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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ZOOLOGIA Beija-flores (Aves: Trochilidae) e as plantas em que forrageiam em uma comunidade de caatinga de altitude da Chapada Diamantina, Bahia. Alan Daniel Cerqueira Moura Orientador: Prof. Dr. Caio Graco Machado Feira de Santana 2012 ii UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ZOOLOGIA Beija-flores (Aves: Trochilidae) e as plantas em que forrageiam em uma comunidade de caatinga de altitude da Chapada Diamantina, Bahia. Alan Daniel Cerqueira Moura Orientador: Prof. Dr. Caio Graco Machado Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Zoologia da Universidade Estadual de Feira de Santana, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Zoologia. Feira de Santana 2012 iii “Por seres tão inventivo e pareceres contínuo, Tempo, Tempo, Tempo Tempo...” Caetano Veloso iv Agradecimentos Primeiro gostaria de agradecer ao Caio, pela relação de confiança estabelecida ao longo dos últimos seis anos em que tem se dedicado a me orientar e pela amizade que construímos neste tempo. Aos amigos Ornitólogos e afins, Aline, Danilo, Cyrio, Karol, Cris, Marcel, Pollyana, Fernando, Ana, Amanda, Érica, Emília, Maurício, André e Clézia, por serem responsáveis pelo excelente ambiente de trabalho em campo, no laboratório ou nas quintas do Andú. Sem dúvida, eu jamais teria coletado a mesma quantidade de dados sem a valiosa ajuda de todos. À minha família, por ter entendido as inúmeras viagens e a minha ausência em muitos momentos importantes e por sempre compreenderem e apoiarem as minhas escolhas. Aos queridos amigos do extrabem, Ana, Brena, Marina, Lala, Léo, Thiago e Taís, por tudo que são e pelo que fazem. Aos bons professores que tive nesta Universidade, pelo conhecimento que acrescentaram em minha vida acadêmica. Principalmente a Franzé, Priscila Paixão, José Geraldo Marques, Cássio van den Berg, Flora Juncá, Luciano Paganucci, Efigênia de Melo, Lygia Funch, Abel Conceição, Marjorie Nolasco... Agradeço muito pelo apoio das pessoas que auxiliaram na identificação das espécies de plantas, o que foi essencial para o desenvolvimento deste estudo – Dr. Luciano Paganucci, Dr. Flávio França, Dra. Efigênia de Melo, Dra. Téo Nunes, Msc. Ricardo Perdiz, Msc. Teresa Buril, Dra. Silva Ferucci, Dra. Nádia Roque, Dr. Alessandro Rapini e Dr. Floriano Pastore. À Dra. Rafaela Forzza, pela dedicação e disponibilidade na identificação das bromélias. À Dra. Daniela Zappi, pelos comentários sobre a fitofisionomia da área. Ao Marlon Machado pela identificação das espécies de cactáceas e pela eficiência com o abstract. À professora Dra. Maria José Gomes de Andrade, pela identificação e informações sobre as espécies de lorantáceas de Morro do Chapéu. Aos amigos da pós-graduação de Botânica - Fábio Espírito Santo e Eloína Neri- também pela identificação de algumas espécies de plantas, mas principalmente pela amizade e pelos momentos de descontração. v Ao professor Dr. Marco Aurélio Ribeiro Mello, pelos preciosos esclarecimentos em redes ecológicas. Aos professores Dr. Wesley Rodrigues, Dr. Augusto Piratelli e aos colegas Jeferson Bugoni, Flor Maria Las-Casas e Licléia Rodrigues pela concessão de importantes referências. Aos professores Dra. Miriam Gimenes e Dr. Gilberto Marcos Santos e Msc. Aline Góes Coelho pelas sugestões na fase inicial do projeto. À professora Dra. Andréa Araujo, pelas valiosas considerações feitas à primeira versão do manuscrito. Aos membros da banca, Dr. Marcelo Vascocelos e Dra. Márcia Rocca por aceitarem ler e contribuir com este trabalho. Aos motoristas da UEFS, Seu Lú, Seu Bené e Seu Miguel, que fizeram muito mais do que dirigir nas expedições. Ao Seu Marcelo, por todo o apoio com hospedagem e transporte, quando precisei ir ao campo sozinho. À D. Sônia, S. João e Val, que sempre nos receberam em Morro do Chapéu com muito carinho e uma mesa farta; e quem me conhece sabe o quanto isso é importante. À D. Carmem pela pontualidade com que trouxe meu almoço nestes dois anos, o que facilitou muito a minha vida. Agradeço também àqueles que foram a trilha sonora durante a organização dos dados e em outras tantas horas. Principalmente aos Doces Bárbaros, Gil, Caetano, Bethania e Gal, Novos Baianos, Chico, Tom, João Gilberto, Toquinho, Baden Power e Vinicius de Moraes, Nana Caymmi, Roberta Sá, Mayra Andrade, Virgínia Rodrigues, Cesária Évora, Ella Fitzgerald, Nina Rodrigues, Miles Davis, George Benson... À FAPESB pela concessão da bolsa que possibilitou minha estadia em Feira de Santana ao longo destes dois anos. À Universidade Estadual de Feira de Santana por toda infra-estrutura oferecida para o desenvolvimento deste estudo. Sumário Resumo ............................................................................................................................. 1 Abstract ............................................................................................................................. 2 Introdução ......................................................................................................................... 3 Metodologia ...................................................................................................................... 5 Área de estudo. ............................................................................................................. 5 Coleta de dados. ............................................................................................................ 7 Beija-flores visitantes ............................................................................................... 9 Espécies de plantas visitadas por beija-flores......................................................... 10 Análise de dados ......................................................................................................... 11 Resultados ....................................................................................................................... 12 Beija-flores visitantes ................................................................................................. 12 Espécies de plantas visitadas por beija-flores............................................................. 21 Padrão de interações entre beija-flores e plantas ........................................................ 26 Discussão ........................................................................................................................ 31 Beija-flores visitantes. ................................................................................................ 31 Plantas visitadas por beija-flores ................................................................................ 36 Padrão de interações entre beija-flores e plantas: ....................................................... 40 Conclusão ....................................................................................................................... 43 Referências Bibliográficas .............................................................................................. 44 1 Resumo Diversas espécies de plantas dependem de animais vertebrados como vetores de pólen. Na região Neotropical, os troquilídeos representam os polinizadores vertebrados mais importantes, podendo ser responsáveis pela polinização de cerca de 15% das angiospermas em uma dada comunidade. Este estudo investigou as relações entre estas aves e os seus recursos florais em uma área decaatinga de altitude da Chapada Diamantina, região considerada prioritária para a conservação pela sua alta diversidade florística e elevado número de espécies endêmicas. Em expedições bimestrais durante um ano e quatro meses, registraram-se a sazonalidade e as estratégias de forrageio das espécies de beija-flores, bem como as características florais e os padrões de floração das espécies de plantas em que forrageiam. Foram registradas oito espécies de beija-flores, cinco delas foram consideradas residentes. Anopetia gounellei e Phaethornis pretrei desempenharam estratégia de forrageio do tipo “trapliner”, visitando espécies com flores ornitófilas mais especializadas. Chlorostilbon lucidus, Eupetomena macroura e Amazilia fimbriata apresentaram comportamento territorialista, defendendo áreas com concentração de recursos florais através de interações agonísticas. As demais espécies realizaram visitas ocasionais, desempenhando o papel de “trapliners” de baixa recompensa ou generalistas. Os beija-flores forragearam em 28 espécies de plantas pertencentes a 15 famílias. Cactaceae foi a família mais representativa, seguida por Bromeliaceae e Loranthaceae. Dentre as espécies de plantas visitadas, 57% são ornitófilas. A maioria das espécies apresenta morfologia tubular da corola e a concentração média de néctar da comunidade foi 21,1 %. Dez espécies floresceram exclusivamente na estação seca, uma apenas na chuvosa e 17 em ambas as estações, de forma que houve disponibilidade de recursos florais ao longo de todo o ano. A rede de interações mutualísticas entre beija-flores e plantas apresentou padrão aninhado, com conectância de 25%. Nesta arquitetura, grande parte das interações concentra-se em um pequeno número de espécies. As diferentes estratégias de forrageio desempenhadas pelos beija-flores promovem uma menor sobreposição de nicho, o que aliado à floração contínua da comunidade de plantas, possibilita a coexistência das espécies na área. Palavras-chave: Cadeia do Espinhaço, troquilídeos, ornitofilia, rede de interações. 