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JONATHAN FARIAS BASSUT SOUZA ROTAS BIOTECNOLÓGICAS PARA A SÍNTESE DE AMINAS QUIRAIS EM CONDIÇÕES DE FLUXO CONTÍNUO Rio de Janeiro 2018 JONATHAN FARIAS BASSUT SOUZA ROTAS BIOTECNOLÓGICAS PARA A SÍNTESE DE AMINAS QUIRAIS EM CONDIÇÕES DE FLUXO CONTÍNUO Tese de doutorado apresentada ao curso de Pós- graduação em Ciências Farmacêuticas, da Faculdade de Farmácia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial à obtenção do título de Doutor em Ciências Farmacêuticas. Orientador: Prof. Dr. Rodrigo Octavio Mendonça Alves de Souza Co-orientador(es): Prof. Dr. Carlos Alberto Mateus Afonso e Prof a . Dra. Ivana Correa Ramos Leal Colaborações internacionais: Prof. Dr. Uwe T. Bornscheuer Rio de Janeiro 2018 CIP - Catalogação na Publicação Elaborado pelo Sistema de Geração Automática da UFRJ com os dados fornecidos pelo(a) autor(a). S729r Souza, Jonathan Farias Bassut Rotas biotecnológicas para a síntese de aminas quirais em condições de fluxo contínuo / Jonathan Farias Bassut Souza. -- Rio de Janeiro, 2018. 165 f. Orientador: Rodrigo Octavio Mendonça Alves de Souza . Coorientadora: Ivana Correa Ramos Leal. Tese (doutorado) - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de Farmácia, Programa de Pós Graduação em Ciências Farmacêuticas, 2018. 1. Biocatálise. 2. Fluxo contínuo. 3. Aminas quirais. I. de Souza , Rodrigo Octavio Mendonça Alves, orient. II. Leal, Ivana Correa Ramos, coorient. III. Título. “As defesas de tese são tão assépticas! Tão puras e tão arrumadas. E ao mesmo tempo, tão distantes da realidade que as gerou! Elas não contam a história Dos fragorosos erros e geniais intuições Dos tropeções no escuro E do progresso sem método Dos inusitados acertos Ou do sofrimento e da vontade de desistir. Com início, meio e “happy end” As teses contam uma história que não ocorreu. As teses mentem” - Prof. Reinaldo Carvalho Silva AGRADECIMENTOS Para mim é extremamente difícil escrever essa seção de agradecimentos, pois mesmo que eu dedicasse páginas inteiras à cada pessoa citada abaixo, minhas palavras estariam muito aquém do sentimento de gratidão pela importância que elas tiveram na minha vida e direta ou indiretamente a este trabalho. Começo então agradecendo à minha mãe, Sonia Farias, por todo apoio e por ser meu maior exemplo de resiliência. Nos recorrentes dias em que as vicissitudes da vida me davam motivos para desistir, eu lembrava que minha mãe nunca desistiu e, se preciso, ela recomeçava de novo e de novo. E ao meu pai, Agenor Bassut, pelo apoio mesmo naquilo em que não podia entender, pelos conselhos, sermões, as lágrimas de orgulho que presenciei cair e aquelas caíram por tantos motivos e eu não estava lá para ver. Eu cheguei até aqui graças às décadas de sacrifícios e suor. E embora eu não possa trazer-lhes a juventude de volta, minha missão será sempre tentar construir uma sensação de que os tempos difíceis valeram a pena. Aos meus irmãos, Emerson, Thayane e Patrick, por todo apoio durante todos esses anos, pelo carinho e mútua admiração. Pelas diversas situações cotidianas que moldaram quem eu sou e construíram quem eu ainda quero ser. Pela compreensão com a minha ausência nas reuniões de família devido às responsabilidades do doutorado. E aos meus sobrinhos, Thayssa, Yago e Lara, por trazerem a esperança de que o futuro será melhor. À minha namorada Erika Ruggio, por todo amor, compreensão e cuidado. Pelo apoio e incentivo diários. Pelos ouvidos e abraços que fizeram da travessia desse turbulento período tão mais fácil. Ao meu orientador, Rodrigo Souza, pelo apoio desde o início dessa jornada. Por todas as portas abertas, pelas quais serei eternamente grato. Pela confiança que tornou esse trabalho possível mesmo com todos os obstáculos que se apresentaram. Tive muita sorte em ter iniciado minha vida acadêmica em um grupo de pesquisa de excelência como o BossGroup e só tenho a agradecer pela(s) oportunidade(s). Obrigado! À minha co-orientadora, Ivana Leal, por todo incentivo e pelas conversas e, principalmente, toda a paciência e por estar sempre tão disposta a ajudar, mesmo quando eu precisava de uma assinatura em cima da hora, o que acontecia praticamente uma vez por ano, geralmente em dezembro, às vezes durante o recesso. Muito obrigado! Ao meu co-orientador, Prof. Carlos Afonso, da Universidade de Lisboa, que me recebeu tão amistosamente durante minha curta estadia em Lisboa e teve grande contribuição a este trabalho. Espero que possamos trabalhar juntos novamente. Obrigado, Professor! Ao Prof. Uwe Bornscheuer pela parceria e a oportunidade de trabalhar no seu grupo de pesquisa durante minha breve estadia na Alemanha e por toda sua contribuição a este trabalho. Ao Prof. Ivaldo Jr., a quem tenho grande admiração, por toda a ajuda durante todos esses anos. A todos do BossGroup pela conversas, risadas e apoio. Foi um grande prazer estar esses 4 anos na companhia de vocês: Raquel Pinheiro e Stefânia Souza, obrigado pelo apoio, pelas conversas e por toda ajuda, paciência e até preocupação, durante todos esses anos. Anderson Aguillón, obrigado pelos bolos, pelas risadas, pelas ricas conversas, pelo podcast e por ser um ótimo relações públicas. Marcus Mattos, obrigado pelas longas conversas e pelo suporte no Brasil e na Alemanha. Marco Macena, obrigado pelas proveitosas discussões sobre qualquer coisa, pelas risadas e pela confiança em entrar em um carro que eu estou dirigindo (haha). Eloah Ávila, obrigado pelas risadas e toda a ajuda. E não posso deixar de mencionar os queridos Alexandre França (“Jonathan, espero não estar incomodando, mas...”), Viviane Marques, Renata Aguiar, Júlio César, Amanda Miranda, Mauro Gomes, Larissa Gotardo e Davi Nascimento. A Ayad Dawood, que teve direta e importante participação nesse trabalho, mas dificilmente lerá esse agradecimento. Em todo caso, vielen Dank für deine Mühe! Du hast dazu beigetragen, dass dieser Werk Echt ist. Viel glück und auf Wiedersehen! A todos os colegas do laboratório do Professor Carlos Afonso, em especial Angelo Rocha e Carlos Monteiro que fizeram valorosas contribuições a este trabalho. À Idima e Euclides, serei sempre grato a vocês por tudo que já fizeram por mim. Obrigado por todo apoio durante tantos anos. Aos amigos Allan Melo, Beatriz Oliveira, Carolina Damasceno, Karen Barbosa, Márcio Toledo, Mateus Oliveira, Thamires Cunha, Tháyna Sisnande, Thiago Tobias, Rayza Adrielle, Stephanie Bustamante e Úrsula Laino. O apoio de vocês foi de extrema importância durante a realização desse trabalho e para que eu conseguisse chegar até o final disso tudo. A amizade de vocês é uma das coisas que mais tenho orgulho. Obrigado! Aos amigos que, apesar de distantes, acompanharam toda essa trajetória diariamente e estavam sempre lá para apoiar, ouvir e aconselhar, fosse nos bons momentos, nos ruins e nos desenfreadamente desastrosos: Alex Marques, Amanda Menezes, André Anastácio, Caio Corrêa, Douglas Assis, Fabrícia Ribeiro, Felipe Antunes, Fernando Henrique, Helio Paiva Neto, Leandro Araújo, Marcella Abreu, Maria Elisa, Matthews Camargos, Murilo Franco, Osmar Golegã, Renato Jacques, Rodrigo Cantini, Shi Sagara, Stefhan Rafael, Tarsis Azevedo e Thiago Guariglia. Obrigado! À Alexandra Elbakyan, pela luta em prol da democratização do conhecimento. À minha banca de acompanhamento, Prof. Ivaldo Jr. (Novamente), Prof a . Gizela Dellamora (que tem me acompanhado desde o início da minha trajetória acadêmica) e à Prof. Melissa Estrada (que desde o meu mestrado faz tão valorosas contribuições ao meu trabalho). À banca por aceitar o convite na avaliação desde trabalho. À Capes e FAPERJ pelo apoio financeiro. RESUMO SOUZA,Jonathan Farias Bassut. Rotas biotecnológicas para a síntese de aminas quirais em condições de fluxo contínuo. Rio de Janeiro, 2018. Tese– Programa Pós- graduação em Ciências Farmacêuticas, Faculdade de Farmácia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2018. Neste trabalho foram investigadas diferentes rotas biocatalisadas para a síntese de aminas quirais enantiomericamente puras em condições de fluxo contínuo. Desse modo, na primeira seção, foram estabelecidas as condições adequadas para a síntese de biaril aminas através da combinação de uma reação de acoplamento de Suzuki- Miyaura, em batelada, com subsequente reação de transaminação biocatalisada em fluxo contínuo. Nesta seção, após triagem com diferentes ω-transaminases, a transaminase de A. fumigatus foi capaz de reconhecer biaril cetonas como substratos. Em seguida, diferentes soluções-tampão foram avaliados na reação de Suzuki- Miyaura, de modo que o meio da reação de acoplamento fosse compatível com a reação biocatalisada subsequente. Após estabelecidas as condições necessárias, as transaminases imobilizadas de A. fumigatus (4CHI) e uma variante descoberta por evolução direcionada (4CHI_I145A) foram utilizadas na obtenção de diversas biaril aminas quirais tanto em batelada quanto em condições semi-contínuas com conversões de até 80% em fluxo contínuo e até 99% em batelada. Na segunda seção desse trabalho, o uso polietilenoglicol (PEG) como agente acilante foi investigado na resolução cinética da (RS)-1-feniletilamina catalisada pela lipase de C. antarctica imobilizada em resina acrílica (N435) em fluxo contínuo. Assim, a (S)-1-feniletilamina foi obtida com 49% de rendimento e >99% de excesso enantiomérico. O biocatalisador N435 pôde ainda ser utilizado por 40 ciclos sem perda de atividade. Após o estudo de diferentes metodologias para a recuperação da amina de configuração (R), a hidrólise da amida formada com o PEG catalisada por solução ácida apresentou melhor resultado. A (R)-1-feniletilamina foi obtida com 34,9% de rendimento e 95% de excesso