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UFRJ - Faculdade Nacional de Direito Professor: Luciano Nuzzo Alunos: Liandra e Luciano Unidade I Aula 01 (25/08) - apresentação do curso + discurso jurídico entre saber e poder (semana 1) Pode-se dizer que o discurso jurídico moderno, pensa e descreve o poder nos termos negativos da lei, sendo o poder o poder do soberano de produzir a lei. A lei se manifesta no poder de dizer não, de vetar algo. • Entretanto, o que aparece, segundo uma linha de pensamento que atravessa Max; Nietzsche, Weber e Foucault, é que o poder não pode se identificar apenas com o estado e a Lei. O poder é horizontal, funciona através de redes que produzem desejos, sujeitos e objetos; seria um poder positivo que produz normalização e controle. • Aqueles discursos e dispositivos que operam nos remetem a uma antropologia que está na base do discurso e dispositivo jurídico moderno e do sujeito humano universal, pensado como e livre e igual. Mas este homem é na verdade o indivíduo burguês, branco, colonizador e proprietário. Aula 02 (27/08) - Para uma sociologia crítica do direito (semana 1) Crise e crítica Essas são duas palavras importantes, de origem grega e que são muito atuais. O professor defende a tese que pode-se entender a atualidade só como crise e crítica, melhor dizendo, é como se crise e crítica constituem dois lados que ao mesmo tempo são complementares e contraditórios do presente. Tanto a palavra crise quanto a palavra crítica, derivam do verbo grego "krinein". Essa palavra significa separar, dividir mas também lutar, combater. Crise é um conceito fundamental na língua grega, pois aparece em muitas esferas do conhecimento. Na medicina, por exemplo, em Hipócrates crise indica o momento agudo de uma doença ou o momento de luta entre a vida e a morte. Já na política, por exemplo, no texto “A política” de Aristóteles, indica o momento decisivo no qual a comunidade política está na frente de um perigo e deve tomar decisões urgentes para enfrentar o perigo que a vida da comunidade. Nesse sentido, se tem um perigo e a necessidade/urgência de decidir para responder a esta ameaça da vida da comunidade política. Na teologia cristã a crise indica o momento no qual se aproxima o julgamento divino do comportamento humano para que se a decisão de quem será salvo, e quem será condenado à danação eterna. A crise indica exatamente esse momento decisivo para cada pessoa. O sentido da palavra crise consistia na compreensão da brevidade no tempo, isto significa a perssessão de uma situação como incerta e perigosa e a perssessão da necessidade de prevenir, a fim obter a salvação. A crise, portanto, nos remete a um perigo que deve ser enfrentado rapidamente/urgentemente, assim, crise nos remete a necessidade de decisão. Em 1936 (momento decisivo para Eropa. Guerra civil na Espanha é determinante para entender a 2ª Guerra mundial e o fascismo), uma importante filósofo alemão, Husserl, escreveu o texto “A crise da ciência europeia”. Para explicar o sentido da palavra crise ele usa uma palavra alemã “sauberugo???” que pode ser traduzida como desencanto ou tirar o ver que cobre a visão do mundo. O sauberugo?? é construída sobre duas palavras: ver de ilusão (necessidade de tirar esse vê-lo para entender o que está acontecendo realmente). Percebe-se que há um momento político decisivo para o mundo todo. Durkheim Adorno em 1944 escreveu o texto “A dialética do iluminismo”. No qual é dito que a razão e o projeto de nacionalização do mundo, não traz , necessariamente, emancipação; direitos e progresso como acreditava o iluminismo. Entretanto, trouxe também violencia, alienação, exploração e guerras. Nação e poder não são inimigos, mas aliados a racionalização maximiza os efeitos do poder. Para Husserl, em sauberugo, a desmitificação do mundo nos fala em ambiguidade da razão moderna e do seu projeto de emancipação. No entanto, a crítica de Husserl não chega a colocar em discussão radicalmente a razão do seu projeto, mas se trata da traição do logos da razão ocidental. Portanto, o diagnóstico da crise deve permitir uma recuperação do sentido original do logos e da capacidade do sujeito humano de fundar ordem e progresso. Para entender a problematicidade da ideia da razão moderna, e a relação desta com o poder moderno, deve-se apresentar a ideia de outro pensador. Em 1940, 4 anos depois do texto que Husserl escreve, o professor alemão Walter Benjamin está fugindo da persseguissão nazifacista. Sendo ele um intelectual de origem judaica e de orientação marxista, que durante a fuga; entre a Espanha e França, escreveu a “Tese sobre o conceito de história”. Diante da crise do estado liberal e do avanço do estado totalitário, não se acreditava mais que, na tese de Husserl, se devia recuperar o sentido da razão ocidental em sentido que tinha uma origem nobre e grega, mas trata-se de se libertar, definitivamente, de uma ideia que era comprometida com um projeto violento de civilização. Walter Benjamin na sétima tese sobre a filosofia da história, escreveu “todos que até hoje venceram, participam do cortejo triunfal que os dominadores de hoje espezinham os corpos dos que estão postados no chão. Os despojos são carregados no cortejo, como de praxe.” Esses despojos são como chamamos de bens culturais. Um materialista histórico os contempla, com distanciamento, pois todos os bens culturais que ele vê tem origem no qual ele não pode refletir sem horror. Deve a sua existência, não somente ao esforço dos grandes gênios que os criaram, como a correia anônima dos seus contemporâneos. Nunca houve um momento da cultura que não fosse também um monumento da barbárie, e como a cultura não é isenta de barbárie não é tão pouco sem o processo de transmissão da cultura. Por isso, na medida do possível, um materialista histórico se desvia dela, considerando sua tarefa estudar a história a controbelo??. Diante da barbárie do colonialismo; do facismo a crítica deve ser radical. Deve ser na altura do desafio que tem pela frente, ou seja, não pode a crítica pensar que o fascismo e o nazismo é uma exceção/ um acidente no percurso da razão e do processo de civilização moderno. O fascismo é um produto da modernidade, da racionalização e civilização moderna, não sendo negações da modernidade. Hannah arendt, dizia que aussicht não podia ser compreendido sem fazer referências aos dispositivos tipicamente modernos, como, por exemplo, a fábrica, a exploração capitalista do trabalho, a burocracia moderno e etc. Não pode considerar aussicht sem considerar como um projeto moderno, de controlar e governar o mundo, através da técnica da ciência, tinha um próprio coração trevas. Nesse sentido, o colonialismo e as práticas de exploração dos recursos naturais e humanos de controle violento da população que vivia nas colônias. Então, não pode-se considerar o processo de civilização moderno sem pensar neste coração de trevas do processo de civilização. A crítica não deve apenas entender a relação de cultura de barbárie, mas também deve entender como o processo de transmissão da cultura não isento da barbárie. A história que nos é contada é a dos vencedores, mas se refletir sobre a origem dos seus monumentos não podemos refletir sem horror, pois é uma origem violenta. Se tem duas questões metodológicas hiper relevantes. A primeira consiste que a crítica consiste na prática de escovar a história a controbelo. Retomando a ideia de nietzsche sobre a história real, a genealogia histórica dos discursos só deve ser capaz de mostrar a dimensão política dos fatos de conhecimento do mesmo sujeito do conhecimento. A segunda é que para a crítica ser não ser ingênua, tem que ser reflexiva, problematizar as condições de observação, ou seja, estamos sempre presos dentro de um discurso, um modelo social que nos determina , assim sempre temos que questionar o nosso lugar de fala.O crítico não está fora do mundo. Ele é também fala dentro do discurso, das condições de possibilidade que aquele discurso permite. Ele não está descrevendo objetivamente o mundo, pois está sempre envolvido em uma perspectiva em um discurso que lhe permite falar/pensar com determinadas categorias. Walter Benjamin fala que temos que se distanciar do processo de transmissão cultural para entender o quanto ele é comprometido com o poder. Assim, temos que problematizar a nossa própria posição de sujeito crítico, pois o sujeito mesmo é construído, ou seja, o sujeito é construído pelas condições culturais nas quais é jogado. Isso significa que nossa experiência no mundo é mediada pela cultura do discurso, pelo que dizia foucault, o discurso e a cultura indicam as condições históricas nas quais somos sujeitos. Conclui-se: se usamos essa reflexão do pensamento crítico do século XX, podemos entender melhor a crise do discurso jurídico, ou seja, essa concessão da crise/crítica nos permite entender a crise do saber sobre o direito e também nos permite entender a relação entre esse saber jurídico positivista e o funcionamento dos dispositivos do poder. Análise do texto de Foucault Foucault diz que para compreender uma formação histórica do saber e as práticas jurídicas podem ser mais importantes que os discursos científicos e filosóficos. Na página 11 do texto Foucault fala: “pareceu-me que entre as práticas sociais, em que a análise de localizar emergência e novas formas de subjetividade, as práticas jurídicas; mais precisamente das práticas judiciárias, estão entre as mais importantes.” Foucault, em uma conferência no RJ, explica que essa nova metodologia será muito importante para os estudos dos críticos. Foucault parte, nesse texto, da hipótese que o racionalismo é uma expressão da vontade de dominação