2 Abstract Several plant species depend on vertebrate animals as pollen vectors. In the Neotropics, the hummingbirds represent the most important vertebrate pollinators, and can be responsible for pollination of approximately 15% of all angiosperms in a given community. This study investigated the relationship between these birds and their floral resources in an area of altitudinal caatinga vegetation in the Chapada Diamantina, a region regarded as having high priority for conservation due to its high floristic diversity and endemicity species. Bi-monthly expeditions during one year and four months registered the seasonality and foraging strategies of the hummingbird species, as well as floral characteristics and flowering patterns of plant species visited and foraged by these birds. Eight species of hummingbirds were recorded, five of which were considered resident species. Anopetia gounellei and Phaethornis pretrei displayed the trapliner foraging strategy, visiting species with more specialized ornithophilous flowers. Chlorostilbon lucidus, Eupetomena macroura and Amazilia fimbriata displayed a territorial behavior, defending areas with concentration of floral resources through agonistic interactions. The remaining species made occasional visits, acting as low reward trapliners or of generalists. Hummingbirds foraged in 28 species of plants belonging to 15 families. Cactaceae was the most representative, followed by Bromeliaceae and Loranthaceae. Among the plant species visited, 57% are ornithophilous. Most of the plant species presents tubular corolla morphology and the average concentration of nectar of the community was 21.1%. Ten species flowered exclusively during the dry season, one species only during the rainy season, and 17 on both seasons, so that floral resources were available throughout the year. The network of mutualistic interactions between hummingbirds and plants displayed a nested pattern, with connectance of 25%. In this architecture, most of the interactions are focused on a small number of species. Different foraging strategies performed by those hummingbirds promote lower niche overlap, which combined with the continuous flowering of species in the plant community, enable the coexistence of hummingbird species in the area. Keywords: Espinhaço Range, Trochilidae, ornithophily, interaction network. 3 Introdução Os beija-flores (Aves: Trochilidae) estão distribuídos em cerca de 320 espécies e ocorrem exclusivamente no continente americano, com centro de origem e diversidade localizado na região dos Andes, próximo ao equador (Sick 1997). No Brasil, são conhecidas 83 espécies, distribuídas em 33 gêneros (CBRO 2011), sendo que destas, 28 ocorrem na Caatinga (Silva et al. 2003) e 24 foram registradas na região da Chapada Diamantina (Carvalhaes e Machado 2008). O domínio das caatingas se estende por uma área de aproximadamente 800.000 km² e apresenta inúmeras variações altitudinais, climáticas e geomorfológicas que se refletem em uma paisagem diversificada, com fitofisionomias distintas, que podem variar desde formações florestais até afloramentos rochosos com arbustos esparsos (Andrade-Lima 1981, Ab’Sáber 2003, Prado 2003). Em casos excepcionais, como ocorre na Chapada Diamantina e no norte do estado de Minas Gerais, a vegetação de caatinga pode ser encontrada na faixa de 1000 m acima do nível do mar, onde pode assumir uma fitofisionomia de caatinga de altitude (Zappi 2008). A Chapada Diamantina, porção norte da Cadeia do Espinhaço, apresenta a maior parte do seu território recoberto por vegetação de caatinga ou por formações vegetais a ela associadas. Encontra-se, portanto, inserida no contexto deste domínio, constituindo uma de suas oito ecorregiões (Velloso et al. 2002). Considerada uma subárea de endemismo de aves da Cadeia do Espinhaço (Vasconcelos et al. 2008) e um centro de diversidade e endemismo vegetal (Giulietti et al. 1997), a Chapada Diamantina representa uma área de expressiva importância biológica e de prioridade máxima para a conservação (Silva et al. 2004, Juncá et al. 2005). Diversas espécies de plantas dependem de animais vertebrados como vetores de pólen (Bawa 1990). No Novo Mundo, milhares de espécies são polinizadas exclusivamente por troquilídeos e em florestas neotropicais, estas aves são os polinizadores vertebrados mais importantes, podendo ser responsáveis pela polinização de até 15% das angiospermas em determinadas comunidades (Feisinger 1983, Schuchmann 1999). No Brasil, os estudos sobre as interações mutualísticas entre beija-flores e plantas em nível de comunidade ainda se encontram concentrados em áreas de Mata Atlântica da região Sudeste, onde foram conduzidos os primeiros estudos brasileiros nesta linha de pesquisa (Snow e Teixeira 1982; Snow e Snow 1986; Fischer 1994, 4 Buzato 1995, Araujo 1996, Martinelli 1997, Machado 2000, Canela 2006, Rocca-de- Andrade 2006, Machado e Semir 2006). Na região Nordeste foram investigadas as relações entre as comunidades de beija-flores e plantas em remanescentes da Mata Atlântica pernambucana (Lopes 2002), em áreas de campo rupestre da Chapada Diamantina, Bahia (Romão 2002, Machado et al. 2007, Santana e Machado 2010) e em áreas de caatinga, no estado de Pernambuco (Leal et al. 2006; Las-Casas 2009) e na Bahia (Machado, 2009). Outros estudos ainda foram conduzidos nos capões do Pantanal sul-matogrossense (Araujo e Sazima 2003), na Serra da Bodoquena, também no Mato Grosso do Sul (Faria e Araujo 2010) e na Serra do Cipó, em Minas Gerais (Rodrigues 2011). Aqueles estudos desenvolvidos em áreas de Mata Atlântica que amostraram diferentes tipos de hábitats (Buzato 1995; Araujo 1996) ou que fizeram observações no sub-bosque e no dossel florestal (Rocca-de-Andrade2006) registraram uma grande riqueza de plantas visitadas por beija-flores, variando de 50 até 86 espécies, com o pico de floração ocorrendo durante a estação chuvosa. Nos estudos pontuais realizados em diferentes tipos vegetacionais da Chapada Diamantina, tem sido registrada uma riqueza inferior, com nove espécies em uma área de cerrado (Machado et al. in prep), 28 na caatinga (Machado 2009) e 36 em uma área de campo rupestre (Machado et al. 2007). Estudos que investigaram a organização ecológica de comunidades de beija- flores em diferentes ambientes demonstraram que poucas espécies podem ser consideradas residentes. O desaparecimento de algumas espécies em determinadas épocas do ano configuram um padrão sazonal que tem sido observado em comunidades de beija-flores de diversas localidades (Stiles 1980, Araujo 1996, Sazima et al. 1996, Dziedzioch et al. 2003, Leal et al. 2006, Machado e Semir 2006, Machado et al. 2007, Las-Casas 2009, Machado 2009, Rodrigues 2011). As duas subfamílias de Trochilidae apresentam diferenciações morfológicas que podem levá-las a explorarem subconjuntos florais em uma mesma comunidade (Feisinger e Cowell 1978). A subfamília Phaethornithinae é composta por espécies de bico longo e curvo, que preferencialmente visitam flores de corola longa, enquanto a subfamília Trochilinae é representada por espécies de bico curto e reto e tendem a visitar flores de corola curta. Além disso, estas subfamílias podem apresentar diferenças também quanto ao comportamento de forrageio. A estratégia do tipo rotas de captura 5 (“trapliner”) é principalmente observada em espécies de fetornitíneos, enquanto o territorialismo é mais característico dos troquilíneos (Feisinger e Cowell 1978). Relacionados com as estratégias de forrageamento, são propostos cinco papéis ecológicos que podem ser desempenhados por beija-flores em uma dada comunidade: trapliner de alta recompensa, trapliner de baixa recompensa, territorialista, parasita de território e generalista. A ocupação destes papéis pode variar de acordo com a disponibilidade de recursos na área e com a posição em que a espécie ocupa no eixo morfológico da comunidade (sensu Feisinger e Colwell 1978). A observação de padrões repetidos na morfologia e no comportamento de espécies que coexistem sugerem que certos princípios básicos estão envolvidos na organização ecológica destas comunidades (Feisinger e Colwell 1978). Os estudos sobre interações entre os beija-flores e as espécies de plantas que polinizam têm fornecido informações importantes para o esclarecimento do papel dos troquilídeos na manutenção das comunidades vegetais, promovendo o entendimento de questões ecológicas, evolutivas, biogeográficas e de conservação (Stiles 1985, Bawa 1990, Olesen e Jordano 2002, Dalsgard et al. 2011). Devido ao elevado número de endemismos nas comunidades vegetais da Chapada Diamantina, as relações entre as espécies de plantas e seus agentes polinizadores devem ser estudadas detalhadamente, pois tendem a ser mais específicas e, portanto, mais vulneráveis às alterações ambientais. Desta forma, o conhecimento sobre a comunidade de polinizadores e da flora que exploram são importantes para o entendimento da história evolutiva e padrões de distribuição dos grupos relacionados, além de fomentar subsídios para políticas de ações conservacionistas dos organismos envolvidos e dos seus ambientes. Neste contexto, o objetivo deste estudo foi registrar quais as espécies de beija- flores que ocorrem em uma caatinga de altitude da Chapada Diamantina, seus padrões sazonais de ocorrência e estratégias de forrageio, bem como as características florais e os padrões de floração da comunidade de plantas visitadas por estas aves. Material e Métodos Área de estudo: O presente estudo foi realizado em uma área de caatinga de altitude no Parque Estadual de Morro do Chapéu, Chapada Diamantina, Bahia, (11°29’51,0’’S/ 41°19’54,9’’W) a uma altitude de 910m (Figura 1). 