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19 produção mais rápida através dos avanços tecnológicos causados pela Revolução Industrial. Nesse sentido, Iglesias (1981, p. 40-41) explica que: Do século XV ao XVIII verificou-se verdadeira mudança de mentalidade. A mecânica e a técnica, de menosprezadas, passaram a supervalorizadas. Não é generalizada essa aceitação, pois os preconceitos têm raízes fundas, dificilmente removíveis. Ainda no século XVIII e mesmo nos seguintes, até o atual, encontra-se certa atitude de suspeita ante o manual ou mecânico, enquanto se realça o ócio, o lazer, a condição de nobreza, que não trabalha ou só trabalha com a inteligência e exerce o comando. Daí a desconsideração com tarefas como as agrícolas - revolver as terras com as mãos - as artesanais ou manufatureira, ou mesmo as comerciais (...). Curioso lembrar como os médicos, forrados de humanismo, não tinham respeito pelos cirurgiões, pois exerciam labor mecânico. Até 1743 - repare-se a data - eram vistos como espécie de barbeiros. 4. A LEGISLAÇÃO QUE EMBASA A EDUCAÇÃO BÁSICA NO BRASIL Fonte: topleituras.com/livros A Educação Infantil da forma como é entendida e oferecida no Brasil atualmente teve seu percurso iniciado com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que firmou o atendimento em creches e Pré-escolas como direito social das crianças ao reconhecer a oferta da Educação Infantil como dever do Estado. Essa conquista foi fruto da ampla participação dos movimentos de mulheres, de trabalhadores, da redemocratização do país e dos próprios profissionais da educação (BRASIL, 2010). Outro passo importante foi dado em 1996, com a publicação da Lei nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), a 20 partir da qual a Educação Infantil passou a ser vista como a etapa inicial da Educação Básica, passando a fazer parte dela juntamente com o Ensino Fundamental e com o Ensino Médio. No art. 29 dessa lei está posto que: [...] a Educação Infantil, primeira etapa da Educação Básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança de até 5 (cinco anos), em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade (BRASIL, 1996). Dois anos após a publicação da LDB foram publicados os Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (BRASIL, 1998), como parte dos documentos dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s), que reuniram objetivos, conteúdos e orientações didáticas para a Educação Infantil. Em 7 de abril do ano seguinte, a Resolução CEB nº 1 instituiu as primeiras diretrizes curriculares nacionais para a Educação Infantil a serem observadas na organização das propostas pedagógicas das instituições de Educação Infantil integrantes dos diversos sistemas de ensino (BRASIL, 1999). Em 2006, por conta de uma alteração na LDB, a idade de acesso ao Ensino Fundamental foi alterada para os 6 anos, e a Educação Infantil passou a atender crianças de até 5 anos e 11 meses (BRASIL, 1996). Em 2009, a Emenda Constitucional nº 59 determinou a obrigatoriedade da Educação Infantil para crianças de 4 e 5 anos de idade. Esse documento trouxe duas importantes inovações à Educação Infantil: a proposição das interações e da brincadeira como eixos do trabalho pedagógico e a indissociabilidade entre o cuidar e o educar. 4.1. Diretrizes curriculares para a Educação Infantil Com o objetivo de orientar as políticas públicas, a elaboração, o planejamento, a execução e a avaliação das propostas pedagógicas e curriculares voltadas para a Educação Infantil, a Resolução nº 5, de 17 de dezembro de 2009, fixou as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI) (BRASIL, 2009). No documento, a Educação Infantil é considerada a primeira etapa da Educação Básica oferecida em creches e Pré-escolas, caracterizadas: [...] como espaços institucionais não domésticos que constituem estabelecimentos educacionais públicos ou privados que educam e cuidam de crianças de 0 a 5 anos de idade no período diurno, em jornada integral ou 21 parcial, regulados e supervisionados por órgão competente do sistema de ensino e submetidos a controle social (BRASIL, 2009). As diretrizes reafirmam o dever do Estado, anteriormente previsto na Constituição Federal, de garantir a oferta de uma Educação Infantil pública, gratuita e de qualidade, sem requisito de seleção. Além disso, o DCNEI (2009), no artigo 4º, reconhece a criança como sujeito histórico e de direitos: [...] que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia, constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca, imagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, questiona e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo cultura (BRASIL, 2009). O currículo é concebido como um conjunto de práticas que visam a promover a articulação entre as experiências e os saberes infantis e os conhecimentos que fazem parte do patrimônio (cultural, artístico, ambiental, científico e tecnológico) da humanidade, de modo a promover o desenvolvimento integral das crianças desde o nascimento até os 5 anos de idade. A proposta pedagógica ou projeto pedagógico deve ser constituída como o plano orientador das ações que serão desenvolvidas nas instituições de Educação Infantil, definindo as metas pretendidas para a aprendizagem e para o desenvolvimento das crianças que nelas são educadas e cuidadas. Essa proposta deve ser elaborada coletivamente, envolvendo todos os atores do processo educativo (equipe gestora, professores e comunidade escolar), que de acordo com o art. 8º da DCNEI (2009), tem com o objetivo: [...] garantir à criança acesso a processos de apropriação, renovação e articulação de conhecimentos e aprendizagens de diferentes linguagens, assim como o direito à proteção, à saúde, à liberdade, à confiança, ao respeito, à dignidade, à brincadeira, à convivência e à interação com outras crianças (BRASIL, 2009). Uma das principais contribuições das DCNEI (BRASIL,2009) para as práticas pedagógicas diz respeito ao estabelecimento de dois eixos norteadores: as interações e a brincadeira. Esses eixos foram incorporados às propostas apresentadas pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC) (BRASIL, 2017), documento orientador da organização curricular no Brasil, desde a sua publicação em dezembro de 2017. 