Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Lei de Drogas Brendha Ariadne Cruz – 6º Termo – Toledo Prudente 19-10-2022 FINALIDADE DA LEI 1) prevenir o uso indevido de drogas: diminuir o consumo de drogas no Brasil. 2) promover a reinserção social do usuário de drogas: tratamento diferenciado ao usuário de drogas. 3) reprimir a produção e o tráfico ilícito de entorpecentes: criação de novos tipos penais envolvendo o tráfico. Lógico que a Lei não dá conta de modo concreto quanto ao problema de drogas no Brasil. Ademais, houve a criação do SISNAD: “Sistema Nacional de políticas públicas sobre drogas”. Os primeiros artigos da Lei nº11.343/06 possuem natureza administrativa e estão ligados ao Sisnad: composição, finalidade, princípios básicos etc. (art. 4º ao 20). Plano Nacional de Política sobre drogas: Lei nº 13.840/19; PORTE DE DROGAS PARA CONSUMO PESSOAL Também chamado de porte de entorpecentes ou porte de drogas para uso próprio. Artigo 28: Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas: I - advertência sobre os efeitos das drogas; II - prestação de serviços à comunidade; III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo. NORMA PENAL EM BRANCO A estrutura normativa da Lei nº 11.343/06 envolve uma Norma Penal em Branco, pois a Lei de Drogas não indica o que é “droga”, sendo a sua estrutura normativa vaga. O preceito primário da norma precisa de complemento. Trata-se de uma “norma penal em branco heterogênea”, uma vez que o complemento é realizado por fonte diversa da Lei (Ato Administrativo); É complementado pela Portaria n. 344/98 da Anvisa que apresenta fórmulas químicas que são utilizadas em medicamentos por exemplo – Ministério da Saúde. A portaria vem sendo atualizada constantemente, sempre que uma outra droga nova é descoberta. OBS: elemento normativo do tipo: “sem autorização ou em desacordo com a determinação legal ou regulamentar”. Existem substâncias, cuja composição química ou o princípio ativo podem estar na lista da Anvisa, mas, se houver prescrição médica ou autorização legal, não existirá crime. Exemplo: tratamento médico com morfina, canabidiol, anfetaminas, etc. OBJETIVIDADE JURÍDICA Trata-se da Saúde Pública. É um crime de perigo abstrato, ou seja, já que apenas a substância causa um risco social. CORRENTES SOBRE A DESCRIMINALIZAÇÃO DO USO DE DROGAS PARA CONSUMO PESSOAL: 1) Corrente da Descriminalização: ponto de vista técnico-penal. O art. 28 não se encaixa no conceito de crime e nem de infração penal; 2) Corrente da “Infração Penal Sui Generis” – assim o art. 28 seria uma infração penal sui generis; 3) Corrente da Criminalização do USO DE DROGAS: Predominante na doutrina e na jurisprudência. Antes poderia ter prisão em flagrante, o que não vigora mais, portanto temos um desencarceramento. Este crime não foi descriminalizado. Existe um tema sendo discutido da POSSIBILIDADE DE DESCRIMINALIZAÇÃO DA UTILIZAÇÃO DE DROGAS, pois quando alguém consome para utilização pessoal envolve uma questão de privacidade da pessoa. Do direito penal vigora o princípio da alteridade sendo somente responsabilizado se o indivíduo fazer mal alguém, neste sentido existe um argumento na doutrina de que não existe motivo para punir alguém que está fazendo mal para si próprio, por meio do recurso extraordinário: 635.659. USO DA MACONHA PARA FINS MEDICINAIS Foi autorizado pela ANVISA através da Resolução Colegiada nº 327/19. Já existiam inúmeras decisões anteriores autorizando o uso medicinal do Canabidiol para tratamento de certas doenças neurológicas – TJPR - MS - 1474214-0 – 2016. PRINCIPAIS DROGAS CONSUMIDAS Lei de Drogas Brendha Ariadne Cruz – 6º Termo – Toledo Prudente • MACONHA Outros nomes: Haxixe, Skunk (apelidos: baseado, beque, diamba, erva, fininho, jererê, bagulho) É uma droga feita das flores e das folhas da planta Cannabis sativa que é uma planta herbácea da família das Canabiáceas (Cannabaceae). As folhas