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UNIPAC ON-LINE Sociologia UNIVERSIDADE PRESIDENTE ANTÔNIO CARLOS – UNIPAC UNIPAC ON-LINE PROF. VILMARA LUCIA RODRIGUES TEIXEIRA SOCIOLOGIA BARBACENA 2016 UNIPAC T266s Teixeira, Vilmara Lucia Rodrigues Sociologia. / Vilmara Lucia Rodrigues. – Barbacena: UNIPAC, 2016. 90 p. il. color. ISBN: 1. Sociologia I. Título II. Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC CDD: 301 Copyright © 2016 Todos os direitos reservados a: Universidade Presidente Antônio Carlos – UNIPAC. Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida e gravada, por qualquer meio eletrônico, por fotocópia e outros, sem a prévia autorização, por escrito, da UNIPAC. Reitor Bonifácio de Andrada Vice-Reitor Institucional Lauro Lopes Pinheiro Vice-Reitor Administrativo Fábio Afonso Borges de Andrada Coordenação e Desenvolvimento de Projeto e Produtos EaD Késcia Maria de Carvalho Coordenação de Produção de Materiais Nívea Campos Capa, Diagramação e Projeto Gráfico Wuallen Leandro José Dornelles Ribeiro Equipe EaD Catalogação na fonte elaborada por Rosy Mara Oliveira – CRB 6/2083 A sociologia como ciência e o ser humano como um ser social, imerso na organização social, vivendo sob os padrões sociais da estrutura, da cultura e das instituições sociais, bem como um ser dotado de um “Eu” e de uma mente, um ser simbólico, capaz de intervir e transformar a realidade social. O indivíduo e a sociedade face à questão da desigualdade social, dos processos sociais e da mudança social. EMENTA CONHEÇA A AUTORA Vilmara Lucia Rodrigues Teixeira possui graduação em História e mestrado em História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2006). Atualmente é professora de ensino superior da Universidade Presidente Antônio Carlos - UNI- PAC. Atua também como professora de Educação Básica no Colégio Tiradentes da Polícia Militar de Minas Gerais. Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/0532137309756575 A UNIPAC há mais de meio século, trabalha para que estudantes tenham uma formação de qualidade e se tornem profissionais ca- pazes de competir no mercado de trabalho. Pensando nisso, a instituição abriu suas portas para o ensino à distância, uma metodologia de aprendizagem ativa que tem como função auxiliar os alunos a desenvolverem competências que podem potencializar seu processo de aprendizagem. As disciplinas oferecidas nesta modalidade são de formação humana e geral, o que significa que os alunos terão um conteúdo que não apenas lhe será útil profissionalmente, mas também ampliará sua visão de mundo tornando-o um sujeito proativo, critico e capaz de fazer escolhas e tomar decisões precisas quando necessário. É com satisfação que a UNIPAC oferece a você, aluno(a), esta apostila de Sociologia, parte integrante de um conjunto de materiais voltado ao aprendizado dinâmico e autônomo que a educação a distância exige. O principal objetivo desta apostila é propiciar a você uma apresentação do conteúdo básico da disciplina. Através do Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA), você possui ainda outras formas de solidificar seu aprendizado, por meio de recursos multidisciplinares, como fóruns, aulas web e material de apoio. Assim, a UNIPAC oferece os recursos necessários para apoiá-lo(a) no seu estudo, tornando seu aprendizado eficiente e prazero- so, concorrendo para uma formação completa, na qual o conteúdo aprendido influencia sua vida profissional e pessoal. Desejamos-lhe bons estudos! APRESENTAÇÃO DA DISCIPLINA SUMÁRIO UNIDADE I - O DESENVOLVIMENTO DO PENSAMENTO SOCIOLÓGICO..................................................11 1.1 A SOCIOLOGIA E O OLHAR SOCIOLÓGICO..........................................................................................12 1.2 O SURGIMENTO DA SOCIOLOGIA: CONTEXTO HISTÓRICO...............................................................15 1.3 AS ABORDAGENS SOCIOLÓGICAS........................................................................................................17 UNIDADE II - O PENSAMENTO SOCIOLÓGICO CLÁSSICO.........................................................................21 2.1 AUGUST COMTE (1798 – 1857).................................................................................................................22 2.2 ÉMILE DURKHEIM (1858 – 1917)...............................................................................................................23 2.3 KARL MARX (1818 – 1883).........................................................................................................................26 2.4 MAX WEBER (1864 – 1920)........................................................................................................................27 UNIDADE III - INDIVÍDUO, SOCIEDADE E SOCIALIZAÇÃO..........................................................................33 3.1 A IMPORTÂNCIA DOPROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO...........................................................................34 3.2 OS PROCESSOS SOCIAIS..........................................................................................................................39 UNIDADE IV - GRUPOS SOCIAIS E INTERAÇÃO.........................................................................................43 4.1 SOCIOLOGIA DOS GRUPOS SOCIAIS......................................................................................................44 4.2 MECANISMOS DE SUSTENTAÇÃO DOS GRUPOS SOCIAIS.................................................................45 4.3 OS GRUPOS SOCIAIS E A CONSOLIDAÇÃO DA INTERNET.................................................................46 UNIDADE V - ESTRATIFICAÇÃO E MOBILIDADE SOCIAL........................................................................51 5.1 ESTRATIFICAÇÃO SOCIAL: CONCEITO E CARACTERÍSTICAS...........................................................52 5.2 TIPOS DE ESTRATIFICAÇÃO