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Estudo in vitro do papel do estroma reativo na atividade das células tumorais prostáticas LNCaP Antonio Palumbo Júnior Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-graduação em Ciências Morfológicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro. ORIENTADORES: Prof. Luiz Eurico Nasciutti Profa. Etel Gimba Março, 2011 ii Antonio Palumbo Júnior Estudo in vitro do papel do estroma reativo na atividade das células tumorais prostáticas LNCaP Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós- graduação em Ciências Morfológicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como pré-requisito para obtenção do título de Mestre em Ciências Morfológicas. Orientadores: Luiz Eurico Nasciutti Etel Gimba Rio de Janeiro, 2011 iii Ficha Catalográfica Júnior, Antonio Palumbo Estudo in vitro do papel do estroma reativo na atividade das células tumorais prostáticas LNCaP / Antonio Palumbo júnior. – Rio de Janeiro: UFRJ / ICB, 2011. 81f. Dissertação de Mestrado em Ciências Morfológicas – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Programa de Pós - Graduação em Ciências Morfológicas, Rio de Janeiro, 2011. Orientadores: Luiz Eurico Nasciutti Etel Gimba 1. Próstata. 2. Câncer. 3. Interação Epitélio-Estroma. 4. Ciências Morfológicas - Tese. I. Nasciutti, Luiz Eurico. II. Gimba, Etel. III. Programa de Pós-Graduação em Ciências Morfológicas, Universidade federal do Rio de janeiro. iv Estudo in vitro do papel do estroma reativo na atividade das células tumorais prostáticas LNCaP. Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós- graduação em Ciências Morfológicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como pré-requisito para obtenção do título de Mestre em Ciências Morfológicas. Antonio Palumbo Júnior Aprovada em Profa. Dr. Helena Lobo Borges - UFRJ Prof. Dr. Róbson de Queiroz Monteiro - UFRJ Prof. Dr. Luiz Felipe Ribeiro Pinto - INCA v Agradecimentos: • A minha família Márcia, Beto e Noã, sem a qual este trabalho não seria possível, sem a qual a minha graduação não seria possível, sem a qual a minha educação não seria possível, sem à qual muito pouco ou quase nada seria possível. Realmente ainda não sei aonde posso e quero chegar, mas seja aonde for e quando for, saberei que foi graças a vocês. • Ao meu querido pai Antonio Palumbo, pelos exemplos de honestidade, retidão de caráter e seriedade. • Ao Prof. Luiz Eurico Nasciutti, pela liberdade de pensamento, pelo apoio incondicional, pelas broncas, pela paciência com as brincadeiras (quase sempre fora de hora) e pelos conselhos científicos ou mundanos, que mais do que essenciais para a realização deste trabalho, contribuem de maneira fundamental para a formação de meu caráter. • A minha família paulista: tia Luiza, Fernanda, Walquíria, Antonio Carlos, Ki, Glauce e Muriel. Muito obrigado pelo carinho e pela força sempre que precisei. • A Dra. Etel Gimba, pela competente orientação e pelos proveitosos questionamentos e sugestões durante o desenrolar deste trabalho, além da impecável revisão da dissertação. • Ao Prof. Leandro Miranda Alves, minha eterna gratidão por me abrigar inicialmente no laboratório de Interações Celulares e pelas orientações teóricas e práticas. • Ao grande amigo Prof. Daniel Escorsim Machado que além da amizade a mim dispensada é um grande exemplo de como o pragmatismo e a malemolência podem conviver em harmonia dentro da pesquisa e do ensino. • Ao Dr. Pedro Augusto Reis, pelas amostras cirúrgicas que possibilitaram a realização deste trabalho, pelas conversas enriquecedoras e altamente divertidas ao final das tardes de terça e sexta, pelo exemplo de como encarar a vida de maneira descontraída e quase irresponsável e pela inestimável ajuda no início de minha graduação, que julgo hoje como fundamental pela manutenção de minha escolha profissional. • Ao amigo Rômulo pela amizade, pela paciência e pelo seu bom caráter contagiante. vi • Aos amigos Leonardo e Juliana pelas horas de descontração dentro e fora do laboratório e pela ajuda sempre que necessário. • A Célia Palmero pelos muitos ensinamentos inerentes a nossa profissão e pela companhia sempre agradável. • A Eliane Gouvêa, pela ajuda prática na realização dos experimentos e pelo estímulo a atualização teórica. • Aos companheiros do laboratório de Interações Celulares: Natália, Flávia, Paula, Laína, Prof. Luiz Cláudio e Maria Aparecida, eu agradeço pelo prazeroso dia-dia e pela convivência. • Aos companheiros de PCM: Bruno, Klauss, Adelzon e Maria Alice. • Ao Prof. Felipe Leite de Oliveira, pelos ensinamentos e ensaios em citometria de fluxo, pelas tardes no “china” e pelos exemplos de simplicidade, humildade e competência. • A Profa. Márcia Cury El-Cheikh, pelas divertidas caronas para o outro lado da ponte, pelas conversas e conselhos de alto nível cultural e pela interessante visão política “ـــ�� ـــ� او����� .”اداة • A Luciana Bueno (INCA), pela simpatia e paciência ao me enviar protocolos e linhagens sempre que necessitei. • Aos amigos Luiz Cláudio “Dom” e Fernanda, pelo apoio, pela torcida e pela presença sempre positiva. • Ao laboratório de pinça óptica e em especial ao Prof. Nathan Bessa e ao Doutorando Bruno Pontes pelo auxílio nos ensaios de migração celular e na análise dos resultados. • A todos aqueles que passaram por minha vida e hoje talvez não saibam da importância ou sequer da existência deste momento, sei que não passaram à toa e apesar de não terem ficado, tenho certeza que as marcas e as lições destes encontros estão impressos nas entrelinhas deste trabalho. vii “Por educação eu perdi minha vida.” Arthur Rimbaud viii SUMÁRIO Sumário: .............................................................................................................. Viii Resumo: ................................................................................................................. X Abstract: ................................................................................................................ Xi Lista de Ilustrações: ............................................................................................ Xii Lista de Abreviaturas: ........................................................................................ XiV 1) Introdução: .................................... .................................................................... 2 1.1) Morfologia das próstata: ................................................................................... 3 1.2) Fisiologia da próstata: ...................................................................................... 7 1.3 – Câncer de Próstata: ..................................................................................... 14 1.4 – Estroma Reativo: .......................................................................................... 18 2) Objetivos: ..................................... .................................................................... 23 - Geral: .................................................................................................................. 23 - Objetivos específicos: .........................................................................................23 3) Metodologia: ................................... ................................................................. 24 3.1 Obtençaõe caracterização da linhagem estromal: .......................................... 24 3.2 Cultivo da linhagem LNCaP: ........................................................................... 25 3.3 Co-cultura das células LNCaP com as células estromais: .............................. 26 3.4 Cultivo de células LNCaP com meio condicionado das células estromais: .... 27 3.5 Cultivo de células LNCaP sobre a matriz extracelular secretada pelas células estromais: .................................................................................................. 27 3.6 Análise da morfologia das células LNCaP:...................................................... 28 3.7 Ensaio de proliferação celular: ........................................................................ 28 ix 3.8 Avaliação do ciclo celular: ............................................................................... 30 3.9 Ensaio de apoptose: ........................................................................................ 30 3.10 Ensaio de migração celular: .......................................................................... 31 3.11 Análise Estatística: ........................................................................................ 33 4) Resultados: .................................... .................................................................. 34 4.1 Caracterização do estroma reativo: ................................................................. 34 4.2 Influência do estroma reativo sobre a morfologia das células LNCaP: ........... 36 4.3 Os fatores solúveis e a matriz extracelular secretados pelo estroma reativo induzem a proliferação das células tumorais LNCaP: ............................... 38 4.4 As interações célula/célula e célula/matriz extracelular modulam a sobrevivência das células tumorais LNCaP: ......................................................... 43 4.5 A motilidade das células LNCaP é modulada de diferentes maneiras pelo estroma reativo: ..................................................................................................... 