6 Figura 1: Mapa com a localização do Parque Estadual de Morro do Chapéu e do município de Morro do Chapéu, no estado da Bahia. (confecção: H.D.S. de Carvalho e E.C. Nolasco). 7 O Parque Estadual de Morro do Chapéu representa uma área importante para a conservação de aves no Brasil (Important Bird Área - IBA) abrigando espécies endêmicas da caatinga, como o ameaçado Herpsilochmus pectoralis (Sclater 1857) (Bencke et al. 2006). O clima da região é caracterizado como Cwa - tropical de altitude, segundo a classificação de Köppen, com a estação seca ocorrendo de abril a outubro e a chuvosa de novembro a março (CPRM 1995). A temperatura média do mês mais frio (julho) é inferior a 18°C e a do mês mais quente (janeiro) alcança valores maiores que 22 ºC. A temperatura média anual estimada gira em torno de 22°C e o índice pluviométrico é de cerca de 700 mm/ano (CPMR 1995). O relevo da região é aplainado, contudo apresenta diversos afloramentos de arenito-quartzito, além de alguns campos de dunas, provavelmente formados pela ação dos ventos (Queiroz et al. 2005). Durante a estação chuvosa, é possível observar a formação de poças temporárias entre os lajedos (Figura 2). A vegetação da área de estudo é caracterizada como um tipo distinto de caatinga que ocorre sobre areias quartzólicas distróficas, onde foram descritas novas espécies vegetais, provavelmente endêmicas desta pequena área (Queiroz et al. 2005). A fitofisionomia é denominada “caatinga de altitude”, onde o contraste entre as vegetações de campo rupestre e caatinga não são muito evidentes e ocorrem espécies características de ambas as formações (Zappi 2008) (Figura 2). Coleta de dados: Entre os meses de abril de 2010 e agosto de 2011, foram realizadas nove expedições bimestrais para a área de estudo, com cinco dias de duração. Foi traçado ao longo de uma trilha um transecto de 2 km de extensão. Este transecto foi percorrido no primeiro dia de cada coleta, com o objetivo de registrar a fenofase de floração de todos os indivíduos de plantas que potencialmente poderiam ter suas flores visitadas por troquilídeos. Foram consideradas apenas as plantas contidas em até 2 m de distância de cada lado do eixo central do transecto, totalizando, desta forma, uma área amostral de 8000 m². Após o registro dos indivíduos floridos no transecto, foram realizadas sessões de observação naturalística, através do método indivíduo-focal (Altman 1974), a olho nu ou com auxílio de binóculos, das 6:00 h às 12:00 h e das 14:00 h às 18:00 h em todas as espécies de plantas floridas visitadas por beija-flores. Sempre que possível, foram monitorados, em cada ponto de observação, mais de um indivíduo da mesma espécie ou 8 Figura 2: Aspectos da vegetação de caatinga de altitude no município de Morro do Chapéu, Chapada Diamantina, Bahia, durante a estação seca (A e C) e a chuvosa (B e D), com os detalhes dos afloramentos rochosos, dos campos de dunas e das poças temporárias (E e F). 9 de espécies diferentes, com o objetivo de otimizar o esforço amostral (Machado e Rocca 2010). Foi considerada como uma visita o intervalo de tempo em que um indivíduo de beija-flor permaneceu forrageando as flores de um indivíduo de planta monitorado, sendo computada uma nova visita cada vez que forrageava em flores de indivíduos distintos. Em cada visita foram registrados a espécie de beija-flor visitante e da planta visitada, o horário, o número e o tipo de visita. Quanto aos tipos, as visitas foram consideradas legítimas quando os beija-flores entraram em contato com as partes férteis da flor, atuando como possíveis polinizadores, e ilegítimas quando perfuravam a base da corola ou utilizaramfuros pré-existentes atuando apenas como pilhadores ou ladrões de néctar (Machado e Rocca, 2010). Beija-flores visitantes: A identificação das espécies de beija-flores foi realizada com o auxílio de guias de campo (Grantsau 1989; Sigrist 2009) e a nomenclatura taxonômica seguiu as recomendações do Conselho Brasileiro de Registros Ornitológicos (CBRO 2011). A classificação dos padrões sazonais de ocorrência das espécies de beija-flores foi estimada a partir das amostragens bimestrais, sendo consideradas residentes quando registradas em todos os meses de observação, ou quando ocorreram apenas ausências pontuais e não-residentes quando não foram registradas na área em três ou mais meses de coleta consecutivos (Machado e Rocca 2010). Quanto às estratégias de forrageamento dos beija-flores, foi determinada como estratégia trapliner, quando o beija-flor forrageia em rotas de captura, visitando flores isoladas em intervalos de tempo espaçados e regulares e a estratégia territorialista, quando há defesa de territórios ricos em recursos através de interações agonísticas (Feisinger e Colwell 1978). A análise dos papéis ecológicos desempenhados pelos beija-flores dentro da comunidade seguiu Feisinger e Colwell (1978), que estabeleceram cinco papéis: “trapliner” de alta recompensa – beija-flores de bicos longos, com tamanho corpóreo maior e alto requerimento energético; “trapliner” de baixa recompensa – bicos curtos, menor tamanho corpóreo e requerimento energético moderado; territorialista – bicos pequenos e médios, tamanho corpóreo médio e requerimento energético de moderado a alto; parasita de território – espécies de tamanho corpóreo maior e bicos longos, que ignoram as tentativas das espécies territoriais em deslocá-los da área ou espécies de 10 tamanho corpóreo menor e bicos curtos, que utilizam áreas pouco exploradas pelos donos do território e generalista - beija-flores de tamanho e comprimento de bico médio que forrageiam em flores pouco especializadas. Todas as interações agonísticas intra e interespecíficas entre os beija-flores foram registradas e organizadas em uma matriz, sendo discriminado o sexo quando há dimorfismo de plumagem. Como interações agonísticas, foram consideradas as manifestações agressivas que envolveram exibições visuais, perseguições, bicadas e a subseqüente expulsão do indivíduo subordinado do território, não sendo consideradas as manifestações sonoras (Machado e Rocca, 2010). As medidas de comprimento de bico das espécies de beija-flores visitantes foram obtidas através de espécimes da coleção da Divisão de Aves do Museu de Zoologia da Universidade Estadual de Feira de Santana (MZUEFS) e de espécimes capturados em 10 redes de neblina (3mx9m, malha 15 mm, 0,5 m do solo) montadas na área de estudo, em todos os dias durante as expedições. Espécies de plantas visitadas por beija-flores: De cada espécie de planta visitada, registrou-se o tipo de flor (tubo, pseudo-tubo, disco, pincel, funil ou estandarte - sensu Faegri e van der Pijl 1980) e a coloração da corola ou de estruturas anexas. O comprimento efetivo da corola (sensu Wolf et al. 1976) de flores tubulosas - tubo e pseudo-tubo – foi medido com paquímetro manual. Em Passiflora luetzelburgii Harms, Helicteres velutina K. Schum. e nas duas espécies do gênero Tacinga, a morfologia tubular não é observada na corola, mas sim no cálice, sendo a partir destes aferidas as medidas de comprimento do tubo. A concentração do néctar produzido foi medida com auxílio de microsseringa e refratômetro de bolso e a presença de osmóforos nas flores, através do teste do vermelho neutro (Vogel 1990). Todos estes dados foram coletados preferencialmente nas primeiras horas da manhã, em 10 flores previamente ensacadas do maior número possível de indivíduos diferentes de cada espécie (Dafni 1992, Machado e Rocca 2010). A classificação das síndromes de polinização seguiu Faegri e van der Pijl (1980), sendo consideradas ornitófilas aquelas espécies que apresentaram antese diurna, coloração conspícua (vermelha, alaranjada) da corola, cálice ou estruturas anexas, ausência de odor, néctar com concentração de açúcares entre 20 e 35% e nectários afastados das partes férteis, sendo estas últimas, expostas. 