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CONDICIONAMENTO E TREINAMENTO DE FORÇA EM GRUPOS ESPECIAIS W B A 04 15 _v 1. 0 2 Ivan Luiz Padilha Bonfante Londrina Editora e Distribuidora Educacional S.A. 2020 CONDICIONAMENTO E TREINAMENTO DE FORÇA EM GRUPOS ESPECIAIS 1ª edição 3 2020 Editora e Distribuidora Educacional S.A. Avenida Paris, 675 – Parque Residencial João Piza CEP: 86041-100 — Londrina — PR e-mail: editora.educacional@kroton.com.br Homepage: http://www.kroton.com.br/ Presidente Rodrigo Galindo Vice-Presidente de Pós-Graduação e Educação Continuada Paulo de Tarso Pires de Moraes Conselho Acadêmico Carlos Roberto Pagani Junior Camila Braga de Oliveira Higa Carolina Yaly Giani Vendramel de Oliveira Henrique Salustiano Silva Juliana Caramigo Gennarini Mariana Gerardi Mello Nirse Ruscheinsky Breternitz Priscila Pereira Silva Tayra Carolina Nascimento Aleixo Coordenador Giani Vendramel de Oliveira Revisor Mateus Betanho Campana Editorial Alessandra Cristina Fahl Beatriz Meloni Montefusco Gilvânia Honório dos Santos Mariana de Campos Barroso Paola Andressa Machado Leal Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) __________________________________________________________________________________________ Bonfante, Ivan Luiz Padilha B713c Condicionamento e treinamento de força em grupos especiais/ Ivan Luiz Padilha Bonfante, – Londrina: Editora e Distribuidora Educacional S.A., 2020. 64 p. ISBN 978-65-5903-064-4 1. Condicionamento. 2. Treinamento. 3. Grupos. I. Título. CDD 331.259 ____________________________________________________________________________________________ Raquel Torres – CRB 6/2786 © 2020 por Editora e Distribuidora Educacional S.A. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento e transmissão de informação, sem prévia autorização, por escrito, da Editora e Distribuidora Educacional S.A. 4 SUMÁRIO Caracterização dos grupos especiais e a prescrição de exercícios para a população com câncer e com HIV/AIDS _____________________________ 05 Prescrição de exercício físico para população obesa ________________ 25 Prescrição de exercício físico para população com doenças cardiovasculares e respiratórias ____________________________________ 40 Prescrição de exercício físico para população diabética ____________ 62 CONDICIONAMENTO E TREINAMENTO DE FORÇA EM GRUPOS ESPECIAIS 5 Caracterização dos grupos especiais e a prescrição de exercícios para a população com câncer e com HIV/AIDS Autoria: Ivan Luiz Padilha Bonfante Leitura crítica: Mateus Betanho Campana Objetivos • Compreender os grupos especiais quanto às suas características e inserção na sociedade atual. • Conhecer as principais alterações fisiológicas gerais decorrentes do câncer e as particularidades da prescrição de exercício aeróbios, resistido e de flexibilidade para pessoas portadoras desta doença. • Verificar as principais alterações fisiológicas gerais decorrentes do HIV/AIDS e as particularidades da prescrição de exercício aeróbios, resistido e de flexibilidade para pessoas portadoras desta doença. 6 1. Contextualização As populações caracterizadas como sendo pertencente à um grupo especial, abrangem uma parcela significativa da sociedade atual e tendem a aumentar ainda mais nos próximos anos. A prática de exercícios físicos é de suma importância para o tratamento e prevenção de determinados problemas inerentes à saúde e certas fases da vida, que podem estar relacionadas a um determinado grupo especial. Os benefícios oriundos do treinamento físico regular abrangem influências positivas nos domínios biopsicossociais e são mais do que consenso de recomendação mundial das mais diversas sociedades e organizações relacionadas à saúde e qualidade de vida. Neste tema, iremos, incialmente, conhecer as características e particularidades das populações tidas como um grupo especial, bem com sua relevância e aspectos diversos a serem observados na aplicação de exercício para essas populações. Posteriormente serão apresentadas as peculiaridades referentes à fisiopatologia do câncer e do HIV/AIDS, assim como as particularidades da prescrição de exercício aeróbios, resistido e de flexibilidade para as pessoas portadoras destas doenças. Boa leitura e aprendizagem! 2. Grupos especiais Diversas transformações ocorrem ao longo do tempo no que diz respeito em como as sociedades se organizam, comportam e evoluem. 7 Desde os primórdios da evolução humana até o momento atual, inúmeros fenômenos e ações oriundas da interação entre o ser e o ambiente moldaram a espécie humana. A tentativa por se adaptar melhor ao ambiente, fez com durante toda a história inovações e facilidades fossem sendo incorporadas. Porém, desde a Revolução Industrial iniciada no século XVIII, houve uma intensa massificação de facilidades tecnológicas que impactaram uma grande transformação social e comportamental mundo a fora (COREY; KAPLAN, 2014). De maneira geral, houve uma melhora do saneamento básico em conjunto com a evolução da Medicina e ciências correlatas, o que fez diminuir a incidência antes majoritária de doenças infecto contagiosas, além de aumentar a expectativa de vida e, consequentemente, o número de idosos. Contrariamente, a maior disponibilidade de alimentos, porém com menor qualidade nutricional, na maioria das vezes, juntamente com um aumento do comportamento sedentário pelas diversas facilidades tecnológicas presentes, além de um ritmo de vida cotidiano acelerado que desencadeia uma exacerbação de fatores como o estresse, depressão e insônia, fez com que aumentasse o número da prevalência de doenças crônicas não-transmissíveis (DCNT) como a obesidade, diabetes tipo 2 e hipertensão por exemplo. Adicionalmente, o aumento no número de idosos ocasionado pela maior expectativa de vida atual, também potencializa o surgimento das DCNT, devido ás diminuições funcionais e estruturais do processo de envelhecimento (PITANGA, 2002; COREY; KAPLAN, 2014). Para Pitanga (2002), essa mudança da prevalência de doenças que atingem a população, tem o nome de transição epidemiológica, que basicamente consiste em uma teoria amplamente utilizada para justificar e basear as mudanças dos padrões/tipos de doenças que vem acometendo a população mundial. Junto a isso, temos ainda um fenômeno chamado de transição demográfica ocorrendo em paralelo e relacionado à transição epidemiológica. Nesta mudança demográfica, temos um menor número de nascimentos por mudanças nos padrões 8 organizacionais das famílias, bem como um maior acesso à informação e métodos contraceptivos. Contrariamente, conforme Corey e Kaplan (2014), há um aumento significativo do percentual de idosos pelos aspectos citados anteriormente de melhores condições de vida e da evolução da Medicina e de áreas correlatas. Assim, conhecer as transições epidemiológica e demográfica pelas quais o mundo vem passando nos ajuda a entender a relevância dos grupos especiais na atualidade, uma vez que, segundo Pitanga (2002), estas transições são as principais responsáveis pelo aumento da incidência de indivíduos que compõem determinados grupos caraterizados como especiais. De maneira geral, as populações caracterizadas como grupos especiais para as ciências da saúde e exercícios físicos, têm relação com a presença de certas doenças crônicas transmissíveis ou não, e ainda com certas fases da vida em que há uma maior fragilidade ou necessidade de atenção (TEIXEIRA, 2008). Destacam-se, neste sentido, a presença de doenças cardiovasculares, obesidade, diabetes, câncer, doenças respiratórias, osteomusculares, demências, síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS),dentre outras. Já em relação às fases da vida temos a infância e adolescência, a gestação e os idosos abrangendo os grupos especiais (CAMPOS, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). A inclusão de determinada população como sendo especial ou então o conceito de grupos especiais, pode sofrer influências da base literal, teórica e autor utilizado. Como nos diz Teixeira (2008), pela base conceitual aqui utilizada, não fazem parte dos grupos especiais indivíduos com necessidades especiais, os quais apresentam perda ou diminuição funcional e ou estrutural significativa por influência genética ou adquirida. Em comum, os grupos especiais acima citados, têm particularidades biopsicossociais diferenciadas e que necessitam de cuidados e atenção redobradas em variadas vertentes. Dentre elas, a prescrição de 9 exercícios físicos, ferramenta esta imprescindível tanto para o auxílio à prevenção de parte das doenças citadas, auxílio ao tratamento de todas, assim como auxilia em um melhor desenvolvimento, enfrentamento e qualidade de vida nas fases de vida que demandam mais atenção (PITANGA, 2002; TEIXEIRA, 2008; CAMPOS, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). 