45 4.6 A matriz extracelular secretada pelo estroma reativo induz a proliferação das células tumorais LNCaP independentemente do tecido de origem: ............... 47 4.7 A matriz extracelular secretada pelo estroma reativo é rica em componentes fibrosos e glicoproteínas de adesão: .............................................. 49 5) Discussão: ..................................... .................................................................. 51 6) Conclusões: .................................... ................................................................. 64 7) Considerações Finais: .......................... .......................................................... 65 8) Perspectivas: .................................. ................................................................. 66 9) Referências Bibliográficas: .................... ........................................................ 67 x Resumo Júnior, Antonio Palumbo. Estudo in vitro do papel do estroma reativo na atividade das células tumorais prostáticas LNCaP. Rio de Janeiro, 2011. Dissertação de Mestrado – Programa de Pós-Graduação em ciências Morfológicas, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2011. Alterações no microambiente tumoral são eventos comuns em muitos tipos de câncer. Neste estudo, avaliamos o papel in vitro do estroma reativo na progressão do câncer de próstata. Para tal, foi isolada uma população de células estromais derivadas de hiperplasia prostática benigna e então avaliou- se a influência do contato célula - célula, célula - fatores solúveis e célula- matriz extracelular sobre a atividade tumoral das células LNCaP. Nossos resultados demonstraram respostas distintas mediadas pelas diferentes interações avaliadas neste trabalho. Ao passo que tanto as células estromais ou o meio condicionado produzido por estas, modularam apenas parcialmente os eventos relacionados com a progressão tumoral, como a proliferação ou a sobrevivência das células LNCaP, a matriz extracelular secretada pelas células estromais demonstrou-se capaz de modular positivamente além da proliferação e sobrevivência, também a migração das células LNCaP. Além disso, as células LNCaP tiveram sua morfologia característica preservada, somente quando cultivadas sobre a matriz extracelular. Desta maneira, podemos concluir que a matriz extracelular secretada pelo estroma reativo aumenta de maneira significativa o fenótipo maligno das células LNCaP, através da modulação de eventos, que contribuem para a progressão tumoral destas células in vitro. xi Abstract Júnior, Antonio Palumbo. Estudo in vitro do papel do estroma reativo na atividade das células tumorais prostáticas LNCaP. Rio de Janeiro, 2011. Dissertação de Mestrado – Programa de Pós-Graduação em ciências Morfológicas, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2011. Changes in the tumor microenvironment are a common feature of many cancers. Here we evaluated the in vitro role of reactive stroma in prostate cancer progression. For this purpose, it was isolated a population of reactive stromal cells derived from Benign Prostatic Hyperplasia, and using co-culture assays, it was analyzed the influence of cell-cell, cell-soluble factors and cell- extracellular matrix interactions over the LNCaP prostate tumor cells. Our results showed distinct responses mediated by the distinct interactions: while stromal cells or their conditioned medium partially modulated events related to in vitro LNCaP cells survival or proliferation, the extracellular matrix increased all tumor progression marks. LNCaP cells cultured over the extracellular matrix secreted by prostate reactive stromal cells preserved their characteristic morphology, presented an induction of proliferation and migration and an inhibition of apoptosis. In summary, we conclude that extracellular matrix secreted by the reactive stroma significantly increases the malignant phenotype of LNCaP cells through modulation of events that contribute to in vitro tumor progression of these cells. xii Lista de Figuras: Figura 1 : Localização anatômica da próstata. Página 4. Figura 2: Esquema da divisão anatômica das zonas prostáticas. Página 5. Figura 3: Organização das glândulas prostáticas. Página 6. Figura 4: Histologia da próstata. Página 7. Figura 5: Esquema simplificado da interação entre o epitélio e o estroma na próstata. Página 13. Figura 6: Caracterização da linhagem estromal. Página 35. Figura 7: Morfologia das células LNCaP após distintas condições de cultivo. Página 37. Figura 8: Modelo esquemático de co-cultivo celular. Página 39. Figura 9: Separação celular por citometria de fluxo. Página 40. Figura 10: Análise da proliferação das células LNCaP através da incorporação de cristal violeta. Página 41. xiii Figura 11: Avaliação do ciclo celular das células LNCaP após cultivo sobre a MEC. Página 42. Figura 12: Avaliação da Apoptose por citometria de fluxo através da marcação para Anexina V. Página 44. Figura 13: Análise da migração celular por videomicroscopia. Página 46. Figura 14: Análise da proliferação das células LNCaP após cultivo sobre a MEC de três diferentes pacientes. Página 48. Figura 15: Identificação imunocitoquímica de elementos de MEC. Página 50. xiv Lista de Abreviações: bFGF - fator de crescimento de fibroblastos básico BSS - solução salina balanceada CA - câncer CAF - fibroblastos associados aocâncer CaP - câncer de próstata CAPB - cancer, prostate and brain / câncer, próstata e cérebro CTGF - fator de crescimento de tecido conectivo DAPi - diamidino phenylindole dihydrochloride DHT - di-hidrotestosterona DMEM - dulbbecos modified eagles médium EGF - fator de crescimento epidermal FAK - kinase de adesão focal FGF - fator de crescimento de fibroblastos HPB - hiperplasia prostática benigna HPC - hereditary prostate câncer / câncer de próstata hereditário IGF - fator de crescimento semelhante a insulina KGF - fator de crescimento de queratinócitos MC - meio condicionado MEC - matriz extracelular MMP - metaloproteinase PBS - tampão fosfato salino PCAP - predisposing for prostate câncer / predisposição ao câncer de próstata PDGF - fator de crescimento derivado das plaquetas xv PIN - neoplasia intra epithelial PMSF - fluoreto do phenylmethanesulphonylfluoride PSA - antígeno prostático específico RA - receptor androgênico Rb - retinoblastoma SDF - fator de crescimento derivado do estroma SFB - soro fetal bovino TGF-β - fator de crescimento transformante beta VEGF - fator de crescimento endotelial vascular 1 2 1. Introdução As glândulas acessórias do sistema reprodutor masculino de uma maneira geral requerem o pleno funcionamento testicular para o seu desenvolvimento, crescimento e secreção. Neste ambiente onde impera o estímulo androgênico mediado primariamente pela testosterona, produzida em sua maior parte pelo testículo, a próstata, as vesículas seminais e as glândulas bulbouretrais, formam um conjunto de glândulas acessórias que desempenham um destacado, mas ainda não totalmente compreendido, papel na reprodução. Estas glândulas apresentam diferenças evolutivas marcantes entre as espécies, quanto a sua anatomia, biologia, e fisiologia. A próstata especificamente é encontrada em todos os mamíferos, mas apresenta diferenças consideráveis quanto a sua bioquímica, anatomia e principalmente quanto à patologia. Um exemplo importante desta diferença reside em uma doença extremamente comum a homens e cães, a Hiperplasia Prostática Benigna (HPB), mas que se encontra ausente entre os demais mamíferos. A próstata também é acometida por um processo inflamatório recorrente em homens, denominado prostatite e também é o tecido de origem do segundo tipo de câncer mais comum entre a população masculina. Uma questão intrigante quanto ao alto índice de patologias prostáticas, encontra-se no fato de que as demais glândulas acessórias raramente apresentam alterações em sua fisiologia relacionadas com qualquer tipo de processo patológico. Assim como a fisiologia da próstata ainda não foi totalmente elucidada, os mecanismos que levam esta glândula a se tornar alvo de diferentes e constantes doenças, também estão longe de serem esclarecidos. Uma 3 distinção marcante entre a próstata e as demais glândulas acessórias é que esta não tem seu desenvolvimento e função controlados pela testosterona diretamente, mas sim pela di-hidrotestosterona (DHT), um metabólito resultante da conversão da testosterona pela enzima 5α-redutase e que possui uma afinidade pelo receptor androgênico (RA), pelo menos cinco vezes maior que a própria testosterona. Diferenças acerca da embriogênese prostática somam-se ao destacado papel do estímulo androgênico e ambos consistem no pilar básico para diversas explanações com base científica ou não, que tentam entender e responder o porquê deste órgão não vital, ser tão propício ao desenvolvimento de diversas patologias, que atualmente são responsáveis por grande parte da morbidade masculina no mundo (Walsh, 2003). 