são finamente recortadas em segmentos lineares; tem propriedades psicoativas podendo atuar como analgésico, antiespasmódico, calmante do sistema nervoso, embriagador, estomático, narcótico, sedativo, tônico. Princípio ativo: Tetrahidro Canabinol – THC Principal forma de consumo: inalação através da fumaça do cigarro. • COCAÍNA Outros nomes: Pó, farinha, giz, neve, branquinha, merla, etc. A cocaína é uma molécula presente nas folhas do arbusto de coca (Erythoxylum coca), planta nativa dos andes. As folhas são refinadas com várias substâncias químicas (solventes, querosenes, ácidos, etc.) extraindo-se a pastabase que depois é misturada com éter e ácido, produzindo-se o cloridato de cocaína que é filtrado até ser obtido o “pó de cocaína” Principal forma de consumo: é cheirada ou diluída para injeção na veia. • CRACK Outros nomes: pedra, freebase, rock O crack é um subproduto da pasta da cocaína, droga extraída por meio de processos químicos, das folhas da coca. A pasta base é misturada com água e soda cáustica, depois aquecida, ao esfriar a cocaína líquida volta ao estado sólido e partido em pequenas pedras. Os efeitos do crack são mais rápidos e intensos que a da cocaína. O nome deriva do ruído peculiar que se produz, quando a pedra de crack é aquecida para ser fumada (um estalo) Principal forma de consumo: inalação através da fumaça (cachimbo, latinhas, garrafinhas, etc). • OUTRAS DROGAS: LSD (Ácido): é uma sigla em alemão (dietilamida de ácido lisérgico). Uma droga sintética de laboratório altamente alucinógena. Consumida através de papéis que se dissolvem na língua; Ecstasy: (mda, bala, pastilha) é um comprimido, cujo princípio ativo é o “mdma”. Também é uma droga sintética criada em laboratório; Lança-perfume (Cheirinho da Loló), é um inalante que possui clorofórmio e éter . No passado era permitido, depois se tornou ilícito; Anfetaminas/Metanfetaminas (benzendrina, Inibex, pervitin, etc) São estimulantes criados a partir da “efedrina” (princípio ativo: planta chinesa Mao Huang). São medicamentos utilizados para combate de certas doenças psicológicas (depressão) cujo uso recreativo é proibido; Opioides (ópio, morfina, heroína, codeína, etc): são drogas elaboradas com a resina extraída das flores da “papoula” (Papaver Somniferum) Drogas diversas: Ayahuasca, Cacto de São Pedro, Cogumelo Alucinógeno, etc. DROGAS LÍCITAS: sedativos que são remédios para tratar certos distúrbios psicológicos (calmantes, barbitúricos, etc.); Tabaco (cigarro, charutos, narguilé, rapé, etc) derivado da planta Nictiana Tabacum; Álcool: bebidas confeccionadas com etanol: cerveja, uísque, pinga, vinho, rum, saquê, etc. Inalantes: acetona, benzina, cola de sapateiro, etc. EFEITOS PRÁTICOS: TRATAMENTO DO PORTE DE DROGAS PARA CONSUMO PESSOAL Não há previsão de pena privativa de liberdade. NÃO CABE PRISÃO EM FLAGRANTE. Posição da doutrina: os efeitos que se aplicam a contravenção penal aplica-se aqui. Crime com ínfima potencialidade lesiva (menor do que contravenção penal – Dec. Lei 3688/41) Aplicação do princípio da proporcionalidade: Tratar com mesmos efeitos das contravenções. Formalmente é crime e materialmente detém os mesmos efeitos da contravenção penal; Não gera reincidência para outro crime, não revoga os “sursis”; não é lavrado B.O. nem instaurado I.P.: Será realizado um Termo Circunstanciado e o agente responderá nos moldes da Lei 9099/95. Contudo, é considerado antecedente criminal. SUJEITOS Sujeito ativo: crime comum (qualquer pessoa). Obs: admite-se concurso de agentes. Sujeito passivo: Estado (coletividade) TIPICIDADE Lei de Drogas Brendha Ariadne Cruz – 6º Termo– Toledo Prudente Trata-se do DOLO ESPECÍFICO: vontade livre e consciente de adquirir, guardar, trazer consigo, transportar, ter em depósito PARA CONSUMO PESSOAL. OBS: não há modalidade culposa. Não há um critério absoluto de quando será porte para uso próprio ou tráfico de drogas (são