Buscar

Sociologia organizacional

Prévia do material em texto

SOCIOLOGIA 
ORGANIZACIONAL 
AULA 1 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Profª Carolina Esther Kotovicz Rolon 
 
 
 
2 
CONVERSA INICIAL 
Olá, seja bem-vindo à nossa aula! Nesta disciplina, vamos pensar como 
a sociologia pode ajudar você, futuro gestor, a compreender as organizações e 
assim planejar melhor suas ações. Nesta primeira aula, vamos começar nossos 
estudos com uma apresentação do olhar sociológico, o que nos permite 
questionar ações e situações sociais. As principais perspectivas teóricas da 
sociologia, assim como as figuras do processo de socialização que une o 
indivíduo e a sociedade, serão apresentadas em seguida. Vamos ver como a 
sociologia analisou dois processos centrais para o surgimento das organizações: 
a racionalização e a individualização. Vamos também apresentar as principais 
perspectivas teóricas da sociologia organizacional. Essa introdução às teorias e 
conceitos sociológicos fundamentais são a base para desenvolver nosso olhar 
sociológico das organizações ao longo dessa disciplina. 
CONTEXTUALIZANDO 
Imagine que você é o gerente de pessoal de uma fábrica. Você organiza 
um organograma com o processo de produção. Neste organograma, cada 
trabalhador tem seu lugar, cada um sabe quem recebe e quem transmite as 
ordens, você apresenta o organograma aos trabalhadores (seus subordinados), 
responde às dúvidas, deixa uma cópia em lugar visível e de fácil consulta. 
Algumas semanas depois, você percebe que os trabalhadores não seguem a 
organização, racionalmente planejada, tal qual representada no organograma 
que você produziu. O que você faria para compreender o motivo desse não 
cumprimento e como funcionam as interações entre os trabalhadores no 
processo de produção que você, como gestor, está incumbido de aperfeiçoar? 
TEMA 1 – O OLHAR SOCIOLÓGICO 
Todos nós temos uma ideia do que é e como funciona a empresa onde 
trabalhamos, ou o que rege nossas relações no trabalho, pois convivemos todos 
os dias com nossos chefes e colegas; assim, o objeto da sociologia das 
organizações está presente no nosso dia a dia. Isso é verdade para o objeto da 
sociologia em geral: a escola, o governo, a família, entre outras realidades que 
fazem parte da vida de todos nós. Peter Berger, sociólogo austro-americano que 
viveu entre 1929-2017, aponta que a especificidade da sociologia não está no 
 
 
3 
seu objeto de estudo, mas na forma como essa ciência aborda a realidade social 
(Berger, 1986). Na nossa vida cotidiana, estamos ocupados em trabalhar, 
entregar resultados, curtir o tempo de folga com a família e os amigos, e não nos 
damos conta de todos os aspectos da realidade social. A sociologia é a ciência 
que se ocupa em desvendar os diversos aspectos presentes nas nossas 
relações cotidianas, demonstrando que a realidade social tem muitos níveis de 
significado. Como diz Berger (1986, p. 31), “o fascínio da sociologia é de nos 
levar a ver sob nova luz o próprio mundo em que vivemos”. 
Você se lembra da primeira vez que entrou na sede da empresa na qual 
trabalha? O que te chamou atenção? Pessoas interagindo no trabalho é uma 
cena corriqueira, não é? Podemos dizer o mesmo de outros objetos de estudo 
da sociologia: as relações em casa, na escola, no trabalho, nos círculos de 
amizades, entre outras. Todavia, as perguntas que a sociologia busca responder 
não são as perguntas que nós nos fazemos no dia a dia. Questionamentos 
sociológicos das diversas cenas quotidianas são: 
 O que as pessoas estão fazendo aqui juntas? 
 Quais são as relações entre elas? 
 Como essas relações se organizam em instituições? 
 Quais são as ideias coletivas que movem os homens e as instituições? 
Para enxergar além das aparências e experiências imediatas, é preciso 
desenvolver um olhar sociológico. Nosso objetivo nesta aula não é preparar 
você, gestor, para realizar um estudo sociológico da organização onde trabalha. 
O que vamos fazer é refletir sobre os fundamentos e os principais conceitos da 
sociologia, pois com essas ferramentas você poderá interpretar os resultados de 
pesquisas sociológicas, em especial sobre as organizações. Isso vai lhe ajudar 
a abstrair de sua rotina na empresa, e olhar para as interações corriqueiras e os 
problemas que existem, na organização que gere, com outras perspectivas. 
Anthony Giddens, sociólogo britânico que nasceu em 1938 e é ainda vivo, explica 
que estudar sociologia também aumenta a nossa compreensão de nós mesmos, 
pois quanto mais sabemos sobre as razões que nos levam a agir dessa ou 
daquela maneira, quanto mais sabemos sobre como funciona, de forma geral, a 
sociedade em que vivemos, tanto mais provável que sejamos capazes de 
influenciar nosso futuro (Giddens, 2008, p. 6). Vamos ver, em linhas gerais, como 
se constrói o conhecimento sociológico? 
 