enantiomérico. Palavras-chave: biocatálise, fluxo contínuo, aminas quirais. ABSTRACT SOUZA, Jonathan Farias Bassut. Biotechnological routes for the synthesis of chiral amines in continuous flow conditions. Rio de Janeiro, 2018. Thesis – Pharmaceutical Sciences Postgraduate Program, Faculty of Pharmacy, Federal University of Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2018. In this work, different biocatalyzed routes were investigated for the synthesis of enantiomerically pure chiral amines under continuous flow conditions. Thus, in the first section, it was established the proper conditions for the synthesis of biaryl amines by combining a Suzuki-Miyaura cross-coupling reaction in batch with posterior biocatalyzed transamination reaction in continuous flow. In order to do this, after screening with different ω-transaminases, A. fumigatus transaminase were identified as capable of recognizing biaryl ketones as substrates. Then, different buffer solutions were evaluated in the Suzuki-Miyaura reaction, so that the coupling reaction medium was compatible with the subsequent biocatalyzed reaction. After establishment of the necessary conditions, immobilized A. fumigatus transaminase (4CHI) and a variant discovered by directed evolution (4CHI_I145A) were used for obtaining chiral biaryl amines both in batch and in semi-continuous conditions with conversions of up to 80% in continuous flow and up to 99% in batch. In the second section of this work, the use of polyethylene glycol (PEG) as the acylating agent were evaluated in the kinetic resolution of (RS)-1-phenylethylamine catalyzed by immobilized C. antarctica lipase (N435) under continuous flow conditions. Thus, (S)-1-phenylethylamine was obtained in 49% yield and >99% enantiomeric excess. The N435 biocatalyst could be used for 40 cycles without loss of activity. After investigation of different methodologies for recovering the (R)-amine, chemical hydrolysis of the PEGylated amine by acidic solution showed the best results. (R)-1- phenylethylamine was obtained in 34.9% yield and 95% enantiomeric excess. Keywords: Biocatalysis, Continuous Flow, Chiral amines. LISTA DE FIGURAS Figura 1. Estrutura de fármacos contendo amina quiral em sua estrutura. ................ 1 Figura 2. Esquema geral de sistemas de fluxo contínuo utilizados em diferentes processos biocatalisados. ........................................................................................... 4 Figura 3. Tempo de residência. ................................................................................. 5 Figura 4. Síntese de aminas quirais catalisada por ω-TAs realizadas pela empresa Celgene. ................................................................................................................... 16 Figura 5. Aminas obtidas com o sistema de reciclo do piruvato por uma aminoácido oxidase. .................................................................................................................... 21 Figura 6. Cromatograma extraído de uma das amostras da reação de síntese assimétrica catalisada por diferentes transaminases utilizando o sistema LDH/GDH e espectro de massa utilizado para a identificação dos compostos.. .......................... 51 Figura 7. Abordagens propostas para a síntese de biaril aminas através da combinação da reação de acoplamento de Suzuki-Miyaura e a transaminação biocatalisada. ............................................................................................................ 52 Figura 8. A) ácido 2-(ciclohexilamino)-etanosulfônico (CHES); B) complexação do paládio com a amina básica. .................................................................................... 56 Figura 9. Suporte EZIGtm ligado à enzima. .............................................................. 57 Figura 10. Substratos selecionados para síntese assimétrica. ................................ 58 Figura 11. Aminas produzidas através da reação de Suzuki seguida de trans- aminação biocatalisada em condições semi-contínuas. ........................................... 61 Figura 12. Cromatograma obtido após reação de síntese assimétrica de 1c biocatalisada em fluxo contínuo. Abaixo o espectro de massas identificando a obtenção do produto. ................................................................................................ 63 Figura 13. Comparação entre o t0 e a amostra após a reação de síntese assimétrica de 2c. ........................................................................................................................ 66 Figura 14. Representação gráfica da relação entre as frequências vibracionais da carbonila no espectro de infravermelho (barras) e a conversão (linha) na transaminação de arilalquil cetonas e piridilalquil cetonas catalisada por transaminases. ......................................................................................................... 68 Figura 15. Comparação entre o t0 e a amostra após a reação de síntese assimétrica de 3c. ........................................................................................................................ 69 Figura 16. Polietilenoglicol (PEG). ........................................................................... 71 Figura 17. Cromatograma da amina extraída após resolução cinética em fluxo contínuo. ................................................................................................................... 73 Figura 18. Métodos para a recuperação da amina de configuração (R) a partir do produto da reação entre a amina e o PEG. .............................................................. 75 Figura 19. Cromatograma após a tentativa de hidrólise catalisada por Novozyme 435 mostrando os dois picos referentes a (RS)-1-feniletilamina......................................75 Figura 20. Cromatograma após reação de etanólise em duas etapas catalisada por N435 em tolueno. ..................................................................................................... 76 Figura 21. Cromatograma da amina extraída após a hidrólise com solução ácida. . 78 LISTA DE ESQUEMAS Esquema 1. Estratégias para uso de TAs para a síntese de aminas enantio- mericamente puras. .................................................................................................... 9 Esquema 2. Primeira etapa do mecanismo da reação catalisada por transaminases. .................................................................................................................................. 10 Esquema 3. Segunda etapa do mecanismo da reação catalisada por transaminases. .................................................................................................................................. 11 Esquema 4. Esquema adaptado da reação realizada por Skalden et al. (2015). .... 13 Esquema 5. Síntese da sitagliptina por uma ω-TA mutante produzida por Jarvis et al. (2010) ....................................................................................................................... 15 Esquema 6. Síntese assimétrica de aminas propargílicas. ...................................... 17 Esquema 7. Síntese do intermediário da silodosina. ............................................... 17 Esquema 8. Síntese assimétrica do intermediário do ramatroban por Busto et al. (2014). ...................................................................................................................... 18 Esquema 9. Esquema da reação no modelo bifásico. ............................................. 20 Esquema 10. Síntese simultânea de (S)-aminoácidos e (R)-aminas com acoplamento de α- e ω-TAs. (A) sistema AlaTA/ω-TAs. (B) sistemas TyrTA/ω-TA e AspTA/ω-TAs. .................................................................................................................................. 22 Esquema 11. Reação entre a acetofenona e L-alanina catalisada por uma (S)-TA. 23 Esquema 12. Estratégias para o deslocamento do equilíbrio. ................................. 24 Esquema 13. Síntese quimio-enzimática do suvorexant com ciclização espontânea pós reação de transaminação................................................................................... 26 Esquema 14. Resolução cinética dinâmica de um derivado do 3-fenil-GABA ......... 26 Esquema 15. Síntese do inibidor da proteína smoothened através da resolução cinética dinâmica utilizando uma transaminase seguidas de etapas químicas......... 27 Esquema 16. Síntese quimio-enzimática da rivastigmina. ....................................... 27 Esquema 17. Reação de hidrólise catalisada por lipases ........................................ 29 Esquema 18. Mecanismo de reações catalisadas por lipases. ................................ 31 Esquema 19. Resolução cinética e dinâmica catalisada por lipases. ...................... 32 Esquema 20. Resolução cinética do intermediário do indinavir. .............................. 35 Esquema 21. Metodologias empregadas para o deslocamento do equilíbrio de reações de síntese assimétrica. ............................................................................... 48 Esquema 22. Reação de acoplamento de Suzuki-Miyaura em solução 50% DMF em água. ......................................................................................................................... 53 Esquema 23. Síntese da 1-(4-bifenilil)etilamina em condições semi-contínuas partindo da 4-bromoacetofenona. ............................................................................. 62 Esquema 24. Síntese da 1-(4’-fluoro-4-bifenilil)etilamina (F-1c) em condições semi- contínuas partindo da 4-bromoacetofenona (1a). ..................................................... 