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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ CENTRO DE TECNOLOGIA DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA HIDRAÚLICA E AMBIENTAL CURSO DE ENGENHARIA CIVIL KARLOMANO FACUNDO DE MESQUITA IMPLEMENTAÇÃO DO MÉTODO DE ANÁLISE DE RISCO PARA AVALIAÇÃO DA ESTABILIDADE DE UMA BARRAGEM DE TERRA INSTRUMENTADA. ESTUDO DE CASO: BARRAGEM PESQUEIRO FORTALEZA 2018 KARLOMANO FACUNDO DE MESQUITA IMPLEMENTAÇÃO DO MÉTODO DE ANÁLISE DE RISCO PARA AVALIAÇÃO DA ESTABILIDADE DE UMA BARRAGEM DE TERRA INSTRUMENTADA. ESTUDO DE CASO: BARRAGEM PESQUEIRO Monografia apresentada ao Curso de Engenharia Civil da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Engenharia Civil. Orientador: Prof. Dr. Rosiel Ferreira Leme FORTALEZA 2018 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará Biblioteca Universitária Gerada automaticamente pelo módulo Catalog, mediante os dados fornecidos pelo(a) autor(a) M544i Mesquita, Karlomano Facundo de. Implementação do método de análise de risco para avaliação da estabilidade de uma barragem de terra instrumentada : estudo de caso: barragem pesqueiro / Karlomano Facundo de Mesquita. – 2018. 75 f. : il. color. Trabalho de Conclusão de Curso (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Centro de Tecnologia, Curso de Engenharia Civil, Fortaleza, 2018. Orientação: Prof. Dr. Rosiel Ferreira Leme. 1. Segurança de barragens. 2. Análise de risco. 3. Instrumentação. I. Título. CDD 620 KARLOMANO FACUNDO DE MESQUITA IMPLEMENTAÇÃO DO MÉTODO DE ANÁLISE DE RISCO PARA AVALIAÇÃO DA ESTABILIDADE DE UMA BARRAGEM DE TERRA INSTRUMENTADA. ESTUDO DE CASO: BARRAGEM PESQUEIRO Monografia apresentada ao Curso de Engenharia Civil da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Engenharia Civil. Aprovada em: 11 / 12 / 2018. BANCA EXAMINADORA ________________________________________ Prof. Dr. Rosiel Ferreira Leme (Orientador) Universidade Federal do Ceará (UFC) _________________________________________ Prof. Dr. Francisco Chagas da Silva Filho Universidade Federal do Ceará (UFC) _________________________________________ Prof.ª Dr.ª Mariana Vela Silveira Universidade Federal do Ceará (UFC) Dedico a realização desta monografia aos meus pais, principalmente à minha mãe Gervina que sempre me apoiou em todos os momentos de minha vida. AGRADECIMENTOS Agradeço à Deus, pelo discernimento, saúde e força em todos os momentos. Ao meu orientador Rosiel Ferreira Leme, pelos conhecimentos passados, pela paciência, incentivo, ajuda e disponibilidade. Suas contribuições foram cruciais para o desenvolvimento deste trabalho. Agradeço à toda minha família, em especial aos meus pais, Salvador e Gervina, pelo apoio, carinho e motivação em todos os momentos. À minha madrinha/tia Francilene Mesquita por ter sido uma segunda mãe durante estes anos. Aos meus irmãos que mesmo à distância compreenderam minha ausência em momentos de júbilo familiar. A todos os professores desde à época do colégio aos da graduação, pelos conhecimentos primordiais transmitidos. Aos amigos, pelo apoio, discussões, trocas de experiência, e principalmente os momentos de jocosidade. “As palavras, sozinhas, não podem prover as compreensões essenciais. As equações podem”. (Stewart, 2013) RESUMO As barragens oferecem muitos benefícios para a nossa sociedade, mas inundações resultantes das rupturas destes aterros também produziram alguns dos desastres mais devastadores dos últimos dois séculos. Neste aspecto, a avaliação da segurança da obra através de instrumentação ocupa um lugar de destaque, permitindo analisar o comportamento mecânico durante o período operacional e possibilitando a identificação de possíveis anomalias. A instrumentação permite ainda avaliar a estabilidade do maciço durante a vida útil conforme a variação do nível de água no reservatório e pela ocorrência de variações de poro-pressão no interior do maciço, todavia, incertezas quanto a real condição da estabilidade através de avaliações por métodos determinísticos é plausível devido a variabilidade dos parâmetros decorrentes do próprio processo executivo ou mesmo relacionado a heterogeneidade do solo de construção. Tendo em vista a relevância do monitoramento de barragens a partir de instrumentos, este trabalho propõe a implementação do método de análise de risco para avaliar a segurança de uma barragem sob o foco probabilístico, determinando a probabilidade da condição de instabilidade (FS<1,50) para diversos níveis piezométricos que o barramento pode estar sujeito em condições anômalas como, por exemplo, a colmatação do sistema de drenagem interna. Para este fim, os estudos foram realizados na barragem Pesqueiro, obra presente na bacia metropolitana de Fortaleza - CE. As modelagens foram realizadas através do software Geostudio 2007, no qual utilizou-se o método de Morgenstern-Price para as análises determinística de estabilidade de taludes e o método de Monte Carlo para o cálculo da probabilidade de falha em função da variação de carga piezométrica de dois piezômetros existentes na seção máxima da barragem. O presente estudo permite ainda ao gestor da obra estimar em tempo real a probabilidade de instabilidade do maciço a partir da leitura de dados de campo sem a necessidade de gerar modelos de cálculo mais complexos, possibilitando assim a adoção de medidas emergenciais com celeridade caso a obra apresente alguma anomalia. Sendo verificado que o processo de colmatação, induzido em um modelo numérico através da redução da permeabilidade do filtro, afeta diretamente a estabilidade da barragem de terra devido ao aumento do nível freático e consequentemente o acréscimo das solicitações na obra. Por meio de análises probabilísticas através de simulações de Monte Carlo realizadas pelo próprio software Geostudio 2007, foi observado que a probabilidade de falha aumenta consideravelmente a medida que as tensões piezométricas no barramento aumentam. Palavras-chave: Segurança de barragens. Análise de risco. Instrumentação. ABSTRACT Dams offer many benefits to our society, but floods resulting from the ruptures of these landfills have also produced some of the most devastating disasters of the last two centuries. In this aspect, the evaluation of the safety of the work through instrumentation occupies a prominent place, allowing to analyze the mechanical behavior during the operational period and allowing the identification of possible anomalies. The instrumentation also allows to evaluate the stability of the mass during the useful life according to the variation of the level of water in the reservoir and by the occurrence of pore-pressure variations inside the mass, however, uncertainties as to the real condition of the stability through evaluations by methods deterministic is plausible due to the variability of the parameters arising from the executive process itself or even related to the heterogeneity of the construction soil. Considering the importance of monitoring dams from instruments, this work proposes the implementation of the method of risk analysis to evaluate the safety of a dam under the probabilistic focus, determining the probability of the instability condition(FS <1.50 ) for various piezometric levels that the busbar may be subjected under anomalous conditions, such as, for example, the sealing of the internal drainage system. For this purpose, the studies were carried out in the fishing dam, present in the metropolitan basin of Fortaleza - CE. The modeling was performed using the Geostudio 2007 software, in which the Morgenstern-Price method was used for the deterministic analyzes of slope stability and the Monte Carlo method for calculating the probability of failure as a function of the piezometric load variation of two piezometers in the maximum section of the dam. The present study also allows the project manager to estimate in real time the probability of instability of the massif from the reading of field data without the need to generate more complex calculation models, thus allowing the adoption of emergency measures with speed if the work have any anomalies. It is verified that the sealing process, induced in a numerical model by reducing the permeability of the filter, directly affects the stability of the earth dam due to the increase of the water table and consequently the increase of the requests in the work. By means of probabilistic analyzes through Monte Carlo simulations carried out by the software Geostudio 2007 itself, it was observed that the probability of failure increases considerably as the piezometric voltages increase in the bus. Keywords: Safety of dams. Risk analysis. Instrumentation. LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Avaliação da colmatação do sistema de drenagem de uma barragem de terra. .......................................................... 16 Figura 3 - Visão panorâmica da superfície de deslizamento de terra de vajont e da represa de arco de curva dupla. .............. 19 Figura 4 - Rompimento da barragem do rio Teton 1976. ................. 22 Figura 5 - Vista aérea da barragem Jaburu I. .................................. 24 Figura 6 – (a) Vista da caverna na ombreira esquerda da Barragem Jaburu I; (b) Vista Interna da caverna. ............................ 25 Figura 7 – Enrocamento e drenagem executados a jusante do aterro da barragem. .................................................................. 26 Figura 8 - Rede de fluxo obtida em simulação numérica (Seção S21) ....................................................................................... 