22 4.2. Base Nacional Comum Curricular (BNCC) Fonte: pinimg.com A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é um documento regulamentário que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver nas fases e modalidades da Educação Básica para que possam garantir seus direitos de aprendizagem e desenvolvimento, de acordo com o disposto no Plano Nacional de Educação (PNE). De acordo com Lei de Diretrizes e Bases da Educação (BRASIL, 1996), a BNCC deve nortear os currículos dos sistemas de ensino (municipal, estadual e federal) e as propostas pedagógicas das instituições públicas e privadas de ensino básico (BRASIL, 2017). Referência nacional para o desenvolvimento dos currículos das redes de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e das propostas pedagógicas dos estabelecimentos de ensino, a BNCC integra a política nacional de Educação Básica e contribui ao alinhamento de outras políticas e ações, nas esferas federal, estadual e municipal, relativas à formação de professores, avaliação, desenvolvimento de conteúdos educacionais e critérios para oferecer infraestrutura adequada ao pleno desenvolvimento da educação. Nesse sentido, a BNCC (2017) visa ajudar a superar a fragmentação da política educacional, promover o fortalecimento da cooperação entre os três poderes e ser um guia para a qualidade da educação. Portanto, além de garantir o acesso e permanência na escola, os sistemas, redes e escolas devem garantir um nívelcomum de aprendizagem para todos os alunos, tarefa para a qual a BNCC é uma ferramenta fundamental. No decorrer da Educação Básica, as aprendizagens essenciais definidas na BNCC (2017) devem concorrer para que os alunos desenvolvam dez competências 23 gerais, que consubstanciam, no contexto pedagógico, os direitos à aprendizagem e ao desenvolvimento. Nesse documento, a competência é definida como a mobilização de conhecimentos (conceitos e procedimentos), habilidades (práticas, cognitivas e socioemocionais), atitudes e valores para resolver demandas complexas da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do mundo do trabalho. Ao definir essas competências, a BNCC (2017) reconhece com base nos documentos da Secretaria de Direitos Humanos e da Organização das Nações Unidas que: a “educação deve afirmar valores e estimular ações que contribuam para a transformação da sociedade, tornando-a mais humana, socialmente justa e, também, voltada para a preservação da natureza” (BRASIL, 2013), mostrando-se também alinhada à Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU) (ONU, 2015) (BNCC, 2017, p. 8). As competências gerais da Educação Básica apresentadas na BNCC foram elaboradas de forma didática e estão interrelacionadas às três etapas da Educação Básica: Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio. Elas se articulam de forma que possibilitem a construção de conhecimentos, o desenvolvimento de habilidades e a formação de atitudes e valores, nos termos da LDB. As 10 competências Gerais da Educação Básica (BNCC, 2017, p. 9) são: 1. Valorizar e utilizar os conhecimentos historicamente construídos sobre o mundo físico, social, cultural e digital para entender e explicar a realidade, continuar aprendendo e colaborar para a construção de uma sociedade justa, democrática e inclusiva. 2. Exercitar a curiosidade intelectual e recorrer à abordagem própria das ciências, incluindo a investigação, a reflexão, a análise crítica, a imaginação e a criatividade, para investigar causas, elaborar e testar hipóteses, formular e resolver problemas e criar soluções (inclusive tecnológicas) com base nos conhecimentos das diferentes áreas. 3. Valorizar e fruir as diversas manifestações artísticas e culturais, das locais às mundiais, e também participar de práticas diversificadas da produção artístico- cultural. 4. Utilizar diferentes linguagens – verbal (oral ou visual-motora, como Libras, e escrita), corporal, visual, sonora e digital –, bem como conhecimentos das linguagens 24 artística, matemática e científica, para se expressar e partilhar informações, experiências, ideias e sentimentos em diferentes contextos e produzir sentidos que levem ao entendimento mútuo. 5. Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais (incluindo as escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva. 6. Valorizar a diversidade de saberes e vivências culturais e apropriar-se de conhecimentos e experiências que lhe possibilitem entender as relações próprias do mundo do trabalho e fazer escolhas alinhadas ao exercício da cidadania e ao seu projeto de vida, com liberdade, autonomia, consciência crítica e responsabilidade. 7. Argumentar com base em fatos, dados e informações confiáveis, para formular, negociar e defender ideias, pontos de vista e decisões comuns que respeitem e promovam os direitos humanos, a consciência socioambiental e o consumo responsável em âmbito local, regional e global, com posicionamento ético em relação ao cuidado de si mesmo, dos outros e do planeta. 8. Conhecer-se, apreciar-se e cuidar de sua saúde física e emocional, compreendendo-se na diversidade humana e reconhecendo suas emoções e as dos outros, com autocrítica e capacidade para lidar com elas. 9. Exercitar a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos e a cooperação, fazendo-se respeitar e promovendo o respeito ao outro e aos direitos humanos, com acolhimento e valorização da diversidade de indivíduos e de grupos sociais, seus saberes, identidades, culturas e potencialidades, sem preconceitos de qualquer natureza. 10. Agir pessoal e coletivamente com autonomia, responsabilidade, flexibilidade, resiliência e determinação, tomando decisões com base em princípios éticos, democráticos, inclusivos, sustentáveis e solidários. 4.2.1. Base Nacional Comum Curricular e Currículos A BNCC (2017) explica que ela e os currículos se identificam integralmente com os princípios e valores que orientam a LDB e as DCN. Por tanto, esse documento 25 reconhece que a educação tem responsabilidade com a formação e o desenvolvimento humano global, considerando as dimensões intelectual, física, afetiva, social, ética e simbólica. Além do mais, afirma-se que tanto a BNCC quanto os currículos têm funções complementares para garantir as aprendizagens essenciais para cada etapa da Educação Básica, “uma vez que tais aprendizagens só se materializam mediante o conjunto de decisões que caracterizam o currículo em ação” (BNCC, 2017, p. 16). São essas escolhas que vão adaptar as propostas da BNCC à realidade local, levando em consideração a autonomia dos sistemas ou redes de ensino e dos estabelecimentos escolares, bem como o contexto e as características dos alunos. Essas decisões, fruto da participação da família e da comunidade, referem-se a (BRASIL, 2017, p. 16): ➢ Contextualizar o conteúdo do componente curricular, identificar estratégias para apresentar, representar, ilustrar, conectar e dar sentido com base na realidade do lugar e do tempo em que a aprendizagem ocorre; ➢ Decidir formas de organização interdisciplinar dos componentes curriculares e fortalecer a competência pedagógica das equipes escolares para adotar estratégias mais dinâmicas, interativas e colaborativas relacionadas à gestão de ensino e aprendizagem; ➢ Escolher e aplicar diferentes métodos e estratégias didático-pedagógicas, utilizando diferentes ritmos e conteúdos complementares quando apropriado, de forma a responder às necessidades dos diferentes grupos de alunos, suas famílias e culturas de origem, suas comunidades, seus grupos de socialização, etc.; ➢ Projetar a implementação de situações e procedimentos para motivar e envolver os alunos na aprendizagem; ➢ Criar para aplicar processos de treinamento ou procedimentos de avaliação de resultados que