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BILDUNGSROMAN
by Luísa Flora | Dez 24, 2009 | 0 comments
[Em port., “romance formativo ou romance de formação”; em ingl., coming-of-age novel ou
apprenticeship novel.] Sendo possível traduzir o termo germânico por ‘romance formativo’
ou ‘romance de formação’, considera‑se mais adequado seguir o uso da história literária e
manter a designação original, pois tal uso corresponde ao reconhecimento do
Bildungsroman como contributo especí�co da literatura alemã. O termo foi cunhado em
1803 por K. Morgenstern e por ele desenvolvido como conceito amplo em textos
surgidos c.1820, mostrando o carácter distinto e o valor artístico de obras como Agathon
(1766‑67) de Wieland ou Wilhelm Meisters Lehrjahre [Os Anos de Aprendizagem de Wilhelm
Meister] (1795‑96) de Goethe, a par da necessidade de integrar o romance alemão no
contexto da produção europeia. No processo de a�rmação e respeitabilização da forma
romanesca, articulando ainda a vertente lúdica e de entretenimento exigidas pelo novo
público leitor com a vertente moralista e didáctica tão ao gosto do Iluminismo, a inclusão
no cânone literário das referidas obras revela já a passagem para um tipo de romance de
cariz antropológico. Ao centrar o processo de desenvolvimento interior do protagonista
no confronto com acontecimentos que lhe são exteriores, ao tematizar o con�ito entre o
eu e o mundo, o Bildungsroman dá voz ao individualismo, ao primado da subjectividade e
da vida privada perante a consolidação da sociedade burguesa, cuja estrutura
económico‑social parece implicar uma redução drástica da esfera de acção do indivíduo.
Apesar de a estética idealista hegeliana ter tomado o texto de Goethe como matriz do
seu conceito de romanesco, nomeadamente ao de�nir como essencial ao romance o
expor do “con�ito entre a poesia do coração” e a “prosa das relações sociais”, Wilhelm
 cceia UU
aa
Meisters Lehrjahre surge em 1817 (no Brockhaus‑Lexikon) como Bildungsgeschichte
[história de ‘formação’], caracterizado ainda e apenas pelo tema do percurso individual e
pela função de celebrar a humanidade. E se a teoria do romance oitocentista foi
dominada na Alemanha pela presença de Wilhelm Meisters Lehrjahre, é apenas com W.
Dilthey, em 1870 e, principalmente em 1905 com Das Erlebnis und die Dichtung, que o
termo se impõe e o conceito se clari�ca. O Bildungsroman adquire então o estatuto de
forma especí�ca no interior da tradição romanesca, usando como paradigma o texto de
Goethe. As suas qualidades de�nidoras — depois aplicadas a muitos outros textos em
diversas literaturas que procuram recriar o modelo iniciador deste tipo de romance até
se tornarem constantes de carácter temático‑formal que tanto escritores como público
aprenderam a reconhecer — estabelecem um conjunto de convenções .
É assim a partir das características consideradas por Dilthey como as mais marcantes do
paradigma que passaremos a de�nir o Bildungsroman. O protagonista é uma personagem
jovem, do sexo masculino (às mulheres não era, na época, possível a liberdade de
movimentos que permite ao herói o contacto com múltiplas experiências sociais
decisivas no percurso de auto‑conhecimento), que começa a sua viagem de formação em
con�ito com o meio em que vive, determinado em afrontá‑lo e recusando uma atitude
passiva; deixa‑se marcar pelos acontecimentos e aprende com eles, tem por mestre o
mundo e atinge a maturidade integrando no seu carácter as experiências pelas quais vai
passando; em constante demanda da sua identidade, representa diferentes papéis e usa
diferentes máscaras; sofre pelo imenso contraste entre a vida que idealizou e a realidade
que terá de viver; o seu encontro consigo mesmo signi�ca também uma compreensão
mais ampla do mundo.
