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58 6 ABORDAGEM DA APRENDIZAGEM E TEORIA SOCIOCOGNITIVA DE BANDURA Pensar sobre como se dá a aprendizagem dos seres humanos vem sendo um desafio para os mais diversos pesquisadores (LUÍS; ROLDÃO, 2016). Psicologia, 59 pedagogia, neurologia e biologia são apenas algumas áreas que já propuseram modelos teóricos sobre como os seres humanos pegam estímulos de seu ambiente, processam internamente e transformam essas experiências em ferramentas a serem utilizadas em outras situações. Assim, podemos compreender que o conceito de aprendizagem não é simples, nem concreto e, muito menos, consensual (SANTROCK, 2009). Entre os diversos modelos teóricos que se formaram, as abordagens sociocognitiva de Bandura (2006) e a teoria cognitivo-comportamental de Beck (1997) são as mais utilizadas por educadores e profissionais que trabalham com educação, principalmente por abarcarem uma complexidade suficiente para que boas estratégias possam ser pensadas a serem utilizadas nas salas de aula para incrementar o processo de aquisição de conhecimentos dos alunos. As abordagens cognitivo-comportamentais partem do princípio do condicionamento operante de Skinner (1954), mas inserem o campo cognitivo (pensamento, raciocínio, expectativas sociais) como um fator importante no aumento ou na diminuição dos comportamentos desejados. Assim, as abordagens cognitivo- comportamentais objetivam a mudança comportamental, fazendo com que o indivíduo monitore, maneje e regule seu próprio comportamento em vez de deixar que seja controlado por fatores externos (BECK, 1997). Santrock (2009) esclarece que as abordagens cognitivo-comportamentais se originaram da psicologia cognitiva, que enfatiza os efeitos dos pensamentos sobre o comportamento, e do behaviorismo, que enfatiza as técnicas de mudança do comportamento. As abordagens cognitivo- comportamentais procuram mudar conceitos errôneos, fortalecer habilidades de enfrentamento, aumentar seu autocontrole e estimular a autorreflexão construtiva (WATSON; THARP, 2007). Métodos auto instrucionais são técnicas cognitivo- comportamentais voltadas para ensinar os indivíduos a modificarem seu comportamento. Os métodos auto instrucionais ajudam as pessoas a alterarem o que dizem para si mesmas. Entre as estratégias cognitivo-comportamentais que os estudantes podem utilizar para autorregular seus comportamentos, chamamos a atenção para as estratégias de auto-fala. Meichenbaum, Turk e Burstein (1975) citam alguns pontos dessa estratégia, que ajudam alunos e educadores a lidarem com mais eficiência em situações de estresse: a) Estar preparado para a ansiedade ou o estresse: “o que preciso fazer? ”; 60 “vou desenvolver um plano para lidar com isso”; “vou simplesmente pensar sobre o que preciso fazer”; “não vou me preocupar”; “ficar preocupado não ajuda em nada”; “tenho várias estratégias diferentes que posso usar”. b) Confrontar ou lidar com ansiedade ou estresse: “posso encarar o desafio”; “vou continuar no ritmo um passo por vez”; “dou conta disso”; “vou relaxar, respirar fundo e usar uma das estratégias”; “não vou pensar sobre meu estresse”; “só́ vou pensar sobre o que tenho de fazer” c) Lidar com sentimentos nos momentos críticos: “o que é isso que tenho de fazer? ”; “eu sabia que minha ansiedade poderia aumentar”; “só́ tenho de manter a mim mesmo sob controle”; “quando a ansiedade chegar, irei apenas fazer uma pausa e continuar me concentrando no que preciso realizar”. d) Use autoafirmação es reforçadoras: “ótimo, consegui”; “dei conta do recado”; “eu sabia que conseguiria”; “espere até́ eu contar para os outros como fiz! ”. Santrock (2009) comenta que, em muitas situações, a estratégia é substituir autoafirmações negativas por positivas. Por exemplo, uma estudante pode dizer para si mesma: “não vou conseguir nunca terminar esse trabalho para amanhã”. Isso pode ser substituído por auto-fala positiva, como: “vai ser difícil, mas acho que consigo terminar”, ou “vou encarar isso como um desafio e não como um estresse”, ou ainda “se eu trabalhar realmente duro, posso conseguir terminar”. A abordagem cognitivo-comportamental sustenta que falar de maneira positiva consigo mesmo ajuda educadores e estudantes a atingirem todo o seu potencial (WATSON; THARP, 2007). Pensamentos negativos acabam virando uma profecia realizada. Você acha que não consegue fazer e, então, não consegue. Se o diálogo interior negativo é um problema para você̂, pergunte-se ocasionalmente ao longo do dia: “o que estou dizendo para mim