1.1 Morfologia da próstata Em humanos, a embriogênese prostática se inicia no terceiro mês do desenvolvimento fetal, no seio urogenital e é controlada pela DHT. Ao contrário de outras estruturas do aparelho reprodutor masculino, como a vesícula seminal e o epidídimo, a próstata não deriva dos ductos de Wolff. O tecido epitelial encontrado na parte posterior do seio urogenital se organiza e migra em direção aos dois lados do verum montanum, antes de invadir o mesênquima adjacente para formar a próstata. Parte do tecido epitelial que forma a zona prostática mais interna aparentemente deriva do mesoderma, enquanto a parte que irá formar a porção mais externa da próstata, aparentemente deriva do endoderma. Estas diferenças no desenvolvimento da próstata parecem ir muito além do já complexo processo de embriogênese 4 deste órgão e podem em uma segunda instância, estarem relacionadas com uma patogênese intrínseca da próstata. Esta hipótese consiste no fato de a zona interna da próstata ser o local exclusivo de origem da HPB, enquanto que a zona externa é local onde mais de 90% dos casos de câncer de próstata (CaP) se originam (Walsh, 2003). A próstata pesa aproximadamente entre 15 e 20 gramas e é a maior glândula acessória do sistema reprodutor masculino, sendo anatomicamente localizada logo abaixo da bexiga (Figura 1). A partir da uretra prostática, distinguem-se três zonas distintas: zona central, zona de transição e zona periférica (McNeal, 1990), (Figura 2). Figura 1: Localização anatômica da próstata . A próstata está situada no assoalho da bexiga, de onde parte a uretra que irá penetrar a glândula prostática. (http://www.enetural.pt/artigos/conteudos/artigos/prostata) 5 O estudo clássico de McNeal (1990) demonstrou que existem diferenças histológicas importantes entre as diferentes zonas prostáticas. Na parte mais interna do órgão, composta pela zona central e de transição, onde encontram- se respectivamente as glândulas da mucosa e da sub-mucosa, nota-se uma predominância do componente estromal (Figura 3). Já na parte mais externa da próstata, formada pela zona periférica onde se encontram as glândulas principais, o componente glandular está em maior quantidade (Figura 3). Histologicamente a próstata é formada por 30 a 50 unidades túbulo alveolares que são constituídas por um epitélio glandular do tipo cubóide simples que forma o parênquima do órgão (Figura 4). Apesar do epitélio prostático se organizar em apenas uma camada, este é caracterizado fenotipicamente pela existência de diferentes tipos célulares (Leenders, 2000). Sabe-se que no compartimento epitelial prostático são encontradas células luminais Figura 2: Esquema da divisão anatômica das zonas prostáticas. De acordo com a proximidade da uretra, a próstata é dividida em três zonas: a zona mais próxima da uretra é denominada de zona central (CZ), a zona posterior a zona central é denominada de zona de transição (TZ) e a zona mais externa e, portanto a mais distante da uretra prostática é denominada de zona periférica (PZ). Modificado a partir de Walsh, 2007. Vesícula Seminal Uretra Verum Montanum Coronal Sagital Ductos ejaculatórios Vaso Deferente 6 presença de células luminais terminalmente diferenciadas que expressam as citoqueratinas 8 e 18 (Okada, 1992), células tronco basais que originalmente expressam as citoqueratinas 5, 14 e 18 em pequena quantidade (Yang, 1997), além das células neuroendócrinas, cujo fenótipo ainda não é bem estabelecido, mas que aparentemente parecem expressar o mesmo padrão de citoqueratinas das células tronco encontradas no compartimento basal (Xue, 1997). O estroma da próstata é composto por um rico tecido fibromuscular, composto por fibroblastos, miofibroblastos, células musculares lisas, células do sistema imunológico como macrófagos e plasmócitos, além de vasos sanguineos, nervos e uma grande quantidade de elementos de matriz extracelular (MEC) (Kierszenbaum, 2008). Figura3: Organização geral das glândulas prostáticas. Notar a localização das glândulas da mucosa na zona central, glândulas da sub-mucosa na zona de transição e glândulas principais na zona periférica (Modificado a partir de Kierszenbaum, 2002). 7 1.2 Fisiologia da próstata O fluido produzido pela glândula prostática é um importante constituinte do líquido seminal e assim como os fluidos oriundos das demais glândulas acessórias do sistema reprodutor masculino, este contribui com uma série de proteínas e elementos químicos que aparentemente não são essenciais para a fertilização, mas que podem otimizar as condições deste processo, exceção feita à frutose, que é secretada em grande quantidade pela vesícula seminal e Figura 4: Histologia da próstata. O epitélio glandular cúbico simples prostático é sustentado por um estroma caracterizado pela presença dos tecidos muscular liso e conjuntivo (Junqueira e carneiro, 2004). 8 que comprovadamente exerce um papel fundamental como fonte energética para os espermatozóides. Acredita-se que o líquido prostático desempenhe uma espécie de efeito tampão no processo de fertilização. Assim, este fluido aumentaria a motilidade e a sobrevivência dos espermatozóides, assim como o transporte espermático tanto no trato genital masculino quanto no feminino (Walsh, 2003). A concentração de ácido cítrico no líquido seminal é de 500 a 1000 vezes maior que a encontrada no plasma. A maior parte deste citrato é oriunda do líquido prostático, já que esta glândula apresenta uma inabilidade intrínseca de sua mitocôndria na oxidação deste composto (Costello, 1998). A atividade de enzimas que degradam poliaminas como a diamina oxidase, tem sido relacionada com alterações na concentração de ácido cítrico na próstata e de acordo com dados obtidos por Gonzáles (1994), estas alterações podem culminar em importantes implicações na dinâmica do processo de fertilização. Outro elemento encontrado em grande quantidade no líquido seminal é o zinco e assim como ocorre com o ácido cítrico, este íon é secretado primariamente pela próstata, sendo este o local do organismo onde há a maior concentração deste metal (Mackenzie, 1962). Além de fazer parte da organização estrutural de diversas proteínas como as metaloproteinases, alterações no nível do zinco encontrado na próstata têm sido relacionadas com patologias típicas deste órgão. Na HPB o nível de zinco aumenta em relação à próstata normal, ao passo que no CaP o nível de zinco diminui (Byar, 1974). Recentemente o estudo da expressão e da atividade do principal receptor intracelular para o zinco, a proteína metalotioneína, tem ajudado a elucidar a importância deste elemento, em especial seu papel no processo de apoptose de linhagens tumorais prostáticas (Wei e Feng, 2008). Outra importante função do zinco é o 9 seu papel bacteriostático, conforme descrito por Fair em 1976, ao constatar em um estudo clínico uma diminuição de 80% na concentração deste metal no líquido prostático de homens com inflamação crônica do órgão (prostatite), em relação a homens saudáveis. Dentre as proteínas secretadas pela próstata, o antígeno prostático específico (PSA), pode ser considerado o mais importante e conhecido produto sintetizado por esta glândula, muito em função de sua importância como marcador de doenças da próstata, como a HPB e o CaP. O PSA é uma glicoproteína que atua como uma serina protease e é quase que exclusivamente encontrado nas células epiteliais prostáticas (Rittenhouse, 1998). Foi descoberto na década de 70 (Ablin, 1970) e passou a ser utilizado em larga escala como um marcador de malignidades da próstata a partir do final da década de 80 (Seamonds, 1988). Ainda que existam relatos científicos da presença sérica desta proteína em mulheres (Yu et al, 1995) e em alguns tipos de carcinomas como o renal e o da glândula adrenal, de maneira geral o PSA pode ser considerado como uma proteína exclusiva da glândula prostática (Levescue et al, 1995). Como o PSA é uma serino protease, uma explanação plausível acerca de seu papel biológico, seria a sua atividade na liquefação do coágulo seminal que é rico em semenogelina, um subtrato natural para esta proteína, mas até o momento, não só a real função do PSA, como a importância dos eventos de coagulação e liquefação do sêmem no processo reprodutivo permanecem ainda não totalmente compreendidas (Walsh, 2003). O antígeno prostático específico de membrana (PSMA) é uma glicoproteína não solúvel ligada à membrana das células epiteliais prostáticas. A análise da expressão do RNAm do PSMA em material proveniente de biópsias de CaP 10 demonstrou que esta proteína também pode ter um destacado papel na clínica, como um marcador físico das células tumorais prostáticas (Wright et al, 1995). A fosfatase ácida prostática foi considerada como o principal meio de monitoramento na progressão do CaP, até a descoberta do PSA. Esta proteína secretada em grande quantidade pela próstata tem a capacidade de hidrolisar diversos substratos em seus resíduos tirosina, portanto pode estar envolvida em uma série de vias de sinalização oncogênicas, ainda que seu papel biológico como constituinte seminal não tenha siso elucidado (Lin e Clinton, 1986). Controle endócrino A próstata é estimulada em seu crescimento, manutenção e função secretora pela presença continuada de certos hormônios e fatores de crescimento. Acima de tudo está o pró-hormônio testosterona que é produzido principalmente pelas células de Leydig dos testículos, que são responsáveis pela produção de 90 a 95% deste hormônio. Estas células sofrem o estímulo da hipófise através do hormônio luteinizante (LH) ou hormônio estimulador das células intersticiais (ICSH), que por sua vez é controlado pelo hipotálamo por meio da liberação do LHRH. Os restantes 5 a 10% da testosterona são produzidos pelas glândulas supra-renais. A testosterona deve ser convertida no interior da próstata no androgênio ativo di-hidrotestosterona (DHT), pela ação da enzima 5α-redutase. Noventa por cento dos andrógenos prostáticos estão na forma de DHT, principalmente os derivados dos androgênios testiculares. 