64 Esquema 25. Síntese da 1-(6-fenil-3-piridinil)etilamina (2c) em condições semi- contínuas partindo da 1-(5-bromopiridin-3-il)etanona (2a). ....................................... 65 Esquema 26. Síntese da 1-(6-fenil-3-piridinil)etilamina (3c) em condições semi- contínuas partindo da 1(6-bromopiridin-3-il)etanona (3a). ........................................ 67 Esquema 27. Resolução cinética da 1-feniletilamina usando PEG600 diéster como agente acilante ......................................................................................................... 72 Esquema 28. Hidrólise da amida (R)-2 catalisada por solução ácida. ..................... 77 LISTA DE TABELAS Tabela 1. Nomenclatura de reatores contínuos segundo seu volume de operação. .. 5 Tabela 2. Meia-vida de ω-TAs modificadas a diferentes temperaturas .................... 14 Tabela 3. (R)-Transaminases do kit ECS-ATA da Enzymicals ................................. 37 Tabela 4. Enzimas produzidas e imobilizadas pelo laboratório do professor Uwe T. Bornscheuer ............................................................................................................. 38 Tabela 5. Tabela com informações sobre os suportes usados. ............................... 39 Tabela 6. Transaminase expressas e imobilizadas em Greifswald (Alemanha)....... 39 Tabela 7. Resolução cinética da (RS)-1-feniletilamina por transaminases imobilizadas comerciais................................................................................................................. 47 Tabela 8. Reação de síntese assimétrica catalisada por diferentes transaminases utilizando isopropilamina como doador amino. ......................................................... 49 Tabela 9. Reação de acoplamento cruzado de Suzuki-Miyaura entre a 4-bromo- acetofenona e o ácido fenilborônico com diferentes bases e catalisadores. ............ 53 Tabela 10. Avaliação de diferentes soluções-tampão na reação de acoplamento de Suzuki-Miyaura ......................................................................................................... 54 Tabela 11. Avaliação de diferentes concentrações DMF na reação de acoplamento de Suzuki-Miyaura entre a 4’-bromoacetofenona e o ácido fenilborônico. .................... 56 Tabela 12. Conversão na síntese assimétrica de diferentes aminas utilizando transaminases liofilizadas e imobilizadas em diferentes suportes. ........................... 58 Tabela 13. Síntese da 1-(4-bifenilil)etanilamina (1c) em batelada. .......................... 64 Tabela 14. Síntese da 1-(6-fenil-3-piridinil)etilamina (3c) em batelada. ................... 66 Tabela 15. Comparação entre a síntese da 1-(6-fenil-3-piridinil)etilamina (3c) e 1-(4- bifenilil)etilamina (1c) em batelada. .......................................................................... 69 Tabela 16. Estabilidade do biocatalisador após 40 ciclos de reação ....................... 74 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS 4CHI – Transaminase de Aspegillus fumigatus 4CHI_I145A – Variante da transaminase de Aspegillus fumigatus AAO – aminoácido oxidase AcOEt – Acetato de etila ADH – Álcool desidrogenase ADN – Ácido desoxirribonucleico AlaDH – Alanina desidrogenase AlaTA – Alanina transaminase Asp – Aspartato AspTA – Aspartato transaminase CDCl3 – Clorofórmio deuterado CG-DIC – Cromatografia gasosa com detector por ionização de chamas CG-EM – Cromatografia gasosa acoplada à espectrômetria de massas CHES - Ácido 2-(ciclohexilamino)etanossulfônico DMF – dimetilformamida DMSO – sulfóxido de dimetila Dopa – L-3,4-diidroxifenilalanina EC – Enzyme commission number ee – Excesso enantiomérico epPCR – Reação em cadeia da polimerase propensa a erros FDH – Formato desidrogenase FP – (4R)-Fluoroprolina GABA – Ácido 4-aminobutanóico GDH – Glicose desidrogenase h – hora(s) HEPES - Ácido 4-(2-hidroxietil)-1-piperazinetanosulfônico His – Histidina Hz – Hertz IPTG - isopropil-3-D-tiogalactopiranosídeo LDH – Lactato desidrogenase m 3 – metro(s)cúbico MBTFA - N-metil-bis(trifluoroacetamida) MeOH – Metanol mg – miligrama min – minuto(s) mmol L -1 – milimol por litro mol L -1 – mol por litro MTBE – Éter metil terc-butílico MBTFA - N-metil-bis(trifluoroacetamida) N435 – Lipase de Candida antactica B imobilizada em resina acrílica comercializada pela Novozymes (Novozyme 435) NAD + – Dinucleotídeo de nicotinamida e adenina (forma oxidada) NADH – Dinucleotídeo de nicotinamida e adenina (forma reduzida) p/p – Peso/peso PEA – 1-feniletilamina PEG – Polietilenoglicol pH – Potencial hidrogeniônico PLP – Piridoxal fosfato PMP – Piridoxamina fosfato PVA – Álcool polivinílico RCD – Resolução cinética dinâmica RLF – Reator de leito fixo rpm – rotações por minuto Ser – Serina SMO – proteína smoothened TA – Transaminase TEA – Trietanolamina THF – Tetraidrofurano Tr – Tempo de residência TyrTA – Tirosina transaminase U g -1 – micromol de produto formado por minuto e por grama de biocatalisador U mL -1 – micromol de produto por minuto e mililitro do biocatalisador v/v – Volume/volume µm – Micrômetro ω-TA[(4R)-FP] – ω-transaminase incorporada com o aminoácido (4R)-Fluoroprolina. ω-TAdopa – ω-transaminase incorporada com o aminoácido L-3,4-diidroxifenilalanina. ω-TAdp[(4R)-FP] – ω-transaminase incorporada com o aminoácido (4R)-Fluoroprolina e L-3,4-diidroxifenilalanina. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO.......................................................................................... 1 1.1 Biocatálise em fluxo contínuo ........................................................ 3 1.2 Transaminases ................................................................................. 8 1.2.1 Mecanismo de reação. ................................................................... 9 1.2.2 Engenharia de proteínas na obtenção de novas transaminases.. 11 1.2.3 Transaminases na síntese de aminas quirais .............................. 15 1.2.4 Resolução cinética catalisada por transaminases ........................ 19 1.2.5 Síntese assimétrica catalisada por transaminases ...................... 22 1.2.6 Processos quimio-enzimáticos envolvendo transaminases. ........ 25 1.2.7 Transaminases em fluxo contínuo ............................................... 28 1.3 Lipases ........................................................................................... 29 1.3.1 Mecanismo de reações catalisadas por lipases ........................... 30 1.3.2 Resolução cinética catalisada por lipases para a produção de amina quirais enantiomericamente puras. .................................................................... 31 1.3.3 Lipases em fluxo contínuo............................................................ 33 2 OBJETIVO GERAL ................................................................................ 36 2.1 Objetivos específicos .................................................................... 36 3 MATERIAIS E MÉTODOS ...................................................................... 37 3.1 Reagentes....................................................................................... 37 3.2 Enzimas .......................................................................................... 37 3.2.1 Lipases ......................................................................................... 37 3.2.2 Transaminases comerciais........................................................... 37 3.2.3 Transaminases imobilizadas ........................................................ 38 3.2.4 Obtenção das transaminases de A. fumigatus e a variante 4CHI_I145A e imobilização. .............................................................................. 39 3.3 Métodos analíticos ........................................................................ 40 3.3.1 Cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de massa (UFRJ). .................................................................................................... 40 3.3.2 Cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de massa (Greifswald universität) ...................................................................................... 41 3.3.3 Cromatografia gasosa com detector por ionização de chamas (UFRJ) 41 3.3.4 Cromatografia gasosa com detector por ionização de chamas (ULisboa) 41 3.4 Equipamentos ................................................................................ 42 3.4.1 Sistemas de Fluxo contínuo (UFRJ) ............................................ 42 3.4.2 Ressonância magnética nuclear .................................................. 42 3.5 Condições reacionais .................................................................... 42 3.5.1 Teste de atividade de ω-transaminases comerciais. .................... 42 3.5.2 Síntese assimétrica usando isopropilamina como doador amino. 43 3.5.3 Síntese assimétrica usando um sistema de deslocamento de equilíbrio LDH/GDH. .......................................................................................... 43 3.5.4 Reações de acoplamento cruzado de Suzuki-Miyaura ................ 44 3.5.5 Síntese de biaril aminas em condições semi-contínuas ............... 44 3.5.6 Síntese do agente acilante PEG600 (dietil diéster) ........................ 45 3.5.7 Resolução cinética enzimática da (RS)-1-feniletilamina usando PEG600 (dietil diéster) como agente acilante em condições de fluxo continuo... 45 3.5.8 Hidrólise química para recuperação da (R)-1-feniletilamina......... 46 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO.............................................................. 47 4.1 Transaminases ............................................................................... 