levem em conta os contextos e as condições de aprendizagem, usando esses registros como referência para melhorar o desempenho da escola, do professor e do aluno; ➢ Selecionar, produzir, aplicar e avaliar recursos de ensino e tecnologia para apoiar o processo de ensino e aprendizagem; 26 ➢ Criação e fornecimento de materiais de orientação para professores e manutenção de processos permanentes de formação de professores que possibilitem a melhoria contínua dos processos de ensino e aprendizagem; ➢ Manter processos de aprendizagem contínua sobre gestão pedagógica e curricular para outros educadores da área de escolas e sistemas educacionais. De acordo com a BNCC (2017), essas decisões também precisam ser consideradas quando se organizam os planos de estudos e as propostas relativas às diferentes modalidades de ensino (Educação Especial, Educação de Jovens e Adultos, Educação do Campo, Educação Escolar Indígena, Educação Escolar Quilombola, Educação a Distância), conforme as orientações das Diretrizes Curriculares Nacionais. Ao falar da Educação Escolar Indígena, a BNCC explica que para garantir as competências específicas, precisa-se ter como base os princípios da: coletividade, reciprocidade, integralidade, espiritualidade e alteridade indígena, a serem desenvolvidas apartir de suas culturas tradicionais reconhecidas nos currículos dos sistemas de ensino e propostas pedagógicas das instituições escolares. Significa também, em uma perspectiva intercultural, considerar seus projetos educativos, suas cosmologias, suas lógicas, seus valores e princípios pedagógicos próprios (em consonância com a Constituição Federal, com as Diretrizes Internacionais da OIT – Convenção 169 e com documentos da ONU e Unesco sobre os direitos indígenas) e suas referências específicas, tais como: construir currículos interculturais, diferenciados e bilíngues, seus sistemas próprios de ensino e aprendizagem, tanto dos conteúdos universais quanto dos conhecimentos indígenas, bem como o ensino da língua indígena como primeira língua (BNCC, 2017, p. 17- 18). Também cabe aos órgãos federais, responsáveis pela implementação da BNCC, reconhecer a experiência curricular existente em seu campo de atuação e até mesmo conhecer as especificidades das diferentes modalidades. Muitas escolas públicas e privadas também adquiriram experiência no desenvolvimento curricular e na criação de materiais de apoio curricular, assim como as instituições de ensino superior adquiriram experiência em consultoria e apoio técnico ao desenvolvimento curricular. Fazer um balanço e avaliar todas essas experiências pode ajudar a aprender com os acertos e os erros e integrar as práticas que levaram a bons resultados (BNCC, 2017). Finalmente, cabe aos sistemas e redes educacionais, bem como às escolas, nas suas respectivas áreas de autonomia e competência, incorporar nos currículos e 27 propostas pedagógicas a abordagem dos problemas atuais que afetam a vida humana em o nível local, regional e global, preferencialmente de forma transversal e integrativa. Entre esses temas, destacam-se (BNCC, 2017, p. 19): ➢ direitos da criança e do adolescente (Lei nº 8.069/199016), ➢ educação para o trânsito (Lei nº 9.503/1997) (BRASIL, 1997), ➢ educação ambiental (Lei nº 9.795/1999, Parecer CNE/CP nº 14/2012 e Resolução CNE/CP nº 2/2012) (BRASIL, 1999; BRASIL, 2012), ➢ educação alimentar e nutricional (Lei nº 11.947/2009) (BRASIL, 2009), ➢ processo de envelhecimento, respeito e valorização do idoso (Lei nº 10.741/2003) (BRASIL, 2003), ➢ educação em direitos humanos (Decreto nº 7.037/2009, ➢ Parecer CNE/CP nº 8/2012 e Resolução CNE/CP nº 1/2012) (BRASIL, 2012), ➢ educação das relações étnico-raciais e ensino de história e cultura afro- brasileira, africana e indígena (Leis nº 10.639/2003 e 11.645/2008, ➢ Parecer CNE/CP nº 3/2004 e Resolução CNE/CP nº 1/2004) (BRASIL, 2003; BRASIL, 2008; BRASIL, 2004), bem como saúde, vida familiar e social, educação para o consumo, educação financeira e fiscal, trabalho, ciência e tecnologia e diversidade cultural (Parecer CNE/CEB nº 11/2010 e Resolução CNE/CEB nº 7/2010) (BRASIL, 2010). Na BNCC, essas questões são abordadas nas competências dos componentes curriculares e cabe aos sistemas de ensino e às escolas abordá-las contextualmente de acordo com suas especificidades (BNCC, 2017). 4.2.2. BNCC e Ensino Infantil Com a Constituição Federal de 1988, as creches e Pré-escolas para crianças de 0 a 6 anos foram transferidas para o estado. Mais tarde, com a entrada em vigor da LDB em 1996, a Educação Infantil passou a integrar o Ensino Fundamental e foi equiparada ao Ensino Fundamental e Médio. E desde a alteração da LDB em 2006, 28 que permitiu o acesso ao Ensino Fundamental a partir dos 6 anos, a Educação Infantil passou a abranger a faixa etária de 0 a 5 anos (BNCC, 2017). Embora reconhecida como direito de todas as crianças e dever do Estado, a Educação Infantil para crianças de 4 e 5 anos só se tornou obrigatória com a Emenda Constitucional nº 59/2009, que estabelece a obrigatoriedade da escolaridade de 4 a 17 anos de idade. Essa extensão obrigatória está incluída na LDB (2013) e consagra a obrigatoriedade da matrícula de todas as crianças de 4 e 5 anos na Educação Infantil. Com a inclusão da Educação Infantil na BNCC, mais um passo importante é dado nesse processo histórico de integração a toda a Educação Básica (BNCC, 2017). A Educação Infantil, como primeiro nível da Educação Básica, é o início e a base do processo educativo. Na maioria dos casos, o ingresso na creche ou Pré- escola significa que a criança primeiro desvincula-se de seus vínculos familiares afetivos para integrá-la em uma situação estruturada de socialização. Nas últimas décadas, consolidou-se o conceito de articulação entre educação e cuidado na Educação Infantil, em que o cuidado é entendido como algo indissociável do processo educativo (BNCC, 2017). Nesse contexto, as creches e pré-escolas, pretendem alargar o universo de vivências através da construção das experiências e saberes que as crianças têm no ambiente familiar e no contexto da sua comunidade, os seus saberes e competências em introduzir e articular as propostas pedagógicas dessas crianças, diversificação e consolidação de novos aprendizados, ações complementares à educação familiar, principalmente em relação à educação de bebês e crianças pequenas, o que implica aprender próximo aos dois contextos (família e escola), tais como socialização, autonomia e comunicação. Nessa direção, para melhorar a aprendizagem e o desenvolvimento das crianças, é essencial a prática do diálogo e da partilha de tarefas entre a instituição de Educação Infantil e a família. Além disso, a instituição deve conhecer e trabalhar com culturas plurais e dialogar com a riqueza/diversidade cultural das famílias e comunidades. Nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI, Resolução CNE/CEB nº 5/2009) (BRASIL, 2009) no artigo 4º a criança é definida como: Sujeito histórico e de