11 No interior da célula, tanto a testosterona quanto a DHT ligam-se à mesma proteína, o receptor de androgênio (RA) de alta afinidade. A DHT é um androgênio mais potente que a testosterona em virtude de sua maior afinidade pelo RA. O RA então se liga a elementos responsivos no DNA, o que resulta em aumento da transcrição dos genes androgênio-dependentes e, ao final, estimula a síntese de proteínas (ex. PSA) (Walsh, 2003). A enzima 5α-redutase tem um importante papel no desenvolvimento e na homeostase prostática e possui duas isoformas com distribuições distintas entre os tecidos. A 5α-reductase I é encontrada na pele e no couro cabeludo em maior quantidade e em menor escala na próstata, e possivelmente está envolvida com a retração e formação da linha capilar (McConnell, 1995). A 5α- reductase II é encontrada nas células basais do epitélio prostático e também em seu estroma (Silver, 1994). Segundo estudo de Berman (1995), enquanto o tipo I é predominantemente encontrado nas células epiteliais, o tipo II é encontrado majoritariamente nas células de origem mesenquimal. Estes dados vieram a confirmar de maneira indireta os dados publicados por Cunha e colaboradores (1983), que constataram a influência endócrina do estroma prostático no desenvolvimento e na manutenção da glândula. Outro elemento de suma importância na glândula prostática é RA. O RA é um membro da superfamília dos receptores nucleares, onde também se encontram receptores para glicocorticóides, ácido retinóico, estrogênio, progesterona, etc. O RA localiza-se no citoplasma das células e após a interação ao ligante (testosterona ou DHT)este transloca para o núcleo de onde irá modular a expressão e repressão dos chamados genes andrógenos dependentes (Kiprianou e Isaacs, 1989). Existe uma relação intrínseca entre o 12 RA e o andrógeno, pois se sabe que na ausência do estímulo androgênico, o RA fica retido no citoplasma e, portanto a mensagem mediada por esta interação ligante/receptor que culminaria com a transcrição nuclear, não acontece (Husmann, 1990). Por outro lado já foi demonstrado que a expressão aumentada do RA no CaP está relacionada com o mal prognóstico da doença (Gelmann, 2002), o que não chega a ser uma surpresa já que a base no tratamento do CaP consiste justamente na interrupção da sinalização androgênica mediada pelo RA (Silva Neto, 2008). De maneira paradoxal a estes dados, Lin demonstrou em 2006 que a expressão deste receptor por si só é um pré-requisito celular para que linhagens tumorais prostáticas andrógeno- dependentes ou não, possam ativar as vias responsáveis pela morte celular programada após exposição à radiação. Interação Epitélio – Estroma Atualmente não restam dúvidas quanto à importância do componente estromal na fisiologia da próstata. O conceito ultrapassado de que o estroma prostático exercia uma mera função de suporte físico, já não mais condiz com os dados obtidos nas últimas décadas. O papel fundamental desempenhado por este compartimento começa ainda no desenvolvimento embrionário da glândula, passa pela produção e armazenamento de fatores de crescimento e é de suma importância na funcionalidade do órgão (Cunha, 1976,1983,1992,1994,1995). Dados científicos demonstraram que o estroma desempenha um papel muito mais importante do que se supunha em relação a patologias como a HPB e o câncer (Tuxhorn, 2001). A base desta interação se 13 encontra no constante fluxo de informações mediadas por gases, hormônios e fatores de crescimento (Figura 5) que são produzidos pelo estroma, ou pelo menos passam por ele e por sua MEC especializada denominada de membrana basal, antes de atingirem o parênquima glandular (Steiner, 1993 e Sikes, 1995). Figura 5: Esquema simplificado da interação entre o epitélio e o estroma na próstata . A DHT é produzida principalmente no estroma prostático, e irá atuar de maneira autócrina sobre as próprias células estromais, assim como de maneira parácrina sobre as células epiteliais, induzindo a transcrição de genes mitogênicos, que irão estimular a proliferação de ambas as populações celulares. (Modificado a partir de Kierszenbaum, 2002). 14 1.3 Câncer de Próstata Em termos de valores absolutos, o adenocarcinoma de próstata é o sexto tipo de câncer mais comum no mundo, sendo o mais prevalente entre os homens e só nos Estados Unidos da América, estimam-se pelo menos 200.000 novos casos de CaP ao ano, sendo que deste total, algo em torno de 30.000 indivíduos vão a óbito em virtude da doença (Damber, 2008). No Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde, eram esperados para o ano de 2010 o surgimento de 50.000 novos casos de CA de próstata (INCA, 2010). Este câncer pode ser considerado como típico da terceira idade, pois apresenta uma magnitude de mortalidade mais baixa que a incidência, sendo relativamente comum o achado acidental deste tipo de tumor em indivíduos na faixa etária acima dos 50 anos de idade, após autópsia (Albertsen, 2011). Não restam dúvidas que o aumento mundial na detecção do CaP e a queda em sua mortalidade nas últimas décadas podem ser diretamente correlacionados com a implementação extensiva nos sistemas de saúde, do exame diagnóstico que quantifica a presença sérica do PSA (Potosky, 1993). Esta evolução na diagnose do CaP não reflete o mesmo padrão quando se avalia a complexa biologia deste tumor, que pode apresentar uma série de fatores de risco ainda não muito bem compreendidos, entre eles: herança familiar, dieta, hábito de vida e origem étnica (Colloca, 2011). As alterações somáticas que levam à gênese do câncer de próstata não exibem um padrão marcante como em outros tipos de tumores. Diversos genes já mapeados podem sofrer deleções, translocações, mutações e amplificações em sua expressão, contribuindo assim, para uma assinatura genética variável 15 e, portanto singular deste tumor. Como consequência desta peculiaridade, o que se têm é um crescimento maligno que do ponto de vista clínico, podendo ser extremamente indolente em determinadas situações e altamente agressivo em outras (Park, 2009). Além disso, a variabilidade genética deste câncer dificulta ainda mais a correlação de sua gênese com possíveis fatores de risco (Kessler, 2003). Uma seqüência de eventos relacionados com a carcinogênese prostática foi proposta por Bostwick em 1996 e atualizada por Leite (Ferreira, 2010). Mutações germinativas podem afetar genes como o HPC (Hereditary Prostate Cancer) e PCAP (Predisposing for Prostate Cancer) ou então os genes que codificam o RA ou metaloproteinases de matriz (MMP) podem ter sua estrutura alterada por polimorfismos. Neste estágio, a célula epitelial normal passa a exibir um padrão chamado de atrofia inflamatória proliferativa. Em um segundo estágio é comum a metilação e o conseqüente silenciamento do gene GSTP1, que codifica a enzima glutationa transferase. Esta enzima é responsável pela proteção do DNA contra danos oxidativos. Com este silenciamento, a célula fica exposta a uma série de elementos potencialmente carcinogênicos, que podem contribuir para que a célula epitelial normal seja agora classificada como uma neoplasia intraepitelial (PIN). A partir daí, eventos progressivos como a reativação da telomerase, a perda de função em supressores de tumor como p53, Rb e PTEN, além do ganho de função em oncogenes como c-MYC e RA, irão promover a transformação contínua de neoplasia intraepitelial a carcinoma localizado, carcinoma metastático e finalmente carcinoma metastático andrógeno-independente. 16 Assim como no desenvolvimento normal da próstata, a testosterona têm um papel fundamental no desenvolvimento do câncer de próstata. Através de seu metabólito mais ativo, a DHT, irá se ligar ao RA e assim ambos irão mediar a sinalização intracelular que irá culminar com a transcrição de genes que codificam diversos fatores de crescimento. Entre eles está o fator de crescimento epidermal (EGF), o fator de crescimento de fibroblastos (FGF), o fator de crescimento semelhante à insulina (IGF), que irão controlar eventos como a proliferação e a diferenciação celulares (Boyle, 2003). O RA tem papel também destacado neste eixo de sinalização, pois além de exibir um aumento em sua expressão em tumores hormônio-refratários e, portanto mais agressivos, este pode apresentar uma promiscuidade a outros ligantes, como o IGF-1, EGF e KGF (fator de crescimento de queratinócitos), o que pode explicar em parte a continuidade da mensagem que originalmente só seria possível com a presença do andrógeno (Gelmann, 2002). Estima-se que em torno de 10% dos casos de CaP tenham origem hereditária. O mapeamento de genes como o HPC1, HPC2, PCAP e CAPB (Cancer, Prostate and Brain), leva a crer que a herança familiar neste tipo de tumor possa ser ainda maior. A elevada prevalência deste tumor em indivíduos com idade avançada e outros fatores, como a ausência de diferenças fenotípicas entre o câncer hereditário e o esporádico, têm dificultado uma maior correlação entre a carga hereditária e a carcinogênese prostática (Ferreira, 2010). A distribuição mundial deste câncer também é bastante variável. Enquanto os EUA apresentam uma incidência classificada como muito alta, a Europa é tida como um continente com uma incidência muito baixa, assim como a Ásia (Boyle, 2003). Uma diferença marcante desta distribuição é 17 revelada quando a prevalência do CaP é avaliada entre diferentes gruposétnicos. Afro-americanos apresentam uma razão entre incidência e mortalidade bem maior que indivíduos brancos. Esta diferença chega a 60% na chance de desenvolvimento