11 Para determinar padrões fenológicos são necessários registros mensais das espécies de plantas estudadas (Newstrom et al. 1994). Uma vez que este estudo foi realizado através de expedições bimestrais, os padrões fenológicos de floração das espécies de plantas visitadas por beija-flores foram estimados e a classificação seguiu Newstrom e colaboradores (1994). Partes férteis de todas as espécies de plantas visitadas por beija-flores foram coletadas e depositadas no Herbário da Universidade Estadual de Feira de Santana (HUEFS), onde foram identificadas por especialistas ao menor nível taxonômico possível. A nomenclatura botânica seguiu The International Plant Names (2011). Análise de dados: Foi utilizado o índice de Jaccard para avaliar a similaridade no uso dos recursos florais pelas diferentes espécies de beija-flores e uma análise de agrupamento (dendrograma) foi feita com uso do programa PAST 1.84. Para verificar a existência de correlação entre o comprimento da corola das flores tubulosas e o comprimento do bico de seus respectivos beija-flores visitantes, foi calculado o índice de Spearman com uso do programa BIOESTAT 5.0 (Ayres et al. 2007). Toda visita legítima foi considerada como uma interação mutualística. Com base nestes registros, foi construída uma matriz binária que descreveu as interações entre beija-flores e espécies de plantas visitadas. Através desta matriz, foi calculado o número de interações e o índice de importância para cada espécie de planta e de beija-flor. O índice de importância Ij, desenvolvido por Murray (2000) é calculado pela fórmula Ij= ∑ [(Cij/Ti)/S], onde i é a espécie vegetal, j é a espécie de beija-flor, Ti é o número total de espécies de beija-flores que visitam a espécie vegetal i, S é o número total de espécies vegetais incluídas na amostra, Cij é 1 se o beija-flor j visita a espécie vegetal i e zero se ele não visita. A mesma fórmula foi utilizada para calcular os índices de importância das espécies de plantas. Nesse caso, i foi considerado a espécie de beija-flor e j a espécie de planta; os valores do índice podem variar de zero a um. A mesma matriz utilizada para o cálculo do índice de Murray foi empregada para analisar os parâmetros qualitativos da rede de interações entre beija-flores e plantas na área estudada (sensu Jordano 1987, Bascompte e Jordano 2006). Foram calculados o tamanho da rede (S), que representa o seu número de componentes, calculado pela somatória do número de espécies de plantas (P) e o de beija-flores (A), ou S = P+A. 12 A conectância (C) corresponde à razão entre o número de interações observadas e o número de interações que seriam possíveis, calculada pela fórmula C = 100.I/A.P, onde I = número de interações observadas. A conectância é uma medida geral do nível de generalização das espécies que compõem a rede (Jordano 1987). A distribuição do grau na comunidade de plantas (Ln) e de beija-flores (Lm) representa o modo como as interações estão distribuídas pelas espécies. O grau médio para plantas (<Ln>) e beija-flores (<Lm>) correspondem à média do número de interações por espécie nestes dois grupos. Em uma rede de interações mutualística, as espécies são tratadas como nós e a interação entre elas como ligações (Bascompte e Jordano 2006). Desta forma, com a utilização do programa Pajek foi construído um grafo bipartido, onde as espécies de beija-flores e plantas são representadas por vértices, os quais estão conectados por linhas quando há registro de interação. As visitas ilegítimas foram desconsideradas nas análises de correlação entrebico e corola, na rede de interações mutualísticas e no cálculo dos índices de importância das espécies de beija-flores, todavia foram consideradas para calcular o índice de importância das espécies de plantas na dieta dos beija-flores. Resultados Beija-flores visitantes: Foram registradas oito espécies de beija-flores, sendo duas pertencentes à subfamília Phaethornithinae, Anopetia gounellei (Boucard, 1891) e Phaethornis pretrei (Lesson e Delattre, 1839), e seis representantes da subfamília Trochilinae: Eupetomena macroura (Gmelin, 1788), Chlorostilbon lucidus (Shaw, 1812), Chrysolampis mosquitus (Linnaeus, 1758), Amazilia fimbriata (Gmelin, 1788), Amazilia lactea (Lesson, 1832) e Heliomaster squamosus (Temminck, 1823) (Figura 3). Phaethornis pretrei e C. lucidus ocorreram em todas as expedições, enquanto E. macroura, H. squamosus e A. gounellei tiveram ausências pontuais ao longo deste estudo (Tabela 1). Quanto à estimativa dos padrões sazonais de ocorrência, estas cinco espécies podem ser consideradas residentes na área. Registros de nidificação de A. gounellei e C. lucidus foram feitos em dezembro de 2010 e junho de 2011, respectivamente. 13 Figura 3: Espécies de beija-flores registradas entre abril de 2010 e agosto de 2011 em uma área de caatinga de altitude, município de Morro do Chapéu, Chapada Diamantina, Bahia. 1: Chlorostilbon lucidus; 2: Amazilia lactea; 3: Amazilia fimbriata; 4: Chrysolampis mosquitus; 5: Heliomaster squamosus; 6: Eupetomena macroura; 7: Phaethornis pretrei; 8: Anopetia gounellei. Créditos das fotos: Fernando Flores (1, 3 e 6), Elisa Torricelli (2), Marcelo Monteiro (4), Sérgio Cedraz (5), Vital Teixeira (7) e Ciro Albano (8). 14 Tabela 1: Período de ocorrência das espécies de beija-flores entre os meses de abril de 2010 e agosto de 2011, em uma área de caatinga de altitude, município de Morro do Chapéu, Chapada Diamantina, Bahia. Ano Subfamília/Espécie 2010 2011 Abr Jun Ago Out Dez Fev Abr Jun Ago Phaethornithinae Phaethornis pretrei (Lesson & Delattre, 1839) x x x x x x x x Anopetia gounellei (Boucard, 1891) x x x x x x x x Trochilinae Chlorostilbon lucidus (Shaw, 1812) x x x x x x x x x Eupetomena macroura (Gmelin, 1788) x x x x x x x x Heliomaster squamosus (Temminck, 1823) x x x x x x x Chrysolampis mosquitus (Linnaeus, 1758) x x x Amazilia lactea (Lesson, 1832) x x Amazilia fimbriata (Gmelin, 1788) x x 15 Indivíduos de Amazilia lactea e A. fimbriata foram registrados em apenas duas coletas não-consecutivas, sendo consideradas espécies não-residentes, juntamente com C. mosquitus, que ocorreu principalmente durante a estação chuvosa. Em dezembro de 2010, foram registradas todas as oito espécies ocorrentes (Tabela 1). De modo geral, as espécies de Phaethornitinae desempenharam a estratégia de forrageio do tipo trapliner, visitando sempre de maneira legítima e em intervalos de tempo espaçados (cerca de 40 min), aquelas espécies de plantas com flores mais especializadas. Indivíduos de C. lucidus, A. fimbriata e E. macroura apresentaram comportamento tipicamente territorialista, defendendo áreas com concentração de recurso floral através de interações agonísticas. As demais espécies realizaram visitas ocasionais, desempenhando os papéis de trapliners de baixa recompensa ou generalistas. Chlorostilbon lucidus explorou as flores de todas as espécies de plantas registradas (28 spp.), sendo o visitante exclusivo de 15 espécies, o que representa mais de 50% da comunidade (Tabela 2). Forrageou de maneira legítima em 22 espécies, atuou como ladrão de néctar nas flores de Piriadacus erubescens Pichon, Pachira retusa (Mart. & Zucc.) Fern. Alonso e Handroanthus impetiginosus (Mart. ex DC) Mattos e realizou tanto visitas legítimas quanto ilegítimas em Handroanthus selachidentatus (A.H. Gentry) S. O. Grose, Ipomoea subincana Meisn. e Helicteres velutina K. Schum (Figura 4). Embora a estratégia territorialista tenha sido observada com maior freqüência nesta espécie, indivíduos de ambos os sexos também forragearam em rotas de baixa recompensa, as quais incluíam tanto espécies ornitófilas quanto não- ornitófilas. Além disso, fêmeas de C. lucidus também foram registradas forrageando sem vocalizar em porções pouco utilizadas de territórios do macho, o que configura um típico comportamento de um parasita de território. Eupetomena macroura visitou de maneira legítima sete espécies de plantas, quatro delas ornitófilas, e atuou como ladrão de néctar nas flores de Pachira retusa, que é uma espécie quiropterófila (Tabela 2, Figura 4). Indivíduos dessa espécie de beija-flor foram territorialistas e defenderam manchas de recurso floral apenas durante o pico de floração de Passiflora luetzelburgii Harms em dezembro de 2010 e de Micranthocereus flaviflorus Buining e Brederoo, em junho de 2011. 16 Tabela 2: Espécies de plantas visitadas por beija-flores em uma área de caatinga de altitude no município de Morro do Chapéu, Chapada Diamantina, Bahia, entre abril de 2010 e agosto de 2011. Hábito: Herbáceo (Her), Arbustivo (Abv), Arbóreo (Arb), Liana (Lia). Tipo de Flor (TF): Disco (Di), Tubular (Tb), Pseudo-tubular (Pt), Estandarte (Es), Pincel (Pi). Cor: Branca (Br), Lilás (Li), Rosa (Ro), Roxa (Rx), Laranja (La), Amarela (Am), Azul (Az), Vermelha (Ve). Comprimento do tubo (CT) (mm) média ± desvio padrão. Concentração de néctar (CN) (%) média ± desvio padrão. Síndrome de polinização (S): Entomofilia (En), Ornitofilia (Or), Quiropterofilia (Qu). Beija-flores visitantes: Chlorostilbon lucidus (CHL), Eupetomena macroura (EUP), Amazilia lactea (AML), Amazilia fimbriata (AMF), Chrysolampis mosquitus (CHR), Heliomaster squamosus (HEL), Anopetia gounellei (ANO) e Phaethornis pretrei (PHA). Família/ Espécie Hábito TF Cor CT CN S Beija-flores visitantes Apocynaceae Nephradenia asparagoides (Decne.) E. Fourn. Lia Di Br - - En CHL Asteraceae Lessingianthus linearis (Spreng.) H.Rob. Abv Tb Li 7,39 ± 0,64 (10) - En CHL Bignoniaceae Handroanthus impetiginosus (Mart. ex DC) Mattos Arb Tb Ro 36,78 ± 3,31 (10) 15,2 ± 4,21 (5) En CHL, EUP, HEL Handroanthus selachidentatus (A.H. Gentry) S. O. Grose Arb Tb Rx 41,55 ± 0,92 (10) 22,2 ± 5,94 (10) En CHL, EUP, HEL, PHA Piriadacus erubescens Pichon Lia Tb La 44,74 ± 2,27 (10) 29,5 ± 3,27 (10) Or CHL, HEL, AML Bromeliaceae Hohenbergia ramageana Mez Her Pt Li/Ve 12,76 ± 0,88 (10) 21,6 ± 3,27 (10) Or CHL Encholirium brachypodium L.B. Sm. & Read Her Pt Am 10,71 ± 1,23 (10) 28,4 ± 8,11 (10) Or CHL Neoglaziovia variegata (Arruda) Mez Her Pt Li/Ve 19,02 ± 1,72 (10) 21 ± 3,11 (7) Or CHL, ANO Cactaceae Melocactus ernestii Vaupel Her Tb Ro 19.95 ± 1,49 (10) 27 ± 2 (3) Or CHL Melocactus concinnus Buining & Brederoo Her Tb Ro 20,9 ± 2,27 (4) 18 ± 1,41 (2) Or CHL Pilosocereus pachycladus F. Ritter Arb Tb Br 51,2 ± 5,23 (10) 18,5 ± 2,92 (10) Qu CHL, EUP, PHA, ANO Tacinga inamoena (K. Schum.) N.P. Taylor & Stuppy Her Tb La 24,79 ± 1,56 (10) 22,6 ± 2,8 (10) Or CHL Tacinga werneri (Eggli) N.P.Taylor & Stuppy Her Tb La 22,2 ± 2,24 (4) 22 ± 1,41 (2) Or CHL, ANO Micranthocereus flaviflorus Buining e Brederoo Her Tb La 17,49 ± 1,05 (10) 20,1 ± 3,38 (10) Or CHL, EUP, ANO, PHA, AML,CHR 17 Tabela 2. Continuação Família/ Espécie Hábito TF Cor CT CN S Beija-flores visitantes Convolvulaceae Ipomoea subincana Meisn. Abv Tb Rx 54,35 ± 4,48 (4) 18,8 ± 8,53 (10) En CHL Cucurbitaceae Apodanthera villosa