através da técnica. As ciências humanas e sociais que nascem a partir do século XIX são centrais para desenvolver este projeto de assujeitamento, ou seja, o saber não independente do poder, mas saber e poder são aliados. O poder precisa de um discurso de verdade e o saberes (discursos de verdade) produzem efeitos de poder. Tal hipótese orienta toda uma série de pesquisas que Foucault desenvolverá sobre o funcionamento do concreto dos dispositivos de poder, e sobre a relação circular de saber e poder. A metodologia que permite pesquisar a entender essa relação entre saber e poder, Foucault a define como genealogia do poder. Ele está se referindo a Nietzsche, na ideia sobre a qual se funda a genealogia é iniciada nas primeiras páginas. O ambiente institucional no qual os estudos são produzidos e opera, transformam os fatos linguísticos em práticas sociais capazes de condicionar a vida real e produzir efeitos específicos de poder. Essa metodologia de pesquisa, chama de genealogia por Foucault, se apoia em três argumentos: 1. As formas de saber se formam a partir das práticas sociais: isso quer dizer que as práticas sociais determinam não só novos saberes, mas também novos sujeitos, e o próprio sujeito do conhecimento tem uma história. Foucault em 1966 escreve “ A palavra e as coisas”, e no final diz que o homem é uma invenção bastante recente, isto é, o homem como condição e objeto do conhecimento é uma invenção recente da modernidade. Nesse sentido, o sujeito do conhecimento, que Kant pensa universal, para Foucault é constituído das sociais, ou seja, (pag. 8) o sujeito moderno não é uma invenção da filosofia mas sim produzido e constituído pelas práticas sociais. 1. EX: O sujeito racional de Descartes pensa o sujeito como universal, racional e pensante. Entretanto, esse sujeito da racionalidade tem que-se excluir a loucura. Mas descartes pode pensar o sujeito como racional, pois no século XVII se tem mecanismos/práticas sociais que determinam a exclusão da loucura (textos dessa época diziam que loucos deviam ser retirados sa sociedade e colocados em um espaço fechado). 2. EX2: O sujeito normal só pode ser pensado no século XVIII e XIX, pois se tinha dispositivos disciplinares que constroem a normalidade do sujeito através de um controle dos corpos dos indivíduos. 2. O discurso não implica em relações de poder: segundo Foucault os fatos linguísticos não podem ser compreendidos só do ponto de vista da regra da linguagem, mas devem ser analisados como estratégias de ação e reação. O discurso é um conjunto de fatos linguísticos que funcionam segundo um conjunto de regras gramaticais sintáticas, mas por outro lado esses fatos linguísticos operam e produzem efeitos dentro do seu contexto institucional. E que são compreendidos dentro de um significado em relação ao contexto específico de uso, portanto o discurso é um conjunto de fatos linguísticos de um determinado nível, polêmicos e estratégico modo. Foucault reformula a análise do discurso, dizendo que não tem uma separação entre discurso e realidade, pois o discurso já é realidade e a ação imanente que produz efeitos reais. Assim, o discurso não é aquele simplesmente que traduz os sistemas de dominação como pensa o marxismo acadêmico, mas o discurso para o que é aquilo através do que se luta, e o discurso é poder que se quer conquistar. 3. Reelaboração da teoria do sujeito moderno: Foucault quer questionar o elemento central do pensamento moderno, isto é, a centralidade do sujeito. Para o pensamento moderno de Descartes a Husserl, o sujeito é a condição de possibilidade do conhecimento e da verdade. Já Kant nos diz que o sujeito é condição transcendental, ou seja, tem que pressupor a existência do sujeito para poder pensar o conhecimento e a verdade. Ainda, segundo ele, o mundo não se oferece ao sujeito como entidade ordenada e objetiva, mas é o sujeito que ordena o mundo com a própria razão. Agora Foucault, através de nietzsche e de uma reflexão do século XX, visa desconstruir radicalmente esse sujeito universal abstrato da tradição filosófica e metafísica moderna. A questão é se pesquisar como se constitui através da história este sujeito, ou seja, este sujeito não é condição transcendental (razão universal), como pensa kant, mas esse sujeito e sua razão se constituem na história. Agora pode-se definir a genealogia do poder como uma metodologia de pesquisa que visa a indagar a constituição histórica de um sujeito de conhecimento, através de um discurso tomado como um conjunto de estratégias que fazem parte de práticas sociais. Centralidade da importância do pensamento de nietzsche para ideia de genealogía A relação entre saber e poder, a dimensão política do discurso e a dimensão histórica do sujeito do conhecimento nos leva a entender porque Nietzsche é central na pesquisa de Foucault. Na “Verdade e as formas jurídicas”; P.13 de Foucault, demonstra que nietzsche produz uma dupla ruptura com a tradição metafísica moderna em relação a natureza do conhecimento. A primeira ruptura com a metafísica ocidental pertence a relação entre o conhecimento e o mundo. Para tradição metafísica entre o conhecimento e o mundo existe uma conexão, isto é, o mundo é algo que pode ser conhecido porque possui uma racionalidade imanente e assim o conhecimento humano pode conhecer o mundo na sua realidade, pois o logos(razão) é imanente à natureza humana. No texto de Nietzsche “A Gaia..” P. 109., diz que o conhecimento pode ser espelho verídico da realidade e somente temos garantias da condição entre o conhecimento humano mundo, ou seja, uma referência transcendental que não se assegura sobre a possibilidade do homem conhecer o mundo e de o mundo ser conhecido pelo homem. Em outras palavras só se acreditamos em Deus. Foucault escreve na p. 18 do texto, o que efetivamente na filosofia ocidental assegurava que as coisas a conhecer e o próprio conhecimento estão em uma relação de continuidade. O que assegurava o conhecimento de conhecer bemas coisas do mundo e de não ser indefinitivamente erro, ilusão, arbitrariedade era Deus. A segunda ruptura que Nietzsche opera pertence a relação entre conhecimento e a natureza humana. Para a tradição filosófica antiga e moderna o conhecimento é algo natural e um instinto próprio da natureza humana o homem é a o mesmo tempo natureza e cultura. Corpo e anima, nos diz aristóteles em um primeiro livro de “ A política”, com a expressão “ao homem pertence a razão” , que o homem é o único ente que participa da natureza através da razão e, portanto, a razão é natural. Destoando da tradição filosófica, Nietzsche nos diz que a razão não é natural, a humanidade é uma espécie natural entre outras. Pode-se perceber a radicalidade deste pensamento antimetafísico que está destruindo toda uma tradição metafísica teológica do pensamento ocidental. Uma vez que o Copérnico demonstrou que humanidade não está no centro do universo, uma tese que é contada em toda espécie vivente., com Nietzsche perde justificação e fundamento metaempírico. Para Nietzsche o conhecimento não é algo natural , mas é algo que é produzido por uma luta entre os instintos. O conhecimento é determinado pela vontade de dominar as coisas do mundo. Nesse sentido, esse sujeito ,que é invenção da filosofia moderna, não existe mais. Foucault escreve nas págs. 19 e 20 do texto sobre essa tese de Nietzsche. Conclui-se: para Foucault, Nietzsche nos permite entender que se realmente quisermos compreender o conhecimento, devemos compreender quais são as relações de luta e de poder. E somente nessas relações que compreendemos no que consiste o conhecimento. Nietzsche inaugura uma história política do conhecimento. Outra questão importante para nós pensarmos na possibilidade de uma crítica auto reflexiva, é problematização universal e objetivante do conhecimento. O conhecimento não é necessário, pois não pertence a natureza humana e porque não algum Deus para fundar a relação com o mundo para conhecer. Isto significa que o conhecimento é contingente, é um evento e não é universal, mas pertence a ordem do acontecimento. Pode-se dizer, então, que o conhecimento é uma interação entre duas realidades espaço temporais (o indivíduo e seu ambiente. Agora pode-se entender o que significa o conhecimento como perspectivismo. Perspectivismo não significa reconhecer como acontece na filosofia de Kant, no qual o conhecimento humano é limitado. Nietzsche com perspectivismo quer dizer que o conhecimento é sempre uma relação estratégica em que o homem é situado. Então o caráter perspectivo do conhecimento não deriva da natureza humana, mas sempre do caráter estratégico e polêmico do conhecimento. Foucault diz isso na pág 25 do texto. A questão do conhecimento é importante, pois essa nova ideia do conhecimento nos permite pensar uma sociologia crítica. E essa sociologia crítica significa reconhecer o caráter perspectivo do conhecimento. Foucault diz que o conhecimento implica em uma posição estratégica e que ele acontece porque há batalhas. A segunda questão importante, é que para se pensar em uma sociologia crítica do direito ela deve ser reflexiva e tomar distância desse processo de transmissão cultural no qual se falava na tese 7 da filosofia da história. Essa questão do conhecimento na análise de Foucault e Nietzsche é importante pois permite a ideia de discurso jurídico moderno. A sua pretensa neutralidade, objetividade se manifesta no saber jurídico do jurista (que parte da ideia de que o direito é um fato, mas atribui nesta fato um valor para ser fato que é o direito positivado). O pensamento sociológico crítico deve questionar quais são as condições que permite a produção deste fato. Assim, Foucault e Nietzsche