 
4 
1.1 A construção do olhar sociológico 
O que nos permite ver além das aparências é o estudo sistemático do 
comportamento humano e da sociedade. Alguns estudos sociológicos utilizam 
métodos quantitativos, como análise de estatísticas e de questionários; outras 
pesquisas analisam os resultados de dados qualitativos, como entrevistas ou 
observações – independentemente do método, seja quantitativo ou qualitativo, o 
importante é saber que são formas de se aproximar do aspecto da realidade que 
se quer estudar. O sociólogo alemão Max Weber (citado por Freund, 2006) 
defende que não há método melhor ou pior, cada qual serve como aproximação 
de um aspecto do fenômeno estudado. Weber lembra que a realidade é 
infinitamente complexa. Assim sendo, nenhum conhecimento pode ser uma 
reprodução fiel ou uma cópia da realidade. Os diferentes métodos nos ajudam a 
estudar diferentes aspectos da realidade. 
Seguindo essa concepção de Weber, podemos pensar a sociologia como 
uma lupa. Quanto mais a gente aproxima a lupa de um fenômeno, melhor vemos 
seus detalhes; podemos descrever as relações e desvendar os sentidos das 
ações das pessoas que participam desse fenômeno. Quanto mais afastamos a 
lupa, melhor podemos fazer proposições de caráter geral, mas perdemos as 
especificidades de cada fenômeno. A sociologia faz um recorte da realidade, 
busca os dados e os analisa através de conceitos e teorias, que são abstrações, 
mas ainda assim nos ajudam a direcionar nosso olhar e a compreender diversos 
aspectos da realidade. 
Na sociologia há, portanto, diferentes formas de explicar os fenômenos 
sociais. Dependendo da perspectiva teórica que você utiliza, vai interpretar um 
fenômeno de uma forma. Podemos dizer que a sociologia é composta de várias 
“lupas”; assim, eu te convido a olhar mais de perto as principais perspectivas 
sociológicas. Você vai perceber que elas vão te ajudar a entender, ao final desta 
aula, as diferentes abordagens sociológicas das organizações. 
TEMA 2 – AS PRINCIPAIS CORRENTES SOCIOLÓGICAS 
A lupa que usamos para enxergar sociologicamente a vida social é o que 
chamamos de perspectiva teórica. Ao escolher uma, é preciso justificar a 
escolha, apontando vantagens e limites. Isso faz da sociologia uma ciência 
extremamente crítica: ela não apenas questiona a realidade, ela questiona 
 
 
5 
também o próprio conhecimento que se produz sobre essa realidade. E é através 
de pesquisas e debates teóricos que avançamos na compreensão dos 
comportamentos e estruturas sociais, tão próximas e ao mesmo tempo tão 
complexas. 
2.1 A sociologia clássica 
As perspectivas teóricas que chamamos de clássicas são as teorias que 
foram elaboradas por Karl Marx, Émile Durkheim e Max Weber no século XIX e 
início do século XX. Karl Marx, pensador alemão que viveu entre 1818 e 1883; 
Durkheim, sociólogo francêsque viveu entre 1858 e 1917; e Max Weber, 
historiador e sociólogo alemão que viveu entre 1864 e 1920, juntamente com 
outras pessoas de sua época, desenvolveram os primeiros estudos e teorias que 
buscaram compreender a sociedade em que viviam. Foram esses estudos e 
formulações teóricas que ajudaram a constituir a sociologia enquanto ciência. Ao 
longo da nossa disciplina, iremos analisar mais de perto as contribuições desses 
autores na sociologia organizacional, pois Marx, Durkheim e Weber 
influenciaram o desenvolvimento do pensamento sociológico que os seguiu, e 
seguem influenciando os estudos sociológicos até hoje. 
Marx, sem dúvida, é um pensador polêmico. Suas ideias e teorias geram 
debates acalorados até hoje! Isso mostra como é importante compreender seu 
pensamento, antes de julgar ou desqualificar. Vamos ver qual a perspectiva de 
Marx para entender a sociedade? Marx pensa que, para entender uma 
sociedade, é necessário entender como os homens produzem. A forma como os 
homens produzem os bens materiais vai determinar os outros aspectos da 
sociedade. Utilizando os termos de Marx, as relações de produção formam a 
estrutura da sociedade. Sobre essa estrutura estão construídos os governos, as 
leis, a cultura – o que Marx chama de superestrutura da sociedade. O método 
adotado por Marx é o materialismo histórico; estuda a evolução dos modos de 
produção ao longo da História. De acordo com Marx, na base do modo de 
produção capitalista está a oposição entre duas classes sociais: capitalistas e 
proletários. Para pensar o modo de produção capitalista, segundo Marx, é 
essencial pensar as classes sociais e a luta que resulta dos interesses 
antagônicos entre elas. Muitos outros sociólogos partiram da perspectiva de 
Marx para desenvolver pesquisas e explicar os fenômenos sociais. Os 
historiadores e historiadoras, geógrafos e geógrafas, economistas e sociólogos 
 
