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1 COMPETÊNCIAS DO ASSISTENTE SOCIAL, ÉTICA E DIREITOS HUMANOS COMPETÊNCIAS DO ASSISTENTE SOCIAL, ÉTICA E DIREITOS HUMANOS 2 SUMÁRIO .................................................................................................................................... 1 .................................................................................................................................... 1 COMPETÊNCIAS DO ASSISTENTE SOCIAL, ÉTICA E DIREITOS HUMANOS ...... 1 1. INTRODUÇÃO .................................................................................................. 3 2. POR QUE DISCUTIR ATRIBUIÇÕES E COMPETÊNCIAS PROFISSIONAIS DE ASSISTENTES SOCIAIS ...................................................................................... 5 Figura 1 ...................................................................................................................... 5 2.1 Atribuição Privativa e Competência Profissional na lei de Regulamentação da Profissão ................................................................................. 7 2.2 O “Chão” do Exercício Profissional: A Vida cotidiana num Contexto de Regressão de Direitos da Classe Trabalhadora ..................................................... 9 2.1.1 Vida Cotidiana e Valores ............................................................................................... 10 2.3 Destituição de Direitos da Classe Trabalhadora e Contrarreforma nas Políticas Sociais ...................................................................................................... 12 3. ATRIBUIÇÕES PRIVATIVAS E COMPETÊNCIAS PROFISSIONAIS .......... 17 3.1 Mediações Constitutivas das Atribuições, Demandas e Requisições .. 22 3.2 Definição dos Termos ............................................................................... 24 3.2.1. Atribuições ...................................................................................................................... 24 3.2.2. Requisições .................................................................................................................... 25 3.2.3. Demandas ...................................................................................................................... 25 3.2.3 Competências ............................................................................................................ 28 4. ANÁLISE DAS EXPRESSÕES EMPÍRICAS DAS ATRIBUIÇÕES, DEMANDAS E REQUISIÇÕES CAPTADAS NAS FONTES CONSULTADAS ....... 30 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 33 REFERÊNCIAS......................................................................................................... 35 3 1. INTRODUÇÃO Muitos aspectos envolvem algo que é, aparentemente, simples: a manutenção de um segredo. Se essa atitude já envolve questões e dilemas quando em relação interpessoal, pois implica desde a possibilidade e o dever daquele que guarda o segredo de se omitir em revelá-lo até a necessária proteção da intimidade do sujeito que apresenta o aspecto de sua vida que não quer que sejam conhecido por outrem, todos esses aspectos complexificam-se ainda mais nos termos do sigilo profissional. Pelo exercício de sua profissão, cabe ao assistente social o direito de não revelar a informação obtida do usuário que o fez na confiança de resguardo da matéria sigilosa. Na língua portuguesa, segredo e sigilo são sinônimos. Ao verificar as diversas definições de sigilo profissional pode-se observar sua similitude tanto enquanto direito 4 como dever do profissional em não divulgar informações colhidas ou obtidas em decorrência de seu trabalho. Não são todas as profissões que devem a obrigação do sigilo e isso já seria revelador da disposição social que é atribuída a algumas profissões de terem o dever e o direito de mantê-lo. Ora é consenso que o profissional conheça todos os elementos necessários para o bom cumprimento de seu trabalho, desde as condições institucionais até as informações obtidas na sua relação com o usuário. O sigilo profissional não é absoluto, no caso do Serviço Social, esse elemento abre a possibilidade de esse profissional avaliar, subjetivamente, se deve manter ou divulgar o fato sigiloso, devendo prevalecer o disposto no Código de Ética Profissional do Assistente Social atentando para o conteúdo ético-político dos princípios que o regem. A análise do sigilo profissional a partir da ética mostra que se está diante de algo complexo, que não se limita a um preceito legal. Quer dizer, o seu entendi- mento remete as questões: • Para quem?; • Com qual necessidade?; • Para quê? • E em que condições? Essas questões não podem ser pensadas abstratamente, mas sim a partir das situações concretas nas quais estão inseridas, pois interrogam a multiplicidade de demandas que lhe são colocadas na comunicação de uma informação. Sobre as competências profissionais e as atribuições privativas de assistentes sociais. desenvolve primeiramente uma reflexão a respeito do impacto das condições objetivas para o trabalho profissional para, posteriormente, apresentar e problematizar um conjunto de ações desenvolvidas pelo Conjunto CFESS-Cress na afirmação das atribuições privativas e, especialmente, das competências profissionais desta categoria. 5 2. POR QUE DISCUTIR ATRIBUIÇÕES E COMPETÊNCIAS PROFISSIONAIS DE ASSISTENTES SOCIAIS Figura 1 As campanhas do dia 15 de maio, Dia do(a) Assistente Social, são uma deliberação dos Encontros Nacionais do Conjunto CFESS- -Cress do ano de 2015, o tema escolhido foi: “Assistente social: atribuições, competências e defesa das políticas públicas”. Assim, sob o slogan — criado pela equipe que elaborou a campanha e aprovado pela diretoria do CFESS, após consulta aos Cress — o Conjunto CFESS-Cress comunica: “Assistente social: profissional de luta, profissional presente! Pelas políticas públicas, pelos direitos humanos”. Para o Conjunto CFESS-Cress, priorizar a reflexão sobre as atribuições e competências profissionais nos debates em torno da data significa: 6 • Iniciar as comemorações em torno dos oitenta anos da profissão, tomando como marco a criação do primeiro curso de Serviço Social em 1936, que hoje pertence à PUC-SP. Assim, estão previstas diversas iniciativas de debate no sentido de refletir sobre a profissão, situada no contexto da sociedade de classes no Brasil, reafirmando que as “comemorações” não ocorrem numa perspectiva endógena. • Trazer as comemorações sobre a profissão no contexto do potencial de seus(suas) trabalhadores(as), para a construção de um país comprometido com as históricas reivindicações da classe trabalhadora, uma vez que, por exemplo, a defesa de políticas públicas demarca um posicionamento contra a livre concorrência, os ditames do mercado e defende a centralidade do papel do Estado na correlação de forças postas da relação capital versus trabalho. • Promover uma reflexão sobre atribuições e competências é discutir a particularidade da intervenção profissional na divisão social etécnica do trabalho, num contexto contemporâneo, em que empregadores vêm buscando ditar como e de que forma devem trabalhar os(as) assistentes sociais. Assim, hoje, profissionais de Serviço Social atuam em programas e projetos governamentais federais que determinam não apenas quais serviços devem ser desenvolvidos nos municípios — por meio do repasse de financiamento —, mastambém vêm buscando determinar como deverão intervir os(as) profissionais que lá atuam, inclusive assistentes sociais. Tal determinação tem vindo por meio de vários documentos sobre como, de que forma e com quais profissionais a categoria de assistentes sociais deve intervir. Isso também vem ocorrendo nos outros espaços ocupacionais — a exemplo do socio jurídico e do empresarial —, sendo cada vez mais demandados para desenvolver iniciativas que buscam determinar quais são as suas competências profissionais, muitas vezes, chocando-se com as atribuições privativas. Portanto, discutir as atribuições privativas e competências profissionais de assistentes sociais é discutir a profissão. E esse debate se faz a partir de uma nítida concepção de profissão, aquela que se forja na ruptura com o conservadorismo que marcou o início da atividade e que está expressa no atual Código de Ética do(a) Assistente Social, na lei de regulamentação da profissão de 1993 e nas diretrizes curriculares da Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (Abepss). 