podem ser assumidos como os pensadores que nos permitem elaborar e pensar uma sociologia crítica do direito, e a partir de agora, com essas premissas, pode-se analisar o discurso jurídico moderno. Unidade II Aula 03 (01/09) - O direito moderno e a construção da ordem social (semana 2) Essa unidade tem o objetivo de apresentar o núcleo teórico, jurídico e político em torno do qual foi construído o discurso da modernidade. Quer se analisar criticamente esse discurso e os dispositivos com os quais ele torna-se operativo. Trata-se de um discurso complexo que vai se envolvendo em um arco temporal bastante longo (da metade do século XVII até o final do século XIX). A partir do século XVII começa um processo definido como processo de diferenciação social, no qual é determinado por uma multiplicidade de fatores sociopolíticos e socioeconômicos que permitem a política de se diferenciar da religião, de se autodescrever como ciência da construção racional da ordem social. Nesse sentido, o direito permite se autonomizar de referencias externas, como o direito divino, o direito canônico e o direito natural, de modo que o único direito será o positivo, Isto é, o direito posto pela autoridade política. O processo acima é lento, terminando com a positivação do direito público e privado no final do século XVII e começo do século XIX. Esta dupla diferenciação da política e do direito, de um fundamento transcendental, permite pensar a política fundada sobre o direito, ou seja, a autoridade é política e legítima quando é autorizada pelo direito. Assim, permite pensar o direito fundado na decisão política do soberano, ou seja, o direito é a expressão da vontade do soberano, e esta se manifesta na forma da lei. Entre o fim do século XVIII e começo do século XIX realiza-se a positivação do direito público e privado, entre estado e direito estabiliza-se uma relação circular. O estado produz o direito, e esse direito produzido pelo estado legitima o estado como estado-direito. A lei absorve cada dimensão do direito nessa representação do discurso jurídico da modernidade e a política se resolve completamente na figura do estado territorial, esta, que no final do século XVIII se configura como estado nacional. Em outras linhas, a lei é igual ao direito e a política é igual ao estado. Se tem algumas consequência dessa modalidade de pensar que começa com o pensamento jusracionalista no século XVII, Como: 1. O direito é pensado como instrumento técnico: portanto, instrumento apolítico de neutralização do conflito entre os indivíduos. 2. A política é o espaço pacificado, isto é, o conflito foi neutralizado através do direito e delimitado pelas fronteiras estatais. 3. O direito é a negação da violência: o direito neutraliza a violência individual através da inclusão da violência na ordem do direito como legítima, ou seja, a única violência permitida é a do estado. 4. O direito funda o monopólio legítimo: O estado é o único sujeito político que detém o direito do uso da violência, mas nos limites estabelecidos pelo próprio direito. Modernidade como crise e como crítica O professor começa a aula com 2 proposições. “Silete teologi in munere alieno” (Alberico Gentilili). “calam-se teórico, porque vocês não são competentes”. Os teóricos não são competentes em questões que pertencem a política moderna. Esse autor está colocando uma questão fundamental, que é a modernidade sendo crise dos valores tradicionais e como o processo de diferenciação entre a política e a religião/ entre o direito e a religião. “Deus é morto” (nietzsche). Ele quer dizer que os valores tradicionais são superados, poiis eles não mais orientar o mundo, de julgar os comportamentos dos outros. Modernidade como desencanto Desencanto significa desdivinização do mundo, ou seja, Deus só pode sobreviver desaparecendo. Passagem da Veritas (verdade) a auctoritas (decisão política): a política não deve mais se fundar na verdade, ou seja, em princípios incontroversos, mas sim na auctoritas, ou seja, na autorização no consenso. Passagem da argumentação religiosa a matemática e a ciência da natureza:o saber político deve tornar-se ciência, segundo os novos cânones da ciência Galileana. A modernidade pode ser entendida como secularização das categorias políticas e jurídicas modernas e dos valores tradicionais. Secularização significa que as categorias religiosas se transformam produzindo um deslocamento do sagrado ao secular. Max Weber, retomando uma ideia de Nietzsche; segundo a qual a modernidade se manifesta com a morte de Deus, afirma que a secularização consiste em uma descristianização (eliminação do sacro, ou seja deus desaparecer) do mundo. Modernidade como neutralização A partir dessas considerações no slide pode-se entender um outro e complementar significado de secularização, a secularização como neutralização. A única via para resolver o problema das guerras dos conflitos religiosos era construir uma ordem social que fosse fundada sobre um método argumentativo racional. E a argumentação religiosa deveria ser substituída pela matemática e pela ciência natural, a fim de construir um espaço político neutralizado (espaço físico onde a vida não fosse ameaçada pelas condições religiosas). Através dessas categorias pode-se entender a diferença entre, um modelo antigo pré moderno do poder estado e um modelo moderno do poder do estado e do dire Modelo Teleológico Medieval Pode-se dizer que nesse modelo o horizonte é a necessidade. Se tem um problema que é a mediação entre a transcendência e a imanência. Esse problema acima vai ser solucionado politicamente, império sacro romano, e a solução teológica/religiosa é através do Papa e a igreja católica. O que quer dizer necessidade? A ordem é natural, essa afirmação é encontrada no primeiro livro “A política” de Aristóteles e tem como consequência que cada entidade é como é por natureza, e não pode ser diferente como é. Isto significa, que a diferença entre os homens são naturais, assim, a ordem política deve reproduzir as diferenças naturais. Nesse sentido, há uma diferença natural entre homem e mulher, sendo assim a ordem política, para Aristóteles, deve reproduzir essas diferenças naturais. Problema da Transcendência/Imanência: Solução para o problema teleológico: Para resolver o problema entre Deus e o mundo, tem que acontecer uma mediação. E quem vai mediar o problema entre a transcendência e imanência é Cristo. Cristo é Deus que se torna homem, sendo ele a auto mediação da transcendência que se torna imanente. O sacrifício de cristo permite a constituição da igreja como unidade de fiéis. O Papa é o representante de cristo e assegura a mediação; a comunicação entre Deus e os homens. Solução para o problema Político: A mediação política entre transcendência e imanência acontece através do papa e do imperador. Isto quer dizer, que o Papa e o Imperador são, ao mesmo tempo, figuras religiosas e políticas. O Papa tem um poder temporal, mas este está fundado em uma dimensão religiosa. O Imperador e o Papa são instrumentos da comunidade cristã na terra e o seu poder é sagrado. A Igreja e o Império são as duas autoridades que fundam a ordem teleológica-política medieval. Solução para o problema jurídico: Tem-se uma lei divina, uma lei de natureza e uma lei positiva. A lei positiva deve ser fundada sobre a lei de natureza e esta parte da lei divina que o intelecto humano pode entender. Para concluir o ponto de transcendência e imanência, o ponto de partida para definição do novo método, para enfrentar a questão, e que ordem política no mundo moderno não pode ser construída com referência à transcendência, ou seja, um conjunto de princípio super trans-humanos. A questão em jogo da ordem política pré-moderna não é mais a verdade e a justiça, mas forma pelo quais os instrumentos são possível alcançar a segurança dos cidadãos. A sociedade torna-se uma construção totalmente imanente, ou seja, os princípios da sua constituição não são externos a sociedade, mas sim internos. A partir desta base, é possível elaborar uma metodologia objetiva e neutra capaz de indicar as regras necessárias para construção da ordem jurídica e política. Esta imagem pode ser usada para representar o modelo político pré moderno. Aqui se tem três níveis, o primeiro (mais alto) são as virtudes que inspiram o bom governo teológicas (Fé,caridade e esperança - Manifestações de Deus) o saber divino. No segundo, ali no meio, se tem as constituições da comunidade (Justiça - que é inspirada pelo saber divino. E no outro lado a justiça comutativa que está distribuindo os critérios de medida aos comerciantes), as virtudes não teológicas (paz, fortaleza, prudência, governo da cidade, generosidade, temperança e a justiça). E no nível mais baixo se tem a comunidade da cidade e o exército. O bom governo se dá na coordenação dos três níveis. Quando se tem um bom governo a cidade funciona perfeitamente, sem conflitos e com acordo entre as pessoas que vivem na cidade. O mau governo que é tirano representado no centro do afresco como um monstro. A justiça ali embaixo está presa (não pode funcionar, pois o tirano não aceita que ela funcione), se tem os vícios capitais (Avareza, soberba e vaidade) ali em cima ao redor do tirano. No mesmo nível do tirado se tem a crueldade, a fraude e a dinição?? Esta representação do Afresco, nos mostra como o modelo político e ao mesmo tempo uma ordem teológica, e só pode funcionar na medida que as diferenças naturais podem ser reproduzidas no nível político. Isto significa, que cada pessoa pode fazer aquilo que por natureza é a sua tarefa (o comerciante deve ser o comerciante, o governador o governador e etc.), e quando todos estiverem respeitando isso a