mesmo neste momento? ”. Momentos que você̂ acredita que serão potencialmente estressantes são ocasiões excelentes para examinar seu auto-fala. Monitore, também, a auto-fala de seus alunos. Se você̂ ouvir alunos dizendo “não consigo fazer isso” ou “sou tão lerdo que nunca vou conseguir terminar isso”, dedique algum tempo para ajudá-los a substituírem o diálogo interior negativo por um positivo. Devido a isso, muitos cognitivistas comportamentais 61 recomendam que os estudantes melhorem seu desempenho por meio do monitoramento do próprio comportamento (ROCK, 2005). Isso pode requerer que os estudantes mantenham gráficos ou registros de seu próprio comportamento. A teoria sociocognitiva de Albert Bandura estabelece que os fatores sociais e cognitivos, assim como o comportamento verificável e privado, desempenham funções importantes na aprendizagem. Santrock (2009) explica que os fatores cognitivos podem envolver as expectativas de sucesso dos estudantes. Os fatores sociais podem incluir a observação, por parte dos estudantes, do comportamento de realização de seus pais. Devido ao seu aporte teórico e, também, por englobar as diferentes dimensões do ser humano (relações com seu comportamento, pensamento e pressões sociais), a teoria sociocognitiva se tornou uma fonte cada vez mais importante de conhecimento teórico para os educadores e facilita a criação de diversas aplicações para sala de aula (CHOI, 2005). Bandura (2006) é o principal arquiteto da teoria sociocognitiva. Ele diz que, quando os estudantes aprendem, podem representar ou transformar cognitivamente suas experiências. Assim como no condicionamento operante de Skinner (1954), as relações na teoria sociocognitiva somente ocorrem entre eventos ambientais e comportamento. O modelo desenvolvido por Bandura (2006) é embasado no pensamento de determinismo recíproco, ou seja, as interações entre indivíduo e ambiente determinarão quais serão as atitudes, os pensamentos e as consequências futuras. Os pensadores que seguem a ideia de determinismo não entendem que seja possível prever o que acontecerá futuramente, pois as variações de combinações entre comportamento e respostas ambientais são demasiadamente grandes para se fazer uma estimativa minimamente válida. Mesmo assim, esses pensadores entendem que todos os comportamentos e pensamentos derivam de interações comportamentais passadas. Dessa forma, não existiria livre-arbítrio real ou escolhas ao acaso — tudo é determinado pelas trocas entre comportamentos e reforços ou punições ambientais que aumentam ou diminuem a frequência desse comportamento. O determinismo recíproco de Bandura (2006) consiste em três fatores principais: comportamento, cognição e ambiente — que podem interagir entre si para influenciar a aprendizagem. Essa influência se dá no comportamento humano, assim como o comportamento também o afeta o ambiente, formando uma intrínseca rede de troca entre indivíduo e meio, que vai formando os padrões comportamentais e 62 psicológicos de cada um. Os pensadores discordam sobre a utilização da palavra “cognição” por Bandura (2006). Santrock (2009) faz uma crítica ao conceito utilizado por Bandura, que usa a palavra “pessoa” ao invés de “cognição”. No entanto, Santrock (2009) entende que muitos dos fatores pessoais que ele descreve são cognitivos,sendo que os que não tem um viés cognitivo são, principalmente, traços de personalidade e temperamento. Tais fatores podem incluir ser introvertidos ou extrovertidos, ativo ou inativo, calmo ou ansioso e amável ou hostil. Fatores cognitivos incluem expectativas, crenças, atitudes, estratégias, raciocínio, pensamento e inteligência. Bandura (2006) estruturou sua teoria sociocognitiva, por meio dessa rede intrincada de influências que sobrepõem umas sobre as outras. Santrock (2009) utiliza um exemplo para ilustrar como se dá a aprendizagem de estudantes pelo viés da teoria sociocognitiva: a) Cognição influencia comportamento — o estudante desenvolve estratégias cognitivas para pensar de maneira mais profunda e lógica sobre como resolver problemas. A estratégia cognitiva melhora seu comportamento de aquisição. b) Comportamento influencia cognição — o estudo (comportamento) do estudante fez com que ele tirasse boas notas, o que, por sua vez, produz expectativas positivas sobre suas capacidades e lhe proporciona autoconfiança e auto eficácia (cognição). c) Ambiente influencia comportamento — o colégio ao qual o estudante está vinculado desenvolveu um programa de habilidades de estudo para ajudar os estudantes