27 Figura 9 - Comparação entre os resultados das simulações numéricas e os dados..................................................... 27 Figura 10 - Geometria do escorregamento. ..................................... 35 Figura 11- Principais fatores causadores de instabilidades de taludes. ........................................................................... 36 Figura 12 - Tipos de geometria de superfície de ruptura. ................ 37 Figura 13 - Localização da barragem Pesqueiro ............................. 41 Figura 14 - Seção máxima da Barragem Pesqueiro ........................ 44 Figura 15 - Piezômetro de Casa Grande. ........................................ 46 Figura 16 - Detalhe do piezômetro existente na barragem. ............. 47 Figura 17 - Seção adotada nas análises de fluxo ............................ 49 Figura 18 - Malha de Elementos Finitos .......................................... 50 Figura 19 - Malha dos possíveis centros e raios dos círculos de ruptura ............................................................................ 53 Figura 20 - Método de Otimização .................................................. 54 GRÁFICOS Gráfico 1 - Distribuições normais dos parâmetros , c e e normal acumulada do FS. ........................................................ 40 Gráfico 2 - Variação no nível da barragem de 2008 a 2010. ........... 48 Gráfico 3 - Distribuição normal dos valores de Fator de Segurança (FS) obtidos pela simulação Monte Carlo automática em condições normais de operação. .................................. 59 Gráfico 4 - Distribuição normal dos valores de Fator de Segurança (FS) obtidos pela simulação Monte Carlo automática com redução do FS em 1000 vezes. ............................ 59 Gráfico 5 - Gráfico da relação do fator de segurança x carga piezométrica ............................................................... 60 Gráfico 6 - Gráfico da relação da probabilidade de instabilidade x carga piezométrica ..................................................... 61 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Características Gerais dos Instrumentos de Medida. .... 28 Tabela 2 – Métodos de equilíbrio-limite. .......................................... 34 Tabela 3 - Fatores de segurança e as respectivas condições de estabilidade do talude. .................................................. 36 Tabela 4 - Parâmetros de permeabilidade após calibração ............. 51 Tabela 5 - Simulação da colmatação do filtro interno ...................... 52 Tabela 6 - Parâmetros geotécnicos. ................................................ 55 Tabela 7 - Comparação dos parâmetros obtidos pela bibliografia (USBR, 1998) e o projeto executivo (COGERH, 1999) 55 Tabela 8 - Parâmetros geotécnicos ................................................. 56 Tabela 9 - Resultados da simulação da colmatação do filtro – Fatores de segurança .................................................................. 57 Tabela 10 - Resultados da simulação da colmatação do filtro ......... 58 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO.................................................................................. 15 1.1 Generalidades ............................................................................... 15 1.2 Justificativa .................................................................................... 15 1.3 Objetivos ........................................................................................ 17 1.4 Estrutura organizacional do trabalho ............................................. 18 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ............................................................. 19 2.1 Acidentes históricos em barragens de terra ................................... 19 2.1.1 Barragem de Vajont (1963) ..................................................... 19 2.1.2 Barragem de Teton (1976) ...................................................... 21 2.1.3 Barragem Jaburu I .................................................................. 24 2.2 Instrumentação de barragens ........................................................ 27 2.3 A lei de segurança de Barragens e a experiência no Ceará .......... 31 2.3.1 O que é a Lei Federal 12.334/10 ............................................ 31 2.3.2 Implementação da lei 12.334/10 no Ceará por meio da COGERH .............................................................................. 32 2.4 Métodos determinísticos: ............................................................... 33 2.4.1 Estabilidade de taludes ........................................................... 33 2.4.2 Métodos de análise de estabilidade ....................................... 34 2.4.3 Tipos de Superfície de ruptura ................................................ 36 2.5 Métodos probabilísticos para avaliação da segurança de uma barragem de terra. ............................................................................... 37 2.5.1 Análise de Risco ..................................................................... 37 2.5.2 Conjectura dos Riscos ............................................................ 38 2.5.3 Método de simulação de Monte Carlo aplicado em barragens. .............................................................................................. 39 3 ESTUDO DE CASO .......................................................................... 41 3.1 Localização ....................................................................................41 3.2 Descrição da Barragem ................................................................. 42 3.3 Geologia do Local .......................................................................... 45 3.4 Instrumentação da Barragem Pesqueiro ....................................... 45 3.5 Coleta de dados ............................................................................. 47 4 MATERIAIS E MÉTODOS ................................................................ 49 4.1 Generalidades ............................................................................... 49 4.2 Análise de fluxo .............................................................................. 49 4.2.1 Descrição da geometria do problema. .................................... 49 4.2.2 Parâmetros de permeabilidade obtidos por Retroanálise ....... 50 4.2.3 Avaliação da colmatação do sistema de drenagem ................ 51 4.3 Análise de estabilidade de taludes – Análises determinísticas. ..... 52 4.3.1 Descrição das análises. .......................................................... 52 4.3.2 Parâmetros geotécnicos adotados nas análises de estabilidade de taludes ............................................................................. 54 4.4 Análise de estabilidade de taludes – Análises probabilísticas. ....... 56 4.4.1 Descrição das análises. .......................................................... 56 5 RESULTADOS DAS ANÁLISES NUMÉRICAS ................................. 57 5.1 Resultados das Análises de estabilidade para as hipóteses de colmatação do sistema de drenagem. ................................................. 57 5.2 Resultados das Análises de risco. ................................................. 57 5.3 Apresentação gráfica dos resultados. ............................................ 59 6 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES ........................................... 62 REFERÊNCIAS ................................................................................... 63 APÊNDICE A – DISTRIBUIÇÕES NORMAIS DOS PARÂMETROS γ, c E ϕ DO FS. .......................................................................................... 68 APÊNDICE B – RESULTADOS PROBABILÍSTICOS DO FATOR DE SEGURANÇA (FS), OBTIDOS PELO SLOPE/W POR SIMULAÇÃO MONTE CARLO AUTOMÁTICA. ......................................................... 69 APÊNDICE C – RESULTADOS DETERMINÍSTICOS DO FATOR DE SEGURANÇA (FS), OBTIDOS PELO SEEP/W. .................................. 71 ANEXO A – RESULTADO DE ENSAIO DE CARACTERIZAÇÃO E COMPACTAÇÃO DO SOLO DA BARRAGEM PESQUEIRO NAS JAZIDAS I E II SEGUNDO COGERH (1999a) .................................... 