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A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 1 id199265 pdfMachine by Broadgun Software - a great PDF writer! - a great PDF creator! - http://www.pdfmachine.com http://www.broadgun.com A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 2 JOSÉ ARILSON XAVIER DE SOUZA A RESIGNIFICAÇÃO RELIGIOSA DO TURISMO REGIONAL: UM ESTUDO GEOGRÁFICO-CULTURAL DO SANTUÁRIO DE FÁTIMA DA SERRA GRANDE Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Ceará (UFC) como requisito para a obtenção do grau de Mestre. Orientador: Prof. Dr. Christian Dennys Monteiro de Oliveira. FORTALEZA-CE 2009 FORTALEZA-CE 2009 A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 3 S715r Souza, José Arilson Xavier de A resignificação religiosa do turismo regional : um estudo geográfico-cultural do Santuário de Fátima da Serra Grande / José Arilson Xavier de Souza, 2009. 164 f. ; il. color. enc. Orientador: Prof. Dr. Christian Dennys Monteiro de Oliveira Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do Ceará, Centro de Ciências. Depto. de Geografia, Fortaleza, 2009. 1. Religião. 2. Turismo. 3. Santuário. 4. Região. 5. Geografia. I. Oliveira, Christian Dennys Monteiro de (orient.). II. Universidade Federal do Ceará � Pós-Graduação em Geografia. IV. Título. CDD 910 A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 4 JOSÉ ARILSON XAVIER DE SOUZA A RESIGNIFICAÇÃO RELIGIOSA DO TURISMO REGIONAL: UM ESTUDO GEOGRÁFICO-CULTURAL DO SANTUÁRIO DE FÁTIMA DA SERRA GRANDE Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Ceará (UFC) como requisito para a obtenção do grau de Mestre. Aprovada em 28 de Julho de 2009. Nota: 10 BANCA EXAMINADORA ______________________________________________ Prof. Dr. Christian Dennys Monteiro de Oliveira Universidade Federal do Ceará � UFC Departamento de Geografia (Orientador) ______________________________________________ Profª. Drª. Zeny Rosendahl Universidade do Estado do Rio de Janeiro � UERJ Departamento de Geografia ______________________________________________ Prof. Dr. Ireleno Porto Benevides Universidade Federal do Ceará � UFC Departamento de Teoria e Economia ______________________________________________ Prof. Dr. Eustógio Wanderley Correia Dantas Universidade Federal do Ceará � UFC Departamento de Geografia A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 5 À Maria Alice, minha mãe, à Maria Valdenice, minha irmã, e a José Maria, meu pai, pelo incondicional apoio e carinho. A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 6 AGRADECIMENTOS A realização do trabalho científico se mostra de forma mais acentuada por meio de um esforço individual, através de reservados momentos de isolamento, mas também nos coloca diante de pessoas e instituições sem os quais se tornaria praticamente impossível o alcance dos objetivos pretendidos. Assim, agradecê-los nesta ocasião passa a ser uma questão de caráter. Deste modo, agradeço inicialmente a orientação do Professor Christian Dennys Monteiro de Oliveira, por ter acreditado na efetivação deste projeto e pela competência científica e simplicidade com que conduziu as nossas relações universitárias e amigáveis. As suas palavras sempre me incentivaram a buscar algo a mais. Fica ainda registrada a minha admiração e apreço a este ser humano. Aos demais professores da Universidade Federal do Ceará que bem contribuíram para a minha formação enquanto mestrando: José Borzachiello da Silva, Leví Furtado Sampaio e Eustógio Wanderley Correia Dantas. A este último em especial pelo bom atendimento que me concedeu, estimulando sempre o enfrentamento aos desafios postos pela vida acadêmica. Pelo apoio empregado, este agradecimento se estende ainda para os professores Jeovah Meireles, Elisa Zanella, Clélia Lustosa e Marta Celina. Aos professores que não são da �casa� (UFC), mas que colaboraram de alguma forma com a pesquisa, com destaque considerável à portuguesa Professora Maria da Graça Mouga Poças Santos, do Instituto Politécnico de Leiria (Portugal), com quem mantive contatos principalmente via internet, mas também pessoalmente durante evento afim; à Professora Zeny Rosendahl, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, que se mostrou sempre solícita quando precisamos de suas compreensões; e à Professora Maria de Lourdes de Araújo, da Universidade Regional do Cariri, integrante da Banca de Qualificação desta pesquisa, que bem contribuiu através de suas importantes intervenções. Outro reconhecimento especial direciona-se ao amigo e Professor Lenilton Francisco de Assis, que através de suas exigências e conversas durante a minha graduação, na Universidade Estadual Vale do Acaraú (UVA), fez-me acreditar que eu era capaz, estimulando para que continuássemos pelos caminhos da academia. Nesta época, até �um hoje simples� resumo de Iniciação Científica já me causava muitas inquietações. A sua paciência foi algo imprescindível! Da UVA sou grato também às professoras Martha Júnior, Neide Santana e Sandra Fonteneles pela torcida e incentivos. A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 7 À minha família agradeço pelo apoio e estímulo, em especial aos meus pais, Maria Alice e José Maria, à minha irmã Maria Valdenice, meu cunhado José Osmarino e a meus sobrinhos Daniel, Izidório e Gelson. Registro exclusiva gratidão e meus sentimentos ainda à Reneida Monteiro da Silva, companheira de muitos anos, pelos momentos de contribuição e compreensão. Aos amigos do curso de Geografia da Universidade Federal do Ceará, tanto da graduação, onde tive a oportunidade de me relacionar muito bem, como do Mestrado, com destacada menção a Márcio Luis, com quem pude compartilhar bons momentos de convivência, João Correia e Suéllem Araújo. Guardarei para sempre os momentos de risadas e colaborações mútuas que vivi com vocês. Estendo ainda estes agradecimentos aos amigos Fábio e Maclécio. Aos companheiros(as) do LEGE (Laboratório de Estudos Geoeducacionais), Leandro, Rafael, Girlene, Ivna, Tiago,Aragão, Carla e Luana, pelo acolhimento e bons momentos de convivência. Ao Lizandro agradeço pela ajuda atribuída na confecção dos mapas utilizados. Aos amigos que sempre torceram pelo meu sucesso profissional, Cleiton Martins, Sidiney Wilker, Francisco Xavier, Renato Monteiro, Samuel Pinheiro e Juliane Passos. A estes dois últimos também pela contribuição cedida em algum momento desta pesquisa. Ao pintor e colega Robervaldo, pela confecção da tela que serve como capa do trabalho. À Diocese de Tianguá, no nome do Bispo Dom Javier, e ao corpo administrativo do Santuário de Fátima da Serra Grande, com menção notória a Padre Antônio Martins Irineu, João Carlos, Edvar e Bruna, dentre outros, os quais sempre se mostraram solícitos na colaboração para com este estudo. À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pelo apoio no desenvolvimento deste trabalho de pesquisa científica, no que tange à concessão de bolsa de estudos, tão importante ao desenrolar das atividades requeridas. Agradeço ainda aos demais inquiridos, pelas respostas concedidas: agentes turísticos, visitantes do Santuário, moradores da cidade de São Benedito e aos jovens alunos da rede regional de ensino. Às coordenações das escolas averiguadas, pelo espaço cedido. E por fim, fica assinalada a nossa gratidão a todos que contribuíram e/ou incentivaram a concretização deste estudo, que, por motivos de esquecimento, não tiveram os seus nomes mencionados aqui. A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 8 . Descobrir o espaço, pensar o espaço, sonhar o espaço, criar o espaço... Uma pedagogia nova para um espaço vivido deve tomar em conta estas quatro exigências. Armand Frémont, (1980, p.262). A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 9 RESUMO Analisar de modo geográfico as atividades Religião e Turismo em suas relações sócio- espaciais é a maior intencionalidade desta pesquisa. Principalmente na tentativa de entender como a primeira pode significar novos valores à segunda é que tomamos como área para as nossas investigações a Região da Ibiapaba, situada na porção Norte do Estado do Ceará. Para tanto, tal direcionamento analítico é levado a cabo tendo como referência cabal as ações desenvolvidas pelo Santuário de Fátima da Serra Grande, localizado na cidade de São Benedito. A metodologia adotada no trabalho, por vez, segue predominantemente os desdobramentos do método fenomenológico, compreendendo a utilização de técnicas de pesquisa essencialmente qualitativas, porém, associando o uso de instrumentos quantitativos. Efetuou-se, assim, um compromissado levantamento e revisão bibliográfica, observação de campo, entrevista com representante eclesial e aplicação de questionários com visitantes da cidade de São Benedito, moradores locais e com alunos da rede regional de ensino. Com efeito, fazendo-se em parte como um estudo perceptivo, embasado nas leituras de uma renovada Geografia Cultural, o trabalho ora resumido analisa as representações imaginárias desses atores e