7 2.1 Atribuição Privativa e Competência Profissional na lei de Regulamentação da Profissão Figura 2 Uma profissão só se afirma e se desenvolve se responder às demandas postas pelos diferentes segmentos da sociedade. Somos sabedores que o Serviço Social (Iamamoto, 1995) atua sobre interesses contraditórios e somente por um polo pode fortalecer o outro. Assim, desde a ruptura com oconservadorismo que caracterizou a emergência da profissão (o que não quer dizer que não exista o conservadorismo entre nós, na profissão), viemos construindo um projeto profissional em que a questão social — matéria que justifica o fazer profissional — é vista como produto e cria do modo de produção capitalista. Portanto, seus efeitos não podem ser enfrentados de forma moralizante e de responsabilidade individual. Seu enfrentamento deve se dar coletivamente. Por isso o compromisso do Código de Éticado(a) Assistente Social (CFESS, 2012a) com a liberdade como valor ético central e a defesa da democracia e dos direitos humanos. Os princípios do Código afirmam ainda a importância de um projeto profissional vinculado ao processo de construção de uma nova ordem societária. Logo, o Código 8 de Ética nega valores corriqueiros da sociedade capitalista, como, por exemplo, o individualismo e a competividade. Trazer para o debate não apenas as atribuições privativas, mas as competências profissionais, coloca em cena não somente aquilo que, pela lei, é função exclusiva do Serviço Social, mas também aquilo que potencialmente podemos/devemos desenvolver no trabalho profissional. Afinal, na lei de regulamentação da profissão (Lei n. 8.662/1993), os artigos 4° e 5° tratam, respectivamente, das competências e atribuições privativas de profissionais do Serviço Social. Iamamoto (2012), pautada em parecer da lavra de Sylvia Terra, sistematiza: “No sentido etimológico, a competência diz respeito à capacidade de apreciar, decidir ou fazer alguma coisa, enquanto a atribuição é uma prerrogativa, privilégio, direito e poder de realizar algo” (p. 37). Assim, as atribuições privativas são aquelas que se referem diretamente à profissão, como a atribuição privativa de coordenar cursos, bem como equipes de Serviço Social nas instituições públicas e privadas. E competênciassão aquelas ações que os(as) assistentes podem desenvolver, embora não lhes sejam exclusivas. Entretanto, a aplicação da lei de regulamentação — a partir das experiências de fiscalização realizadas pelos Cress — mostrou que há algumas repetições do que se lista como atribuições privativas no artigo que trata das competências. Por isso, o citado parecer de Terra (2000) entende que quando há essas repetições no item competências, elas são entendidas automaticamente como atribuições privativas. Sabendo ainda que sejam necessárias as regulamentações profissionais, o reconhecimento da relevância de uma profissão vem da capacidade de resposta de seus(suas) próprios(as) profissionais. Esse reconhecimento o Serviço Social conseguiu rapidamente, uma vez que o processo de profissionalização foi rápido, pois duas décadas após a fundação da primeira escola já havia a lei de regulamentação da profissão (Lei n. 3.252/1957), sendo que mais à frente foi promulgado o Decreto n. 994/1962, que complementou a primeira regulamentação, instituindo o Conselho Federal e os conselhos regionais da profissão. Afinal, se reconhecemos que o Serviço Social, como todas as outras, é uma profissão inserida na divisão social e técnica do trabalho (Iamamoto, 1992), possui, consequentemente, uma particularidade no campo do trabalho coletivo. Sabe se, por outro lado, o quanto a divisão entre as profissões (e ocupações) é resultado da forma alienada de como o trabalho se dá na sociedade capitalista. Portanto, uma profissão se legitima a partir das respostas que consegue emitir para 9 usuários(as) dos seus serviços e para seus(suas) contratantes. E estas — as respostas — podem ser maiores ou menores, dependendo da competência do coletivo profissional. No caso do Serviço Social, tal debate não pode ser realizado sem a clareza dos distintos interesses que envolvem o contratador do trabalho profissional e a população usuária dos seus serviços. Para uma reflexão sobre as atribuições privativas e competências profissionais, faz-se importante, portanto, uma reflexão a respeito do “chão” em que se dá o exercício profissional. 2.2 O “Chão” do Exercício Profissional: A Vida cotidiana num Contexto de Regressão de Direitos da Classe Trabalhadora Figura 3 O “chão” do exercício profissional, para o qual queremos chamar a atenção, é primeiramente aquele onde se dá todo o agir histórico: o cotidiano. Afinal, a vida cotidiana é insuprimível e existe em todas as sociabilidades humanas. A outra 10 característica do “chão” que queremos ressaltar é a forma como os direitos da classe trabalhadora vêm sendo tratados, tema fundamental para assistentes sociais, uma vez que atendem à classe trabalhadora ao mesmo tempo que fazem parte dela. Se a vida cotidiana é insuprimível, certamente ganha contornos próprios diante da alienação na sociedade de classes. 2.1.1 Vida Cotidiana e Valores O cotidiano faz parte da vida. Em todos os momentos históricos os homens vivem no cotidiano. É quando damos respostas para as questões que emergem no dia a dia, seja na esfera privada, profissional, no âmbito do lazer, do descanso etc. Lidamos com muitas informações e, pela agilidade, — diga-se de passagem, cada vez mais requerida nesse trato —, pouco paramos para refletir sobre o que pensamos, falamos e fazemos. O fato de que todas as suas capacidades se coloquem em funcionamento determina também, naturalmente, que nenhuma delas possa realizar-se, nem de longe em toda sua intensidade. O homem da cotidianidade é atuante e fruidor, ativo e receptivo, mas não tem nem tempo nem possibilidade de se absorver inteiramente em nenhum desses aspectos; por isso, não pode aguçá-los em toda intensidade. (Heller, 1992, p. 17-18) As características do cotidiano são: a heterogeneidade (o desenvolvimento de diferentes ações simultaneamente, ainda que haja uma hierarquia entre elas; por exemplo, na sociedade de classes o trabalho alienado é a principal atividade), a imediaticidade (uma relação automática entre o pensamento e a ação) e a superficialidade extensiva (uma vez que há o desenvolvimento simultâneo de diferentes ações, o indivíduo domina apenas superficialmente a realidade e os conhecimentos que mobiliza) (Netto, 2000). Se o cotidianoé insuprímivel, também é importante dizer que nem por isso é necessariamente sempre alienador, pois se vivêssemos em outra ordem societária, com valores emancipatórios hegemônicos, daríamos respostas mais qualificadas, ainda que imediatas, e manejando conhecimentos distintos ao mesmo tempo. No cotidiano, o indivíduo vive o mundo a partir do “eu”. Somente quando ele supera essa singularidade pode ter acesso à consciência humano-genérica. 