74 15 1 INTRODUÇÃO 1.1 Generalidades As barragens têm proporcionado muitos benefícios para a nossa sociedade, todavia inundações resultantes da falha nestas obras também produziram alguns dos desastres mais devastadores dos últimos dois séculos. Assim como outras obras do mesmo porte, a estabilidade absoluta de uma barragem não pode ser garantida, sendo assim torna-se necessária a definição criteriosa de medidas de segurança afim de evitar possíveis incidentes. Neste aspecto, a avaliação da segurança da obra através de instrumentação ocupa um lugar de destaque, permitindo analisar o comportamento mecânico da barragem durante o período operacional (ALMEIDA, 2002). Nesse contexto, é essencial a determinação das poropressões atuantes no maciço de modo a se avaliar a estabilidade da obra e consequentemente possibilitar ao gestor da obra tomar medidas corretivas na ocorrência de possíveis anomalias que coloquem em risco a integridade da obra. 1.2 Justificativa A supervisão do desempenho de barragens por meio de dados de instrumentação é de suma importância a fim de que se possa avaliar a segurança da barragem ao longo do seu período de operação. A instalação de piezômetros e medidores de nível de água, permite uma compreensão das poropressões em determinados pontos do maciço, possibilitando uma melhor avaliação do real comportamento do fluxo no interior da barragem. A instrumentação, dependendo do que se deseja analisar, pode assumir características e finalidades distintas, podendo, portanto ser instalada ainda na fase de construção, na fase de enchimento ou até mesmo já na fase de operação (SILVEIRA, 2006). O monitoramento tem como principais funções a determinação do comportamento da barragem em suas condições de operação assim como a detecção e prevenção de comportamentos anômalos com a finalidade de se garantir a seguridade de sua estrutura. Anomalias, tais como a deficiência do sistema de drenagem interna, 16 podem gerar a instabilidade do talude de jusante ocasionado pelo aumento da carga hidráulica (acréscimo dos esforços solicitantes), gerando consequentemente a redução da estabilidade do talude expresso pelo Coeficiente de Segurança. Leme et. al. (2011) apresenta o processo de colmatação do filtro de uma barragem, por meio de um exemplo hipotético de uma sequência de análise de fluxos, conforme mostra a Figura 1. Figura 1 - Avaliação da colmatação do sistema de drenagem de uma barragem de terra. (a) filtro em estado normal de funcionamento (b) filtro parcialmente colmatado (c) filtro colmatado Fonte: Leme et. al, (2011) Os dados obtidos pela instrumentação, podem inclusive servir como base para o monitoramento de estabilidade da barragem ao longo de sua operação, sendo capaz de indicar a variação do coeficiente de segurança da estrutura conforme a sazonalidade do nível de água da barragem. A compreensão dos níveis de segurança é fundamental para a escolha do conjunto de ações corretivas que precisam ser executadas caso haja alterações significativas na barragem. Cabe ressaltar que no monitoramento de segurança de barragens, há a necessidade de ferramentas práticas e precisas a fim de se obter uma definição das condições de estabilidade do maciço e dessa forma tomar decisões pontuais (SILVEIRA, 2006). Uma alternativa para se ter a real noção do estado de segurança da obra seria a determinação de quais níveis de carga hidráulica o barramento poderia atingir, por meio de instrumentos como piezômetros e medidores de nível de água, fazendo com que o coeficiente de segurança reduzisse a valores mínimos aceitáveis. Partindo desse ponto pretende-se estabelecer o que o que se chama “nível de alerta”, que representa o nível crítico que cada instrumento possa ter de tal forma que garanta a integridade da obra. A definição destes níveis de alerta, no presente trabalho, será associada a metodologia probabilística de análise de risco, no qual procura 17 reconhecer as incertezas e variabilidades básicas dos parâmetros no modelo de cálculo selecionado. Segundo Vieira (2005), a análise de risco é uma metodologia que avalia e determina a probabilidade ou possibilidade de falha de um evento, geralmente indesejável, quantificando-o e qualificando-o. Segundo Fontenelle (2007), os valores dos parâmetros geotécnicos neste caso são definidos estatisticamente pelas distribuições de probabilidades, levando em consideração a variabilidade dos mesmos, ficando o desempenho do talude analisado definido sob o enfoque probabilístico. Este tipo de metodologia associada ao estudo da estabilidade de taludes é uma ferramenta de grande importância para se tomar o conhecimento do grau de estabilidade, ou probabilidade de ruptura de um talude. Tendo em vista a importância do monitoramento de barragens a partir de instrumentos, este trabalho propõe a análise dos dados piezométricos a fim de determinar os níveis críticos de carga piezométrica que o barramento poderia atingir, relacionado com a probabilidade de ruptura do barramento através da análise de risco. 1.3 Objetivos O objetivo geral do presente trabalho é correlacionar os níveis piezométricos de uma barragem de terra instrumentadacom a probabilidade de instabilidade através da implementação da metodologia de análise de risco. Para este fim, temos como os seguintes objetivos específicos: a) Obter dados de barragens de terra instrumentadas do estado do Ceará para estudo(s) de caso(s); b) Realização de retro análises através de modelos computacionais transientes, estimando a variação do fluxo pelo maciço, tendo como condições de contorno o histórico da variação do nível de água do açude e pela variação das cargas hidráulicas nos instrumentos; c) Realizar simulações de fluxo, considerando a possibilidade de colmatação do filtro, e desta forma, termos cargas hidráulicas acima dos máximos obtidos pelo histórico; d) A partir das análises de colmatação do sistema de drenagem, realizar análises de estabilidade de taludes; 18 e) Avaliar a probabilidade de ruptura da barragem em função da colmatação do sistema de drenagem; f) Obter relações carga hidráulica x probabilidade de falha nos estudos de caso; 1.4 Estrutura organizacional do trabalho O presente item, apresenta a disposição do trabalho e a abordagem realizada por capítulos. O primeiro capítulo consiste na introdução do trabalho, fazendo uma breve explanação da importância da instrumentação para a segurança de barragens e consequentemente a determinação de níveis de segurança para a prevenção de acidentes na estrutura. No capítulo consta também a justificativa e os objetivos deste trabalho. No segundo capítulo será apresentado casos históricos de acidentes de barragens, onde a presença de instrumentação seria crucial na prevenção de tais desastres. Trata também da instrumentação em barragens, e faz uma leve explanação da lei de segurança de barragens e a experiência no Ceará por meio da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos do Estado do Ceará- COGERH, além de uma revisão dos aspectos teóricos, análises de estabilidade de taludes, e a metodologia das análises de risco com descrição do método de Monte Carlo. No terceiro capítulo consta os detalhes da Barragem Pesqueiro (estudo de caso deste trabalho), a descrição da localização da obra, geologia local e o detalhamento da seção transversal. No quarto capítulo será descrita a metodologia e os parâmetros utilizados para as análises numéricas e simulações de análise de estabilidade e colmatação do sistema de drenagem. Conhecendo os parâmetros, no capítulo 5 serão apresentadas as análises realizadas com o objetivo de se determinar os níveis de segurança obtidos para cada piezômetro. 19 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 2.1 Acidentes históricos em barragens de terra O presente item tem como finalidade, passar ao leitor um resumo dos principais acidentes ocorridos com barragens nas últimas décadas, destacando a importância da instrumentação para a identificação de possíveis anomalias. 2.1.1 Barragem de Vajont (1963) A barragem de Vajont, que foi concluída no ano de 1959, está localizada a leste do município de Longarone, que está situado no rio Piave, a cerca de 100 km ao norte de Veneza, na Itália. É uma das represas mais altas em todo o mundo com 265 m de altura, e com capacidade de reservação de 150 hm³ (BARLA & PARONUZZI, 2013) Em 9 de outubro de 1963, aproximadamente 270 milhões de m³ de rocha deslizaram na lateral do Monte Toe no reservatório de Vajont. O deslizamento ocorreu ao longo das encostas norte onde o rio Vajont tinha cortado um cânion a mais de 300 m de profundidade logo acima de sua junção com o rio Piave (Figura 2). Como resultado do deslizamento, a topografia sofreu enormes mudanças ao longo do sopé do Monte Toe (HENDRON, 1985). Figura 2 - Visão panorâmica da superfície de deslizamento de terra de vajont e da represa de arco de curva dupla. Fonte: Barla & Paronuzzi (2013) O deslizamento moveu uma massa de rocha de 250 m de espessura cerca de 300 a 400 m na horizontal e estima-se que tenha atingido uma 20 velocidade de 20 a 30 m/s antes de subir e parar no lado oposto da parede do vale Vajont. O novo deslizamento deslocou uma antiga massa rochosa, que havia sido isolada no lado oposto do vale, cerca de 100 a 150 m acima de sua posição original antes que a massa deslizasse para trás de 30 a 40 m para o sul. A onda resultante da água deslocada propagou-se tanto a montante como a jusante, arrastando árvores e solo no lado norte do vale de Vajont até uma elevação máxima de 935 m ou 235 m acima do nível do reservatório. A onda varreu a represa atingindo mais de 100 m acima de sua crista a 435 m acima da base a jusante da represa) e desceu a Garganta Vajont até o rio Piave, onde tinha uma altura de cerca de 70 m na confluência com o Vale Piave, destruindo a maior parte da cidade de Longarone e partes de outras cidades próximas ao vale (HENDRON, 1985). Cerca de 2043 pessoas morreram e muitas outras ficaram feridas, por conta dos efeitos da onda. A maior parte da perda de vidas ocorreu em Longarone, mas a perda também foi severa nas aldeias próximas, especialmente em Pirago. Quarenta e cinco homens, que faziam parte de uma força de trabalho de engenheiros, técnicos e operários que viviam em quartéis situados no topo da barragem, também foram mortos. Mais de 16 milhões de dólares foram pagos por ações civis por danos pessoais e perda de vidas. Dezenas de milhões de dólares de danos materiais resultaram. A barragem e o reservatório de 100 milhões de dólares foram abandonados (HENDRON, 1985). Evidências foram encontradas sugerindo que a superfície de deslizamento de 1963 tinha uma origem complexa e correspondia a mais de um período anterior de ruptura. Esses períodos incluem tanto um deslizamento de terra pré-histórico quanto deslizamentos de terra e, possivelmente, um período muito mais antigo de falhas tectônicas (HENDRON, 1985). O acidente ocorreu em um momento no desenvolvimento de geotecnia e geomecânica em que essas ideias foram