3. Cuidados e benefícios gerais dos exercícios para grupos especiais A prescrição de exercícios para qualquer população, seja ela especial ou não, exige cuidados para que haja otimização dos benefícios e minimização de riscos. No caso dos grupos especiais, isso ainda é motivo de mais atenção devido as particularidades biopsicossociais inerentes à cada condição (POLITO; CASONATTO, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). Entre os cuidados gerais, estão conhecer a fisiopatologia da doença ou condição presente no indivíduo, lembrando que é muito comum a presença de não só uma, mas um grupo de patologias e condições. É muito comum por exemplo, um idoso com hipertensão e diabetes tipo 2 ou um obeso também hipertenso e diabético. O entendimento da fisiopatologia de uma doença ou condição é essencial para identificar necessidades especificas de exercícios físicos, assim como prever possíveis interações biopsicossociais da prescrição aplicada (CAMPOS, 2013; POLITO; CASONATTO, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). Outro aspecto similar ao entendimento da doença ou condição trabalhada é a importância do conhecimento dos medicamentos utilizados e de suas interações orgânicas, assim como de suas inter- relações com os efeitos dos exercícios físicos. Adicionalmente, interrogar sobre histórico médico e familiares, presença de sinais e sintomas 10 atuais, bem como padrão básico de atividade física e alimentação ajudam a verificar eventuais riscos na prescrição do treinamento. Com isso, conforme Weineck (2005), percebe-se que a aplicação de uma anamnese estruturada é algo de fundamental importância. Outros aliados essenciais para uma otimização da prescrição de exercícios físicos, principalmente na população caracterizada especial, é a realização de exames médicos e da avaliação física. Os exames médicos devem ser solicitados por profissionais da área médica baseado nas particularidades fisiológicas e econômicas do indivíduo. No geral, eles são relacionados à exames bioquímicos básicos com, no mínimo, a presença da avaliação da glicemia, perfil lipídico e hemograma. Adicionalmente, é de suma importância a realização de eletrocardiograma de esforço (ECG), também conhecido como teste ergométrico, a fim de identificar a segurança cardiovascular (possível presença e limiares de isquemia e arritmia, hiper-reatividade pressórica ao exercício, dentre outros) e os níveis de segurança para o emprego da intensidade do treinamento. A impossibilidade de realização do ECG por indivíduos pertencentes a grupos especiais, deve ser ao menos pautada por liberação médica e a aplicação de carga de treinamento deve ser realizada com cautela (WEINECK, 2005; CAMPOS, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; POLITO; CASONATTO, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). É importante salientar que, embora não sejam comuns, existem contraindicações parciais ou totais em relação à prática de exercícios físicos, estando, geralmente, associadas a um maior risco cardiometabólico e menores benefícios. Nas contraindicações totais, a prática física deve ser excluída pelo menos temporariamente, até que haja uma estabilização ou melhora do quadro presente. Dentre as contraindicações totais, se destacam: imunossupressão elevada ou doenças infecciosas agudas; insuficiência cardíaca congestiva; miocardite e endocardite ativas; angina, isquemia e/ou arritmia graves e/ou reativas ao mínimo esforço; embolia pulmonar ou sistêmica recente; estenose 11 aórtica grave ou aneurisma dissecante. Já nas contraindicações parciais, a prática física pode ser realizada, porém, os cuidados, particularidades específicas e o acompanhamento devem ser redobrados. Como contraindicações parciais, temos como exemplo: anormalidades nos níveis de eletrólitos; hipertensão e frequência cardíaca reativas ao esforço; angina, isquemia e/ou arritmia moderadas; hipertrofia cardíaca patológica e insuficiência cardíaca não congestiva; aneurisma não dissecante e estenose aórtica coronária/valvular leve; distúrbios/lesões neuromusculares-esqueléticas ou reumáticas; Doenças metabólicas quando descompensada (CAMPOS, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; POLITO; CASONATTO, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; KATCH; KATCH; MCARDLE, 2016). Já a avaliação física é um instrumento que deve ser aplicado pelo profissional de Educação Física. Ela irá pautar as reais necessidades do indivíduo, otimizará os benefícios do treinamento e servirá de base em conjunto com exames médicos para acompanhar a evolução do aluno por meio das reavaliações (WEINECK, 2005; KATCH; KATCH; MCARDLE, 2016). De acordo com Weineck (2005) e Katch, Katch e Mcardle (2016), durante e após o treinamento é necessário atentar ao controle das variáveis, presença de sinais e sintomas e aspectos básicos relacionados com a segurança de execução, temperatura do ambiente, hidratação, alimentação e recuperação adequada. Os benefícios relacionados aos exercícios físicos são amplos e conhecidos, podendo ser gerais, como a melhora da composição corporal e da aptidão física, ou então específicos quanto à fisiopatologia, fase da vida ou individualidades do praticante. Dentre as principais disfunções relacionadas aos grupos especiais, o exercício físico consegue atuar proporcionando benefícios diretos nas alterações musculoesqueléticas, metabólicas, cognitivas e psicossociais diversas. Por isso é consenso de aplicação e uso por todas as sociedades e 12 diretrizes médicas relacionadas às condições e doenças inerentes aos grupos especiais (CAMPOS, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; POLITO; CASONATTO, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). 4. Câncer O câncer é caracterizado por desequilíbrios na regulação celular que são chamados de crescimentos tumorais ou neoplasias, que basicamente são crescimento e desenvolvimento celulares novos e anormais (GUYTON; HALL, 2017). Os tumores podem ser divididos em benignos ou malignos. Nos benignos, as células crescem mais lentamente e com certa semelhança ao tecido normal, podendo comprimir os órgãos e tecidos adjacentes, porém não há invasão do tecido em sua proliferação. Geralmente, este tipo de tumor é tratado facilmente com remoção cirúrgica ou, dependendo do caso, são apenas acompanhados rotineiramente. Já nos tumores malignos, as células têm uma multiplicação muito mais rápida, podem invadir estruturas próximas aos locais de origem, além de em casos mais avançados causar metástase, que é a migração de células tumorais pela corrente sanguínea ou vasos linfáticos até outros órgão e tecidos mesmo distantes de onde se deu o crescimento anormal inicial. Este tipo de tumor, geralmente é mais resistente e pode levar a morte, sendo o seu tratamento muitas vezes baseado em quimioterapia e/ou radioterapia e/ou imunoterapia e/ou cirurgias. Sendo issobaseado no tipo de tumor, estado do paciente, tempo do diagnóstico e estágio da doença, lembrando que quanto mais rápido sua descoberta, maior a chance de cura. Outro aspecto relacionado à mortalidade é o tipo e grau do tumor (KATCH, KATCH; MCARDLE, 2016; GUYTON; HALL, 2017). Mais de 100 doenças podem ser classificadas como câncer em variados órgãos e tecidos, entretanto, a classificação tumoral é dividida em quatro 13 tipos, e isso tem relação com a célula na qual o tumor deu origem, sendo eles: - Carcinomas: originário em células epiteliais, glândulas e órgãos internos, representando entre 80% e 90% dos casos, e tendo como exemplo o câncer de próstata, cólon, mama, pulmão etc. - Sarcomas: origem em locais com tecido conjuntivo, como ossos, tendões, cartilagem, gordura e músculos. - Leucemias: origem em determinadas células sanguíneas. - Linfomas: origem no sistema imunológico, especialmente em linfócitos, linfonodos e outros componentes do sistema linfático (GUYTON; HALL, 2017). Segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA) (BRASIL, 2020), o grupo de doenças classificadas como câncer são a segunda causa morte do Brasil e do mundo, perdendo apenas para as doenças cardiovasculares. Estima-se que, por ano, são mais de 18 milhões de casos e 9,6 milhões de mortes no mundo, sendo estes números no Brasil de mais de 625 mil casos e 185 mil mortes. A etiologia para o desenvolvimento tumoral é complexa e abrangente, podendo abranger predisposição genética, aspectos ambientais e os relacionados com o estilo de vida como o sedentarismo e a má- alimentação, além do excesso de gordura corporal, idade avançada e a presença de vícios como o fumo e o álcool. Alguns tumores têm relação mais com um fator ou com outro, por exemplo, tumores ovarianos parecem ter mais relação com aspectos genéticos, enquanto no intestino grosso as neoplasias são mais associados à obesidade e estilo de vida, já o câncer de pulmão tem como principal causa o tabagismo (KATCH; KATCH; MCARDLE, 2016; GUYTON; HALL, 2017). 