da doença e a 200% quanto ao risco de óbito em virtude deste tumor (Hsieh, 2003). Parte da diferença na penetrância do câncer de próstata entre distintos grupos étnicos pode ser explicada pelo padrão de polimorfismo no gene do RA que indivíduos de etnia afro-americana apresentam. Neste caso, o gene do RA apresenta uma área de repetição de poliglutamina (CAG) curta, que se correlaciona com uma maior responsividade ao andrógeno, ao passo que asiáticos apresentam esta mesma seqüência (CAG) mais longa, portanto o RA é menos responsivo ao andrógeno. Consequentemente, estes indivíduos possuem uma predisposição genética atenuada quanto à gênese do câncer de próstata (Ferreira, 2010). Evidências que correlacionem à dieta e o câncer de próstata estão diretamente ligadas ao consumo de carne, em especial a vermelha, pois esta ainda é considerada como a principal fonte de acúmulo de gordura em países ocidentais (Kolonel, 1999). Como conseqüência do acúmulo de gorduras, as alterações nos níveis hormonais e a síntese de eicosanóides podem afetar a proliferação das células tumorais, a resposta imunológica e a metástase (Boyle, 2003). Por outro lado, dados demonstram que indivíduos que consomem regularmente vegetais, em particular o tomate que é rico em licopeno, podem prevenir o risco do surgimento do câncer de próstata em 25%. Este carotenóide é capaz de seqüestrar espécies reativas de oxigênio, capazes de lesar o DNA das células epiteliais prostáticas (Clinton, 1996). 18 A composição corporal reconhecidamente altera os níveis de testosterona e estrogênio circulantes. Indivíduos com maior percentual de gordura apresentam maiores níveis de estrogênio circulante que testosterona. Estudos demonstraram que ratos, camundongos e cães tratados com estrogênio por períodos prolongados, sofreram um aumento significativo no tamanho de suas próstatas, sugerindo assim, que estes mesmos efeitos possam ocorrer em humanos. Quanto ao consumo de álcool e tabaco os dados parecem ser inconclusivos. Enquanto o cigarro parece não estar relacionado com o surgimento do tumor prostático, mas sim com sua progressão, o álcool em quantidade média não demonstra nenhuma correlação associativa com o câncer de próstata (Boyle, 2003). 1.4 Estroma reativo No século passado a teoria reducionista foi levada ao extremo pelos pesquisadores e graças a esta maneira de se analisar sistemas complexos, onde as partes são fragmentadas, em prol do conhecimento mais a frente de um todo, muito do que se sabe até então sobre a biologia tumoral floresceu sob esta ótica. A segregação de tecidos em células e de células em moléculas forneceu avanços admiráveis principalmente quanto à biologia molecular dos tumores. Por outro lado, no final do mesmo século a comunidade científica percebeu que o pilar reducionista outrora tão fértil em informações, já não mais respondia certos aspectos relacionados à gênese e à progressão tumoral. Desta maneira, a ciência que invariavelmente passa por ciclos de descobertas e retrocessos, teve a percepção de que nem todo o repertório de uma célula tumoral é oriundo de informações contidas em seu DNA, constatando assim, que mais que uma doença celular, o câncer, é uma doença tecidual. Sendo 19 uma doença tecidual, um componente hoje fundamental a ser avaliado sob vários aspectos da biologia do tumor, são as células não neoplásicas, que são parte inerente de grande parte dos cânceres. Como 90% dos casos de câncer em humanos são derivados de tecido epitelial, sendo estes patologicamente classificados como carcinomas, as tais células não neoplásicas em questão, que compõe estes tumores, fazem parte do estroma tumoral. Este estroma varia de órgão para órgão e é de origem mesenquimal, sendo formado por uma grande variedade de células e por dezenas de moléculas solúveis, insolúveis e estruturais, que medeiam grande parte da troca de informações entre este compartimento e o componente neoplásico propriamente dito. Hoje se sabe que o estroma pode ser um ativo colaborador do tumor e possivelmente isto aconteça através da recapitulação de programas celulares pré-existentes, mas que neste caso são utilizados fora do contexto normal dos tecidos. Trabalhos como o de Radisky (2005) reforçam esta constatação ao demonstrar que o aumento na expressão da MMP-3 por si só é suficiente para induzir a transformação de células epiteliais normais em células tumorais, através de eventos relacionados com a transição epitélio-mesenquima. Aparentemente, programas biológicos como a cicatrização tecidual são reativados de maneira perniciosa pelas células tumorais, visando à contribuição do estroma, em benefício exclusivo das células neoplásicas. De fato, existem similaridades intrigantes que permeiam o processo de cicatrização de uma lesão e a progressão tumoral, que talvez constituam a base dos eventos biológicos que são reutilizados nesta interação entre estes dois compartimentos teciduais (Weinberg, 2008). 20 Entre a cascata de eventos envolvidos no processo de cicatrização, destacam-se a liberação de fatores como o fator de crescimento derivado das plaquetas (PDGF), o fator de crescimento transformante beta (TGF-β), além de fatores vaso-ativos. Estes fatores produzidos pelas plaquetas irão atuar de forma diferente no estroma adjacente, assim o PDGF irá estimular a proliferação dos fibroblastos e o TGF-β irá induzir a secreção de MMPs por estas células. Os fibroblastos por sua vez secretam fatores como o FGF, que é capaz de induzir a proliferação das células epiteliais. Com a ativação das MMPs, há um remodelamento da MEC que abrirá espaço para novas células e irá liberar uma série de outros fatores de crescimento como o fator de crescimento de fibroblastos básico (bFGF), TGF-β, FGF, EGF e PDGF, que estavam ligados de forma inativa a componentes da MEC, como os proteoglicanos. Alguns destes fatores irão também atrair células imunocompetentes, entre elas, macrófagos, monócitos e neutrófilos. Estas por sua vez, além de reciclarem a matéria orgânica oriunda do processo de cicatrização, secretarão fatores pró-angiogênicos como o fator de crescimento endotelial vascular (VEGF), que irá estimular a proliferação das células endoteliais, responsáveis pela formação de novos vasos sanguíneos no sítio da lesão. Ao mesmo tempo em que todos estes eventos estão acontecendo no estroma, às células epiteliais reduzem sua adesão à MEC e umas às outras, alterando a expressão de integrinas e suprimindo a expressão de caderinas, com o intuito de tornarem-se mais móveis e repovoarem o local lesionado (Dvorak, 1986). De fato, estas alterações na homeostase tecidual causadas por uma lesão, em muito se assemelham com o que acontece com o microambiente onde surge o tumor. Vários estudos têm mostrado que o 21 estroma tumoral difere significativamente do estroma normal (Condon, 2005; Berry, 2008; Taylor, 2008; Josson, 2009; Nong Niu 2009). A alteração tecidual causada pelo CaP, por exemplo, leva a um aumento na proliferação e invasão das células tumorais, fazendo com que o estroma prostático gere uma resposta similar ao observado no processo de cicatrização (Singh, 2004). Os trabalhos clássicos de Olumi (1998,1999) forneceram as primeiras confirmações científicas sobre a importância do estroma na progressão do CaP. Nestes trabalhos, demonstrou-se que as células tumorais LNCaP quando injetadas em camundongos NUDE, não eram capazes de gerar tumores, já quando estas foram co-inoculadas juntamente com células estromais prostáticas, vários tumores foram gerados nestes mesmos animais. Os dados produzidos por Olumi também revelaram que as células estromais eram capazes de induzir aformação de tumores em camundongos NUDE, quando co-inoculadas com células transformadas, mas não neoplásicas. Na ocasião dos trabalhos acima referidos, o termo utilizado para identificar as células não neoplásicas associadas ao carcinoma era o de fibroblastos associados ao câncer (CAF). Posteriormente este termo caiu em desuso, pois distinguia apenas um componente, dentre os vários que constituem o estroma. Desde então, este compartimento passou a ser caracterizado de estroma reativo, por apresentar um fenótipo diferenciado do estroma normal, em função de um aumento no número de miofibroblastos, uma diminuição no número de células musculares lisas, além de uma maior deposição de componentes da MEC (Untergasser, 2005). Além disso, vários fatores que são secretados durante o processo de cicatrização, também são liberados com a formação do estroma reativo em resposta ao crescimento tumoral (Tuxnorn, 2001). Entre eles, estão fatores 22 como o FGF-2 (Yang, 2008), o fator de crescimento de tecido conectivo (CTGF) (Yang, 2005), o VEGF, o PDGF (Condon, 2005) e o TGF-β (Untergasser, 2005). O TGF-β em especial, desempenha um papel fundamental na formação do estroma reativo, desencadeando a mudança no fenótipo das células que compõem este compartimento. Sob a influência deste fator, o estroma prostático que originalmente era composto por um grande número de células musculares lisas, caracterizadas pela expressão de proteínas de citoesqueleto como desmina, calponina, além da cadeia pesada da miosina, agora se torna mais fibroso, com um significativo aumento no numero de miofibroblastos (Tuxhorn, 2002; Tabela 1). Esta mudança no fenótipo estromal também induz o remodelamento da MEC, que irá levar à liberação de novos fatores de crescimento e de moléculas da MEC, como os colágenos I e III (Untergasser, 2005), tenascina C e versican, (Xue, 1998 e