SOCIAL......................................................................................................52 5.3 MOBILIDADE SOCIAL................................................................................................................................54 UNIDADE VI - INSTITUIÇÕES SOCIAIS.........................................................................................................57 6.1 AS INSTITUIÇÕES SOCIAIS: CONCEITOS E FUNÇÕES.........................................................................58 6.2 AS INSTITUIÇÕES SOCIAIS E O CONTROLE DOS INDIVÍDUOS..........................................................58 UNIDADE VII - SOCIEDADE E CULTURA..................................................................................................67 7.1 A CULTURA E SUAS VARIAÇÕES...........................................................................................................68 7.2 TIPOS DE CULTURAS.................................................................................................................................69 7.3 A INDÚSTRIA CULTURAL..........................................................................................................................70 UNIDADE VIII - RAÇA E RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO BRASIL......................................................77 8.1 CONCEITOS BÁSICOS...............................................................................................................................78 8.2 A REPRESENTAÇÃO SOCIAL DA COR...................................................................................................79 REFERÊNCIAS................................................................................................................................................90Figura 1: Filme de Charlie Chaplin - Tempos Modernos..................................................15 Figura 2: Luke Fildes Houseless and Hunfry, 12 de Abril de 1869.................................16 Figura 3: Max Weber, Marx e Durkheim.............................................................................18 Figura 4: Augusto Comte......................................................................................................22 Figura 5: Émile Durkheim.....................................................................................................23 Figura 6: Karl Marx................................................................................................................26 Figura 7: Max Weber..............................................................................................................27 Figura 8: Pirâmide das Castas na Índia.............................................................................52 Figura 9: Pirâmide social da sociedade estamental.........................................................53 Figura 10: Ilustração do Panóptico, de Jeremy Bentham..................................................59 Figura 11: Movimento Hippie da década de 60, nos EUA...................................................69 Figura 12: A facilidade da interação entre: indústria cultural e consumidores, catálogo da Netflix. ................................................................71 IMAGENS UNIPAC ON-LINE Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC 11 UNIPAC ON-LINE Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC O DESENVOLVIMENTO DO PENSAMENTO SOCIOLÓGICO UNIDADE 12 meios de comunicação de massa, e comumente admi- tidas como verdade. A Sociologia é uma ciência que transforma nos- sa percepção sobre o que vivemos em nossa rotina e, desse modo, contribui para alterar a forma como pen- samos nossa própria vida e a realidade que nos cerca. É por isso que para analisar as questões sociais deve- mos nos libertar da rapidez das circunstâncias pesso- ais e enxergar as coisas em um contexto mais amplo. Desnaturalizar o mundo. Aquilo que encaramos como natural, inevitável, bom ou verdadeiro pode não ser bem assim. Os modos como a vida social se organiza são arbitrários, fortemente influenciados por processos históricos. É o que nos ensina o americano C. Wright Mills, em sua famosa expressão “imaginação sociológica”, muito utilizada para incitar o pensamento criativo suge- rindo pensar além do óbvio, pensar fora dos padrões (usuais) ou alguma outra expressão similar. 1.1 A SOCIOLOGIA E O OLHAR SOCIOLÓGICO A Sociologia trata de fenômenos sociais, de mu- danças e permanências, que de uma maneira ou de outra, nos afetam em nosso dia-a-dia. São questões que estamos acostumados a ver em nossa vida coti- diana. Quem nunca “trocou ideia” com os amigos sobre a sociedade e seus problemas como desemprego, cor- rupção, fome, miséria? Quem nunca emitiu uma opi- nião sobre como os ricos ficam cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres? Sabemos que dez em cada dez pessoas que lerem estas indagações vão responder que fazem isso frequentemente. Mas, en- tão, todos nós somos sociólogos? Na verdade não, porque quando falamos sobre esses assuntos, mesmo que sejam instigantes, não nos detemos neles refletidamente, ao contrário emiti- mos opiniões por meio de noções do senso comum, ou seja, ideias recebidas, principalmente, através dos do seu período, que ele somente poderá conhecer suas chances na vida cientificando-se de todos os indiví- duos em suas circunstâncias. De muitas maneiras, é uma lição terrível; de muitas maneiras, magnífica. Não conhecemos os limites das capacidades de esforço supremo ou degradação voluntária de um homem, de agonia ou alegria, de brutalidade prazerosa ou da do- çura da razão. Todavia, em nossa época, aprendemos que os limites da ‘natureza humana’ são assustadora- mente amplos. Aprendemos que cada indivíduo vive, a cada geração, em alguma sociedade; que ele vive uma biografia, e que ele vive dentro de alguma sequência histórica. Pelo fato de viver, ele