14 5.Exercícios físicos e câncer A prática regular de exercícios físicos, tem comprovada relação com a prevenção do surgimento de tumores, principalmente aqueles relacionados com o estilo de vida e controle do peso corporal. Isto ocorre em função da prática física em induzir maior gasto energético e menor peso e gordura corporal, diminuindo a secreção de substâncias inflamatórias, controlando a secreção de hormônios anabólicos e indutores angiogênicos, favorecendo um melhor controle imunológico e dos mecanismos de morte e regeneração celular, além de ainda estar associado com uma microbiota saudável e redução do trânsito gastrointestinal. Todos estes fatores de interferência do exercício são comprovados de estarem envolvidos com os mecanismos moleculares de desenvolvimento do câncer (KATCH; KATCH; MCARDLE, 2016; GUYTON; HALL, 2017; MAGINADOR et al., 2020). Adicionalmente, o treinamento físico também induz benefícios gerais e específicos para quem está acometido e fazendo tratamento para a doença, propiciando benefícios como melhora da capacidade funcional, manutenção do peso e massa muscular, diminuindo, assim, o risco de fadiga, caquexia ou do aumento excessivo de peso (aumento ou diminuição de peso são associadas ao tratamento utilizada e ao grau/tipo da doença), o que colabora para um melhor controle metabólico. Também há uma melhora de alguns componentes do sistema imunológico, que podem ajudar no combate à doença, além de diminuição de eventuais dores e depressão pela secreção de substâncias analgésicas e neurotransmissores benéficos ao humor que são induzidos pelo exercício. Indiretamente estes efeitos melhoram a qualidade do sono e de vida (SANTOS, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; SILVERIO; OLIVAN; SEELANDER, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; MAGINADOR et al., 2020). 15 Evidências ainda mostram a relação do exercício com maior sobrevida durante/pós tratamento, além de achados iniciais demonstrarem uma menor velocidade de crescimento tumoral provavelmente pelo melhor controle metabólico, influência imunológica e desvio de substratos energéticos dos tumores para suprir as funções durante e pós exercício (SANTOS, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; SILVÉRIO; OLIVAN; SEELANDER, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; MAGINADOR et al., 2020). Dentre os cuidados a serem tomados na prescrição de exercícios, temos, incialmente, a liberação médica, o conhecimento do tipo de tumor e do tratamento que está sendo realizado, lembrando que a magnitude de efeitos negativos do tratamento dependerá de particularidades individuais e da doença/local afetado. Entre os principais efeitos colaterais dos tratamentos temos: Cirurgia: dores, sensibilidade e irritação local, limitação temporárias de certos movimentos. Quimioterapia: vômitos, náuseas, diarreia, fraqueza, fadiga muscular e queda de cabelo. Radioterapia: vômitos, náuseas, diarreia, fadiga muscular, ressecamento da pele e coceira. Imunoterapia: sintomas gripais, febre, calafrios, fraqueza e náuseas (SANTOS, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; SILVÉRIO; OLIVAN; SEELANDER, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; KATCH; KATCH; MCARDLE, 2016; GUYTON; HALL, 2017). Os sintomas acima e outros eventuais oriundos do tratamento ou da própria doença, assim como as precauções a serem tomadas na prescrição de exercícios físicos, são apresentados no Quadro 1. 16 Quadro 1 – Eventuais complicações e precauções na prescrição de exercícios e câncer Complicação Precaução Hemograma completo: nível de hemoglobina < 8,0 g/dl e baixa contagem absoluta de neutrófilos e plaquetas. Ataxia/vertigem/ neuropatia sensorial periférica. Evitar atividades que exigem um transporte significativo de O2 (testes aeróbios máximos). Evitar atividades que aumentam o risco de sangramento (exercícios de alto impacto). Pode indicar infecção sistêmica e deve ser investigada (evitar teste). Evitar atividades que exigem equilíbrio e coordenação significativos (esteira rolante, pesos livres). Febre e infecções Não fazer atividades. Caquexia intensa (perda de mais de 35% do peso pré- morbido) A perda de massa muscular costuma limitar o exercício para uma intensidade leve, dependendo do grau de caquexia (evitar teste). Feridas/ulcerações na boca. Dispneia. Dor óssea. Evitar atividades intensas. Evitar atividades que elevam os riscos de fratura (testes de alto impacto/ estresse, como esteira rolante e 1RM). Náuseas/vômitos intensos. Fadiga/fraqueza externa. Evitar atividades intensas. Iniciar atividades com um rendimento de potência mais baixo, utilizar pequenos aumentos progressivos. 17 Feridas cirúrgicas/ hipersensibilidade. Estado funcional precário. Escolher uma atividade que evita a pressão/traumatismo no local cirúrgico. Evitar atividade volumosas e intensas. Fonte: elaborado pelo autor. As recomendações de exercícios físicos no câncer trazem a realização de atividades aeróbias, de força e flexibilidade, as quais tem sua frequência, volume e intensidade citados a seguir. Treino aeróbio - 3 a 5 vezes na semana, que englobem sessões de 20 a 60 minutos e totalizem ao menos 150 minutos semanais de intensidade moderada ou 75 minutos intensos. - Já a intensidade dependerá da aptidão física, gravidade da doença e efeitos colaterais do tratamento. Atividade moderadas tem relação com 40% – 60% do VO2máx ou 60%–75% da Frequência Cardíaca (FC) máx., já a alta intensidade abrange 60% – 89% do VO2máx. ou 75 a 95% da FC máx. - Trabalho intermitente, múltiplas sessões com pouco volume ou menor tempo semanal podem ser aplicados inicialmente ou para pessoas debilitadas, assim como uma menor intensidade empregada (SANTOS, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO; SILVÉRIO; OLIVAN; SEELANDER, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; KATCH; KATCH; MCARDLE, 2016). Treino de força - 2 a 3 vezes na semana, com pelo menos 48 horas de intervalo entre as sessões. - 8 a 10 exercícios, 2 a 3 sériesde 8 a 10 repetições e intensidade entre 30% e 60% de 1RM. 18 - Ajustes para menor volume e intensidade, também podem ser realizados, e repetições acima de 15 devem ser evitadas, principalmente em descondicionados, frágeis ou fadigados (SANTOS, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO; SILVÉRIO; OLIVAN; SEELANDER, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; KATCH; KATCH; MCARDLE, 2016). Treino de flexibilidade - 2 a 3 vezes por semana. - 2 a 4 séries com 10 a 30 segundos de manutenção da posição ou estímulo aplicado. - O trabalho pode ser estático ou dinâmico, o que gera ao menos moderado desconforto articular (SANTOS, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO; SILVÉRIO; OLIVAN; SEELANDER, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; KATCH; KATCH; MCARDLE, 2016). É importante que, independentemente, do tipo de atividade, as modalidades escolhidas sejam seguras, abranjam grandes grupos musculares e sejam relacionadas à preferência do aluno/paciente. Já a progressão deve ser realizada conforme observada a adaptação do indivíduo ao treinamento, sendo que em pessoas “descondicionadas”, debilitadas ou com efeitos colaterais do tratamento ela deve ter a progressão mais lenta (SANTOS, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; SILVÉRIO; OLIVAN; SEELANDER, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; KATCH; KATCH; MCARDLE, 2016). Caso haja toxidade ou alguma fase mais aguda do tratamento, pode haver uma pausa do treinamento por uns dias até a estabilização do quadro ou término da fase aguda (KATCH; KATCH; MCARDLE, 2016). 19 6.HIV/AIDS A síndrome da imunodeficiência humana (AIDS) é causada pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV), o qual é pertencente à família dos retrovírus e ocasiona imunodepressão severa que abre as portas para infecções oportunistas, neoplasias e degenerações neurais. Dados recentes apontam para aproximadamente 38 milhões de infectados pelo vírus HIV no mundo e 900 mil no Brasil (RASO; GREVE; CASSEB, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; KATCH; KATCH; MCARDLE, 2016; GUYTON; HALL, 2017). Descoberta na década de 1980, a AIDS acaba diminuindo significativamente as capacidades de defesa do indivíduo, uma vez que destrói determinados componentes do sistema imunológico, em especial os linfócitos CD4. No início da doença, a pessoa infectada pelo vírus, ao desenvolver a AIDS, era fadada a uma sobrevida não muito grande. Entretanto, com o avanço das terapias medicamentosas, em especial as com antirretrovirais (ART) (compostas de inibidores de transcriptase reversa e inibidores de protease), foram decisivas para o aumento da expectativa de vida pelas pessoas infectadas, uma vez que conseguiram diminuir a replicação e quantidade de vírus, reestabelecer quantidades adequadas de CD4 e, consequentemente, minimizar a ocorrência de doenças e comorbidades oportunistas (RASO; GREVE; CASSEB, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; GUYTON; HALL, 2017). A infecção pelo HIV pode ser dividida basicamente em três fases, sendo elas: - Fase aguda: presença de infecção aguda que proporciona febre, cefaleia, inflamações de trato respiratório superior, linfadenopatia e erupções cutâneas. Resposta imune inicial e parcial. 