agentes envolvidos com a realidade estudada. Portanto, o conhecimento destas representações, somado com as observações alcançadas, fazem com que ao final afirmemos que o Santuário em tela, diante de seus desígnios expansionistas em termos atrativos, proporciona à Região da Ibiapaba outra configuração territorial, incidente sobre o seu imaginário e quadro turístico, onde possivelmente se acarretará um grau maior de visitação e exploração. Em suma, acredita-se que o Santuário vem proporcionando uma espécie de resignificação religiosa do Turismo regional. Assim, defendemos que este equipamento seja visto pelo seu potencial turístico. Palavras-Chave: Religião; Turismo; Santuário; Região; Geografia. A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 10 ABSTRACT The major aim of this research is to analyze in a geographical way the activities of religion and tourism in their socio spatial relations. Trying to understand the first activity that means new values, we took the second as the area for investigating the region of Ibiapaba, situated in the North part of Ceará State. To do this, an analytical direction was taken, having as complete reference the actions developed by Fátima Sanctuary of Serra Grande, located in the city of São Benedito. The methodology used in this work, follows mainly the development of the phenomenological method comprising the use of techniques of research essentially qualitative, however associating the use of quantitative appliances. It was made a reliable survey, bibliographical review, field observation, interview with ecclesiastic representative and the application of questionnaires to visitors of São Benedito city, to the neighborhood and students of the teaching regional network. So, doing this work as a perceptive study, based in the readings of a renewed cultural geography, this work now summarized analyses the imaginary performances of these actors and agents involved with the reality studied. Therefore, the knowledge of these performances summed up with the reached observations, make us say that the Sanctuary in front of its expansive and attractive purposes, provides to the Region of Ibiapaba another territorial configuration , incident on its imaginary and touristic sights where possibly will have a more extent of exploration and visitation. In short, it is believed that the Sanctuary is providing a kind of religious meaning of regional tourism. Thus, this baggage needs to be seen because of its touristic potential. Keywords: Religion; Tourism; Sanctuary; Region; Geography. A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 11 LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 01: Esboço reduzido da investigação Figura 02: Área representativa de estudo Figura 03: Antecedentes, gênese e evolução da Geografia da Religião (esquema-síntese) Figura 04: Mediações motivacionais para o exercício do Turismo Religioso Figura 05: Mapa das macrorregiões turísticas do Estado do Ceará Figura 06: Vista parcial do Planalto da Ibiapaba Figura 07: Mapa do Ceará � destaque a Região da Ibiapaba Figura 08: CE 085 � ligação entre Jijoca e Granja Figura 09: Santuário de Fátima da Serra Grande Figura 10: Sede da Diocese de Tianguá Figura 11: Mapa da área territorial da Diocese de Tianguá - em destaque São Benedito Figura 12: Dom Javier Figura 13: Igreja de Nossa Senhora do Livramento de Parazinho Figura 14: Padre Antônio em ato eucarístico Figura 15: Interações Centrípetas e Centrífugas do Santuário Figura 16: Terreno do Santuário Figura 17: Benção do terreno Figura 18: Projeto do Santuário Figura 19: Vista aérea do Santuário (Projeto) Figura 20: Santuário durante as festas de Maria � maio 2008 Figura 21: Santuário durante as festas de Maria � maio 2009 Figura 22: Religioso em penitência Figura 23: Sala de ex-votos Figura 24: Imagem de Nossa Senhora de Fátima Figura 25: Devoto Thomas Bezerra da Silva Figura 26: Mapa da cidade de São Benedito Figura 27: Praça central da cidade de São Benedito Figura 28: Mapa dos principais Santuários do Estado do Ceará Figura 29: Cartaz do Santuário em comércio local Figura 30: Mapa dos principaispontos turísticos da Região da Ibiapaba Figura 31: Mapa de localização da cidade de São Benedito, com distâncias e vias de acesso para algumas cidades dos Estados do Ceará e do Piauí � destaque ao S.F.S.G A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 12 Figura 32: Capa de panfleto de orações do Santuário Figura 33: Modelo hipotético do processo de resignificação pela imaginação Figura 34: Fachada da escola MAC Figura 35: Fachada do CPACO Figura 36: Fachada da escola Monsenhor Melo Figura 37: Fachada da escola Monsenhor Aguiar A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 13 LISTA DE TABELAS E GRÁFICOS Tabela 01: Características físico-geográficas dos municípios da Região da Ibiapaba Tabela 02: Principais atrativos turísticos da Região da Ibiapaba Tabela 03: Quadro de paróquias que compõem a Diocese de Tianguá Tabela 04: Áreas Missionárias que compõem a Diocese de Tianguá Tabela 05: Regiões Pastorais da Diocese de Tianguá Tabela 06: Quadro do número de alunos inquiridos por cidade e caráter da escola Gráfico 01: Local de origem dos visitantes Gráfico 02: Modo da viagem Gráfico 03: Meio de hospedagem utilizado Gráfico 04: Principal motivo da viagem Gráfico 05: Enquadramento espacial do Santuário � Visitante Gráfico 06: Valências associadas ao Santuário � Morador local Gráfico 07: Enquadramento espacial do Santuário � Morador local Gráfico 08: Importância do estudo da Religião nas aulas de Geografia � escola pública de São Benedito Gráfico 09: Importância do estudo do Turismo nas aulas de Geografia � escola pública de São Benedito Gráfico 10: Enquadramento espacial do Santuário � escola pública de São Benedito Gráfico 11: Importância do estudo da Religião nas aulas de Geografia � escola privada de São Benedito Gráfico 12: Importância do estudo do Turismo nas aulas de Geografia � escola privada de São Benedito Gráfico 13: Enquadramento espacial do Santuário � escola privada de São Benedito Gráfico 14: Importância do estudo da Religião nas aulas de Geografia � escola de Ibiapina Gráfico 15: Enquadramento espacial do Santuário � escola de Ibiapina Gráfico 16: Importância do estudo da Religião nas aulas de Geografia � escola de Tianguá Gráfico 17: Enquadramento espacial do Santuário � escola de Tianguá A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 14 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS APL � Arranjo Produtivo Local BNB � Banco do Nordeste do Brasil BNDES � Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social BID � Banco Interamericano de Desenvolvimento CAPES � Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Nível Superior CNBB � Conferência Nacional dos Bispos do Brasil CONDER � Conselho de Desenvolvimento Regional da Ibiapaba CPACO � Colégio Professora Alice do Carmo EMCETUR � Empresa Cearense de Turismo ENTBL � Encontro Nacional de Turismo com Base Local FCT � Fórum de Cultura e Turismo FUI � Festival União da Ibiapaba GETI � Grupo de Empresários de Turismo da Ibiapaba IBAMA � Instituto Brasileiro de Meio Ambiente IBGE � Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IPECE � Instituto de Pesquisa e de Estratégia Econômica do Ceará IPHAN � Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional LEGE � Laboratório de Estudos Geoeducacionais MAC � Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Ministro Antônio Coelho MAPP � Mestrado Acadêmico em Políticas Públicas NEPEC � Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Espaço e Cultura NUPPER � Núcleo Paranaense de Pesquisa em Religião OMT � Organização Mundial de Turismo PDIR � Plano de Desenvolvimento Interregional do Vale do Coreaú-Ibiapaba PNT � Programa Nacional de Turismo PRODETUR-NE � Programa de Desenvolvimento do Turismo no Nordeste PRODETUR-CE � Programa de Desenvolvimento do Turismo no Ceará PRODETURIS � Programa de Desenvolvimento do Turismo no Litoral do Ceará RITUR � Rede de Turismo da Ibiapaba RSG � Resignificação SETUR-CE � Secretaria de Turismo do Estado do Ceará S.F.S.G � Santuário de Fátima da Serra Grande A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 15 UERJ � Universidade do Estado do Rio de Janeiro UFC � Universidade Federal do Ceará UFPR � Universidade Federal do Paraná A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 16 SUMÁRIO INTRODUÇÃO.............................................................................................................17 Fundamentos teórico-metodológicos e procedimentos da pesquisa...............................19 CAPITULO I � A ABORDAGEM GEOGRÁFICA DA RELIGIÃO E DO TURISMO......................................................................................................................26 1.1. A Religião enquanto tema cultural de interesse geográfico....................................27 1.1.1. A importância da renovação e difusão da Geografia Cultural...............................29 1.1.2. Sobre a disciplina