relativos): pauta-se no “livre convencimento” das autoridades (juiz, promotor, delegado). Contudo o Artigo 28 §2º estabelece as seguintes diretrizes: A) NATUREZA E QUANTIDADE DA DROGA: Regra geral: Grande quantidade é indício de traficância; pequena quantidade: porte para uso pessoal. Comporta exceções: →Drogas potentes podem ser vendidas em pequenas quantidades, ex. crack; →Drogas menos potentes podem estar guardadas em quantidades consideráveis para serem consumidas com o tempo; outros elementos precisam ser analisados: B) LOCAL DE APREENSÃO DA DROGA: também é um critério a ser sopesado, drogas em local de refinação, dentro de bolsas, carros, dentro de fundos falsos, alojadas dentro do estômago, partes íntimas, é indicio de traficância. C) CONDIÇÕES DE DESENVOLVIMENTO DA AÇÃO – CONDUTA: pouca droga apreendida, ou nenhuma droga, mas são encontradas outras substâncias, éter, benzeno, ácido sulfúrico, material de embalagem, balança de precisão, dinheiro, caderno de anotações e contabilidades, é sinal de tráfico. D) CIRCUNSTÂNCIAS SOCIAIS E PESSOAIS DO AUTOR DO CRIME – ANTECEDENTES: antecedentes como dependente químico ou condenações por tráfico de drogas, etc. OBS: os critérios deverão ser conjugados para ser adotada uma posição sobre tráfico ou porte para uso pessoal. CONDUTAS TÍPICAS DO PORTE Tipo misto alternativo= é o crime que possui mais de um núcleo do tipo, sendo que a prática de apenas um deles é suficiente para a sua consumação e a prática de mais de um deles, no mesmo contexto, configura crime único. Crime de conduta variada= aquele em que a lei descreve várias condutas (vários verbos),que são separadas pela conjunção alternativa "ou". • Adquirir: obter propriedade, de forma gratuita ou onerosa (tradição); • Guardar: ter sob sua vigilância, manter a droga em algum lugar, esconder; • Trazer consigo: transportar junto ao corpo, bolso, roupa, etc. • Transportar: levar de um lugar para outro (no carro, bolsa, mala, etc.) • Ter em depósito: reter à sua disposição, guardar em algum lugar, etc. CONSUMAÇÃO E TENTATIVA CONSUMAÇÃO: predomina o entendimento que ocorre com a “tradição” quando o agente passa a ter a posse ou a propriedade da droga; TENTATIVA: 1ª Posição: Admite-se. O acordo de vontade caracteriza início de execução do delito; 2ª Posição: Não se admite. O crime só existe com a tradição efetiva, antes o fato é atípico. Além disso, não se admite tentativa nas contravenções penais: art. 4º Dec. Lei nº 3688/41 e o porte de drogas é de menor potencialidade lesiva que as contravenções. Posição predominante. QUESTÕES DA JURISPRUDÊNCIA E DA DOUTRINA USO DA DROGA SEM PORTAR: tragar fumaça, injetar na veia, cheira carreira, sem portar a substância: →1ª Posição: há crime, mesmo que por segundos trouxe consigo ou portou; →2ª Posição: não há crime, pois, o artigo não prevê o verbo “usar” e não há perigo para a saúde pública se a droga se exauriu no agente (seria autolesão impunível); vem predominando. USO PRETÉRITO DA DROGA: tenho prova de que ele consumiu, mas não está com ele. Não é punível, a substância deve estar com o agente, tendo em vista que é necessário o porte ou posse, e o objeto material do crime é a Droga que precisa ser periciada; Lei de Drogas Brendha Ariadne Cruz – 6º Termo – Toledo Prudente USO COMPARTILHADO DA DROGA: quando a pessoa traz droga para consumir com o seu ciclo íntimo, é o caso do “fornecedor eventual”. Exemplo: oferecer ao namorado (a); amigos, pessoas de seu relacionamento, eventualmente e sem lucro (Caracteriza o art. 33 § 3º da Lei de Drogas é uma espécie de tráfico privilegiado – pena: detenção de 06 meses a 01 ano); APREENSÃO DE QUANTIDADE EXTREMAMENTE ÍNFIMA DE DROGA: →1ª posição: caracteriza crime, pois o perigo é abstrato, mesmo com quantidade bem pequena; →2ª posição: não caracteriza crime. “Princípio da Insignificância”: não há perigo abstrato com quantidade extremamente ínfima, tendo a ausência