11 Para isso, tem que suspender a heterogeneidade da vida cotidiana (processo esse entendido como homogeneização do ser singular em direção ao humano- genérico). E as formas privilegiadas para suspensão são: • O trabalho criador, • A arte, • A ciência, • A ética. Não tem como o indivíduo ficar permanentemente “suspenso”, mas, ao voltar ao cotidiano, ele o percebe de forma diferente. Diversas pesquisas têm mostrado que os(as) assistentes sociais afirmam seu compromisso com a democracia, com os direitos e com o projeto ético-político do Serviço Social. Também nas provas de concurso ou seleção pública para empregos, as questões referentes ao Código de Éticado(a) Assistente Social não costumam ter problemas para ser respondidas corretamente por profissionais da área. Assim, partir da constatação de que tanto verbalizam como sabem teoricamente sobre quais são os princípios do projeto profissional. Mas será que realmente internalizaram seus valores? É preciso ter claro que a categoria de assistentes sociais não está imune ao caldo conservador da sociedade brasileira. Mas se opta por valores conservadores — ainda que discordemos —, essa tem que ser uma escolha consciente, e não como vem se dando na maioria das vezes, como um “autoengano”. O “autoengano” referido se dá pelo discurso de que “o que penso e faço como profissional pode ser distinto do que penso e faço fora do trabalho”. É como se houvesse uma “muralha chinesa”: ao chegar ao trabalho, dou um“stop” nos meus valores e, ao colocar o crachá, o jaleco ou um uniforme, ou mesmo ao bater o ponto, “plim!”, tenho em mim os valores do projeto ético-político. Isso é impossível, pois as ações desenvolvidas no cotidiano formam um continuum. Afinal, “não sou um(a) em casa e outro(a) no trabalho”. Trago em mim valores, e esses são fortes. São como bússolas para a imediaticidade do cotidiano. Não paro para pensar, nem ligo para o Cress frente a uma situação que necessita de uma resposta profissional imediata: faço, mesmo que depois não o fizesse com a mesma intenção. O cotidiano é o espaço das respostas imediatas em todas as esferas da nossa sociabilidade, inclusive as relativas ao trabalho. Logo, se estivermos mais qualificados(as), daremos, no trabalho, respostas melhores. 12 Se efetivamente internalizarmos os valores do projeto ético-político, que são emancipatórios, daremos respostas emancipatórias para a “dureza” do dia a dia — que naturaliza a desigualdade social, estimula o preconceito, desqualifica os indivíduos fora do padrão dominante etc. —, tanto no trabalho como nas outras esferas da sociabilidade. 2.3 Destituição de Direitos da Classe Trabalhadora e Contrarreforma nas Políticas Sociais Figura 4 Desde o primeiro governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB) até o governo atual do PT, o Brasil cumpre um conjunto de medidas preconizadas pelo Banco Mundial, dentre as quais destacamos: a contrarreforma da previdência do(a) trabalhador(a) regido(a) pela Consolidação das Leis Trabalhistas(CLT) no governo de FHC; a contrarreforma do servidor público, regido pelo Regime Jurídico Único (RJU) no início do primeiro governo Lula; a publicação das Medidas Provisórias ns. 664 e 665, que afetam tanto trabalhadores(as) regidos(as) pela CLT, como o servidor público, regido pelo RJU; os avanços — tanto nos governos do PSDB como nos do PT — nos processos de privatização do público; por fim, a desregulamentação dos direitos trabalhistas por meio do projeto de terceirização. 13 Sobre a privatização do espaço público, o projeto mais “imponente” é a proposta da criação de fundações públicas de direito privado. Essa iniciativa propõe que o poder público institua fundações estatais com personalidade jurídica de direito privado em diferentes áreas consideradas de atividade estatal, mas não exclusivas do Estado. A proposta da criação das fundações parte do principal argumento para a “reforma” do Estado apregoada pelo governo do PSDB e revisitada pelo governo do PT, que é a ineficácia do Estado, sendo razões centrais para isso a estabilidade de servidores(as) públicos(as), a burocracia, que dificultaria a agilidade na gestão — tanto para compra de insumos e materiais, como para poder demitir funcionários(as) — e a necessidade de um melhor gerenciamento. Segundo Granemann (2011), existem várias questões problemáticas nessa proposição, como: • A contratação de servidores(as) seria por meio de concurso, mas via CLT, e não mais pelo RJU, consagrado como o modelo único de contratação para os(as) servidores(as), pela Constituição Federal de 1988; • Não está ainda devidamente claro, mas supõe-se que a remuneração dos(as) trabalhadores(as) estará subordinada ao contrato de gestão que cada fundação firmar com o Estado e com agentes do mercado; • Cada fundação terá seu próprio plano de carreira, emprego e salários. Isso, consequentemente, fragilizará a organização dos(as) trabalhadores(as); • As fundações receberiam subsídios públicos, mas não contribuiriam para a formação do fundo público; • O controle social se tornará inexistente, com a criação de conselhos “moldados nas grandes empresas capitalistas, inclusive ao usar terminologias ali nascidas e aplicadas”, como “conselho curador, diretoria executiva, conselho fiscal e conselho consultivo social”, sendo que se cita “sociedade civil” apenas na composição do conselho consultivo social. Na mesma linha do projeto de fundação cabe ainda destacar a criação, no último dia do segundo mandato de Lula, da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), que, apesar de diversas manifestações contrárias por parte dos segmentos universitários, tem avançado em muitas universidades. A Ebserh se constitui também numa empresa pública de direito privado (nos moldes das fundações estatais de direito privado), vinculada ao Ministério da Educação, com a “missão” de reestruturar os hospitais universitários que hoje 14 integram o maior complexo hospitalar do Brasil, pois são 47 hospitais, distribuídos em 33 universidades federais do país (Correia, 2014). Sobre a desregulamentação dos direitos trabalhistas, a ofensiva atual em curso é o Projeto de Lei n. 4.330, conhecido como projeto da terceirização, que pretende regulamentar a terceirização nas atividades-fim, uma vez que hoje formalmente só estão garantidas para as atividades- meio. Dados coligidos pela revista Carta Capital indicam que o salário de terceirizados(as) é 24% menor que de empregados(as) formais; que terceirizados(as) trabalham, em média, três horas a mais; que sofrem mais acidentes de trabalho — por exemplo, na Petrobras, mais de 80% dos(as) trabalhadores(as) mortos(as) em serviço entre 1995 e 2013 eram subcontratados(as); e que estão mais sujeitos(as) aos mecanismos que tentam burlar os direitos trabalhistas, pois, entre 2010 e 2014, cerca de 90% dos(as) trabalhadores(as) resgatados(as) nos dez maiores flagrantes de trabalho escravo eram terceirizados(as). Conforme Correia (2008 e 2010), todas essas medidas não estão sendo realizadas aleatoriamente. Numa leitura rápida dos documentos do Banco Mundial, identifica-se — e os documentos são cristalinos — que tais ações dosgovernos brasileiros respondem a um conjunto de prescrições para países como o Brasil. O afrontamento dos direitos da classe trabalhadora se espalha em diferentes nuances. Assistentes sociais, profissionais historicamente com inserção na esfera estatal — mas não somente —, vêm tendo suas condições de trabalho afetadas, com a redução de recursos e “enxugamento” das políticas sociais, mas vêm também sofrendo “na carne” esse afrontamento. Tem crescido o número de profissionais contratados(as) por frágeis vínculos — como RPA (Recibo de Pagamento Autônomo) —, como também tem ocorrido em diferentes municípios, em especial nos estados do Centro-Oeste e em Minas Gerais, a contratação de assistentes sociais por pregão, em que, por meio do oferecimento do menor preço (leia-se menor salário), assistentes sociais (e não apenas esses) são “contratados(as)”. Na esfera fora do Estado, também tem se intensificado a exploração da força de trabalho de assistentes sociais. Empresas que, a partir dos anos 1990, diminuíram ou fecharam os setores de Serviço Social, têm “reabsorvido” o trabalho de assistentes