Geografia da Religião..............................................................34 1.1.3. O interesse da Geografia pela Religião.................................................................36 1.2. O Turismo e o exame geográfico.............................................................................39 1.3. Sobre o Turismo e a Visitação religiosa...................................................................45 1.4. Igreja Católica: ação cultural, espacial e também turística......................................51 CAPITULO II � O TURISMO REGIONAL: A IBIAPABA EM FOCO................55 2.1. A Região sob o olhar da Geografia..........................................................................56 2.2. Planejamento do Turismo regional: a experiência do Estado cearense....................61 2.3. Caracterização geográfica da Região da Ibiapaba....................................................67 2.4. O Turismo na Ibiapaba.............................................................................................70 CAPITULO III � SANTUÁRIO DE FÁTIMA DA SERRA GRANDE: DIMENSÕES GEOGRÁFICA, RELIGIOSA E TURÍSTICA DE ANÁLISE........76 3.1. O Santuário de Fátima da Serra Grande no contexto da Diocese de Tianguá: uma explicação mitológica para a constituição territorial.......................................................77 3.2. Santuário de Fátima da Serra Grande: um �geossímbolo� cosmogônico.................87 3.3. São Benedito, cidade ibiapabana sede do Santuário.................................................95 3.4. O Santuário e o Turismo [Religioso]: possibilidades regionais.............................100 CAPITULO IV � REPRESENTAÇÕES IMAGINÁRIAS ACERCA DO SANTUÁRIO E DO TURISMO REGIONAL..........................................................108 4.1. O processo de resignificação pelo discurso geográfico da imaginação.................109 4.2. Polivocalidade de atores e agentes envolvidos com a realidade em estudo...........111 A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 17 4.2.1)Análise das percepções de um representante eclesial responsável pelo Santuário.....................................................................................................................113 4.2.2) Análise das percepções dos visitantes do Santuário.........................................116 4.2.3) Análise das percepções dos moradores da cidade de São Benedito.................121 4.2.4) Contextualizando a presença de alunos da Região no âmbito da pesquisa......125 4.2.4.1) Análise das percepções dos alunos da Escola Ministro Antônio Coelho � São Benedito......................................................................................................................127 4.2.4.2) Análise das percepções dos alunos do Colégio Professora Alice do Carmo Oliveira � São Benedito..............................................................................................129 4.2.4.3) Análise das percepções dos alunos da Escola Monsenhor Melo � Ibiapina.......................................................................................................................132 4.2.4.4) Análise das percepções dos alunos da Escola Monsenhor Aguiar � Tianguá.......................................................................................................................135 4.2.5) Pontuando interpretativamente determinadas representações.............................138 CONSIDERAÇÕES FINAIS: REFLETINDO SOBRE A RESIGNIFICAÇÃO RELIGIOSA DO TURISMO IBIAPABANO...........................................................141 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................147 APÊNDICE 1: Roteiro de entrevista com representante eclesial responsável pelo Santuário........................................................................................................................156 APÊNDICE 2: Questionário de opinião do visitante do Santuário..............................157 APÊNDICE 3: Questionário de opinião do morador da cidade de São Benedito....... 159 APÊNDICE 4: Questionário de opinião dos alunos da Região da Ibiapaba................161 ANEXO 1: Decreto de lei canônica da criação do Santuário de Fátima da Serra Grande...........................................................................................................................163 ANEXO 2: Música em referência ao Santuário de Fátima da Serra Grande................164 A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 18 INTRODUÇÃO O espaço se revela como o maior direcionamento das atenções analíticas que o geógrafo tem empregado em seus embates e desvendamentos teórico-empíricos em toda a história da ciência geográfica, ao ponto de ser de maneira especializada nomeado de espaço geográfico. Mesmo sendo objeto de interesse de outras ciências, o espaço, quando mencionado, faz lembrar a Geografia. Seguindo o ritmo das transformações que a sociedade mundial foi impregnando, e assim continua fazendo, em seu meio de vivência, os geógrafos estão sendo continuamente chamados a contribuir com o foro social pela análise espacial que sabem realizar. Analisar o espaço geográfico não se trata de uma tarefa simples, tendo em vista que este acolhe diversas atividades humanas e, não mais entendido unicamente de maneira cartesiana, está sujeito a diversas representações imaginárias do homem. Deste modo, no amplo campo das significações espaciais, a Religião vem se mostrando como um fenômeno de interesse também do geógrafo, afinal, muito dos aspectos religiosos, das mais variadas religiões, dependem diretamente de uma base geográfica para fixação. Recortes espaciais são alegados e afirmados por suas constituições sagradas. Afirmamos, por isso mesmo, que a Religião tem uma dimensão espacial que precisa ser investigada. O Turismo, outra atividade humana difusora de (re)definições territoriais em lugares e regiões, também faz parte do temário empírico e teórico dos estudos geográficos. Notadamente, as atividades turísticas têm merecido da Geografia uma atenção maior se comparadas à Religião. As formas de crenças através de seus rebatimentos espaciais, por sua vez, vêm crescendo enquanto temática de interesse dos profissionais que �fazem Geografia�. A evolução teórica do conhecimento geográfico tem concorrido em muito para esta ampliação analítica dos fenômenos. Já quando nos colocamos a analisar um fenômeno que mescla fatores religiosos e turísticos, o Turismo Religioso no caso, a quantidade de estudos geográficos afins é ainda menor. Por caráter, esta especificidade de visitação se destaca, geograficamente falando, por encontrar na religiosidade dos lugares e das pessoas o seu princípio de origem, multiplicando paisagens, dinamizando territórios, distribuindo formas e gerando fluxos. A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 19 Em termos concretos, acompanhando esta comenta inicial de direcionamentos, a pesquisa que se segue está intencionada no ensejo de trabalhar com abordagens teóricas que dêem conta de analisar as incidências espaciais de duas práticas sociais: Religião e Turismo (ora em separado, ora em conjunto). Deste feito, visamos contribuir para o conhecimento do fenômeno geográfico abrangente em nossas análises, bem como para melhor visualizar, comparativamente, a formação de realidades semelhantes com a aqui estudada. Assim, pela complexidade posta, torna-se necessária a adoção de um critério de embasamento teórico plural, e não restritamente (puramente) geográfico, embora seja este o dominante, buscando em outras áreas do conhecimento um desenho mais apurado para as nossas explicações científicas de geógrafo. Santos (2006), ao realizar um minucioso estudo geográfico referente ao Santuário de Fátima em Portugal, assentado sobre o tripé Espiritualidade, Turismo e Território, desenvolveu um importante aporte voltado aos estudos da Geografia da Religião, mas também à Geografia do Turismo, que, assim, nos instigou para melhor pensarmos o trabalho agora escrito. No intuito de fazermos render as pesquisas neste campo da Geografia, procuramos investigar como pode ocorrer o processo de �resignificação� religiosa do Turismo regional, tomando como estudo de caso a Região da Ibiapaba, situada no Noroeste do Estado do Ceará, ponderando-a a partir da organização religiosa do Santuário de Fátima da Serra Grande, localizado na cidade de São Benedito. Conforme proposta apresentada, as marcas impressas pela Religião Católica através do Santuário de Fátima da Serra Grande, será, quanto possível, uma das preocupações interpretativas deste trabalho científico. Outra inquietação manifesta reside na tentativa de captar as eventuais tendências que este �equipamento religioso� pode incidir no desenvolvimento futuro do Turismo na Região. Neste sentido, as análises das percepções dispensadas por atores e agentes envolvidos enquanto �sujeitos projetados� com a realidade estudada terão grande importância. Partindo desses pressupostos, idealizamos a pesquisa em quatro