Ricciardelli, 1998), além das MMPs 2 e 9 (Wilson, 2002). Também foi demonstrado que o TGF-β quando inibido, diminui a formação de novos vasos sanguíneos em modelo de xenoenxerto de CaP (Tuxhorn, 2002), assim como reduz a apoptose dos miofibroblastos prostáticos (Singh, 2004). Foi demonstrado pela técnica de microarranjos de DNA que o estroma reativo apresenta uma assinatura genética singular em comparação ao estroma normal, sendo este então caracterizado pelo aumento na expressão dos genes MRE11A, HUS1 e RAD17 (Ittmann, 2009). Coforme relatado neste mesmo trabalho, estes genes estão relacionados com o processo de reparo do DNA e com o aumento na geração de espécies reativas de oxigênio em virtude do processo inflamatório desencadeado pelas células tumorais. A reatividade estromal prostática não é uma resposta exclusiva do crescimento neoplásico 23 maligno. A HPB que é caracterizada como um crescimento tumoral benigno da próstata (Walsh, 2003) e ocorre de maneira concomitante ao câncer, em mais de 80% dos casos (Bushman, 2009). Além disso, ambas as patologias são marcadas pela presença de um forte processo inflamatório (Theyer, 1992), onde ocorre a liberação de fatores como o TGF-β e a interleucina 8, que contribuem para a formação de um estroma que também é caracterizado como reativo, pois este apresenta um fenótipo similar ao observado no estroma tumoral (Schauer., 2007). Em função do exposto acima e em virtude de aspectos éticos que impossibilitam a obtenção de fragmentos de câncer de próstata em estágio inicial, a utilização de tecido derivado de HPB para obtenção in vitro do estroma reativo, representa em nosso ponto de vista, o modelo de estudo ideal para se avaliar como as interações mediadas por este compartimento contribuem para a progressão tumoral prostática. Desta maneira, nós “dissecamos” o estroma reativo in vitro avaliando como as interações célula-célula, célula-MEC e célula-fatores solúveis influem na progressão tumoral das células LNCaP . vimentina + α - actina de músculo liso + desmina - calponina - cadeia pesada da miosina - Tabela 1: Padrão de expressão de elementos do citoesqueleto pelo estroma reativo de próstata (Tuxhorn, 2001). 24 2. OBJETIVO GERAL Avaliar in vitro a influência do estroma reativo sobre a progressão tumoral prostática, utilizando as células LNCaP. 2.1. OBJETIVOS ESPECÍFICOS • Estabelecer e caracterizar morfologicamente uma população estromal homogênea derivada de Hiperplasia Prostática Benigna. • Estabelecer co-culturas de células estromais com as células tumorais LNCaP. • Avaliar a morfologia, a atividade proliferativa, a apoptose e a migração das células LNCaP co-cultivadas com as células estromais, cultivadas na presença de meio condicionado produzido pelas células estromais e cultivadas sobre substrato de matriz extracelular secretado pelas células estromais. 25 3. MATERIAIS E MÉTODOS 3.1. Obtenção e caracterização da população homogên ea de células estromais de HPB Fragmentos de ressecção trans uretral prostática (RTU) foram obtidos de cirurgias realizadas no Hospital Geral do Andaraí, oriundos de paciente com critérios clínicos para HPB, com indicação cirúrgica e PSA inferior a 2,5, e utilizados para a obtenção das células estromais. Este procedimento foi aprovado pelo Comitê de Ética do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho da Universidade Federal do Rio de Janeiro, protocolo nº CAAE-0029.0.197.000- 05. O diagnóstico de HPB foi confirmado pelo exame histopatológico dos fragmentos teciduais restantes. O material foi acondicionado em Dulbbecos Modified Eagles Médium (DMEM; Sigma) estéril com penicilina/estreptomicina a 1% e preservado no gelo para evitar contaminação antes do processamento. Fragmentos de 1 a 3 mm3 foram cultivados em placa de 24 poços contendo DMEM suplementado com 10% de Soro Fetal Bovino (SFB). Os fragmentos foram mantidos sob condições controladas de CO2 (5%) e temperatura (37ºC), sendo o meio trocado a cada dois dias. Após as células aderirem ao fundo da placa de cultura, estas foram tripsinizadas e passadas para garrafas de 25 mm. Após sucessivas passagens, foi estabelecida uma população homogênea de células estromais de HPB. A fim de identificar o fenótipo das células estromais derivadas de HPB, em cada passagem as culturas foram caracterizadas imunocitoquímicamente para elementos do citoesqueleto. Após a remoção dos sobrenadantes, as células foram lavadas por duas vezes com PBS, antes de serem fixadas com paraformaldeído 4% (Sigma), por dez minutos em temperatura ambiente. Após a 26 fixação, foram lavadas por três vezes com PBS e então incubadas em uma solução de NH4Cl 50 nM (Vetec), por 30 minutos. Os sítios inespecíficos foram bloqueados após 30 minutos de incubação com PBS/BSA 5% e em seguida foram adicionados os anticorpos primários overnight. Para a identificação dos elementos do citoesqueleto foram utilizados os anticorpos anti-vimentina (Sigma, na diliuição de 1/100), anti-α-actina de músculo liso (Sigma, 1/400), anti- citoqueratina peptídeo 18 (Sigma, 1/400) e anti-desmina (Dako, 1/50). Para a identificação das proteínas da MEC foram utilizados os anticorpos anti- fibronectina (Sigma, 1/200), anti-laminina (Sigma, 1/100), anti-colágeno tipo I (Novotec, 1/25), anti-colágeno tipo III (Novotec, 1/25), anti-colágeno tipo IV (Sigma, 1/200) e anti-condroitin sulfato (Sigma, 1/200). Após a incubação com os anticorpos primários, as células foram lavadas com PBS e incubadas por duas horas com anticorpo secundário Alexa 488 Goat Anti Mouse (Invitrogen). Os núcleos celulares foram marcados com DAPI (4',6-diamidino-2-phenylindole dihydrochloride, Santa Cruz Biotechnology). Ao final, as células foram lavadas com águadestilada e montadas sobre lâminas histológicas com N- propilgalato (Sigma), antes de serem analisadas e fotografadas (Hamamatsu orca2), por meio de microscopia de fluorescência (Confocal Olympus IX81). 3.2. Cultivo da linhagem de células tumorais prostá ticas LNCaP A linhagem de células LNCaP é caracterizada como uma linhagem tumoral humana de CaP andrógeno-dependente de baixa agressividade, derivada de metástases linfonodais (Julius, 1983). Esta linhagem foi obtida no Instituto Nacional do Câncer (INCA) e mantida rotineiramente em meio de cultura RPMI suplementado com 10% de SFB, exceto na condição controle ou nas condições 27 experimentais (sobre as células estromais, na presença do meio condicionado ou sobre a MEC), em que a suplementação de SFB adotada foi a mínima necessária para a manutenção da viabilidade celular (0,5%) sem, contudo interferir na análise dos experimentos . 3.3. Co-cultura das células LNCaP com as células es tromais 1x105 células estromais foram cultivadas em placa de 6 poços com meio completo por 72 horas. Após atingirem a confluência, o meio foi retirado, os poços lavados com solução salina balanceada (BSS) e as células estromais foram incubadas com o corante fluorescente vital green CMFDA (Molecular Probes) numa concentração de 5µM em DMEM sem soro, por 45 minutos. Este marcador intracelular é capaz de se difundir pela membrana plasmática de células vivas e possui em sua estrutura o diacetato de fluoresceína, que uma vez em meio intracelular é convertido por esterases e enzimas do complexo glutationa transferase em um composto fluorescente e estável, por pelo menos 72 horas. Após esta etapa, as células foram lavadas e incubadas por mais uma hora em DMEM suplementado com 10% de SFB antes de serem lavadas mais uma vez com BSS. Após as células estromais incorporarem o corante, 2,5 x 105 células LNCaP foram lançadas sobre estas, em meio DMEM com 0,5% de SFB, por um período de 72 horas. Após este período, as células LNCaP foram separadas das células estromais marcadas com o corante por citometria de fluxo (MoFlo, Dako Cytomation) e então submetidas a ensaios de proliferação e apoptose. A excitação do fluorocromo foi feita a partir de um laser de argônio com um comprimento de onda de 488 nm e a emissão coletada através de um filtro de 530/40 nm. 28 3.4. Cultivo de células LNCaP com o meio condiciona do produzido pelas células estromais 5x104 células estromais foram cultivadas em placa de 24 poços com meio completo por 96 horas. Após atingirem a confluência, o meio foi retirado, os poços lavados com BSS e as células foram cultivadas por mais 24 horas em DMEM com 0,5% de SFB. Passado este período, o sobrenadante (meio condicionado) foi coletado, clarificado (centrifugado) e adicionado às células LNCaP (1x105), sendo estas cultivadas por 72 horas. 3.5. Cultivo de células LNCaP sobre a matriz extrac elular secretada pelas células estromais 5x104 células estromais foram cultivadas em placa de 24 poços com meio completo por 96 horas. Após atingirem a confluência, o meio foi retirado, os poços lavados com PBS suplementado com cloreto de cálcio (PBS-Ca) e então foram adicionados 300µL do tampão de lise celular composto por PBS-Ca; Leupeptina (Sigma 20 µM); PMSF (Sigma 1mM); Triton X-100 (Sigma 0,1%) e Hidróxido de Amônio (Vetec 0,1 nM) por 15 minutos. Este tampão é composto por reagentes como o hidróxido de amônio que lisam estruturas celulares de modo que somente as proteínas secretadas pelas células estromais são preservadas, pois inibidores de protease como o PMSF e a leupeptina impedem a degradação peptídica por MMP’s por exemplo. Após esta etapa, os poços foram lavados por três vezes com PBS-Ca e então 1x105 células LNCaP foram cultivadas sobre o tapete de MEC secretada pelas células estromais durante 72 horas. 