 
6 
que adotam a perspectiva materialista constituem uma corrente que chamamos 
de marxismo. 
Muitas vezes, há confusão entre sociologia e socialismo. Socialismo, na 
teoria de Marx, seria a época histórica em que os trabalhadores seriam os donos 
dos meios de produção, o que acabaria com a divisão entre capitalistas e 
trabalhadores; consequentemente, traria a extinção das classes sociais – é uma 
formulação teórica de Marx. Já a sociologia é a ciência que estuda os fenômenos 
sociais. O marxismo é uma perspectiva teórica dentre outras da sociologia e, 
portanto, a sociologia não se limita à Marx. Outros teóricos igualmente 
importantes para o desenvolvimento da sociologia são Durkheim e Weber. 
Durkheim e Weber são contemporâneos, mas não conheceram o trabalho 
um do outro. Talvez por isso mesmo, cada um desenvolveu uma perspectiva 
bem diferente para estudar os fenômenos sociais. Na perspectiva de Durkheim, 
a sociedade tem uma dinâmica própria, que não se resume à soma das ações 
dos indivíduos que a compõem – em suas palavras, a sociedade é uma realidade 
sui generis. A perspectiva de Durkheim é positivista. O positivismo é uma ideia 
elaborada por Auguste Comte que afirma que todas as ciências, incluindo a 
sociologia, buscam, com base na observação e na experimentação, descobrir as 
leis gerais que regem os diversos fenômenos, naturais e sociais. Portanto, para 
Durkheim, a sociologia é uma ciência positiva, e seu objeto são os fatos sociais. 
Fatos sociais são formas de pensar, agir ou sentir; são externas aos indivíduos, 
o que quer dizer que os fatos sociais não dependem de determinado indivíduo 
para existir. Durkheim aponta que outra característica dos fatos sociais é que 
eles exercem poder de coerção sobre os indivíduos; ou seja, as pessoas são 
impelidas a se enquadrar nesses fatos. Um fato social, por exemplo, é a língua 
dos diferentes países. Vamos seguir o raciocínio de Durkheim, adaptando-o à 
nossa realidade: nós falamos português, mas não fui eu nem você quem 
inventou o português. A língua existia antes que tivéssemos nascido, e quando 
morrermos, ela vai continuar existindo e, dessa forma, sua realidade é exterior 
aos indivíduos. Além disso, a língua portuguesa exerce sobre nós um poder 
coercitivo, pois somos obrigados a usar o português para nos comunicar. 
A perspectiva de Weber é totalmente oposta à de Durkheim. Weber pensa 
a sociedade a partir do indivíduo. Ao contrário de Durkheim, Weber pensa que a 
sociedade só existe “no” e “pelo” indivíduo. Mas nem toda ação do indivíduo é 
uma ação social. A ação social é aquela orientada subjetivamente, tendo em 
 
