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1 PRINCÍPIOS BÁSICOS DA ELETROCARDIOGRAFIA Profa. Esp. Ana Flávia Prévide Raymundo RESUMO Willen Einthoven, em 1902, idealizou um aparelho para registrar as correntes elétricas que se originavam no coração. O equipamento foi chamado eletrocardiógrafo e o registro feito em papel milimetrado, eletrocardiograma. É um exame de fácil manuseio, não invasivo, de rápida execução e baixo custo operacional, sendo bastante solicitado na medicina humana e também, na veterinária. O exame faz um registro do potencial elétrico médio gerado no coração. Com o conhecimento dos parâmetros normais e através da análise das ondas, intervalos e segmentos registrados, são evidenciadas as possíveis alterações pelas modificações no traçado, fazendo assim, um diagnóstico seguro das afecções cardíacas e estabelecimento do melhor protocolo terapêutico. O exame ainda é indispensável no pré-operatório para avaliar possíveis riscos relacionados às anestesias ou aos procedimentos cirúrgicos. A atividade cardíaca é representada por ondas registradas em papel milimetrado (quadradinhos de 1 mm de aresta) e tracionado a uma velocidade de 50 mm/s (padronizada para a Medicina Veterinária). O eixo horizontal permite a interpretação da duração (tempo em segundos) de cada onda, enquanto o eixo vertical, a sua amplitude (em mV) de um ciclo cardíaco. Segundo Filippi (2011) e Macêdo et al. (2019), para a realização do exame, o animal deve ser contido manualmente e posicionado na mesa, em decúbito lateral, com os membros torácicos paralelos entre si e perpendiculares ao esqueleto axial, sobre um tapete de borracha para evitar interferências. As pinças dos eletrodos conectadas diretamente à pele e umedecidas com gel condutor, nas posições das articulações úmero-rádio-ulnar e fêmuro-tíbio- patelar. O conhecimento da eletrofisiologia do coração possibilita o entendimento do traçado do ECG. 2 A ativação ou despolarização cardíaca tem origem no nódulo sinusal (marca-passo cardíaco) localizado no átrio direito. É a 1ª área a despolarizar. O estímulo passa para o átrio esquerdo, nódulo atrioventricular, feixe de His e seus ramos direito e esquerdo, a rede de Purkinje, os ventrículos e se extingue, com a contração ventricular. Fenômenos elétricos são originados na despolarização e repolarização e registrados no eletrocardiógrafo. A ativação dos 2 átrios (representada por 2 vetores) gera uma deflexão chamada Onda P. É uma onda de pequena amplitude em função da massa muscular atrial ser relativamente delgada, arredondada, monofásica e geralmente positiva. A repolarização atrial tem início nas porções próximas ao nódulo sinusal e seu vetor de repolarização tem a mesma intensidade do vetor de ativação, porém sentido contrário. A onda da repolarização (Onda Ta) não aparece no ECG convencional porque acontece ao mesmo tempo que a despolarização ventricular (fenômeno de maior amplitude). À medida que os átrios se despolarizam, o estímulo alcança o nódulo atrioventricular com um pequeno atraso para não coincidirem as manifestações elétricas de átrios e ventrículos. O registro desse momento, se manifesta num segmento isoelétrico chamado segmento PR. Uma interpretação matemática feita pela somatória da duração da onda P e do segmento PR, originando o Intervalo PR que indica a despolarização atrial, o atraso do estímulo ao nódulo AV, com a despolarização da 1ª fibra ventricular despolarizada. Esse intervalo é inversamente proporcional à frequência cardíaca (maior FC, menor intervalo PR). Ativação ventricular (representada por 4 vetores) produz uma deflexão chamada Complexo QRS. O estímulo que parte do nódulo AV, se propaga pela superfície endocárdica dos dois ventrículos em direção ao epicárdio, ativando simultaneamente o septo interventricular e parte da espessura das paredes livres dos ventrículos. O 1º vetor de ativação ventricular representa a despolarização do septo interventricular. Em direção à região baixa do septo, um 2º vetor continua a ativação ventricular. As forças elétricas se deslocam para a esquerda onde a massa ventricular tem maior volume resultando no 3º vetor da ativação ou vetor da