capítulos articulados. No primeiro capítulo, por meio de uma revisão bibliográfica consistente, objetivamos demonstrar como a Geografia tem desenvolvido considerações teóricas a respeito dos fenômenos Religião e Turismo e, mais especificamente, sobre o Turismo Religioso. As ações culturais, espaciais e turísticas promovidas pela Igreja Católica também são ventiladas neste capítulo inicial. No segundo, procuramos apresentar a Região da Ibiapaba pelos seus debates e potencialidades turísticas, frente ao contexto do A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza_________________________________________________________________________________ 20 planejamento regional/estadual das atividades correspondentes. Já o terceiro capítulo se inscreve na tentativa de apresentar, explicar a formação mitológico-territorial e avaliar o caráter religioso e de potencialidades turísticas (atrativas) do Santuário de Fátima da Serra Grande, intercalando considerações entre a escala local (São Benedito) e regional (Ibiapaba). A análise das ações exercidas pela Diocese responsável pelo Santuário se faz presente pelo fato de que expressam uma leitura explicativa para a criação e sustentação de tal forma geossímbolica (o Santuário). E, por fim, o quarto capítulo é, em grande parte, resultado de análises da coleta de dados e informações diretas. Efetuada a aplicação de entrevista e questionários, privilegiaram-se as seguintes amostragens: representantes eclesiais, visitantes do Santuário, moradores da cidade de São Benedito e jovens da rede regional de ensino. Nessa seção do texto, as percepções dos inquiridos são trabalhadas mediante as principais freqüências alcançadas, tendo o intuito de absorver o imaginário regional concernente a temáticas ligadas ao fenômeno estudado, o que nos forneceu subsídios para afirmar a existência de uma resignificação em sentido amplo, inclusive espacial. No entanto, obedecendo aos preceitos de uma pesquisa científica, estabelecemos algumas escolhas teóricas e metodológicas preferenciais. Fundamentos teórico-metodológicos e procedimentos da pesquisa No desígnio de oferecer uma abrangência dos caminhos teóricos e metodológicos utilizados na pesquisa perante os fenômenos e a área estudada, abrimos esta seção para realizar esclarecimentos sobre os procedimentos empregados. Assim, de modo geral, exporemos alguns tópicos visando iluminar e delimitar as opções científicas aplicadas. Campo de estudo Demarcamos logo de início que esta pesquisa possui um caráter eminentemente geográfico e que por isso segue preceitos direcionados por esta ciência. No entanto, aposta em uma vertente de caráter interdisciplinar, em contato com outras áreas do conhecimento; entendendo que assim o conhecimento geográfico se torna mais inteligível (HISSA, 2002). A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 21 Adiantamos que o acesso mais direto à temática da Religião não faz desta pesquisa um estudo teológico. Embora tal campo possa ser visto como uma contribuição à compreensão da ação eclesial no espaço geográfico averiguado. Quando nos referimos à Religião, estamos nos restringindo ao entendimento específico de investigação sobre a Religião Católica. Com efeito, acreditamos que, pelo menos em parte, este texto esteja em consonância com o eixo indicativo correspondente às �leituras sobre a transformação territorial do espaço religioso�, apontado por Oliveira (2005), e com a linha de estudos �religião, território e territorialidade�, proposta por Rosendahl (1996). Assim, por tratar de simbolismo religioso, a Geografia da Religião é vista com bastante influência neste estudo. No bojo de discutir o Turismo como uma atividade incidente sobre a �geografia� dos lugares, justamente pela interatividade espacial e fácil adaptação que desenvolve junto aos mais variados espaços temáticos, neste tratamento, fazemos uso de considerações alinhadas pelo campo de estudo conhecido por Geografia do Turismo. A grande área de abrangência da ciência geográfica, chamada Geografia Humana, que percebe as relações sociais como produtora cultural do espaço geográfico, permite que enquadremos esta pesquisa no campo da Geografia Cultural. Entendemos que as práticas religiosas e turísticas possuem uma natureza cultural incidente sobre o �espaço do geógrafo�, ou seja, aquele que o geógrafo analisa. Examinar os fenômenos espaciais por uma ótica cultural tem se tornado preocupação de um número crescente de geógrafos, possibilitando vários mecanismos de análise. A imaginação geográfica das pessoas, que, grosso modo, pode ser entendida como a imaginação geográfica dos lugares estudados, é um caminho apontado. Com isto, ao darmos voz aos atores e agentes que partilham da realidade em estudo, trabalhamos com a idéia de averiguar as percepções significativas destes no sentido de compreender o imaginário regional pelo seu novo molde após a instalação do Santuário em tela. Como um dos conceitos mais caros à Geografia em toda a sua história, Região será aquele mais abordado na pesquisa, principalmente quando nos reportarmos à Região turística da Ibiapaba. Isso não quer dizer, porém, que, para fazermos uma análise geográfica o mais completa possível, não iremos recorrer a outros conceitos geográficos, tão caros ao entendimento da Região. A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 22 A composição do título da pesquisa: �A Resignificação Religiosa do Turismo Regional: Um Estudo Geográfico-cultural do Santuário de Fátima da Serra Grande�, no entanto, pode ser capaz de evidenciar os principais eixos temáticos empregados (Figura 1), aportando no Santuário o foco principal. Figura 1: Esboço reduzido da investigação Fonte: Elaboração própria, a partir de Santos (2006). Resultado de reflexões acerca dos temas propostos, esta pesquisa teve sua origem numa viagem, podemos dizer turística, realizada à Região da Ibiapaba em 2006, na qual pudemos visitar o Santuário de Fátima da Serra Grande ainda no seu estágio inicial de construção. Daí diferentes situações convergiram a favor do desenvolvimento do projeto, sendo possível, em curto espaço de tempo, torná-lo uma realidade. O amadurecimento teórico e metodológico veio mediante as discussões realizadas na Universidade, no contato com a orientação direcionada e, concomitantemente, pela participação em grupos de estudos afins a tais debates. Recorte espacial e temporalidade de estudo Os estudos geográficos sempre se situam por recortes espaciais e temporais de referências. Perdemos quando rompemos com a interligação de áreas e temporalidades, contudo, por outro lado, podemos ganhar no que toca à apuração mais detalhada dos fatos. Dialeticamente, estas escolhas não funcionam como barreiras que nos impedem de transbordarmos as referências tomadas a princípio. Caso seja necessária a �saída� a outros recortes espaciais e temporais visando o melhor entendimento da realidade estudada, não devemos ficar presos, sob a pena de mal explicarmos os mesmos. A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 23 Assim, a área espacial prioritária do nosso estudo conjuga três instâncias principais: o Santuário de Fátima da Serra Grande, a Região da Ibiapaba e a cidade de São Benedito (Figura 2), não necessariamente sempre nesta ordem. O recorte territorial de atuação da Diocese de Tianguá, respondente por tal Santuário, deverá ser consultada justamente por compor uma explicação territorial de implantação do mesmo. Figura 2: Área representativa de estudo A Região da Ibiapaba, composta por nove municípios, é alvo de nossas investigações por já possuir um discurso turístico formado. Pode agora ser revista pela implantação do centro de atração religiosa e turística que é o Santuário de Fátima da Serra Grande. Localizado na cidade de São Benedito, o Santuário já ocasiona transformações paisagísticas e territoriais em sua cidade sede; por isso mesmo este circunscreve outro espaço analisado neste estudo. Pela relação intermediária que adotamos entre o Santuário e aRegião da Ibiapaba, demarcamos como temporalidade referencial de nossas análises o ano de 2005, quando tem início a construção das obras do Santuário. No entanto, a fim de realizarmos compreensões acerca da constituição deste centro religioso, teremos de nos envolver com o tempo de trabalho da Diocese de Tianguá, retrocedendo a data lançada A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 24 acima. Isso porque só assim conseguiremos revelar a �chave que abre as portas� para o entendimento espacial da realidade geográfica posta. Quando tivermos que considerar a organização política do Turismo na Região da Ibiapaba este exercício de �volta no tempo� (tomando por base o ano de 2005) também se mostrará necessário. Admitindo que o espaço geográfico além de ser um híbrido de marcas passadas e presentes é ainda palco imaginativo de virtualidades futuras (SANTOS, 1996), também nos remeteremos neste estudo às potencialidades que o espaço religioso do Santuário pode conter rumo a um futuro