 
7 
mente outro indivíduo. Se a minha ação é orientada tendo em vista você, e a sua 
ação é orientada tendo em vista a minha, temos uma relação social – no nosso 
caso entre professora e aluno. Weber buscou compreender as regularidades das 
ações sociais nas diferentes épocas e sociedades; assim, estudou a religião 
através da ética que guia as ações dos fiéis; o Estado; e o que nos interessa em 
sociologia organizacional, a burocracia. Weber destaca que a burocracia é uma 
organização legal-racional que visa coordenar atividades de uma forma 
constante no tempo e no espaço. Para tanto, lança-se mão de regras impessoais 
e escritas, com uma hierarquia clara. (Giddens, 2008). Um conceito básico da 
perspectiva weberiana é o de racionalização. Weber observa o processo de 
racionalização tanto na explicação do mundo – o que faz a ciência predominante 
– como na própria organização da sociedade, e o desenvolvimento da burocracia 
é um exemplo. 
Tabela 1 – Perspectivas da Sociologia Clássica 
 Marx Durkheim Weber 
Perspectiva da 
sociedade 
As diferentes sociedades 
são determinadas pela 
forma como é organizada 
a produção. 
A sociedade tem 
existência própria, 
exterior aos 
indivíduos. 
A sociedade existe 
no e pelos 
indivíduos. 
Método Materialismo Histórico 
Positivista 
 
Compreensivo-
histórico 
Principais 
Conceitos 
Classes sociais 
Luta de classes 
Modo de produção 
capitalista 
Coesão social 
Socialização 
Coerção 
Ação social 
Burocracia 
Racionalização 
Marx, Durkheim e Weber desenvolveram olhares que buscavam ver além 
das aparências das sociedades de seu tempo, cada um enfatizando um aspecto. 
Vamos ver, sob alguns aspectos, como as perspectivas sociológicas desses três 
clássicos influenciaram a forma como pensamos a sociedade até hoje! 
2.2 Correntes sociológicas contemporâneas 
Há uma imensa multiplicidade de estudos sobre os mais diversos 
fenômenos sociais desde o tempo de Marx Weber e Durkheim. A sociologia se 
espalhou para além da França, da Inglaterra e da Alemanha. Nos Estados 
Unidos, a disciplina teve um desenvolvimento forte no início do século XX. No 
Brasil, os primeiros pensadores sociais brasileiros foram influenciados por 
leituras dos clássicos; Florestan Fernandes, o primeiro grande sociólogo 
 