de periculosidade social. Pena branda. STF/STJ. Vem prevalecendo. FIGURA EQUIPARADA Artigo 28 § 1º: “Às mesmas medidas submete-se quem, para seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substância ou produto capaz de causar dependência física ou psíquica”. São os casos de “Semear”, “Cultivar” e “Colher”: planta um pé de maconha no quintal da residência, cultiva e colhe as folhas; PENAS PARA O CRIME DE PORTE DE DROGAS Podem ser aplicadas de maneira isolada, cumulativas ou substitutivas (art. 27). São as seguintes penas previstas no art. 28: I- Advertência sobre os efeitos das drogas; II- Prestação de Serviços à comunidade; III- Medida Educativa de comparecimento a programa ou curso educativo. Obs: caso haja descumprimento, o juiz poderá realizar uma admoestação verbal ou imposição de pena de multa (art. 28 § 6º). ASPECTOS FINAIS Ação penal: Pública incondicionada; Procedimento criminal: aplica-se o rito da Lei 9099/95; É crime, portanto, gera registro criminal na ficha de antecedentes criminais- F.A.; Prazo máximo da Prest. Serv. Comunidade e Comparecimento em cursos: 05 meses (art. 28 § 3º); A prestação de serviços à comunidade será cumprida em programas comunitários, entidades educacionais ou assistenciais, hospitais, estabelecimentos congêneres, públicos ou privados sem fins lucrativos, que se ocupem, preferencialmente, da prevenção do consumo ou da recuperação de usuários e dependentes de drogas (art. 28 § 5º); O juiz poderá determinar o tratamento da dependência química do réu em um estabelecimento público de maneira gratuita (art. 28 § 7º) Prescrição das penas: 02 anos, observando as regras gerais da prescrição (art. 107 e seguintes do CP) art. 28 § 8º. TRÁFICO DE DROGAS Também chamado de Tráfico de substâncias entorpecentes. ARTIGO 33: Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. • § 1º Nas mesmas penas incorre quem: I - importa, exporta, remete, produz, fabrica, adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem em depósito, transporta, traz consigo ou guarda, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, matéria- prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas; • II - semeia, cultiva ou faz a colheita, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, de plantas que se constituam em matéria-prima para a preparação de drogas; • III - utiliza local ou bem de qualquer natureza de que tem a propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com Lei de Drogas Brendha Ariadne Cruz – 6º Termo – Toledo Prudente determinação legal ou regulamentar, para o tráfico ilícito de drogas. • IV - vende ou entrega drogas ou matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas, sem autorização ou em desacordo com a determinação legal ou regulamentar, a agente policial disfarçado, quando presentes elementos probatóriosrazoáveis de conduta criminal preexistente. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) • § 2º Induzir, instigar ou auxiliar alguém ao uso indevido de droga: • Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa de 100 (cem) a 300 (trezentos) dias-multa. • § 3º Oferecer droga, eventualmente e sem objetivo de lucro, a pessoa de seu relacionamento, para juntos a consumirem: • Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, e pagamento de 700 (setecentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa, sem prejuízo das penas previstas no art. 28. • § 4º Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos , desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa. (Vide Resolução nº 5, de 2012) 20-10-2022 Trata-se de crime de ação múltipla, marcado por 18 verbos, para alcançar aquele que está cometendo tráfico. Ademais, existem condutas equiparadas e crimes correlatos ao tráfico, além do caput. ASPECTOS TÉCNICOS PENAIS DO TRÁFICO • Norma penal em branco heterogênea: Portaria 344/98-Anvisa – Ministério da Saúde; • Objetividade Jurídica: Saúde