20 - Fase assintomática ou latente: diminuição de sintomas e sinais agudos, declínio do número de células CD4; instalação viral em tecidos linfoides, mas com baixa produção viral. - Fase sintomática/AIDS: surgimento de infecções oportunistas, tumores, perda de peso e encefalopatias crônicas; aumento da replicação viral, destruição de tecidos linfoides e células CD4 (RASO; GREVE; CASSEB, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; GUYTON; HALL, 2017). Embora a sobrevida tenha aumentado significativamente, a terapia com ART não consegue estabelecer a cura completa em função da capacidade do vírus de inserir seu material genético em certas células do hospedeiro, favorecendo com que a infecção permaneça, embora baixa e latente, o que favorece sua proteção ao menos parcial dos medicamentos, por permanecerem “escondidos” em determinadas células. Mecanismos para tentar barrar essa barreira de proteção/ latência viral são alvo de numerosos estudos da ciência a fim de estabelecer a cura completa (RASO; GREVE; CASSEB, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; GUYTON; HALL, 2017). A AIDS é classificada como doença crônica transmissível, uma vez que seu contagio ocorre por transmissão sexual, sanguínea e de mãe para filho na gestação. Dentre os grupos especiais, as pessoas vivendo com AIDS (PVAIDS) representam um contingente significativo e de atenção quando comparados à outros doenças infecciosas, uma vez que como mencionado ainda não há cura para a doença (CAMPOS, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO; RASO; GREVE; CASSEB apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; KATCH; KATCH; MCARDLE, 2016; GUYTON; HALL, 2017). 21 7. Exercícios físicos e HIV/AIDS Embora a terapia de ART tenha sucesso em elevar a sobrevida, é importante salientar que ela proporciona vários efeitos colaterais ao usuário, aumentando o aumento do risco cardiometabólico e neuromuscular, lipodistrofia, toxidade mitocondrial com aumento da hiperlactecidemia e esteatose hepática. Neste sentido, a prática de exercícios pelas PVAIDS, assume importância, pela sua minimização de determinados efeitos colaterais e riscos proporcionados por eles, além de induzir melhora imunológica, funcional de composição corporal, da qualidade de vida e da saúde mental (RASO et al., 2013; KATCH et al., 2016). Entretanto, além dos cuidados comumente observados na prescrição de exercícios, é de suma importância a realização do ECG de esforço e o monitoramento constante da pressão arterial e FC em função do risco cardiometabólico elevado nessa população de PVAIDS. A avaliação da aptidão física é outro aspecto a ser observado a fim de verificar a tolerância ao esforço, principalmente pelo fato da disfunção mitocondrial e hiperlactecidemia presente pelo menos em parte dessa população (RASO; GREVE; CASSEB apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; KATCH; KATCH; MCARDLE, 2016). Além dos exames bioquímicos médicos comuns, é de grande importância a avaliação do lactato sanguíneo, a dosagem da carga viral e a contagem linfocitária, em especial dos linfócitos C4 e CD8. Esses exames são essenciais, uma vez que, com os valores de lactato, é possível identificar indiretamente eventuais disfunções mitocondriais e, consequentemente, se precaver quanto à aplicação de cargas e volumes elevados. Enquanto que a identificação de alta carga viral e da diminuição de células CD4, bem como a presença de infecções agudas, inviabilizam a prática física, pois indicam imunossupressão, e o treinamento só passa a ser viável após a estabilização desse quadro 22 (RASO GREVE; CASSEB apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; KATCH; KATCH; MCARDLE, 2016; GUYTON e HALL, 2017). Em termos de diretrizes, assim como no câncer, é recomendado que também seja aplicado treinamento aeróbio, de força e flexibilidade para PVAIDS, os quais tem sua frequência, volume e intensidade citados a seguir (RASO; GREVE; CASSEB apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; KATCH; KATCH; MCARDLE, 2016). Treino aeróbio - 3 a 5 vezes na semana. - 30 a 60 minutos por sessão, iniciando com ao menos 10 minutos e totalizando ao menos 150 minutos por semana. - Intensidade entre 40 a 60% do VO2máx. ou 60 a 75% da FC máx. (RASO; GREVE; CASSEB apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). Treino de força - 2 a 3 vezes na semana. - 8 a 10 exercícios, 2 a 3 séries com 8 a 10 repetições e intensidade de até 60% de 1RM e que não proporcione falha concêntrica e manobra de Valsalva (RASO; GREVE; CASSEB apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). Treino de flexibilidade - 2 a 3 vezes na semana. - 2 a 4 séries com 10 a 30 segundos de manutenção da posição ou estímulo aplicado. 23 - O trabalho pode ser estático ou dinâmico que gera ao menos moderado desconforto articular (RASO; GREVE; CASSEB apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). É importante que a atividade escolhida seja de gosto do praticante, porém, evite atividades que gerem risco dequeda ou sangramento. Adicionalmente, as sessões de treino não devem passar de 60 minutos cada e a intensidade e volume pode ser diminuída para pessoas com aptidão física baixa, hiperlactecidemia ou em recuperação de imunossupressão. Já pessoas assintomáticas, estáveis e treinadas, podem executar maiores intensidades (RASO; GREVE; CASSEB apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; KATCH; KATCH; MCARDLE, 2016). 8. Considerações finais Neste tema, você conheceu os principais grupos especiais, bem como sua importância e prevalência na sociedade atual, além dos inúmeros benefícios da prática de exercícios físicos, tanto para a prevenção como para o tratamento de doenças crônicas e minimização de efeitos que levam a uma maior fragilidade e necessidade em certas fases da vida. Por fim, também conheceu a fisiopatologia do câncer e do HIV/ AIDS, além dos principais aspectos relacionados com a prescrição de exercícios físicos para estas populações. Referências Bibliográficas BRASIL. Instituto Nacional do Câncer – INCA. Ministério da Súde. Estatísticas do câncer. INCA, Brasília, 8 de maio de 2020. Disponível em: https://www.inca.gov.br/ numeros-de-cancer.Acesso em: 27 ago. 2020. http:// http:// 24 CAMPOS, E. M. P. 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Contextualização A obesidade e o sobrepeso são problemas gravíssimos de saúde pública mundial devido à sua alta incidência e várias comorbidades atreladas. Fatores relacionados, principalmente, ao estilo de vida ruim de boa parte da população colaboram para esta ocorrência. Com isso, neste tema serão apresentados aspectos relacionados à etiologia e fisiopatologia da obesidade e sobrepeso, além das particularidades relacionadas à prescrição de exercícios para a população acometida por excesso de peso. 2. Etiologia da obesidade Desde o início da vida na Terra, os seres vivos passam por constante evolução e adaptação ao meio em que vivem. Especificamente no caso dos seres humanos, inúmeras transformações relacionadas à sua forma de vida e comportamento tiveram uma velocidade recorde de transformação nos últimos milênios e se acentuaram ainda mais desde a revolução industrial que se iniciou na Inglaterra durante o século XVIII (COREY; KAPLAN, 2014). Nossos ancestrais eram incialmente nômades, viviam da caça e coleta e não dominavam técnicas simples como fazer fogo. Com isso, seu organismo foi se desenvolvendo para a construção de estoques energéticos fisiológicos e determinado padrão de digestão e absorção de nutrientes, uma vez que a disponibilidade alimentar não era algo tão comum e fácil de se obter, assim como a preparação de alimentos e a realização de coisas básicas, por exemplo, um cozimento alimentar, que facilitaria a ingestão, digestão e absorção de nutrientes (COREY; KAPLAN, 2014; REDINGER, 2009). 