 
8 
brasileiro, realizou vários estudos sob a perspectiva marxista. A sociologia se 
espalhou pelo globo, inclusive em países periféricos, com teorias que 
questionam a dependência não apenas econômica, mas também intelectual. Por 
exemplo, estudos desenvolvidos pela corrente pós-colonialista no Brasil, mas 
também na Índia, por exemplo. Tendo em mente essa diversidade de 
perspectivas teóricas, apresentamos três correntes da sociologia 
contemporânea que foram influenciadas pelas perspectivas clássicas (Giddens, 
2008, p. 18): funcionalismo; perspectivas do conflito; e perspectivas da ação 
social. 
O funcionalismo é uma corrente sociológica que desenvolveu aspectos da 
teoria de Durkheim. Descreve a sociedade como um sistema complexo formado 
por partes, que são articuladas de forma a garantir a estabilidadedo todo. Traça-
se uma analogia com o corpo humano: é como se a sociedade fosse um corpo 
humano e cada fenômeno social um órgão que contribui para o bom 
funcionamento desse corpo. O papel da sociologia, nessa perspectiva, é 
descobrir qual a função dos diferentes fenômenos sociais para o bom 
funcionamento da sociedade como um todo. Os sociólogos americanos Talcott 
Parsons (1902-1979) e Robert Merton (1910-2003) foram os principais 
representantes da corrente funcionalista. Giddens (2008) destaca que hoje o 
funcionalismo é uma forma menos popular de compreender a sociedade, 
sobretudo porque essa perspectiva realça excessivamente o funcionamento 
harmônico da sociedade, e não explica os conflitos, as divisões ou as 
desigualdades, tão presentes no nosso dia a dia. 
Por outro lado, o foco das perspectivas sociológicas do conflito se volta 
justamente para as questões de desigualdade e divisões na sociedade. Nessa 
perspectiva, os sociólogos analisam questões de poder, de desigualdade, e 
como os diferentes grupos lutam por seus interesses. Por exemplo, o sociólogo 
francês Pierre Bourdieu, que viveu de 1930-2002, analisa a escola como uma 
instituição que legitima e reproduz as desigualdades entre as classes sociais. 
Essa perspectiva remonta às análises de Marx de luta de classes, destacando a 
importância das estruturas na sociedade. 
Outros sociólogos buscam compreender a sociedade a partir dos 
indivíduos, de suas ações e interações. Essas perceptivas contemporâneas da 
ação social têm suas raízes na obra de Weber. Por exemplo, o interacionismo 
simbólico busca compreender os significados compartilhados pelas pessoas em 
9 
diferentes situações sociais. Cada perspectiva nos revela um aspecto do 
fenômeno estudado; quanto mais perspectivas conhecemos, mais ferramentas 
teremos para pensar as diversas situações que vivemos e vislumbrar possíveis 
soluções. 
TEMA 3 – DO INDIVÍDUO À SOCIEDADE: FIGURAS DA SOCIALIZAÇÃO 
Você já parou para pensar em que medida aquilo que você veste, a sua 
maneira de falar ou mesmo as coisas que você acha bonitas, importantes ou 
desejáveis, são influenciadas pelo contexto em que você vive? Até mesmo as 
suas atitudes no trabalho, como, por exemplo, a sua relação com a autoridade: 
você acata ou questiona as ordens? Você segue os protocolos ou acha um 
jeitinho? Você é pontual? Você pode me afirmar que as suas respostas são 
expressões da sua personalidade. Sim, é verdade. Mas é igualmente verdade 
que o que você considera bonito, importante, desejável, assim como a sua 
relação com a autoridade, a disciplina e a pontualidade, são em grande parte 
expressões de valores e normas culturais. Isso vale não apenas para o trabalho, 
mas para as mais diversas esferas da nossa vida: o que você veste, o jeito que 
você fala, a forma como você se relaciona com seus pais, companheiros ou 
companheiras e amigos, são expressões de valores e normas culturais. 
Cada sociedade tem um grupo de valores e de ideias do que é útil, 
importante, desejável; elas se traduzem em uma série de normas do que fazer 
ou não fazer nas mais diversas situações, sendo incorporadas nos nossos 
comportamentos. Chamamos esse conjunto de valores e comportamentos que 
são aprendidos pelos indivíduos ao longo da vida de cultura. Nós aprendemos 
esses valores, normas e comportamentos sociais ao longo de toda nossa vida, 
em um processo que chamamos em sociologia de “socialização”. Vamos 
entender mais de perto como esse processo de socialização funciona e como 
ele liga o indivíduo à sociedade? 
O processo de socialização se desenvolve em duas fases (Giddens, 
2008). Durante a infância, ocorre a socialização primária, quando a criança 
interioriza os padrões básicos de comportamentos e valores sociais. Nossas 
mães e pais nos ensinam a falar, a comer de garfo e faca, a usar o banheiro, a 
não gritar, a respeitar os adultos, dentre tantos outros valores e comportamentos 
básicos que nos permitem conviver em sociedade. Por isso, chamamos a família 
de agente de socialização primária. Depois que crescemos um pouco, temos 
 
 
10 
contato com outras instituições sociais de socialização, que dão seguimento ao 
nosso aprendizado social, na fase que chamamos de socialização secundária. A 
escola é um agente de socialização secundária importante. Como nos mostrou 
Durkheim, a função da escola não é simplesmente transmitir conhecimentos 
escolares; a escola cumpre uma função importante de socialização. Na escola, 
a criança sai da esfera privada do seu lar e entra em contato com outras crianças 
e adultos. Nas brincadeiras aprendemos a respeitar, a escutar, a negociar. Até 
mesmo quando as crianças brigam, elas são punidas e isso as ensina o que não 
devem fazer. Durkheim mostra que a principal função da escola é transformar a 
criança, que chega como um ser egoísta, em um ser social – aprender a conviver 
com os outros, a dividir. Há também a figura do professor, em referência à qual 
ela terá de respeitar a autoridade, a respeitar regras, caso contrário sofrerá 
punição. Michel Foucault, filósofo e sociólogo francês que viveu entre 1926-
1984, em sua obra Vigiar e Punir, mostrou também que a escola disciplina não 
apenas o comportamento, mas os corpos – você aprende a ficar sentado durante 
horas prestando atenção. Por meio das mais diversas relações e situações, as 
crianças vão aprendendo e incorporando as regras sociais. 
O processo de socialização secundária continua além da escola, através 
de outros agentes – dentre eles, o trabalho. Quando você entra em uma 
empresa, leva um tempinho para se situar, aprender como as pessoas 
trabalham, que tipo de relações se estabelecem (mais formal? Mais informal?) 
Esse processo de socialização se dá no dia a dia; trabalhando lado a lado, você 
aprende o que deve ou não fazer, como se comportar. Nas trocas informais, no 
almoço, nos intervalos ou até mesmo no happy hour depois do trabalho, na 
partida de futebol ou de vôlei com o pessoal da “firma”, em todos esses 
momentos de troca você está sendo socializado, ou seja, criando o sentimento 
de fazer parte de um grupo, por se identificar com os valores e os 
comportamentos desse grupo. As trocas podem ser mais ou menos intensas; o 
sentimento, delas resultante, também. A socialização acontece quando os 
indivíduos interiorizam os valores e padrões de comportamento – ou seja, eles 
não precisam mais pensar: o que eu tenho que fazer nessa situação? Como 
devo agir? A ação flui, mas ela é resultado de um aprendizado. 
 