pública; • Sujeito ativo: crime comum (qualquer pessoa pode praticar). Obs: na modalidade “PRESCREVER” o crime é próprio, pois exige-se a condição de Médico ou Odontólogo. Em certos casos, as características pessoais do sujeito ativo podem majorar a pena de 1/6 a 2/3: art. 40, II (professor, funcionário público, pai, tutor, curador, etc.) • Sujeito passivo: Estado (coletividade) – sujeição passiva vaga. • Tipicidade Subjetiva: DOLO ESPECÍFICO: vontade livre e consciente de praticar as condutas descritas no art. 33 da Lei de drogas PARA CONSUMO DE TERCEIRAS PESSOAS. • Obs: não há modalidade culposa. MATERIALIDADE DELITIVA NO TRÁFICO O tráfico de drogas é um crime que deixa vestígios materiais (facta permanentes), assim, há necessidade de constatação da materialidade delitiva. Em outras palavras, a droga precisa ser apreendida no contexto dos fatos, via de regra e precisa ser submetida a perícia para a comprovação da natureza da substância. Existem dois laudos: 1. Laudo de Constatação (exame provisório, sem maior profundidade) que autoriza a prisão em flagrante do agente, instauração do IP, etc. Não é suficiente para a condenação. Caso haja condenação apenas com esse laudo, essa será nula. 2. Laudo Definitivo, mais complexo e profundo, onde é analisado cientificamente o teor da droga. Esse é indispensável para a condenação do réu (art. 50 da Lei 11.343/06) Essa questão também se aplica aos demais crimes de droga, como porte para uso próprio. TIPICIDADE OBJETIVA É um crime de conteúdo variado, composto por 18 verbos nucleares, sendo eles: • Importar: fazer entrar a droga no território nacional (trazer de outro país); • Exportar: fazer sair a droga do território nacional (enviar para outro país); • Remeter: enviar a droga para algum lugar, dentro do território nacional • Preparar: juntar componentes, combinar substâncias; • Produzir: dar origem, gerar (extrair da natureza); • Fabricar: manufaturar, produzir por meio industrial ou mecânico; • Adquirir: obter a propriedade (de maneira gratuita ou onerosa); Lei de Drogas Brendha Ariadne Cruz – 6º Termo – Toledo Prudente • Vender: alienar mediante contraprestação, negociar; • Expor a venda: mostrar para compradores, exibir a droga; • Oferecer: ofertar, mesmo que gratuitamente; •Ter em depósito: conservar em algum lugar, reter à sua disposição; • Transportar: levar de um lugar para o outro (veículos, aviões, embarcações) • Trazer consigo: trazer junto ao corpo, junto a si (bolso, roupa, etc); • Guardar: ter sob vigilância, zelar, tomar conta; • Prescrever: receitar para uso, dar receita; • Ministrar: aplicar a droga em outra pessoa,introduzir no organismo de alguém; • Entregar para consumo: dar, ceder, entregar a outrem para consumir; • Fornecer ainda que gratuitamente: prover, entregar uma amostra grátis. CONSUMAÇÃO E TENTATIVA A consumação se dá no momento em que o agente realiza a conduta típica (vender, oferecer, ministrar, guardar, ter em depósito, etc.) Obs: crime permanente cuja consumação se protrai no tempo; Quanto a tentativa, por causa da multiplicidade e superposição de condutas é difícil existir tentativa na prática. Exige-se a tradição. Teoricamente é possível nas modalidades: adquirir, importar, prescrever. Ademais, é crime de perigo abstrato (sem droga, não há risco para a saúde pública). FLAGRANTE PREPARADO E CRIME DE TRÁFICO Existe uma tática policial consistente na figura do “agente provocador” (policial disfarçado), que finge ser uma vítima do crime que induz o criminoso a praticar o delito, prendendo-o posteriormente em flagrante (flagrante provocado ou preparado); Existe polêmica na doutrina a respeito da validade deste tipo de flagrante. Há súmula do STF indicando que tal tipo de prisão seria nula por se tratar de um crime impossível (Súmula 145 do STF). No entanto, no caso de tráfico de drogas, tal argumentação não se aplica, pois o flagrante não é nulo, já que antes de