direitos, que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia, constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca, imagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra, questiona e 29 constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo cultura (BRASIL, 2009). Conforme afirmado pela DCNEI no artigo 9º, os eixos estruturantes das práticas pedagógicas neste nível da Educação Básica são as interações e brincadeiras, experiências nas quais as crianças podem construir conhecimentos e aquisições, e interações com pares e adultos que as possibilitem para aprender ativar desenvolvimento e socialização. A interação durante a brincadeira molda a vida cotidiana das crianças e traz consigo muitas aprendizagens e oportunidades para o seu desenvolvimento integral. Por exemplo, ao observar as interações e brincadeiras entre crianças/crianças e entre crianças/adultos, podem ser identificadas demonstrações de afeto, mediação de frustração, resolução de conflitos e regulação de emoções (BNCC, 2017). Tendo em vista os eixos estruturantes das práticas pedagógicas propostas pela BNCC (2017) e as competências gerais da Educação Básica, seis direitos de aprendizagem e desenvolvimento na educação inicial (conviver; brincar; participar; explorar; expressar; conhecer-se) garantem as condições para que as crianças aprendam em situações que lhes permitam jogar um papel ativo em ambientes, que os convidem a vivenciar desafios e sejam motivados a resolvê-los, nos quais possam construir significados para si mesmos, para os outros e para o mundo social e natural (BNCC, 2017). A noção da criança que comparece no documento é como um ser que observa, questiona, formula hipóteses, lista conclusões, faz julgamentos e aceita valores, constrói conhecimentos e adquire conhecimentos sistematizados, por meio de ações e interações com o mundo físico e o social. Não se deve limitar esse aprendizado a um processo de desenvolvimento natural ou espontâneo. Ao contrário, se deve reforçar a necessidade de trazer a intencionalidade pedagógica para as práticas de sala de aulatanto na Educação Infantil quanto na Pré-escola (BNCC, 2017). Esta intenção consiste na organização e disponibilização por parte do educador de experiências que permitam às crianças conhecer a si e aos outros, conhecer e compreender as relações com a natureza, com a cultura e com as práticas de cuidados pessoais (alimentação, vestuário, higiene), brincando, experimentando diferentes materiais, aproximando-se da literatura e conhecendo pessoas. 30 Parte do trabalho do educador é refletir, organizar, planejar, selecionar, mediar e monitorar a variedade de práticas e interações para garantir um leque de situações que apoiam o pleno desenvolvimento das crianças, como a história de cada criança e de todo o grupo e suas conquistas, progressos, oportunidades e experiências de aprendizagem. Através de diversos registros feitos em diferentes momentos tanto pelos professores quanto pelas crianças (como fotos, relatórios, portfólios, desenhos e textos), é possível mostrar os avanços realizados durante o período observado. Classificar as crianças como aptas e inaptas, prontas ou não, maduras ou imaturas. Trata-se de conectar elementos para reorganizar espaços, tempos e situações que garantam os direitos de aprendizagem de todas as crianças (BNCC, 2017). Com o objetivo de regulamentar e organizar a Educação Infantil, o Ministério da Educação (MEC) publicou alguns documentos. Entre eles, pode-se considerar: ➢ As Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (BRASIL, 1998a, 1998b, 1998c), em três volumes, dois Planos Nacionais de Educação (BRASIL, 2001, 2014); ➢ Os Parâmetros de Qualidade para a Educação Infantil (BRASIL, 2006); Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (BRASIL, 2010); ➢ A Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017). Acerca da Educação Infantil, na BNCC há como proposição os direitos de aprendizagem e desenvolvimento e os campos de experiências, que se subdividem nas seguintes faixas etárias: 01 = Bebês (zero a 1 ano e 6 meses) 02 = Crianças bem pequenas (1 ano e 7 meses a 3 anos e 11 meses) 03 = Crianças pequenas (4 anos a 5 anos e 11 meses) (BRASIL, 2017, p. 26). No Quadro 1, a seguir, se pode ver a estrutura da Educação Infantil por faixa etária. 31 Quadro 1: Estrutura da Educação Infantil (BNCC) Fonte: BNCC (2017) A BNCC (2017) tem a concepção de criança que rompe com a visão “adultocêntrica” de educação, que anula as potencialidades das crianças e entende que a criança é protagonista. As crianças recebem uma cultura construída pela sociedade. Contudo, ao serem expostas e encorajadas a realizar atividades em uma instituição de Educação Infantil, podem transformar essa produção cultural, interpretando-a e integrando-a por meio de suas práticas (SARMENTO, 2013). Conforme esses direitos, princípios pedagógicos e com base na pedagogia das infâncias, a BNCC (2017) organiza a proposta curricular para a educação infantil através dos cinco campos de experiência. Eles são: ➢ o eu, o outro e o nós — interação consigo mesmo e com os pares, cultivando o respeito às diferenças; ➢ corpo, gestos e movimentos — expressão corporal, mais criatividade e maior habilidade na resolução de problemas; ➢ traços, sons, cores e formas — interação com manifestações artísticas, desenvolvimento da própria perspectiva cultural e apropriação cultural; ➢ escuta, fala, pensamento e imaginação — contato com o alfabeto, concepção da língua escrita e expressão de sentimentos, emoções e percepções próprios por meio da língua oral e da escrita espontânea; ➢ espaços, tempos, quantidades, relações e transformações — estabelecimento de relações sociais com os pares, primeiros entendimentos sobre o mundo sociocultural e curiosidade com o mundo além da própria casa. 32 4.2.3. BNCC e Ensino Fundamental A educação primária é o nível mais longo da Educação Básica, com nove anos e atende alunos entre 6 e 14 anos. Portanto, há crianças e adolescentes que vivenciam uma série de mudanças nesse período, relacionadas a aspectos físicos, cognitivos, afetivos, sociais e emocionais, entre outros. Conforme estabelecido nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica de Nove Anos (Resolução CNE/CEB nº 7/2010) (BRASIL 2010), essas mudanças colocam desafios ao desenvolvimento curricular para esse nível escolar, para superar as rupturas que ocorrem na transição não apenas entre os níveis da Educação Básica, mas também entre as duas fases do Ensino Fundamental: Anos Iniciais e Anos Finais. A BNCC (2017) dos anos iniciais do Ensino Fundamental, valorizando as situações lúdicas de aprendizagem, visa a necessária articulação com as experiências vividas na Educação Infantil. Essa articulação deve propiciar tanto a sistematização progressiva dessas experiências quanto o desenvolvimento, pelos alunos, de novas formas de relação com o mundo, novas possibilidades de leitura e formulação de hipóteses sobre os fenômenos, de vivê-los e de refutá-los. Este documento, valorizando as situações lúdicas