27 Posteriormente, a fixação de territórios e domínio da agropecuária e do fogo, dentre outros fatores, possibilitaram uma inicial facilidade no modo de vida humano. Ademais, conforme Corey e Kaplan (2014), a Revolução Industrial, Grandes Guerras Mundiais, Guerra Fria e outras ocorrências surgidas nos últimos 260 anos, favoreceram o avanço de facilidades tecnológicas sem precedentes na nossa história evolutiva. Essas facilidades propiciaram melhoras significativas na vida das pessoas, abrangeram inúmeras áreas do conhecimento e foram primordiais para a melhora do conforto e do modo de viver, assim como em aumentar a expectativa de vida. Entretanto, essa evolução humana propiciou uma mudança radical do estilo de vida das pessoas, e isso começou a gerar efeitos negativos do ponto de vista biopsicossocial de parte considerável da população (COREY; KAPLAN, 2014; ROSEN; SPIEGELMAN, 2014). Na parte alimentar começou a haver uma troca da alimentação de característica prioritariamente in natura para uma de perfil processado e ultra processado. Isto ocorreu, principalmente, pela necessidade da disponibilidade de alimentos em grande escala para a grande população que se estabeleceu no planeta, além da necessidade de preparo/consumo alimentar de rapidez em função do cotidiano de ritmo acelerado. Adicionalmente, determinados aspectos psicossociais, por exemplo, o estresse, induziram indiretamente para a satisfação e prazer por meio do consumo exacerbado de determinados tipos de alimentos, uma vez que alimentos de origem industrial apresentam boa palatividade e induzem determinados neurotransmissores indutores do prazer. Entretanto, suas características nutricionais são normalmente ruins, pois estes alimentos apresentam alto nível de gordura satura ou trans, além de elevado índice de carboidratos simples, e quase nenhuma 28 quantidade de fibras, vitaminas e minerais (HILL; MELANSON, 1999; COREY; KAPLAN, 2014; GONZÁLEZ-MUNIESA et al., 2017). Em relação ao comportamento de atividade física, também houve mudança de características, perfil e quantidade, com uma diminuição significativa dos níveis de atividades de deslocamento, instrumentais e de lazer, além doaumento da prática de atividades sedentárias (HILL; MELANSON, 1999; KOHL et al., 2012). Hoje, a inatividade física é um dos principais fatores relacionados direta e indiretamente às causas de mortalidade e surgimento de doenças crônicas (LAKKA; BOUCHARD, 2005). Outros comportamentos como o sono, humor e controle do estresse, também tiveram drástica mudanças em função de um ritmo acelerado do cotidiana, falta de tempo, excesso de cobranças profissionais, estresse exacerbado, dentre outros fatores (COREY; KAPLAN, 2014; GONZÁLEZ-MUNIESA et al., 2017). De acordo com González-Muniesa et al. (2017), estes fatores causam um desbalanço na secreção e ação de determinados hormônios e neurotransmissores, como o cortisol, melatonina, dopamina, serotonina e catecolaminas. Em conjunto, essas mudanças no comportamento alimentar, de atividade física, sono, humor e estresse, estão relacionadas ao ambiente e estilo de vida do indivíduo, e influenciam diretamente no controle do peso e da composição corporal, assim como no gasto energético. Isto ocorre, principalmente, pela presença de balanço energético positivo em função do aumento do consumo de calorias e diminuição significativa do gasto calórico basal e de atividade física, gerando um número exacerbado de pessoas com excesso de peso e gordura corporal (COREY; KAPLAN, 2014; GONZÁLEZ-MUNIESA et al., 2017). Determinados fatores endógenos, como a genética e distúrbios neuroendócrinos, ou ainda o uso de certos medicamentos como os corticoides, também podem influenciar no aumento de gordura 29 corporal. Porém, os aspectos relacionados ao ambiente e estilo de vida são os que mais colaboram para o desenvolvimento da obesidade e sobrepeso (GONZÁLEZ-MUNIESA et al., 2017). Dados de 2014, mostraram que aproximadamente 40% dos adultos do mundo tem o Índice de Massa Corporal (IMC) acima de 25 Kg/m², o que representa mais de 2,1 bilhões de pessoas com excesso de peso, sendo que desse total, 650 milhões são obesos (NG et al., 2014). No Brasil, dados de 2018 apontavam que por volta de 55,7% da população adulta está com peso em excesso, sendo que desses, 19,8% apresentavam obesidade (BRASIL, 2019). É importante salientar que o excesso de peso populacional atinge tanto países ricos quanto em desenvolvimento, acarretando números também significativos de comorbidades e mortes, diminuindo a expectativa de vida e gerando grandes impactos econômicos para os sistemas de saúde (NG et al., 2014; OMS, 2017). 3. Alterações fisiológicas decorrentes do excesso de gordura corporal A Organização Mundial da Saúde considera, há mais de 30 anos, a obesidade uma doença, de característica endócrino metabólica e, como já citado, de origem multifatorial, que culmina no acúmulo exacerbado de energia no organismo, a qual é estocada principalmente em forma de triglicerídeos no tecido adiposo e pode levar à comorbidades significativas (FANTUZZI, 2005; OMS, 2017; GONZÁLEZ-MUNIESA et al., 2017). O principal método para o diagnóstico da obesidade e sobrepeso, segundo a OMS (2017), é o IMC (fórmula a seguir), que mesmo podendo 30 ter algumas limitações técnicas é o teste mais usado na clínica médica e estudos populacionais. Fórmula do IMC: IMC = peso_ altura² O diagnóstico do excesso de peso se dá quando o IMC apresenta valores entre 25 a 29,9 kg/m², enquanto valores iguais/acima de 30 kg/m² são caracterizados como obesidade e seus graus que vão de 1 a 3 (OMS, 2017). Ainda conforme a organização, outro método simples e também amplamente aplicado para avaliar o excesso de gordura corporal na região abdominal e o risco cardiovascular/metabólico, é a avaliação da circunferência de cintura, sendo valores menores de 80 cm para mulheres e de 94 cm para homens considerados normais. Vide Tabela 1 com as referências e classificação de IMC e circunferência de cintura. Tabela 1 – Valores referenciais e classificação do IMC e circunferência de cintura IMC Classificação Obesidade (grau) Abaixo que 18,5 Magreza excessiva. - Entre 18,5 e 24,9 Peso normal. - Entre 25 e 29,9 Sobrepeso. - Entre 30 e 34,9 Obesidade. I Entre 35 e 39,9 Obesidade. II 31 Acima de 40 Obesidade grave/mórbida. III Risco de complicações metabólicas associadas à circunferência de cintura Elevado Muito elevado Homem ≥ 94 cm ≥ 102 cm Mulher ≥ 80 cm ≥ 88 cm Fonte: adaptada de OMS (2017). Além da caracterização da obesidade como uma doença endócrino metabólica, novos conhecimentos sobre o tecido adiposo ocorridos nas últimas três décadas, passaram a caracterizar a obesidade como uma doença que ocasiona um estado inflamatório subclínico crônico de baixo grau (GLEESON et al., 2011; GONZÁLEZ-MUNIESA et al., 2017). Essa inflamação de baixo grau, embora não gere os sintomas graves de uma inflamação de alto grau inflamatório, como a presença de febre e dores, pode interferir, conforme Fantuzzi (2005) e Gleeson et al. (2011), significativa e negativamente em diversos órgãos e sistemas. Estas interferências podem gerar disfunções e doenças como a resistência à insulina (RI), diabetes tipo 2 (DM2), aterosclerose, dislipidemias, hipertensão arterial, sobrecarga cardíaca, demências, artrite e alguns tipos de cânceres. Importante citar, ainda, os efeitos biopsicossociais do excesso de peso, como a baixa autoestima, depressão, discriminação social e diminuição da vida social, além de prejuízos de aptidão física e realização de atividades de vida diária (GLEESON et al., 2011). Dentre os vários fatores responsáveis por essa indução inflamatória pela obesidade, o principal parece ter relação com a hipóxia em adipócitos gerada pela sua hipertrofia exacerbada, e que pode induzir dano e necrose celular destas células. 32 Este quadro ocorre mais na gordura localizada, em compartimentos adiposo viscerais e ectópicos (armazenamento aumentado de gordura em órgãos não adiposos) gera adaptações e sinalizações celulares por meio de citocinas e outras substâncias focando o remodelamento, adaptação e regeneração do tecido adiposo pelo organismo. Ocorre, por exemplo, o estímulo de sinalizadores para induzir a irrigação sanguínea e o aporte de oxigênio pelo remodelamento e aumento de vasos sanguíneos, além da necessidade de eliminação de células lesadas. Entretanto, indiretamente, estas sinalizações celulares e o processo inflamatório aumentado acabam atrapalhando outras funções orgânicas, como a sinalização da insulina ou o controle pressórico, além de aumentar o risco de desenvolvimento de cânceres e aterosclerose, processos estes intimamente ligados a presença de inflamação (FANTUZZI, 2005; GLEESON et al., 2011). O tratamento do excesso de gordura corporal é baseado no nível de IMC e na presença ou não de complicações e morbidades. Em qualquer nível é recomendado a mudança comportamental-cognitiva e do estilo de vida, principalmente pelo aumento do gasto calórico em função da atividade física, além da mudança do padrão alimentar e de hábitos associados ao sono e ao gerenciamento do estresse, depressão e compulsões (ABESO, 2016; GUYTON; HALL, 2017). Em casos mais extremos, como no IMC acima de 30 kg/m² em conjunto com a presença de comorbidades, pode haver a introdução de tratamento farmacológico com o uso de anorexígenos catecolaminérgicos ou de medicamentos que inibam o apetite ou retardem a absorção de carboidratos e lipídeos. Entretanto, efeitos colaterais são comuns com a prática medicamentosa (ABESO, 2016; GUYTON; HALL, 2017). Já o tratamento cirúrgico pode ser indicado em casos de IMC acima de 40 kg/m² ou no IMC acima de 35 kg/m² associado à presença de comorbidades, porém, riscos e complicações diretas e indiretas da 33 cirurgia, ou posteriores distúrbios nutricionais e metabólicos podem ocorrer (ABESO, 2016; GUYTON; HALL, 2017). 