lentamente encontrando seu caminho para fora da Universidade e Laboratórios de Pesquisa e se tornando prática geral na profissão geotécnica. As pessoas estavam apenas se familiarizando com as noções de falha progressiva e resistência ao cisalhamento residual; a instrumentação iria ser desenvolvida em grande 21 escala dentro de alguns anos. Os equipamentos e técnicas de investigação do local não eram tão avançados quanto hoje e não conseguiram obter resultados precisos na profundidade de 200 m da perfuração em Vajont (BELLONI, 1987). Com relação aos modelos matemáticos, houve um rápido avanço. Métodos adequados estavam disponíveis para uma análise detalhada (Bishop, 1955), mas os computadores não eram, e, portanto, a aplicação dos métodos era bastante limitada. Métodos como o método dos elementos finitos, que teriam permitido a um engenheiro realizar uma análise de tensão, não estavam em uso até 1968. A instrumentação na época também era limitada tanto em termos de equipamento e técnicas de instalação, quanto os modelos matemáticos adequados para interpretar as medições. Os instrumentos, de fato, são projetados para medir quantidades que os modelos deformacionais indicam como importantes para a análise dos fenômenos em estudo. Se as análises não fossem bem conhecidas ou a sua importância não fosse completamente compreendida, as medições teriam sido inúteis. Um engenheiro não teria sequer pensado em instalar instrumentos, pois não teria ideias claras sobre como usar os dados deles. (BELLONI, 1987). 2.1.2 Barragem de Teton (1976) A barragem Teton era localizado no sudeste do estado de Idaho. O rio Teton drena as encostas ocidentais das Montanhas Teton e as encostas nordeste das Montanhas Big Hole localizadas ao longo da fronteira Idaho- Wyoming. A represa estava localizada em um cânion de paredes íngremes entalhado pelo rio Teton. O cânion termina aproximadamente 8 quilômetros a jusante da represa. O rio serpenteiaatravés de uma planície relativamente plana e se divide em dois braços cerca de 6 quilômetros a jusante do final do cânion. Ambos os braços, que serpenteiam em geral através dos depósitos aluviais, fluem para Henry's Fork vários quilômetros rio abaixo. (DEAVER, 2013) A construção da barragem começou em fevereiro de 1972 e foi substancialmente concluída em novembro de 1975. A estrutura de aterro zonado de 90 metros de altura era para armazenar água para irrigação 22 suplementar e primária, produção de energia, controle de inundação e recreação. A área de drenagem na represa foi de 2200 quilômetros quadrados. (DEAVER, 2013) A falha da Barragem de Teton é um dos eventos únicos mais importantes na história da engenharia de barragens, por ser a barragem mais alta que falhou completamente, e veio a se romper no ano seguinte à sua conclusão, devido à erosão interna causada pela percolação de água no maciço (Figura 3). Ela foi projetada e construída sob a supervisão do Departamento de Recuperação dos EUA, que construiu muitas grandes barragens nos últimos 70 anos e que era amplamente considerado um líder no campo. (SHERARD, 1987) Figura 3 - Rompimento da barragem do rio Teton 1976. Fonte: Sherard (1987) Para Sherard (1987) os principais pontos que acarretaram no acidente são: (1) A falha foi causada quando um vazamento concentrado se desenvolveu através da vala cheia de terra escavada na rocha ou na interface terra-rocha no fundo da vala. O vazamento erodiu o material do núcleo e levou o material erodido a grandes fissuras abertas na fundação da rocha. A erosão progressiva do material de aterro da Zona 1 altamente erodível levou a uma falha completa dentro de poucas horas após o início da erosão. 23 (2) Foi conhecido das explorações e observações originais durante a construção que as fundações rochosas e as paredes rochosas da vala de corte tinham grandes fissuras abertas. Não havia previsão no projeto para vedar essas rachaduras na superfície e a vedação realizada durante a construção era inadequada e incompleta. O projeto não fornecia nenhum filtro entre a zona 1, erodível e fina, e a rocha rachada e nenhuma foi instalada durante a construção. (3) Devido a essa ausência de vedação e filtros de trinca, o projeto da Barragem de Teton não era aceitável, em comparação com a prática geral na indústria. A grande maioria dos experientes engenheiros de barragens, conhecendo a natureza da rocha, teria rejeitado o projeto como inaceitável: se a barragem fosse construída de acordo com o projeto, danos sérios ou falha por erosão do material da Zona 1 nas rachaduras teriam considerado não apenas possível, mas provável. (4) A ausência de disposições de projeto para vedar ou filtrar as fissuras, e subsequente falha em modificar o projeto durante a construção, quando as condições extremas de rachaduras sob a Zona 1 foram claramente expostas, só pode ser explicada como um erro monumental no julgamento. Este erro foi possível devido a restrições burocráticas de longo prazo sobre as atividades do grupo de projeto de barragens que haviam limitado severamente sua experiência e capacidade. (5) O vazamento erosivo inicial poderia ter sido causado por qualquer um dos vários mecanismos citados como mais prováveis pelos pesquisadores principais. (6) Não há "lições aprendidas" técnicas da falha da Barragem de Teton, que tornam desejável considerar qualquer mudança no projeto atual de barragens ou na prática de construção. (7) A lição geral aprendida é a reconfirmação da antiga regra fundamental de que nenhuma barragem importante deve ser deixada totalmente nas mãos de um engenheiro ou de uma equipe próxima, sem revisão independente por outros engenheiros especialistas, com o poder de veto. Isto foi expresso eloquentemente no veredicto do Júri do Condado de Los Angeles, após o fracasso ainda mais desastroso da represa de St. Francis, Califórnia, em 1928: "Uma política sólida de julgamento público e de engenharia exige que a construção e operação de uma represa nunca deve ser deixada apenas para o julgamento de um homem, não importa quão eminente, sem verificação por autoridade especializada independente, pois ninguém está livre de erros..." Para Silveira (2006) se a barragem de Teton tivesse sido bem instrumentada, principalmente na região da trincheira de vedação localizada em sua ombreira direita, com intrínseca participação dos técnicos tanto de Geologia como de Engenharia, possibilitaria o diagnóstico prévio desse acidente com dias, ou até com semanas de antecedência. Em vista desse prévio diagnóstico sobre a ocorrência do processo de erosão interna, poderia ter-se evitado a ruptura da barragem, por meio da paralisação do enchimento do reservatório ou até mesmo de seu rebaixamento. Mesmo que não pudesse antecipar dentro de um prazo maior, ainda assim 24 haveria tempo para um alerta a jusante com mais antecedência, evitando-se, as vítimas fatais (SHERARD, 1987). A ruptura da barragem de Teton ocasionou na morte de cerca de 10 pessoas, com o total de vítimas não sendo maior porque houve tempo para o envio de um alerta a jusante através da estação de rádio, que fez com que as pessoas deixassem suas casas e se deslocassem para locais mais altos e longe da calha do rio (SHERARD, 1987). 2.1.3 Barragem Jaburu I Localizada no município de Tianguá, região oeste do estado do Ceará, a Barragem Jaburu I (Figura 4) foi construída pelo governo do estado entre os anos de 1981 e 1983. A estrutura é de terra zoneada, com seção transversal típica, com uma extensão de 770 m e altura máxima de 48 metros, que dá origem à um lago de 210 hm³ de capacidade de acumulação máxima, com uma área total ocupada de cerca de 1450 hectares, com vertedouro à margem direita tipo Creager em canal retangular com 29 m de largura, descarga máxima de projeto igual a 155 m³/s e lâmina vertente de 1,9 m (SOUZA et. al., 2005). Figura 4 - Vista aérea da barragem Jaburu I. Fonte: Souza et. al. (2005) 25 Conforme registros da Secretaria dos Recursos Hídricos (SRH), do histórico da obra, cinco anos após o primeiro enchimento (em 1988), foi identificado a primeira anomalia na obra através de uma ressurgência na ombreira esquerda da barragem, localizado a aproximadamente 30 metros do pé da barragem, provocando uma pequena caverna na ombreira de rocha arenítica, atingindo vazões com picos de 47 l/s (SOUSA, 2013). A Figura 5 presenta o detalhe do local da fuga d´água e da caverna formada. Figura 5 – (a) Vista da caverna na ombreira esquerda da Barragem Jaburu I; (b) Vista Interna da caverna. Fonte: Sousa (2013) Segundo Souza et. al. (2005), no ano de 1997 surgiram novas anormalidades com a presença de zonas úmidas que foram identificadas no talude de jusante do maciço compactado. Deixando evidente a deficiência no sistema de drenagem da barragem e com isso pondo a segurança da barragem em risco. Em agosto de 1997, o PISB – Painel de Inspeção e Segurança de Barragens da Secretaria dos Recursos Hídricos em missão de inspeção, em conjunto com técnicos da SRH, COGERH e SOHIDRA, detectaram o talude de jusante altamente saturado em cota elevada, cerca de 10 metros acima do enrocamento de pé de jusante. Tal anomalia indicou uma clara deficiência do sistema de drenagem, seja por mal dimensionamento ou por efeito de colmatação. Posteriormente foi constatado a colmatação dos filtros por cimentação por oxido de ferro, tendo em vista que a região onde foi construída a barragem ser rica em solos lateríticos, inclusive tendo-se empregado tais 26 solos como material de empréstimo para a construção do aterro. A fim de solucionar o problema de instabilidade, em 2003, foi realizado a execução de um