contribui, ainda que minimamente, para a criação dessa sociedade e suas disputas históricas. A imaginação sociológica nos pos- sibilita compreender história e biografia e as relações entre as duas na sociedade. Essa é sua tarefa e sua promessa … (WRIGHT MILLS, C. A imaginação sociológica. Tra- dução Waltensir Dutra.Rio de Janeiro: Zahar, 1965.pp. 11-18) A imaginação sociológica proporciona àquele que a pos- sui entender o cenário histórico mais amplo em termos de seu significado para a vida interior e a carreira externa de uma va- riedade de indivíduos. Ela pos- sibilita ao sociólogo considerar como os indivíduos, no rebuliço de suas experiências cotidianas, se tornam falsamente conscien- tes de suas posições sociais. Dentro desse rebuliço, procura-se um modelo que re- presente a sociedade moderna e, dentro desse modelo, formulam-se as psicologias de uma variedade de ho- mens e mulheres. Por tais meios, a inquietação pessoal dos indivíduos é dirigida para problemas explícitos, e a indiferença do público se transforma em envolvimento com questões públicas. O primeiro fruto dessa imaginação – e a primeira li- ção das ciências sociais a incorporá-lo – é a ideia de que o indivíduo pode entender a sua própria experiên- cia e avaliar o seu próprio destino situando-se dentro INTRODUÇÃO Porque estudar Sociologia? Por que ela é importante? De que forma o conhecimento sociológico pode contribuir para minha formação? Estas são algumas perguntas que procuraremos responder nesta unidade. PARA SABER MAIS 13 por trás do comportamento particular das pessoas (eventos que parecem ser individuais refletem ques- tões mais amplas). Embora todo indivíduo seja único, a sociedade molda a vida de seus integrantes. O divórcio, por exemplo, é um fato pessoal inques- tionavelmente difícil para o marido e para a esposa que se separam. Entretanto, o uso da imaginação socioló- gica permite ver o divórcio não apenas como problema pessoal do indivíduo, mas sim como uma preocupação da sociedade. Usando essa perspectiva, podemos no- tar que um aumento da taxa de divórcio na verdade redefine uma instituição fundamental – a família. Os la- res hoje com frequência incluem padrastos, madrastas e meios-irmãos cujos pais se divorciaram e casaram novamente. Embora isso demonstre que somos todos influen- ciados pelos contextos sociais, nenhum de nós é de- terminado totalmente por esses contextos em nosso comportamento. Possuímos e criamos nossa própria individualidade. É trabalho da Sociologia investigar as conexões entre o que a sociedade faz de nós e o que fazemos de nós mesmos e da sociedade. O texto a seguir busca apresentar a sociologia como uma ciência que tem seu objeto de estudo no cotidiano. Trata-se de um texto livre publicado na pri- meira edição da Revista Café com Sociologia. Segue o texto: O exercício de imaginar socio- logicamente exige que “pensemos fora da caixa”, que nos afastemos das respostas simples e pas- semos a enxergar a reali- dade como algo novo. Além disso, este exercício nos ensina a pensar criticamen- te, levando-nos do senso comum para o desenvolvimento de um conhecimento científico, autônomo, capaz de nos tornar pensadores independentes, capa- zes de analisar um noticiário, uma novela, um jornal, uma entrevista, com autoridade. Aprender a pensar sociologicamente significa cul- tivar a imaginação. Um sociólogo é alguém capaz de se libertar do quadro das suas circunstâncias pesso- ais e pensar as coisas num contexto mais abrangente, ou seja, abstrair-se das rotinas familiares da vida co- tidiana de maneira a poder olhá-las de forma diferen- te. Estabelecer relaçõesmais amplas com situações rotineiras. Peter Berger (1963) descreveu esse olhar socio- lógico como “ver o geral no particular”. Com isso ele quer dizer que o sociólogo procura os padrões gerais Figura 1.0: Pensar fora da caixa. das para impor uma suposta explicação verdadeira ou, no caso da última, apresentar uma explicação na defensiva, buscando deixar claro que é assim, e que se não for é por que mudou de uns tempos pra cá. A verdade é que a vida é como o futebol, todos se acham técnicos, capazes de explicar as regras do jogo. O certo é que os fenômenos que acontecem em nossa volta nos instigam a buscar compreendê-los. Mas o que tem a Sociologia com isso? A Socio- logia se alimenta do cotidiano e ao mesmo tempo procura iluminá-lo. Em outras palavras, é do coti- diano que o Sociólogo “pega” o fenômeno que irá estudar. Assim acaba tratando da mesma coisa que o cidadão comum. O que muda é a forma de expli- car as coisas. Isso nos lembra um episódio que nos ocorreu, no ano de 2004, em um bar na cidade de Guaribas, localizada no interior do Piauí. A noite estava quente e resolvemos, depois de um congresso, ir a um bar. Não sabíamos que uma cidade tão pequena nos proporciona- ria tanta reflexão, e olha que não foi nas palestras. Quando chegamos no local, havia uma roda de pes- soas discutindo e apontando para uma mulher que estava sentada em uma mesa ao lado. Devido a Diferentemente da Astronomia e de outras ciên- cias, temas sociológicos são assuntos de bar. Sa- bia?Os temas discutidos são quase sempre socio- lógicos, mas a forma de discuti-los quase sempre não o são. Como assim? Você deve estar se per- guntado! É isso mesmo. Podemos falar de assuntos de Sociologia sem pensar sociologicamente, assim como podemos falar de problemas sociais e não so- ciológicos. Os problemas ou os temas sociais discu- tidos no bar só passam a ser sociológicos quando apresentam, em sua análise, um rigor científico pró- prio da Sociologia. É comum todos acharem que sabem explicar um determinado fenômeno social, como, a prostituição, o desemprego, a moda, a pobreza, entre outros as- suntos. Cada pessoa tenta explicar à seu modo. Al- gumas explicações são até bem lógicas, outras sem o menor sentido. Algumas buscam explicações na religião, no acaso ou no fenômeno em si. É comum ouvir a expressão “olhe, a questão é a seguinte...”