C. Jeffrey Lia Tb Am/La 12,6 ± 0,67 (10) 17,05 ± 3,9 (10) Or CHL Euphorbiaceae Jatropha mutabilis Benth. Abv Di Ve - 15,4 ± 1,67 (5) Or CHL, EUP Fabaceae Mysanthus uleanus(Harms) G.P. Lewis & A. Delgado Lia Es Rx - 20 ± 0 (4) En CHL Bionia coriacea (Nees & C. Mart.) Benth. Abv Pt Ve 36,91 ± 2,76 (10) 23,88 ± 5,17 (8) Or CHL, PHA Lamiaceae Hyptis cuniloides Epling Abv Tb Az - - En CHL Eriope latifolia (Mart. Ex Benth.) Harley Abv Tb Ro 7,53 ± 0,82 (10) 22,5 ± 2,65 (4) En CHL Loranthaceae Ligaria teretiflora (Rizzini) Kuijt Epi Pt Ve 19,82 ± 1,21 (10) 22,7 ± 3,3 (10) Or CHL, EUP, AMF Psittacanthus bicalyculatus Mart. Epi Pt La 28,57 ± 1,97 (10) 15,5 ± 2,17 (10) Or CHL, HEL, CHR Tripodanthus acutifolius (Ruiz & Pav.) Tiegh. Abv Pt Br 5,11 ± 1,16 (10) 19,45 ± 5,25 (10) En CHL Malvaceae Pachira retusa (Mart. & Zucc.) Fern. Alonso Arb Pi Br - 16,9 ± 7,87 (10) Qu CHL, EUP Sapindaceae Serjania aff caracasana (Jacq.) Willd. Lia Di Br - 22,75 ± 2,22 (4) En CHL Sterculiaceae Helicteres velutina K. Schum. Abv Tb Ve 21,8 ± 0,93 (10) 20,1 ± 1,47 (6) Or CHL Passifloraceae Passiflora luetzelburgii Harms Lia Tb Ve 18,69 ± 1,89 (10) 26,4 ± 1,67 (5) Or CHL, EUP, HEL, PHA, ANO, AML, CHR 18 Figura 4: Registros de visitas legítimas e ilegítimas das espécies de beija-flores em uma área de caatinga de altitude, município de Morro do Chapéu, Chapada Diamantina, Bahia, entre os meses de abril de 2010 e agosto de 2011. Visitas legítimas de Anopetia gounellei, Phaethaornis pretrei e Eupetomena macroura às flores de Passiflora luetzelburgii (Passifloraceae) (1, 2 e 3) e de Chlorostilbon lucidus em Apodanthera villosa (Cucurbitaceae), Tacinga inamoena e Tacinga werneri (Cactaceae), Encholirium brachypodium (Bromeliaceae), Pilosocereus pachycladus (Cactaceae) (4,5,6,7 e 8), e registro de visitas ilegítimas de C. lucidus às flores de Pachira retusa (Malvaceae) (9). 19 Indivíduos de A. gounellei e P. pretrei visitaram flores de quatro espécies ornitófilas, sempre de maneira legítima e em intervalos de tempo espaçados (Tabela 2, Figura 4). Também foram registradas visitas legítimas destas espécies às flores da cactácea quiropterófila Pilosocereus pachycladus F. Ritter. Nesta espécie, os beija- flores estabeleceram a rota de forrageio no final da tarde, logo após o período inicial da antese, quando foi observada uma grande produção de néctar, ou logo nas primeiras horas da manhã, quando as suas flores ainda permaneciam abertas, mesmo que parcialmente. Heliomaster squamosus visitou de maneira legítima, mas em uma baixa freqüência, as flores de cinco espécies de plantas, três delas ornitófilas (Tabela 2). Indivíduos desta espécie de beija-flor foram sempre registrados sobrevoando os estratos mais altos da vegetação, onde visitaram apenas flores tubulosas e com corolas mais longas de espécies com hábito arbóreo, lianescente ou epifítico (Tabela 2) Amazilia fimbriata, A. lactea e C. mosquitus foram os únicos beija-flores que forragearam exclusivamente em espécies de plantas com os atributos florais relacionados com a síndrome da ornitofilia (Tabela 2). Amazilia fimbriata visitou apenas uma espécie [Ligaria teretiflora (Rizzini) Kuijt] apresentando comportamento territorial em junho de 2011, quando defendeu, por três dias consecutivos, uma mancha de recurso floral composta por oito indivíduos desta espécie de planta. Entre as sessões de visitas, ficou sempre empoleirado em galhos próximos e expulsou todos os indivíduos de C. lucidus que se aproximaram. Indivíduos de A. lactea e C. mosquitus realizaram visitas ocasionais tanto em manchas de recurso quanto em flores isoladas e ocuparam o papel ecológico de espécies generalistas. Forragearam de maneira legítima em todas as espécies, com exceção de Piriadacus erubescens que foi pilhada por A. lactea. Foram registradas 272 interações agonísticas entre os beija-flores (Tabela 3), das quais apenas 22% corresponderam a interações interespecíficas. Foram contabilizados 190 eventos intraespecíficos de C. lucidus, envolvendo indivíduos de ambos os sexos, porém com predominância das disputas entre machos, com 111 interações registradas (Tabela 3). Esta espécie também esteve envolvida em 55 interações interespecíficas, onde foi dominante em 67% dos casos, tendo sido subordinada principalmente por E. macroura. Agonismos intra-específicos ocorreram ainda entre indivíduos de A. gounellei (1) e E. macroura (13). 20 Tabela 3: Matriz de interações agonísticas entre as espécies de beija-flores em uma área de caatinga de altitude, município de Morro do Chapéu, Chapada Diamantina, Bahia, entre abril de 2010 e agosto de 2011. Foi realizado o somatório dos eixos horizontal (número de vezes em que a espécie dominou) e vertical (número de vezes em que a espécie foi subordinada) de cada espécie, onde ∑1 = somatória das interações interespecíficas e ∑2= somatória total. Os valores em negrito correspondem às interações intraespecíficas. Chlorostilbon lucidus macho (CHLm), Chlorostilbon lucidus fêmea (CHLf), Eupetomena macroura (EUP), Amazilia lactea (AML), Amazilia fimbriata (AMF), Chrysolampis mosquitus (CHR), Heliomaster squamosus (HEL) Anopetia gounellei (ANO) e Phaethornis pretrei (PHA). Espécies dominates Espécies subordinadas CHLm CHLf EUP AML CHR HEL ANO PHA AMF ∑1 ∑2 CHLm 111 34 7 1 - - 5 14 - 27 172 CHLf 33 12 1 - 1 - 1 - 3 48 EUP 11 1 19 4 - - 1 - - 17 36 AML 1 - - - - - - - - 1 1 CHR - - - - - - - - - 0 0 HEL - - - - - - - - - 0 0 ANO - - - - - - 2 1 - 1 3 PHA 2 - - - - - - - - 2 2 AMF 1 9 - - - - - - - 10 10 ∑1 15 10 8 5 1 0 6 16 0 61 - ∑2 159 56 27 5 1 0 8 16 0 - 272 21 Espécies de plantas visitadas por beija-flores: Vinte e oito espécies de plantas, distribuídas em 15 famílias botânicas, tiveram suas flores visitadas por troquilídeos (Tabela 2, Figura 5). A família mais representativa foi Cactaceae, com seis espécies, seguida por Bromeliaceae, Bignoniaceae e Loranthaceae, todas com três espécies; Fabaceae e Lamiaceae foram representadas com duas espécies e as nove famílias restantes com apenas uma espécie (Tabela 2). Outras duas espécies de plantas não- ornitófilas - Bauhinia acuruana (Fabaceae) e Tillandsia streptocarpa (Bromeliaceae) – também foram visitadas por beija-flores, mas em uma frequência muito baixa, não sendo consideradas neste estudo. Dentre a comunidade de plantas exploradas por beija-flores, 16 espécies foram classificadas como ornitófilas (57%) e as demais enquadraram-se em outras síndromes de polinização como a entomofilia (36%) e a quiropterofilia (7%) (Tabela 2). As espécies que tiveram os maiores valores de freqüência de visita dos beija-flores foram a entomófila Handroanthus impetiginosus. (7,65), e as ornitófilas Ligaria teretiflora (2,52) e Passiflora luetzelburgii (2,1) (Tabela 4). Não foi observado o predomínio de um hábito específico dentre as espécies de plantas, sendo registradas visitas dos beija-flores em oito espécies herbáceas, oito arbustivas, seis lianescentes, quatro arbóreas e duas epífitas (Tabela 2). Algumas espécies encontram-se distribuídas de maneira dispersa ao longo do transecto, com poucas flores abertas por indivíduo (e.g. B. coriacea, N. variegata, P. erubescens e P. pachycladus) enquanto outras formam manchas de indivíduos agregados com muitas flores abertas por dia (e.g. L. linearis, T. inamoena, E. latifolia e L. teretiflora). A coloração da corola é conspícua em 53% das espécies, com predomínio do vermelho e do laranja (Tabela 2, Figura 5). A maioria das espécies (71%) apresentou flores tubulosas e os valores do comprimento do tubo variaram de 5,11 ± 1,16 mm, em Tripodanthus acutifolius, a 54,35 ± 4,48 mm, em Ipomoea subincana (Tabela 2). A concentração média de néctar da comunidade de plantas exploradas é 21,1% variando de 15,2 ± 4,21% na entomófila H. impetiginosus a 29,5 ± 3,27%, na ornitófila Piriadacuserubesbens (Tabela 2). Quanto aos padrões fenológicos de floração estimados, 71% das espécies apresentam padrão anual ou sub-anual, com duração intermediária de um a cinco meses (Figura 6, Tabela 4). 22 Figura 5: Espécies de planta visitadas por beija-flores em uma área de caatinga de altitude, município de Morro do Chapéu, Chapada Diamantina, BA. 1: Micranthocereus flaviflorus; 2: Tacinga werneri 3: Tacinga inamoena; 4: Melocactus ernestii; 5: Melocactus concinnus; 6: Jatropha mutabillis; 7: Hohenbergia ramageana (hábito) 8: Hohenbergia ramageana (flor); 9: Helicteres velutina; 10: Ligaria teretiflora; 11: Bionia coriacea; 12: Neoglaziovia variegata; 13: Passiflora luetzelburgii; 14: Psittacanthus bycaliculatus; 15: Encholirium brachypodium; 16: Piriadacus erubescens; 17: Apodanthera villosa; 18: Lessingianthus linearis; 19: Ipomoea subincana; 20: Handroanthus selachidentatus; 21: Nephradenia asparagoides; 22: Serjania aff. caracasana; 23: Tripodanthus acutifolius; 24: Pilosocereus pachycladus; 25: Mysanthus uleanus; 26: Pachira retusa; 27: Hyptis cuniloides; 28: Eriope latifolia ; 29 e 30: Handroanthus impetiginosus. 23 Tabela 4: Espécies de plantas e seus respectivos beija-flores visitantes em uma área de caatinga de altitude no município de Morro do Chapéu, Chapada Diamantina, Bahia, entre abril de 2010 e agosto de 2011. Número de indivíduos monitorados (NI), Número total de horas de observação focal (NH), Número total de sessões de visitas dos beija-flores (NV), Frequência toda de visitas (sessões de visitas por indivíduo/hora de observação) (FT). Frequência relativa (%): Chlorostilbon lucidus (CHL), Eupetomena macroura (EUP), Amazilia lactea (AML), Amazilia fimbriata (AMF), Chrysolampis mosquitus (CHR), Heliomaster squamosus (HEL), Anopetia gounellei (ANO) e Phaethornis pretrei (PHA). Padrão de floração: An: anual, Sb- sub-anual, Co-contínuo, In: Intermediário, Lo: longo. Família/ Espécie NI NH NV FT Frequência relativa de visitas (%) Padrão de Floração CHL EUP ANO PHA AML AMF CHR HEL Apocynaceae Nephradenia asparagoides (Decne.) E. Fourn. 