política pode funcionar, quando alguém não estiver agindo com as virtudes teológicas e não teleológicas (Atitudes seculares) se terá um mau governo. Crise Teleológica do modelo político medieval É uma crise teleológica que se transborda com a reforma evangélica de Lutero e com as guerras religiosas. E uma crise política que se dá com a queda do império romano e formação do estado moderno. Esta mediação, no nível teológico, é posto em discussão com a reforma protestante. Lutero recusa a reconhecer no Papa a função de mediador entre a Terra e céu, afirmando que se tem uma relação direta entre fiel e Deus. O modelo político entra em crise quando o império sacroromano, centrado no direito romano e canônico, acaba por começa a questionar a figura do imperador e Papa. O horizonte no qual se apresenta o problema da mediação entre transcendência/imanência, é o da contingência. Isso significa que a ordem política não é natural (precisa ser construída), mas sim o problema, pois se tem as guerras e os conflitos produzidos pela teologia e pela religião. A partir do exposto acima, o problema agora é como sair desse conflito político e construir uma ordem racional, na qual todos os indivíduos; com suas orientações religiosas diferentes podem se encontrar. A solução aqui não é mais o Cristo, o Papa ou o Imperador, mas sim o estado territorial e a mediação através do sujeito racional. Contingência quer dizer que não existe uma ordem política natural. No primeiro livro “A política” de Aristóteles, ele pensava a ordem jurídica como natural, ou seja, o homem é um animal político, logo, a dimensão política está presente na natureza humana e, portanto, a ordem política é uma ordem natural que está escrita na natureza humana. Entretanto, contingência, nesse momento histórico; com as guerras religiosas; demonstra que não existe uma ordem política natural. A ordem torna-se o problema, ela não está na natureza,deve ser construída. A ordem é artificial, sendo algo que os indivíduos devem construir. Como se pode construir uma nova ordem política, uma pluralidade de indivíduos construir uma autoridade política que permita aos indivíduos viver com segurança ? Ela deve ser construída através da razão, que é o novo medium. E esta razão deve ser realizada pelo sujeito, e este deve fazer com a sua ação ordenante e projectante para produzir a imagem racional do mundo. Em 1644 Descartes, publica “As meditações filosóficas”. Hobbes, em 1651, publica “ O leviatã”. Nesses dois textos, a figura central para construir a ordem racional do mundo é o sujeito. No caso de Descartes é o sujeito do conhecimento, que parte de si mesmo, do próprio pensamento, ou seja, da consciência que o ser pensa “Penso, logo existo”. Descartes disse que uma vez que a existência do sujeito é fundada, ontologicamente e justificada, o sujeito torna-se missão transcendental para pensar a ordem. No caso de Hobbes é o sujeito jurídico e político é o resultado da construção racional do sujeito. A consequência deles para o direito natural e positivo, são os significados: Recta ratio (razão), natureza e a ordem. A razão na modernidade tem um novo significado no pensamento jurídico, político e filosófico para os pensadores do século XVII e XVIII. A razão não indica mais a faculdade com que aprendemos a verdade evidente dos princípios primeiros, mas indica, agora, a faculdade de raciocínio, de pensar. Razão é uma ação instrumental, que através dpo conhecimento do objeto, é capaz de escolher o instrumento/estratégia para alcançar o escopo que se quer alcançar. A ruptura da unidade teologicamente vai determinar que a ordem política não é natural, não tendo na natureza a ordem social e política. Portanto, a ordem não é o ponto de partida, mas o ponto de chegada. O problema é como construir uma ordem artificial da coexistência pacífica civil. Apesar das diferentes posições, há um ponto em comum a todos os pensadores jusracionalistas: a natureza é a ausência de ordem. Sendo a lei e o estado artificialidades necessárias para superar uma condição de indiferenciação. Nesse slide se tem a apresentação das diferenças entre o modelo antigo e o modelo moderno. No modelo medieval se tem um espectador, no sentido que a ordem é uma ordem política, que é natural, ou seja, somos espectadores de uma ordem que já existe e a única coisa que os indivíduos têm que fazer é observar e descobrir uma ordem que não aparece e não é evidente, mas deve ser descoberta (temos que ser filósofos, mas essa ordem divina já está presente no mundo, só tendo que descobri-lá/ o homem não cria nada, mas sim Deus). Na modernidade se tem o ator, que é um sujeito que está construindo o próprio destino com raciocínio/razão. O horizonte é a necessidade no mundo medieval, isto é, a ordem é presente na natureza e não podemos escolher nada, assim temos que nos entender a ordem do mundo. Já no mundo moderno o horizonte é a contingência, isto é, as coisas podem ser diferentes de como são , assim, as diferenças naturais não são determinantes e que a ordem política não tem, necessariamente que reproduzir as diferenças naturais. O modelo político medieval, tem uma concessão do tempo que é imovél. Isso se dá, pois as mudanças não são possíveis, já tem uma ordem que já está na realidade das coisas, assim, a temporalidade não pertence aos homens, mas sim uma dimensão transcendente. Já no mundo moderno se tem a mobilidade, que se tem um conceito de tempo que implica na transformação das coisas. A mobilidade é social, os homens podem ser diferentes de como são. Ciência política moderna A situação é uma situação de guerra/conflito. A questão é como sair desta situação, e como fundar pressupostos para uma convivência pacífica entre os indivíduos? a resposta já figura um método de pensamento. É necessário que os homens sejam livres e iguais e sejam pensados a partir de uma condição abstrata, em que as diferenças naturais não contém mais. Então a perspectiva moderna quebra completamente a imagem da antropologia e da política aristotélica, na qual os indivíduos são diferentes e a ordem política para ser tal deve manter as diferenças naturais. Já a ordem política moderna é uma ordem artificial/construída e a racionalidade que funda essa nova ordem política está sempre ameaçada. 1.A origem do estado é o estado de natureza, 2.que é um estado não político e contra político (na natureza não tem uma ordem política, sendo política - construção artificial da ordem - e natureza - ausência de ordem- conceitos contrários. 4. liberdade e igualdade são as condições naturais, nas quais se encontram os indivíduos no estado de natureza, produzem o conflito. Isso se dá, pois não tem um indivíduo mais forte que o outro, assim, não tem um grupo por natureza, que possam governar sobre outros indivíduos. 8. Assim tem que se se construir uma autoridade política artificial, para superar a situação de conflito na qual se encontram os homens, isso se dá pela passagem do estado de natureza para o político por meio de acordo voluntário. Aula 04 - Direito e Estado (semana 2) “O leviatã” foi publicado em 1651 em inglês. A publicação nessa língua foi pensada por Hobbes para a construção do estado nacional territorial. Esse slide representa a capa da primeira edição do livro. Aqui, lá em cima, já pode ser ler que não tem nenhuma autoridade na terra que pode ser comparada ao poder deste monstro, e assim se expressa Jó na Bíblia. Aparece, também, um grande homem composto por indivíduos iguais, não mão direita uma espada (símbolo do poder temporal) e com a esquerda o pastoral (símbolo do poder religioso). Então, este homem grande está em posição de proteção da cidade e do território que está ao redor dele. A questão para Hobbes, é eliminar todos os poderes concorrentes dos poderes estatais. O primeiro a ser eliminado é o poder temporal da Igreja católica. Todas as representações do estado são grandes. No capítulo XVII Hobbes analisa a origem do estado, que é um contrato através do do qual os indivíduos entram em acordo para constituir uma pessoa jurídica, ou seja, uma pessoa artificial que possa representar; de forma unitária; a multidão. Pode-se ler na página 147 “A multidão unida em uma só pessoa, chama-se República...”. Com esta imagem do grande homem Hobbes apresenta o estado, este para ser tal deve ser constituído pela vontade de todos os indivíduos, mas ao mesmo tempo deve transcender a singularidade dos indivíduos e concentrar o poder temporal e espiritual. Analisando mais analiticamente essa imagem, pode se ver que o corpo deste monstro é composto por indivíduos todos iguais. Como a representação do bom governo de Lorenzetti, no medievo, é a imagem do bom poder. A capaz de Hobbes pode ser pensada como a representação do modelo político e jurídico moderno, ou seja, a ideia desta imagem é que o poder do estado é constituído pelas vontades dos indivíduos todos iguais. A ordem moderna pode ser construída, racionalmente, só na medida em que pensamos a ordem como artificial. E como construir essa ordem? para Hobbes é a partir de uma análise da natureza humana. Então para Hobbes, que queria usar a nova ciência que estava se formando no final do século XVI, é necessário analisar analiticamente a natureza humana. Assim encontra-se uma natureza uma composta por: Paixão e Razão. Até aqui não se tem nada diferente no discurso de Hobbes. Até Aristóteles já dizia que a natureza humana por um lado era composta por razão e por outro por paixão. A novidade no discurso Hobbesiano é que a natureza humana determina a igualdade dos indivíduos, que são livre e iguais. Essa liberdade e igualdadedos indivíduos determina uma ideia a antropologia negativa. Pode-se ler no texto de “O Leviatã”, no