vender, o sujeito ativo tem a droga em depósito, guardava ou trazia consigo, estando em situação de FLAGRANTE PERMANENTE antes da atividade do agente provocador. A QUESTÃO foi devidamente tratada pelo PACOTE ANTICRIME: Lei nº 13.964/19 que acrescentou o inciso IV no parágrafo 1º do art. 33, afirmando categoricamente que constitui CRIME vender droga, matéria prima, insumo ou componente químico ao policial disfarçado; Assim, é pacífico na doutrina e na jurisprudência que se o policial se disfarça de usuário de drogas e induz o traficante a vender uma substância proibida para ele, havia flagrante permanente anterior (pois guardava, tinha em deposito ou trazia a droga consigo de maneira preexistente) validando-se a prisão em flagrante. BUSCA DOMICILIAR E PRISÃO EM FLAGRANTE A casa é asilo inviolável do cidadão (art. 5º XI da CF); Os policiais precisam de mandado de busca domiciliar ou de prisão para ingressarem em um imóvel (art. 240 do CPP). No entanto, se existir DROGA EM DEPÓSITO DENTRO DA CASA, os policiais podem entrar sem mandado no local (caso de flagrante dentro do imóvel). Mas, e necessário prévia investigação e existência de indícios suficientes de que a droga esteja dentro do imóvel (tema 280-STF). ANÁLISE ESTRUTURAL DO TRÁFICO DE DROGAS Artigo 33 “caput” da Lei 11.343/06: Trata-se da figura básica do tráfico (Crime Hediondo Equiparado – art. 5º XLIII da CF); As figuras equiparadas (derivadas) ao tráfico também são hediondas: Art. 33 § 1º (Figuras derivadas – também hediondas): inciso I - matéria prima da droga inciso II- plantio, colheita, exploração de vegetais; inciso III – local ou bens destinados para o tráfico; inciso IV- vender para policial disfarçado (Lei 13.964/19) CRIMES CORRELATOS AO TRÁFICO Lei de Drogas Brendha Ariadne Cruz – 6º Termo – Toledo Prudente São crimes autônomos ligados ao tráfico, mas não estão previstos como hediondos na legislação especial: Art. 34 – Maquinismo e objetos destinados ao tráfico; Art. 35 – Associação ao tráfico; Art. 36 – Financiamento ao tráfico; Art. 37 – Informante ou colaborador do tráfico. Obs: apesar de não serem hediondos, a Lei nº 11.343/06 impõe um tratamento rigoroso para esses delitos, conforme se verifica do disposto contido no art. 44 da Lei de Drogas: Art. 44. Os crimes previstos nos arts. 33, caput e §1º , e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas emrestritivas de direitos. Parágrafo único. Nos crimes previstos no caput deste artigo, dar-se-á o livramento condicional após o cumprimento de dois terços da pena, vedada sua concessão ao reincidente específico”. Obs: essas disposições não se aplicam: Art. 33 § 2º (induzimento ou instigação ao uso de drogas) Art. 33 § 3º ( Uso compartilhado de droga) Art. 33 § 4º (Tráfico privilegiado) ANÁLISE DAS RESTRIÇÕES DO ART. 44 • Inafiançabilidade: após Lei nº 11.464/07 (alterou o art. 2º, II da Lei dos Crimes Hediondos) é possível a Liberdade Provisória sem fiança com aplicação de medida cautelar diversa da prisão (Lei nº 12.403/11); • Vedação da conversão em penas restritivas de direitos: STF declarou inconstitucional esse dispositivo (HC 97.256-RS) pois, é atribuição do juiz verificar se é possível aplicar ou não pena restritiva de direitos em caráter substitutivo (art. 5º, XLVI da CF) – Resolução 05-2012 do Senado; • Progressão de regimes: o art. 44 da Lei de drogas, não fala nada sobre progressão de regimes. Assim, conforme entendimento predominante, os lapsos aplicáveis para os artigos 34, 35, 36 e 37 são aqueles previstos na legislação comum (LEP – Lei 7210/84 com alterações do pacote Anticrime – Lei 13;964/19), uma vez que não são considerados crimes hediondos. Para o art. 33 “caput” e 33 § 1 º, I, II , III e IV teremos aplicação da Lei dos Crimes Hediondo TRÁFICO PRIVILEGIADO Art. 33 § 4º: Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos , desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa. Causa