. Certamente, quem usa esta frase quer ganhar o direito de estar certo. Quem, também, não ouviu a famosa frase vinda dos mais velhos: “desde que me entendo por gente é assim...” Ou ainda: “na minha época era assim...”. Estas frases são usa- A Sociologia, um bar, o equilibrista, uma beata e a Darleny: tudo a ver! 14 era chamada na região) só tem uma! Tentamos então explicar que existiam mais coi- sas para além da Darleny - Danadinha de Guaribas. Buscamos argumentar que existem fatores que in- fluenciam as escolhas e o comportamento das pes- soas. Foi aí que Equilibrista falou algo que nos fez entender que a forma de enxergar o mundo não é só questão de aprendizagem, mas também como “você está no mundo e ele em você”. Ele nos interrompeu e disse: seus cabras sociólugus, entendo o que tão dizeno. Entonce é o como o caso da cachaça que mexe comigo, num é? Nessa hora ficamos decepcio- nados com o resultado de nossa explicação. Quando ele prosseguiu: no caso eu sou como a Darleny; o bar é a porcaria da sociedade, cheia de tipus de bibi- das; a beata a moralidadi e; a cana é aquilo que be- bemos dessa sociedadi, que leva nois a fazer coisas por querer e sem querer, pra além de nossa vontadi. Acho que é isso que estão querendo dizer... Essa re- flexão nos animava, até que ele continuou...mas ain- da acho que é por dinheiro, né não Antoin? – Claro que não homi, é por servengonheza! Respondeu ele. Desistimos de explicar e voltamos para a pousada onde estávamos alojados. Essa experiência nos serviu para refletir sobre o pensamento sociológico, o pensamento religioso, o senso comum e nossa posição no mundo. A beata apresentou uma explicação baseada na religião, não possuindo nenhuma racionalidade, antes apoiando-se em suas crenças, o que chama- mos de mito. Mito são todas as explicações basea- das em deus ou deuses. Já Antônio e o Equilibrista se apropriam do senso comum para explicar o caso de forma isolado do mundo, como simples escolha autônoma de Darleny. Suas interpretações estavam influenciadas pelas suas posições no mundo, assim como pela influencia deste em suas vidas. Gostaríamos que eles entendessem a colabora- ção da Sociologia para compreender a questão da prostituição, sendo ela parte de uma estrutura, um conjunto de fenômenos interligados que de certa for- ma levou a Darleny àquela profissão. Assim, o caso desta mulher não era um caso isolado, como se ti- vesse em uma redoma de vidro. Antes, trata-se de um fenômeno fruto de nossa história, da pobreza, da falta de escolaridade, da corrupção e tantos ou- tros fenômenos interligados direta ou indiretamente. O mais provável é que Darleny era prostituta devi- do sua história, a qual se entrelaça com a história do país, especialmente do interior do nordeste. Órfã desde os 6 anos de idade, criada pela tia como em- pregada, não teve condições de estudar, foi obriga- da pela tia a casar muito cedo, tendo três filhos e logo ficando viúva. Darleny residia em uma das ci- dades mais pobres do Brasil,com pouco mais de 4 mil habitantes. Guaribas era marcada pelo trabalho de subsistência no campo e pelo preço elevado dos curiosidade, perguntamos qual era o assunto. Um bêbado, conhecido como Equilibrista (entendi na hora o porquê do apelido), nos disse: Nois tamu suntano a Darleny. - Quem é Darleny? Perguntamos. - É que o Antoin disse que ela é quenga porque quer. Disse Equilibrista. - É pura safadeza dela! Gritou Antônio, por detrás do balcão do bar. Nessa hora, Equilibrista subiu na cadeira, ou me- lhor, tentou se equilibrar nela, e antes de se espatifar no chão gritou: - Ela é quenga por semvergonhonhice. Ela gosta é da bufunfa. Num quer trabaiar! Ele gritou tão alto que uma beata, que passava na frente do bar, ouvindo aquilo gritou em resposta, sem olhar para o ambiente: é coisa do demo! Ela tá encapetada! De repente um silêncio. Parecia que a discussão havia acabado. Após alguns segundos alguém gri- tou: pergunte prus cabras da cidade o porquê Dar- leny é quenga. Percebemos que estavam falando de nós. Ficamos sem reação. Como nada dissemos, Equilibrista sugeriu para que alguém perguntasse a própria Darleny. Foto que não acorreu. Todos, exceto nós que nada dissemos, concordaram, acreditando que só a Darleny saberia responder essa questão. Nós então dissemos que éramos sociólogos e que poderíamos ajudar. Logo veio duas “pergunta afirmativas”, enfáticas e bombásticas: e daí? Esta- mos falando da Darleny e vocês vêm com essa reli- gião? Equilibrista, depois de entornar mais uma dose de pinga, disse: se nois caricesse de tirar o capeta dos côro da cutruvia, nós chamava a beata que pas- sou indagorinha por aqui. Nois tudim é católico! - Eu sou discrenti – gritou mais uma vez Antônio por de traz do balcão. - Te discunjuro Antoin. Diabeisso? Tá duvidano de Deus? Perguntou equilibrista. Fomos explicar o que era ser Sociólogo. Todos se interessaram pela explicação, prestando atenção no que estávamos a falar, até que afirmamos que havíamos estudado justamente para explicar a situ- ação da Darleny. Nesse momento gritaram para a Darleny: Eita cunhã que tu tá famosa na capital! É a primeira vez que vejo universidade estudar quenga! Tentamos dizer a eles que existiam várias “Dar- lenys” no Brasil, quando alguém nos interrompeu di- zendo: Darleny Danadinha de Guaribas (assim ela 15 co. Embora o senso comum e a Sociologia pareçam distantes,não são. Naquele bar de Guaribas, poderia ocorrer uma discussão de caráter sociológico, desde que se atentasse para o método típico desta ciência. Poderíamos encerar esse texto dizendo: Veja como a Sociologia é útil! Mas optamos em terminar afirmando que o bar, o Equilibrista, a bea- ta e a Darleny era um cenário de pura Sociologia, apenas eles não sabiam. E você, sabe? Talvez veio a seguinte frase à cabeça: “Eu nunca tinha pensado desta forma”. Se isso ocorreu, fomos mais aptos do que naquele dia... naquele bar de