam, o acesso à saúde seguia cerceado e as condições gerais de saúde pioravam (Iriart, 2002). Nesse cenário, a correlação entre condições de saúde e desigualdade social se explicitaram. Diversos autores, preocupados em compreender o que se enxergava, com abordagens teórico-metodológicas diversificada, passaram a produzir um conhecimento científico crítico e sensível às questões sociais, tal esforço seria reconhecido como Medicina Social. Este movimento latino-americano da epidemiologia crítica, questiona a capacidade explicativa desta epidemiologia convencional, clássica, a respeito da realidade, que, a despeito de dispor de um arsenal estatístico robusto, não cumpre com a tarefa de relacionar os sistemas sociais, modos de vida e saúde, e tampouco é efetivo na explicação a respeito da distribuição “por classes das formas e intensidades de exposição a situações de risco, ou os diferentes níveis de vulnerabilidade inerentes a cada realidade social distinta” (PEREIRA DE SOUZA, MENDES; CARNUT, 2019, p. 80). Em síntese, tenho tentado demonstrar através desta revisão teórico-bibliográfica que a epidemiologia clássica empreende suas análises sustentadas em noções de pessoa, tempo e lugar – descoladas do conhecimento antropológico e por isso obsoletas; somemos a esta consideração que também aos conceitos de história natural da doença e sistemas de equilíbrio (antígeno-suscetível-ambiente) falham na tarefa de conhecer a realidade para alterá-la (BREILH, 2013). 30 Além das questões conceituais, a epidemiologia crítica latino-americana sintetiza os problemas metodológicos que impossibilitam que análises críticas e aprofundadas sejam feitas seguindo moldes de uma epidemiologia convencional: a) uma explicação fenomenológica reducionista e fragmentária da realidade e da saúde, b) primazia absoluta de causa e efeito como grande organizador e lógica do universo epidemiológico, c) reprodução da relação causa-efeito como um artefato formal aplicado para identificar fatores de risco, d) a redução da noção de exposição/vulnerabilidade a um problema probabilístico essencialmente individual, e e) redução da organização da prática epidemiológica em ações funcionais sobre fatores de risco (Breilh, 2013, p. 15). O modelo clássico, convencional, da epidemiologia fundamenta-se em paradigmas hegemônicos do pensamento ocidental. É efeito do colonialismo médico. Nesta perspectiva quaisquer processos serão explicados apenas no plano dos fenômenos observáveis empiricamente, a realidade é tratada como algo que existe “em si”. A saúde ou doença, que emerge empiricamente, são as únicas coisas comprováveis, e, portanto, passíveis de existência. Por isso, as avaliações quantitativas são consideradas meios de obtenção de conhecimento que “deduzem as relações simples e lineares que se estabelecem entre cada fenômeno” (PEREIRA DE SOUZA, MENDES ; CARNUT, 2019, p. 83). A epidemiologia crítica latino-americana surge, portanto, como resposta a uma epidemiologia ortodoxa moderna, hegemônica e colonial que, constrói-se sobre fundamentos tecnicistas, abstratos e alheios à vida concreta das pessoas. Por isso consideramos que o desenvolvimento de uma mudança epistemológica no interior da epidemiologia poderá ser o ponto de articulação para se compreender as reflexões antropológicas a respeito da saúde. Esse repertório crítico combinado, dialogado, é um passo paradigmático importante para que a saúde caminhe na trilha do pensamento crítico e siga pensando sobre seus próprios (des)acertos e comprometa-se com a eliminação das desigualdades. CONCLUSÃO Ainda que a discussão a respeito das possibilidades de diálogo e integração entre a epidemiologia e a antropologia já tenha em seu repertório uma significativa literatura– alguns, inclusive, chegaram a cunhar o termo "epidemiologia comportamental" (Fernandes, 2003) nos anos 70 – este trabalho