14 98 38 0,38 100 - - - - - - - In/Sb Asteraceae Lessingianthus linearis (Spreng.) H.Rob. 38 590 393 0,66 100 - - - - - - - In/An Bignoniaceae Handroanthus impetiginosus 4 36 276 7,65 98 1,9 - - - - - 0,1 In/An Handroanthus selachidentatus (A.H. Gentry) S. O. Grose 11 86 137 1,58 96 1.5 - 1.5 - - - 1 In/An Piriadacus erubescens Pichon 8 70 16 0,23 25 - - 38 12 - - 25 In/An Bromeliaceae Hohenbergia ramageana Mez 17 108 93 0,86 100 - - - - - - - In/An Encholirium brachypodium L.B. Sm. & Read 13 105 211 2 100 - - - - - - - In/An Neoglaziovia variegata (Arruda) Mez 5 41 34 0,82 91 - 9 - - - - - In/An Cactaceae Melocactus ernestii Vaupel 50 184 340 1,8 100 - - - - - - - Co Melocactus concinnus Buining & Brederoo 6 20 42 2,1 100 - - - - - - - In/Sb Pilosocereus pachycladus F. Ritter 10 87 46 0,51 57 8 22 13 - - - - In/An Tacinga inamoena (K. Schum.) N.P. Taylor & Stuppy 18 96 112 1,16 100 - - - - - - - In/Sb Tacinga werneri (Eggli) N.P.Taylor & Stuppy 3 26 20 0,79 100 - 0 - - - - - In/An Micranthocereus flaviflorus Buining e Brederoo 139 1180 1408 1,19 93 5 0,9 0,1 0,9 - 0,1 - Lo/Anu 24 Tabela 4. Continuação. Família/ Espécie NI NH NV FT Frequência relativa de visitas (%) Padrão de Floração CHL EUP ANO PHA AML AMF CHR HEL Convolvulaceae Ipomoea subincana Meisn. 11 90 80 0.88 100 - - - - - - - In/An Cucurbitaceae Apodanthera villosa C. Jeffrey 19 200 341 1.7 100 - - - - - - - Co Euphorbiaceae Jatropha mutabilis Benth. 17 90 58 0.64 95 5 - - - - - - Lo/Sb Fabaceae Mysanthus uleanus (Harms) G.P. Lewis & A. Delgado 6 38 24 0.63 100 - - - - - - - Co Bionia coriacea (Nees & C. Mart.) Benth. 39 306 164 0.54 72 - - 28 - - - - Co Lamiaceae Hyptis cuniloides Epling 2 17 6 0.35 100 - - - - - - - Lo/Sb Eriope latifolia (Mart. Ex Benth.) Harley. 10 200 381 1.9 100 - - - - - - - In/An Loranthaceae Ligaria teretiflora (Rizzini) Kuijt 44 355 897 2.52 65 4 - - - 31 - - Lo/Anu Psittacanthus bicalyculatus Mart. 13 122 120 0.97 96 - - - - - 3 1 In/An Tripodanthus acutifolius (Ruiz & Pav.) Tiegh. 4 50 55 1.1 100 - - - - - - - In/An Malvaceae Pachira retusa (Mart. & Zucc.) Fern. Alonso 9 58 87 1.49 91 9 - - - - - - In/An Sapindaceae Serjania aff caracasana (Jacq.) Willd. 9 102 110 1.08 100 - - - - - - - In/An Sterculiaceae Helicteres velutina K. Schum. 14 115 87 0.75 100 - - - - - - - In/Sb Passifloraceae Passiflora luetzelburgii Harms 11 87 183 2.1 3 46 31 16 0,1 - 0,9 2 In/Sb 25 Figura 6: Fenologia de floração das espécies de plantas visitadas por beija-flores entre os meses de abril de 2010 e agosto de 2011 em uma área de caatinga de altitude, município de Morro do Chapéu, Chapada Diamantina, Bahia. 26 O padrão de floração contínuo foi observado em apenas três espécies (Bionia coriacea; Mysanthus uleanus e Melocactus ernestii), as quais estiveram floridas em todos os meses estudados (Tabela 4; Figura 6). Dez espécies estiveram em fenofase de floração exclusivamente na estação seca, uma apenas na chuvosa e 17 floresceram em ambas as estações, havendo disponibilidade de recurso floral ornitófilo e não- ornitófilo ao longo de todo o período estudado (Figura 6). Nos meses de abril e agosto de 2011, que correspondem aproximadamente ao início e ao final da estação seca, foram registradas as maiores riquezas de espécies de plantas visitadas por beija-flores, com 16 e 17 espécies floridas, respectivamente (Figura 6). Padrão de interações entre beija-flores e plantas: Na similaridade entre os beija- flores de acordo com as espécies de plantas que visitam, pode-se observar o isolamento de A. fimbriata e C. lucidus das demais espécies. As espécies restantes formam dois grupos. Nestes grupos, a maior similaridade foi observada entre as espécies C. mosquitus e A. lactea (Figura 7). Houve correlação positiva e significativa entre o comprimento do bico dos beija- flores e o da corola das espécies visitadas de maneira legítima (r = 0,33, p< 0,05, n=48). O cálculo do índice de importância revelou que C. lucidus apresenta um valor bastante superior ao observado nas demais espécies, sendo responsável por concentrar 46% de todas as interações registradas (Figura 8). Em seguida estão E. macroura, P. pretrei, H. squamosus e A. gounellei, que apresentaram valores de importância similares entre si (Figura 8). Amazilia lactea, A. fimbriata e C. mosquitus foram as espécies com os menores valores (Figura 8). Dentre a comunidade de plantas visitadas, os valores de importância encontram- se distribuídos de forma gradual, não sendo observado um valor pronunciado de uma determinada espécie. P. luetzelburgii, M. flaviflorus e L. teretiflora apresentaram os maiores valores e, portanto, podem ser consideradas como os recursos florais mais importantes para a comunidade de beija-flores (Figura 8). Se forem desconsideradas as espécies visitadas exclusivamente por C. lucidus (15), pode-se observar que, dentre o conjunto das 13 espécies mais importantes, 69% são ornitófilas e 60% apresentam concentração de néctar maior do que 20% (Figuras 5 e 8; Tabela 2). A rede de interações mutualísticas formada entre as comunidades de beija-flores e plantas apresentou um padrão aninhado, com grande parte das interações concentradas em um pequeno número de espécies (Figuras 9 e 10). 27 Figura 7: Análise de agrupamento com uso do índice de similaridade de Jacaard entre asespécies de beija-flores de acordo com a similaridade do uso de recursos florais em uma área de caatinga de altitude, município de Morro do Chapéu, Chapada Diamantina, Bahia. Chlorostilbon lucidus (CHL), Eupetomena macroura (EUP), Amazilia lactea (AML), Amazilia fimbriata (AMF), Chrysolampis mosquitus (CHR), Heliomaster squamosus (HEL) Anopetia gounellei (ANO) e Phaethornis pretrei (PHA). 28 Figura 8: Valores do índice de importância das oito espécies de beija-flores e das 13 espécies de plantas que apresentaram os maiores índices em uma área de caatinga de altitude, município de Morro do Chapéu, Chapada Diamantina, Bahia. 29 Figura 9: Rede de interações entre as 27 espécies de plantas que foram visitadas de forma legítima pelas oito espécies de beija-flores em uma área de caatinga de altitude, município de Morro do Chapéu, Chapada Diamantina, Bahia. Os valores representados ao lado de cada espécie correspondem ao número de interações realizadas (grau). 2 5 7 6 5 5 3 2 1 C h lo ro st il b o n l u ci d u s E u p et o m en a m a cr o u ra P h a et h o rn is p re tr ei H el io m a st er s q u a m o su s A n o p et ia g o u n el le i C h ry so la m p is m o sq u it u s A m a zi li a l a ct ea A m a zi li a f im b ri a ta 7 Passiflora luetzelburgii 1 1 1 1 1 1 1 6 Micranthocereus flaviflorus 1 1 1 1 1 1 4 Handroanthus selachidentatus 1 1 1 1 4 Pilosocereus pachycladus 1 1 1 1 3 Ligaria teretiflora 1 1 1 3 Psittacanthus bycaliculatus 1 1 1 2 Piriadacus erubescens 1 1 2 Handroanthus impetiginosus 1 1 2 Bionia coriacea 1 1 2 Neoglaziovia variegata 1 1 2 Jatropha mutabilis 1 1 2 Tacinga werneri 1 1 1 Nephradenia asparagoides 1 1 Lessingianthus linerais 1 1 Hohenbergia ramageana 1 1 Encholirium brachypodium 1 1 Ipomoea subincana 1 1 Apodanthera villosa 1 1 Melocactus ernestii 1 1 Melocactus concinnus 1 1 Tacinga inamoema 1 1 Helicteres velutina 1 1 Tripodanthus acutifolius 1 1 Serjania aff caracasana 1 1 Mysanthus uleanus 1 1 Hyptis cuniloides 1 1 Eriope latifolia 1 30 Figura 10: Rede de interações mutualísticas entre as 27 espécies de plantas que foram visitadas de forma legítima pelas oito espécies de beija-flores em uma área de caatinga de altitude, município de Morro do Chapéu, Chapada Diamantina, Bahia. Passiflora luetzelburgii Micranthocereus flaviflorus Handroanthus selachidentatus Pilosocereus pachycladus Ligaria teretiflora Psittacanthus bycaliculatus Piriadacus erubescens Handroanthus impetiginosus Bionia coriacea Neoglaziovia variegata Jatropha mutabilis Tacinga werneri Nephradenia asparagoides Lessingianthus linearis Hohenbergia ramageana Encholirium brachypodium Ipomoea subincana Apodanthera villosa Melocactus ernestii Melocactus concinnus Tacinga inamoema Helicteres velutina Tripodanthus acutifolius Serjania aff. caracasana Mysanthus uleanus Hyptis cuniloides Eriope latifolia C. lucidus E. macroura P. pretrei H. squamosus A. gounellei C. mosquitus A. lactea A. fimbriata 31 Nesta arquitetura, beija-flores especialistas visitam espécies de plantas generalistas e plantas especialistas são visitadas por beija-flores generalistas. Oito espécies de beija-flores visitaram de maneira legítima as flores de 27 espécies de plantas, sendo registradas 54 interações (Figura 10). Estes valores conferem a rede um tamanho de 35 (S) e uma conectância de 25% (C). O grau médio da comunidade de beija-flores (<Lm>) foi de 6,75 variando de 1 a 27, enquanto o valor do grau médio entre as espécies de plantas (< Ln>) foi 2, variando de 1 a 7 (Figura 10). Se forem consideradas apenas as espécies de plantas ornitófilas, a rede passa a apresentar um tamanho de 24, com 36 interações registradas e uma conectância de 28%. Discussão Beija-flores visitantes: A riqueza de espécies de beija-flores registrada neste estudo foi similar à que tem sido reportada em outras áreas de caatinga (Leal