 
 
11 
3.1 Figuras da socialização 
Já vimos que em sociologia há diversas maneiras de olhar um fenômeno, 
certo? Pois bem, não é diferente quando o assunto é explicar a socialização. 
Vamos apresentar duas figuras, sistematizadas por Berger (1986), que explicam 
o que une os indivíduos à sociedade a que pertencem. A primeira figura 
representa o homem no centro das diversas instituições que compõem a 
sociedade. Berger utiliza a imagem do indivíduo localizado no centro de círculos 
concêntricos – cada um representa um sistema de controle social: a família, a 
escola, o trabalho, o Estado: cada uma dessas instituições, externas ao 
indivíduo, moldam suas ações através do poder de coerção, uma perspectiva 
durkheimiana da socialização. (Berger, 1986). 
Figura1 – O indivíduo na sociedade 
Fonte: Elaborado com base em Berger, 1986. 
Outra figura é a sociedade no homem: a sociedade atua no indivíduo 
através dos papeis sociais e da identidade que ele assume. Você age de formas 
diferentes quando está numa roda de conversa com os amigos, num jantar de 
família ou numa reunião com seu chefe. A roupa que você usa, o vocabulário 
que escolhe para se expressar,até a sua postura muda de acordo com a 
situação, não é? De acordo com a figura da sociedade no homem, você sabe 
como agir nessas diversas situações, pois aprendeu tão bem os valores, normas 
e padrões de comportamento, que os considera como sendo seus. Utilizando um 
vocabulário sociológico, dizemos que você interiorizou as normas sociais. Temos 
Profissão
Escola
Família
Indivíduo
12 
diversos papéis sociais; no trabalho você é gestora, você sabe o que esperam 
de você lá, mas em casa você é mãe e age com seu filho de acordo com o que 
aprendeu sobre família e sobre ser mãe; mas você também é roqueira e essa 
sua identidade molda a sua forma de se apresentar aos outros, além das suas 
escolhas do que fazer e que tipo de música escutar no tempo livre. Adotamos 
diversos papéis sociais ao longo da vida; sabemos o que esperam de nós em 
cada um deles, pois interiorizamos as regras e normas de conduta social. Essa 
figura da socialização permite pensar a diversidade de situações sociais, 
representando o indivíduo como resultado da interiorização de valores e normas 
bem definidos. 
Figura 2 – A sociedade no indivíduo 
Fonte: Elaborado com base em Berger, 1986. 
TEMA 4 – OS PROCESSOS DE RACIONALIZAÇÃO E DE INDIVIDUALIZAÇÃO 
Você deve estar pensando: afinal, o que essa relação entre indivíduos e 
socialização tem a ver com o estudo da organização? Citando Etzioni (citado por 
Jaime; Lucio, 2017, p. 5) “Em geral, os cidadãos das sociedades modernas 
nascem em hospitais, são educados em escolas, trabalham em uma ou outra 
organização em de acordo com sua participação em atividades políticas ou 
religiosas, também com frequência ocupam lugares nas organizações 
complexas”. Nós passamos grande parte das nossas vidas dentro de diversas 
organizações, de modo que entender o impacto disso na nossa formação é 
essencial. 
Indivíduo
Filho
Aluno
Profissão
Pai
 