Guaribas. Fonte: BODART, Cristiano das N. SILVA, Roniel Sampaio. A Sociologia, um bar, o equilibrista, uma beata e a Darleny: tudo a ver! Revista Café com So- ciologia, v.1, Nº 1, Dez. 2012. Disponível em:<http:// revistacafecomsociologia.com/revista/index.php/ revista/issue/view/Vol.1%2C%20Número1%2C%20 ano%202012%2C%201ª%20edição/showToc> bens de consumo (devido ao difícil acesso à cidade). Parece que para ela, que não tinha terra para plantar o sustento de sua família, não havia muitas escolhas e nem condições de ter uma visão do mundo diferen- te. Parece que não lhe restou nada além de ter que deitar-se com estranhos para garantir o seu sustento e de seus três filhos. Buscado ser críticos, no sentido de duvidarmos de tudo o que nos veem aos olhos e ouvidos, esta- remos nos aproximando do pensamento sociológico. Se assim fizessem o balconista, o Equilibrista e a beata, talvez entenderiam que não era bem uma es- colha, ou por “sem-vergonhice”, ou ainda por que o “diabo” a teria tomada. Antes, compreenderiam que o contexto social a qual Darleny viveu a influenciou fortemente para essa escolha. Claro que o raciocínio não para por aí. São necessários métodos científicos para compreender como o fenômeno da prostituição atua e se situa na estrutura social, bem como buscar identificar regras gerais capazes de explicá-lo. Alguns temas oriundos de conversas corriqueiras de bar, embora não tenham rigor científico, pode ser dotado de uma certa lógica racional, o que é o pri- meiro passo em direção ao conhecimento sociológi- 1.2 O SURGIMENTO DA SOCIOLOGIA: CONTEXTO HISTÓRICO O filme “Tempos Modernos,” produzido, dirigido, escrito e estrelado por Charles Chaplin em 1936, re- trata a situação do proletariado americano pós-grande depressão de 1929. Porém, trata-se de um dos melho- res roteiros capazes de ilustrar o processo de transfor- mação da estrutura social e econômica que tem sua origem no fim do Feudalismo e na consolidação da so- ciedade capitalista. Na imagem acima, Carlitos aparece apertando parafusos, num emprego repetitivo e automatizado, um trabalho completamente esvaziado de sentido, por não abranger qualquer conteúdo que exija do trabalha- dor senão o seu adestramento manual. Desde os primeiros momentos da industrialização, em função do aprimoramento nos equipamentos e pro- cessos, o modelo de produção, fundado na fragmenta- ção e rotinização das tarefas e na fixação do operário a um único posto de trabalho passou a ser adotado como regra em todas as indústrias. Esta situação é o reflexo de parte da lógica social desumanizadora ins- taurada a partir da formação da sociedade capitalista moderna. Desde o século XVI, diversas transformações so- ciais vêm caracterizando o que chamamos de moder- nidade. Estas mudanças provocaram expectativas e incertezas, pois o que era considerado certo foi cain- do em descrédito e o que se julgava válido foi posto em questão. A vida em sociedade ganhou um formato mais complexo, isto é, formas de produção, de conhe- cimento, de cultura e de consumo contribuíram para a dinamização das relações sociais. O século XVIII tornou-se um marco importante para a história do pensamento ocidental, dadas as Fonte: http://oteatrodavida.blogspot.com.br/ Data do acesso: 25/01/2016. Figura 1: Filme de Charlie Chaplin - Tempos Modernos. 16 transformações econômicas, políticas e culturais que se aceleraram nesse período e que apresentaram pro- blemas inéditos para as sociedades. A dupla revolução que este século testemunhou (Revoluções Francesa e Industrial) constituiu dois lados de um mesmo proces- so: a instalação definitiva da sociedade capitalista. A partir desse momento, economia mundial foi influenciada pela Revolução Industrial ocorrida na In- glaterra, enquanto a política e a ideologia sofreram a intervenção da Revolução Francesa. A Revolução Francesa (1789) e os ideais de Li- berdade, Igualdade e Fraternidade cultivados por seus líderes contribuíram enormemente para a ascensão da burguesia ao poder e para tornar evidente os proble- mas e os conflitos sociais. A partir desse momento, a divisão da sociedade segundo o modelo medieval (nobreza, burguesia e camponeses) é radicalmente alterada. A crença na rí- gida hierarquia social e na impossibilidade dos indiví- duos se moverem na escala social foi rompida. A ideia de que todos os homens são iguais impulsiona simples plebeus a buscarem o desenvolvimento de suas capa- cidades e de seus talentos, pois agora existe a certeza de que se se esforçassem conseguiriam alcançar a liberdade e a tão almejada mobilidade social. Assim, essa nova maneira de ver o mundo transforma a so- ciedade em um caldeirão de relações conflituosas que levariam a rupturas e mudanças definitivas. Para Martins (1985, p.13) o objetivo da revolução de 1789 não era apenas mudar a estrutura do Estado, mas abolir radicalmente a antiga forma de sociedade, com suas instituições tradicionais, seus costumes e hábitos arraigados, e ao mesmo tempo promover pro- fundas inovações na economia, na política, na vida cultural etc. A Revolução Industrial representou um conjunto de mudanças tecnológicas que tiveram um profundo impacto no processo produtivo, econômico e social no mundo antigo. Iniciado na Inglaterra em meados do século XVIII, esse amplo processo de mudanças se propagou pelo mundo a partir do século XIX. Na primeira fase (1760-1860) foram principalmente utiliza- dos recursos como o ferro, o carvão, o tear mecânico e a máquina a vapor. A segunda fase (1860-1900) foi caracterizada pelo emprego da energia elétrica, do aço e de produtos químicos. O desenvolvimento acarretado por essa industria- lização reorganizou o trabalho manufatureiro de forma radical, pôs fim ao artesão independente, introduziu a fábrica moderna e criou uma nova classe de trabalha- dores: o proletariado, ou classe operária, concentran- do, sobretudo em grandes unidades industriais. As novas condições de