et al. 2006, Las-Casas 2009, Machado 2009), em comunidades de campo rupestre da Cadeia do Espinhaço (Vasconcelos e Lombardi 1999, Machado et al. 2007) e em uma floresta tropical seca no México (Arizmendi e Ornelas 1990), todas reconhecidas como regiões com marcada sazonalidade climática. Comparada com estudos conduzidos em algumas áreas na Mata Atlântica (Buzato 1995, Araujo 1996, Machado 2000, Rocca-de Andrade 2006), na Amazônia Colombiana (Lasprila e Sazima 2004) e em uma floresta tropical montana do Equador (Dziedzioch et al. 2003), esta riqueza foi relativamente menor. Deste modo, localidades em ambientes florestais úmidos tendem a apresentar riqueza local de beija-flores maior do que a de ambientes mais secos, com climas mais sazonais. Esta diferença está de acordo com um padrão geral para diversidade de aves na região neotropical, onde florestas secas apresentam menor diversidade do que florestas úmidas (Stotz et al. 1996). Ambientes de florestas úmidas neotropicais, via de regra, apresentam uma grande diversidade de epífitas, sobretudo bromeliáceas, ocupando os diversos estratos vegetacionais, do solo ao alto das copas (Dziedzioch et al. 2003, Machado e Semir 2006, Cestari 2009). Sendo as bromeliáceas uma importante fonte de recurso para os troquilídeos, podem manter uma maior diversidade destas aves nestas áreas (Araujo 1996, Buzato et al. 2000, Dziedzioch et al. 2003, Machado e Semir 2006, Rocca-de- Andrade 2006); por outro lado, em ambientes mais secos, a diversidade de bromeliáceas é menor, com predominância de espécies terrícolas ou rupestres, não se configurando 32 como espécies-chave para a manutenção destas aves em uma comunidade (Leal et al. 2006, Machado 2009, Santana e Machado 2010). A composição da comunidade de beija-flores na área estudada é semelhante à encontrada em outras áreas de caatinga (Las-Casas 2009, Machado 2009), com a presença de espécies de ampla distribuição e comuns em ambientes abertos, como C. lucidus e E. macroura (Grantsau 1989). O registro de Anopetia gounellei neste estudo é importante por esta ser uma espécie endêmica da vegetação de caatinga (Stotz et al. 1996, Silva et al. 2003) e pela escassez de conhecimento sobre sua história natural. Até então, dos três estudos realizados na Caatinga, apenas um registrou as espécies de plantas utilizadas por A. gounellei (Machado 2009) e os demais somente detectaram a espécie na área, mas não tendo sido registrado visitando flores (Leal et al. 2006, Las- Casas 2009). Alguns estudos que avaliaram a sazonalidade das espécies de beija-flores ao longo de um ciclo anual ou durante períodos mais extensos observaram apenas duas ou três espécies residentes (Arizmendi e Ornelas 1990, Rocca-de-Andrade 2006, Machado et al. 2007, Las-Casas 2009, Rodrigues 2011). Neste estudo e em uma área de caatinga arbórea da Chapada Diamantina (Machado 2009) foram registradas cinco espécies residentes, sendo algumas delas comuns às duas áreas, como Phaethornis pretrei, A. gounellei e C. lucidus. Um maior número de beija-flores residentes também foi observado em uma área de Mata Atlântica da Serra de Paranapiacaba (Machado 2000 - cinco espécies). Os deslocamentos populacionais de algumas espécies de beija-flores em determinadas épocas do ano podem estar relacionados com a sazonalidade da floração das plantas que utilizam e, portanto, com a busca de fontes mais ricasde recurso alimentar (Stiles 1980, Machado et al. 2007). Assim, a riqueza de espécies de plantas floridas na área estudada garante fonte de recursos suficiente para suprir a demanda energética das populações das cinco espécies de beija-flores residentes. Chrysolampis mosquitus foi uma espécie considerada no presente estudo como não residente e é reconhecida por apresentar deslocamentos populacionais tanto na América Central quanto no Brasil (Schuchmann 1999). Na área estudada, indivíduos desta espécie foram registrados apenas em determinada época do ano, com maior freqüência durante a estação chuvosa, o que também foi observado em outros ambientes 33 com marcada sazonalidade climática (Leal et al. 2006, Machado 2007, Las-Casas 2009). Durante este estudo, os troquilíneos tenderam a apresentar comportamento de forrageio territorialista enquanto as espécies de fetornitíneos desempenharam o papel de trapliners, sendo este padrão comum em ambientes tropicais (Stiles 1975, Feisinger e Cowell 1978). A comunidade de beija-flores da área estudada em Morro do Chapéu está organizada de maneira semelhante à observada em Monteverde, na Costa Rica (Feisinger 1976) e em uma floresta tropical seca, no México (Arizmendi e Ornelas 1990). Nestes estudos, a espécie residente mais freqüente monopolizou as áreas com concentração de recurso floral e deslocou as outras espécies, que passaram a forragear em plantas mais isoladas através de estratégias não-territoriais. Em Morro do Chapéu, este comportamento de dominância foi desempenhado por indivíduos de C. lucidus, enquanto na Costa Rica e no México as espécies que ocuparam este papel foram Amazilia saucerottei (Delattre e Bourcier, 1846) e Amazilia rutila (Delattre, 1843), respectivamente. Embora o papel de organizador da guilda de nectarívoros geralmente seja atribuído a fetornitíneos (Sazima et al. 1996, Buzato et al. 2000, Rocca-de-Andrade 2006, Machado et al. 2007), se for considerada a riqueza de espécies de plantas visitadas, o número de sessões de visitas e a freqüência em que foram realizadas, C. lucidus deve ser considerada como a espécie organizadora, assim como em outros dois estudos conduzidos em áreas de caatinga (Leal et al. 2006, Las-Casas 2009). Chlorostilbon lucidus foi territorialista na maior parte do tempo, exibindo comportamento bastante agressivo na defesa de recursos florais agregados. Entretanto, indivíduos desta espécie também forragearam em rotas de baixa recompensa, em diversas flores não adaptadas a polinização por aves, como as entomófilas Nephradenia asparagoides, Lessingianthus linearis e Serjania caracasana. Em outros estudos, este beija-flor também tem sido observado visitando uma grande riqueza de plantas, incluindo espécies não-ornitófilas (Vasconcelos e Lombardi 2001, Machado et al. 2007, Las-Casas 2009, Machado 2009), o que denota ser uma espécie pouco exigente quanto aos tipos de recursos florais que explora. Fêmeas de C. lucidus atuaram como parasitas de territórios dos machos, sendo este mesmo comportamento também reportado em Thalurania glaucopis (Gmelin, 34 1788) em uma comunidade da Mata Atlântica (Rocca-de-Andrade 2006). Estas interações devem estar relacionadas com a forma e o comprimento do bico, que são similares entre machos e fêmeas destas duas espécies (Grantsau 1989). Esta característica favorece a uma maior sobreposição no uso de recursos florais, ocasionando uma alta competição intraespecífica (Schuchmann 1999, Machado et al. 2007). Considerando os registros de visitas esporádicas em flores dispersas, a ocupação de diferentes papéis ecológicos na comunidade e a ampla variedade da dieta de C. lucidus, esta espécie também pode ser considerada como generalista (Feisinger e Colwell 1978) Embora as espécies de beija-flores desempenhem melhor determinados papéis ecológicos, a ocupação destes pode variar de acordo com a disponibilidade e a distribuição de recursos florais e com as características morfológicas e comportamentais das outras espécies presentes na área (Feisinger e Colwell 1978). Esta plasticidade comportamental também tem sido registrada em outras comunidades. Em uma área de Mata Atlântica, Ramphodon naevius (Dumont,1818), considerado um típico trapliner, defendeu territórios no dossel florestal (Rocca-de-Andrade 2006), enquanto o troquilíneo Heliactin bilophus Temminck, 1820, que é tipicamente territorialista, desempenhou o papel de trapliner de baixa recompensa em uma área de cerrado com baixa densidade de recursos florais (Machado e Rocca 2010, Machado et al. in prep). No presente estudo, indivíduos de C. lucidus e E. macroura foram observados desempenhando papéis distintos em uma mesma expedição, o que indica que a variação na ocupação destes papéis são tênues e podem ocorrer em um curto período. Certamente, através da marcação e do acompanhamento de indivíduos das diferentes espécies de beija-flores será possível observar melhor os padrões de ocupação dos papéis no tempo e no espaço, bem como quais fatores podem influenciar na organização ecológica da comunidade. O comprimento médio da corola das espécies visitadas por A gounellei e P. pretrei foi 31,4 mm e a concentração média de néctar foi 22,9% - ambas as medidas apresentam uma amplitude menor do que a observada na comunidade inteira, o que sugere que dentre a comunidade de beija-flores estudada, os fetornitíneos apresentam um maior nível de especialização, visitando preferencialmente flores dispersas e com 35 características ornitófilas mais pronunciadas (e.g. Piriadacus erubescens e Bionia coriacea), assim como foi observado na caatinga da Serra do Bastião (Machado 2009). Assim como registrado em uma floresta seca do México (Arizmendi e Ornelas 1990), fetornitíneos forragearam com maior frequência no amanhecer e no final da tarde, o que pode estar relacionado com as taxas de produção de néctar das espécies que visitaram, principalmente de P. pachycladus, que apresenta antese crepuscular. Ao longo de todo este estudo, P. pretrei e A. gounellei desempenharam o papel de trapliners de alta recompensa, mesmo quando visitaram P. luetzelburgii em seu pico de floração, quando