Este tipo de romance não inclui a morte do herói e termina de modo feliz, ou, pelo menos,
não pressupõe danos irreparáveis. O romance organiza‑se pela aparente ausência de um
princípio de unidade: a narrativa articula‑se em função da viagem espiritual do
protagonista e não impõe aos diversos episódios uma sucessão lógica visível. Tem um
carácter aberto, não conclusivo que possibilita o surgir de obras de continuação (em
Goethe, Wilhelm Meisters Wanderjahre [Um Homem Feliz], 1821). É o caminho percorrido
pelo protagonista que determina a estrutura da obra, tanto do ponto de vista temático
como formal. A plasticidade da forma adequa‑se à multiplicidade de experiências
necessárias à maturação do herói. Desde Goethe, a realidade histórica e o processo de
amadurecimento surgem relacionados de modo muito íntimo; o tempo histórico é
�ltrado pelo tempo interior; o desenvolvimento da personalidade realiza‑se pelos
caminhos do con�ito e da dissonância até um estado de harmonia inicialmente difícil de
entrever.
Embora não usando o termo entretanto consagrado por Dilthey, ao qual preferiu
Erziehungsroman [‘romance educativo’ ou ‘romance de educação’], G. Lukács, ao publicar
em 1916 a sua Theorie des Romans [Teoria do Romance], revisita a tradição hegeliana de
historicizar as categorias estéticas, considerando o género como uma tentativa do
homem moderno para reconciliar a existência com a sua essência (o eu verdadeiro),
através da epopeia então possível. Solitário, em busca constante de um signi�cado para a
vida, o herói do romance opõe‑se à sociedade; do con�ito entre valores universais e as
realidades comezinhas do quotidiano decorre a instabilidade estrutural da forma
romanesca. Wilhelm Meister surge, neste ensaio, como o tipo de romance que procura a
síntese entre o ‘romance do idealismo abstracto’(cujo herói, exempli�cado por Don
Quixote, é um indivíduo problemático, que luta desesperadamente para encontrar uma
relação entre os seus ideais e a vulgaridade prosaica do mundo exterior) e o que designa
por ‘romantismo da desilusão’ (caracterizado por um protagonista passivo, virado para si
mesmo, pois renuncia a qualquer acção, a priori encarada como inútil)
A presença dominante do Bildungsroman na literatura alemã oitocentista dera entretanto
lugar a obras como a de Hoffmann, Lebens‑Ansichten des Katers Murr (1820‑22),
considerado uma paródia a este tipo de romance, ao mesmo tempo que facilitara o surgir
do Künstlerroman (v.) [‘romance de artista’], representado entre outros pelo texto de
Novalis Heinrich von Ofterdingen (1802), cuja longa descendência até hoje se manifesta no
reiterado encenar do con�ito entre o artista e a sociedade.
O Bildungsroman joga com duas tendências fundamentais em toda a �cção: por um lado,
manifesta a necessidade de expressar o mundo concreto, por outro, a necessidade de o
superar. Da tensão entre a realidade e a possibilidade, entre o real concreto e presente e
um real alternativo resulta um carácter híbrido neste tipo de romance que, segundo,
entre outros, M. Swales, o aproxima da utopia enquanto forma literária.
Narrativa de uma subjectividade, o Bildungsroman é também a�rmação de um
compromisso com o social que acaba por vencer, deixando o protagonista reconciliado
com o mundo concreto. Ao longo da obra surge perante o leitor uma perspectiva
narrativa distanciada, assinalando a disparidade entre os objectivos do protagonista e os
resultados alcançados; o narrador, já ‘formado’, assume uma atitude plena de ironia (v.), a
posição de quem sabe mais e vê mais longe, não permitindo ao leitor qualquer equívoco
acerca da imaturidade do protagonista.
O romance mantém um olhar vigilante sobre a acção formadora do tempo, os diversos
momentos da história pessoal do protagonista são seleccionados para representar
outros tantos degraus na sua compreensão do mundo e de si mesmo. A dimensão
histórica do tempo é interiorizada e, mais importante do que o �nal do romance é o
processo, o devir que vai revelando a dimensão de acaso que domina a vida em confronto
com a �rmeza de propósitos e as certezas que pareciam dominar o herói no início do
percurso de aprendizagem.Pela relação semelhante com o tempo, pela abertura do �nal
o Bildungsroman aproxima‑se da autobiogra�a, porém, segundo L. Köhn, distingue‑se
desta pelo seu grau de abstracção da realidade, favorecendo aquilo que é universal no ser
humano.