4. Particularidades e recomendações da prescrição de exercícios físicos para pessoas obesas Inúmeros benefícios podem ser incorporados por pessoas com obesidade e sobrepesopraticantes regulares de exercícios físicos. Além das já conhecidas adaptações ao treinamento físico, pessoas com excesso de peso que praticam algum tipo de atividade física tem menor possibilidade de desenvolver as comorbidades associadas ao excesso de gordura corporal (ACSM, 2011; MORAES; ZANESCO, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; ABESO, 2016). Além disso, o treinamento físico auxilia na perda de peso pela indução do gasto energético adicional proporcionado durante e após o período de prática, fator este primordial para a perda de gordura, em conjunto com adaptações na dieta (ACSM, 2011; GLEESON et al., 2011; MORAES e ZANESCO, 2013; ABESO, 2016). Os exercícios físicos têm ação direto na fisiopatologia da obesidade, não só pela diminuição do peso corporal, como também pela ação anti- inflamatória proporcionada pela contração muscular (GLEESON et al., 2011). Muito da proteção contra o desenvolvimento de comorbidades está relacionado com os efeitos anti-inflamatórios, além de outros diversos que atuam diretamente nos mecanismos moleculares do desenvolvimento de certas doenças e distúrbios correlatos ao excesso de gordura corporal. Interessantemente, muito dos efeitos protetores do ponto de vista cardiometábolicos, assim como da diminuição da 34 inflamação, podem ocorrer sem que haja perda significativa de peso e gordura corporal (GLEESON et al., 2011). Para a otimização de benefícios e minimização de riscos é necessário a realização das avaliações clínica e física, lembrando que é comum a presença de comorbidades atreladas e elevado risco cardiometabólico. Assim, a observação também de recomendações e atenções especificas voltadas para outras possíveis doenças e distúrbios se faz necessária (ACSM, 2011; MORAES; ZANESCO, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). Em termos gerais, na presença de diabetes ou pré-diabetes é importante que não se exercitar se a glicemia estiver abaixo de 100 mg/dl ou acima de 250 mg/dl, e independentemente da presença ou não de distúrbios no controle glicêmico é recomendável não se exercitar em jejum (ACSM, 2011; MORAES; ZANESCO, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). Caso o aluno ainda tenha esteatose hepática, altas intensidades são contraindicadas em função de gerarem grande produção de radicais livres, que podem aumentar o dano celular hepático (MORAES; ZANESCO, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). Já a hipertensão e outras doenças cardiovasculares, contraindicam elevações pressóricas sistólicas acima de 180 mmHg, além de evitar a realização de manobra de Valsava e atividades que levem a falha muscular concêntrica. Moraes e Zanesco (2013) nos lembram que o uso de medicamentos como os betabloqueadores obrigam, além do controle da Frequência Cardíaca (FC), também da Percepção Subjetiva de Esforço. Ainda conforme referidos autores, sobre medicamentos, é importante atentar ao uso de fármacos exclusivos para o emagrecimento, sendo necessárias, neste sentido, atenção para: 35 - Inibidores de receptação de noradrenalina e serotonina como a sibutramina: podem elevar a pressão arterial e FC, além de boca seca, sudorese, dor de cabeça, insônia e constipação intestinal. - Orlistat (inibidor da digestão de gordura): pode favorecer hipoglicemia, flatulência, hipovitaminose de vitaminas lipossolúveis e incontinência fecal. - Agentes simpatomiméticos como certas classes de anfetaminas: Aumento da pressão arterial e FC, boca seca, sudorese, fraqueza, insônia e constipação intestinal. É necessário, também, minimizar o uso de atividades que gerem impacto e atritos, devendo favorecer o uso de atividades aquáticas e no ciclo ergométrico. Dessa forma, minimizar compressões mecânicas excessivas é usar menor intensidade de carga (ACSM, 2011; MORAES; ZANESCO, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO). Recomendações de exercícios físicos para obesos e ou presença de sobrepeso incluem a prática de atividades aeróbias, de força muscular e flexibilidade. Embora volume, frequência e intensidades mínimas sejam descritas, dependendo da individualidade biológica e da condição física do praticante, é comum no início do período de treinamento que haja uma diminuição dessas variáveis do treinamento devido à falta de capacidade física para a execução dos níveis mínimos recomendados. O importante é iniciar o treino dentro da capacidade de realização dos sujeitos, havendo então uma posterior progressão segura até que o mínimo recomendado seja atingido e quem sabe extrapolado conforme à adaptação, segurança cardiometabólica e disponibilidade dos alunos (ACSM, 2011; MORAES; ZANESCO, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO). A seguir, temos uma síntese da recomendação de treinamentos para obesos quanto aos tipos, frequência, volume e intensidade: 36 Treino aeróbio - 5 vezes na semana, que alcancem de início 150 minutos por semana e posterior tentativa de alcançar 300 minutos por semana com a adaptação ao treino. - A intensidade deve ser moderada (46% a 63% do VO2máx. ou 64% a 76% da FCmáx.). Já se a alta intensidade for usada conforme a adaptação e segurança cardiovascular, os valores são (64% a 90% do VO2máx. ou 77% a 95%). - No caso do uso de alta intensidade, os 300 minutos semanais podem cair para 150 minutos. - Pode haver, ainda, combinação de atividades moderadas com intensas. - As sessões devem ter no mínimo 10 minutos de atividades e não se prolongar por mais de 1 hora a 1 hora e 30 minutos. - Deve-se variar atividades para diminuir a monotonia e gerar menos impacto, como citado anteriormente. Treino de força - 2 a 3 vezes por semana, e intervalo de 48 horas entre sessões para trabalhar o mesmo grupo muscular. - Priorizar os grandes grupos musculares. - 8 a 10 exercícios. - 2 a 4 séries de 8 a 12 repetições, com o intervalo variando entre 60 a 120 segundos entre séries, dependendo da intensidade trabalhada. Para idosos obesos são sugeridas de 10 a 15 repetições. 37 - A intensidade deve ser entre 60%–70% de 1RM, sendo que indivíduos treinados podem usar intensidade cima de 80% de 1RM, enquanto pessoas com baixa capacidade física ou idosos obesos, podem se exercitar com 40%–50% de 1RM. - Idosos obesos podem realizar treino de potência com intensidade entre 20% a 50% de 1RM. Treino de flexibilidade - 2 a 3 vezes na semana. - Priorizar grandes articulações. - Manter articulações sobre tensão de 10 a 30 segundos, sendo que se o sujeito for um obeso idoso, o tempo de tensão deve ser de 30 a 60 segundos. Caso o aluno obeso seja idoso, a recomendação traz, ainda, a inclusão de atividades que trabalhem o equilíbrio, sem muitos direcionamentos em relação a variáveis do treinamento físico, apenas mencionando que sejam realizadas atividades que gerem um desequilíbrio do centro de gravidade, sempre priorizando a segurança a fim de evitar quedas. 5. Considerações finais Neste tema, você conheceu a etiologia relacionada ao desenvolvimento da obesidade e excesso de peso, e verificou que embora sua origem seja multifatorial, os fatores ambientais e que compõem o estilo de vida são os principais responsáveis para sua ocorrência e números epidemiológicos pandêmicos mundo a fora. 38 Também foi possível identificar a fisiopatologia da doença, que é caracterizada como uma doença endócrino metabólica que acarreta um estado inflamatório de baixo grau crônico capaz de gerar diversas disfunções e comorbidades orgânicas, dentre elas as principais doenças crônico não-transmissíveis. Por fim, verificou que os benefícios diretos e indiretos da prática de exercícios por pessoas com excesso de gordura corporal, assim como os principais cuidados, além de recomendação de tipos de atividades a serem prescritas com suas respectivas frequências, volumes e intensidades. Referências Bibliográficas ABESO. Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica. Diretrizes brasileiras de obesidade. 4.ed. São Paulo: ABESO. 2016. ACSM. American College of Sports Medicine. Position Stand. Quantityand quality of exercise for developing and maintaining cardiorespiratory, musculoskeletal, and neuromotor fitness in apparently healthy adults: guidance for prescribing exercise. Medicine & Science in Sports & Exercise, Indianapolis, 43(7), p. 1334-59, 2011. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/21694556/. Acesso em: 16 nov. 2020. BRASIL. Ministério da Saúde. VIGITEL BRASIL 2019. 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Contextualização As doenças cardiovasculares e pulmonares atingem um grande contingente de pessoas mundo afora. Neste tema, as principais doenças classificadas como cardiovasculares ou respiratórias crônicas serão apresentadas. Posteriormente as recomendações e cuidados relacionados à prescrição de exercícios para a população acometida por estes dois grupos de doenças serão contextualizados. 