apresentava dezenas de flores abertas por indivíduo. Portanto, diferente de C. lucidus, a variação do comportamento de forrageio destas espécies parece ser mais estreita, as quais permanecem estabelecendo rotas mesmo quando forrageiam em recursos agregados. Espécies de plantas com distribuição agregada concentram espacialmente fontes de néctar, o que promove a territorialidade entre os beija-flores que a exploram (Sazima et al. 1996). Um grande número das interações agonísticas registradas neste estudo esteve diretamente relacionado à defesa de manchas de recursos florais específicas, como as de Ligaria teretiflora, defendida por A. fimbriata e C. lucidus; de P. luetzelburgii e Micranthocereus flaviflorus, defendidas por E. macroura e C. lucidus e de Tacinga inamoena, Handroanthus impetiginosus e Eriope latifolia, defendidas apenas por C. lucidus. Esta relação específica e temporalmente bem definida na defesa de recursos também foi observada em uma comunidade da Mata Atlântica (Rocca-de- Andrade 2006). A forma como estão distribuídas as interações agonísticas entre os beija-flores reitera o status de C. lucidus como uma espécie principal (“specie core”) na comunidade, dominante na maioria dos eventos em que esteve envolvida. Encontros agonísticos entre fetornitíneos foram raros, uma vez que o comportamento territorial não é comum nesta subfamília (Feisinger 1976, Feisinger e Colwell 1978, Stiles 1978). Desta forma, os agonismos registrados entre indivíduos de A. gounellei e a subordinação de C. lucidus por P. pretrei devem estar relacionados com encontros ocasionais durante as rotas de forrageio em P. luetzelburgii. O númerode interações agonísticas registradas neste estudo foi muito superior ao observado em campos rupestres da porção meridional da Cadeia do Espinhaço (Rodrigues 2011) e da Chapada Diamantina (Machado 2007), apesar de nestas áreas 36 também ocorrerem recursos agregados. Entretanto, estes eventos foram menos freqüentes quando comparados com os registros feitos em uma área de caatinga da Serra do Pará, em Pernambuco (Las-Casas 2009). Entender quais fatores influenciam a intensidade das interações agonísticas em diferentes localidades e períodos sazonais é uma análise complexa. Portanto, estudos ecológicos que visem compreender a otimização de tempo e energia deverão esclarecer as divisões de esforços e as relações de custo-benefício entre as diferentes atividades comportamentais das espécies de beija- flores (Wolf e Hainsworth 1971). Plantas visitadas por beija-flores: A comunidade de plantas visitadas por beija- flores apresentou uma riqueza semelhante à de outras duas áreas de caatinga (Las-Casas 2009, Machado 2009), de uma floresta seca do México (Arizmendi e Ornelas 1990) e em capões do pantanal sul mato-grossense (Araujo e Sazima 2003), mas é relativamente inferior à que tem sido reportada em campos rupestres da Cadeia do Espinhaço (Vasconcelos e Lombardi 2001, Machado et al. 2007, Rodrigues 2011), que são considerados centros de diversidade vegetal (Giulietti et al. 1997), e de áreas de florestas úmidas das Américas do Sul e Central (Stiles 1978, Buzato et al. 2000, Machado 2000, Dziedzioch et al. 2003, Rocca-de Andrade 2006). Além de diferenças amostrais, a composição florística, o grau de complexidade vegetacional e os padrões sazonais distintos entre as áreas podem ser fatores que determinam as diferentes riquezas. Considerando que em comunidades tropicais as espécies de plantas podem apresentar padrão de floração supra-anual (Newstrom et al. 1994), é possível que um esforço amostral que englobe um maior período acrescente novos registros de espécies utilizadas por beija-flores na área estudada em Morro do Chapéu. A proporção de cerca de 60% de espécies ornitófilas em comunidades de plantas visitadas por beija-flores também tem sido reportada em outras áreas (Stiles 1978, Araujo 1996, Vasconcelos e Lombardi 2001, Rocca-de-Andrade 2006, Machado et al. 2007, Rodrigues 2011), o que revela que as espécies não-ornitófilas representam uma importante fonte de recurso floral em diferentes tipos vegetacionais, principalmente para aquelas espécies de beija-flores mais generalistas. Em algumas espécies de plantas registradas neste estudo, o caráter de atratividade característico da síndrome de ornitofilia (Faegri e van der Pijl 1980) está relacionado à combinação de cores entre a corola e o escapo das inflorescências, como 37 ocorreu nas bromeliáceas Neoglaziovia variegata e Hohenbergia ramageana, que apresentam flores de coloração lilás, mas com escapo vermelho; ou entre corola e caule como ocorreu na liana Apodanthera villosa, cujas flores são pequenas e amarelas, mas o caule apresenta uma forte coloração alaranjada nas porções proximais das inflorescências. A estrutura da comunidade de plantas ornitófilas está relacionada com a disponibilidade e a competição por polinizadores (Stiles 1980). A evolução da ornitofilia deve ser vista sob uma perspectiva de custo e benefício, obviamente bem balanceados entre as comunidades de beija-flores e plantas (Schuchmann 1999). De acordo com Cruden (1972), a riqueza de espécies ornitófilas tende a ser maior em altitudes elevadas, onde as aves são polinizadores mais eficientes do que as abelhas, principalmente devido às limitações de forrageio destas em condições de baixa temperatura. Ao analisar estudos realizados em diferentes fitofisionomias de caatinga, considerando as diferentes cotas altitudinais, pode-se observar que os estudos em áreas mais elevadas de fato apresentam maior riqueza de espécies ornitófilas quando comparados com aqueles conduzidos em altitudes inferiores: este estudo reportou 16 espécies (910 m de altitude) e Machado (2009), estudando em uma área em cota de 980 m de altitude, 12 espécies; Leal et al. (2006) registraram oito espécies em área com altitude de 298 m e Las–Casas (2009), cinco espécies em área em cota de 729 m. A família Cactaceae é considerada uma importante fonte de recurso floral para beija-flores em áreas secas da América do Sul (Schuchmann 1999). No presente estudo, assim como registrado em outros dois efetuados em áreas com vegetação de caatinga (Leal et al. 2006, Las-Casas 2009), esta família foi a mais representativa. A importância também se deve ao fato dos diferentes períodos de floração das seis espécies registradas neste estudo, cinco delas ornitófilas, estarem distribuídos de forma que garantem disponibilidade de recurso floral contínua para as espécies de beija-flores ao longo do ano. As espécies de Bromeliaceae são citadas como o principal recurso floral para beija-flores em florestas neotropicais (Stiles 1978, Bawa 1990, Araujo 1996,Sazima et al. 1996, Buzato et al. 2000, Machado e Semir 2006, Rocca-de-Andrade 2006, Cestari 2009. Neste estudo, foram registradas três espécies de bromélias terrestres ornitófilas, uma riqueza inferior àquela reportada em áreas florestais. Conforme comentado, a diversidade de bromeliáceas está relacionada com a complexidade da estratificação 38 vegetal - na caatinga, a menor estratificação da vegetação contribui para a diminuição da quantidade de micro-hábitats necessários para o estabelecimento de espécies epífitas (Machado et al. 2007, Santana e Machado 2010). As lorantáceas apresentam flores na periferia das copas das árvores que parasitam e são atraentes para muitas espécies de troquilídeos, sendo as espécies do gênero Psittacanthus consideradas dentre as mais comumente polinizadas por estas aves (Sick 1997, Schuchmann 1999). Neste estudo, esta família também aparece como a segunda mais representativa na dieta dos beija-flores, com três espécies, sendo uma delas, Ligaria teretiflora, endêmica da região de Morro do Chapéu. Algumas das espécies de plantas ornitófilas visitadas por beija-flores no presente estudo têm sua biologia reprodutiva conhecida: Hoehenbergia ramageana (Santana e Machado 2010), Melocactus ernestii (Fonseca et al. 2008), Neogalziovia variegata (Leal et al. 2006, Pereira e Quirino 2008) e Jatropha mutabilis (Santos et al. 2005). Todos estes estudos registraram visitas de troquilídeos, sendo, em alguns casos, considerados os polinizadores mais eficientes. O presente estudo endossa, portanto, a importância dos beija-flores na polinização destas espécies em diferentes áreas de caatinga. O predomínio da morfologia tubular da corola também foi observado em outras comunidades de plantas visitadas por beija-flores (Wolf et al. 1976, Sazima et al. 1996). Espécies ornitófilas com flores tubulosas, principalmente as que apresentam maior profundidade e abertura estreita da corola, caracterizam um tipo floral mais especializado e, portanto, restringem seu espectro de visitantes, sendo geralmente adaptadas à polinização por beija-flores e denominadas troquilófilas (Machado e Rocca 2010). Contudo, estas aves apresentam grande capacidade exploratória e forrageiam em diversos tipos florais, o que pode ser observado principalmente naqueles estudos que, assim como o presente, registraram visitas em espécies de plantas de outras síndromes de polinização além da ornitofilia. (Vasconcelos e Lombardi 2001, Rocca-de-Andrade 2006, Machado et al. 2007, Machado 2009, Rodrigues 2011). Em geral, flores ornitófilas apresentam grande produção de néctar com baixa concentração de açúcares (Faegri e van der Pijl 1980). A concentração média do néctar registrada neste estudo (21,1 ± 3,91%, n = 25) está de acordo com a descrita em outras comunidades
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