47 4.1.1 Avaliação da atividade de transaminases imobilizadas comerciais. ............................................................................................................................ 47 4.1.2 Avaliação das metodologias de deslocamento do equilíbrio para síntese assimétrica. ........................................................................................... 48 4.1.3 Avaliação das condições para síntese de biaril aminas por reação de acoplamento de Suzuki-Miyaura e transaminação biocatalisada em cascata em fluxo contínuo. ............................................................................................. 51 4.1.4 Síntese de biaril aminas por reação de acoplamento de Suzuki- Miyaura e transaminação biocatalisada em regime semi-contínuo. .................. 60 4.1.5 Conclusões parciais ..................................................................... 70 4.2 Lipase ............................................................................................. 71 4.2.1 Resolução cinética enzimática da (RS)-1-feniletilamina (PEA) catalisada por lipase usando PEG600-diéster como agente acilante em condições de fluxo contínuo. .............................................................................................. 71 4.2.2 Avaliação de metodologias para a recuperação da (R)-1- feniletilamina; ..................................................................................................... 74 5 CONCLUSÕES....................................................................................... 79 6 REFERÊNCIAS ...................................................................................... 81 ANEXOS ...................................................................................................... 101 1 1 INTRODUÇÃO Aminas quirais enantiomericamente puras são de grande importância para a indústria química e farmacêutica pois funcionam como blocos de construção para compostos bioativos, como por exemplo, para a rivastigmina, utilizada no tratamento da doença mal de Alzheimer e Parkinson, a sitagliptina, para tratamento da diabetes, e a tansulosina, indicada para o tratamento dos sintomas da hiperplasiaprostática benigna (figura 1). Esses compostos fazem parte de um mercado que movimenta bilhões de dólares todo ano (BRENNA et al., 2017; FUCHS et al., 2012, GHISLIERI; TURNER, 2014, HANSEN et al., 2009). Figura 1. Estrutura de fármacos contendo amina quiral em sua estrutura. Entre as metodologias não-enzimáticas mais comumente empregadas para a obtenção de aminas opticamente ativas, a resolução de aminas racêmicas pela adição de ácidos carboxílicos quirais é ainda a abordagem mais comum. Entretanto, a busca por agentes de resolução pode ser problemática, levando ao uso de uma solução de diversos ânions de ácidos carboxílicos (conhecida como dutch resolution), que tem como maior desvantagem a impossibilidade de reuso da solução. Outros métodos comuns são a aminação redutiva e a redução de iminas e enamidas, que têm cetonas como material de partida, mas tornam necessárias laboriosas etapas para obtenção do produto final. Além disso, a síntese dos substratos imina e enamida muitas vezes se mostra complicada (BREUER et al., 2004; GHISLIERI; TURNER, 2014; NUGENT; EL-SHAZLY, 2010). N N N N O NH2 F F F F3C Sitagliptina N ON O Rivastigmina MeO H N O EtO Tansulosina 2 Nesse contexto, a biocatálise se tornou uma importante ferramenta para a síntese dessas moléculas por apresentar diversas vantagens em relação aos métodos químicos tradicionais, como a facilidade de aplicação, o menor impacto ambiental, a alta seletividade das enzimas e a maior segurança do processo (HOLLMANN et al., 2011). Assim, diferentes enzimas têm sido empregadas para obtenção de aminas assimétricas enantiomericamente puras, entre elas, as lipases e as ω-transaminases (HÖHNE; BORNSCHEUER, 2009). Lipases são empregadas, principalmente, em reações de resolução cinética para separar os enantiomêros de um racemato, considerando que em uma resolução cinética ideal apenas um dos enantiômeros reage, enquanto o outro permanece inalterado. Desse modo, esse tipo de reação possui um rendimento máximo teórico de 50%, a menos que uma etapa de racemização do enantiômero não transformado seja incluída no processo. À reação de resolução cinética acoplada à etapa de racemização dá-se o nome de resolução cinética dinâmica (RCD) (ITABAIANA et al., 2013; DE SOUZA et al., 2015). Por outro lado, as transaminases produzem aminas quirais por meio de reações de transaminação, seja por resolução cinética ou desracemização, partindo da amina racêmica, ou por síntese assimétrica, partindo de uma cetona pró-quiral (HÖHNE; BORNSCHEUER, UWE T., 2012). Embora, o uso desses biocatalisadores possua diversas vantagens, algumas desvantagens ainda persistem e dificultam a aplicação industrial. Elas estão relacionadas com a baixa estabilidade térmica e operacional dos biocatalisadores, baixa tolerância a altas concentrações de solventes orgânicos, a pouca disponibilidade e baixa pureza das enzimas, impactando negativamente no custo. Assim, a imobilização da enzima é um método amplamente utilizado para o melhora- mento da estabilidade enzimática e para a recuperação do biocatalisador, sendo ambos fatores cruciais para a viabilidade econômica do processo. As vantagens da imobilização são ainda maiores quando esses biocatalisadores são utilizados em 3 regime contínuo (TRUPPO et al., 2012; TUFVESSON et al., 2015). Nos últimos anos, a tecnologia de fluxo contínuo tem recebido amplo reconhecimento como uma interessante ferramenta para a produção de fármacos e agroquímicos nos moldes do que foi estabelecido como química verde. Desde 2007, quando o Green Chemistry Institute, parte da American Chemical Society, classificou o processamento por fluxo contínuo como uma área primária para as atividades de pesquisa na indústria farmacêutica e de química fina, muitos processos industriais foram desenvolvidos para uso desta tecnologia. Isso porque reatores de fluxo contínuo permitem um melhor controle do processo, tornando a reação mais eficiente e, consequentemente, evitando o desperdício. Assim, a reação em fluxo contínuo tem se tornado uma importante tecnologia facilitando o uso de enzimas imobilizadas para produção industrial de, entre outros importantes compostos, aminas quirais enantiomericamente puras (LEY, 2012; WILES; WATTS, 2012). 1.1 Biocatálise em fluxo contínuo A velocidade no desenvolvimento de processos é um fator essencial na indús- tria química e farmacêutica. Nesse contexto, a miniaturização possibilita a aceleração no desenvolvimento, minimizando custos por meio da diminuição da demanda de substratos dispendiosos e permitindo que diferentes experimentos possam ser realizados em paralelo (KRÜHNE et al., 2014; TAMBORINI et al., 2017). Entretanto, existem fatores a serem considerados durante o escalonamento desses processos, já que sistemas enzimáticos em batelada, quando conduzidos em larga escala, frequentemente sofrem com cisalhamento das partículas, no caso de biocatalisadores imobilizados, pela agitação nos reatores ou inativação pela alta concentração de substrato/produto. Além disso, a quantidade de partículas sólidas que um reator de batelada consegue lidar é limitada (TUFVESSON et al., 2010). Esses fatores podem ser facilmente evitados em sistemas contínuos, uma vez que não apresentam agitação mecânica e o contato do composto inibidor com a enzima é reduzido devido ao constante bombeamento da solução para fora do reator. O escalo- 4 namento pode ser alcançado aumentando o volume do reator ou utilizando vários reatores em paralelo (WEGNER et al., 2012). De maneira geral, os processos contínuos biocatalisados podem ser classi- ficados em 2 tipos (figura 2): No primeiro tipo de processo, os reagentes serão bombeados juntos de um catalisador homogêneo através de sistemas tubulares até uma coluna ou reator helicoidal. Então, no fim do reator, o produto é coletado, incluindo o biocatalisador, possíveis subprodutos e substratos que não sofreram alterações. Assim, uma etapa de separação do catalisador e possíveis subprodutos será necessária. No segundo tipo de processo contínuo, o reator é preenchido com o biocatalisador imobilizado enquanto os reagentes fluem através da coluna. Nesse caso, nenhuma etapa de separação do catalisador é necessária. Além disso, o reuso do catalisador é possível, tornando esse processo ainda menos dispendioso e mais adequado aos preceitos da química verde (PORTA et al., 2016; THOMAS et al., 2017; TSUBOGO et al., 2015; URBAN et al., 2006). Figura 2. Esquema geral de sistemas de fluxo contínuo utilizados em diferentes processos biocatalisados. 5 Dependendo do tipo de reator, o volume de operação pode variar de 15 nL a 1L. Assim, a nomenclatura para cada volume de trabalho é dada de acordo com a escala mostrada na tabela 1 (ITABAIANA et al., 2013; DE SOUZA; MIRANDA, 2014). Tabela 1. Nomenclatura de reatores contínuos segundo seu volume de operação. Nomenclatura Volume Nano 15 nL – 10 μL Micro 10μL – 100μL Mini 50 μL – 200 μL Meso 100 μL – 10mL Macro 10 mL – 1L Diferente do sistema em batelada (no qual o tempo de reação é definido pela duração na qual a solução é mantida agitando a determinada temperatura), em um sistema contínuo, o tempo de reação depende da vazão e do volume do reator. Visto que o meio reacional é bombeado através do reator onde a transformação dos substratos acontecerá, o tempo de reação é dado pelo período em que a solução passa pelo interior do reator e é chamado de tempo de residência (Tr). Assim, Tr é calculado pela razão entre volume total do reator dividido pela velocidade de fluxo com qual a solução é bombeada (figura 3) (PLUTSCHACK et al., 2017; WEGNER et al., 2012). Figura 3. Tempo de residência. 