não é uma revisão sistemática a respeito das contribuições já existentes no que tange à relação da epidemiologia com a 31 Antropologia ou com outras disciplinas (Janes, Stall & Gifford, 1986; Sallis, Owen & Fotheringham, 2000). Em outra direção, o objetivo foi explorar os aspectos teórico- metodológicos, a partir de alguns autores que têm permitido a reflexão sobre as potencialidades de uma abordagem que integre as referidas disciplinas para o estudo dos fenômenos de saúde. Dentre as abordagens possíveis, optou-se por revisar o que tem sido sistematizado em torno de uma epidemiologia crítica latino-americana. A compreensão do diálogo se dá matizando o pensamento epidemiológico como cerne de uma perspectiva crítica radical à sociedade capitalista e a suas formas de dominação, que se desdobram em desigualdades sociais expressas em desigualdades em saúde. Tal cenário não pode ser compreendido à luz de um colonialismo médico, ou a partir da aceitação tácita das interpretações das questões relacionadas a saúde oriundas de uma perspectiva biomédica, hospitalocêntrica e centrada em fármacos. Ao longo deste trabalho tentamos problematizar a necessidade de se romper com a falsa dicotomia entre os métodos qualitativos e quantitativos. E, para fazê-lo, seria necessário localizar o objeto de estudo – as pessoas – no núcleo central do problema. E isso só pode ser feito a partir da construção de ponte, de um canal de diálogo entre a Antropologia da saúde e a Epidemiologia Crítica Latino Americana. Em nosso entendimento, este é o caminho medular para a superação dos Colonialismos biomédicos e superação das desigualdades Sociais em Saúde. REFERÊNCIAS Barreto, Mauricio Lima. “Desigualdades em Saúde: uma perspectiva global.” Ciência & Saúde Coletiva, 22 (7), 2017. Barros, José Augusto C. “Pensando o processo saúde doença: a que responde o modelo biomédico?” Saude e Sociedade, vol.11, no.1, 2002: 67-84. Breilh, Jaime. Epidemiologia Crítica: ciência emancipadora. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2006. Breilh, Jaime. Epidemiologia, Economia, Medicina y Política. Mexico: Fontamara, 1998. Breilh, Jaime. “.La determinación social de la salud como herramienta de transformación hacia una nueva salud pública.” Revista Facultad Nacional de Salud Pública, v. 31, n. 1, p. 13-27, 2013. Capra, Fritjof. O ponto de mutação. São Paulo: Cultura, 1982. Dardot, Pierre, e Christian Laval. A Nova Razão do Mundo: Ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo: Boitempo, 2016. Descartes, René. O discurso do Método. São Paulo: Martins Fontes, 2001. 32 Fernandes, Rita de Cássia Pereira. “Uma leitura sobre a perspectiva etnoepidemiológica.” Ciência & Saúde Coletiva, 8 (3), 2003: 765-774. Filho, Naomar Almeida, e Jairnilson Silva Paim. “La crisis de la salud pública y el movimiento de la salud colectiva en Latinoamérica.” Cuadernos medico sociales, 75, 1999: 5-30. Foucault, Michael. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1979. Herzlich, Claudine. “Saúde e doença no início do século XXI: entre a experiência privada e a esfera pública.” Physis: Revista de Saúde Coletiva, vol.14, n.2, 2004: 383- 394. Iriart, C. “Medicina social latinoamericana: aportes y desafíos.” Rev Panam Salud Publica, v. 12, n. 2, 2002: 128-136. Janes C, Stall R & Gifford S. Anthropology and epidemiology: interdisciplinary aproaches to the study of health and disease. Dordrecht: Reidel Publishing Company, 1986. Kawachi, I, S Subramanian, e N. Almeida-Filho. “A glossary for health inequalities.” Journal of Epidemiology Community Health, 56, 9, 2002: 647-652. Minayo, M. C. S, e O. Sanches. “Quantitativo-qualitativo: oposição ou complementaridade?” Cadernos de Saúde Púbica, 9, 1993: 239-262. Moraes, Sarah Maria Escorel de. Vivendo de Teimosos: moradores de rua da cidade do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Garamond, 