volumoso corpo de enrocamento, filtros e transições a jusante da barragem, com o propósito de garantir uma drenagem adequada dofluxo que perpassa o maciço e a fundação do aterro, causando melhorias nas condições de estabilidade do talude de jusante. (SOUZA et. al., 2005) A obra de estabilização do talude da barragem Jaburu I pode ser vista na Figura 6. Figura 6 – Enrocamento e drenagem executados a jusante do aterro da barragem. Fonte: Souza et. al. (2005) Como intuito de analisar as condições de operação do sistema de drenagem interna da barragem Jaburu, foram realizadas simulações numéricas do regime de fluxo no aterro compactado. Para a realização das análises foi empregado o programa SEEP2D, elaborado pelo U.S. Army Corps of Engineers (USACE), que permite a modelagem computacional de uma gama de problemas associados a ocorrência de fluxo em meios porosos. (SOUZA et. al., 2005) De acordo com SOUZA et. al., (2005), a análise de fluxo foi feita em duas seções transversais do aterro compactado – S21 e S23. As seções supracitadas apresentam sistema de drenagem do tipo filtro chaminé, tapete drenante e rockfill, assim como um vasto registro de dados de instrumentação 27 piezométrica. Sendo assim, foi realizado análises paramétricas, com o intuito de identificar condutividades hidráulicas que gerassem resultados suficientemente próximos aos observados nos dados piezométricos disponíveis a época. Os resultados obtidos podem ser observados nas Figuras 8 e 9. Figura 7 - Rede de fluxo obtida em simulação numérica (Seção S21) Fonte: Souza et. al. (2005) Figura 8 - Comparação entre os resultados das simulações numéricas e os dados Fonte: Souza et. al. (2005) A partir dos resultados das modelagens, e das informações colhidas pelo monitoramento realizado pela equipe da COGERH, Souza et. al. (2005) afirma que a deficiência identificada no sistema de drenagem interna da barragem Jaburu, poderia comprometer a segurança da obra caso não fossem tomadas medidas intervencionistas no empreendimento. As anomalias no regime de fluxo poderiam posteriormente acarretar na ruína da barragem. Tal ruptura causaria enormes prejuízos às populações à jusante e aos municípios abastecidos pelo reservatório. 2.2 Instrumentação de barragens A instrumentação tem por finalidade a mensuração das ações ou os 28 efeitos que atuam na estrutura. Seu principal propósito é fornecer dados que ajudem na análise da segurança de uma estrutura, e que possibilitem ao longo do tempo a detecção de problemas. Seu objetivo secundário é o de permitir a comparação do desempenho da estrutura com o previsto no projeto. Instrumentos corretamente instalados, associado a leituras realizadas de forma correta e avaliações realizadas nas épocas certas são fundamentais na determinação do desempenho de uma barragem. (KUPERMAN et. al., 2003) Segundo Bressani (2009), para o êxito de um bom programa de instrumentação é necessário que se cumpra quatro etapas cruciais de execução: planejamento da instrumentação; definição da posição e do tipo do instrumento utilizado; definição do pessoal envolvido e responsabilidades (envolvendo detalhes como forma dos relatórios e cadeia de informação); análise crítica dos resultados. A Tabela 1 apresenta as principais características de um instrumento de medida. Tabela 1 – Características Gerais dos Instrumentos de Medida. Acurácia Essa característica expressa a diferença entre a medição nele efetuada e o valor de referência aceito como verdadeiro. O valor da exatidão de um instrumento é definido pelos limites dos erros intrínsecos e pelos limites da variação da indicação. Ela está diretamente relacionada com as características próprias dos instrumentos, ou seja, como ele foi projetado e construído. Além disso, essa característica é avaliada durante a sua calibração. Quanto maior a exatidão do instrumento, mais caro ele custa e mais cuidados ele requer para a sua utilização Precisão Característica que expressa o afastamento mútuo entre as diversas medidas obtidas de uma dada grandeza, em relação à média aritmética dessas medidas. Esta grandeza expressa o grau de consciência ou reprodução nas indicações de uma medida sob as mesmas condições Resolução É a menor divisão na escala de leitura do instrumento, ou seja, é o menor incremento que se pode assegurar na leitura de um instrumento Sensibilidade É a característica que expressa a relação entre o valor da grandeza medida e o deslocamento da indicação. Alta sensibilidade não indica alta acurácia ou alta precisão 29 Linearidade Característica que traduz uma condição de proporcionalidade direta entre as leituras fornecidas pelo instrumento e os valores da grandeza que está sendo medida Histerese Um instrumento apresenta histerese quando a grandeza medida está sujeita a variações cíclicas, tendo seu valor variável com as tendências distintas de aumento ou de redução da grandeza medida. Ruído Termo utilizado para relatar medidas aleatórias induzidas por fatores externos, gerando falta de precisão e acurácia Conformidade Característica que expressa a influência específica da implantação do instrumento em relação aos valores da grandeza a ser medida. Uma maior conformidade implica em uma acurácia maior do instrumento. Erro É definido como o desvio entre o valor medido e o valor real ou o valor admitido como correto (erro grosseiro). O erro relativo é o quociente entre o erro absoluto e o valor real da leitura. - Erros grosseiros: geralmente causados por descuido, fatiga ou inexperiência do operador; - Erros sistemáticos: causados por calibração imprópria, alterações da calibração com o tempo, histerese e não- linearidade; - Erros de conformidade: causados pela seleção errada dos procedimentos de instalação ou pelas limitações no projeto do instrumento; - Erros ambientais: causados pelos efeitos de calor, umidade, vibrações, pressão, etc sobre o instrumento de medida; - Erros observacionais: causados pela atuação de diferentes observadores (equipes de medições) usando diferentes técnicas observacionais; - Erros de amostragem: causados pela instalação do instrumento em local inadequado e pela variabilidade do material sendo instrumentado; - Erros acidentais: erros imponderáveis, essencialmente variáveis e não susceptíveis de prevenção. Fonte: Fonseca (2003) Em geral a tendência na instrumentação de taludes e encostas é enfatizar a instrumentação de deslocamentos da superfície e do sub-solo e as medias de pressões de água. (GEORIO, 2000) Cada barragem possui uma condição única e, portanto, requer uma solução individual para seu projeto de instrumentação. A escassez ou insuficiência de instrumentação em uma barragem, não é sinal de que um sistema se auscultação precise ser instalado. No entanto, quando há instrumentos adequados instalados a fim de se avaliar a segurança, é de extrema importância que sejam lidos e analisados conforme as rotinas estabelecidas, tendo em vista as informações valiosas que fornecem sobre o 30 desempenho das estruturas e suas condições de segurança (KUPERMAN et. al., 2003). Podem haver diferentes níveis de abordagem, detalhamento e periodicidade nas inspeções, sendo, portanto, elementos fundamentais no controle de uma barragem, normalmente elas são divididas em: rotineiras ou informais, periódicas, supervisão e extraordinárias. Tais inspeções são realizadas com base em uma análise prévia dos resultados da instrumentação, e que possibilite a verificação de problemas específicos nas áreas auscultadas assim como observar o estado de conservação dos aparelhos de medição, além de se realizar o acompanhamento dos problemas pré-existentes na área, bem como, a detecção de futuras anomalias que por ventura venham a prejudicar a segurança da obra (BALBI et. al., 2005). Alguns problemas tais como surgências de água, fissuras e abatimentos localizados, só são detectados através de inspeções de campo, sendorealizadas por meio de caminhadas pela extensão da barragem e do reservatório, assim como as áreas no entorno do barramento. Contudo, diversos problemas não são tão facilmente identificados, e demandam uma abordagem de gerenciamento maior, no que concerne a dados e tempo de observação. Portanto para um controle eficiente das condições de segurança, é necessário um monitoramento sistemático da magnitude e das faixas de variação de certas grandezas físicas, permitindo a auscultação prévia de tais problemas, por intermédio da implantação de um programa específico de instrumentação (FONSECA, 2003). A avaliação das condições de segurança de barragens de terra e enrocamento dependem da compreensão da grandeza e da evolução das pressões intersticiais que se desenvolvem nos maciços compactados e nos solos de fundação, durante as fases construtiva e de operação da barragem ou mesmo no caso de um rebaixamento do nível do reservatório. É preciso que haja o controle e inspeção dos dados das poropressões nas zonas ao longo do sistema de drenagem interna da barragem, durante e após a formação do reservatório, para que se possa aferir o desempenho global das funções drenantes e filtrantes dos materiais utilizados. (SILVEIRA, 2006) Nas fundações, as pressões intersticiais podem ser geradas tanto 31 pelas tensões de carregamento ocasionadas pela construção do próprio maciço como pelos acréscimos das cargas hidráulicas advindas do aumento do nível do reservatório. O controle e o monitoramento destas poropressões possibilita determinar as condições reais de drenagem e a avaliação da eficiência dos dispositivos de impermeabilização adotados. Os instrumentos convencionalmente utilizados para a medida de poropressões em obras geotécnicas são os piezômetros (FONSECA, 2003). 