vida suscitadas pelo mun- do moderno provocaram o aparecimento de complexos problemas cujas explicações não eram encontradas nem na natureza, nem na vontade individual. As con- sequências da rápida industrialização e urbanização levaram ao aumento da prostituição, do alcoolismo, da criminalidade, das epidemias e dos bolsões de misé- ria. Até o fim do século XIX, as jornadas de trabalho na indústria europeia giravam em torno de catorze ou dezesseis horas por dia. Não havia descanso remune- rado, como hoje, nem férias, nem aposentadoria. As condições de trabalho na indústria e nas minas eram extremamente penosas, ocasionando muitos aci- dentes, que podiam provocar a morte ou mutilações nos trabalhadores. Não havia limite de idade para tra- balhar, nem leis de proteção ao menor, de modo que mesmo crianças de seis ou sete anos trabalhavam em funções perigosas. Além disso, as condições de vida e de moradia eram precárias. Não havia saneamento básico nos bairros proletários. As habitações eram pequenas, in- salubres e nelas se aglomeravam muitas pessoas. Fonte: http://spartacus-educational.com/Jfildes.htm Data do acesso: 25/01/2016. Figura 2: Luke Fildes Houseless and Hunfry, 12 de Abril de 1869. Nesse contexto eclodiram movimentos de protes- to e tentativasde organização da classe trabalhadora. Formavam-se, assim, os primeiros sindicatos na Ingla- terra e em outros países europeus. Ao mesmo tempo, alguns pensadores dedicavam esforços para compreender essas mudanças pelas quais o mundo passava. Foi nesse cenário que emer- giu a necessidade de uma ciência que investigasse ri- gorosamente a sociedade. A vida social passou a ser um “problema” para as pessoas. Percebeu-se que era preciso entender o que se passava com a sociedade para explicar como as pessoas viviam e como deve- riam se posicionar diante do que estava acontecendo. A Sociologia surgiu como uma disciplina no século XIX, na forma de uma resposta acadêmica para um desafio da modernidade. Uma ciência voltada para a observação da sociedade, dos seus antagonismos de classes epor isso mesmo uma ciência da ação, dese- 17 josa por interferir e transformar os rumos da civilização moderna. Historicamente, a Sociologia é um conjunto de conceitos, de técnicas e de métodos de investigação que produzem uma diversidade de tendências teóricas desenvolvidas por pessoas com diferentes “visões de mundo”. Segundo Martins (1985) a Sociologia “[...] para alguns representa uma poderosa arma a serviço dos interesses dominantes, para outros ela é a expressão teórica dos movimentos revolucionários” (MARTINS, 1985, p. 7). Podemos destacar, a partir dessa análise, que além de não se tratar de uma ciência neutra, a Socio- logia possui diferenças na explicação da vida social. E essas diferenças acabam dando origem a uma infini- dade de conceitos, muitas vezes divergentes, mas que nos permite alcançar uma pluralidade de respostas para o mesmo problema: o que é viver em sociedade? Isto fica evidente quando observamos os trabalhos dos pioneiros fundadores dessa disciplina. Sua refe- rência é a sociedade capitalista moderna, porém sua interpretação segue matrizes diferentes, ora conserva- dora ou reformista e ora revolucionária. Ao olhar para a sociedade do século XIX, trans- formada pelo trabalho das máquinas, quase sem fron- teiras comerciais graças ao neocolonialismo e com um sistema social que não só hierarquizava e privile- giava algumas poucas pessoas, mas também alguns Estados Nacionais, os sociólogos ligados às ideias conservadoras pensavam e teorizavam sobre as vá- rias formas de manutenção do sistema social vigente, para que determinados grupos sociais se mantivessem no poder. Os reformistas, também chamados liberais, buscavam o aprimoramento do sistema capitalista que os deixaria cada vez mais próximos de um refinado conjunto de estratégias de exploração das pessoas mais pobres e do trabalho exercido por elas. Já os re- volucionários defendiam a transformação dessa forma de organização capitalista da vida social. Uma trans- formação tão profunda que implica na superação do capitalismo, radicalizando a igualdade social. Nesse sentido, podemos concluir que a Sociologia surge para estudar e explicar a sociedade capitalista, ora defendendo-a e produzindo conhecimento para aprimorá-la, ora criticando-a e produzindo estratégias para superá-la, transformá-la. 1.3 AS ABORDAGENS SOCIOLÓGICAS As três mais importantes abordagens sociológi- cas, o funcionalismo, a abordagem do conflito e o in- teracionismo simbólico, apresentam conexões com as teorias de Durkheim, Marx e Weber, respectivamente. Para Giddens “o funcionalismo diz que a socieda- de é um sistema complexo, cujas várias partes atuam juntas para produzir estabilidade e solidariedade. Se- gundo essa abordagem, a disciplina Sociologia deve investigar a relação de partes da sociedade entre si e com a sociedade como um todo.” (GIDDENS, 2012, p. 31). Durkheim costumava comparar a sociedade a um “corpo vivo”, em que cada órgão cumpre uma função. As partes da sociedade funcionam juntas, assim como várias partes do corpo humano, para benefício da so- ciedade como um todo. Nesse sentido, estudar a fun- ção de uma prática ou instituição social é analisar a contribuição que aquela prática ou instituição traz para a continuidade da sociedade. Muitos críticos argumentam que o funcionalismo é bom para explicar o consenso – porque as sociedades se sustentam e compartilham uma moralidade comum – mas é muito menos capaz de explicar o conflito e a mudança social radical. Outros argumentam que o funcionalismo durkheimiano parece priorizar as restri- ções das sociedades para as pessoas e não possibilita espaço suficiente para os atos criativos dos indivíduos. Finalmente, a análise funcional tende a imputar propó- sitos e necessidades à própria sociedade. (GIDDENS, 2012, p. 69). Como os funcionalistas, os sociólogos que empre- gam teorias de conflito