6 Atualmente, existem diversos tipos de reatores de fluxo contínuo disponíveis para processos biocatalisados, comoreatores de membrana, reatores helicoidais, microrreatores, reatores de leito fluidizado e reatores de leito fixo, sendo este último indubitavelmente mais comum (BRENNA et al., 2017; GRUBER et al., 2017; JAKOVETIĆ et al., 2013; LONG et al., 2005; SÁNCHEZ et al., 2000; XI; XU, 2005). Em um reator de leito fixo (RLF), que consiste geralmente de uma coluna cilíndrica preenchida com o biocatalisador, as partículas têm a sua movimentação restringida. Desse modo, a(s) solução(ões) contendo os substratos pode(m) ser bombeada(s) para dentro do reator pela parte inferior ou superior da coluna. Além do baixo custo de produção, facilidade de operação e a alta performance, esse tipo de reator oferece diversas vantagens. Uma vantagem em relação aos reatores de batelada é o menor espaço deixado entre as partículas (34% para reatores de leito fixo e 80-90% para reatores de batelada) (Woodley et al., 1994apudCSAJÁGI et al., 2008). Assim, a alta concentração do catalisador combinada com a eficiente transferência de massa no interior do reator leva a tempos de reação menores (KAMBLE; YADAV, 2017; PLUTSCHACK et al., 2017). Neste contexto, um fator que deve ser levado em consideração ao utilizar um reator de leito fixo é o tamanho da partícula do biocatalisador, já que partículas demasiado pequenas podem aumentar a contrapressão ou entupir a coluna, impossibilitando a passagem do meio reacional. Por outro lado, partículas grandes demais podem levar a baixas conversões, considerando que a reação frequentemente acontece na superfície do biocatalisador (CHUA; SARMIDI, 2004). Assim, a imobilização da enzima é também um fator extremamente importante a ser considerado, de modo que um suporte deve apresentar algumas características, entre as quais: estabilidade térmica e química, grupos funcionais suficientes para a ligação, facilidade de regeneração e resistência mecânica. O tipo de ligação ao suporte pode influenciar a estabilidade da enzima e reduzir a lixiviação, ainda que a lixiviação em fluxo contínuo seja muito menor que em batelada (BOROS et al., 2013; KUREK et al., 2017; SILVA et al., 2015; DE SOUZA et al., 2016). 7 Apesar das diversas vantagens advindas do uso de sistemas contínuos comparado à batelada, como a maior eficiência energética e um menor número de operações no isolamento do produto, no que concerne à taxa de reação (r), compa- rações entre processos em fluxo contínuo e batelada podem ser feitas apenas em valores de conversão próximos. Isso porque, em fluxo contínuo, a concentração subs- trato/produto na saída do reator é constante, enquanto em batelada a concentração substrato/produto muda no decorrer da reação, dificultando uma comparação direta. (BOROS et al., 2013; CSAJÁGI et al., 2008; KAMBLE; YADAV, 2017; DE SOUZA; MIRANDA, 2014; TAMBORINI et al., 2017) De maneira geral, a taxa específica de reação (rfluxo) em sistemas contínuos pode ser calculada segundo a equação 1 e é frequentemente expressa em mmol min -1 gbiocatalisador -1 . Quando possível, a comparação pode ser feita conside- rando a taxa específica de reação para processos em batelada, através da equação 2. (CSAJÁGI et al., 2008) !"#$%& = [P] × f m./&0121#/314&5 Equação 1. Onde a [P] é a concentração de produto deixando o reator (frequentemente expresso em mmol mL -1 ), f é a vazão (podendo ser expresso em mL min -1 ) e m, a massa do biocatalisador (em g). !.126#141 = 78 × t m./&0121#/314&5 Equação 2. onde a np é a quantidade de produto (frequentemente expresso em mmol), t é o tempo (em min) e m, a massa do biocatalisador (em g). 8 1.2 Transaminases Em um organismo, as transaminases (E.C. 2.6.1.x, também conhecidas como aminotransferases) são responsáveis pela produção e degradação de aminoácidos. Esses compostos possuem um papel fundamental no organismo e, por isso, não surpreende sua importância para a indústria farmacêutica (MCMURRY; BEGLEY, 2005). O interesse entre pesquisadores sobre o papel da transaminação em reações metabólicas despertou quando, em 1939, Braunstein et al. demostraram pela primeira vez a reação de transaminação através da transferência de um grupamento amino entre um doador aminoácido e um aceptor α-cetoácido utilizando um tecido animal. Desde então, esse grupo de enzimas vem sendo amplamente estudado devido ao seu papel biológico. (BRAUNSTEIN, 1939; BRAUNSTEIN; KRITZMANN, 1937) Embora as transaminases tenham sido descobertas há aproximadamente 60 anos, seu uso para a síntese de substratos não-naturais tem aumentado conside- ravelmente nos últimos 15 anos. Essas enzimas catalisam a síntese de aminoácidos quirais por resolução cinética ou por uma síntese assimétrica. No caso de uma resolução cinética catalisada por transaminases, a reação resulta em um aminoácido enantiomericamente puro e um cetoácido. Um grupo de transaminases ainda mais interessante é composto por enzimas capazes de reconhecer substratos sem qualquer grupo carboxílico (como aminas), as chamadas ω-transaminases (ω-TA) (HÖHNE; BORNSCHEUER, 2012; PARK et al., 2010). Como dito anteriormente, a resolução cinética possui um rendimento máximo teórico de 50%, o que torna a síntese assimétrica mais interessante, pois através dessa é possível obter o produto com máximo rendimento. No entanto, esse tipo de reação necessita de técnicas de deslocamento do equilíbrio, visto que o equilíbrio termodinâmico está deslocado para a formação do substrato. Além disso, uma desracemização também é possível, sendo uma abordagem útil quando o substrato pró-estereogênico não está prontamente disponível. Para isso, no caso de aminas, uma cetona gerada em uma resolução cinética pode ser subsequentemente usada 9 como substrato em uma síntese assimétrica empregando uma ω-TA de seletividade oposta (Esquema 1). (FUCHS et al., 2015; GHISLIERI; TURNER, 2014; HÖHNE; BORNSCHEUER, 2012) Esquema 1. Estratégias para uso de TAs para a síntese de aminas enantiomericamente puras. 1.2.1 Mecanismo de reação. Conceitualmente, uma transaminação biocatalisada é o processo pelo qual uma amina/aminoácido reagirá com uma cetona/cetoácido para permutarem seus grupos funcionais mediados por uma transaminase. O mecanismo pelo qual a reação ocorre é bem conhecido. E embora transaminases diferentes possam apresentar R1 R2 NH2 R1 R2 NH2 R1 R2 O + piruvato alanina ~50% (R)-transaminase R1 R2 O R1 R2 NH2 alanina piruvato >99% (R)-transaminase Resolução cinética Síntese assimétrica R1 R2 NH2 R1 R2 NH2 R1 R2 O + piruvato alanina (R)-transaminase Desracemização (S)-transaminase piruvato alanina 10 diferentes especificidades em relação ao substrato, o mecanismo se mantém o mesmo (CASSIMJEE et al., 2015). Podemos dizer que esse mecanismo ocorre em duas etapas principais: Na primeira etapa (esquema 2), um doador amino, como o (S)-feniletilamina, reage com o piridoxal fosfato (PLP), que está reversivelmente ligado à enzima através de uma Base de Schiff (E-PLP), por uma adição nucleofílica do seu grupamento –NH na ligação C=N da imina, gerando um intermediário piridoxamina ligado à enzima e a cetona correspondente, nesse caso, a acetofenona. Então, na segunda etapa (esquema 3), um segundo substrato carbonilado (aqui usado o piruvato), entra no sítio ativo onde recebe um grupamento amino transferido do fosfato de piridoxamina (PMP) ligado à enzima, produzindo o produto amino correspondente (alanina) e regenerando o cofator piridoxal fosfato para um outro ciclo catalítico. Esquema 2. Primeira etapa do mecanismo da reação catalisada por transaminases. 11 Esquema 3. Segunda etapa do mecanismo da reação catalisada por transaminases. 1.2.2 Engenharia de proteínas na obtenção de novas transaminases Apesar das vantagens na utilização de TAs para a produção de aminas quirais, transaminasesprovenientes de cepas selvagens podem não apresentar as características ideais para o processo desejado. Nesses casos, técnicas de engenharia de proteína como mutagênese sítio-dirigida e evolução direcionada podem ser empregadas para obtenção de enzimas com as características necessárias. Quando a estrutura tridimensional da proteína é conhecida, é possível através da mutagênese sítio dirigida modificar a estrutura da enzima para melhorar a especificidade pelo substrato/cofator, a enantiosseletividade e estabilidade. Por outro lado, se a estrutura de raios X do cristal da proteína não está prontamente disponível, a evolução direcionada pode ser utilizada para obtenção de uma biblioteca genética de mutagênese aleatória e triagem das enzimas mutantes que apresentem essas características (HÖHNE et al., 2010). Um dos objetivos mais comuns na engenharia de proteínas é a melhora da estabilidade da enzima e especificidade pelo substrato. Para isso, uma abordagem amplamente utilizada baseada no método de evolução direcionada é a reação em cadeia da polimerase propensa a erros (error-prone PCR ou epPCR), que introduz 12 mutações aleatórias em um segmento de ADN. Por exemplo, a termoestabilidade da transaminase de Arthrobacter citreus foi melhorada e, após 6 rodadas de mutagênese aleatória, a temperatura ótima passou de 30 ºC para 55 ºC, o que pode facilitar a remoção de um coproduto volátil e ajudar no deslocamento do equilíbrio. A produ- tividade também aumentou em 260 vezes, partindo de 5,9 para 1582,8 Ug -1 na produ- ção da (S)-aminotetralina (CERIOLI et al., 2015; CHO et al., 2006, 2008; HWANG et al., 2008; HWANG; KIM, 2004; MARTIN; DISANTO; et al., 2007). Através da mesma abordagem, mutantes da ω-transaminase de Vibrio fluvialis JS17 foram obtidas a partir de mutagênese aleatória para superar a inibição por