de aprendizagem, visa a necessária articulação com as experiências vividas na Educação Infantil. Essa articulação deve propiciar tanto a sistematização progressiva dessas experiências quanto o desenvolvimento, pelos alunos, de novas formas de relação com o mundo, novas possibilidades de leitura e formulação de hipóteses sobre os fenômenos, de vivê-los, de refutá-los, numa atitude ativa na construção do conhecimento; a afirmação de sua identidade em relação ao grupo ao qual pertence leva a uma relação mais ativa com esse grupo e com as regras que regem as relações entre as pessoas dentro e fora da escola, por meio do reconhecimento de suas potencialidades e do acolhimento e valorizando as diferenças. As experiências também se tornam elementos importantes para a aquisição do sistema de escrita alfabética e outros sistemas de representação, como signos matemáticos, registros artísticos, cientistas, meios e formas para o desenvolvimento da oralidade e dos processos de percepção, compreensão e representação do tempo e do espaço. Os alunos são expostos a uma variedade de situações que empregam conceitos e práticas científicas, o desenvolvimento de observações, análises, 33 argumentos e o refinamento de descobertas. As vivências das crianças no seu contexto familiar, social e cultural, as suas memórias, a sua atribuição ao grupo e a sua interação com as mais diversas tecnologias de informação e comunicação são fontes que estimulam a sua curiosidade e a formulação de questões. Estimular o pensamento criativo, lógico e crítico, construindo e fortalecendo a capacidade de formular perguntas e avaliar respostas, de raciocinar, de interagir com as diferentes produções culturais e de utilizar as tecnologias de informação e comunicação possibilita aos alunos ampliar a compreensão de si mesmo, do mundo natural e social, das relações humanas entre si e com a natureza (BNCC, 2017). As características dessa faixa etária exigem um trabalho no ambiente escolar organizado em torno dos interesses das crianças, suas experiências mais imediatas, para que, a partir dessas experiências, elas ampliem gradativamente sua compreensão do que está acontecendo e suas habilidades mobilizam operações de complexidade e sensibilidade crescentes para entender, expressar e responder ao mundo. Durante os dois primeiros anos do Ensino Fundamental, a ação pedagógica deve se concentrar na alfabetização, a fim de proporcionar aos alunos amplas oportunidades de articular a aquisição do sistema de escrita alfabética com o desenvolvimento de outras habilidades de letramento e articular sua participação nas várias práticas de letramento. Conforme refere o Parecer CNE/CEB nº 11/2010, “os conteúdos dos vários componentes curriculares são [...], ao descortinarem às crianças o conhecimento domundo por meio de novos olhares, lhes oferecem oportunidades de exercitar a leitura e a escrita de um modo mais significativo” (BRASIL, 2010). Durante o Ensino Fundamental - Anos Iniciais, o avanço do conhecimento ocorre por meio da consolidação das aprendizagens anteriores e da ampliação das práticas linguísticas e da experiência estética e intercultural das crianças, utilizando- se tanto de seus interesses quanto de suas expectativas, pois o que ainda é necessário é ser considerado aprendido. Ampliam-se a autonomia intelectual, a compreensão das normas e interesses da vida social, o que lhes permite abordar sistemas mais amplos que afetam as relações dos sujeitos entre si, com a natureza, com a história, com a cultura, com as tecnologias e com o meio ambiente. Além destes aspectos relacionados com a aprendizagem e o desenvolvimento, na concepção dos planos de estudos e propostas pedagógicas, devem também ser 34 inclusas medidas para garantir que os alunos tenham um percurso de aprendizagem contínuo entre as duas fases do ensino básico, a fim de alcançar uma integração mais forte entre eles. Assim, esta transição é caracterizada por mudanças pedagógicas na estrutura educacional, que resultam principalmente da diferenciação dos componentes curriculares. Como aponta o Parecer CNE/CEB nº 11/2010, “os alunos, ao mudarem do professor generalista dos anos iniciais para os professores especialistas dos diferentes componentes curriculares, costumam se ressentir diante das muitas exigências que têm de atender, feitas pelo grande número de docentes dos anos finais” (BRASIL, 2010). Fazer os ajustes e articulações necessários tanto no 5º como no 6º ano, para apoiar os alunos neste processo de transição, pode evitar interrupções no processo de aprendizagem e garantir-lhes uma maior chance de sucesso (BNCC, 2017). Ao longo do Ensino Fundamental-Anos Finais, os alunos enfrentam desafios mais complexos, principalmente pela necessidade de se apropriar das diferentes lógicas de organização do conhecimento relacionadas aos domínios. Face a esta especialização acrescida, importa reintroduzir e ressignificar, nos vários componentes do currículo, as aprendizagens do ensino básico no contexto das diferentes áreas de forma a aprofundar e alargar o repertório dos alunos. Nesse sentido, também é importante fortalecer a autonomia desses jovens, proporcionando-lhes condições e ferramentas de acesso crítico e interação com diferentes fontes de conhecimento e informação. Os alunos dessa fase estão em uma faixa etária que corresponde à transição entre a infância e a adolescência, caracterizada por intensas mudanças decorrentes de transformações biológicas, emocionais, sociais e psicológicas. Neste período da vida, conforme Parecer CNE/CEB nº. 11/2010, os adolescentes enfatizam os laços sociais e afetivos, as possibilidades intelectuais e a capacidade de pensar de forma mais abstrata. Os alunos se tornam mais capazes de ver e avaliar os eventos da perspectiva uns dos outros praticando a capacidade de desfocar, importante para construir autonomia e adquirir valores morais e éticos. As mudanças inerentes a esse período da vida implicam na compreensão do adolescente como um sujeito em evolução, com particularidades e formações de identidade e cultura que exigem uma prática escolar diferenciada, capaz de levar em conta suas 35 necessidades e diferentes formas de convivência social. Como as DCN reconhecem, muitas vezes é nessa fase que se: observa forte adesão aos padrões de comportamento dos jovens da mesma idade, o que é evidenciado pela forma de se vestir e também pela linguagem utilizada por eles. Isso requer dos educadores maior disposição para entender e dialogar com as formas próprias de expressão das culturas juvenis, cujos traços são mais visíveis, sobretudo, nas áreas urbanas mais densamente povoadas (BRASIL, 2010). Em todos os níveis escolares, mas principalmente entre os alunos deste nível do Ensino Fundamental, esses fatores tendem a dificultar a convivência e a aprendizagem, levando ao desinteresse, à alienação e não raramente à agressividade e ao fracasso escolar. Consciente das culturas diversas, heterogêneas ou contínuas dos alunos nesta fase, é necessário que a escola se engaje em diálogo com a diversidade de formações e experiências para enfrentar com sucesso os desafios de seus propósitos educacionais. Entendendo os alunos como sujeitos com histórias e conhecimentos construídos nas interações com outras pessoas, tanto no ambiente social mais próximo quanto no universo da mídia e da cultura digital, fortalece o potencial da escola como formadora do espaço e orientadora de cidadania consciente, crítica e participativa. Assim, no Ensino Fundamental - Anos Finais, a escola pode contribuir para a formação do projeto de vida dos alunos, fazendo uma articulação não só com as aspirações desses jovens em relação ao seu futuro, mas também com a continuidade de seus estudos no Ensino Médio. Esse processo de reflexão sobre o que cada jovem quer ser no futuro e planejamento de ações para construir esse futuro pode ser mais uma oportunidade de desenvolvimento pessoal e social (BNCC, 2017). 