2000. Nichter, Mark. Anthropology and International Health: South Asian Case Studies. Dordrechet: Kluwer Publications, 1989. Nunes, Everardo Duarte. “Saúde coletiva: história de uma ideia e de.” Saúde e Sociedade, 3 (2), 1994: 5-21. Pereira de Souza, Isabel Figueiredo, Áquilas Mendes, e Leonardo Carnut. “História política e pensamento epidemiológico: Breilh e a economia política da saúde.” Revista Guillermo de Ockham, Vol. 17, No. 1, 2019: 77-84. Pereira, Maurício Gomes. Epidemiologia: teoria e prática. Rio de Janeiro: Ed. Guanabara, 2002. Pinto, Helder. “A Medicina no "Discurso do Método" de Descartes: Um Breve Apontamento.” Arquivos de Medicina, 23(1), 2009: 23-26. Rouquayrol, Maria Zélia, e N Almeida Filho. Epidemiologia & Saúde. Rio de Janeiro: Ed. MEDSI, 2003. Sallis JF, Owen N & Fotheringham MJ. “Behavioral epidemiology: a systematic framework to classify phases of research on health promotion and disease prevention.” Annals of Behavioral Medicine, 22(4), 2000: 294-298. Stiglitz, Joseph Eugene. The price of inequality. How today´s divide society endangers our future. New York: WW Norton & Company, 2013. Trostle, James A. Epidemiologia e Cultura. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2013. 33 Uchôa, Elizabeth, e Jean Michel Vidal. “Antropologia Médica: Elementos Conceituais e Metodológicos para uma Abordagem da Saúde e da Doença.” Cadernos de Saúde Pública, 10, 4, 1994: 497-504. Whitehead, Margareth. “The concepts and principles of equity and health.” International Journal of Health Services, n. 22, 1992: 429-445. 34 CAPÍTULO 3 ATUAÇÃO DA FISIOTERAPIA NA LINHA DE CUIDADO DO AVC – HOSPITAL REGIONAL DO CARIRI Maria Angela Lopes Pereira Pinheiro Suianne Ferreira Soares Alencar Lívia Maria dos Santos Landim Moisés Sampaio da Silva RESUMO O presente artigo discutirá a respeito do Acidente Vascular Cerebral – AVC, apresentando as suas formas, potencial de letalidade bem como a sua capacidade de deixar sequelas, quando do cuidado tardio bem como a aplicação de métodos inadequados para tratar essa doença. De forma complementar será apresentado um panorama acerca do tratamento dado aos pacientes que chegam ao Hospital Regional do Cariri – HRC e que recebem um tratamento padronizado para a sua recuperação. Busca-se, a partir desse trabalho, apresentar, através da explanação dos métodos e protocolos, os cuidados necessários e indispensáveis aos pacientes com AVC e a forma de atuação dos profissionais desse hospital para que o paciente consiga se recuperar e que se recupere com o mínimo possível de sequelas comumente deixadas por esta doença. Palavras-chave: Acidente Vascular Cerebral – AVC. Fisioterapia. Hospital Regional do Cariri - HRC INTRODUÇÃO O presente trabalho busca traduzir um pouco do cotidiano dos profissionais de saúde, principalmente da fisioterapia do Hospital Regional do Cariri – HRC, apresentando a atuação desses profissionais através da análise de indicadores e aplicação de protocolos padronizados para minimizar os efeitos do AVC e preservar a qualidade de vida do paciente. O AVC é um dos grandes responsáveis por mortes no mundo, e quando este não é capaz de matar uma pessoa, pode deixar o paciente com sequelas para a vida inteira, por esse motivo é uma doença tão grave e que requer uma série de cuidados específicos para tratar desses pacientes, que possuem o tempo enquanto um inimigo. 