cetonas alifáticas, subprodutos de reações de resolução cinética de aminas quirais. A variante apresentou atividade duas vezes maior frente a aminas alifáticas de cadeia longa em relação à enzima selvagem, ainda que as atividades das duas enzimas tenham sido equivalentes para aminas alifáticas de cadeia curta e aminas aromáticas. A inibição pelo produto também foi evitada na síntese assimétrica do 2- amino-1-metoxipropano com o uso de uma ω-transaminase obtida por evolução direcionada. Com a variante mutante foi possível melhorar a conversão de 12% para 65%, sem a necessidade de deslocamento do equilíbrio. Após outras etapas de evolução direcionada, variantes com melhor estabilidade química e térmica foram obtidas. Desse modo, a acetona formada pode ser retirada do meio a 50ºC sob pressão reduzida. Finalmente, o produto (S)-2-amino-1-metoxipropano foi obtido com 93% de rendimento e >99% de excesso enantiomérico após 7 h de reação (YUN et al., 2005). Com os mesmos objetivos, a mutagênese sítio dirigida se mostra um método mais eficiente, eliminando etapas de mutagênese necessárias na evolução direcionada, além de ter maior especificidade em relação ao processo. Para isso, o conhecimento da estrutura do sítio ativo da enzima é necessário. Em 2002, foi observado que o sítio ativo das transaminases é composto por duas cavidades de tamanhos diferentes. O reconhecimento do substrato depende então da acomodação nessas duas cavidades, considerando que, além da diferença 13 de tamanho, a cavidade menor possui uma repulsão eletrostática pelo grupo carboxílico do substrato cetona. Na transaminase de Vibrio fluvialis, por exemplo, os resíduos triptofano W57 e W147 na cavidade menor maior do sítio ativo são responsáveis pela baixa promiscuidade da enzima. Sendo assim, a atividade para substratos maiores que uma metila aumentou consideravelmente quando o triptofano foi substituído por glicina (CHO et al., 2008; SHIN; KIM, 2002). Um resultado ainda mais interessante foi observado por Skalden et al. (2015) que mostrou como a alteração de um único resíduo de aminoácido no sítio ativo pode modificar até mesmo a enantiopreferência da enzima. O grupo investigava a produção dos diferentes diasteroisômeros do 1-amino-3-metilciclohexano através de uma reação em cascata envolvendo um enoato redutase e uma transaminase de Vibrio fluvialis (Esquema 4). A reação catalisada pela enoato redutase anterior à etapa de transaminação produz apenas o enantiômero de configuração (S) com alta seletividade (>99%). Entretando, a transaminase de V. fluvialis apresentou baixa seletividade e o diasteroisômero de configuração (1R, 3S) foi produzido com apenas 14% de. Assim, durante o exame da estrutura do sítio catalítico da transaminase foi identificado que uma mudança no resíduo aminoácido Leu56 poderia ter impacto na enantiosseletividade. Após a alteração de leucina para valina (Leu56Val), um aumento na seletividade foi observado e o diasteroisômero (1R, 3S) foi obtido com 66% de. Entretanto, quando a leucina foi alterada para isoleucina (Leu56Ile), a reação catali- sada pela variante converteu a cetona com preferência contrária (1S, 3S) com 70% de (SKALDEN et al., 2015). Esquema 4. Esquema adaptado da reação realizada por Skalden et al. (2015). O O Enoato redutase NH2 1 3 NH2 + ω-transaminase NADPH Alanina (1R, 3S) (1S, 3S) 14 Recentemente, a incorporação de aminoácidos não-canônicos na estrutura da enzima foi utilizada para melhorar a estabilidade de uma ω-TA de Sphaerobacter thermophilus e permitir imobilização sítio-específica em quitosana. Para isso, o aminoácido prolina foi substituído por uma (4R)-fluoroprolina (FP), por conferir um efeito estabilizador, e uma L-3,4-diidroxifenilalanina (dopa) foi incorporada para auxiliar na imobilização. Além de melhorar consideravelmente a termoestabilidade da enzima (tabela 2), após imobilização, as variantes puderam ser utilizadas por até 10 ciclos na resolução cinética de aminas quirais. (DEEPANKUMAR et al., 2015) Tabela 2. Meia-vida de ω-TAs modificadas a diferentes temperaturas (DEEPANKURMAR et al., 2015) Biocatalisador Modificação 50ºC (h) 60ºC (h) 70ºC (h) ω-TA -- 19,5 8,1 2,2 ω-TA[(4R)-FP] Prolina substituída por (4R)-FP 31,0 11,5 4,5 ω-TAdopa Adição do aminoácido dopa. 19,4 7,5 2,1 ω-TAdp[(4R)- FP] Substituição da prolina por (4R)-FP e adição de dopa 29,5 11,0 4,4 Um exemplo proeminente da aplicação da tecnologia de mutagênese sítio dirigida é a evolução de uma (R)-ω-TA para a síntese assimétrica da sitagliptina (esquema 5), um inibidor da dipeptidil-peptidase IV utilizado no tratamento da diabetes (JARVIS et al., 2010). Após 27 alterações no sítio ativo da ω-TA de Arthrobacter sp, a variante foi capaz de converter a cetona da sitagliptina com rendimento de 92% e alta pureza enantiomérica. Esse feito é bastante notável visto que a maioria das transaminases não aceitam grupamentos maiores que uma metila na posição adjacente à carbonila (NOBILI et al., 2015). Além da melhor tolerância a solventes orgânicos e alta concentração de isopropilamina, quando comparado à síntese química tradicional da sitagliptina, que envolve um catalisador quiral de ródio, o processo utilizando a enzima mutante teve rendimento 13% maior e reduziu o desperdício total em 19%. 15 Esquema 5. Síntese da sitagliptina por uma ω-TA mutante produzida por Jarvis et al. (2010) 1.2.3 Transaminases na síntese de aminas quirais Até pouco tempo, dois fatores impediam o uso de transaminases para biotransformação de substratos não naturais: A pouca disponibilidade de transaminases ativas com substratos diferentes de α-ceto/α-aminoácidos e a carência de estratégias para o deslocamento do equilíbrio da reação em direção à formação do produto, no caso de aminas quirais. Com o advento de novas técnicas e metodologias para a solução desses problemas, as transaminases têm se tornado cada vez mais importantes na síntese de aminas enantiomericamentepuras. As transaminases foram aplicadas pela primeira vez na síntese de aminas quirais no final da década de 80 por pesquisadores da companhia americana Celgene Co., que desenvolveram transaminases (R)- e (S)-específicas para produção de diferentes aminas e cetonas por resolução cinética e síntese assimétrica (Figura 5). A Celgene demostrou ainda a resolução cinética de aminas na escala de 2,5 m 3 , embora tenha apresentado problemas com a inibição da enzima por ambos os substratos cetona e amina. Além disso, baixas concentrações dos produtos foram obtidas quando substratos hidrofóbicos foram empregados, visto que a reação ocorria em meio aquoso (STIRLING et al., 1990, 1992). 16 Figura 4. Síntese de aminas quirais catalisada por ω-TAs realizadas pela empresa Celgene. Recentemente, transaminases de Arthrobacter sp., Aspergillus terreus e Chromobacterium violaceum foram identificadas como capazes de converter cetonas propargílicas aos seus correspondentes aminados (esquema 6). Aminas propargílicas são importantes blocos de construção para a síntese orgânica, utilizadas na prepa- ração de heterocíclicos contendo nitrogênio, como 2-aminoimidazóis, oxazolidinonas, pirimidinonas e triazóis. Embora esses compostos tenham sido relatados como inibidores irreversíveis de transaminases, as enzimas identificadas foram capazes de realizar a síntese assimétrica de aminas propargílicas aromáticas com excelente conversão e excesso enantiomérico. Outras ω-TAs reconhecidas pela ampla tolerância a substratos, como de Bacillus megaterium, Paracoccus denitrificans, Pseudomonas putida, Vibrio fluvialis e Arthrobacter citreus, também foram testadas, porém não foram capazes de transformar o substrato. Foi possível notar que para substratos suportando grupos doadores de elétrons na posição meta e para a R1 R2 NH2 + O R1 R2 NH2 R1 R2 O NH2(S)-TA + + 1) Resolução cinética 2) Síntese assimétrica R1 R2 O NH2 + (S)-TA R1 R2 NH2 O + NH2 X N NH2NH2 MeO O NH2 N R3H2N O R3 NH2O X 17 conversão foi maior que 90%. Enquanto que substratos portando grupos retiradores de elétrons no anel aromático obtiveram baixa conversão para todas as TAs utilizadas (SCHMIDT et al., 2015b). Esquema 6. Síntese assimétrica de aminas propargílicas. (SCHMIDT et al., 2015b) O intermediário da pró-droga silodosina, utilizada no tratamento da hiperplasia benigna da próstata, também foi obtido através de aminação redutiva assimétrica biocatalisada (esquema 7). Um sistema para reciclo do piruvato utilizando uma alanina desidrogenase foi empregado e diferentes enzimas foram testadas. O melhor resultado foi obtido quando a ω-TA de Arthrobacter sp. foi utilizada, levando à conversão maior que 97% e alta pureza enantiomérica, com mais 97% do enantiomêro (R). Um outro resultado interessante foi obtido pela ω-TA de Pseudomonas fluorescens, com conversão de 84% e 97% de excesso do enantiômero (S), embora a silodosina utilizada pela indústria farmacêutica possua configuração (R). (SIMON et al., 2014) Esquema 7. Síntese do intermediário da silodosina. O R (R)- ou (S)-TA Tampão, pH 7 PLP, 30ºC, 24h Alanina Piruvato NH4COOHCO2 H2O+ R: H, p-Me, p-MeO, m-MeO, p-CF3 ou p-Br NH2 R AlaDH, FDH O (R)-TA Tampão, pH 7 PLP, 30ºC, 24h 10% DMSO Alanina Piruvato N R CN NH2 N R CN (reciclo/remoção) 18 Um exemplo interessante aplicado a síntese de fármaco é a síntese do (R)- 2,3,4,9-tetra-hidro-1H-carbazol-3-amina, um intermediário chave para a síntese da droga antialérgica ramatroban realizada por BUSTO et al., (2014) (esquema 8). Apenas uma etapa foi necessária para alcançar a amina alvo ao utilizar uma ω- transaminase como biocatalisador, ao passo que, por via química, 3 etapas seriam necessárias, segundo trabalhos anteriores. O grupo utilizou uma transaminase de Arthrobacter evoluída para reconhecer