capítulo XII, p. 106, “é intitulado da condição natural da humanidade, relativamente, a sua felicidade e miséria”. Este capítulo Hobbes explica a sua ideia de homem da natureza humana, pois ele acha que a natureza humana produz os conflitos entre os indivíduos. E isso deve ser superado através da construção/artifício político. “A natureza fez os homens iguais, quanto a faculdade do corpo e espírito, que embora por vezes encontram a vezes um homem…” (P. 106). Aqui quer dizer que o homens em um estado de natureza encontram-se em uma situação de igualdade. E ele ataca a imagem do homem aristotélico, da imagem da antropologia antiga, na qual diz que os homens nascem desiguais e que algum homem tem que governar os outros. Nesse sentido, o governo deveria refletir as diferenças naturais, pois já natureza os homens são diferentes (há pessoas inteligentes e não inteligentes), e Aristóteles; no livro “A política” chegou a dizer que os escravos é escravo por natureza, não podendo fazer funções que uma pessoa mais forte pode fazer. Hobbes está quebrando essa imagem da ordem política medieval com uma ordem natural. Ele diz que os homens são iguais, tanto na inteligência, quanto na força física. Assim não se justifica uma diferença entre as pessoas que comandam e as que servem. Este discurso sobre igualdade de Hobbes tem um problema, pois ele está usando esse discurso de igualdade natural dos homens para chegar a uma antropologia negativa. “Desta igualdade, quanto à capacidade deriva a igualdade…” (P.107), então a igualdade natural dos homens é a causa do conflito entre eles. A antropologia negativa significa que a natureza humana é composta por paixão e razão. Para se entender a questão da paixão, no contexto do horizonte da modernidade, como contingência. Assim, não se tem uma autoridade natural, os homens são iguais e, portanto, querem obter os bens necessários para viver. Por isso entram em conflito um com outro. O desejo de alcançar os bens é produzido pela falta de recursos e pela necessidade, ou seja, o medo da escassez produz no humano o desejo de possuir. As paixões em Hobbes se tem uma produtividade política, isso quer dizer que ele quebra com o pensamento tradicional. No pensamento medieval as paixões não tem nenhuma produtividade política, sendo manifestações do espírito animal do homem, assim devem ser reprimidas/disciplinadas para acessar a política como racionalidade. Hobbes pensa diferente, dizendo que as paixões têm uma produtividade política, pois através das paixões o sujeito humano pode entender qual é a sua condição no estado de natureza. Neste modelo Hobbesiano, o desejo é uma vontade que se manifesta com o desejo humano em mundo contingente (caracterizado pela escassez de recursos). É uma vontade sem fim, ou seja, que constantemente quer alcançar os bens. As paixões são causa de conflito, que tem seus objetivos, com o ganho, viver em condição de seguridade e obter uma boa reputação. Entretanto, todos esses objetivos produzem, no estado de natureza, conflito entre os indivíduos. O ganho produz a competição, a seguridade a desconfiança e a reputação gera conflito para obter a glória. Na pág. 108 do Cp 13, Hobbes escreve: “Além disso os homens não tiram prazer algum da companhia de um dos outros…” essas palavras de Hobbes apresentam uma ideia negativa do homem no estado de natureza. O estado de natureza é um estado de guerra de todos contra todos, e a guerra não é uma guerra real, mas também o medo da possibilidade que aconteça a guerra. E essa possibilidade que aconteça guerra é produzida pela falta de autoridade política. No estado de natureza tem apenas indivíduos iguais, com a mesma força e inteligencia, que brigam para alcançar os bens necessários para viver, No entanto, nessa situação de estado de natureza os bens para viver são poucos, assim a guerra é produzida para para possuir os poucos bens que existem no estado de natureza. As funções da paixão, no discurso de Hobbes, é ao mesmo tempo positiva e negativa. O homem no estado de natureza entende que sua situação é de contingência; perigo constante; conflito. E para sair dessa situação conflitual do estado de natureza temos que raciocinar., ou melhor dizendo nas palavras de Hobbes, constituir uma autoridade política em que todos os indivíduos possam viver em paz. Na Pág. 111, Hobbes diz: “esta guerra de todos os homens contra todos os homens, isto também é consequência que nada pode ser injusto…”. As paixões tem uma função negativa e uma positiva. Negativa, pis produzem conflitos, guerras, inseguranças e risco de perder a vida. Positivas, pois se faz raciocinar para sair de uma situação de conflito. É interessante o nominalismo de Hobbes, que ele fala na p. 111. Que quando não tem uma autoridade política não tem lei, e quando não tem esta não há justiça. Então, Hobbes está antecipando o positivismo jurídico. O medo é a paixão mais importante no discurso de Hobbes. Toda a política moderna, como construção da ordem estatal, é uma política que se constrói através do medo. Isso no sentido que a origem do estado e o medo, e ao mesmo tempo o estado deve reproduzir o medo para governas. Aqui se tem uma dupla natureza dessa ideia acima, por um lado é dispositivo racional (os indivíduos são iguais, se encontram em uma situação de conflito e pretendem sair desta situação através de um contrato que constroem um acordo de todos: a autoridade política). Por outro lado se tem um coração de trevas, no qual o medo é fundamental para constituir o estado, e uma vez que o soberano é constituído tem que se manifestar em toda a sua potência. O sujeito instintivo é um sujeito dominado pelas paixões, estas que tem uma função positiva (permitem o homem, no estado de natureza, de entender a necessidade de construir uma autoridade política através da qual é possível viver em paz). Então, a paixão permite que se entenda a necessidade como sair desta situação de conflito. A razão moderna é instrumental, não significando mais aprender os princípios primos, mas sim conhecer o objeto. Uma vez que se funda o objeto pode-se pensar nos instrumentos necessários para alcançar os objetivos. As paixões permitem ao sujeito a entender a necessidade de disciplinar as paixões. Se tem as paixões, que são as causas do conflito e a solução do conflito, pois permitem ao sujeito de entender a necessidade de fundar uma autoridade política. As paixões inclinam ao sujeito um comportamento natural. que é conflitual, e a razão sugere a esse sujeito de sair da situação do estado de natureza. Hobbes tem uma concessão das leis da natureza bastante inovadora a respeito da posição dos outros jusracionalistas do século XVII. As leis da natureza são aquelas que sugerem os meios necessários para sair da situação de conflito. A primeira lei é procurar a paz e segui-la, a segunda é renunciar aos direitos naturais em condições de reciprocidade e a terceira é cumprir os pactos. As duas primeiras leis são analisadas por Hobbes no capítulo XIV do “O leviatã”. Neste capítulo Hobbes parte de uma distinção entre o direito e a lei: “o direito da natureza é a liberdade..”. Nesse passagem, sintetizando as palavras de Hobbes, o homem de natureza é orientado pelo fim de conservação da vida, assim ele tem que usar a própria liberdade para alcançar este objetivo. Mas a lei é algo que determina a limitação dessa liberdade. Hobbes quando pensa o direito como liberdade, e esta como ausência de impedimento, está pensando nos termos da tradição liberal. Ao contrário, a lei é algo que determina um limite a estaliberdade. O direito é a liberdade de fazer aquilo que a natureza humana consegue fazer para alcançar os objetivos próprios da natureza, ou seja, a proteção da vida. A lei da natureza sugere quais são os instrumentos para sair de uma situação conflitual que é produzida por uma liberdade sem limites. 1ª Lei - Buscar a paz e segui-la: “Consequentemente é uma regra geral da razão, que todo homem deve se esforçar pela paz, na medida em que tenha esperança...”(Page.113). 2ª Lei - “Contratar para obter a paz dessa lei fundamental da natureza mediante a qual se ordena todos os homens que se esforçam para conseguir a paz…” (Pag 113). A primeira leis diz que deve-se procurar a paz, e para procurá-la temos que renunciar a nossa liberdade ilimitada, pois é esta que determina uma situação de conflito e, assim, entrar em um estado político. A 3ª Lei da natureza é analisada por Hobbes no cap. XV -“Pacta Sunt Servanda”. Hobbes tem uma ideia de justiça moderna, completamente diferente da ideia que tinha os clássicos, os gregos, os romanos. “Nesta lei da natureza, cumprir os pactos, reside a fonte da origem da justiça, porque se um pacto anterior não há a transferência do direito…” (pág 116). Hobbes está falando que a justiça é uma questão nominal, tendo uma concessão minimalista, ou seja, é justiça o comportamento que está realizando um pacto e injusto um comportamento que realiza um pacto. Entretanto, se não temos um acordo não se pode ter uma justiça, pois não se pode ter uma violação do pacto. E a justiça é conformidade a lei, e esta que é produzida sobre a medida no qual se tem uma autoridade política legítima. “E, portanto, que as palavras justo e injusto possam ter lugar é necessária alguma espécie de poder coercitivo...”