específica de diminuição de pena (1/6 a 2/3): aplicada apenas aos que “transportam a droga” (mulas) que fossem primários e de bons antecedentes, desde que não associados às organizações criminosas; HEDIONDEZ DO TRÁFICO PRIVILEGIADO 1ª Corrente: tem natureza hedionda porque é “Tráfico”, apenas a pena é menor em razão da causa de diminuição (não é crime autônomo) (Entendimento da antiga Súmula 512 do STJ – FOI CANCELADA); 2ª Corrente: não tem natureza hedionda, pois são institutos incompatíveis. Não poderia ser privilegiado e hediondo ao mesmo tempo. Até 2016 o STJ e STF entendiam ser hediondo, mas, a partir deste ano, o STF e o STJ unificaram o posicionamento de que o TRÁFICO PRIVILEGIADO NÃO TEM CARÁTER HEDIONDO (Súm. 512 do STJ foi cancelada). Esse é o entendimento predominante na atualidade. QUESTÕES ATUAIS SOBRE O TRÁFICO PRIVILEGIADO • Cabe conversão de pena privativa de liberdade em restritiva de direitos se preenchidos os requisitos legais. • HC Coletivo do STJ: Em 08/09/20, o STJ julgou o “HC nº 596603” impetrado pela Defensoria Pública de SP onde foi concedido um “habeas corpus coletivo” para todos os presos condenados por tráfico privilegiado cuja pena estivesse no patamar de 01 (um) ano e 08 (oito) meses, onde, poderiam os mesmos cumprirem pena em REGIME ABERTO (alcançou mais de mil e cem presos); CARACTERÍSTICAS GERAIS SOBRE O TRÁFICO DE DROGAS 1) Circunstâncias indicativas do tráfico: aplicam- se as mesmas previstas no art. 28 § 2º (quantidade de droga, local da apreensão, antecedentes, conduta do agente, etc.) Lei de Drogas Brendha Ariadne Cruz – 6º Termo – Toledo Prudente 2) Elemento normativo do tipo: sem autorização legal ou em desacordo com a determinação legal ou regulamentar; 3) Aspectos probatórios: dúvida entre tráfico e porte, aplica-se o “in dubio pro reu”; 4) Palavra dos policiais que participaram da apreensão: a jurisprudência vem aceitando como válida (apenas por ser policial não afasta a validade do depoimento) mas precisa estar em harmonia com os demais elementos do processo; 5) Destruição das drogas apreendidas: as drogas serão destruídas (incineradas) em 15 dias (caso ocorra prisão em flagrante e os laudos estiverem prontos) ou em 30 dias, caso não haja prisão em flagrante (Obs: poderá ser guardada amostra da droga para o laudo definitivo se não tiver sido realizado) - Art. 50 e 50-A Lei 11.343/06 – (Lei nº 13.840/19) 6) Bens apreendidos com o tráfico: veículos, embarcações, aeronaves, serão apreendidos e vendidos em hasta pública conforme procedimento estabelecido nos arts. 60 a 64 da Lei de Drogas (Lei nº13.886/19); Obs: O juiz decretará a perda dos bens, direitos, produtos obtidos com o tráfico (art. 63 da Lei de Drogas). As terras que foram utilizadas para o tráfico serão expropriadas sem direito a indenização (art. 243 da CF/88 – art. 32 § 4º da Lei de Drogas) 7) Competência para julgamento do Tráfico: • Tráfico Nacional: Competência da Justiça Estadual; • Tráfico Internacional: Competência da justiça Federal (art. 109, V da CF e 70 da Lei 11.343/06) 26-10-2022 ASSOCIAÇÃO AO TRÁFICO “Art. 35. Associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º , e 34 desta Lei: Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e pagamento de 700 (setecentos) a 1.200 (mil e duzentos) dias-multa. Parágrafo único. Nas mesmas penas do caput deste artigo incorre quem se associa para a prática reiterada do crime definido no art. 36 desta Lei”. OBJETIVIDADE JURÍDICA Saúde Pública e Segurança Pública; ENQUADRAMENTO LEGAL Crime autônomo e independente em face do art. 33 da Lei de Drogas (não é obrigatória a condenação por tráfico para ser condenado por associação ao tráfico). Posso ter apenas condenação por Associação por tráfico (art. 35 da Lei de Drogas) ou concurso material com outros crimes (Tráfico – 33 Lei de Drogas); Obs: existem posicionamentos minoritários de que a Associação ao tráfico seria um delito