cetonas impedidas estericamente, uma vez que transaminases provenientes de cepas selvagens não aceitam grupamentos volumosos. Além disso, a mutante possui alta termoestabilidade comparada à selvagem, tornando possível o uso de isopropilamina como doador amino e a consequente evaporação do produto acetona formado. Entretanto, os pesquisadores notaram ainda que a isopropilamina acabou sendo prejudicial à cetona precursora levando à formação de vários subprodutos. Sendo assim, o doador amino empregado foi o (R)-1-feniletilamina. A reação biocatalisada foi completada em 4 h e teve rendimento de 96% e 97% de excesso enantiomérico usando a enzima alterada por biologia molecular. Esquema 8. Síntese assimétrica do intermediário do ramatroban por BUSTO et al. (2014). (R)-TA Tampão, pH 7 PLP, 30ºC, 24h Alanina Piruvato NH4COOHCO2 H2O+ AlaDH, FDH N H O N H NH2 19 1.2.4 Resolução cinética catalisada por transaminases A resolução cinética catalisada por TAs apresenta algumas vantagens em relação a síntese assimétrica, como o equilíbrio termodinâmico favorável à formação do produto, a não necessidade de outras enzimas e a facilidade de aplicação. Consequentemente, esse tipo de reação já é extensamente estudado e utilizado na produção de uma série de compostos utilizando enzimas imobilizadas, livres ou células íntegras (HÖHNE; ROBINS; et al., 2008; KOSZELEWSKI et al., 2010; MALLIN; MENYES; VORHABEN; HÖHNE, 2013; SHIN; KIM, 2001; TRUPPO et al., 2012). A resolução cinética catalisada por TAs foi eficiente mesmo em larga escala, como demostrado por Hanson et al., (2008), que empregaram células de E. coli expressando uma transaminase (S)-seletiva de Bacillum megaterium SC6394 para resolver cineticamente 750g de sec-butilamina (0,684 mol L-1). A amina de configuração (R) foi obtida com rendimento isolado de 46,6% e excesso enantiomérico maior que 99%. Entretanto, além do rendimento máximo limitado a 50%, essas reações sofrem frequentemente com inibição pelo produto e, desse modo, apesar das vantagens supracitadas, esses obstáculos podem tornar essa abordagem um pouco menos interessante. A inibição pelo produto é uma propriedade intrínseca das transaminases devido o mecanismo pelo qual a reação acontece. A inibição geralmente resulta de um co- produto cetona no meio, embora outros produtos carbonilados possam provocar o mesmo efeito. Por exemplo, ao utilizar (RS)-1-feniletilamina ou até mesmo benzilamina como doador amino, a enzima pode sofrer inibição pelo co-produto acetofenona, no caso da (RS)-1-feniletilamina, ou benzaldeído, no caso da benzilamina, formados no meio (SHIN; KIM, 1997, 2009). A utilização de um sistema bifásico foi a primeira metodologia utilizada para superar esse obstáculo apresentada por Shin e Kim (1997) na resolução cinética da (RS)-1-feniletilamina catalisada por células de B. thuringiensis JS64 (esquema 9). Após o teste de diversos solventes, um sistema cicloexanona/água (20% v/v) foi esco- 20 lhido. A fase orgânica seria responsável por extrair o produto inibidor do meio aquoso, além de funcionar como reservatório do substrato α-metilbenzilamina. Considerando que a (RS)-1-feniletilamina forma uma imina com a cicloexanona, o substrato é libe- rado para o meio aquoso conforme a reação de resolução cinética prossegue de modo a garantir um equilíbrio. O piruvato e a L-alanina, por outro lado, se mantêm no meio aquoso devido a efeitos de carga em pH neutro. Com esse sistema foi possível reduzir drasticamente a inibição pelo produto e, após 18h, 51,2% de conversão e 95,4% ee foram alcançados. Esquema 9. Esquema da reação no modelo bifásico. Adaptado de Shin e Kim (1997). Os autores descreveram ainda a inibição enzimática devido o contato da enzima com a fase orgânica, já que para manter o produto inibidor em baixa concentração em meio aquoso, grande quantidade de solvente orgânico foi utilizada. Posteriormente, reatores de membrana e reatores de leito fixo forameficientemente utilizados para evitar essa inibição pelo contato com fase orgânica.(SHIN, J. S. et al., 2001; SHIN, J. S. et al., 2001) Alternativamente, Bea et al., (2010) transformaram o produto inibidor acetofenona em 1-feniletanol utilizando a oxirredutase endógena de células de Pichia pastoris GS115 expressando o gene de ω-TA de V. fluvialis JS17. Com esse sistema foi possível obter a (R)-1-feniletilamina com 52,2% de conversão e excesso enantio- 21 mérico maior que 99% após 6h de reação. O reciclo do substrato piruvato também pode ser desejável como uma maneira de tornar o processo mais barato em larga escala. Ademais, o piruvato também pode atuar inibindo a enzima. Desse modo, um exemplo interessante é o trabalho realizado por Truppo et al., (2009) com a utilização de uma aminoácido oxidase (AAO) para reciclar in situ o piruvato adicionado em quantidade catalítica (8 mol%) na presença de oxigênio molecular. Assim, duas transaminases de seletividades diferentes (ATA- 117, (R)-seletiva, e ATA-113, (S)-seletiva) foram utilizadas alternativamente para a produção de diferentes aminas aromáticas com máxima conversão e alta pureza enantiomérica para ambos os enantiômeros em apenas 1 hora (figura 6). Por outro lado, uma reação controle, onde a AAO não foi empregada, produziu apenas 7,5% do produto e 8% ee na resolução cinética da feniletilamina. Figura 5. Aminas obtidas com o sistema de reciclo do piruvato por uma aminoácido oxidase. (TRUPPO et al., 2009) Outra abordagem para a reutilização do piruvato é a co-expressão de uma ω- transaminase e uma α-transaminase em uma mesma célula para catalisar a produção concomitante de aminas e aminoácidos quirais (esquema 10). Nesse caso, o piruvato 22 formado na reação de síntese assimétrica do aminoácido é utilizado como aceptor do grupamento amino em uma resolução cinética de uma amina quiral. Com esse sistema, três pares de reações acopladas, como AlaninaTA/ω-TA, TirosinaTA/ω-TA, e AspartatoTA/ω-TA foram aplicados para a produção de (S)-aminoácidos tais como (S)-fenilalanina, (S)-homofenilalanina e (S)-aspartato (CHO et al., 2003). Esquema 10. Síntese simultânea de (S)-aminoácidos e (R)-aminas com acoplamento de α- e ω-TAs. (A) sistema AlaTA/ω-TAs. (B) sistemas TyrTA/ω-TA e AspTA/ω-TAs. Adaptado de Cho et al (2003). 1.2.5 Síntese assimétrica catalisada por transaminases Como dito anteriormente, em uma síntese assimétrica catalisada por transaminases, um cetoácido reage com um aminoácido intercambiando seus grupos funcionais. Se uma ω-transaminase é empregada, uma cetona pró-quiral pode ser usada como substrato para reagir com um doador amino gerando uma amina enantiomericamente pura. Durante muito tempo, a síntese assimétrica biocatalisada era inviável. Nesse tipo de reação, os efeitos de ressonância de elétrons tornam o substrato cetona muito 23 mais estável do que o produto amina, deslocando o equilíbrio da reação em direção ao substrato. Além disso, a enzima poderia ainda sofrer inibição pelo produto. Por exemplo, na produção da (S)-1-feniletilamina, utilizando acetofenona e L-alanina, além da limitação termodinâmica, os produtos (S)-1-feniletilamina e piruvato são muito mais reativos do que a acetofenona e a L-alanina (esquema 11). Isso sugere que uma maior inibição pelo produto ocorra na reação entre a acetofenona e a L-alanina do que entre os produtos cetona e amina correspondentes. No entanto, diversas estratégias vêm sendo desenvolvidas para superar esse problema (SHIN; KIM, 1998, 1999). Esquema 11. Reação entre a acetofenona e L-alanina catalisada por uma (S)-TA. Na síntese da sitagliptina, por exemplo, Jarvis et al. (2010) utilizaram a isopropilamina como doador amino. Nesse caso, a reação foi realizada a 45ºC permitindo que a acetona formada fosse destilada do meio sob vácuo. Essa abordagem, entretanto, encontra dificuldades na sua aplicação em larga escala, onde a destilação nem sempre é possível, além da alta temperatura requerer enzimas termoestáveis. Ao longo dos anos outras metodologias para o deslocamento do equilíbrio e diminuição da inibição de atividade pelo produto foram desenvolvidas, como a utilização de resinas de troca iônica, para remoção in situ do produto formado, e o uso de doadores amino cujo produto formado sofre transformações espontâneas (GREEN et al., 2014; TRUPPO et al., 2010). Uma outra abordagem para deslocamento do equilíbrio da reação é a utilização de uma outra enzima que converta irreversivelmente um dos produtos formados (esquema 12). Por exemplo, a utilização de uma lactato desidrogenase, que converte 24 o piruvato formado quando a alanina é usada como doador amino em acido lático. Entretanto, a lactato desidrogenase reduz o piruvato enquanto oxida concomitan- temente o cofator NADH a NAD + . Por isso, um sistema de regeneração do cofator se faz necessário e, para esse fim, uma glicose desidrogenase ou uma formato desidrogenase podem ser utilizadas (KOSZELEWSKI; LAVANDERA; CLAY; ROZZELL; et al., 2008). Esquema 12. Estratégias para o deslocamento do equilíbrio. Alternativamente, quando a alanina é o doador amino escolhido, outra enzima utilizada é a piruvato descarboxilase, produzindo acetaldeído e CO2 que podem ser facilmente removidos do meio. Quando comparado ao uso de um lactato desidrogenase, o uso da piruvato descarboxilase oferece maior vantagem por dispensar a adição de cofatores e produzir compostos voláteis. De mesmo modo, uma acetolactato sintase pode ser utilizada convertendo o piruvato em acetoína e CO2. (HÖHNE; KÜHL; et al., 2008; YUN; KIM, 2008) Uma alanina desidrogenase também pode ser empregada para reciclar o piruvato, transformando-o de volta em alanina, um sistema particularmente R1 R2 O R1 R2 NH2 R3 NH2 R3 O NH3 Alanina desidrogenase H2O ω-TA (R3 = COOH) (R3 = COOH) (R3 = COOH) (R3= arila, alquila) Lactato desidrogenase Piruvato descarboxilase Álcool desidrogenase Acetolactato sintase (R3 = COOH) COOH OH H O + CO2 R3 O OH O + CO2 25 interessante por permitir a adição de alanina em quantidade catalítica. Neste caso, amônia é utilizada como fonte amino para o piruvato. Um sistema de regeneração do cofator NADH é necessário e, para isso, o já mencionado sistema com uma FDH ou GDH pode ser empregado. Essas enzimas serão responsáveis pela redução do NAD+ a NADH utilizando um agente redutor Formato ou Glicose. Esse sistema foi utilizado pela primeira vez por Koszelewski et al. (2008), onde diversas cetonas pró-quirais foram convertidas nas respectivas aminas com alta conversão e excesso enantiomérico usando L-alanina como doador amino. Recentemente esse mesmo sistema foi aplicado na síntese diversas aminas propagílicas e na síntese do intermediário do fármaco Ramatroban (BUSTO; SIMON, ROBERT C; et al., 2014; KOSZELEWSKI; LAVANDERA; CLAY; GUEBITZ; et al., 2008; SCHMIDT et al., 2015a). Finalmente, uma álcool desidrogenase (ADH) também pode ser utilizada para transformar o produto cetona inibidor em um álcool. Esse sistema foi aproveitado por Yun et al., (2003) para produzir (R)-1-feniletanol concomitante a produção da (R)-1- feniletilamina. A ADH é uma enzima dependente de NADH e, por isso, um sistema de reciclo de NADH através do acoplamento com uma glicose desidrogenase (GDH) foi utilizado. 