 
13 
A definição sociológica de organização enfatiza sua racionalidade. As 
organizações são “conjuntos humanos ordenados e hierarquizados em ordem a 
assegurar a cooperação e a coordenação de seus membros para determinadas 
finalidades” (Boudon, 1990, p. 181). As empresas, as administrações públicas, 
as indústrias, os partidos políticos, as associações com ou sem fins lucrativos, 
são todas organizações. As organizações, portanto, reúnem indivíduos de 
diversas origens sociais; assim, saber como funciona o processo de socialização 
é importante. Por outro lado, mesmo que sua finalidade não seja transmitir 
valores e normas sociais, elas acabam por participar da socialização dos 
indivíduos que dela participam. Assim, pensar a relação entre o indivíduo e a 
sociedade, mediada pela organização, nos abre outra perspectiva para pensar o 
dilema de toda organização, a saber: como conseguir que seus membros 
cooperem para atingir os fins visados? O processo de racionalização e o 
processo de individuação são importantes para pensar o funcionamento das 
organizações. 
O processo de racionalização está na raiz da própria Modernidade. Uma 
das características principais da nossa época é a pretensão de conhecer as 
causas e prever os efeitos dos mais diversos fenômenos, e assim pensar e agir 
no mundo com base em algo que está para além da tradição. A raiz filosófica da 
Modernidade é o racionalismo filosófico de Descartes, que busca conhecer as 
causas dos mais diversos fenômenos. (Jaime; Lucio, 2017). A sociologia nasce 
do desenvolvimento da ciência como forma de entender o mundo. Durkheim, 
Weber e Marx buscaram compreender a transição da sociedade tradicional para 
a sociedade moderna. O aprofundamento do processo de racionalização e suas 
consequências são objeto de estudos mais recentes em Anthony Giddens, em 
sua obra As Consequências da Modernidade, e em Ulrich Beck, sociólogo 
alemão que viveu entre 1944 e 2015, em sua obra A Sociedade do Risco. 
Paralelamente ao processo de racionalização, há o processo de 
individualização, que começa na passagem da sociedade tradicional para a 
sociedade moderna. Na sociedade feudal, a personalidade das pessoas era 
incorporada aos círculos sociais: a comunidade, a associação, a propriedade 
feudal. Com o surgimento das fábricas, das classes sociais, das cidades, a 
sociedade se torna mais diversificada e fragmentada: as pessoas circulam por 
mais grupos, com diferentes interesses e referencias. Georg Simmel, sociólogo 
alemão que viveu entre 1858 e 1918, em sua obra A Filosofia do Dinheiro, 
 
 
14 
enfatiza o papel do dinheiro para o surgimento do individualismo: ele questiona 
como o dinheiro é impessoal e pode ser trocado por outras coisas; 
independentemente do desempenho pessoal da pessoa que o possui, ele 
aumenta a autonomia e a independência, pois ela pode buscar o que lhe 
interessa. Com a diversificação social e cultural, nós temos a possibilidade de 
construir nossas referências. 
TEMA 5 – PERSPECTIVAS DA SOCIOLOGIA ORGANIZACIONAL 
As diferentes perspectivas sociológicas influenciaram o desenvolvimento 
da sociologia organizacional. Max Weber foi o primeiro a descrever as 
organizações modernas sistematicamente. Para Weber, as organizações são 
formas de coordenar as atividades ou a produção de bens de uma maneira 
estável ao longo do tempo e do espaço. Para tanto, as regras escritas e os 
registros das atividades são essenciais, segundo Weber (citado por Giddens, 
2008). Na perspectiva weberiana, a organização é vista como “um grupo 
deliberadamente planejado, com objetivos específicos, possuindo um conjunto 
de regras formais mais ou menos desenvolvidas e uma estrutura de autoridade, 
papéis e responsabilidades relativamente fixos” (Jaime; Lucio, 2017, p. 7). 
Weber pensa que toda grande organização tem uma natureza burocrática. É 
preciso normas de controle e de gestão para que uma grande organização 
funcione. Weber observou elementos disfuncionais na organização burocrática. 
Robert Merton, sociólogo americano de orientação funcionalista, analisou as 
consequências prejudiciais da burocracia para o funcionamento das 
organizações, ao que ele chamou de disfunções da burocracia. Ou seja, trata-se 
dos efeitos negativos e não previsíveis da organização racional. 
Outra perspectiva da sociologia das organizações lança luz aos processos 
internos das organizações, às relações interpessoais, aos conflitos. As 
pesquisas realizadas em uma fábrica em Chicago pelo cientista social Elton 
Mayo nos anos 1920 já investigavam os fatores psicossociais que afetavam os 
trabalhadores e seus desempenhos na empresa Western Electric Company. 
Nessa perspectiva, a obra O Ator e o Sistema, de Michel Crozier (1922-2013) e 
Erhard Friedberg (1942) mostra como a organização pode ser pensada como 
uma arena na qual os indivíduos buscam realizar suas necessidades de dinheiro, 
poder, status, reconhecimento social, entre outras. Esses estudos ajudam a 
pensar a distância que há entre os objetivos e as estratégias racionalmente 
 