4.2.4. Plano Nacional De Educação (PNE) A elaboração de um Plano Nacional de Educação (PNE) está diretamente relacionada à perspectiva de construção de um projeto de educação para o País, objetivando enfrentar os desafios necessários para a efetivação da educação pública e gratuita como um direito de todos (COELHO, 2016). Deste modo, a aprovação do PNE (2014-2014), por meio da Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014, pode ser compreendido com um esforço fundamental para a continuidade dos avanços das políticas de consolidação de direitos educacionais em curso no Brasil (MOLL, 2014). 36 Fonte: shre.ink/mwUj O PNE (2014-2024) foi organizado em 20 metas e 254 estratégias objetivando, entre outros aspectos, a erradicação do analfabetismo, a universalização do atendimento escolar e a melhoria da qualidade da educação (BRASIL, 2014). Entre as referidas metas está a de número 6 (seis) que determinou: “oferecer educação em tempo integral em, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) das escolas públicas, de forma a atender, pelo menos, 25% (vinte e cinco por cento) dos (as) alunos (as) da Educação Básica” (BRASIL, 2014). Especificamente em relação a essa meta, o Ministério da Educação (MEC) assumiu um papel de grande articulação para que as estratégias associadas ao tempo integral, presentes no referido plano, viessem ao encontro da experiência colocada em curso por meio do Programa Mais Educação (PME) (PARENTE, 2017), estratégia indutora de educação integral em tempo integral criada e operacionalizada pelo governo federal. A aprovação do PNE (2014-2014) trouxe à cena dois grandes desafios. O primeiro deles está associado ao fato de que a Lei que aprovou o Plano também determinou que a instâncias subnacionais devessem elaborar ou adequar os seus planos de educação, em conformidade com o Novo PNE, no prazo de um ano (BRASIL, 2014, Art. 8º). Esse processo enfrentaria desafios para a sua consolidação, em razão das dificuldades relacionadas à elaboração e aprovação dos planos no nível dos estados, dos municípios e do Distrito Federal (SOUZA; MENEZES, 2015). O segundo desafio está relacionado ao processo de efetivação do PNE 2014- 2024, uma vez que após o golpe sofrido pela presidenta Dilma Rousseff, as 37 ações do MEC apontaram para “a secundarização do PNE, seus comandos, dispositivos e prazos” (DOURADO, 2018). 4.2.5. A educação em tempo integral no Brasil: da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) ao Programa Novo Mais Educação (PNME) Apesar do governo federal ter empreendido, na década de 1990, duas “tentativas de implementação de programa de educação integrale(m) tempo integral” (COSTA, 2019, p. 143), a saber: o Programa Minha Gente (PMG) (BRASIL, 1991), no governo Collor; e, na sequência, o Programa Nacional de Atenção à Criança e ao Adolescente (Pronaica) (BRASIL, 1993), no governo Itamar Franco, foi apenas no ano de 1996 que a LDBEN 9394/96, estabeleceu que “a jornada escolar no Ensino Fundamental incluirá pelo menos quatro horas de trabalho efetivo em sala de aula, sendo progressivamente ampliado o período de permanência na escola” (BRASIL, 1996). Ainda assim, a determinação da referida lei não apresentava uma definição sobre a métrica associada ao tempo integral. Essa regulamentação ocorreu no ano de 2001, por meio do Plano Nacional de Educação (PNE/2001-2010), que dimensionou o tempo integral para, ao menos, sete horas diárias de atividades escolares (BRASIL, 2001). Afora essa definição, o PNE (2001-2010) determinou ainda a priorização das crianças das camadas mais vulneráveis da população (BRASIL, 2001), revelou alinhamento com determinação de organismos internacional, em especial a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) que editou orientações (UNESCO, 1984; 1996; 2002) que expressam consenso sobre o potencial da ampliação da jornada escolar diária dos estudantes, como estratégia voltada para o enfretamento das desigualdades educacionais e para a proteção social das camadas mais vulneráveis da população (DINIZ JÚNIOR, 2020). A priorização determinada pelo PNE (2001-2010) já sinalizava que a(s) políticas(s) de educação em tempo integral no Brasil não seriam universais, ou seja, atenderiam a uma parcela do quantitativo de estudantes da educação pública brasileira e ainda, teriam como foco a população mais pobre da sociedade. Apesar da definição expressa no PNE (2001-2010), acerca da educação em tempo integral, foi apenas no ano de 2007 que o governo federal empreendeu duas ações que viabilizavam esse atendimento. 38 Em relação à Educação Infantil, no referido ano foi instituído pelo governo federal, no âmbito do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) o Programa Nacional de Reestruturação e Aparelhagem da Rede Escolar Publica de Educação Infantil (Proinfância) que visa a garantir o acesso de crianças a creches e Pré-escolas, bem como a melhoria da infraestrutura física da rede de Educação Infantil em todo Brasil (BRASIL, 2007b). Operacionalizado por meio de transferências voluntárias de recursos, da União para os municípios, o programa busca corrigir as desigualdades de acesso e de permanência na Educação Infantil, através da ampliação do número de vagas nesta etapa, da adequação da rede física das escolas da Educação Infantil e, dentre outros elementos, da oferta de educação em tempo integral (FALCIANO; NUNES: DOS SANTOS, 2019). Ainda que seu foco não fosse exclusivamente a oferta da educação em tempo integral, é possível depreender que o referido programa se constituiu como uma importante ação para a oferta desta modalidade na Educação Infantil do país. No âmbito do Ensino Fundamental o governo federal criou Programa Mais Educação (PME), por meio da Portaria Interministerial n° 17/2007 (BRASIL, 2007) que foi, posteriormente, disposto pelo Decreto nº 7.083/2010 (BRASIL, 2010), com o objetivo de se constituir como a ação indutora de políticas de tempo integral. Os Manuais do PME (BRASIL, 2008; 2009; 2010; 2011; 2012; 2013; 2014a), sinalizaram para a focalização em grupos sociais mais vulneráveis ao