1.2.6 Processos quimio-enzimáticos envolvendo transaminases. Rotas quimio-enzimáticas podem ser um importante método para obtenção de compostos complexos, reduzindo o impacto da síntese química tradicional e realizando transformações para as quais não existem enzimas disponíveis (OLIVEIRA et al., 2014; YURYEV et al., 2011). Um exemplo, é a síntese do suvorexant, um antagonista duplo-seletivo dos receptores de orexina, usado no tratamento da insônia. Após a produção do precursor ceto-éster atravésde etapas químicas, Mangion et al. (2012) realizaram a transaminação do composto, utilizando a mesma transaminase evoluída para reconhecer o precursor da sitagliptina, seguida de uma ciclização espontânea. O resultado foi alcançado em 4 etapas eliminando o uso de solventes 26 halogenados e catalisadores de metais de transição utilizados na síntese tradicional (esquema 13). Esquema 13. Síntese quimio-enzimática do suvorexant com ciclização espontânea pós reação de transaminação. Uma reação de resolução cinética dinâmica (RCD) foi realizada pela primeira vez com uma transaminase por Koszelewski et al. (2009), aproveitando a racemização espontânea do substrato para produzir a 4-fenil-2-pirrolidona enantiomericamente pura. Após etapas químicas, o grupo obteve o derivado do ácido γ-aminobutanóico (GABA), o 3-fenil-GABA, um aminoácido que atua no sistema nervoso (esquema 14). Esquema 14. Resolução cinética dinâmica de um derivado do 3-fenil-GABA 27 Posteriormente, uma resolução cinética dinâmica também foi crucial para a síntese de um inibidor do receptor SMO por Peng et al. (2014) utilizando um ω-TA produzida pela Codexis. Um importante resultado foi obtido na formação de dois centros estereogênicos, com configuração anti, em uma única etapa. A partir da transaminação, mais duas etapas foram necessárias para alcançar o produto. No total, foram necessárias apenas 5 etapas com rendimento de 40%. Esquema 15. Síntese do inibidor da proteína smoothened através da resolução cinética dinâmica utilizando uma transaminase seguidas de etapas químicas . Outro exemplo de uma rota quimio-enzimática é a síntese da (S)-rivastigmina, um potente inibidor da colinesterase utilizado para o tratamento do Mal de Alzheimer e Parkinson, sintetizado por Fuchs et al. (2012). A reação ocorreu em apenas 4 etapas, sem necessidade de etapas de proteção, considerando que a ω-TA de Paracoccus dentrificans foi capaz de converter o precursor suportando o farmacóforo polar carbamato ligado ao grupo m-fenólico da molécula (esquema 16). (FUCHS et al., 2012) Esquema 16. Síntese quimio-enzimática da rivastigmina. (FUCHS et al., 2012) 28 1.2.7 Transaminases em fluxo contínuo Em 2001, Shin et al. demonstraram pela primeira vez uma reação catalisada por transaminases em fluxo contínuo. O grupo utilizou um reator de membrana, contendo o extrato de células de Bacillus theringiensis JS64 com atividade de transaminase, de modo a superar a inibição da atividade enzimática ocasionada pela utilização do sistema bifásico no trabalho já mencionado anteriormente. De 2001 até os dias de hoje, a utilização de transaminases em fluxo contínuo ainda é escassa, principalmente pela necessidade da adição do cofator PLP (SHIN, J.S. et al., 2001). Destarte, em 2014, Andrade et al. utilizaram um reator de leito fixo preenchido com células de E. coli expressando uma (R)-transaminase de Anthobacter sp. imobilizadas junto do cofator PLP em resina polimérica de metacrilato. O sistema contou ainda com um cartucho de sílica gel acoplado ao final do reator, de modo que o produto amina ficasse retido e fosse separado continuamente dos demais reagentes. Assim, o produto poderia ser recuperado posteriormente ao lavar o cartucho de sílica gel com metanol. Diferentes aminas foram preparadas com bons rendimentos e pureza enantiomérica, embora esses resultados tenham sido alcançados somente após 5 dias de recirculação do meio reacional, devido a baixa quantidade de biocatalisador utilizada (ANDRADE et al., 2014). Em 2017, células de E. coli expressando ω-TAs foram imobilizadas em LentiKats®, partículas de hidrogel em formato de disco, produzidas a partir da secagem parcial em temperatura ambiente do álcool polivinílico (PVA). As células imobilizadas foram empacotadas em um reator de leito-fixo miniaturizado desenvolvido com placas de poli(metracrilato de metila) e o sistema foi aplicado na síntese assimétrica utilizando acetofenona como aceptor amino. O sistema foi utilizado por 21 dias mantendo mais de 80% da atividade inicial (BAJIĆ et al., 2017). No mesmo ano, uma (S)-transaminase de Halomonas elongata foi utilizada sem a necessidade de um sistema celular (PLANCHESTAINER et al., 2017). A enzima foi imobilizada covalentemente em resina epóxi e o biocatalisador foi então 29 acondicionado em um reator de leito fixo. A imobilização conferiu a enzima maior tolerância a solventes orgânicos e, em fluxo contínuo, apresentou uma produtividade até 33 vezes maior do que na síntese assimétrica em batelada, com tempo reacional diminuído de 24 h para 5 ciclos de 2 min. A mesma enzima foi utilizada posteriormente para a oxidação de aminas a aldeídos em fluxo contínuo (CONTENTE et al., 2017). 1.3 Lipases No organismo, as lipases (EC 3.1.1.3) são responsáveis pela hidrólise de triglicerídeos produzindo ácidos graxos e glicerol (esquema 17). Entretanto, sob condições com baixo teor de água, a reação de esterificação acontece. Essas enzimas são hoje as mais amplamente empregadas e estudadas tanto na indústria quanto na academia (ITABAIANA et al., 2013; JUNIOR et al., 2012; S. DE MIRANDA et al., 2014; DE SOUZA et al., 2015, 2016, 2017, 2018). Esquema 17. Reação de hidrólise catalisada por lipases Na indústria, lipases são utilizadas nos mais diversos setores para a produção de medicamentos, cosméticos, polímeros, detergentes, biocombustíveis, além da utilização em diagnósticos médicos e na indústria de alimentos. Espera-se que em 2020, o mercado de lipases movimente cerca de 590 milhões de dólares com uma taxa de crescimento de 6,2% ao ano (DAIHA et al., 2015; SEDDIGI et al., 2017). Na literatura, são empregadas em diferentes reações para a produção de uma ampla variedade de compostos, dentre eles: aminas quirais enantiomericamente puras 30 (ALATORRE-SANTAMARÍA et al., 2008; KAMBLE; YADAV, 2017; VERDUGO et al., 2011; YAO et al., 2011). Essas enzimas apresentam quimio, régio e enantios- seletividade e catalisam a síntese de aminas opticamente ativas através da acilação enantiosseletiva de aminas racêmicas em meio orgânico ou através da hidrólise de amidas racêmicas em meio aquoso, embora esse último seja mais raro considerando que longos tempos reacionais podem ser necessários nesse caso (BORNSCHEUER; KAZLAUSKAS, 2006; GHISLIERI; TURNER, 2014; GOTOR-FERNÁNDEZ et al., 2006). 1.3.1 Mecanismo de reações catalisadas por lipases Como dito anteriormente, embora o papel fundamental de lipases no organismo seja a hidrólise de triglicerídeos, em condições com baixa concentração de água, a reação de esterificação acontece. Assim como para as transaminases, a reação acontece por um modelo de reação ping-pong bi bi. Isso quer dizer que o substrato entra ordenadamente no sítio catalítico e é prontamente transformado em produto (ping-pong) e que dois substratos darão dois produtos (bi bi) no final da reação. Desse modo, o mecanismo de reações catalisadas por lipases tem a participação de três resíduos de aminoácidos no sítio catalítico da enzima: A serina, a histidina e o aspartato. De maneira geral, o mecanismo se inicia com o ataque nucleofílico do resíduo serina do sítio catalítico enzimático à carbonila do doador de acila, culminando na formação do complexo acil-enzima. Posteriormente, o complexo sofre ataque do nucleófilo (exemplo, a amina) resultando na formação do produto e regeneração da enzima para um novo ciclo catalítico. O mecanismo é apresentado graficamente no esquema abaixo. 31 Esquema 18. Mecanismo de reações catalisadas por lipases. 1.3.2 Resolução cinética catalisada por lipases para a produção de amina quirais enantiomericamente puras. Como já definido anteriormente para a resolução cinética catalisada por transa- minases, em uma resolução cinética ideal apenas
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