Resta‑nos perguntar se esta forma especí�ca da arte romanesca resistiu no século XX ou
se, pelo contrário, se encontra exaurida. A inclusão de um número maior ou menor de
textos nesta tradição tem evidentemente dependido da maior ou menor amplitude que
se atribui ao conceito, desde ensaístas e historiadores da literatura que o restringem a
um período determinado da cultura de língua alemã até outros que, utilizando um
critério muito lato, nele incluem textos produzidos em momentos históricos muito
diversos e em circunstâncias literárias e socio‑culturais muito distintas, dando origem a
um extenso elenco de romances nas literaturas dinamarquesa, russa, holandesa, inglesa e
norte‑americana. Em 1984, Rolf Selbmann assinala só na literatura alemã uma vasta
descendência que, passando pela revisitação paródica de Thomas Mann em Der
Zauberberg [A Montanha Mágica] (1924) — desmontagem sistemática das expectativas de
leitura da tradição e reforço (através do intuito de ampliar os limites da consciência do
protagonista ) da sua componente ontológica, ia até Heinrich Böll e Günther Grass.
Recuperado no pós‑guerra por escritores da Alemanha de Leste que, através dele,
procuravam interpretar o carácter exemplar do processo de crescimento do herói a par
com o crescimento da nova sociedade socialista, o Bildungsroman foi mais recentemente
problematizado por autores como Christa Wolf ou Peter Weiss — a (im)possibilidade de
ajuste entre o eu e o mundo continua central à experiência contemporânea e é hoje
porventura mais dolorosa e dilacerante do que no tempo de Goethe. De salientar é
também a crescente visibilidade feminina na literatura actual, propiciando numerosos
romances onde a questionação do lugar da mulher na escrita e na cultura tem, entre
múltiplas outras técnicas e estratégias artísticas, recuperado e revitalizado o venerando
paradigma romanesco — veja‑se, por exemplo, Doris Lessing e The Golden Notebook
(1962).
Ocupando o singular terreno entre o desejo (insano?) de totalidade e as múltiplas
limitações em que a contemporaneidade se enreda, entre a possibilidade e um real
(ainda) concreto, o Bildungsroman pode, apesar de tudo, continuar a dar voz ao con�ito de
uma sociedade dividida entre os valores de um humanismo liberal cioso de preservar o
indivíduo e as exigências de uma humanidade em extenuante luta pela sobrevivência. No
seu pendor ontológico, na importância concedida à discursividade, no debate intelectual
que sempre tem promovido, o Bildungsroman — se interpretado com a amplitude que,
entre outros, Der Zauberberg lhe possibilitou e metamorfoseado pelas muito diferentes
circunstâncias literárias e culturais — manterá a vitalidade.
{bibliogra�a}
Jerome Buckley: Season of Youth: The Bildungsroman from Dickens to Golding, 1974; Petra
Gallmeister:‘Der Bildunsroman’, Formen der Literatur in Einzeldarstellungen, 1991; Jürgen
Jacobs e Markus Krause: Der Deutsche Bildungsroman: Gattungsgeschichte vom 18. bis zum
20. Jahrhundert, 1989; François Jost:“ La tradition du Bildungsroman”, Comparative
Literature, 21, 1969, pp. 97-115; Lothar Köhn: “Entwicklungs— und Bildungsroman. Ein
Forschungsbericht”, Deutsche Vierteljahrscrift für Literaturwissenschaft und
Geistesgeschichte, 42. 1968, pp. 427‑73; Fritz Martini: “Der Bildungsroman. Zur
Geschichte des Wortes und der Theorie”, Deutsche Vierteljahrscrift für
Literaturwissenschaft und Geistesgeschichte, 35. 1961, pp. 44‑63; Hans Heinrich
Borcherdt: ‘Bildungsroman’, Reallexikon der deutschen Literatur, 1958; Rolf Selbmann: Der
deutsche Bildungsroman, 1984; George Stanitzek: ‘Bildungs — und Entwicklungsroman’,
Literaturlexikon: Begriffe, Realien, Methoden, 1992; Martin Swales: The German
Bildungsroman from Wieland to Heine, 1978 e “Utopie und Bildungsroman” in
Utopieforschung: Interdisziplinäre Studien zur neuzeitlichen Utopie, 1985.
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