estabelecerem critérios para a adesão ao programa, por parte das escolas e ainda, para a seleção dos estudantes a serem atendidos na ampliação da jornada escolar. Esses critérios, que apontavam para a priorização nas camadas sociais mais vulneráveis, buscavam articular políticas sociais sob a perspectiva do binômio educação e proteção social (SILVA, 2018), inserindo-se no contexto das políticas redistributivas de combate à pobreza e à vulnerabilidade social (CARVALHO; RAMALHO; SANTOS, 2019). No ano de 2014, o PNE (2014-2024), de forma inédita, apresentou meta exclusiva associada à educação em tempo integral, tendo estabelecido, conforme apresentado anteriormente, que, ao final do seu período de vigência, sua oferta deverá contemplar, no mínimo, 50% das escolas públicas de modo a atender, pelo menos, 25% dos estudantes da Educação Básica (BRASIL, 2014). A referida meta reforça aquilo que já estava apontando no PNE (2001-2010) e, posteriormente, no 39 PME, a respeito do atendimento em tempo integral não se constituir como uma política universal, de modo a atender parte do quantitativo total dos estudantes da Educação Básica pública do país. A Meta 6 do PNE (2014-2024), assim como o PME, privilegia o projeto de educação em tempo integral, denominado por Cavaliere (2009, p. 51) de “aluno de tempo integral”, uma vez que, ao possibilitar abarcar apenas uma parte dos alunos, sinaliza, claramente, que tal política não está direcionada para todo o universo de estudantes, seja no âmbito do território nacional, de uma mesma unidade federativa, ou, até, de uma mesma instituição escolar (COELHO, 2016). A respeito dessa relação entre a Meta 6 e o PME, Parente (2017) sinalizou que o esforço empreendido pelo MEC no processo de elaboração do PNE (2014- 2024) contribuiu a materialização de uma meta específica para essa modalidade e ainda, que esta estivesse em consonância com o referido programa levado a cabo pelo governo federal. As metas presentes no PNE (2014-2024) são acompanhadas de estratégias que contribuem para a “estruturação da política educacional brasileira” (COELHO; ROSA; SILVA, 2018). No caso específico da Meta 6 são apresentadas 9 estratégias que podem ver observadas por meio do Quadro 3. Quadro 3: Estratégias associadas à Meta 6 - PNE 2014-2024 6.1) promover, com o apoio da União, a oferta de educação básica pública em tempo integral, por meio, de atividades de acompanhamento pedagógico e multidisciplinares, inclusive culturais e esportivas, de forma que o tempo de permanência dos (as) alunos (as) na escola, ou sob sua responsabilidade, passe a ser igual ou superior a 7 (sete) horas diárias durante todo o ano letivo, com a ampliação progressiva da jornada de professores em uma única escola; 6.2) instituir, em regime de colaboração, programa de construção de escolas com padrão arquitetônico e de mobiliário adequado para atendimento em tempo integral, prioritariamente em comunidades pobres ou com crianças em situação de vulnerabilidade social; 6.3) institucionalizar e manter, em regime de colaboração, programa nacional de ampliação reestruturação das escolas públicas, por meio da instalação de quadras poliesportivas, laboratórios, inclusive de informática, espaços para atividades culturais, bibliotecas, auditórios, cozinhas, refeitórios, banheiros e outros 40 equipamentos, bem como da produção de material didático e da ormação de recursos humanos para a educação em tempo integral; 6.4) fomentar a articulação da escola com os diferentes espaços educativos, culturais e esportivos e com equipamentos públicos, como centros comunitários, bibliotecas, praças, parques, museus, teatros, cinemas e planetários; 6.5) estimular a oferta de atividades voltadas à ampliação da jornada escolar de alunos (as) matriculados nas escolas da rede pública de educação básica por parte das entidades privadas de serviço social vinculadas ao sistema sindical, de forma concomitante e em articulação com a rede pública de ensino; 6.6) orientar a aplicação da gratuidade de que trata o art. 13 da Lei no 12.101, de 27 de novembro de 2009, em atividades de ampliação da jornada escolar de alunos (as) das escolasda rede pública de educação básica, de forma concomitante e em articulação com a rede pública de ensino; 6.7) atender as escolas do campo e de comunidades indígenas e quilombolas na oferta da educação em tempo integral, com base em consulta prévia e informada, considerando-se as peculiaridades locais; 6.8) garantir a educação em tempo integral para pessoas com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação na faixa etária de 4 (quatro) a 17 (dezessete) anos, assegurando atendimento educacional especializado complementar e suplementar ofertado em salas de recursos multifuncionais da própria escola ou em instituições especializadas; 6.9) adotar medidas para otimizar o tempo de permanência dos alunos na escola, direcionando a expansão da jornada para o efetivo trabalho escolar, combinado com atividades recreativas, esportivas e culturais. Fonte: BRASIL (2014) O artigo 7º da Lei n. 13.005/2014 determina que os entes federados “atuarão em regime de colaboração, visando ao alcance das metas e à implementação das estratégias objetivo deste Plano” (BRASIL, 2014) e, como se pode observar, as estratégias associadas à Meta 6 apontam o regime deste atendimento. A efetivação desta meta, só se dará a partir da articulação e cooperação entre os sistemas de ensino dos entes federados e da efetivação do PNE (2014-2024), como a grande estratégia de planejamento da educação pública brasileira (SOUZA et al., 2017). 41 Tendo como base os estudos de Coelho (2016) e Coelho, Rosa e Silva (2018) podemos identificar que as 9 estratégias vinculadas à Meta 6 do PNE podem ser organizadas em quatro tópicos: : 1. Organização pedagógica; 2. Recursos materiais e humanos; 3. Sujeitos atendidos, e; 4. Articulação com outros espaços públicos e com a sociedade civil. No que diz respeito à organização pedagógica, as estratégias 6.1 e 6.9 apontam para a articulação entre atividades já presentes no currículo da escola e outras atividades educativas de modo a ofertar atividades recreativas, culturais e esportivas. Destacamos que as referidas estratégias estão alinhadas ao modus operandi da oferta das atividades no âmbito do PME, que, por meio de diversas experiências educativas, organizadas em macrocampos, buscavam oportunizar aos estudantes múltiplas atividades de modo a contribuir para a formação integral desses sujeitos (LECLERC; MOLL, 2012). De tal modo, a referida estratégia evidencia a influência da experiência do PME na elaboração do PNE 2014-2024 no que diz respeito à organização pedagógica da educação em tempo integral. Com relação aos recursos materiais e humanos, as estratégias 6.2 e 6.3 apontam para “[...] a construção de escolas com padrão arquitetônico e de mobiliário adequado para atendimento em tempo integral [...]” (BRASIL, 2014) e a adequação e reestruturação de escolas, bem como a “[...] formação de recursos humanos para a educação em tempo integral” (BRASIL, 2014). O apontamento para a construção/adequação das escolas veio no sentido oposto daquilo que estava presente no PME, uma vez que o programa não previa empreender alterações na estrutura física das escolas, nem a construção de novas instituições escolares. A viabilização de tais ações estruturais, de acordo com as referidas estratégias, se daria a partir do regime de colaboração. Entretanto, diante da ausência de regulamentação do regime de colaboração que gera prejuízos associados ao equilíbrio federativo e à garantia do direito à educação (ARAÚJO, 2014), os investimentos em recursos materiais e humanos para a educação em tempo integral estariam à mercê deste cenário. 