35 A rapidez na identificação de que o paciente sofreu um AVC é determinante para a sua sobrevivência e também para a sua recuperação e sequelas, pois quanto mais o tempo passa sem que o diagnóstico seja feito ou que o paciente demore a chegar na unidade hospitalar, menores são as chances de recuperação desse indivíduo. Deste modo, não se trata de uma doença comum e o seu tratamento requer uma equipe capacitada e apta a identificar de prontidão a incidência do acidente e de imediato seguir com os protocolosnecessários ao tratamento. Partindo da análise da importância do profissional fisioterapeuta para a recuperação dos pacientes com AVC no Hospital Regional do Cariri – HRC é que o presente trabalho foi sendo desenhado. Objetiva-se, com esse trabalho, apresentar a atuação dos profissionais fisioterapeutas do HRC no tratamento de pacientes com AVC, para tanto, serão abordados os principais indicadores que são considerados para a realização desse tratamento no ambiente do hospital em estudo. REFERENCIAL TEÓRICO O acidente vascular cerebral (AVC) é atualmente uma das principais causas de morte no Brasil sendo apontado como um problema de saúde pública mundial, causa de 27% das internações e a terceira causa de morte no mundo (REIS; FARO, 2019). Sabe-se que existem cerca de 62 milhões de sobreviventes dessa doença, dos quais até 40% têm alguma limitação funcional, que é classificada como grave em até um terço desta população (FELIPPO et al.; 2020). Por vezes, isso torna a vítima altamente dependente de cuidadores, até mesmo para atividades corriqueiras como comer e tomar banho (FELIPPO et al.; 2020). De acordo com Reis e Faro (2019), o montante de pessoas com sequelas após o AVC é maior que o número de mortes, pois a principal característica da doença são as limitações físicas e cognitivas que atingem até 80% das vítimas (REIS; FARO, 2019). Fator que atribui a essa doença, um nível alto de dificuldade na recuperação, existindo a necessidade de prestar cuidados de forma intensiva e eficientes para a obtenção de resultados positivos. Os sinais de alerta para a suspeita de AVC são variados, incluindo déficits neurológicos de início súbito, especialmente os localizados, fraqueza muscular súbita ou alteração sensitiva súbita unilaterais, dificuldade repentina para falar ou compreender, perda visual súbita, especialmente se unilateral, perda súbita do equilíbrio ou incoordenação motora repentina, rebaixamento súbito do nível de consciência, cefaléia súbita (PROTOCOLO, 2020). 36 Na PORTARIA N° 665, DE 12 DE ABRIL DE 2012, DO MINISTÉRIO DA SAÚDE, que dispõe sobre os critérios de habilitação dos estabelecimentos hospitalares como Centro de Atendimento de Urgência aos Pacientes com Acidente Vascular Cerebral (AVC), no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), foi instituída e aprovada a Linha de Cuidado em AVC, considerando a necessidade de ações integradas em estruturar as redes de atenção à saúde e de se estabelecer uma linha de cuidados para o atendimento, com diretrizes voltadas ao diagnóstico, tratamento e acompanhamento dos indivíduos com esta doença, com intuito de reduzir morbimortalidade e assegurar a assistência desde o evento agudo até o os programas de reabilitação domiciliares. O atendimento envolve a comunicação simultânea e integrada de diversos profissionais e setores hospitalares envolvidos no atendimento inicial de pacientes com suspeita de AVC agudo, incluindo equipes médicas responsáveis pelo primeiro atendimento nas diversas áreas da instituição, enfermagem, neurologia, radiologia, neurorradiologia intervencionista, neurocirurgia, farmácia, unidade neurointensiva e unidade crítica geral ou neurológica. Seguindo com o tratamento trombolítico intravenoso que será indicado para pacientes acima de 18 anos com AVC até 270 minutos de evolução, que contemplem os critérios de elegibilidade e não apresentem critérios de exclusão, com isso denota-se que o tratamento deve ser iniciado o mais rápido possível, pois o tempo está fortemente associado aos resultados. A intervenção fisioterápica desempenha um papel de extrema importância em pacientes que recebem alta hospitalar com diagnóstico de AVC. O atendimento do fisioterapeuta consiste na realização de exercícios que garantem ganhos de amplitude de movimento (ADM) para manter a integridade articular e