. Hobbes diz aqui, que probidade e justiça só podem acontecer no estado político, quando se tem uma autoridade capaz de fazer, com a força, um terror para respeitar os pactos. A ausência dessa autoridade não tem lei, não tem justiça, não tem autoridade capaz de distinguir o certo do errado. Através desse dispositivo racional, Hobbes justifica; a partir de uma condição de contingência, a necessidade da autoridade política. E esta é uma autoridade racional, pois permite a cada indivíduo entender em paz. A leis da natureza são leis universais, pois são impulsos universais de limitar o direito particular de cada um para permitir sua sobrevivência. Então, se renuncia ao próprio direito natural para re-obter esse direito no estado político. Leis naturais não são de verdade, pois ainda não se tem uma instituição política capaz de fazer observar as leis com o uso da força. Assim são teoremas que sugerem o que o homem da paixão deve fazer para sair dessa situação da natureza e construir a autoridade política. A formulação que Hobbes usa do pacto, que pode ser lido no cap XVII de “O leviatã”, é a seguinte: autorizo e transfiro meu direito de governar a mim mesmo, a este homem ou assembléia de homens. Então, o pacto de Hobbes é a multidão dele fazer construir essa autoridade. Nesse sentido, o soberano é uma pessoa jurídica e uma ficção não existe realmente, sendo algo construído através do acordo da multidão. Este pacto produz, ao mesmo tempo o povo e o soberano. Eles não existem antes do pacto, existindo apenas a multidão dos indivíduos. Depois do acordo entre a multidão (pacto) é que produz o soberano e o povo (artifício político). Hobbes está construído o que será a representação da política moderna. Neste slide, pode-se ver os termos com quais funciona a representação política moderna. Se tem a multidão, que a dos indivíduos, que decide todo o processo racional de sair da condição de conflito e, assim, faz um pacto. Com este se produz povo e soberano. Estes que são ligados através de uma relação de representação. “O soberano é uma pessoa…” (Pag 116): aqui Hobbes quer dizer que o soberano é apenas um representante do povo. E este é o soberano são ao mesmo tempo pelo pactum que a multidão decidiu fazer. Essa é a ideia que funda o estado moderno como estado representativo. Conclui-se que podemos entender como este estado moderno, que se está construindo lentamente sobre a crise do modelo político pré moderno, encontra seu fundamento no indivíduo, que na sua singularidade funda a autoridade política. Esta encontra a sua justificação no consenso da pluralidade dos indivíduos. Aula 5 - Envio de Dúvidas. Aula 7 - Aula síncrona Aula 8 - A positivação do direito moderno e a construção da autonomia da categoria jurídica (Semana 4) Por diferenciação do direito entende-se um processo que começa com a formação do estado moderno, no século XVII, e se realizar completamente com a positivação do direito público e privado, no século XIX. É um processo histórico que nos conduz à consideração do direito positivo, ou seja, o direito posto pelo estado seguindo? específicas normas jurídicas é o único direito válido. Do ponto de vista teórico o processo de diferenciação começa com a reflexão do jusracionalismo no século XVII, ou seja, dos teóricos políticos; como Hobbes que pensa teoricamente na contingência dos conflitos que atravessam a Europa, com o estado. Este processo continua com a reflexão de Kant e do positivismo jurídico no século XIX. Kant e o positivismo constroem a categoria jurídica e a norma jurídica como diferente das outras normas sociais, sendo autônoma e independente Esse processo chega a sua máxima elaboração com a reflexão da dogmática jurídica do final do século XIX e da teoria pura do direito no final do século XX. Elas tentam fundar, teoricamente e metodologicamente o saber jurídico com o saber técnico. Entretanto, se aqui podemos individualizar algumas características deste processo e do discurso que o sustenta, ao mesmo tempo tem que se observar que não se trata linear, identificado as rupturas e diferenças, ou seja, há diferenças entre Hobbes; Kelsen e Kant. Se tem uma relação circular entre o discurso e os eventos. Os eventos, na singularidade deles, permitem o discurso, este que é condição de possibilidade dos eventos (da significação dos eventos dentro de um contexto de sentido?). Cada evento é resultado contingente de uma pluralidade de relações sociais entres as quais acontece e que ao mesmo tempo contribui a produzi-la. É com essa condições metodológicas que podemos pensar tanto nas continuidades, que nos permitem analisar Hobbes; Kant e Kelsen falar em discurso jurídico moderno, quanto pensar nessa continuidade como as rupturas; as passagem epistemológicas; as históricas e políticas que cada pensador apresenta. A positivação do direito moderno e a construção da autonomia da categoria jurídica Aqui, em particular, queremos analisar o processo de positivação desde uma dupla perspectiva teórica e prática. Perspectiva teórica: quais são os efeitos da positivação no âmbito da reflexão sobre o direito? A reflexão de Kant permitirá entender como o discurso jurídico da modernidade vai se especificando metodologicamente e teoricamente. Até pensar o direito como reflexão científica e a categoria jurídica como um objeto; com características próprias diferentes de outros objetos normativos. Perspectiva prática: A diferenciação do direito se realiza historicamente com a constitucionalização do direito público e a codificação do direito privado. O direito se torna lei do estado, a codificação, apesar de acontecer contemporaneamente em todos os estados e países, indica o momento de afirmação do estado moderno como modelo da política moderna e do direito. E o direito é identificado com a lei como forma de regulação da política. A ideia da aula 6 é passar que a positivação é um evento que determina grandes mudanças na modalidade de pensar e praticar o direito, na relaçãode política e direito e no funcionamento das instituições políticas e jurídicas. Começamos a analisar a positivação desde uma perspectiva prática, ou seja, em relação aos efeitos que determinam o funcionamento das instituições políticas e jurídicas. O direito a partir da positivação internaliza o próprio fundamento de validade. Em Hobbes, apesar de ser um antecipador em muitos aspectos do positivismo em relação aos outros pensadores da tradição jusracionalista moderna, o fundamento do direito permanece externo ao direito, o fundamento da lei do soberano está, ao final, em uma norma racional; tendo a necessidade de proteger a vida. Sendo a proteção da vida um princípio racional que funda, tanto o poder de fazer a lei, quanto a obediência dos súditos. A ordem política é pensada como contingente, ou seja, resultado artificial de uma decisão dos indivíduos. Ao mesmo tempo essa ordem artificial e contingente encontra sua justificativa em um princípio externo que pertence a ordem da necessidade: a razão. Com a positivação o fundamento do direito é o direito. O direito se libera da necessidade de encontrar um fundamento externo. Nesse sentido, o que importa é que o direito seja produzido nas formas indicadas pelo próprio direito. Positivo deriva do latim “Postum(?)”=posto, ou seja, é direito só o direito posto por uma autoridade autorizada pelo direito a produzi lo nas formas indicadas pelo direito. Desta forma, o direito pode ser pensado como autônomo da política e da decisão política. Esta última pode ser pensada como legítima quando está conforme o direito. A juridicização/constituição das decisões políticas permite uma separação que ao mesmo tempo implica uma relação e uma colaboração constante entre política e direito. A constituição fala da origem política do direito, dizendo que este como valor/norma/dever ser tem uma origem factual;histórica no poder constituinte. Este que pode ser uma revolução/uma guerra, mas uma vez que essa unidade política é constitucionalizada a separação entre política e direito é instituída, consequentemente, a origem política e factual tem que ser esquecida e ocultada para poder pensar o direito na sua autonomia e construir uma ciência do direito autônoma pensada como metodologia da construção da racionalidade interna ao sistema normativo. Isso tudo significa que agora os órgãos políticos do estado podem produzir direito respeitando as condições indicadas pela constituição. Outro efeito da positivação é que o direito positivo é, ao mesmo tempo, variável e estável. Nesse sentido, o direito positivo institucionaliza as condições da própria variabilidade e ao mesmo tempo se apresenta como direito válido, ou seja, resistente a mutação. Isto significa, que o direito positivo é variável e contingente, pois é resultado de uma decisão. Portanto, isso significa que uma decisão futura pode mudar o direito existente, no sentido que pode apagar o direito existente ou pode transformar em direito válido algo que no presente não é direito. Assim, o direito é aberto às mutações sociais. Os sociólogos dizem que o direito positivo é cognitivamente aberto, podendo aprender com o próprio ambiente social. Outra consequência importante do direito positivo é que a política, com a positivação do direito, é o lugar onde é possível mudar o direito, mas respeitando as condições jurídicas. Essa é a regra fundamental constitucional do direito. Os conflitos sociais são os lugares através dos quais são elaborados interesses, problemas e questões pela política. A positivação do direito permite variabilidade e estabilidade. A estabilidade significa que quando um fato é qualificado como norma as expectativas dos indivíduos que tem como objeto aquele fato se estabilizam, ou seja, se tornam resistentes ao tempo. Em caso de decepção de expectativa de um objeto de uma norma jurídica, o titular dessa expectativa pode não mudar a própria expectativa. Ex:Fulano tem a expectativa, a partir de uma norma válida, de receber dinheiro de sicrano. Acontece que sicrano não paga, assim violando a norma jurídica. Entretanto fulano não muda a própria expectativa só porque não