promissor, tendo em vista a imaginação criadora do homem. Para realizar uma pesquisa mais elaborada, os geógrafos que estudam sobre Religião penetram, ou pelo menos assim devem fazer, na vida religiosa, estudam-na do interior. Percebem como o futuro e a idéia de outro mundo é vivenciada pelos fiéis (CLAVAL, 2008). Sobre o método O trabalho científico direcionado amiúde para um objetivo de investigação caminha para o conhecimento e possível explicação de determinado(s) fenômeno(s). Para tanto, deve seguir a um método que direcione seus rumos. Desta forma, o método usado numa pesquisa diz muito no seu resultado final. A sua variação implica certamente em seu produto terminal. O método diz respeito às concepções amplas de interpretação do mundo, de objetos e de seres, referentes às posturas filosófica, lógica, ideológica e política que fundamentam a ciência e os cientistas na produção do conhecimento (HISSA, 2002, p. 159). Este estudo se estrutura, assim, pelos moldes de predominância do método fenomenológico, dirigindo-se em maior grau como uma pesquisa qualitativa de análise geográfica, baseada, principalmente, no estudo da �imaginação� (BACHELARD, 1989). No entanto, sabemos que �o projeto fenomenológico se define como �uma volta às coisas mesmas�, isto é, aos fenômenos, aquilo que aparece à consciência, que se dá como seu objeto intencional� (SPOSITO, 2004, p.35). É procedendo por esta ideologia que tocamos a pesquisa adiante. Os atores e agentes escutados, mesmo diante das limitações estruturais da pesquisa, são analisados através de seus imaginários intersubjetivos, frutos de suas A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 25 experiências culturais e expressos por suas percepções1. A realidade geográfica que lhes tocam é analisada através da vocação analítica que a considera como criação social, pois �é na relação intersubjetiva que o lugar vai sendo construído� (NOGUEIRA, 2004, p.217). Aproximando o entendimento fenomenológico aos preceitos geográficos, Nogueira (2004, p.212) ressalta: A perspectiva fenomenológica da geografia deixa de priorizar a descrição do mundo físico e humano, para descrever o mundo vivido, onde o físico/humano são elementos percebidos e interpretados pelos diversos sujeitos que os experienciam. Como a investigação aqui desdobrada pretende absorver �o espaço por ele mesmo�, afinal de contas �o próprio do espaço deve mostrar-se a partir dele mesmo� (HEIDEGGER Apud SAMARAGO, 2008, p.19), entendemos a extensão geográfica estudada por uma constituição de aspectos identitários (projetivos) de vinculação religiosa, de um lado, e uma perspectiva turístico-regional de outro. No paralelo à composição emergente de um Santuário católico de forte apelo conciliador e grande plasticidade simbólica, as vivências e as possíveis prospecções do espaço circundante também se revestem em designações analíticas. Clareando os caminhos de pesquisas afins, Fabri (2007, p.40), com base nas idéias de Husserl, destaca: Uma fenomenologia da cultura deve ter como objetivo analisar e descrever as relações de motivação entre os indivíduos, bem como a relação desses com os objetos culturais de seu próprio Umwelt2. Trata-se de compreender em que medida são possíveis formações sempre novas de significar e resignificar o mundo no interior da vida coletiva 3. O devir do mundo circundante é determinado pela liberdade que caracteriza o agir humano. Sobre a metodologia �A pesquisa cientifica é uma busca de informações, feita de forma sistemática, organizada, racional e obediente a cerca das regras� (MOREIRA, 2002, p.11). Direcionada em muito pelo método adotado, a metodologia de uma pesquisa científica 1 Moreira (2002, p. 108) corrobora dizendo: �o método fenomenológico enfoca fenômenos subjetivos na crença de que verdades essenciais acerca da realidade são baseadas na experiência vivida�. 2 �O Umwelt (mundo circundante) é sempre e necessariamente algo percebido, rememorado, imaginado, etc. por alguém, vale dizer, ele é intencionado de diferentes modos por aquele que o percebe, rememora, imagina, e assim por diante. Conseqüentemente, não se pode separar o mundo circundante dos atos da pessoa� (FABRI, 2007, p. 40). 3 O destaque em negrito fica por nossa conta. A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 26 presume caminhos que a levarão a um determinado fim (DEMO, 1991). A metodologia pode, então, ser caracterizada pelos seus aspectos instrumentais, referindo-se: [...] ao conjunto de procedimentos � incluindo uma diversidade de técnicas � adotado por uma atividade científica para a produção do conhecimento [...] Cada pesquisa demanda um projeto (metodológico) que lhe corresponda (HISSA, 2002, p. 159-164). Os procedimentos adotados nesta pesquisa, inscritos na tentativa de facilitar a compreensão da complexa realidade em estudo, funcionam como meios reguladores canalizados para alcançar os anseios objetivados. Para que possamos ter um exame bem apurado da pesquisa empreendida, não podemos, assim, considerá-los em separado. Sublinhamos tais procedimentos em quatro momentos principais: a) Levantamento, análise e revisão bibliográfica: Consiste na consolidação de uma base teórica capaz de ventilar possíveis respostas às indagações surgidas através das inquietações empíricas relacionadas com o campo de estudo. Neste sentido, trabalhou-se com livros, artigos, dissertações, teses, dentre outros materiais. Trata-se de uma leitura cara ao entendimento dos fenômenos estudados. b) Trabalho de campo: Imprescindível a um estudo geográfico de caráter empírico, refere-se às visitas e contatos que estabelecemos com o universo (físico e humano) estudado. Além de oportunizar ambiência e conhecimento da área, possibilitou importantes momentos de observações da realidade. c) Aplicação e interpretação de inquéritos: Realizado em parte no campo, seguindo ao rigor científico, acatando ao método predominante utilizado na pesquisa, optamos, para além da observação real, por trabalhar com o recurso do inquérito, buscando informações através de duas maneiras: entrevista e questionário. A entrevista, aplicada com atores que representam um grupo ou instituição. O questionário, utilizado com determinados agrupamentos. Este trabalho, mesmo com suas demarcações, acontece no intuito de retratar existencialmente as percepções geográficas acerca da realidade avaliada. d) Confecção e uso de material iconográfico: Diz respeitobasicamente à aquisição e produção de imagens que auxiliam na leitura e compreensão do texto integral. Refere-se à inserção de mapas, figuras, fotografias, tabelas e gráficos, usados para representar o espaço geográfico em estudo, melhorando a visualização do corpo dissertativo. A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 27 Capitulo I: A abordagem geográfica da Religião e do Turismo A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 28 CAPÍTULO I: A ABORDAGEM GEOGRÁFICA DA RELIGIÃO E DO TURISMO 1.1. A Religião enquanto tema cultural de interesse geográfico Expressão institucional do ponto de vista espiritual, reflexo das escolhas culturais de vida dos seres humanos, a Religião faz parte das discussões geográficas, principalmente, pela tentativa dos geógrafos de entender e explicar as razões que levam o indivíduo a perceber e significar certas porções do espaço geográfico como sagradas. Como tema profundo à vida social e cultural da humanidade, a Religião, atividade esta repleta de implicações e significados espaciais, ao longo do processo de evolução do pensamento geográfico não recebeu grande relevância nos estudos desta ciência. Foi por muito tempo negligenciada pelos geógrafos. Na Geografia brasileira este fato nos parece ainda mais notório. Ao realizarmos um exame da obra �Geografia � Pequena História Crítica� de Antonio Carlos Robert de Moraes (1987), onde o autor faz um balanço da evolução do pensamento geográfico, apresentando e, em algumas vezes, confrontando ideologias das principais escolas, autores e linhas de análises, mesmo levando em consideração os seus contextos históricos, não conseguimos encontrar nenhuma menção a estudos que pudéssemos relacionar diretamente ao entendimento da Geografia da Religião; nem mesmo quando se relatou sobre o processo de renovação da Geografia. Contudo, ao reconhecer que o movimento de renovação da Geografia �advém da diversidade de métodos de interpretação e de posicionamentos dos autores que o compõem� (1987, p. 98), Moraes faz um apontamento para as novas perspectivas das pesquisas geográficas, como as possibilidades de estudos sobre as formas de representação do espaço geográfico. Espaço que é, a nosso ver, carregado de feições e significados religiosos. O descuido da Geografia para com as investigações sobre Religião, o que não aconteceu tão fortemente nas outras Ciências Sociais, que contribuíram em muito para melhorar a ventilação explicativa deste fenômeno, é ressaltado em parte por Rosendahl (1996) por dois aspectos principais: 1º) a influência positivista na Geografia; e 2º) a irrelevância da temática para a Geografia Crítica. A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 29 No que toca à educação positivista, é sabido que, esta, na sua acepção, deixou um legado de ser concernente a Geografia estudar os fenômenos de sua ordem por uma base primeiramente física, dificultando a realização de análises que partam de concepções abstratas perante conteúdos culturais e simbólicos, revelando a espacialidade material econômica e populacional como eixo indispensável para as suas investigações. É, pois, verdade que �o partido positivista adotado dissuadia os geógrafos das representações� (CLAVAL, 1999, p. 45). De acordo com a visão positivista, os objetos só podem ser estudados pelas suas revelações exteriores. Explanações fenomenológicas não são bem vindas, isto porque não são passíveis de uma fácil exposição aos olhos desses críticos. �O positivismo caracteriza-se por um agnosticismo no qual nega a razão e a fé o poder de provar a existência de Deus [...]