enfatizam a importância de es- truturas dentro da sociedade. Eles também defendem um “modelo” abrangente para explicar como a socie- dade funciona. Todavia, os teóricos do conflito rejeitam a ênfase do funcionalismo no consenso. Ao invés dis- so, eles destacam a importância das divisões na so- ciedade. Desse modo, concentram-se em questões de poder, desigualdade e luta. Eles tendem a considerar a sociedade composta de grupos distintos, que bus- cam seus próprios interesses. A existência de interes- ses separados significa que o potencial de conflito está sempre presente e que certos grupos se beneficiam mais que outros. Os teóricos do conflito analisam as tensões entre os grupos dominadores e dominados na sociedade e tentam entender como as relações de controle se estabelecem e se perpetuam. Uma aborda- gem influente na teoria do conflito é o marxismo, assim denominado por causa de Karl Marx, cujo trabalho en- fatizava o conflito de classe. (GIDDENS,2012, p. 32) O interacionismo simbólico direciona a nossa atenção para os detalhes das interações interpessoais 18 e como os usamos para entender o que as pessoas dizem e fazem. Os sociólogos influenciados pelo in- teracionismo simbólico enfocam as interações presen- ciais nos contextos da vida cotidiana. Eles enfatizam o papel dessas interações na criação da sociedade e de suas instituições. Max Weber tem uma influência di- reta e importante nessa abordagem teórica, pois, em- bora reconhecesse a existência de estruturas sociais – como classes, partidos, grupos de status e outros – acreditava que essas estruturaseram criadas por meio das ações sociais dos indivíduos. Embora a perspectiva interacionista simbólica possa gerar muitas ideias sobre a natureza das nos- sas ações no decorrer da vida social cotidiana, ela foi criticada por ignorar as questões mais amplas do po- der e da estrutura da sociedade, e como servem para condicionar a ação individual. (GIDDENS, 2012, p.32) A partir de tudo isso que vimos, podemos afirmar que a Sociologia possui uma variedade de aborda- gens, isso é devido à natureza própria do seu objeto de estudo. O comportamento humano é diverso e com- plexo, assim, é necessária a utilização de teorias para conferir sentido às interpretações feitas, pois sem uma abordagem teórica, não saberíamos o que procurar ao começar a estudar ou ao interpretar nossos resultados ao final da pesquisa. Nesses cento e cinquenta anos (mais ou menos) de construção da Sociologia, o volume de pesquisas e teorias produzidas criaram lógicas, formas de pensar os fenômenos sociais que nos informam sobre os mo- dos de pensar sociologicamente. O ponto chave para o desenvolvimento das pes- quisas no campo sociológico foi o abandono das expli- cações religiosas e míticas e a adoção da ciência ao responder as questões impostas pela realidade social. Temas clássicos foram trabalhados por grandes pensadores, que se tornaram clássicos e, que são re- correntes nas pesquisas contemporâneas. A base do ofício do sociólogo é o saber, são os saberes elabo- rados historicamente sobre a realidade social,as re- lações e as formas de vida. As técnicas nascem das necessidades contemporâneas e do saber acumulado e apropriado pelo cientista, pelo pensador, pelo soció- logo. Do saber acumulado, definimos princípios lógicos do raciocínio e da imaginação sociológica. Das neces- sidades contemporâneas, definimos modos de ensi- nar, técnicas de criação de vínculos da sociologia com os indivíduos. Como a Sociologia é uma ciência da mo- dernidade e é relativamente nova em relação às ou- tras, o saber acumulado sobre os mais variados fenô- menos sociais é novo, não é de todo superado. Mesmo os estudos dos clássicos, tais como, Durkheim, Marx e Weber, guardam alguma atualidade e vínculos com as VOCÊ APRENDEU QUE: - A Sociologia é uma ciência que contribui para a mudança na forma em que pensamos a realidade que nos cerca. - A formação da Sociologia como ciência tem relação com a dupla revolução europeia do século XVIII, ou seja, o desenvolvimento do pensamento social foi influenciado pelas mudanças causadas pelas Revoluções Industrial e Francesa. - A Sociologia possui diferentes abordagens para a explicação da realidade social, destaca- -se três delas: o funcionalismo, a teoria do conflito e o interacionismo simbólico. Fonte: http://literatortura.com/ Data do acesso: 25/01/2016 necessidades contemporâneas de compreensão da realidade. indivíduos. Como a Sociologia é uma ciência da modernidade e é relativamente nova em relação às outras, o saber acumulado sobre os mais variados fenômenos sociais é novo, não é de todo superado. Mesmo os estudos dos clássicos, tais como, Durkheim, Marx e Weber, guardam alguma atualidade e vínculos com as necessidades contemporâneas de compreen- são da realidade. E é exatamente isso que passaremos a ver nas próximas unidades, temas contemporâneos explica- dos à luz dos pais fundadores da Sociologia. Figura 3: Max Weber, Marx e Durkheim. 19 SUGESTÕES DE LEITURA: SCOTT, John. 50 Sociólogos Fundamentais. Editora Contexto. 2007. Este livro trata da vida, obra, ideias e impacto de alguns dos mais importantes sociólogos da nossa história, como Auguste Comte, Émile Durkheim, Karl Marx, Theodor Adorno, Max Weber e Frédéric Le Play. Palavras-chave: Sociólogos. Sociologia. GIDDENS Anthony. Sociologia. Editora ARTMED. 2005. A quarta deste livro edição preserva e, mais do que isso, amplia as notáveis qualidades do texto, sua lucidez, vivacidade, alcance e originalidade. Esta obra é o primeiro livro-texto a abordar o im- pacto da internet, da nova economia e da globalização na sociedade atual. Palavras-chave: Sociologia. Sociedade. BARBOSA, Maria Ligia de Oliveira & OLIVEIRA, Márci. Um Toque de Clássicos. Editora Barbosa. 