 
15 
planejados pelos gestores da organização, e os objetivos e as estratégias 
colocados em prática pelos indivíduos participantes. 
Outra perspectiva sociológica das organizações é aquela que investiga as 
relações de diversas organizações com agentes externos, como governo, 
mercado de trabalho, cultura e concorrentes. Nessa perspectiva, as 
organizações são vistas como sistemas abertos. Por fim, uma perspectiva mais 
recente pensa a organização como um processo. Esses estudos investigam 
como se dá o processo de organização de empresas (Jaime; Lucio, 2017). 
A sociologia das organizações permite, pois, olhar para as organizações 
através de diversas lupas, cada uma mostrando um aspecto. Você, futuro gestor,já tinha pensando sobre esses diversos aspectos das organizações? Você 
consegue identificar elementos da racionalização na organização em que 
trabalha? Há disputas internas na sua organização que afetam os processos de 
trabalho? As influências do mercado e do Estado são perceptíveis? Ao longo da 
nossa disciplina de Sociologia Organizacional, vamos aprofundar essas 
perspectivas, e lhe ajudar a exercitar a imaginação sociológica, pensando em 
enxergar os problemas e as relações cotidianas através de outras lupas, e assim 
poder utilizar ferramentas que auxiliem na gestão eficiente e eficaz da 
organização. 
TROCANDO IDEIAS 
Como é a socialização na organização onde você trabalha? Quais são os 
momentos de trocas entre vocês? Você se sente parte da empresa? Compartilha 
seus valores? Ou você não se sente parte da empresa? Por que essa distância? 
NA PRÁTICA 
Você, gestor, vai gerenciar pessoas que chegam à organização com 
valores e padrões de comportamentos diversos. Que atividades ou espaços de 
trocas você pode organizar para ajudar os funcionários a conhecer e 
compartilhar os valores e os comportamentos esperados na empresa? 
FINALIZANDO 
Nesta aula, vimos que um olhar sociológico nos mostra outros aspectos 
das situações do nosso dia a dia, inclusive nas organizações onde trabalhamos. 
 
 
16 
As diversas perspectivas teóricas lançam luz a diferentes aspectos das 
organizações e das nossas ações, ampliando nossa compreensão sobre eles. 
Os processos de socialização, de individualização e de racionalização são 
centrais para compreender as relações sociais dentro das organizações. As 
diversas perspectivas da sociologia organizacional têm abordado esses 
processos sociais e suas consequências. 
Por fim, retomamos a problematização do início desta aula, do 
organograma que os funcionários não seguem. Um olhar sociológico pode lhe 
ajudar a perceber que há um esquema mais sutil e menos visível de relações 
entre os trabalhadores. Investigando, você pode se dar conta de que entre os 
funcionários há relações de lealdade e antipatia, e que há também preconceitos 
e códigos de comportamento. A gestão racional das pessoas representada no 
organograma não dá conta das relações entre as pessoas, porém elas regem 
suas ações na realização das funções diárias. 
 
 
 
17 
REFERÊNCIAS 
BECK, U. A Sociedade do risco: rumo a uma outra modernidade. São Paulo: 
Editora 34, 2010. 
BERGER, P. Perspectivas sociológicas. Petrópolis: Vozes, 1986. 
BOUDON, R. et al. (Org.). Dicionário de sociologia. Lisboa: Publicações Dom 
Quixote, 1990. 
BURKE, P. L. Perspectivas sociológicas: uma visão humanística. 23. ed. 
Petrópolis: Editora Vozes, 2001. 
FOUCAULT, M. Vigiar e punir. Petrópolis: Editora Vozes, 2014. 
FREUND, J. A Sociologia de Max Weber. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense 
Universitária, 2006. 
GIDDENS, A. As Consequências da modernidade. São Paulo: Editora da 
UNESP, 1990. 
_____. Sociologia. 6. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2008. 
JAIME, P.; LUCIO, F. Sociologia das organizações: conceitos, relatos e casos. 
São Paulo: Cengage, 2017. 
SOUZA, J.; BERTHOLD, O. Simmel e a modernidade. Brasília: Editora UNB, 
1998.

Continue navegando