sociais por meio de duas estratégias: uma pela contratação de empresas de “consultoria” de Serviço Social, que, sem vínculo com o empregador, atendem 15 aos(às) seus(suas) trabalhadores(as); outra por meio do atendimento via call center, em que os(as) trabalhadores(as) das empresas ligam para um número telefônico e são atendidos(as) e orientados(as) por um(a) profissional de Serviço Social que não conhecem, e este(a) também não conhece o cotidiano do local de trabalho de onde fala esse(a) trabalhador(a) (Botão, 2015). A discussão que aqui se faz sobre o trabalho profissional, por outro lado, não se descola da formação profissional. Assim, devem considerar as seguintes constatações e inquietações: • O quadro do aligeiramento da formação profissional em todos os níveis da formação, especialmente na graduação e no mestrado (importante para a formação de professores(as) para a área de Serviço Social). Para onde vão a pesquisa e a extensão. • Tão importantes para o projeto de formação profissional expresso nas diretrizes curriculares da Abepss — nessa rapidez? • O fato de a formação em Serviço Social ter se constituído como nicho de mercado, refletindo, principalmente, na expansão da modalidade do ensino a distância enquanto expressão máxima da precarização do ensino superior, pois essa realidade impõe limites à formação profissional. Como ensinar sem o debate cotidiano emsala de aula? Como formar alunos(as) críticos(as) sem o movimento estudantil? Como assegurar as competências teórico-metodológicas de modo consistente com o recurso a apostilas, em detrimento dos livros? Como garantir campos de estágio em conformidade com nossas normativas sobre a supervisão direta com elevado número de matrículas? o avanço da contrarreforma do Estado e da reestruturação produtiva na década atual do século XXI tem “aprimorado” as suas ações, apresentando significativas consequências para a classe trabalhadora, como aquelas aqui tratadas, com impacto direto para o trabalho de assistentes sociais. 16 • Por último, mas não menos importante, o panorama da expansão do ensino superior público, que vem sendo materializada sem a infraestrutura física e de pessoal e com projetos pedagógicos, reduzindo-se, muitas vezes, apenas ao ensino. Tais inquietações evidenciam, portanto, que as condições de reprodução desse perfil profissional encontram-se também impactadas pelo conjunto de contrarreformas aludidas, em decorrência de que é preciso reconhecer e enfrentar as dificuldades reais postas por esse mesmo “chão” ao projeto profissional. 17 3. ATRIBUIÇÕES PRIVATIVAS E COMPETÊNCIAS PROFISSIONAIS Estandonítido que o quadro em que exercem o Serviço Social hoje é bastante desafiador, considerando, por outro lado, que o acúmulo dos debates coletivos em torno das atribuições privativas e competências profissionais nos parece um bom arsenal para encará-lo. Ou seja, se não temos dúvida sobre o que dizer das nossas atribuições privativas, é necessário que se afirme que isso é uma conquista da organização política da profissão desde as suas origens, mesmo que com perspectivas políticas distintas. Ainda que não tenham dúvida, tal ponto não é necessariamente um bálsamo perfeito. Por isso, temos que ficar atentos(as) para a importância da garantia do direito à existência de profissões regulamentadas. Ademais, o status de profissão liberal nos possibilita organizá-la por meio do conselho profissional. Assim, essa defesa deve ser permanente. Mas, com certeza, o que precisa ser discutido hoje de forma mais urgente é: que competências profissionais temos?Quais podemos afirmar? O ponto de partida para essa reflexão é a clareza da função social da profissão: o seu trato com as diferentes expressões da questão social. Aqui então se desconhecem todas as possibilidades fora desse circuito, como o Serviço Social clínico, que psicologia a desigualdade social. Não podemos também ficar reféns de uma visão generalista da questão social, razão pela qual se fala em expressões, as quais se materializam em diferentes demandas (aparentes e não aparentes) no multifacetado universo dos serviços sociais organizados segundo a setorialidade das políticas sociais que fragmentam a questão social. Esses serviços, por sua vez, engendram processos coletivos de trabalho que, nem por isso, deixam de requerer competências profissionais particulares, lembrando que entendemos que o trabalho coletivo expressa uma busca de resposta às necessidades dos(as) usuários(as). Cabe lembrar que esse movimento é contraditório: ao mesmo tempo que pode descaracterizar nossas atribuições privativas, pode também apresentar novas e importantes demandas para a profissão. Essa contradição sublinha a importância de não perdermos de vista a função social da profissão, para oferecer respostas qualificadas e posicionadas a esse contexto, 18 mas também sem “engessarmos” o trabalho, por não conseguirmos captar o movimento tendencial das demandas a ele colocadas. A resposta a essas demandas, por parte de assistentes sociais, está posta no campo das suas possíveis competências; logo, essa ação não lhes éexclusiva. Ser competente aqui é articular a dimensão ético-política, teórico- -metodológica e técnico- operativa. Competência, nos moldes aqui tratados, não é mérito individual, e sim resultado de um projeto que se constrói coletivamente nos serviços, que se retroalimenta da produção intelectual da profissão e da sua organização político- profissional. Assim, a responsabilidade não pode repousar exclusivamente em profissionais nos diferentes serviços dos “quatro cantos” do país. A universidade, por meio da extensão, da pesquisa e do conhecimento que daí gera, tem um papel fundamental. As entidades da categoria, como a Abepss e o Conjunto CFESS-Cress, também contribuem para a qualificação da formação e na luta pelas garantia das condições éticas e técnicas do trabalho profissional. A defesa das prerrogativas profissionais e o debate sobre o fato de outras profissões e/ou ocupações estarem, em tese, assumindo o que era historicamente realizado pelo Serviço Social, avançará, sim, com um posicionamento dos órgãos de fiscalização da profissão. Mas a realidade não se restringe apenas às normas e às leis: é na prática que se materializa o que é, legitimamente, campo de intervenção de uma profissão. Assim, também a ação crítica e consciente de profissionaisé fundamental. Reconhecendo isso é que o Conjunto CFESS-Cress vem desenvolvendo ações afirmativas no sentido de demarcar as atribuições privativas e competências profissionais, bem como atividades de formação que buscam refletir sobre a potencialização da profissão e do trabalho de seus(suas) profissionais. • No eixo das ações afirmativas das atribuições privativas e competências profissionais, gostaríamos de destacar algumas ações desenvolvidas pelo CFESS: a Política Nacional de Fiscalização, elaborada em 1996 e revista em 2007, que se estrutura em três dimensões: afirmativa de princípios e compromissos históricos; político-pedagógica; e normativo- -disciplinadora. Essa concepção de fiscalização não está preocupada com a dimensão punitiva, e sim com a educativa. Sendo assim, contribui para a defesa das atribuições privativas e, especialmente, para a materialização das competências profissionais, uma vez que busca aprimorar o trabalho profissional de assistentes sociais; 19 • A campanha em defesa do concurso público para assistentes sociais em diferentes espaços sócio-ocupacionais. Entendemos que a defesa do concurso faculta experiências profissionais com maior possibilidade de autonomia profissional, pois o locus do exercício profissional se dá, possivelmente, longe do clientelismo, protecionismo e mandonismo, que ainda caracterizam muitas das ocupações dos postos de trabalho; • A participação em diversos espaços sobre a gestão do trabalho, com destaque para o Fórum Nacional de