2.3 A lei de segurança de Barragens e a experiência no Ceará 2.3.1 O que é a Lei Federal 12.334/10 Por muito tempo, os potenciais danos ocasionados por acidentes de barragens não foram ponderados nas etapas iniciais de projeto. Quando no caso de acidente, e de catástrofe, tentava-se procurar um responsável, quando o mesmo não era identificado, julgava-se o acidente como resultado da “vontade de Deus”, ou do azar propriamente dito. Prevalecia a ideia de que a técnica fazia o que estava ao seu alcance, garantindo a segurança ao público, mas só o destino poderia ser incumbido de uma catástrofe (ALMEIDA, 2002). Antes mesmo da criação da lei de segurança de barragens no Brasil, diversas entidades nacionais e internacionais, prescreviam diretrizes tendo em vista, se não regular, disciplinar o tratamento sobre o assunto. Proprietários, mais conscientes da relevância do assunto e, principalmente, com a significância do risco para seus negócios adotaram por anos essas diretrizes em suas barragens. A Lei 12.334/10 tem como objetivo a garantia e observância de padrões de segurança de barragens, de tal maneira que possibilite a redução de acidentes e suas respectivas consequências, assim como regulamentar as ações e os padrões de segurança. Considera-se o empreendedor como o responsável legal pela segurança da barragem, sendo-lhe incumbido o desenvolvimento de ações para garantir a segurança. A aplicação da norma é para todas as barragens designada à acumulação de água para os mais diversos usos, à disposição de rejeitos final ou temporária, e de acumulação de rejeitos industriais (BRASIL, 2010), e que apresentem pelo menos uma das características a seguir: 32 a) altura do maciço, contada do ponto mais baixo da fundação à crista, maior ou igual a 15m; b) capacidade total do reservatório maior ou igual a 3.000.000m³; c) reservatório que contenha resíduos perigosos conforme normas técnicas aplicáveis; d) categoria de dano potencial associado, médio ou alto, em termos econômicos, sociais, ambientais ou de perda de vidas humanas, sendo as barragens classificadas pela lei conforme a categoria de risco e de dano potencial associado. Ainda estabelece que a fiscalização da segurança das barragens caberá à entidade que outorgou o direito de uso dos recursos hídricos, observado o domínio dos recursos hídricos, com exceção as com a finalidade de aproveitamento hidrelétrico. Ficando a cargo da fiscalização, a entidade que concedeu ou autorizou o uso potencial hidráulico, no caso de fins de geração de energia. O novo sistema tem como principais órgãos encarregados a ANA, a ANEEL, o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), o Ibama, as entidades de meio ambiente estaduais e do Distrito Federal e os órgãos gestores de recursos hídricos dos estados. 2.3.2 Implementação da lei 12.334/10 no Ceará por meio da COGERH No Ceará as ações de segurança de barragens tiveram início no ano de 2000, por meio da Gerência de Segurança de Infraestrutura Hídrica – GESIN, vinculada à Diretoria de Operações da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos do Estado do Ceará – COGERH. A GESIN executa, acompanha, analisa e planeja as intervenções necessárias à manutenção das boas condições operacionais da infraestrutura hídrica existente. As inspeções na COGERH já estão institucionalizadas e são realizadas anualmente em duas campanhas, uma inspeção antes e outra após a quadra chuvosa nas barragens estaduais, e nas federais quando há o Agente de Guarda e Inspeção de Reservatório – AGIR. Atualmente a COGERH monitora 136 reservatórios, sendo responsável pela manutenção de 66 barragens estaduais. As ações de 33 segurança consistem em inspeções, leituras e análise da instrumentação, manutenção e operação dos equipamentos hidromecânicos e treinamentos. As inspeções tanto podem ser de rotina, formal, de especialista como de caráter emergencial. As inspeções rotineiras são executadas por equipes locais de operação e manutenção, como atividade regular. A frequência de tais inspeções pode ser semanal ou mensal, e não geram relatórios específicos, apenas comunicações de eventuais anomalias detectadas. A COGERH realiza além das inspeções, o monitoramento constante das barragens por instrumentação de seus maciços de terra e/ou da fundação. O programa de instrumentação possibilita a leitura dos instrumentos, a avaliação dos dados e a notificação aos responsáveis em caso de observações atípicas ou divergentes dos critérios de projeto. São analisadas pela GESIN especificamente, leituras de piezômetros de medidores de fluxo pelo maciço e fundação. 2.4 Métodos determinísticos: 2.4.1 Estabilidade de taludes Denomina-se talude qualquer superfície inclinada de um maciço de rocha ou solo, podendo este ser natural ou artificial. No que tange as barragens, estes taludes são produzidos artificialmente pela compactação de camadas sucessivas de terra, advindas de jazidas de empréstimo, e realizadas por meio de rolos compactadores (MASSAD, 2010). A análise de estabilidade de taludes como conhecemos hoje, foi desenvolvida a partir de 1916, sendo motivada pelo escorregamento ocorrido no cais de Stigberg, em Gotemburgo. O método de análise usado atualmente foi desenvolvido pelos suecos tendo como base o conceito de “equilíbrio-limite” (MASSAD, 2010). Estudos de estabilidades são feitos em diversas obras geotécnicas como taludes rodoviários, aterros, escavações e barragens, tendo como objetivo principal de avaliar a possibilidade de ocorrência de escorregamento de massa de solo. Neste caso, métodos analíticos são empregados para a análise do problema, quantificando a estabilidade através do cálculo de um 34 fator ou coeficiente de segurança. 2.4.2 Métodos de análise de estabilidade Em um projeto de barragem de terra, costuma-se realizar análises para a determinação da estabilidade dos taludes, tanto ao lado montante (talude em contato com a água), quanto à jusante. Para isso diferentes métodos podem ser usados pelos projetistas para realizartais análises, contudo, é comum o uso dos métodos de equilíbrio-limite, que consiste em considerar o equilíbrio de uma massa de solo definida entre os limites físicos do terreno e uma superfície de deslizamento. (MASSAD, 2010) Segundo Massad (2010) os métodos de Equilíbrio-Limite partem dos pressupostos: a) O solo porta-se como um material rígido-plástico, ou seja, rompe-se subitamente, sem se deformar; b) As equações de equilíbrio estático são válidas até a premência da ruptura, quando o processo é dinâmico; c) O coeficiente de segurança (FS) é constante em toda a linha de ruptura, em outras palavras, despreza-se fenômenos de ruptura progressiva. Para a classe de métodos de equilíbrio-limite existem algumas variantes conforme mostra a Tabela 2. Tabela 2 – Métodos de equilíbrio-limite. método do círculo de atrito métodos de equilíbrio- limite método de Fellenius método sueco (das fatias) método de Bishop Simplificado método de Morgenstern-Price método das cunhas Fonte: elaborada pelo autor. O movimento dos maciços de terras depende, principalmente, da sua resistência interna ao escorregamento. Contudo, deve-se destacar que as causas de instabilidade podem assumir formas complexas, envolvendo diversos fatores associados (TERZAGHI, 1925). Em geral, a instabilidade do talude ocorre quando as tensões cisalhantes mobilizadas se igualam às tensões de resistência ao cisalhamento 35 (Figura 9). Figura 9 - Geometria do escorregamento. Superfície Potencial de Ruptura Superfície Potencial de Ruptura Resistência FS= Mobilizada Resistê nc ia = 1,00 M obilizada N.A. Fonte: Elaborada pelo autor. As solicitações mobilizadoras neste caso referem-se a todos os esforços que provoquem a movimentação da massa de solo acima da superfície potencial de ruptura, tais como o peso do material do talude (acima da superfície potencial de ruptura - SPR), presença de poropressões, sobrecargas na crista do talude, etc. Já as tensões resistentes são de natureza da própria resistência interna do material como a força coesiva do solo e o atrito entre partículas, expressos em parâmetros geotécnicos conhecidos como coesão e o ângulo de atrito. Estas solicitações atuantes podem sofrer alterações ao longo do tempo, causando necessariamente alterações quanto a estabilidade do talude. Neste caso, escorregamentos de taludes podem ser deflagrados por uma redução da resistência interna do solo que se opõe ao movimento da massa deslizante (geralmente ocasionada pela saturação do solo) e/ou por um acréscimo das solicitações externas aplicadas ao maciço. Varnes (1978) divide os mecanismos deflagradores em 2 grupos, como pode ser visualizado na Figura 10 a seguir: 36 Figura 10- Principais fatores causadores de instabilidades de taludes. F A T O R E S C A U S A D O R E S D E I N S T A B IL ID A D E D E T A L U D E S A u m e n to d a s o li ci ta çã o Erosão Escorregamentos Cortes R ed u ç ã o d a r es is tê n ci a Peso da água de chuva, neve, granizo, etc. Acúmulo natural de material Construção de estruturas, aterros etc. Solicitações dinâmicas Terremotos, ondas, vulcões etc. Explosões, tráfego, sismos induzidos Remoção de massa Sobrecarga C ara ct erí s ti ca s geomecâ ni ca s do material. Tensões Mudanças ou fatores variáveis Intemperismo: redução na coesão, ângulo de atrito, Variação das poropressões. Características inerentes ao material Fonte: elaborado pelo autor. A avaliação da estabilidade de um talude segundo o fator de segurança pode ser determinada de acordo com a Tabela 3: Tabela 3 - Fatores de segurança e as respectivas condições de estabilidade do talude. Fatores de segurança (FS) Condição do Talude FS<1,0 Talude instável; caso o talude venha a ser implantado (corte ou aterro) nestas condições, deverá sofrer ruptura. FS=1,0 Condição limite de estabilidade associada à iminência de ruptura; também condição adotada geralmente nos cálculos de retroanálise. FS>1,0 (Pouco Maior) Condição de estabilidade do talude. FS>1,0 (Muito Maior) Condição estável; quanto maior for o FS, menores serão as possibilidades do talude vir a sofrer ruptura quando submetido a condições críticas (percolação d'água, etc.) Fonte: ABGE (1998) 2.4.3 Tipos de Superfície de ruptura Quanto a geometria da superfície de ruptura, esta pode assumir diversas configurações a depender do tipo de solo, estratigrafia, geometria do talude, etc. 37 Resumidamente, podem ser admitidas como cilíndrica, plana, espiral-logarítmica, ou combinação destas formas, como pode ser observada na Figura 11. Figura 11 - Tipos de geometria de superfície de ruptura. Superfície Circular Superfície Planar Superfície Circular+Planar Superfície BiPlanar Fonte: Leme (2006) Geralmente, é observado que em solos relativamente homogêneos e coesivos, a superfície tende a ser circular. No caso de materiais com resistências mais baixas ou presença de descontinuidades, a superfície passa a ser mais complexa, podendo incluir trechos lineares. 