acessório ou secundário, apenas sendo aplicado em caso de condenação por tráfico ; CAMPO DE INCIDÊNCIA DA ASSOCIAÇÃO AO TRÁFICO A Associação ao tráfico fica limitada aos seguintes casos: Art. 33 caput e § 1º; (Tráfico na figura básica e figuras equiparadas) Art. 34 – Maquinismo para o tráfico; Art. 36- Financiamento para o tráfico. Obs: não se aplica o crime de Associação ao tráfico em outras hipóteses da Lei nº 11.343/06 (consideradas pelo legislador de condutas individualizadas) REQUISITOS PARA O RECONHECIMENTO DA ASSOCIAÇÃO AO TRÁFICO São requisitos cumulativos 1) Participação de “no mínimo” DUAS PESSOAS: a associação ao tráfico equiparou ao concurso de agentes (art. 29 do CP); 2) Intenção de praticar os crimes previstos nos artigos: 33 “caput”, 33 § 1º, 34 e 36: Tráfico na figura básica e nas figuras equiparadas, maquinismo para o tráfico e financiamento para o tráfico; 3) Que os agentes queiram cometer o crime de forma reiterada ou não: Correntes de entendimentos: 1ª Corrente: não se exige estabilidade e permanência; 2ª Corrente: exige-se estabilidade e permanência, mesmo que seja para cometer um único crime de tráfico. Posição majoritária. ➔ Pode haver um tráfico só, mas para caracterizar associação deve-se ter Lei de Drogas Brendha Ariadne Cruz – 6º Termo – Toledo Prudente estabilidade mesmo para esse único crime. CRITÉRIOS LEVADOS EM CONSIDERAÇÃO PARA O RECONHECIMENTO DA ASSOCIAÇÃO AO TRÁFICO: ▪ Gravidade da dimensão do tráfico; ▪ Finalidade da reiteração criminosa; ▪ Quantidade de integrantes e estruturação da Associação. Obs: Não se aplica o art. 288 do CP (princípio da especialidade). Aplica-se somente o art. 35 da Lei nº 11.343/06); Dependendo das circunstâncias (mais de 04 integrantes, nível de organização e estruturação empresarial – transnacionalidade, etc.) pode ser aplicada a Lei nº 12.850/13 – Organizações Criminosas. TIPICIDADE SUBJETIVA DOLO ESPECÍFICO: Vontade livree consciente de se associar para o fim de praticar “tráfico de drogas”; CONSUMAÇÃO Crime formal – consuma-se no momento da união dos envolvidos “Societa Criminis”; TENTATIVA Não se admite. DELAÇÃO PREMIADA Art. 41 da Lei nº 11.343/06. Se o agente colaborar voluntariamente com a investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais coautores ou partícipes do crime e na recuperação total ou parcial do produto do crime pode ser aplicada uma redução de 1/6 a 2/3 (aplica subsidiariamente a Lei nº 9807/99) CAUSAS DE AUMENTO DE PENA NO TRÁFICO DE DEMAIS CRIMES CORRELATOS Estão previstas no art. 40 da Lei 11.343/06 e se aplicam nos casos do artigo 33 até o 37. Assim, as penas podem ser majoradas no patamar de 1/6 até 2/3 nas seguintes hipóteses: I - a natureza, a procedência da substância ou do produto apreendido e as circunstâncias do fato evidenciarem a transnacionalidade do delito; II - o agente praticar o crime prevalecendo-se de função pública ou no desempenho de missão de educação, poder familiar, guarda ou vigilância; III - a infração tiver sido cometida nas dependências ou imediações de estabelecimentos prisionais, de ensino ou hospitalares, de sedes de entidades estudantis, sociais, culturais, recreativas, esportivas, ou beneficentes, de locais de trabalho coletivo, de recintos onde se realizem espetáculos ou diversões de qualquer natureza, de serviços de tratamento de dependentes de drogas ou de reinserção social, de unidades militares ou policiais ou em transportes públicos; IV - o crime tiver sido praticado com violência, grave ameaça, emprego de arma de fogo, ou qualquer processo de intimidação difusa ou coletiva; V - caracterizado o tráfico entre Estados da Federação ou entre estes e o Distrito Federal; VI - sua prática envolver ou visar a atingir criança ou adolescente ou a quem tenha, por qualquer motivo, diminuída ou suprimida a capacidade de entendimento e determinação; VII - o agente financiar ou custear a prática do crime.
Compartilhar