29 3.6. Análise da morfologia das células LNCaP A morfologia das células LNCaP foi avaliada por microscopia de contraste de fase e por marcações para o citoesqueleto de actina, com a toxina fúngica faloidina. Para a análise da morfologia das células LNCaP cultivadas sobre as células estromais utilizou-se a citoqueratina peptídeo 18, que é um marcador tipicamente epitelial, não expresso por células de origem mesenquimal, como as células do estroma. Após a remoção do meio de cultura, as células foram lavadas por duas vezes com PBS, antes de serem fixadas com paraformoldeído 4%, por dez minutos em temperatura ambiente. Após a fixação, as células foram lavadas por três vezes com PBS e então foram incubadas em uma solução de NH4Cl 50nM por trinta minutos. Após rápida lavagem e permeabilização com Triton X-100 0,1%, por 30 minutos, as células foram incubadas com faloidina Cy3 (Sigma), diluída na proporção de 1/100 em PBS, em câmara escura e úmida por 60 minutos. Após a incubação e lavagem das células por três vezes novamente com PBS, estas foram reincubadas com DAPI por 5 minutos. Ao final, as células foram lavadas com água destilada e montadas sobre lâminas histológicas com N- propilgalato, antes de serem analisadas e fotografadas. 3.7. Ensaio de proliferação celular O cristal violeta é um corante catiônico e, portanto possui uma alta afinidade por estruturas aniônicas como o DNA, que em função disso é utilizado para avaliar a proliferação de células in vitro. Logo, quanto maior o número de células, maior será a quantidade de cristal violeta incorporada ao DNA e sendo 30 assim maior será a absorbância gerada. Após lavagem com PBS, as células foram fixadas em etanol 100% por 10 minutos e então coradas com cristal violeta 0,05% (Vetec) por mais 10 minutos. Após a incorporação do corante, as células foram lavadas com água destilada e incubadas em metanol por 5 minutos em uma placa agitadora. Após a solubilização do corante pelo metanol, o sobrenadante foi recolhido e a absorbância quantificada em leitor de ELISA (iMARK BIO-RAD) a 490 nm. A proliferação também foi avaliada pela imunomarcação para histona H3p. Após a remoção dos sobrenadantes, as células foram lavadas por duas vezes com PBS, antes de serem fixadas com paraformaldeído 4% (Sigma), por dez minutos em temperatura ambiente. Após a fixação, foram lavadas por três vezes com PBS e então incubadas em uma solução de NH4Cl 50 nM (Vetec), por 30 minutos. Os sítios inespecíficos foram bloqueados após 30 minutos de incubação com PBS/BSA 5% e em seguida foi adicionado o anticorpo primário anti-histona H3p na diluição de 1/500 overnight. Após a incubação com o anticorpo primário, as células foram lavadas com PBS e incubadas por duas horas com anticorpo secundário Alexa 488 Goat Anti Rabbit (Invitrogen). Os núcleos celulares foram marcados com DAPI (4',6- diamidino-2-phenylindole dihydrochloride, Santa Cruz Biotechnology). Ao final, as células foram lavadas com água destilada e montadas sobre lâminas histológicas com N- propilgalato (Sigma), antes de serem analisadas e fotografadas (Hamamatsu orca2), por meio de microscopia de fluorescência (Confocal Olympus IX81). 31 3.8. Avaliação do ciclo celular O iodeto de propídeo é um fluorocromo que possui alta afinidade por estruturas eletronegativas como o DNA. Este se intercala entre as bases nucléicas nitrogenadas e desta forma é possível correlacionar às fases do ciclo celular de acordo com a quantidade de DNA ligada ao iodeto de propídeo. Após serem tripsinizadas, as células LNCaP foram centrifugadas e 1x105 células foram ressuspendidas em 200 µL da solução de iodeto de propídeo (PBS; Triton X-100 0,1%; Rnase 0,1% e iodeto de propídeo 50µg/mL – Sigma) e incubadas por 5 minutos no gelo. Após o tempo de incubação, o ciclo celular foi avaliado por citometria de fluxo (FACScalibur Becton Dickison) após a aquisição de 20.000 eventos. A excitação do fluorocromo foi feita a partir de umlaser de argônio com um comprimento de onda de 488 nm e a emissão coletada através de um filtro de 630/22 nm. 3.9. Ensaio de apoptose Em uma situação de homeostase celular, o fosfolipídio fosfatidilserina se localiza na face interna da membrana citoplasmática, e durante o estágio inicial do processo de apoptose, este é externalizado. A proteína anexina V é capaz de se ligar a fosfatidilserina e, portanto detectar fases iniciais da morte celular por apoptose. As células LNCaP foram tripsinizadas, centrifugadas e tiveram seu sobrenadante recolhido. 1x105 células foram ressuspendidas em 400 µLde tampão de ligação acrescido de 5 µL de anexina V FITC e 5 µL de iodeto de 32 propídeo (Apoptosis Detection Kit II BD Biosciences), por 15 minutos em temperatura ambiente. Após o tempo de incubação, a porcentagem de células positivas para anexina V foi avaliada por citometria de fluxo (FACScalibur Becton Dickison), após a aquisição de 20.000 eventos. A excitação do fluorocromo foi feita a partir de um laser de argônio com um comprimento de onda de 488 nm e a emissão foi coletada através de um filtro de 530/30 nm. 3.10 Ensaio de migração celular Após serem tripsinizadas, 1x105 células LNCaP foram cultivadas sobre as células estromais, sobre a MEC ou com o meio condicionado, por um período de doze horas, em uma câmara de cultivo com condições controladas de CO2 e temperatura, adaptada a um microscópio invertido Nikon Eclipse TE300. Durante este período, foram capturadas imagens da cultura por contraste de fase, a cada minuto, com o auxílio de uma câmera fotográfica Hamamatsu C2400. Após a montagem dos filmes de cada situação de cultivo, 10 células diferentes foram marcadas com um ponto preto, de diâmetro cerca de 10 vezes menor que o diâmetro da célula, com o auxílio do programa image J (National Institute of Health, USA), em intervalos de tempo de 10 minutos. As trajetórias das células marcadas foram obtidas usando o programa ImageJ e a partir das mesmas, usando o programa Kaleidagraph (Synergy Software, USA), duas velocidades de deslocamento das células foram determinadas, a velocidade de afastamento Va e a velocidade tangencial Vt. A velocidade de afastamento representa o maior deslocamento realizado pela célula em relação ao seu ponto de partida. Ela é obtida dividindo-se o deslocamento máximo 33 realizado pela célula pelo tempo de observação, que no caso foi de 12 horas. A velocidade tangencial representa o deslocamento total realizado pela célula no período de 12 horas de observação. Neste caso, ao invés de se avaliar o deslocamento referente ao ponto inicial e ao ponto mais distante alcançado pela célula, todo o trajeto percorrido por ela é levado em consideração. Na determinação da velocidade tangencial considera-se o movimento da célula como tendo sido realizado sem mudanças de direção, ao longo de uma reta. A velocidade tangencial diz respeito a como a maquinaria da célula está preparada para migração. Já a velocidade de afastamento traz informação de quão direcionado está o movimento da célula. Para avaliar o erro na determinação da velocidade tangencial que vem da marcação de células realizadas anteriormente às análises de suas trajetórias, um filme com 72 imagens iguais obtidas de uma foto de um instante qualquer na situação controle foi criado. O procedimento de marcação e análise das imagens foi realizado como descrito anteriormente e a velocidade de erro Verro foi deterinada. A velocidade de erro é originada por deslocamentos aleatórios que surgem no processo de marcação das células. Para essa situação a velocidade resultante da soma da velocidade tangencial e a velocidade de erro pode ser escrita como: .errotR VVV rrr += (equação1). Utilizando a Equação 1, o módulo de VR é escrito como: ),cos(2222 θtRerrotR VVVVV ++= (equação 2), onde θ é o ângulo formado entre as velocidades tangencial e de erro. θ varia aleatoriamente no processo de marcação. Assumindo que tanto Vt como Verro são constantes no processo e que apenas o ângulo θ varia no processo de marcação: ,)cos(2222 θtRerrotR VVVVV ++= (equação 3), onde 34 corresponde ao valor médio da grandeza em seu interior: . 1 1 ∑ = = N i iyN y (equação 4). Como 0)cos( =θ tem-se que: ,222 errotR VVV += (equação 5) da qual se obtém o valor da velocidade tangencial corrigida: .222 erroRt VVV −= 3.11. Análise Estatística As análises estatísticas foram realizadas utilizando-se o programa GraphPad Prism 4.0. Os dados obtidos foram analisados através do teste T de Student, exceto nos ensaios de migração, onde foi utilizado o teste não paramétrico de Kruskal-Wallis, com aproximação gaussiana na determinação do valor. Os valores considerados estatisticamente significativos foram aqueles em que a diferença foi inferior a p<0.05. 35 4. RESULTADOS 4.1. Caracterização do estroma reativo A partir da obtenção de fragmentos de HPB, obtivemos uma cultura primária deste tecido, cujas células foram caracterizadas a cada passagem, onde observou-se uma diminuição gradativa na quantidade de células arredondadas de aspecto epitelial e um aumento na quantidade de células alongadas e com prolongamentos de aspecto fibroblastóide, conforme demonstrado pelas imagens obtidas por microscopia de contraste de fase (Figura 6 A,B). Após seis passagens obteve-se uma população de células fibroblastóides positivas para vimentina (Figura 6 C,D), α-actina de músculo liso (Figura 6 E,F) e negativas para citoqueratina 18 (Figura 6 G) e desmina (Figura 6 H), revelando assim o isolamento de uma população homogênea de células estromais e de fenótipo reativo. 