2.5 Métodos probabilísticos para avaliação da segurança de uma barragem de terra. 2.5.1 Análise de Risco No que diz respeito as barragens, o conceito de risco possui grande importância. Refere-se a um sistema tecnológico criado com a finalidade de assegurar altos benefícios ao Homem, por meio da regularização e armazenamento de água em um vale (ALMEIDA, 2002). Considera-se a análise de risco como uma metodologia que avalia e determina a probabilidade de falha de um evento, por vezes indesejável, quantificando e qualificando-o. Tal metodologia ligada ao estudo da estabilidade de taludes é uma ferramenta de suma importância para se ter ideia do grau de estabilidade do talude, entretanto tem sido pouco utilizado por conta de seu difícil domínio. (VIEIRA, 2005) 38 Com as análises de risco ou análises probabilísticas é possível determinar a probabilidade de ruptura de um talude, levando em conta a variabilidade dos parâmetros geotécnicos do solo que o compõe, o que o torna mais vantajoso em relação às análises determinísticas que apenas consideram os valores médios dos parâmetros. 2.5.2 Conjectura dos Riscos Seja S o conjunto das solicitações e C a capacidade total do sistema, o que se procura é que, para qualquer obra, C seja sempre maior ou, pelo menos, igual a S. (VIEIRA, 2005) Nos projetos a solução tradicional é a de se considerar C=kS, sendo k o coeficiente de segurança, que assume maiores valores quanto maior forem as incertezas na avaliação de C e S. Segundo Fontenelle (2007) a tendência é se considerar C e S como variáveis aleatórias, definindo-as por meio de funções de probabilidades, em busca de se quantificar o risco K ou a confiabilidade G, como: K = P[k<1] (1) G = P[k>1] (2) Sendo o risco medido por P [C<S], define-se Z = C-S como coeficiente de desempenho da obra ou sistema hibrido, de modo que: P [C<S] = P [Z<0] (3) Podemos chamar este coeficiente Z como margem de segurança e P [Z<0] seria a probabilidade da obra funcionar em condições de insegurança. O método do período de retorno é a forma mais elementar de se mensurar o risco, muito aplicada para a avaliação de eventos hidrológicos indesejados. É correlacionado ao intervalo de tempo médio de ocorrência, Tr, e ao risco K. Considerando o risco K, para um período de n anos, dado por K= 1 – (1-1/Tr)n (4) Para a determinação da probabilidade de falha, o método mais correto é através da integração direta das funções densidade de probabilidades das variáveis S e C,entretanto ele possui dificuldade de aplicação por conta da complexidade. Podendo ainda ser utilizado o método de simulação Monte Carlo 39 (VOSE, 2000), que admite o conhecimento das funções densidade de probabilidades efetuando-se a geração de valores a partir de suas distribuições de probabilidade, a fim de se calcular um conjunto de valores de Z - funções desempenho do tipo Z = C - S = g (Xi), (i = 1,2,3,...,n), sendo Xi as variáveis básicas nas quais se decompõem C e S - suficientemente grande para representar uma boa amostra da população Z. 2.5.3 Método de simulação de Monte Carlo aplicado em barragens. Segundo Ang & Tang (1990), a simulação de Monte Carlo consiste em um processo de replicação do "mundo real" baseado em um conjunto de proposições e modelos teóricos da realidade. A simulação Monte Carlo consiste na geração simulada de conjuntos de valores das variáveis probabilísticas envolvidas no problema, com base em suas distribuições de probabilidade, a fim de se calcular um conjunto de valores da função estudada (FS) suficientemente amplo para a obtenção de uma boa amostragem estatística. A probabilidade de falha será avaliada pela razão entre a quantidade de falhas e a totalidade de eventos simulados. Na simulação de Monte Carlo inicialmente são gerados números aleatórios que seguem uma determinada distribuição de probabilidades. Conforme Goodarzi (2013) afirma, para essa geração de números aletórios, é preciso admitir X como uma variável aleatória, tendo Fx (X) como sua função acumulada de probabilidades. Portanto, a função inversa para qualquer valor de u pode ser escrita conforme a seguinte equação: X = (u) (5) na qual (u) é a inversa da função e u tem distribuição uniforme em (0,1). Entretanto, existem duas preocupações com relação à simulação de Monte Carlo, relatada por Tung (2006): a) a necessidade de um elevado número de simulações para a geração de variáveis aleatórias; e b) a existência de relação entre base estocástica e parâmetros. Para a realização de uma análise de risco para uma barragem de 40 terra fazendo uso do método de Monte Carlo, antes de tudo utiliza-se métodos determinísticos (Fellenius, Bishop, etc.) a fim de se determinar a provável superfície potencial de ruptura. Conhecendo esta superfície, são realizadas simulações através da variabilidade dos parâmetros mais importantes para uma análise de estabilidade, tais como a coesão (c), o ângulo de atrito () e o peso específico do solo (). É distribuído cada parâmetro normalmente de acordo com seus valores médios e desvio padrão. Os fatores de segurança são obtidos segundo uma distribuição de probabilidade. (KRAHN, 2004) As distribuições de probabilidade dos parâmetros , c e são obtidas através dos valores da média e desvio padrão. Primeiramente são obtidos valores aleatórios independentes de , c e segundo uma distribuição probabilística (normal, log Normal, triangular, uniforme, etc.). A partir dos valores obtidos de , c e são obtidos os valores do fator de segurança (FS) para várias simulações distintas . O Gráfico 1 apresenta a curva de frequência acumulada do FS obtida, através da qual pôde-se obter um risco calculado de FS (CAVALCANTE, 2010) Gráfico 1 - Distribuições normais dos parâmetros , c e e normal acumulada do FS. (a) (b) (c) (d) Fonte: Cavalcante (2010) 41 38º57’ 4º26' da Rch. 257Carqueja 060 Pesqueiro CAPISTRANO Rch. do Nilo Lagoa Nova Aratuba Itapiúna Baturité Mulungu LO S Contexto Municipal 257 BARRAGEM PESQUEIRO 3 ESTUDO DE CASO 3.1 Localização Para o estudo de caso, foi escolhido o Açude Público Pesqueiro, que por ser uma barragem relativamente nova, concluído em 2008, ainda não possui rede de fluxo bem definida, ou seja, ainda não se encontra em regime estacionário. A barragem Pesqueiro está localizada no distrito de mesmo nome, no Município de Capistrano de Abreu-CE, na região Nordeste do Estado do Ceará, de coordenadas 38º 57’ de longitude e 4º 27’ de latitude, cujo eixo se encontra referenciado pelo datum horizontal Córrego Alegre, entre as coordenadas UTM: Norte: 9.508.600 e 9.509.000; Leste: 504.200 e 504.400. O acesso ao eixo barrado, com origem na cidade de Capistrano, é realizado através de uma estrada pavimentada com pedras poliédricas que liga Capistrano a Pesqueiro, cerca de 12 km pela margem direita do riacho Lagoa Nova, seguindo por mais 1 km chega-se na ombreira direita da barragem. A Figura 12 a seguir, ilustra a localização da barragem, no contexto estadual e municipal. Figura 12 - Localização da barragem Pesqueiro P IA U Í R IO G R A N D E D O N O R TE PA R A ÍB A PERNAMBUCO OCEANO ATLÂNTICO Fortaleza Contexto Estadual CAPISTRANO 4º26' 38º57´ 060 257 Fonte: Leme et. al. (2011) 42 3.2 Descrição da Barragem A barragem do Pesqueiro dispões de uma capacidade de 8,1 milhões de m³ de água, em uma bacia hidráulica de 126 ha, possuindo uma descarga regularizada de 74 l/s, sendo uma importante reserva hídrica para o município de Capistrano. A extensão do eixo barrável é de 560,00 m sendo E0=M0 a estaca inicial na ombreira esquerda, indo até a estaca E-10 onde existe uma deflexão de 184º45´00´´ prosseguindo até a estaca E24=M1, já na ombreira direita, daí com um ângulo de 180º00´00´´ prosseguindo até a estaca E=28 na ombreira direita, estaca final do eixo barrável. A seção tipo consiste na sua concepção geral de uma barragem principal de terra homogênea, cota 199,20 (à jusante) e 199,10 (à montante) e largura de 6,00 m, assente sobre um substrato rochoso. A altura máxima do maciço, a partir do leito do rio, é de 24,20 m. Conta ainda com três diques na ombreira direita. O talude de montante possui uma inclinação de 1:2 (V:H) localizado entre o terreno natural e o coroamento localizado na cota El = 199,20 m. O talude de jusante possui inclinação de 1:1,5 (V:H) e está compreendido entre o terreno natural e a cota 181,00 do “rock fill”, 1:2 (V:H) da cota 181,00 do “rock fill” até a cota da berma na cota 190,00, e com inclinação de 1:2 (V:H) da berma até o coroamento na cota 199,20. A proteção do talude de jusante “rip-rap” possui camada graduada de enrocamento de 1,00 na horizontal, com blocos maiores de até 30cm, e fração fina (% < # 200) de no máximo 5%. A proteção do talude de jusante contra erosão foi executada com blocos de rocha inferiores a 60 cm e transição com granulometria ampla, com fração de finos (% < # 200) menor que 2% com blocos maiores de diâmetro inferior a 25 cm. O sangradouro posicionado na ombreira esquerda, é do tipo soleira espessa e consiste em um canal escavado com largura variável e fundo, parte em rocha gnáissica alterada e parte em rocha, cota da soleira de 196,5 m. A tomada d´água está localizada na ombreira direita, mais precisamente na estaca 19+5,00 m do eixo da barragem, perpendicular ao mesmo, com cota de 186,25 m situado em faixa de rocha alterada, com controle a jusante. 