. A existência de Deus constitui-se em uma questão metafísica, fora do âmbito da ciência positiva� (ROSENDAHL, 1996, p.20). Grosso modo, pode-se dizer que o positivismo provoca uma espécie de afastamento entre Religião e ciência. Por sua vez, a Geografia Crítica, portadora de uma proposta austera de questionamentos às bases da Geografia Tradicional � que adotava o positivismo como premissa �, não conseguiu ensejar grande interesse nos geógrafos para que estudassem as dimensões geográficas da Religião. �O procedimento rigorosamente materialista de análise em busca das forças que realmente moviam a sociedade, levou os geógrafos a marginalizar as questões religiosas de seus estudos� (ROSENDAHL, 1996, p.22). Influenciados diretamente pelas concepções marxistas, os geógrafos críticos se pautaram, sobretudo, por questões que denotavam as contradições do modelo de produção capitalista, ficando, assim, negligenciados das averiguações outros comportamentos do ser humano, como a religiosidade. É também verdade afirmar que a relação entre marxismo e Geografia Cultural não se desenvolveu por um diálogo mútuo (COSGROVE, 2007). A esse respeito, Claval (1999, p. 59) ressalta: Os regimes marxistas tentavam apagar as culturas ou reduzi-las a um folclore indigente [...] Os intelectuais marxistas contribuíram amplamente para o declínio dos estudos geográficos culturais, pois para eles, o econômico explicava tudo em última instância. A esse período em que a Geografia esteve a se descuidar do estudo da Religião, Santos (2002) denominou-o de �Geografia sem religião�, afirmando que tanto a chamada A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 30 [...] Geografia Tradicional quanto a Geografia Marxista (com raras exceções) negligenciaram a dimensão sensível do homem de percepção do mundo. A primeira por negar o conhecimento subjetivo; a segunda, por rotular de alienação toda e qualquer relação afetiva ou simbólica do homem com a natureza (p.24). Mesmo na Geografia Humana algumas correntes de estudo pouco consideraram a religiosidade do ser humano, deixando à margem de suas investigações aspectos como a percepção e a imaginação das criaturas diante das expressões religiosas. O quadro recorrente de afastamento dos contextos religiosos nos conteúdos geográficos, porém, é então relativizado pela atuação e importância da linha de pensamento conhecida por Geografia Humanista (CLAVAL, 1999; ROSENDAHL, 1996; OLIVEIRA, 2001; SANTOS, 2006). A Geografia Humanista, como maneira distinta de enxergar as relações geográficas, remete o homem ao centro de suas análises, tirando-lhe de uma situação secundária e limitada. Ela vai ao encontro da dimensão subjetiva do homem, entendendo-a como possuidora de fortes incidências geográficas. Nesta ordem, os fenômenos são analisados e apresentados a partir de onde ganham vida, do íntimo de cada ser. �De acordo com esse novo paradigma de conhecer o mundo, não somente em sua percepção do mundo, mas também pelo imaginário que elabora acerca do meio em que vive, torna-se possível uma reflexão do fenômeno religioso na geografia� (ROSENDAHL, 1996, p.23). 1.1.1. A importância da renovação e difusão da Geografia Cultural É consenso que a denominada virada cultural na Geografia trouxe grandes avanços às pretensões das análises dos geógrafos que enveredavam seus estudos por uma ótica cultural, ampliando as possibilidades teórico-metodológicas. Neste bojo, a Religião passava a ser estudada de forma mais estruturada nesse campo científico, assim como outros temas. Simbolismo e identidade são alguns desses. Essa passagem resulta no processo de renovação da chamada Geografia Cultural e tem como referência inicial a segunda metade da década de 1970. Uma leitura dasações que levaram a tal acontecimento ajudará a compreender como a Religião, em meio à inserção de novas perspectivas à Geografia, passou a ser incorporada pelo julgamento dos geógrafos como fenômeno cultural de seus interesses. A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 31 A Geografia Cultural4, considerada subcampo da Geografia, tem seu processo de difusão iniciado na Europa, estendendo-se daí para outros lugares, já possuindo mais de um século de existência (CORRÊA & ROSENDAHL, 2007). Nasce a partir das observações dos diferentes gêneros de vida e paisagens, quase que exclusivamente levando-se em consideração as comunidades rurais. O modo de vida urbano não interessava. A paisagem ficava compreendida como o resultado do trabalho do homem, produto de sua cultura. Oculta ou explicitamente, o tema cultural sempre fez parte das análises dos geógrafos humanos5, ocorrendo uma espécie de sistematização dessas considerações a partir do século XX. Alemanha, França e Estados Unidos apresentaram-se como os países mais expressivos no tocante à disseminação dos estudos de Geografia que optavam por uma perspectiva cultural de explicação dos fenômenos. A saber, essa abordagem era denominada Geografia Cultural. Em realidade, foi nos Estados Unidos, especialmente, que a Geografia Cultural ganhou uma sólida base de sustentação, principalmente através dos estudos de Carl Sauer. A obra de Sauer, tido por alguns como o �pai da Geografia Cultural�, hoje considerada tradicional, sobretudo pela crítica à sua visão supra-ôrgânica de cultura, �teve importante papel na história do pensamento geográfico, deixando um rico legado. Dialeticamente, sua presença se faz sentir na geografia cultural renovada� (Corrêa & Rosendahl, 2007, p.11). A Escola de Berkeley, por sua nota, teve papel ímpar no favorecimento da inserção da variante temática cultural nas discussões geográficas, onde já se tem hoje um relativo entendimento epistemológico da cultura no corpo da �ciência do espaço�, a Geografia (MARTINS & SILVA, 2007), fator que, em parte, deve-se à melhor compreensão do conceito de cultura, incorporando as subjetivas maneiras de se vivenciar o conteúdo simbólico dos fenômenos geográficos. Até que acontecesse o processo de revisão dos geógrafos ao conceito de cultura, seus estudos se desenvolviam de uma forma reducionista, limitando-se às técnicas e utensílios que os homens utilizavam na transformação da paisagem, reflexo do que se 4 Em nota: o termo Geografia Cultural é lançado pela primeira vez por Ratzel em 1880 na obra chamada Culturgeographie der Vereinigten Staaten von Nord-Amerika unter besonderer Berücksichtigung der wirtschaflichen Verhältnisse (CLAVAL, 1999). 5 �Da maioria dos geógrafos humanos pode dizer-se que estão a �fazer� geografia cultural de uma forma ou de outra, mesmo quando eles se chamam a si próprios de �geógrafos urbanos�, �geógrafos históricos�, �geógrafos da população�, etc.