Trabalhadores e Trabalhadoras do Sistema Único de Assistência Social (FNTSUAS) • Em que temos acompanhado de perto a regulamentação das ocupações previstas na legislação em vigor • E para o Fórum das Entidades Nacionais de Trabalhadores da Área da Saúde (Fentas), com destaque para a Resolução n. 383/1999, que caracteriza o(a) assistente social como profissional da saúde. Nesses fóruns, num diálogo permanente com representantes de outras profissões, vamos demarcando as particularidades do Serviço Social na divisão social e técnica do trabalho; • As publicações de diversas resoluções do CFESS, que orientam e disciplinam o exercício da profissão. Algumas das mais importantes nesse sentido são: a Resolução n. 493/2006 (referente às condições técnicas e éticas de trabalho), a Resolução n. 533/2008 (que regulamenta a supervisão direta de estágio no Serviço Social); a Resolução n. 556/2009 (que se refere aos procedimentos para efeito da lacração do material técnico sigiloso do Serviço Social); a Resolução n. 557/2009 (que dispõe sobre a emissão de pareceres, laudo, opiniões técnicas conjuntos entre o(a) assistente social e outros(as) profissionais); e a Resolução n. 569/2010 (que trata sobre a vedação da realização de terapias associadas ao título e/ou ao exercício profissional do(a) assistente social); • A elaboração de documentos que se constituem em subsídios para o trabalho profissional, como os parâmetros de atuação na política de saúde (CFESS, 2010) e na de assistência social (CFESS, 2011), bemcomo os subsídios para atuação na área da educação (CFESS, 2013) e para o trabalho no sociojurídico (CFESS, 2014b). Esses documentos partem de uma concepção ampla de Serviço Social, ou seja, não reduzem a intervenção profissional ao trato direto com usuários(as) • Ainda que seja essa a maior frente de trabalho e não menos importante, 20 • E, por isso, apontam competências profissionais na esfera da gestão dos serviços e na formulação da política, na assessoria, na mobilização popular, no planejamento, nos espaços de controle social etc. Esses documentos avançam no delineamento das competências profissionais, de forma objetiva e com clara direção ético-política e teórico-metodológica. Posicionam-se contrariamente a um conjunto de solicitações equivocadas, dirigidas a profissionais de Serviço Social e muitas vezes restritivas de sua autonomia técnica. Durante muito tempo, foi lugar-comum dizer que assistentes sociais sabiam dizer o que não era sua competência, mas não sabiam informar quais eram. Entendemos que a reafirmação desse tipo de frase hoje é um equívoco, pois a produção do conhecimento e, especialmente, os documentos aqui citados, sem esquematismos e reducionismos, se constituem em referências sobre o que compete a profissionais de Serviço Social. Embora eles não abarquem a totalidade dos espaços ocupacionais em que a profissão tem sido convocada a intervir, estamos cientes de que alcançam os mais significativos e expressivos segmentos do mercado de trabalho brasileiro. Além das ações que acabamos de tratar, gostaríamos de destacar também um conjunto de atividades/reflexões que o CFESS vem desenvolvendo sobre as competências e atribuições profissionais. É, em sua maioria, atividades de formação teórica, ética, política etc., que constroem um acúmulo para ações futuras. Assim, gostaríamos de chamar atenção para: — a promoção de seminários nacionais e outros eventos, de acesso gratuito, com transmissão on-line e publicação dos textos, problematizando temas relevantes para a profissão. No ano de 2015, por exemplo, o Conjunto CFESS-Cress promoveu o seminário “ServiçoSocial e diversidade trans: exercício profissional, orientação sexual e identidade de gênero em debate”, a partir de uma série de demandas que estavam chegando sobre o posicionamento de assistentes sociais no atendimento a pessoas trans, especialmente referentes à atual normatização do processo transexualizador no Sistema Único de Saúde (SUS). As discussões desse seminário atualmente alimentam o Conjunto CFESS- Cress no processo de estudo com vista à publicação de uma possível resolução sobre o tema do exercício profissional que se realiza nesse âmbito; • A realização de campanhas nacionais que, ao questionarem valores da moralidade conservadora da sociedade brasileira, impactam também os sujeitos da profissão. Assim, as campanhas realizadas — combate ao racismo; 21 • Pela liberdade de orientação e expressão sexual; • Em defesa do trabalho e dos direitos humanos — são convites ético-políticos à categoria profissional. Fazem-nos refletir sobre nossas atribuições e competências e sobre o seu potencial enquanto luta pelos direitos humanos; • À edição, há mais de uma década, do curso Ética para Agentes Multiplicadores (as), do Projeto Ética em Movimento do CFESS, que anualmente capacita um(a) representante de cada Cress do país e este(a) reproduz a capacitação em seu estado. • O curso — composto pelos conteúdos “Ética e sociedade”, “Ética e práxis profissional”, “Ética e direitos humanos” e “Ética e instrumentos processuais” — vem se mostrando uma estratégia importante para a internalização dos valores do atual Código de Ética junto a parcelas significativas da categoria de assistentes sociais; — o investimento na comunicação, entendendo-a tanto como peça importante na socialização do conhecimento para a categoria, quanto também como disputa pela hegemonia dos meios de comunicação. Assim, a Política Nacional de Comunicação do Conjunto CFESS- -Cress vem sendo uma ação estratégia de fortalecimento das ações previstas pelo CFESS; — a clareza sobre os limites dos espaços de controle social (notadamente os conselhos de direitos e de política e as conferências), mas, ao mesmo tempo, o entendimento de que podem ainda ser espaços de luta e construção de consciência crítica. Por isso, temos uma atuação crítica no Conselho Nacional de Saúde (CNS) — e em suas diversas comissões, em especial na Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), e atualmente no intenso debate para a criação de uma resolução específica para a pesquisa no campo das ciências humanas e sociais —, no Conselho Nacionaldos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), em especial nesse momento, acompanhando todos os debates sobre a tentativa de redução da maioridade penal e fazendo incidência, com o movimento social da área, contra a proposta desse projeto de lei no Legislativo; no Conselho Nacional dos Direitos do Idoso (CNDI) e no Conselho Nacional de Combate à Discriminação e Promoção dos Direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (CNCD/LGBT); Ao mesmo tempo que o CFESS está nos espaços institucionais de participação, temos clareza da importância de se fortalecer a organização da sociedade civil. Política se faz na rua. Por isso, também estãonesses espaço e gostaríam de ressaltar a inserção no Fórum Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (FNDCA), Fórum Nacional de Assistência Social (FNAS), Fórum 22 Nacional pela Reforma Urbana (FNRU) e na Frente Nacional contra a Privatização da Saúde. 3.1 Mediações Constitutivas das Atribuições, Demandas e Requisições Figura 5 A mediação da Política Social não é circunstancial ao Serviço Social, como poderia ser para outros profissionais: é para executá-las que a profissão recebe um mandato sócioinstitucional. Não casual o fato de que a profissão cresce na medida em que as instituições sociais se colocam aptas para atender as novas necessidades de controle da força de trabalho ocupada e excedente. A maneira particular de como esse controle será realizada, tem a ver com as conjunturas, mas é da estrutura do Estado burguês, como uma estrutura de comando do capital (Mészáros, 2002) que o faz buscar estratégias que lhe permitam operar com a gestão da força de trabalho visando atacar os problemas do capitalismo em duas frentes: aumento da taxa de lucro e contenção do sub-consumo. 