43 Possui filtro vertical (tipo chaminé) situado a 2,0 a jusante do eixo, e 1,0 m de espessura com topo na cota EI = 197,30 e filtro horizontal, com 1,0 m de espessura ligados a um enrocamento no pé do talude de jusante. A seção máxima da barragem Pesqueiro pode ser visualizado na Figura 13. 44 Figura 13 - Seção máxima da Barragem Pesqueiro Fonte: COGERH (1999b) 45 3.3 Geologia do Local A descrição a ser apresentada neste item faz referência à geologia local da barragem pesqueiro obtida junto ao projeto executivo da barragem COGERH (1999b). A área estudada está situada em coordenadas 38º40´/39º10´WGr e 4º50´ sul do equador e se enquadra nas seguintes feições geomorfológicas: Depressão Sertaneja e Planalto Residuais. A depressão sertaneja engloba uma subdivisão denominada Depressão Interplanáltica Central, onde a sudesteaparece uma superfície de área aplainada e no restante da área surgem formas curvas de vales em “V”, com relevo de topo planos e vales de fundo igualmente plano. Como planalto residual sobressai a Serra de Baturité a noroeste da área. Trata-se de um maciço gnáissico cuja altitude média é de 600 m. Possui topo separado em colinas formando um planalto elevado, rodeado por cristas. 3.4 Instrumentação da Barragem Pesqueiro De acordo com COGERH (2018), a barragem Pesqueiro é instrumentada por oito piezômetros distribuídos por cinco seções ao longo do maciço da barragem, sendo eles do tipo Casagrande/Standpipe, que são os piezômetros mais simples e mais utilizados, devido sua facilidade de execução, baixo custo e bons resultados obtidos pelo componente. A Figura 14 mostra um piezômetro Casagrande localizado no maciço da barragem Pesqueiro. 46 Figura 14 - Piezômetro de Casa Grande. FONTE: Sales (2006). Piezômetros de tubo aberto (Stanpipe ou Piezômetro Casagrande) são considerados instrumentos de fácil confecção e instalação, alta durabilidade e confiabilidade. No entanto ele apresenta grande tempo de resposta em solos impermeáveis assim como baixa sensibilidade. (DUNNICLIFF, 1988) A instrumentação existente foi executada ao final da etapa construtiva do maciço. Todos os piezômetros atuam em condições normais de funcionamento. A Figura 15 mostra um dos piezômetros existentes. 47 Figura 15 - Detalhe do piezômetro existente na barragem. Fonte: Leme et. al. (2011) 3.5 Coleta de dados Para a efetivação das análises deste trabalho, foram utilizados dados da variação do nível d´água da barragem Pesqueiro e leituras piezométricas fornecidas pela Companhia de Gestão de Recursos Hídricos do Estado do Ceará – COGERH, tendo como base os anos de 2008 a 2010, sendo estes os anos que a barragem apresentou o maior volume armazenado. Conforme informação da COGERH, os dados são coletados pelo AGIR (Agente de Guarda e Inspeção de Reservatório), sendo este um funcionário treinado pela empresa e que reside no local da barragem. Com relação aos dados, os referentes ao nível do açude são coletados diariamente, enquanto as leituras dos piezômetros são obtidas quinzenalmente. O Gráfico 2 apresentaa variação do nível de água do reservatório ao longo do período de três anos. 48 Gráfico 2 - Variação no nível da barragem de 2008 a 2010. Fonte: Leme et. al. (2011) 49 4 MATERIAIS E MÉTODOS 4.1 Generalidades O presente capítulo trata sobre a metodologia adotada para a realização das análises computacionais na Barragem Pesqueiro, no qual incluem simulações incluem análises de fluxo e de estabilidade. As análises de fluxo têm por objetivo investigar as condições de percolação em função das propriedades do solo e das condições de carregamento durante o período de operação da barragem. Para esta análise utilizou-se o software SEEP/W (Geostudio 2007 - Geoslope International) em que utiliza o Método de Elementos Finitos para as soluções de fluxo em meio poroso. As análises de estabilidade definem a segurança do talude para as diferentes condições de fluxo, expressos em um coeficiente de segurança. Além dos estudos de estabilidade, promoveu-se uma avaliação da segurança da barragem em termos de probabilidade, avaliando o risco de ruptura com base na variabilidade dos parâmetros geotécnicos. Para a realização destas análises utilizou-se o software SLOPE/W (Geostudio 2007 - Geoslope International) associado ao SEEP/W. 4.2 Análise de fluxo 4.2.1 Descrição da geometria do problema. A geometria tomada como base nas análises corresponde à seção máxima da Barragem Pesqueiro, mostrada na Figura 16. Para os dados de entrada, foram considerados os materiais referentes ao solo compactado, dreno de areia, dreno de pé e rip-rap. Para a simplificação do problema, assumiu-se que todos os materiais presentes na seção são homogêneos. Figura 16 - Seção adotada nas análises de fluxo Fonte: Elaborado pelo autor (2018). 50 A seção da Barragem Pesqueiro foi discretizada em uma malha de elementos triangulares geradas automaticamente pelo software com tamanho global de 2 metros com 1517 Elementos Finitos, que foram gerados automaticamente pelo programa SEEP/W e distribuídos uniformemente em sete regiões. A Figura 17 apresenta a malha. Figura 17 - Malha de Elementos Finitos Fonte: Elaborado pelo autor (2018). 4.2.2 Parâmetros de permeabilidade obtidos por Retroanálise Em uma barragem instrumentada como o Pesqueiro, faz-se necessário determinar para cada piezômetro, as cargas hidráulicas classificadas como críticas, que possam assim comprometer a segurança da barragem, isto é, fatores de segurança inferiores ao mínimo admissível para este tipo de obra. Afim de que se possa determinar os níveis críticos hidráulicos para cada piezômetro instalado, primeiramente é necessária a obtenção de um modelo numérico calibrado que possua um comportamento de drenagem interna análogo ao verificado in loco. A partir do modelo calibrado, far-se-á a simulação da colmatação do sistema de drenagem interna, determinando assim os valores de estabilidade da barragem e a carga hidráulica de cada piezômetro. Sendo assim, obtém-se uma relação das cargas piezométricas de cada instrumento em relação à estabilidade da barragem na situação de colmatação do filtro. Com base nos dados históricos de nível de água e leituras piezométricas, entre os anos de 2008 e 2010, obtidos junto à COGERH, realizou-se retro análises transientes, alterando a relação anisotrópica do solo, a fim de se atingir valores de carga hidráulica dos piezômetros semelhantes aos valores observados em campo. Para esta análise foi utilizada a seção máxima instrumentada (estaca 16), apresentada anteriormente na Figura 18. 51 Os parâmetros de permeabilidade do solo e do dreno foram obtidos com base nos ensaios geotécnicos presentes no projeto executivo da barragem pesqueiro, enquanto o do enrocamento foi estimado para fins de análise. A calibração foi realizada com base nas informações do piezômetro, modificando-se as condições de anisotropia do solo para atingir valores piezométricos semelhantes ao observado em campo. A variação do lençol freático foi obtida alterando a relação do Ky/Kx, encontrando um valor de 0,4 que é um parâmetro que confere uma carga semelhante à vista in situ. Na Tabela 4 a seguir, estão os parâmetros de permeabilidade estabelecidos após calibração. Tabela 4 - Parâmetros de permeabilidade após calibração Material k (m/s) Ky/Kx Solo compactado 3.00E-09 0.40 Filtro de areia 3.33E-05 1.00 Enrocamento 1.00E-04 1.00 Fonte: Elaborado pelo autor (2018). 4.2.3 Avaliação da colmatação do sistema de drenagem O processo de colmatação do sistema de drenagem interna foi executado no intuito de analisar a influência desta falha na estabilidade da barragem, por consequência, estabelecer os valores de carga hidráulica que cada piezômetro pode atingir sem comprometer a instabilidade do talude. Baseado no modelo de fluxo calibrado, efetuaram-se análises simulando hipoteticamente a colmatação do sistema de drenagem interna da barragem. O processo foi realizado através da redução do coeficiente de permeabilidade do filtro de areia. Os coeficientes de permeabilidade reduzidos pela simulação estão apresentados na Tabela 5. 52 Tabela 5 - Simulação da colmatação do filtro interno Fator de redução K (m/s) do dreno de areia 1 3,33E-05 10 3,33E-06 100 6,67E-07 500 3,33E-07 1000 1,67E-07 Fonte: Elaborado pelo autor (2018). A simulação do filtro foi executada em um processo interativo, em que para cada situação de colmatação, estabelecia-se o Fator de Segurança para a barragem e as cargas hidráulicas de cada
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