� (KONG Apud SANTOS 2006, p.146). Complementando este raciocínio, Paul Claval (2007, p.163) comunga com a concepção de que �todos os fatos que a geografia humana trata são apreendidos por meio de mediações culturais�. A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 32 entendia por cultura (CLAVAL, 1999). Os temas cultura, paisagem cultural, região cultural, história da cultura e ecologia cultural predominavam no seio da disciplina6. O interesse dos geógrafos pelos fatos de cultura era centrado no conjunto de utensílios e equipamentos elaborados pelos homens para explorar o ambiente e organizar seu hábitat. A mecanização e a modernização introduzem um arsenal de máquinas e de tipos de construções tão padronizados que o objeto de estudo é esvaziado de interesse. A geografia cultural entra em declínio, porque desaparece a pertinência dos fatos de cultura para explicar a diversidade das distribuições humanas (CLAVAL, 1999, p.48). Como a visão de cultura nos estudos geográficos se resumia aos modos de existência e sobrevivência de alguns grupos que estariam à margem do progresso, esta Geografia se negava a estudar as implantações modernas. Por isso a sensação real de crise, afinal a globalização surgia com uma promessa de homogeneização. Contraditoriamente àquilo que foi pensado, os efeitos do processo da globalização não conseguiram extinguir os diferenciados estilos de vida dos grupos sociais, tornando-os inclusive mais notáveis na maioria dos casos. A massificação não se deu por completo. A cultura ganhou ares de multiplicidade, brotando de diversas interações. Portanto, incidiu que, diante de um mundo �multicultural�, tornava-se manifesto crescente o interesse de geógrafos por esse campo, elegendo a cultura como elemento essencial de suas análises. Em registro, postula-se que a Religião faz parte decisivamente do cotidiano cultural de grupos e lugares. Num apontamento embasado frente às limitações analíticas engendradas pelas epistemologias naturalistas e funcionalistas, visões de parte dos geógrafos do final do século XIX e de parte do século XX, que ideologicamente dispensavam o questionamento crítico à natureza e à sociedade, Paul Claval (2002) vem nos elucidar o fato de que estas concepções não deram o lugar devido às ações executadas pelo indivíduo. Ressalta o autor que: El enfoque cultural corrige estas orientaciones: al concebir el espacio como una escena donde los seres humanos se ofrecen al espectáculo, representan papeles que los valorizan, los enriquecen o les aseguran ciertos poderes, tiene en cuenta al individuo y las iniciativas de que es autor. Nos hace descubrir el sentido que le dan los seres humanos a los decorados que los rodean y que, en gran medida, han construido. Nos hace entrar en el universo de sus valores y creencias, y aclara las estrategias que retienen en su vida social, política o cultural (p.38). Destarte, seguindo a orientação indicada acima, as análises dos geógrafos começavam a considerar as representações imaginárias do indivíduo. A partir daí o mundo passa a ser visto pelo lado perceptivo de quem o vivencia, de quem lhe traz 6 Ver: Os temas da Geografia Cultural dos autores Philip L. Wagner e Marvin W. Mikesell, (2007). A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 33 animação. A cultura passa a se constituir em um elemento primaz às análises de tal natureza, não mais explicando tudo, e sim, precisando ser explicada quando abordada em estudos sobre as realidades geográficas de regiões, territórios, paisagens e lugares � instâncias estas constituídas de fixos e fluxos, fatores básicos da conceituação de espaço geográfico (SANTOS, 2005). Espaço que é palco da vida social, onde os homens descansam seus laços afetivos e desenvolvem seus mecanismos de comunicação. É diante deste novo patamar de abordagem que a Geografia Cultural se renova. Uma possível definição dessa �nova� geografia cultural seria: contemporânea e histórica (mas sempre contextualizada e apoiada na teoria); social e espacial (mas não reduzida a aspectos da paisagem definidos de forma restrita); urbana e rural; atenta à natureza contingente da cultura, às ideologias dominantes e às formas de resistências. Para essa �nova� geografia a cultura não é uma categoria residual, mas o meio pelo qual a mudança social é experienciada e, contestada e constituída. (COSGROVE & JACKSON, 2007, p. 136). Os estudos de Geografia Cultural, por expressão, devem, então, reclamar por explicações que relacionem o meiogeográfico com o homem através de suas atividades culturais. Devem pensar a percepção do ser para com o espaço que visita ou que habita. Por exemplo: Como peregrinos e romeiros ou turistas vivem a festa religiosa e percebem o espaço sagrado? Como os moradores da localidade anfitriã dessa mesma festa a entendem? Obviamente que suas experiências culturais refletirão diretamente em suas concepções de existência e convivência. É também provável que os estudos postos adotem conceitos variados de cultura, retratando da melhor maneira o fenômeno que estão a averiguar. Superando a visão de cultura como um agente supra-orgânico, como via Carl Sauer, onde o ser humano não passava de um simples receptor desta suposta força dada, compreendemo-la como uma variável política e que �enquanto criação social, é parte integrante da trajetória humana� (CORRÊA, 2007a, p. 172). Pouco acrescentaria se aqui recorrêssemos por uma definição una de cultura, assim preferimos tê-la como �multi�, brotando das diversas relações sociais, salvaguardando suas especificidades de tempo e lugar. Assim, acreditamos que a cultura possui simultâneas geografias como lócus de sua representação e vivência, com um status perceptivo peculiar. Não obstante a produção bibliográfica com abordagem centrada na dimensão cultural, por vários motivos, ainda consista em uma quantidade relativamente menor do que outros ramos da Geografia, estudando Religião ou temas outros, alguns autores se A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 34 destacam nesse tratamento7 e contribuem para o incremento dessa discussão geográfica, visitando freqüentemente outras áreas do conhecimento, como Filosofia, Ciências da Religião, Psicologia, Sociologia, Antropologia etc. Aproximando as discussões da Geografia Cultural com as intenções marcadas nesta seção textual, salientamos que, na �Geografia Cultural Tradicional�, a Religião se apresentava pelas formas descritivas dos lugares possuidores desse cariz. Mesmo com todo o preconceito vindo dos paradigmas positivistas, tornava-se quase que impossível desconsiderar a questão religiosa frente à realidade geográfica de lugares e regiões, pelo menos como uma atividade disseminadora de formas arquitetônicas magníficas tidas como sagradas, que geravam por ora uma atratividade surpreendente. Em causa: Os geógrafos preocupados com as realidades culturais dedicam uma atenção crescente aos fatos religiosos. Eles continuam, portanto, a abordá-los do exterior, a partir dos signos que imprimem na paisagem. Hesitam em tratar de sua influência sobre os comportamentos e sobre as escalas de preferência que instituem (CLAVAL, 1999, p.45). Na seqüência das palavras ditas acima, Paul Claval aponta como importante contributo ao avanço da discussão da Religião pela Geografia a obra do francês Pierre Deffontaines: Géographie et religion (Geografia e religião), datada de 1948. Em outro número literário, Claval (2007) faz menção a mais um trabalho científico também inerente ao amadurecimento da apreciação posta: L� Homme et la Terre (O Homem e a Terra), de outro francês, do historiador Eric Dardel, escrita em 1952. De fato, estas produções configuraram-se como contribuições respeitáveis aos anseios da Geografia da Religião � objeto de nossas próximas discussões. No entanto, não podemos deixar de mencionar que os avanços epistemológicos da Geografia Cultural refletiram em potencialidades para os estudos da Geografia da Religião. Um dos grandes feitos reside na mudança de escala das análises, antes focadas em grandes paisagens e regiões, passando a permitir o estudo de espaços mais reduzidos, como um bairro, uma rua ou um santuário (SANTOS, 2006). Com a reformulação da Geografia Cultural, a Religião passou a fazer parte mais intensamente do rol das atividades culturais assim demarcadas pelos geógrafos, sendo vista até pelos seus aspectos simbólicos. Assim, o foco desses estudos conseguiu ir além das materializações espaciais da Religião, chegando até o modo como as pessoas ao vivenciarem suas crenças interpretam estes espaços. 7 Julgamos que as referências que usamos aqui denunciam em parte algumas dessas fontes. A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 35 1.1.2. Sobre a disciplina Geografia da Religião De acordo com a subdivisão que realizam os geógrafos nesta ciência, estabelecendo nomenclaturas singulares às suas áreas de especialização, em consonância com as atividades que diretamente estudam8, a Religião, como seu alusivo nome indica, é analisada de forma mais acentuada pela disciplina Geografia da Religião. Situada mais acertadamente como sub-ramo integrante do campo da Geografia Cultural, pelas relações estreitas existentes entre os aspectos religiosos e culturais exprimidos por pessoas e lugares, a Geografia da Religião enquadra-se mais perfeitamente na grande divisão Geografia Humana (FICKELER, 2008). A Geografia da Religião9, como parte da Geografia que tece preocupações acerca dos fatos religiosos, relacionando-os a quadros espaciais, faz atualmente um uso significativo de abordagens que privilegiam as compreensões dos seres humanos frente aos fenômenos simbólico-religiosos. Tem, por ordem, a tarefa de investigar e explicar as relações entre a Religião e a realidade geográfica dos lugares. Enquanto disciplina, a Geografia da Religião passou por algumas etapas de evolução (Ver Figura 3). Remontando ao período da Antiguidade grega, é a partir dos séculos XVI e XVII que se denotam os primeiros indícios de conhecimentos referidos à classificação geográfica sobre a Religião. Fazendo-se de informações teológicas, sobretudo para cartografar os lugares religiosos, os geógrafos contribuíram nessa mesma época para a sistematização do que se chamou de Geografia eclesiástica. Ao mesmo tempo do desenrolar desta última, ainda no decurso do século XVII, surge da necessidade e vontade do geógrafo de identificar, localizar e representar os lugares descritos pela Bíblia a denominada Geografia bíblica, conhecimento que se estende até o início do século XX. Este é um período que se caracteriza incisivamente por estudos descritivos, geralmente analisando o cristianismo em seu nível de crescimento (SANTOS, 2006). 