36 CS C VM A B αααα- SMA LM FN E F H VM A D C H G F E B B C D E F G V M V M α α B V M α Act E CK (- ) G DM (- ) H V M C α Act F V M D V M C A B 100 µm 100 µm 100 µm 50 µm 100 µm 50 µm 100 µm 100 µm H G F E D C Figura 6: Caracterização da linhagem estromal. Micrografias de contraste de fase de cultura primária prostática (A-B) e de imunomarcação para vimentina (C-D), α- actina de músculo liso (E-F), citoqueratina 18 (G) e desmina (H). Notar a presença de células com morfologia arredondada tipicamente epitelial ainda na 1ºpassagem (A – seta) e de células com aspecto tipicamente fibroblastóide a partir da 6º passagem (B) e de fenótipo reativo (C-H). 37 4.2. Influência do estroma reativo sobre a morfolog ia das células LNCaP As células LNCaP apresentaram uma clara diferença quanto à sua morfologia entre as distintas condições de cultivo. Quando cultivadas na presença de meio suplementado com quantidade mínima de SFB (0,5%) (controle; Figura 7A, B) ou mesmo sobre as células estromais, estas células apresentaram uma forma mais arredondada, formando pequenos grumos, que muitas vezes se dispunham de maneira cordonal (Figura 7 C,D). Este padrão de organização morfológica foi similar aquele observado quando as células LNCaP foram cultivadas com o meio condicionado (Figura 7 E,F). Quando cultivadas sobre o tapete de matriz extracelular produzido pelas células estromais (Figura 7 G,H) ou em meio completo (Figura 8 A), a morfologia das células LNCaP diferiu de maneira considerável em relação às condições anteriores. Nestas circunstâncias, pode-se notar uma maior confluência da cultura, uma maior expansão citoplasmática com um consequente aumento no número de interconexões entre as células, formando uma monocamada em forma de rede com a típica morfologia fusiforme que caracteriza estas células. 38 200 µm 200 µm 200 µm 200 µm B H D F A G C E 100 µm 100 µm 100 µm 100 µm H F D B Figura 7: Morfologia das célulasLNCaP após distint as condições de cultivo. Controle (células cultivadas com 0,5% SFB) (A-B), células cultivadas sobre as células estromais (C-D), com meio condicionado (E-F) e sobre a MEC secretada. Micrografias de contraste de fase (A,C,E,G), de marcação para faloidina (B,F,H) e de imunomarcação para citoqueratina 18 (D). 39 4.3. Os fatores solúveis e a matriz extracelular se cretados pelo estroma reativo induzem a proliferação das células tumorais LNCaP Após o co-cultivo das células estromais marcadas com Green CMFDA, com as células LNCaP (Figura 8 A,B), verificou-se a eficiência de separação deste modelo por citometria de fluxo (Figura 9 A,B), permitindo assim, a segregação de ambas as populações celulares com uma eficiência de 99.30%. Após isto, foi verificado que as células LNCaP quando cultivadas sobre as células estromais não exibiram diferença significativa quanto a sua atividade proliferativa (Figura 10 A). Já quando estas células foram cultivadas na presença do meio condicionado produzido pelas células estromais, pode-se notar um aumento significativo na proliferação das células LNCaP em relação ao controle (Figura 10 B), mas que ainda assim, foi menos significativo que o aumento na proliferação induzido pela MEC (Figura: 10 C,D). Além disso, quando cultivadas sobre a MEC estromal, as células LNCaP demonstraram um perfil de ciclo celular, típico de células que estão se dividindo ativamente, com um percentual de células na fase S significativamente maior que o controle, além de um maior percentual de células também na fase G2/M (Figura 11 A,B). 40 Figura 8: Modelo esquemático de co -cultivo celular. Obtenção das células estromais a partir de fragmentos de HPB obtidos por ressecção trans uretral prostática e isolamento da população estromal após seis sucessivas passagens. Co-cultivo das células LNCaP com as células estromais marcadas com green CMFDA (B). Micrografia de microscopia de fluorescência das células estromais marcadas com green CMFDA após 72 horas de cultivo (C). B C 41 Figura 9: Separação celular por citometria de fluxo . Padrão de emissão de fluorescência das células LNCaP (A superior esquerda), padrão de emissão de fluorescência das células LNCaP pós sorting (A superior direita). Diferenças nos picos de emissão de fluorescência da co-cultura entre as células estromais marcadas com Green CMFDA e as células LNCaP (B inferior esquerda) e padrão de emissão de fluorescência das células LNCaP após o sorting da co-cultura (B inferior direita). 42 Figura 10: Análise da proliferação das células LNCa P através da incorporação de cristal violeta. Análise colorimétrica da incorporação de cristal violeta setenta e duas horas após o cultivo das células LNCaP sobre as células estromais (A), com o meio condicionado (B) e sobre a MEC (C). Imunomarcação para histona H3p após cultivo das células LNCaP sobre a MEC (D). Notar que apesar de o meio condicionado e a MEC induzirem a proliferação das células LNCaP, a MEC o fez de maneira mais acentuada. D/O = Densidade Óptica; ** = p<0.01, *** = p<0.0001. 43 Figura 11: Avaliação do ciclo celular das células LNCaP após c ultivo sobre a MEC. Após setenta e duas horas de cultivo, as células LNCaP foram marcadas com iodeto de propídeo e analisadas por citometria de fluxo (A). Percentual de células na fase S e G2/M do ciclo celular (B). * = p<0.05. Observe a diferença significativa de células LNCaP na fase S do ciclo celular em relação ao controle quando cultivadas sobre a MEC produzida pelo estroma reativo. 44 4.4. As interações célula/célula e célula/matriz ex tracelular modulam a sobrevivência das células tumorais LNCaP O percentual de células LNCaP positivas para a proteína Anexina V quando cultivadas sobre as células estromais (Figura 12 A) ou sobre a MEC produzida por estas células (Figura 12 C), foi significativamente menor que o controle (meio com quantidade mínima de SFB) em ambas as situações. Isto demonstra que tanto os elementos de matriz extracelular produzidos pelo estroma reativo, quanto as próprias células estromais modulam positivamente a sobrevivência das células LNCaP. ao impedir que estas entrem em apoptose (Figura 12 D). Quando cultivadas na presença do meio condicionado, não foi verificada diferença significativa no percentual de células LNCaP positivas para a proteína Anexina V em relação ao controle (Figura 12 B). 45 Figura 12: Avaliação da Apoptose por citometria de fluxo através da marcação para Anexina V. Histograma referente a emissão de fluorescência para Anexina V nas células LNCaP cultivadas por setenta e duas horas sobre as células estromais (A), na presença do meio condicionado (B) e sobre a MEC (C). Percentual de células positivas para anexina V (D). * = p<0.05. Note que as células LNCaP entraram menos em apoptose sobre as células estromais ou quando cultivadas sobre a MEC, 46 4.5 A motilidade das células LNCaP é modulada de d iferentes maneiras pelo estroma reativo O ensaio de videomicroscopia utilizado para avaliar a migração das células LNCaP, revelou que as interações entre os componentes estromais e as células tumorais geram respostas distintas quanto à motilidade destas células. Quando comparadas à situação controle (Figura 13 A), a velocidade de afastamento foi significativamente diferente para as demais situações consideradas, sendo que a maior diferença foi observada quando as células LNCaP foram cultivadas sobre a MEC (Figura 13 A). Por outro lado, a velocidade tangencial, que representa o deslocamento total das células LNCaP em determinado período de tempo foi significativamente diferente em relação à situação controle para as células cultivadas sobre a MEC (Figura 13 B) e para células cultivadas sobre células estromais (Figura 13 B). Não houve diferença significativa entre os valores da velocidade tangencial obtidos para a situação controle e para células LNCaP cultivadas na presença do meio condicionado produzido pelas células estromais (Figura 13 B). 47 Figura 13: Análise da migração celular por videomic roscopia. Velocidade de afastamento das células LNCaP (A) e velocidade tangencial das células LNCaP (B). * = p < 0.05, ** = p < 0.01, *** = p<0.001 48 4.6. A matriz extracelular secretada pelo estroma r eativo induz a proliferação das células tumorais LNCaP independent emente do tecido de origem Como a linhagem estromal isolada em nosso estudo foi derivada de um único paciente com HPB, nós decidimos verificar se a contribuição da MEC para a progressão tumoral in vitro das células LNCaP observada em nossos dados, não era resultado apenas de uma interação singular, entre a MEC produzida por nossa linhagem estromal e as células LNCaP. Para tal, nós isolamos duas outras linhagens estromais primárias de HPB e juntamente com a linhagem que foi utilizada em nosso estudo, nós avaliamos a proliferação das células LNCaP sobre a MEC produzida por estas três diferentes linhagens. Observamos que a proliferação das células LNCaP foi positivamente modulada pela MEC secretada por todas as linhagens estromais (Figura 13). 49 controle P1 P2 P3 0 1 2 72 horas D /O ( 57 0 nm ) * * * * * * Figura 14: Análise da proliferação das células LNCaP após cultivo sobr e a MEC de três diferentes pacientes. Análise colorimétrica da incorporação de cristal violeta, setenta e duas horas após o cultivo das células LNCaP, sobre a MEC obtida a partir do isolamento de linhagens estromais, oriundas de três diferentes pacientes. Paciente 1 (P1), paciente 2 (P2) e paciente 3 (P3). Notar que MEC derivada dos três pacientes
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