prevenir contraturas musculares. Durante as sessões de fisioterapia, as terapias convencionais são tipicamente compostas de exercícios de alongamento e fortalecimento, mobilização e treinamento funcional (treinamento de ciclo ergômetro ativo para os membros inferiores, Estimulação Elétrica Funcional (FES), ortostatismo, equilíbrio e treinamento de marcha e exercícios de conscientização corporal. Também inclui treinamento de segurança e independência para Atividades de Vida Diária (AVDs) (FELIPPO et al.; 2020). A fisioterapia também proporciona treinos de marcha que possibilitam uma melhora na coordenação, equilíbrio e força que são pré-requisitos para a deambulação, onde é possível afirmar que através do conhecimento fisioterapêutico, pode ser desenvolvido planos terapêuticos individualizados, com a execução de manobras e 37 técnicas específicas, propiciando que a reabilitação desses indivíduos seja de acordo com os distúrbios apresentados, além de prevenir futuras recidivas dessa doença. Tendo em vista que o AVC é uma patologia com alta incidência global o que torna difícil traçar um plano de tratamento devido as mais variadas sequelas motoras herdadas pelos pacientes (LIRIOS et al.; 2016). Faz-se necessário a adoção de medidas personalizadas e pautadas em reavaliações constantes para alcançar resultados promissores. A Figura 1 confirma as informações mencionadas anteriormente e corrobora para o entendimento acerca da linha de cuidado com o AVC e o perfil do paciente com AVC. Figura 1: Linha de cuidado AVC: perfil do paciente com AVC Pode-se observar que mais de 80% dos AVCs são Isquêmicos e não Hemorrágicos e ainda, na Figura 2, os tipos de hemorragias que podem fazer parte do AVC Hemorrágico e os percentuais. Apresentando ainda fatores interessantes sobre os pacientes, sendo mais de cinquenta por cento dos pacientes do sexo masculino e o transporte para socorrê-los apontam o SAMU como o responsável por mais de setenta por cento dos socorros prestados aos pacientes. 38 Figura 2: Perfil do paciente da linha de cuidado AVC A Figura 2 chama a atenção para a faixa etária dos pacientes com AVC, e cerca de noventa por cento dos diagnósticos da doença ocorrem em idosos, apresentando uma média de idade de setenta anos entre os pacientes. Apresenta ainda um comparativo entre os anos de 2017 e 2018, onde pode-se perceber uma diminuição de mais de 300 casos, o que representa um avanço. A Equipe de Fisioterapia do HRC gerencia dois indicadores na Linha de Cuidado do AVC, que são respectivamente: Taxa de Melhoria Funcional do Paciente com AVC na Alta e Taxa de Pacientes com Independência Funcional Após a Alta da Linha de Cuidado do AVC (Conforme Escala de Ranking – 90 dias). Indicador I - Taxa de Melhoria Funcional do Paciente com AVC na Alta: Esse indicador foi implementado no dia 14 de janeiro de 2019, onde começamos a realizar a aplicação da escala de Rankin modificada na Unidade de AVC e na Unidade de Cuidados Especiais - UCE, de forma a mensurarmos os ganhos de funcionalidade dos pacientes da linha de cuidado do AVC. Este indicador é obtido a partir da mensuração da escala de Rankin modificada na admissão do paciente na UAVC e na alta do paciente na linha do AVC, que pode acontecer na própria UAVC como na UCE. 39 Essa escala nos permite verificar o grau de incapacidade do paciente e desta forma os seus ganhos funcionais ao longo da internação, assim o paciente classificado com Rankin 0 - sem sintomas, apresenta independência funcional total; Rankin 1 – nenhuma deficiência significativa a despeito de sintomas (capaz de conduzir todos os deveres e atividades habituais); Rankin 2 – leve deficiência (incapaz de conduzir todas as atividades de antes, mas capaz de cuidar dos próprios interesses sem assistência). Já o Rankin 3 – deficiência moderada (requer ajuda, mas é capaz de caminhar
Compartilhar