2. Doenças cardiovasculares O grupo de doenças caracterizado como cardiovasculares é responsável pela maior causa de óbitos do mundo. Individualmente, o infarto do miocárdio e o acidente vascular cerebral (AVC) (também conhecido como acidente vascular encefálico – AVE), ocupam, respectivamente, a primeira e segunda posições nas causas morte mundial (OPAS, 2018). Várias doenças podem ser classificadas como cardiovasculares; dentre as que mais se destacam, temos: infarto do miocárdio, AVC, doença isquêmica do coração, insuficiência cardíaca e hipertensão arterial sistêmica. No geral, essas doenças têm origem multifatorial, destacando- se: envelhecimento, genética, etnia, consumo de álcool e tabaco, má alimentação, excesso do consumo de sódio, sedentarismo e sobrepeso/ obesidade, além da presença de outros problemas cardiovasculares, como a hipertensão arterial sistêmica. Em conjunto, esses fatores favorecem um desequilíbrio autonômico e hormonal, aumento da presença de inflamação sistêmica de baixo grau, dislipidemia e consequente risco de formação de placas de ateromas que desencadeiam o processo aterosclerótico e obstrução arterial (NEGRÃO; BARRETTO, 2010; GUYTON; HALL, 2017). 42 Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) Está é uma doença multifatorial, silenciosa e de lenta progressão que consiste em valores aumentados e sustentados de pressão arterial (PA) sistólica ≥ 140 mmHg e ou diastólica ≥ 90 mmHg. A HAS é uma doença que eleva o risco de AVC, infarto do miocárdio, e pode levar a lesões e diminuições funcionais de órgãos como o coração, rins e vasos em geral. A PA é controlada diretamente por fatores como o sistema nervosoautônomo, sensibilidade barorreflexa, reatividade vascular, sistema cinina-calicreína e renina-angiotensida-aldoesterona. Porém, indiretamente, também pode sofrer influência da resistência à insulina e hiperinsulinemia, excesso de ácido úrico circulante, além de disfunções endoteliais, vasculares e hematológicas. Todos estes aspectos, influenciam cada qual no débito cardíaco (volume sistólico x frequência cardíaca (FC)) e na resistência vascular periférica, variáveis essas responsáveis pela caracterização dos valores pressóricos. Insuficiência cardíaca Na maior parte dos casos, a insuficiência cardíaca está associada à sequela de alguma outra doença cardiovascular. Esta doença pode ser caracterizada como a incapacidade de o músculo cardíaco suprir as necessidades circulatórias do indivíduo. Isto ocorre em função de déficits funcionais ou estruturais do coração, que acarretam diminuição do débito cardíaco e da fração de ejeção cardíaca, que se tornam incapazes de suprir as demandas metabólicas. Esses fatores, acarretam efeitos que pioram ainda mais a deterioração do miocárdio, uma vez que há a indução do aumento da atividade do componente simpático do sistema nervoso autônomo e dos sistemas hormonais responsáveis pelo controle da PA, além de elevar o estresse oxidativo e o estado inflamatório do sujeito (NEGRÃO; BARRETTO, 2010; BECHARA et al., 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). 43 Como o coração não consegue suprir a demanda metabólica, começam a surgir problemas no metabolismo energético, e disfunções periféricas, como retenção de líquidos, diminuição da vasodilatação e desorganização estrutural da musculatura esquelética. Por todos estes aspectos, a pessoa com insuficiência cardíaca pode apresentar fadiga, dispneia (falta de ar), intolerância ao esforço e caquexia (síndrome que acarreta a perda de peso, atrofia muscular, fadiga e fraqueza). Entretanto, a severidade e tipos de sintomas apresentados vão depender da classificação do indivíduo quanto ao nível da doença, sendo elas (BECHARA et al., 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013): Classe 1: assintomáticos em atividades habituais. Classe 2: assintomáticos em repouso, sintomas nas atividades habituais com limitação física leve. Classe 3: assintomático em repouso, sintomas nas atividades menores que as habituais e com limitação física moderada. Classe 4: sintomas em repouso com limitação física grave. Aterosclerose, dislipidemia e isquemia A aterosclerose se caracteriza pela formação de placas de ateromas, as quais são caracterizadas como placas de gordura, em especial lipoproteína de baixa densidade oxidada (LDL oxidado), cálcio, colágeno, células imunológicas e outros elementos, que favorecem um enrijecimento da área afetada, diminuição do fluxo sanguíneo, hipertensão e estenose arterial (vide Figura 1) (NEGRÃO; BARRETTO, 44 2010; PASCHALIS, 2013; RODRIGUES et al., 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). Figura 1 – Processo aterosclerótico Fonte: CreVis2 /iStock.com. A formação de placas ateroscleróticas, ocorre pela dislipidemia ou hiperlipidemia, que se caracteriza por um desequilíbrio na circulação de lipídeos, principalmente pelo aumento do colesterol total, da lipoproteína de baixa densidade (LDL) e triglicerídeos, além da diminuição das lipoproteínas de alta densidade (HDL). Além disso, ocorre, concomitantemente, um aumento do processo inflamatório subclínico, o que favorece a aderência de LDL oxidado, tecido fibroso e outros produtos na parede vascular. Com isso, diminui progressivamente o diâmetro do vaso (NEGRÃO; BARRETTO, 2010; PASCHALIS, 2013; RODRIGUES et al., 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). De acordo com Paschalis (2013), as placas de ateroma podem ser estáveis ou instáveis: 45 - Estáveis: quando o processo inflamatório e a agregação de lipídeos e outros materiais são encerrados e a placa é coberta por colágeno, gerando uma saliência/bloco estável no meio da artéria, além de menor risco de gerar eventos cardiovasculares graves. - Instáveis: presença de processo inflamatório contínuo e intenso, que gera crescimento contínuo da placa e dificuldade de estabilização, o que está associado a um maior risco de problemas como infarto, AVC e doença arterial obstrutiva crônica. Este aumento do risco se deve a maior probabilidade de rompimento, seguido de dano arterial e consequente formação de coágulo e obstrução parcial ou total da circulação sanguínea, o que acarreta no déficit de oxigênio e outros nutrientes as células irrigadas posteriormente a essa obstrução. A diminuição do lúmen arterial acarreta diminuição do fluxo sanguíneo nas regiões posteriores, o que é chamado de isquemia, e tem sua severidade conforme o local e tamanho do desenvolvimento da placa de ateroma. Segundo Guyton e Hall (2017), isto também acarreta disfunções autonômicas que podem interferir negativamente na função e no trabalho do coração e vasos sanguíneos. Geralmente, a isquemia ocorre na realização de esforço físico, uma vez que a diminuição de fluxo prejudica a capacidade de suprimento da demanda metabólica, gerando sintomas que irão variar conforme a região onde a placa de ateroma se encontra. No geral, esses sintomas podem incluir: dores de cabeça, na região peitoral e em membros inferiores ou superiores e dispneia, além de formigamento, tontura, perda de força, hipertensão arterial, elevação exacerbada da FC, enjoo, mal estar e falta de coordenação motora dentre outros (PASCHALIS, 2013; RODRIGUES et al., 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). 46 Infarto do miocárdio O infarto do miocárdio está relacionado à presença de isquemia e rompimento de placas de ateromas em vasos e artérias do coração. Com o rompimento e a obstrução total ou parcial do local lesado, há um déficit de oxigênio que acarreta em dano e morte celular, aumento de espécies reativas de oxigênio e de inflamação, que dependendo do caso e se não for tratado rapidamente, pode levar morte (KEMPF; REUB, 2006; BRITTO; PEREIRA, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; RODRIGUES et al., 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). O tratamento, geralmente, é dividido em uma fase aguda de redução da lesão, inicialização da cicatrização e proteção contra complicações, por exemplo, o surgimento de arritmia e parada cardíaca. Após a estabilização do quadro, há uma fase posterior chamada de reabilitação cardíaca, na qual o foco é a recuperação funcional e de eventuais sequelas (KEMPF; REUB, 2006; RODRIGUES et al., 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). Acidente Vascular Cerebral (AVC) O AVC é caracterizado como uma síndrome neurológica que induz mudanças funcionais e estruturais no encéfalo em função da interrupção sanguínea desencadeada por obstruções geralmente relacionadas à trombos/coágulos oriundos do rompimento de ateromas (AVC isquêmico, entre 80 e 85% dos casos) ou por extravasamento sanguíneo relacionado, geralmente, a rompimentos de vasos e aneurismas (AVC hemorrágico). Um terceiro tipo de AVC é o transitório, que se assemelha ao AVC isquêmico, porém de menor proporção e com o trombo/coágulo se dissolvendo voluntariamente (NEGRÃO; BARRETTO, 2010; ALVES, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; GUYTON; HALL, 2017). 