8 É o que Hissa (2002) chama de �distritos do saber�. Como por exemplo: Geografia do Turismo, Geografia da Indústria, Geografia Agrária, Geografia da Saúde, dentre outras. 9 Em contribuição e acréscimo: a expressão �Geografia da Religião� foi usada pela primeira vez pelo teólogo alemão Goulieb Kasche, em 1795. Bernhard Varenius (1649), por sua vez, pode ser compreendido como o precursor deste campo disciplinar. Já Kant (1724-1808) pode ser visto como o fundador de uma moderna Geografia da Religião. Mas é somente com os trabalhos de Fickeler (1947) e Deffontaines (1948) que surge a disciplina científica Geografia da Religião. Ver de forma mais amiúde sobre estes acontecimentos em Santos (2006), de onde tiramos estes esclarecimentos. A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 36 Figura 3: Antecedentes, gênese e evolução da Geografia da Religião (esquema-síntese) ......................................----------------------------------------------------- Séculos XVI-XIXSéculo XX Fonte: Adaptado parcialmente de SANTOS (2006, p. 128). Segundo Santos (2006), é a partir do Pós Segunda Guerra Mundial que acontece o movimento de despertar da verdadeira Geografia da Religião, agora baseado essencialmente em conhecimentos geográficos formais, cujas informações religiosas serviam apenas de suporte ao entendimento das realidades espaciais. No andamento do processo de evolução, é entre os anos 60 e 70 que vem a ocorrer o período da construção 10 disciplinar. Foi durante estes dois momentos citados por último que paisagens e territórios passaram a ser mais bem analisados pelos seus aspectos de influência religiosa. Somente no início dos anos 80 é que a Geografia da Religião conhece seu processo de consolidação, firmando-se como campo reconhecido no seio da ciência geográfica. Assim, com a validação científica, surge a oportunidade de inovações nos métodos de estudo, não por acaso seguindo as transformações do processo de renovação da Geografia Cultural. O homem passa a ser visto por sua �individualidade� religiosa, o que enriquece as possibilidades deste campo de estudos. Já o século XXI, diante do aumento das mazelas que vivem a população num todo, desponta com muitos desafios a Geografia da Religião, requerendo respostas inteligíveis no que concerne ao entendimento da formatação de quadros espaços-religiosos, suscitando novos caminhos de investigação (SANTOS, 2006). Tanto em nível nacional como mundial, ganham cada vez mais importância na ciência geográfica discussões sobre os efeitos das diversas legendas religiosas. Cresce o 10 Santos (2006, p.174) apresenta um quadro-síntese com os nomes dos principais autores que concorreram com seus trabalhos para a construção do corpo teórico da disciplina Geografia da Religião. GEOGRAFIA DA RELIGIÃO Antiguidade clássica Geografia bíblica Geografia eclesiástica Anos 40-50 -Despertar- Anos 60-70 -Construir- Anos 80-90 -Consolidar- Século XXI -Novos caminhos- A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 37 número de departamentos, núcleos11, revistas, encontros e grupos de pesquisas12 de Geografia que incorporam esta temática em seus anseios universitários. Mesmo ainda em estágio inicial de evolução, no Brasil o estudo geográfico da Religião conhece alguns nomes destacáveis neste tratamento. Aqui relacionamos alguns desses: FRANÇA, 197213; ROSENDAHL, 1996; OLIVEIRA, 2001; GIL FILHO, 2001. Recentemente, a Professora Maria da Graça Poças Santos dispensou ao campo da Geografia da Religião uma ampla e significativa contribuição. Fruto de seu trabalho de doutoramento, a obra da autora portuguesa se intitula �Espiritualidade, Território e Turismo: Estudo Geográfico de Fátima�. Privilegiando uma ótica da Geografia Cultural, situando aí a Geografia da Religião, Poças Santos buscou entender as dimensões espacial, religiosa e espiritual exercidas pelo Santuário de Fátima de Portugal, entendendo-o como um atrativo religioso e turístico. Para tanto, parte de uma noção de território enquanto construção social que carrega vertentes de ordem material e temporal. 1.1.3. O interesse da Geografia pela Religião Muito influenciadas pelas ideologias do historiador Mírcea Eliade, as investigações geográficas sobre a Religião têm se pautado pela dualidade conceitual entre sagrado e profano. Segundo este autor, esses são os dois modos possíveis de existência do ser humano no mundo. Deste feito, no que tange às refletâncias do espaço sagrado, �o homem deseja situar-se num �centro�, lá onde existe a possibilidade de comunicação com deuses� (ELIADE, 2008, p.141). Em geral, o que fica fora deste centro se torna espaço profano. Contudo, a compreensão do acontecimento de processos, encontros e misturas culturais no mundo atual, cada vez mais heterogêneo, nos leva ao entendimento de que 11 Em termos nacionais, o NEPEC (Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Espaço e Cultura), coordenado pela Professora Drª. Zeny Rosendahl, que funciona na UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), destaca-se pelo trabalho desempenhado nesta área. Ver: www.nepec.com.br. O NUPPER (Núcleo Paranaense de Pesquisas em Religião), sob coordenação do Prof. Dr. Sylvio Fausto Gil Filho, da UFPR (Universidade Federal do Paraná), é outro meio de discussão geográfica da Religião. Ver: http://www.geog.ufpr.br/nupper/. 12 Como exemplo, citamos o Grupo �ESTUDOS GEOEDUCACIONAIS - Turismo, Religiosidade e Planejamento Regional na Formação do Imaginário Geográfico� do qual fazemos parte, coordenado pelo Professor Dr. Christian Dennys Monteiro de Oliveira, cadastrado pelo CNPQ (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e que se encontra vinculado ao LEGE (Laboratório de Estudos Geoeducacionais) do Departamento de Geografia da UFC. Ver: www.lege.ufc.br. 13 Este trabalho configura-se como um estudo precursor na área da Geografia da Religião brasileira. http://www.nepec.com.br http://www.geog.ufpr.br/nupper/ http://www.lege.ufc.br A Resignificação Religiosa do Turismo Regional... / José Arilson Xavier de Souza _________________________________________________________________________________ 38 sagrado e profano podem, por ventura, ser analisados em conjunto num mesmo recorte espacial � como �espaços sacro-profanos� �, não sendo gerada necessariamente esta separação, ainda quando reconhecemos a importância didática desta. Afinal, �não existe uma fronteira cultural nítida ou firme entre grupos, e sim, pelo contrário, um continuum cultural� (BERKER, 2003, p.14). Diante de um mundo de caráter híbrido, a ciência de hoje exige a produção de conhecimentos holísticos, conseguidos pela interpenetração de saberes (HISSA, 2002). Não fará mal algum à Geografia se for buscar em outras ciências conhecimentos para se enriquecer. Em todo caso, a heterogeneidade cultural-religiosa de lugares e pessoas reclama incessantemente da Geografia uma posição crítica na produção de considerações analíticas diante dos fenômenos religiosos. �A religião imprime uma marca na paisagem através da cultura� (ROSENDAHL, 2008, p.66). Portanto, eis mais um desafio ao geógrafo: desvendar as significações espaciais disseminadas pela Religião. Sobre esta incumbência, Santos (2006, p.167) assinala: [...] é tarefa do geógrafo da religião procurar discernir, no conjunto dos fatores explicativos (sociais, culturais, económicos, etc.) das transformações do espaço, quais são os elementos especificamente religiosos que a elas conduzem e qual o seu peso relativo nesse processo. Deve ter-se em conta que a religião não é um fenómeno estático, devendo ser situada no tempo e no espaço, interpretando as mudanças temporalmente registradas e as mutações espaciais daí decorrentes. No que se remete ao interesse da Geografia pelo estudo da Religião, a assertiva nos parece mais do que legítima. A Religião, pelo menos na sua expressão institucional, possui uma base territorial de existência, e só este fato já justifica a análise precedida. Porém, algumas mentes por demais práticas e racionalistas não conseguem estabelecer relação sobre as duas áreas em discussão. Em nossa compreensão, é certo que a cultura religiosa oportuniza um considerável campo de análise para a Geografia. Os fenômenos religiosos, como factos culturais e sociais, apresentam consideráveis implicações em termos espaciais, especialmente visíveis quando se trata de grandes sistemas religiosos, em geral profundamente gravados no espaço, desde logo porque propõem aos respectivos crentes uma explicação da ordem do universo (cosmogonia), muitas vezes presente também, em termos simbólicos no modo como modelam os seus espaços, nomeadamente
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