recebeu o pagamento, pois é objeto de uma norma jurídica. A normatização da expectativa, portanto, permite a fulano dizer que ele tem um direito subjetivo a obter o pagamento. Assim, ao não receber o pagamento da dívida, fulano abre um processo judicial para obter o reconhecimento da sua expectativa. Como escreveu o sociólogo Zigmunt Bauman, a cultura espontânea da idade medieval torna-se uma cultura de jardim. O jurista medieval era um jusperito, ou seja, a sua atividade consistia em criar ligações entre ordens normativas diferentes (entre o direito natural, canônico, divino entre outros). Esse jurista era consciente do caráter periférico, limitado de suas decisões. Entretanto, com a modernidade, o jurista se torna legislador, afirmando um modelo intelectual, auto referencial e que tem uma autoridade. E essa autoridade está ligada ao pertencimento dos órgãos do estado moderno. Assim o modelo intelectual autorreferencial, não admite a existência de ordens normativas diferentes da ordem estatal. A codificação do direito privado e a constitucionalização do direito público, produz uma simplificação sintática, semântica e pragmática. A simplificação sintática leva em consideração a relação entre signos e normas jurídicas. Assim, o código permite a superação do pluralismo jurídico medieval, através da eliminação das fontes não atribuíveis às leis do estado e através da colonização normativa (processo com o qual uma fonte normativa, no caso a lei do estado, reconhece outras fontes do direito não estatais serem válidas e produtivas para efeitos jurídicos). A simplificação semântica leva em consideração a relação entre signos e objetos, ou seja, a relação entre normas e valores jurídicos. O código produz uma codificação semânticas, porque reduz os diversos valores jurídicos a uma unidade coerente, isto é, o sujeito jurídico, a generalidade abstração das normas jurídicas, a liberdade e igualdade da capacidade de querer. A simplificação pragmática leva em consideração a relação entre os signos e aqueles que os usam. O código determina uma simplificação pragmática, pois ao reduzir as regras aos princípios gerais de abstração (generalidade e unicidade do sujeito jurídico) é possível proceder a uma redução da pluralidade de sujeitos que povoavam o universo jurídico medieval e ao mesmo tempo os destinatários das regras são redefinidos pelo caráter geral e abstrato das normas jurídicas perante a lei. No caso da constituição e do direito público os indivíduos são unificados em cidadãos, no caso do código civil os indivíduos são unificados em proprietários. Em ambos os casos a antropologia humana o indivíduo político é o indivíduo burguês, branco, homem e proprietário. Concluindo: é possível, portanto, dizer que a positivação do direito permite compreender o caráter artificial e convencional da modernidade, cujo ato constitutivo é a decisão de construir uma ordem de coexistência a partir de uma antropologia individualista que pensa o indivíduo como um assunto de necessidade ilimitada. A abstração do sujeito, pensada como livre ou igual, permite, com a reconfiguração do conceito de propriedade privada, superar o conflito entre natureza e sociedade. O direito positivo se apresenta, portanto, em toda a sua ambiguidade, como fato e valor; como histórico e racional, ao mesmo tempo. Ele liberta-se da referência ao valor e se apresenta como um fato social, ou seja, produzido pela decisão contingente dos homens. Mas ao mesmo tempo é valor, pois se apresenta como única justiça possível. É histórico, porque é resultado histórico da crise do antigo modelo teológico político medieval, mas ao mesmo tempo se apresenta como negação da história, tendo que esquecer sua origemhistórica para se apresentar como categoria formal, autônoma, racional e formal. Assim se diferencia da política e se apresenta como uma técnica neutra, independe das diferenças sociais das quais se faz abstração. Aqui começa a segunda parte da aula A ciência jurídica moderna tem a tarefa de, a partir da análise da empiria (Normas jurídicas. Estas são empíricas, pois são produzidas por legisladores em tempos diferentes), como organizar a multiplicidade e pluralidade de normas jurídicas contingentes e discretas, em uma ordem uma unidade lógico racional. Para se fazer isso, a ciência jurídica tem que deduzir os princípios gerais do direito/normas, e através destes os conceitos jurídicos voltar novamente ao material empírico. Kant apresenta, ao mesmo tempo, o ponto de chegada e o ponto de partida deste percurso. Kant pode ser pensado, ao mesmo tempo, como o último racionalista e o'primeiro teórico da ciência jurídica moderna positiva. Assim, vai se pensar no problema teórico deixado pelo jusracionalismo. Pode-se resumir o problema teórico da seguinte maneira: dá uma explicação teórica, não apenas empírica da contigencia do direito sem recorrer a fundamentos externos. Uma justificativa que permite afastar o direito da sua relação com o fato e o poder, evitando; ao mesmo tempo; de cair na metafísica recorrendo a valores e princípios externos ao direito positivo (Deus, natureza e razão). No nível teórico e metodológico a razão do direito deve brotar dentro do direito e não de fora. A racionalidade, então, se torna uma questão da metodologia: de um método que permite organizar em um sistema racional a pluralidade das normas jurídicas. Este é o problema sobre qual trabalha Kant, e sobre qual trabalhou a dogmática jurídica e a ciência do direito positivista neokantiana do século XIX. No nível político a questão sobre a reflexão do direito é justificar a autonomia do direito, ou seja, subtrair o direito da identificação com o poder político. A questão é a lei é apenas arbitrária? não, pois o direito não apenas identificável totalmente com o poder. Então, como, de um direito contingente; arbitrariamente modificado, como pode derivar uma autoridade vinculante (esta que é comparável a que deriva de um direito sagrado)? Análise do texto de Kant Kant, em 1717, pública “Princípios metafísicos da doutrina do direito”. A partir do 1º parágrafo já pode se entender como a questão do direito jurídico muda em relação ao jusracionalismo do século XVII e XVIII. “O conjunto das leis, para quais é possível uma legislação externa, se chama doutrina do direito. Se tal legislação é efetiva…” A partir da leitura desse texto de Kant se tem duas questões importantes. A primeira diz a respeito a legislação externa, para o direito o motivo pelo qual alguém realiza ação prescrita não é importante, mas somente o fato externo. O segundo ponto é a definição da ciência jurídica como elaboração sistemática das normas jurídicas positivas, é a primeira vez uma definição inovativa, ou seja, Kant está fundando uma nova ciência jurídica. Então, o direito natural no princípio Kantiano torna-se um princípio metodológico de organização material do direito positivo. No segundo parágrafo, “O que é o direito?” Kant visa alcançar uma definição filosófica do direito. Aqui Kant diz que essa pergunta pode colocar o jurista em dificuldade. O jurista consegue responder qual é o direito em um determinado lugar, mas é incapaz de indicar o conceito de direito, pois se não abandona os princípios empíricos que guiam seus julgamentos. Então, Kant está dizendo que o conceito de direito é uma questão; principalmente; filosófica. E como a filosofia pode responder a questão do conceito de direito? Kant diz que para identificar o conceito de direito, é necessário buscar os critérios de julgamento, não no empirismo, mas sim na razão pura. Somente com essa definição é possível reconhecer o que é certo e errado. E é a partir disso que Kant identifica uma relação nova e tipicamente moderna, entre a razão pura e a razão prática. O ponto central acima, é a consciência do mundo humano se organiza com base no “zolen (?)=dever ser”. O intelecto, diz Kant, pode conhecer a natureza como ela é, foi e será. Entretanto, o intelecto puro não pode fundar a razão prática, assim a necessidade de fazer uma ação é um princípio da razão pura. Nesse sentido, o conhecimento não pode chegar ao conhecimento dos princípios da razão pura, isto é; para Kant; não pode-se conhecer a verdade em si e etc. A metafísica de Kant é moderna, ele reconhece que há limites para razão especulativa. Toda crítica Kantiana consiste em reconhecer os limites da razão e só determinando os limites é possível restabelecer os motivos da ação. Em outras palavras, reformular a questão da verdade; do bem; da dignidade é necessário para repensar as condições nas quais é possível agir conformemente ao direito e de forma justa. As consequências dessa posição acima, é que não pode-se conhecer as ideias da razão pura (Deus, verdade e justiça). Essas ideias não podem ser reconhecidas cientificamente, pois a razão tem que reconhecer os limites próprios, assim a razão especulativa não pode conhecer analiticamente a ideia de Deus, da justiça, da verdade. Entretanto, deve se pressupor a existência dessas ideias para pode agir. Então, Kant por um lado reconhece os limites da razão especulativa e. através desse reconhecimento, justifica uma razão prática de uma que permite agir em um mundo habitado pelos outros. Nessa perspectiva, o direito pode ser pensado filosoficamente só como relação intersujeitiva (?), ou seja, o direito tem haver com a capacidade dos homens se relacionarem um com os outros. A determinação filosófica do conceito de direito, como relação intersujeitiva, é articulada; segundo Kant; em três axiomas. E ao final destes, encontramos o que o direito a partir de três axiomas. §B, P. 34 “ O conceito de direito, enquanto relacionado a uma obrigação correspondente…influência umas sobre as outras”. Esse trecho traz o primeiro axioma: o direito é uma relação externa de uma pessoa com a outra. O direito é definido pela intersubjetividade. O direito diz respeito as ações externas das pessoas. §B, P. 34 “ Mas em segundo lugar, ele o direito, … mas apenas ao arbítrio do outro.”