42 Em relação aos sujeitos atendidos, destaca-se a priorização nas “comunidades pobres ou com crianças em situação de vulnerabilidade social” (BRASIL, 2014). Essa focalização vai ao encontro de orientações de organismos internacionais, como a Unesco, que apontavam a ampliação da jornada escolar como estratégia para a proteção social. Afora isso, o próprio PME priorizava as camadas mais vulneráveis da população, seja nos critérios para a adesão das escolas, seja na seleção dos estudantes (MENEZES: DINIZ JÚNIOR, 2020). Além da priorização sob o aspecto da vulnerabilidade social, as estratégias 6.7 e 6.8, sinalizam para o atendimento, na educação em tempo integral, das “escolas do campo e de comunidades indígenas e quilombolas” e também para as “pessoas com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação na faixa etária de 4 (quatro) a 17 (dezessete) anos (BRASIL, 2014). É possível compreender que essas especificidades, apontadas pelas referidas estratégias, vão ao encontro daquilo que Cury (2005, p. 11) denominou como “políticas inclusivas e compensatórias da Educação Básica”. No que diz respeito à articulação da escola é possível observar que o PNE (2014-2024) aponta para a necessidade que este movimento ocorra com outros espaços públicos como “centros comunitários, bibliotecas, praças, parques, museus, teatros, cinemas e planetário” (BRASIL, 2014). Essa articulação, que também estava presente no (con)texto do PME, está relacionada às Cidades Educadoras, que compreende a educação como responsabilidade de toda a comunidade, de modo romper com a ideia da aprendizagem como obrigação exclusiva da escola, reforçando o entendimento de que ela se dá em diferentes espaços, no contexto do território educativo (CAVALIERE; MAURÍCIO, 2001). Além disso, é apontada também a articulação da escola com entidades privadas de serviço social, nas estratégias 6.5 e 6.6, indo ao encontro do que foi proposto pelo PME, no sentido de utilizar esses espaços como locais para a oferta das atividades educativas vinculadas ao programa. Sobre essa articulação, entre o Estado e as organizações da sociedade civil, há que se considerarem os interesses políticos que entremeiam essas relações e contribuem para potencializar a desobrigação do Estado para com as políticas sociais (COELHO; ROSA; SILVA, 2018). 43 A presença de uma meta específica para a educação em tempo integral no âmbito da aprovação do PNE 2014-2024 sinalizou um importante avanço no que diz respeito a essa pauta no âmbito das políticas educacionais. Se até o ano de 2007, o país contava com experiências locais de ampliação da jornada escolar na perspectiva do tempo integral, a partir desse ano, por ocasião do PME houve uma “capilarização do debate na sociedade brasileira” (LECLERC; MOLL, 2012, p. 104) e, por fim, se apresentou no PNE como umas das metas para a melhoria da qualidade da educação. Convém destacar que a Portaria que institui o PNME não revogou aquela que deu origem ao PME, de modo que a sua descontinuidade se deu a partir da suspensão dos repasses de recurso financeiro às escolas para a sua execução (IGLESIAS, 2019). E ainda, o fato de o PNME possibilitar a ampliação da jornada escolar em cinco horas semanas sinaliza que sua implementação, neste formato, não contribuiria efetivamente para o alcance da Meta 6 estabelecida no PNE, em relação à oferta de educação em tempo integral. 5. FORMAÇÃO DOCENTE NA EDUCAÇÃO INFANTIL Fonte: shre.ink/mwU5 Nos últimos anos vivemos um contexto em que os direitos da criança têm sido afirmados e as instituições de ensino têm se expandido, condição que torna a formação de profissionais que trabalham com crianças um dos grandes desafios para a área. Mais recentemente, a escolaridade obrigatória alargada a crianças de 4 e 5 44 anos, ou seja, parte da educação inicial, enfatizando a necessidade de acompanhar as estratégias do governo local para implementar tal oferta, com especial atenção ao currículo Pré-escolar a ser processado, bem como para a formação de professores antes da recuperação judicial. Com os requisitos legais propostos pela Lei de Diretrizese Fundações (LDB) 9.394 (BRASIL, 1996), que estabelece a Educação Infantil como primeira etapa da Educação Básica, a carreira pedagógica adota em seu regulamento a obrigação formar professores para trabalhar com crianças pequenas (KIEHN, 2011), embora a legislação preveja que todos os graduados podem trabalhar na área da Educação Infantil e nos primeiros anos do Ensino Fundamental. Grande parte dos municípios reconhece essa formação como pré-requisito para o preenchimento das vagas na condução de processos seletivos públicos. É importante refletirmos sobre as características que envolvem o perfil do profissional que trabalha na Educação Infantil, levando em conta as especificidades das crianças de 0 a 6 anos de idade, bem como problematizar os desafios diários envoltos na docência na Educação Infantil. O intuito é partir do reconhecimento da infância como categoria específica no desenvolvimento humano, refletir sobre a necessidade de institucionalização dos processos de cuidar e educar, com destaque para o papel dos profissionais que trabalham com as crianças na Educação Infantil. Nesse cenário, é importante apontar as mudanças ocorridas em relação à formação dos jovens na Educação Infantil, refletir sobre as especificidades desse campo de trabalho e enfatizar a importância da formação do conhecimento sobre como atuar na Educação Infantil para superar o caráter assistencialista que moldou a história da atenção à primeira infância e o viés compensatório que aponta para a retomada. Como salienta Côco (2015, p. 143): [...] a Educação Infantil está imersa no conjunto das pautas em disputa no contexto social e, não sem tensões, vem conquistando visibilidade e reconhecimento social, evidenciando necessidades emergentes, iniciativas de ação, metas futuras e desafios que persistem. Ao longo da história, os estudos dedicados à infância evidenciaram que a criança foi destinada a um espaço diferente dentro das famílias e, consequentemente, na sociedade. Esse ‘novo’ lugar da infância no cenário familiar e social foi fruto, dentre outras questões, do crescente interesse pelas crianças pelo que poderiam se tornar,
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