a aprenderem como fazer anotações, gerenciar seu tempo e realizar provas com mais eficiência. O programa de habilidades de estudo melhora o comportamento de aquisição do estudante. d) Comportamento influencia ambiente — o programa de habilidades de estudo melhora o comportamento de aquisição de muitos alunos da classe do estudante. A melhora no comportamento de aquisição dos alunos estimula a escola a expandir o programa para que todos os estudantes do ensino médio possam participar. e) Cognição influencia ambiente — as expectativas e o planejamento dos 63 profissionais que trabalham o ensino sobre seu estudante foi o que propiciou a criação do programa de habilidades. Dessa forma, podemos ver que os modos como os profissionais e estudantes percebem o seu entorno pode facilitar ou dificultar a apreensão dos conteúdos. Se um estudante considera que a escola só serve para “prendê-lo” ou não tem auto eficácia suficiente para acreditar que pode aprender as matérias, é mais fácil que ele tenha maior dificuldade, realmente, na hora de estudar, o mesmo que ocorre com os profissionais do ensino (SATROCK, 2009). f) Ambiente influencia cognição — o colégio utiliza seus recursos para montar uma biblioteca à qual os estudantes e pais podem ter acesso a diferentes livros e formas de aprofundar seus conhecimentos. Esse centro de recursos também oferece serviços de tutoria de estudos aos estudantes, que, junto com seus cuidadores, aproveitam os recursos do centro e as tutorias. Esses recursos e serviços melhoram as habilidades de raciocínio do estudante. Vemos que a principal diferença entre o modelo sociocognitivo de Bandura (2006) e o modelo comportamental de Skinner (1954) está no fato de Bandura (2006) considerar a cognição como um pilar que influencia tanto o ambiente como o comportamento de forma equivalente a esses dois planos. Esse novo eixo de influência permite com que a teoria sociocognitiva acesse uma complexidade superior nos estudos da aprendizagem. A cognição se torna passível de estudo, e é preciso que os pesquisadores a entendam para poder melhorar suas capacidades de ensinar. Porém, o fator pessoal/cognitivo que Bandura (2006) mais enfatizou nos últimos anos foi a autoeficácia, a crença de que uma pessoa consegue dominar uma situação e produzir resultados positivos. Bandura diz que a autoeficácia tem influência poderosa sobre o comportamento (SANTROCK, 2009). Podemos observar que tanto a abordagem sociocognitiva quanto a cognitivo- comportamental têm a cognição como um dos pilares fundamentais, por onde estruturar-se-ão todas as estratégias. Não por acaso essas são as duas abordagens mais utilizadas atualmente dentro das instituições de ensino (CHOI, 2005). Dessa forma, percebemos que não há como pensarmos o processo de aquisição de informações sem levarmos em conta a forma como os alunos formulam seu pensamento, como este é regulado pelas expectativas sociais e como seus 64 comportamentos influenciam as expectativas que a sociedade terá sobre determinado estudante e como isso impactará seus pensamentos sobre si mesmo e sobre suas capacidades (autoeficácia). 6.1 Aprendizagem por observação, monitoramento e autorregulação A aprendizagem por observação é uma forma de aquisição de conhecimentos que envolve adquirir habilidades, estratégias e crenças ao observar outros indivíduos realizando ações semelhantes e as consequências que essas atitudes tiveram (SANTROCK, 2009). Bandura (2006) explica que a aprendizagem por observação envolve a imitação, mas não está́ limitada a ela. O que é tipicamente aprendido não é uma cópia completa do modelo observado, mas uma forma geral ou estratégia que o observador aplica de maneira criativa, adicionando ou retirando etapas de acordo com suas vivências. A capacidade de aprender padrões de comportamento por meio da observação elimina a necessidade de aprendizagem por tentativa e erro, pois essa é muito mais difícil e demorada para dar algum resultado efetivo. Assim, na maioria das ocasiões, a aprendizagem por observação exige menos tempo do que o condicionamento operante. Desde seus primeiros experimentos, Bandura (1986) se concentrou na exploração de processos específicos envolvidos na aprendizagem por observação, que incluem atenção, retenção, produção e motivação. Santrock (2009) explica um pouco mais sobre cada uma dessas etapas. a) Atenção — antes que qualquer indivíduo possa imitar as ações de um modelo, ele precisa prestar atenção no que este está fazendo ou dizendo. A atenção ao modelo é influenciada por