47 Assim como no infarto do miocárdio, é necessário atendimento médico agudo e precoce para minimizar sequelas e agravamentos que interfiram significativamente na função neuronal/regiões atingidas que, dependendo do caso, podem levar à óbito. Posteriormente, também há a necessidade de reabilitação para o tratamento e recuperação de sequelas (ALVES, 2013). 3. Prescrição de exercícios para a população com doenças cardiovasculares Os exercícios físicos são atividades imprescindíveis e recomendadas tanto para prevenção quanto para o auxílio na reabilitação e tratamento de doenças cardiovasculares, uma vez que propiciam benefícios diretos ao enfretamento de cada uma das fisiopatologias das doenças mencionadas, como outros diversos que abrangem aspectos biopsicossociais(KEMPF; REUB, 2006; NEGRÃO; BARRETTO, 2010; RONDON, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). Um dos aspectos que devem ser observados na prescrição de exercícios para pessoas com doenças cardiovasculares é o conhecimento dos medicamentos utilizados, uma vez que, isoladamente, podem provocar efeitos colaterais, além de interferir nas respostas fisiológicas do treinamento físico. Outro ponto sobre os fármacos são os possíveis ajustes de dosagem que podem vir a ocorrer em função de adaptações benéficas pelo treinamento, por exemplo, o exercício aeróbio proporciona efeito hipotensor, ao agrega-lo com o uso do medicamento, eventuais reduções podem ser necessárias para evitar hipotensão em excesso, devendo o médico ser contatado nestes caos. A seguir, são citados os principais medicamentos utilizados pela população com doenças cardiovasculares e os aspectos a serem observados (CARDOSO JÚNIOR et al., 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013; LOPES; MUNHOZ, 2013): 48 - Hipolipemiantes: agentes com esse fim, em especial certas classes de estatinas, podem induzir danos musculares e diminuir a oxidação de gorduras. - Anticoagulantes e antiplaquetários: por aumentar o risco de pequenas hemorragias em casos específicos, como lesões músculo-articulares, atividade de impacto ou com grande contato físico, devem ser evitadas. - Betabloqueadores, antagonistas de canais de cálcio e outros antiarrítmicos: diminuem a FC em repouso e em exercício. Além da FC, o treinamento deve ser acompanhado por percepções subjetiva de esforço. - Vasodilatadores: induzem aumento da FC em exercício. - Diuréticos: maior risco de desidratação e câimbras. - Nitrato: risco de hipotensão, camuflagem da angina e surgimento de dores de cabeça. - Anti-hipertensivos em geral (inclusive os três medicamentos anteriores): podem induzir hipotensão severa, o que justifica atenção com quedas e mudanças bruscas de movimentos. - Digitálicos: aumento da contratilidade cardíaca, o que pode dar um irreal estado de aptidão aeróbia. Outro aspecto de importante atenção é a liberação médica e realização do eletrocardiograma (ECG) de esforço, também chamado de teste ergométrico. Além da identificação de problemas, com o ECG de esforço é possível identificar limiares de isquemia ou de arritmia ou hiper-reatividade da PA ao exercício, ou seja, pontos de intensidade que podem desencadear estas intercorrências e que seriam zonas de intensidade e resposta de PA e FC que não deveriam ser alcançadas em hipótese alguma durante a o treinamento. Caso seja possível, o 49 ergômetro usado no ECG deve ser similar ao tipo de atividade aeróbia que será realizada elo indivíduo (NEGRÃO; BARRETTO, 2010; RONDON, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). Adicionalmente, algumas situações especificas, como fases logo após ao evento agudo de AVC, infarto do miocárdio ou casos mais graves de insuficiência cardíaca, justificam a presença de uma equipe multidisciplinar composta por outros profissionais da área da saúde para otimizar o atendimento nestes casos (KEMPF; REUB, 2006; NEGRÃO; BARRETTO, 2010). Independentemente do tipo de doença cardiovascular, sempre é necessário a identificação da existência de limiar isquêmico, arrítmico ou de hiperresponsividade da PA, e que o trabalho físico atinja no máximo uma intensidade de dez batimento cardíacos a menos que o limiar desencadeador de determinado evento. Por particularidade hemodinâmicas, autonômicas e termorregulatórias, não são recomendadas interrupção brusca dos exercícios e a não realização de aquecimento progressivo, realização de atividades em temperaturas extremas e mudanças bruscas de posição. Além disso, também deve ser evitado manobras de Valsalva, uso de apneia, falha concêntrica e isometria nos movimentos, exacerbação de dano muscular e o emprego de intensidade que induzam PA sistólica acima 180 mmHg e PA diastólica acima de 115 mmHg, exceto em casos específicos como o exercício ambulatorial na insuficiência cardíaca e outros casos específicos (KEMPF; REUB, 2006, NEGRÃO; BARRETTO, 2010). No geral, as atividades recomendadas para a população, abrangem o trabalho das capacidades físicas aeróbia (que devem ser priorizadas na maioria dos casos), de força muscular e flexibilidade. Embora estas e outras recomendações e cuidados para a prescrição de exercícios na doença cardiovascular se assemelhem, a seguir, são destacados pontos específicos conforme cada problema/doença cardiovascular (NEGRÃO; BARRETTO, 2010). 50 Exercícios, aterosclerose e isquemia Treino aeróbio: 3 a 5 vezes/semana; 30 a 60 minutos por sessão de treino; intensidade entre 50% a 70% da FC de reserva, podendo chegar até 80% se bem tolerado e não atingido o limiar de isquemia (dez batimentos abaixo do momento em que os sinais isquêmicos são sentidos). Treino de força: o trabalho deve ser dinâmico e realizado de 2-3 vezes na semana; envolver os grandes grupos musculares; ter entre oito a dez tipos de exercícios, 2 a 3 séries de 10 a 15 repetições e 60 a 80% de 1 RM (também respeitar o limiar isquêmico). O intervalo entre séries deve variar de 1 a 2 minutos. Treino de flexibilidade: 2 a 3 vezes/semana, com 1 a 4 séries de 20 a 30 segundos. que gerem ligeiro desconforto nos principais grupos musculares (NEGRÃO; BARRETTO, 2010; BRITTO; PEREIRA, 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). Exercícios e Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) Treino aeróbio: deve ser realizado de 3 a 5 vezes/semana, por 30 a 50 minutos por sessão e intensidade de 40% a 70% da FC de reserva. Treino de força: trabalho dinâmico em 2 a 3 vezes/semana, realizado com 1 a 3 séries de 10 a 15 repetições, 1 a 2 minutos de pausas entre séries e intensidade de 30% a 40% de 1RM para membros superiores e 50 a 60% de 1RM para membros inferiores. Treino de flexibilidade: 2 a 3 vezes/semana com pelo menos uma série que induza manutenção da posição por 15 a 60 segundos. O treinamento não deve ser iniciado se a PA estiver maior que 160 x 100 mmHg. A PA deve ser aferida rotineiramente no pré e durante o treino, principalmente em indivíduos que não tenham um controle tão 51 adequado desta variável, neste caso, pelo menos até estabilização do quadro deve-se evitar exercícios na água pela dificuldade de aferição da PA neste ambiente (NEGRÃO; BARRETTO, 2010; CARDOSO JÚNIOR et al., 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). Exercício e insuficiência cardíaca Treino aeróbio: 4 a 7 vezes/semana, com 20 a 60 minutos por sessão e intensidade entre 40% e 80% da FC de reserva. Treino de força: 2 a 3 vezes/semana, oito a dez exercícios para os grandes grupos musculares, 3 a 4 séries de 10 a 15 repetições com intensidade entre 40% e 60% de 1RM e 1 a 2 minutos de intervalo entre séries. Treino de flexibilidade: 2 a 3 vezes/semana, foco nos principais grupos musculares, 4 séries de manutenção da posição de maior amplitude articular por 15 a 60 segundos. A FC e a PA devem ser monitoradas, rotineiramente, uma vez que esta população apresenta essas variáveis elevadas. Embora certas recomendações tragam que o exercício pode ser realizado se níveis pressóricos em repouso estiverem até 220 x 100 mmHg e possam chegar durante o treino a 220 x 105 mmHg, estes valores devem ser vistos com cuidados, pois estão mais relacionados à prática em ambiente ambulatorial/controlado e acompanhados por equipes multidisciplinares. Na ausência desses fatores, não se deve iniciar as atividades se a pressão estiver >180 x 110 mmHg. Indivíduos que estejam descompensados ou com quadros congestivos não devem se exercitar, a não ser que seja em ambiente ambulatorial (KEMPF; REUB, 2006; NEGRÃO; BARRETTO, 2010; BECHARA et al., 2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013). 52 Exercícios e infarto do miocárdio De acordo com Kempf e Reub (2006) e Rodrigues et al. (2013 apud RASO; GREVE; POLITO, 2013), indivíduos que sofreram infarto, passam por um processo denominado de reabilitação cardíaca, o qual é dividido em quatro fases: Fase 1: hospitalar,
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