23 O resultado é que, cada vez mais, as políticas sociais vão se tornando funcionais às formas de enfrentamento da crise do capital. Nesta pesquisa partimos da concepção de que as atribuições, demandas e requisições da profissão indicam a sua natureza, seu lugar na divisão social e técnica do trabalho, sua funcionalidade ao Estado e suas estratégias de responder à crise do capital. Indicam, ainda, a configuração do mercado de trabalho profissional, a peculiar maneira de inserção da profissão nos serviços, o perfil esperado, conhecimentos, habilidades, valores que estão sendo requeridos a estes profissionais. Para responder as demandas que chegam é necessário que o profissional corresponda a um determinado perfil. Tal perfil é formado e forjado tanto na formação profissional quanto no e pelo mercado de trabalho. Esse perfil recebe os influxos das transformações societárias, oriundas da reestruturação produtiva, do tipo de Estado e de suas formas de intervenção para o enfrentamento da chamada “questão social”, da sociabilidade que se conforme no espírito desse tempo histórico. Assim como Amaral e Mota (1998, p.26) considerando que, desvelar as demandas é “condição para apreender as mediações que vinculam as ‘reais necessidades’” dos processos sociais da sociedade burguesa constituída com as exigências colocadas pelo mercado de trabalho profissional”, para o que é importante, “refazer - teórica e metodologicamente – o caminho entre a demanda e as suas necessidades fundantes (idem, ibidem)”. Nessa direção, pretende-se desenvolver duas ordens de questões: 1) A primeira, refere-se às questões conceituais. Interessa apresentar as diversas definições que os termos vêm recebendo na literatura do Serviço Social. Parte-se de definições etimológicas para captar os diferentes significados e usos na bibliografia da profissão. A importância dessa explicitação remete diretamente à questão da interpretação que o assistente social faz de si e da profissão, dado que ela conduz o profissional a experiências empíricas que se expressam nas respostas profissionais; 2) A segunda, pretende-se apresentar asrequisições descritas, identificadas pelos autores da produção consultada, que se realizam nas políticas de Saúde, Assistência Social e Previdência. 24 3.2 Definição dos Termos 3.2.1. Atribuições Dentre seus significados etimológicos, o conceito atribuição indica ato ou ação de um sujeito sobre outro no sentido de concessão, outorgamento, faculdade ou mesmo reconhecimento, sendo atribuição o ato de imputar algo a alguém. É utilizado, ainda, como competência, prerrogativa, responsabilidade de determinada autoridade, responsabilidade própria de um trabalho, cargo, função ou oficio; competência de uma atividade profissional. Como verbo pronominal, a palavra é utilizada no sentido de arrogar-se, delegar-se. Apesar de seus vários significados, a bibliografia da profissão quando aborda a questão das atribuições não a determina como atribuição profissional e utilizam, indiscriminadamente, os termos atribuição, atribuições profissionais e atribuições profissionais especificas e/ou privativas, nesse caso, sempre reputando à Lei de Regulamentação e poucas vezes ela vem seguida do substantivo profissional. Tem, encontrado sua utilização como algo delegado por outrem. Há casos de uma profunda identificação das atribuições, com um rol de atividades a serem realizadas, instrumentos e, até mesmo sua identificação direta com os objetivos profissionais. Tal indefinição do conceito atribuição leva a que atividades parecidas ou idênticas sejam designadas, ora como atribuições ora como requisições, o que demonstra imprecisão. Nesse sentido, algumas questões foram levantadas: De onde vem essa dificuldade de adotar uma clara concepção de atribuição? Da realidade ou do conceito? O que determina e quem determina as atribuições? Na abordagem a estas questões há que se considerar que na mediação do assalariamento, na compra e venda da força de trabalho das/os assistentes sociais, na inserção dos assistentes sociais na esfera dos serviços, reside uma tensão entre o que a instituição atribui e o que a categoria profissional considera ser atribuições profissionais, donde a tensão entre (no mínimo) duas fontes diferentes das quais emanam as atribuições: a da instituição e a da categoria. Não obstante a falta de determinação e imprecisões observadas, a nosso ver, as atribuições privativas são as funções que essa profissão desempenha no escopo da divisãosocial e técnica do trabalho. 25 Daí ser algo privativo, o caráter privativo relativo às atribuições de uma profissão não significa reserva de mercado. Sua observação não depende, apenas, da definição da própria categoria, mas não deixa de ter a sua interferência. Melhor dizendo, as atribuições privativas expressam o perfil de profissional que se encontra no mercado de trabalho, para o qual a formação profissional é central, pois sua função precípua é preparar seus profissionais para o desempenho dessas atribuições privativas. Isso significa buscar quais os conhecimentos necessários que habilitam essa profissão. Em que medida a formação tem permitido desenvolver habilidades necessárias às atribuições privativas? 3.2.2. Requisições Requisição é uma palavra originária do latim requisitio, de requirire que significa requerimento, solicitação ou pedido. Ação, ato ou efeito de requisitar; sinônimo de pedido e também utilizada no sentido de uma exigência legal: fazer requisição de material ou de reclamação. Na linguagem jurídica, requisitar é requerer com autoridade ou exigir. Nesse sentido a requisição é a exigência legal, emanada de autoridade competente para que se cumpra se preste ou se faça o que esta sendo ordenado. A requisição pode ser direcionada à prestação de um serviço, entrega decoisas ou comparecimento de pessoas. Nessa direção, questionamos: A requisição é sempre institucionalizada? Ela emana sempre da instituição? Pode ser acolhida ou não? A requisição é o que a instituição já estabelece para o assistente social. Está definida nas normas, nos manuais? Podem considerar que existam requisições distintas para o assistente social, para a Política, para os Programas, para os Serviços? O material indica que, embora sejam mencionadas requisições distintas para sujeitos distintos às vezes elas coincidem, causando a aparência de que se trata de uma requisição única. 3.2.3. Demandas No sentido etimológico, demanda significa procura. Trata-se de ação, ato ou efeito de buscar. Também possui sua particular utilização jurídica como processo e/ou a ação judicial: demanda judicial. Sinônimo de luta; ação de combater ou confrontar. 