diversas características. Os seres humanos estão mais propensos a prestarem atenção em modelos com status social/hierárquico mais elevado, sendo que, na maioria dos casos do ensino fundamental, os professores e educadores são modelo ótimos de aprendizagem por observação. b) Retenção — para reproduzir as ações do modelo, os indivíduos devem codificar a informação e armazená-la na memória para que possa ser recuperada. A retenção de informações dos estudantes pode ser aprimorada se os educadores usarem demonstrações vividas, lógicas e 65 claras do que querem ensinar, como exemplos contextualizados do cotidiano dos alunos. c) Produção — as crianças podem prestar atenção ao modelo e codificar na memória o que viram, mas, devido às limitações em sua capacidade motora, não são capazes de reproduzir o comportamento do modelo. Uma pessoa sem condicionamento físico, ao observar os movimentos de um nadador olímpico, certamente não conseguirá reproduzi-los fielmente sem um longo treino d) Motivação — frequentemente, as crianças prestam atenção no que o modelo diz ou faz, retém a informação na memória e têm as habilidades motoras para desempenhar a ação, mas não estão motivadas para desempenhar o comportamento do modelo. Quando os estudantes são punidos ao imitar o comportamento do modelo, este diminuirá sua ocorrência. Psicólogos educacionais defendem cada vez mais a importância da aprendizagem autorreguladora (SCHUNK; ZIMMERMAN, 2006), que consiste na autogeração e no automonitoramento dos pensamentos, sentimentos e comportamentos, a fim de atingir um objetivo, que pode ser acadêmico (melhorar a interpretação em leitura, escrever de maneira mais organizada, aprender a multiplicar, fazer perguntas relevantes) ou socioemocional (controlar a raiva, relacionar-se melhor com os colegas). Winne (2005) lista algumas características de alunos autorregulados: definem objetivos para ampliar seu conhecimento e manter sua motivação; conhecem seu perfil emocional e têm estratégias para controlar suas emoções; monitoram periodicamente seu progresso em relação a um objetivo; ajustam ou reveem suas estratégias com base no progresso que estão fazendo; avaliam os obstáculos que podem surgir e fazem as adaptações necessárias. 66 Entendemos como funciona o processo de aprendizagem por observação e quais os meios que podem influenciar para que esse comportamento não se mantenha, mas, também, existem diversas estratégias que podem incrementar a forma como esses comportamentos aparecerão — uma delas é o automonitoramento, que consiste em uma estratégia excelente para melhorar a aprendizagem, pois permite que você̂ ajude os estudantes a aprenderem a fazer com eficiência (WATSON; THARP, 2007). 6.2 Consequências das abordagens sociocognitivas É inegável que as abordagens sociocognitivas fizeram contribuições importantes para a educação em geral. Enquanto mantiveram o perfil cientifico dos behavioristas e a ênfase na observação cuidadosa, elas expandiram significativamente a ênfase da aprendizagem para incluir fatores sociocognitivos (SANTROCK, 2009). Uma aprendizagem considerável ocorre ao se observar e ouvir modelos competentes e, depois, imitar o que eles fazem. A ênfase da abordagem cognitivo-comportamental na auto-fala e na aprendizagem autorreguladora proporciona uma mudança importante da aprendizagem controlada pelos outros para a responsabilidade por sua própria aprendizagem (WATSON; THARP, 2007). Essas estratégias autorrealizáveis podem melhorar consideravelmente a aprendizagem do estudante. A teoria cognitivo-comportamental e a teoria sociocognitiva iniciaram dentro dos campos acadêmicos da psicologia, mas sua amplitude se deu de tal forma que se estendeu para diversos outros campos, como o direito, o esporte e a educação. Se pensarmos no modelo escolar antigo, no qual o educador ensinava de forma rígida e havia uma crença de que a hierarquia na qual o professor manda e os estudantes obedecem, havia a crença de que pudesse fazer com que as crianças aprendessem bem (LOURO, 2000). Além disso, o modelo anterior de escola não levava em conta as individualidades de cada estudante. Pelo contrário, as escolas pretendiam a homogeneização de todos os alunos para “facilitar” a aquisição dos conteúdos. Muitos estudantes foram preteridos e marginalizados devido a isso. Não entender que os estudantes não são iguais e não aprendem da mesma maneira fez com que o Brasil tivesse um aumento enorme da evasão escolar, que só foi estancada mediante
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