. Esse trecho traz o segundo axioma: essa relação tem uma relação com a vontade dos outros, não com o desejo. Essa relação não se manifesta com a relação externa. O direito é racional na medida a qual permite que a livre vontade externa dos sujeitos coexistem pacificamente. A autonomia é a característica essencial que Kant atribui ao conceito de persona. §B, P. 34 “ Em terceiro lugar… uma lei universal de liberdade.”. Esse trecho traz o terceiro axioma: o direito é a forma da liberdade da relação, da vontade de um com a vontade do outro. Nas relações jurídicas não leva em consideração a matéria da vontade, mas apenas a forma da vontade, ou seja, como a vontade se expressa. Essa vontade tem que ser livre. Assim, para Kant o direito é uma condição formal para coexistência de arbítrios ou de vontades individuais, porém abstraídas dos possíveis conteúdos da vontade. Desses três axiomas, pode-se extrair duas implicações fundamentais sobre a natureza problemática da operação Kantiana: 1. Kant implanta o conceito do direito na exterioridade, ou seja, na interação dos indivíduos. 2. Essa exterioridade é puramente formal/racional. Isso permite a Kant subtrair o direito da identificação com o fato bruto e da identificação com o valor moral. Enquanto racional a exterioridade não se reduz ao fato, ou seja, ao comando do soberano. Enquanto formal a exterioridade se diferencia do valor, ou seja, da finalidade da ação, e, portanto, se diferencia da moral. Um jurista alemão Pucta (?), fala da diferença entre o sujeito jurídico e o moral.Aquele é sujeito jurídico quando o comportamento dele é conforme o direito e também quando não é conforme o direito. Já no caso da moral a finalidade da ação é relevante, portanto se tem o sujeito da moral apenas quando ele se comporta conforme a norma moral. §B, P. 34 “O direito é... uma lei universal de liberdade.” aqui Kant define o direito. O direito é forma, pois as condições pelas quais a vontade de um pode coincidir com a vontade do outro, de acordo com a lei universal da liberdade. A definição de direito Kantiana tenta explicar um fenômeno jurídico ao reunir os dois aspectos que o caracterizam: fato e valor. Isso no sentido, que a lei não é redutível nem ao fato e nem ao valor, e deve, portanto se distinguir o direito tanto do fato quanto da moral. Daqui se tira a exterioridade da definição do direito kantiano. No §d o direito está ligado a autorização de coagir, desta forma Kant distingue o direito da moral. Todo o discurso Kantiano está centrado na tentativa de diferenciar o direito do fato e a moral. Nesse sentido, o direito é ao mesmo tempo fato, mas não se identifica com este, e valor, mas também não se identifica completamente como valor moral. Essa é a complexidade da composição Kantiana. Um elemento fundamental na tese Kantiana, da estrutura da norma é a coação. A distinção entre direito e moral não se baseia no conteúdo das regras, mas sim nas diferentes razões para a obediência. No caso do direito o motivo para obediência é indiferente, sendo o cumprimento da ação externa importante. No caso da moral não é necessário apenas uma obrigação externa, mas também interna. A partir do exposto acima, o primeiro elemento que diferencia o elemento da moral é baseada na obrigação externa e interna. A obrigação jurídica é externa, e a moral é interna. O segundo elemento que diferencia o direito da moral, é que aquele trata de ações externas e este diz respeito a ações internas. O terceiro elemento é que a moral se baseia em si mesma, enquanto a obediência ao direito é baseada nas consequências. A norma moral é um imperativo categórico. O quarto elemento que diferencia são que as normas morais são autônomas baseiam-se num sujeito racional, já as jurídicas são heterônomas, ou seja, são postas pelo legislador. No §E Kant está dizendo que o direito também é fato; está ligado a questão da coação; mas não deve-se pensar a coação como algo que contraria a liberdade. Nessa lógica, Kant está tentando não reduzir o direito ao fato, pois o direito também é valor. O direito estrito também tem a possibilidade de ser apresentado como uma coação geral, mas concordante com a liberdade de qualquer um. “O direito estrito pode ser apresentado também… mas se pode fazer o conceito de direito consistir imediatamente na possibilidade da coação recíproca universal com a liberdade qualquer um.” Então, Kant diz que se é verdade que o direito é fato porque a norma jurídica se define pela coação e, portanto, se distingue da moralidade, também é verdade que o direito é valor/coexistência livre da vontade dos sujeitos. Então, Kant está dizendo que o direito tem fundamento na liberdade da vontade, qual justifica e fundamenta a obrigação política e jurídica. A moral o direito e a política indicam diferentes áreas da ação, mas ao mesmo tempo essas áreas são conectadas. A condição se baseia em uma ideia de liberdade, que permite ao direito e a política não sejam manifestação da vontade do soberano. desta forma, Kant coloca dois fenômenos limites: a equidade e a necessidade. A equidade é um fenômeno limite que define a fronteira entre o direito e a moral. Já a necessidade (fronteira de marcação entre o direito e o fato bruto) é um fenômeno limite que define a fronteira entre o direito e o fato. A equidade, na tradição Aristotélica, é um instrumento moral para corrigir a rigidez formal do direito. A necessidade significa que a liberdade de fazer ou não fazer algo é negada, porque se está em uma situação que não pode escolher, ou seja, a liberdade não é livre. Conclusão: Todas essas reflexões Kantianas são articuladas em torno da questão da relação entre direito e moral por um lado, e entre direito e fato por outro lado. O discurso jurídico da modernidade não pode ser entendido sem a reflexão de Kant. A partir de Kant as duas direções de pensar a categoria jurídica, serão por um lado uma direção que valoriza a dimensão factual da norma jurídica, outra direção valoriza a dimensão do valor do direito. No pensamento Kantiano esses dois elementos eram pensados como complementares. Apenas Kelsen, retomando o pensamento Kantiano, vai tentar pensar o direito como fato e valor. Aula 09 - (Semana 4) Método jurídico Vs Método sociológico Em 1934 Kelsen, publica “A doutrina pura do direito”. Kelsen com este título retoma a obra da crítica Kantiana “A crítica da razão pura”. Essa ideia de pura significa que o conhecimento deve abordar apenas o direito, para isso deve delimitar claramente o objeto do conhecimento. Então, Kelsen para distinguir uma teoria da norma jurídica, distingue o direito - fato da natureza, ou seja, distinguir a norma jurídica da norma moral. O problema, mais uma vez, é entre a contingência e a necessidade. A positivação do direito o colocou, em novos termos, o problema de legitimidade a variabilidade do direito positivo. O direito positivo se apresenta como único direito possível, institucionalizando as condições da própria variabilidade. Nesse sentido,o direito positivo é resistente e variável, aberto cognitivamente, pois pode mudar nas condições que ele mesmo estabelece. O procedimento é o lugar de aprendizado e variação, mas ao mesmo tempo é um direito que se apresenta como indiferente a variação. Kelsen, retomando Kant, tenta resolver o problema da contingência do direito por meio de uma teoria entendida como forma autônoma e independente, quanto da moral, quanto da política. Kelsen será capaz de resolver o problema da justificação da contingência do direito por meio da racionalidade interna ao direito positivo. Desta forma, garantirá a autonomia do direito, no entanto no plano político isso significa a impossibilidade de compreender a relação entre o problema da legitimidade e o problema da legalidade, ou seja, o problema da autonomia do direito como resultado de uma ideologia que serve para resultar o processo real de produção da abstração jurídica. ] No plano moral a redução do problema da justiça a uma questão puramente formal ou uma questão que não diz nada a respeito ao direito. Nessa perspectiva, a justiça tornasse justiça formal, pois está em conformidade às leis do estado (legalidade). A teoria de Kelsen pode ser resumida da seguinte forma: 1. A visão do mundo de Kelsen é dualista, estando divido em ser e dever ser (1º ponto). 2. Toda ciência visa construir a unidade do próprio objeto, assim a ciência jurídica deve ser sistemática, isto é, a ciência jurídica deve identificar os princípios gerais pelos quais a pluralidade descrita (?) de normas jurídicas pode ser trazida de volta a uma unidade lógica (2º ponto). 3. A ciência jurídica descreve um objeto colocado no mundo do dever ser, ou seja, a ciência jurídica explica apenas o direito (3º ponto). 4. O direito é unitário, pois todo ordenamento jurídico deriva de uma única norma fundamental. Esta não é estabelecida pelo legislador, mas apenas pensada pela ciência jurídica, que atribui unidade a toda uma ordem jurídica (4º ponto). 5. O direito é obedecido porque é válido. E sua validade depende do fato que sua norma fundamental transmitir o dever para todas as suas normas de nível inferior. Nesse sentido, o sistema jurídico de Kelsen tem uma forma piramidal e deve-se supor a norma fundamental uma condição transcendental kantiana (condição para pensar a unidade de uma pluralidade discreta de normas). O que será
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