26 Reivindicação: ação de exigir, reivindicar, de demandar esforços para recuperar algo que pertence a outra pessoa. Podemos agrupar os diversos significados etimológicos da palavra demanda quatro eixos: 1) Solicitação de algo, especialmente quando se considera um direito, 2) Pergunta que se faz a uma pessoa, 3) Quantidade de mercadorias ou serviços que os consumidores pedem e estão dispostos a comprar, oferta de produtos, 4) Documento através do qual se empreende uma ação judicial contra uma pessoa ou entidade para reclamar algo. O material analisado nos leva a considerar que chegam para assistentes sociais: a) Diferentes tipos de demandas, a depender da região, subpolítica, do programa, da instituição/unidade, do campo/área, etc.); b) Demandas espontâneas (especialmente na política e nos equipamentos da Assistência); c) Demandas Imediatas; d) Demandas “Indevidas” (Formulação Pouco Clara); e) Demandas Secundarias; f) Demandas Reprimidas. Tais Terminologias Utilizadas Para Acusar As Diferentes Modalidades De Demandas Não Explicitam A Que Efetivamente Se Referem. Nota-Se Que O Material Aludido Nem Sempre Considera A Existência De Demandas Divergentes Ou Antagônicas Que Emanam Das Necessidades Das Classes Sociais. As Demandas Sociais São Produzidas Por Necessidades Sociais Que Plasmam O Processo De Reprodução Social Da Sociedade Capitalista, Historicamente Colocadas Por Interesses Antagônicos Das Classes Sociais. Em Guerra Temos Que “As demandas das classes sociais põem e repõem objetos para o Serviço Social. Estes encontram-se inscritos nas condições sociais das classes e por isso são, de um lado, históricos, transitórios, encerram continuidades e rupturas e, de outro, ou não extrapolam o limite material ou mantêm-se no nível das necessidades imediatas. Tais demandas convertemse em requisições profissionais, cujo atendimento requer a mobilização de um determinado nível de racionalidade, de uma parte; limitam e determinam as funções profissionais, de outra. (1995, p.199-200- grifos da autora)” 27 Considerando que as necessidades antagônicas das classes sociais se convertem em demandas a todas as profissões. As instituições sociais recolhem tais demandas e as enquadram aos seus objetivos e finalidades configurando demandas institucionais que chegam aos profissionais como .requisições técnico-operativas que, através do mercado de trabalho, incorporam as exigências dos sujeitos demandantes. Em outros termos, elas comportam uma verdadeira ‘teleologia’ dos requisitantes a respeito das modalidades de atendimento de suas necessidades. Por isso mesmo, a identificação das demandas não encerra o desvelamento das reais necessidades que as determinam (Amaral e Mota, 1998, p. 25). Dado que tal movimento vela e revela ao mesmo tempo os interesses introjetados nas demandas, é preciso analisá-lo à luz da teoria social de Marx, visando captar as mediações que conectam as dimensões universais às singularidades da profissão. Mas não e só isso, há ainda a questão de como o assistente social interpreta a demanda, as mediações que aí se colocam e a resposta emitida. Em Guerra temos que: O debate sobre demandas e a forma de responder a elas nos encaminha para a questão das competências profissionais. “Ao encontrar o seu âmbito de ação delimitado, tanto pelas condições acima apontadas quanto por outras determinações peculiares aos setores nos quais atua, o assistente social acaba por reduzir sua intervenção ao atendimento imediato da demanda, para o que aciona níveis de racionalidade os mais elementares possíveis, mas que lhe permitem responder às necessidades prático-materiais do cotidiano profissional, limitadas ao nível do empírico. (op. cit. os grifos são nossos)”. 28 3.2.3 Competências Competência é o substantivo feminino originado do latim competere que significa uma aptidão para cumprir alguma tarefa ou função. Sinônimo de conhecimento ou âmbito de jurisdição. Significa, ainda, aptidão,conhecimento ou capacidade em alguma área específica; atributo legal de um juiz ou funcionário que revela a sua capacidade de julgar uma determinada causa; faculdade para apreciar e resolver qualquer assunto, estar capacitado para realizar algo. A análise da Lei de Regulamentação da profissão, que se constitui no estatuto jurídico que dispõe sobre as atribuições privativas e competências dos assistentes sociais, indica atribuição privativa como “prerrogativas exclusivas” da prática profissional dos assistentes sociais e competência como “capacidade para apreciar ou dar resolutividade a determinado assunto, não sendo exclusivas de uma única especialidade profissional, mas a ela concernentes em função da capacitação dos sujeitos profissionais” (Iamamoto, In: CFESS, 2012, p. 37). São competências do assistente social, que a Lei de Regulamentação reconhece: implementar, planejar e avaliar políticas sociais. Mais uma vez se coloca a mediação da política, donde a importância de se problematizar o modelo de política social que se configura como espaço sócio-profissional dos assistentes sociais. Cabe lembrar que por toda a trajetória dessa profissão construímos competências as quais são legalmente designadas aos assistentes sociais, constantes da lei que regulamenta a profissão, atualmente pela lei 8662/93. Concebemos que competência e habilidade são dois conceitos que estão relacionados. A habilidade é conseguir pôr em prática as teorias e conceitos que foram adquiridos, enquanto a competência é mais ampla e consiste na articulação entre conhecimentos, atitudes e habilidades. Cabe, ainda, uma problematização que toca a todos os conceitos e em suas expressões empíricas. É preciso identificar as fontes de legitimidade das quais as demandas, requisições, atribuições emanam. Dado que a sociedade burguesa se funda no antagonismo de interesses das classes fundamentais, tais interesses contraditórios às vezes se confrontam também com os interesses do Estado burguês, “como uma precondição essencial para a subsequente articulação de todo conjunto“ (Meszáros, 2011a, 108-9), função fundamental na garantia da reprodução social do sistema. 29 Na fase atual do capitalismo, o Estado participa ativamente do processo de valorização do valor, ou seja, de acumulação do capital. Ao mesmo tempo em que investe em mecanismos de controle daordem social, via instituições e mecanismos repressivos, investe em programas focalistas de redução de danos, chamados de programas de “transferência de renda” na direção de controle da pobreza que se alastra tendo em vista a crise e queda na taxa de lucro do capital. Disso decorre também que as instituições jurídico-políticas não apenas mantêm asformas sociais da ordem burguesa, como também acirram as formas repressivas que o momento econômico-politico exige. Com isso é preciso identificar que a configuração atual das políticas sociais como espaço sócio-ocupacional engendra demandas, requisições, atribuições direcionadas pela lógica da repressão? Os que planejam e propõem as políticas, planejam e propõem um perfil de profissional e/ou determinam um conjunto de atribuições profissionais? Se se considera o termo demanda no seu sentido de litígio, o caminho da demanda não atendida é a sua judicialização? O que se tem feito na direção da coletivização da demanda? 30 4. ANÁLISE DAS EXPRESSÕES EMPÍRICAS DAS ATRIBUIÇÕES, DEMANDAS E REQUISIÇÕES CAPTADAS NAS FONTES CONSULTADAS A análise provisória do material resultado de comunicações em eventos, teses e dissertações que focam a política de seguridade social demonstra que as atribuições, demandas, requisições se repetem nas várias políticas e nas várias regiões do país, de modo que não se identificam diferenças entre as regiões, exceção feita apenas para projetos desenvolvidos em regiões de fronteira. Percebe-se, ainda, que grande parte das demandas reconhecidas pelos profissionais são convertidas em demandas institucionais. Entretanto, aparece como demanda que merece ser problematizada: “atendimento de encaminhamento de outros profissionais que não conseguem resolver ou não tem tempo de fazê-lo”. No que se refere à natureza da demanda, chama-nos a atenção na área da Saúde para o fato de que todas as atribuições reconhecidas pelo profissional como tal (ou atividades reconhecidas como suas) se voltam para a adesão do paciente e/ou de sua família (cuidador) ao tratamento, desocupação do leito, orientação e ou informação à família ou ao paciente sobre o tratamento e, consequentemente, sobre seus direitos. Nota-se, aqui, que os diretos do paciente são restritos e ou consequência de sua adesão ao tratamento. Cabe observar que a mesma tendência da política de Saúde comparece na política de Assistência Social quanto ao atendimento individualizado dos sujeitos e das famílias. Espera-se do assistente social que seja capaz de escutar, ouvir, para estabelecer um clima de aceitação recíproca bem como de proporcionar uma “integração” do usuário no contexto sócio-institucional, no qual sua demanda será, em tese, atendida. Não casual que uma das atribuições dos profissionais é a “escuta ativa ou qualificada”, termo que comparece na formulação de ambformulação de ambas as políticas, na atualidade, como ferramenta ou estratégia de gestão. Exemplar aqui é o “acolhimento” que se torna uma tecnologia relacional para garantir consenso. Outra constatação refere-se ao fato de que há uma introjeção imediata de objetivos institucionais resignificadoscomo objetivos profissionais, o que leva, em muitos casos, a que muitos profissionais reconheçam o objeto da instituição como idêntico ao da profissão. Em geral, parece haver uma desconsideração da mediação das instituições enquanto lócus do trabalho profissional, sua dinâmica e estruturas burocráticas e, ao 31 fazê-lo, o material demonstra que o profissional indica um “dever ser” profissional sem referência ao seu “ser” institucional concreto” (WEISSHAUPT, 1985). Por fim, uma tendência histórica que é de tributar o reconhecimento profissional a utilização de técnicas e ao domínio do instrumental técnico-operativo. Nessa perspectiva, a legitimidade profissional seria dada pelo domínio do instrumental, fazendo valer a profissão a partir da aplicação da técnica dirigida aos objetivos da instituição. O resultado está na capacidade de resolver as situações pontuais e focalizadas nas “problemáticas individuais” dos usuários. Aqui, há que se problematizar o significado de funções históricas assumidas na reprodução social de indivíduos e famílias e da classe trabalhadora como um todo, da reprodução da ideologia burguesa (normas e critérios da instituição e da política/programas) e o compromisso com o atendimento das demandas do capital, mediatizadas pelo Estado e pelas políticas/programas institucionais, que transformam trabalhadores em vulneráveis. É preciso levar em consideração o perfil sócio-técnico reforçado aí. Em vários trabalhos encontramos, no discurso dos profissionais, a queixa da distancia entre o que se problematiza na academia e o trabalho profissional, em muitos casos recaindo na crítica da suposta “dicotomia entre teoria e prática”. Há uma tendência, presente nas pesquisas, de o assistente social apenas reconhecer como algo próprio da profissão as atividades diretas com os usuários (famílias, grupos, comunidades, movimentos sociais): • Viabilizar acesso, • Orientar, • Realizar reuniões, • Visitas, • Encaminhamentos, • Entrevista, • Atendimento de plantão, • Acolhimento, em detrimento das atividades de gestão. Assim, atribuições que não estejam vinculadas ao atendimento dos usuários, tais como: • Coordenar, • Planejar, • Administrar, 32 • Organizar, • Gerir e formular políticas, nem sempre são assumidas pelos profissionais como suas atribuições. Pouca menção se faz as atribuições voltadas para ações de educação ou organização popular. Outra ausência sempre sentida é a de não reconhecimento das atividades de pesquisa como atribuição, mantendo a concepção equivocada de quepesquisa é uma atribuição restrita à academia. Portanto, o quetornou evidente até o momento é que muitas vezes a preocupação com as atribuições, requisições, demandas (privativas, sociais e políticas, institucionais), com o que se faz ou com o que fazer, remete para a questão do porque e do para que fazer. Se o assistente social não se pergunta sistematicamente pelos objetivos profissionais, das classes sociais, distinguindo-os dos institucionais, não consegue perceber que os objetivos explicitam intencionalidades. Se isso não ocorre, os objetivos aparecem como universais, indiferenciados, inespecíficos sob a aparente neutralidade, e podem considerar que é legitimo que todos os agentes possam formular objetivos e que estes levariam, necessariamente, ao mesmo resultado. Chama-se, aqui, a atenção ao principio do compromisso com a competência e com os reais interesses dos usuários, como parte do nosso Código de Ética Profissional. 33 CONSIDERAÇÕES FINAIS Então até o momento o tema abordado históricas preocupações da profissão, num outro cenário sócio-histórico, o que exige tratá-los na sua historicidade, ou seja, no movimento de continuidades e rupturas. Tem observado, portanto, é a manutenção de tendências históricas na profissão, algumas delas redimensionadas e/ou metamorfoseadas, reposta no “espírito do tempo” da contemporaneidade, dentre as quais salientam o retorno às praticas disciplinares de maneira naturalizad. A profissão reaparece no desempenho de uma função histórica de “tecnologia de organização do cotidiano como manipulação planejada” (NETTO, 1992, p.92). Daí a aparência fluida, sem definição, das requisições profissionais. Já observam em outro lugar (Guerra, 1995) que esta indefinição não está na profissão, mas “localiza-se na natureza das demandas geradas no confronto das classes sociais antagônicas que passa a se constituir nas requisições institucionais que historicamente convocam a profissão, atribuindo-lhe um caráter difuso que passa como incognoscível” (1995, p.33), Além disso, assim como as demandas sociais, as demandas institucionais são de classe e, portanto, permeadas por interesses divergentes, embora apareçampara os indivíduos como iguais. Ao não distinguir entre objetivos, demandas, requisições impostas das assumidas conscientemente, o assistente social corre o risco de ver cancelada/comprometida a sua autonomia relativa. A aparente inespecificidade operatória da profissão, que não a diferencia de práticas leigas,voluntárias e filantrópicas; sua polivalência (que lhe valeu ampliar suas funções e ocupar espaços emergentes) a tendência a incorporar tudo àquilo que outros profissionais não fazem, põe o nosso exercício profissional conectado e em sintonia com a tendência à desespecialização, desprofissionalização, dessubjetivação. Elas requisitam procedimentos instrumentais operatórios, padronizados à luz da racionalidade formal-abstrata, conectados com o que vem previamente estabelecido pela instituição, pelos programas e projetos, pela política social. Assim, a racionalidade formal-abstrata orienta as respostas profissionais, sendo essa uma das mediações que se interpõem entre as demandas e respostas profissionais. O que 34 pode ser considerado novo no contexto atual é que, incidindo sobre a intervenção profissional, tais políticas, cujo modelo é o de gestão de riscos sociais, não apenas criam demandas, mas formatam as respostas, padronizando-as em normas operacionais, legislações e procedimentos prévios já elencados no interior das próprias políticas, oferecendo ao assistente social um repertório de técnicas e instrumentos voltados para o controle da população, concebida como vulnerável. Tem se observado a ampliação de competências direcionada para o controle do social, que se realiza sutilmente pela via das políticas sociais. Fica evidente que ao Serviço Social como objeto de sua própria pesquisa faltam análises dos processos sociais à luz da teoria social marxiana. Considera-se, portanto que a pesquisa que de conta das condições e relações de trabalho e das mediações que explicam as demandas, atribuições e requisições sócio-profissionais e políticas constitui-se em requisito essencial e caminho fecundo para qualificar a formação e o trabalho profissional. 35 REFERÊNCIAS AMARAL, A. S. do e MOTA, A. E.. Reestruturação do capital, fragmentação do trabalho e serviço social. In: MOTA, A. E. (org.). A nova fábrica de consensos. São Paulo: Cortez, 1998. AMORIM, Andrêssa Gomes Carvalho de. O serviço social e a institucionalização das demandas sociais: um estudo a partir das necessidades sociais no capitalismo. Programa de Pós-Graduação em Serviço Social - UFAL: Maceió, 2010. Dissertação de mestrado). BOTÃO, Márcia. Serviço Social e consultoria empresarial: uma possibilidade de intervenção crítica? Dissertação (Doutorado em Serviço Social) — Universidade do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2015. CFESS. 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