parede livre do ventrículo esquerdo. A despolarização termina nas porções basais das paredes livres dos ventrículos e do septo interventricular. É o 4º vetor 3 da ativação ventricular ou vetor basal. Todos esses fenômenos elétricos resultam na inscrição do complexo QRS. A repolarização ventricular inicia com correntes elétricas fracas que não causam deflexão mostrando uma linha isoelétrica identificada como segmento ST. O processo tem início na superfície epicárdica em direção ao endocárdio (sentido contrário à despolarização), graficamente no ponto J (ponto juncional no final de QRS), com uma deflexão de forma variável e lenta, que se traduz na Onda T, que representa a repolarização ventricular, sendo a 1ª e maior deflexão depois do complexo QRS. Uma 4ª onda pode aparecer no traçado, a Onda U, arredondada, de curta duração, baixa amplitude (inversamente proporcional à FC) e inscrita após a onda T. É indicativa da repolarização tardia das fibras de Purkinje e dos músculos papilares, enquanto sua ausência, em cães, remete à menor densidade da rede de Purkinje. Após a onda U, o traçado segue numa linha de base isoelétrica, que representa a diástole ou o repouso elétrico do coração, interrompido por um novo ciclo cardíaco e assim sucessivamente. Segundo Filippi (2011), esses fenômenos elétricos que ocorrem durante a excitação cardíaca causam diferenças de potencial na superfície do corpo. Sua medição (duração e amplitude) e registro pelo galvanômetro do eletrocardiógrafo determina o traçado do ECG. São eletrodos que captam esses fenômenos e, através de fios condutores, os transferem ao aparelho. Dessa forma, obtêm-se as derivações (linhas imaginárias que unem dois eletrodos), que podem ser bipolares e unipolares. As derivações bipolares são registros feitos por meio de 2 eletrodos situados à mesma distância do coração e são identificadas numericamente. A medida da diferença da atividade elétrica entre os eletrodos dos membros torácicos direito (negativo) e esquerdo (positivo) representa da derivação D1. A relação entre o membro torácico direito (negativo) e do membro pélvico esquerdo (positivo) se traduz na derivação D2, enquanto D3 está relacionada ao membro torácico esquerdo (negativo) e do membro pélvico esquerdo (positivo). Einthoven imaginou que 3 eletrodos colocados nos dois braços e na perna esquerda estariam formando um triângulo equilátero cujos lados seriam linhas imaginárias que representavam as derivações. Os vértices do triângulo foram 4 identificados por letras (L, R, F), onde o eletrodo LA estava colocado no membro torácico esquerdo, o eletrodo RA, no membro torácico direito e o eletrodo LL, no membro pélvico esquerdo. Com as leituras de cada eletrodo e as fórmulas matemáticas (D1 = VL – VR), (D2 = VF – VR) e (D3 = VF – VL) ele obtinha os valores das derivações. VL, VR e VF são derivações unipolares, ou seja, registram o potencial absoluto de um só ponto, onde VR representa o membro torácico direito, VL, o membro torácico esquerdo e VF, o membro pélvico esquerdo (FILIPPI, 2011). Macêdo et al. (2019), fez uma análise das principais alterações do ECG considerando idade e sexo dos animais atendidos pelo serviço de eletrocardiografia do hospital veterinário ETAVE de Fortaleza (CE). Machos e fêmeas entre 9 e 11 anos de idade, selecionados por indicação clínica, exame pré-anestésico e pré-cirúrgico. Os machos mostraram-se mais propensos às alterações eletrocardiográficas que as fêmeas, no entanto, elas apresentaram arritmia sinusal, taquicardia sinusal e bradicardia sinusal. Seus dados corroboram com outros autores. Quanto às alterações no sistema de condução do impulso elétrico, 100%das fêmeas apresentaram bloqueio sinusal e elas, mais que os machos, bloqueio atrioventricular de 1º grau. Ambos apresentaram as mesmas porcentagens para o bloqueio atrioventricular de 2º grau e bloqueio de ramo direito do feixe de His. Concluíram ainda, que cães obesos apresentam maiores índices de alterações no ECG. Para os autores, o ECG é um importante recurso diagnóstico para detecção e controle das afecções cardíacas, que podem levar o animal à morte.
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