2003 O pensamento social é quase tão antigo como a própria humanidade. No entanto, a Sociologia, como campo delimitado do saber científico, surge em meados do século 19. Para melhor enten- der esse novo campo do saber é imprescindível o conhecimento de 3 grandes sociólogos: Marx, Durkheim e Weber. Palavras-chave: Marx. Durkheim. Weber. INTERNET: www.cafecomsociologia.com Site que divulga a produção sociológica. Traz textos, materiais e links de publicações. FILMES: Tempos Modernos. Direção: Charles Chaplin. Produção: 1936. Um trabalhador de uma fábrica (Chaplin) tem um colapso nervoso por trabalhar de forma quase escrava. É levado para um hospital, e quando retorna para a “vida normal”, para o barulho da ci- dade, encontra a fábrica já fechada. Vai à busca de outro destino, mas acaba se envolvendo numa confusão: ao ver uma jovem (Paulette) roubar um pão para comer, decide se entregar em seu lugar. Não dá certo, pois uma grã-fina tinha visto o que houve e entrega tudo. A prisão para ele parece ser o melhor local para se viver: tranquilo, seguro e entre amigos. Mesmo assim, os dois acabam escapando e vão tentar a vida de outra maneira. A amizade que surge entre os dois é bela, porém não os alimenta. Ele tem que arrumar um emprego rapidamente. 20 UNIPAC ON-LINE Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC 21 UNIPAC ON-LINE Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC O PENSAMENTO SOCIOLÓGICO CLÁSSICO UNIDADE 22 2.1 AUGUST COMTE (1798 – 1857) A Sociologia foi a primeira ciência social a ser insti- tucionalizada, antes, portanto, da Ciência Política e da Antropologia. O termo Sociologie foi usado pela primei- ra vez por August Comte, em seu Curso de Filosofia Positiva, em 1839. Originalmente, ele usava o termo “física social” para descrever o novo campo, mas al- guns intelectuais da época também estavam usando o termo, então ele decidiu distinguir suas ideias e, assim, cunhou o termo Sociologia. Nascido dez anos depois da Revolução Francesa, Comte teve seu pensamento influenciado pelos acon- tecimentos turbulentos de sua época. Tentou criar uma ciência da sociedade que pudesse explicar as leis do mundo social, assim como a Ciência Natural explica- va o funcionamento do mundo físico. Comte afirmava que a sociedade deveria ser considerada como um organismo vivo, cujas partes desempenham funções específicas que contribuem para manter o equilíbrio do todo. Para Comte, da mesma maneira que a descober- ta de leis no mundo natural nos permitira controlar e prever os acontecimentos ao nosso redor, descobrir as leis que governam a sociedade humana poderia nos ajudar a moldar o nosso destino e melhorar o bem-es- tar da humanidade. Argumentava que a sociedade aia INTRODUÇÃO Por tudo que vimos até aqui, podemos afirmar que a Sociologia não é uma ciência de ideias uniformes e nem uma obra de um único cientista, mas o resultado do trabalho de vários pensadores empenhados em compreender as diversas situações da vida social. Pas- saremos a partir de agora à análise da contribuição deles, os chamados “pais fundadores da Sociologia”. Imagem: http://www.estudopratico.com.br/ Data do acesso: 25/01/2016 Figura 4: Augusto Comte. conforme leis invariáveis, da mesma forma que o mun- do físico. (GIDDENS, 2012, p.24) Sua abordagem denomina-se Positivismo, baseia- -se no princípio da observação direta, que pode ser explicado por afirmações teóricas baseadas no esta- belecimento de generalizações causais (assim como leis gerais), através de evidências empíricas obtidas com observação, comparação e experimentação. A tarefa da Sociologia, segundo Comte, era adqui- rir conhecimento seguro sobre o mundo social para fa- zer previsões sobre ele e, com base nestas previsões, intervir para mudar a vida social de maneira progres- sista. A motivação pela qual Comte se movia era a si- tuação de “anarquia” e “desordem” de sua época. A reconciliação entre a “ordem” e o “progresso” consiste em um dos eixos centrais de sua Sociologia. Por isso, ao estudar as novas realidades advindas das Revolu- ções Industrial e Francesa, preconizava a necessida- de mútua desses dois elementos (ordem e progresso) para a nova sociedade. O restabelecimento da ordem nas ideias e nos conhecimentos era a chave, segundo o autor, para a promoção da coesão e equilíbrio na so- ciedade, e para isso seria necessário criar um conjunto de crenças comuns a todos os homens. O século XX assistiu a muitas tentativas de con- trolar populações humanas, incluindo os Regimes Mi- litares linha-dura como o implantado no Brasil de 1964 a 1985 e em governos fascistas baseados em teorias de “racismo científico” para justificar assassinatos em massa. Os cientistas sociais não podem desconhecer as horrorosas consequências humanas desse uso de teorias científicas, e existe um ceticismo crescente so- bre a noção de Comte da Sociologia como uma ciência positiva. (GIDDENS, 2012, p.65) Entretanto, embora Comte não seja particularmen- te estimado pela maioria dos sociólogos atualmente, é importante lembrar seu papel formativoem estabelecer o argumento em favor de uma ciência da sociedade. 23 É considerado o pai da Sociologia, pois é ele que vai estruturar, de fato, a ciência sociológica na França, tendo dedicado toda sua carreira ao desenvolvimento dessa ciência, metódica e rigorosamente objetiva. Nasceu na região francesa da Alsácia, em 1858. Descendente de judeus franceses e rabinos frequentou grandes escolas e formou-se em Filosofia. Tornou-se professor e mais tarde foi estudar Ciências Sociais na Alemanha (1885) onde esses estudos estavam mais avançados. Ministrou o primeiro curso de Sociologia criado em uma universidade francesa. Durante estes estudos, teve contatos com as obras de Augusto Com- te e Herbert Spencer que o influenciaram significativa- mente na tentativa de buscar a cientificidade no estudo das humanidades. Durkheim é uma figura fundamental no desenvolvimento da Sociologia acadêmica, acredi- tava que esta estava mais próxima de esclarecer as principais questões morais que a sociedade francesa enfrentava. Para Durkheim, o estudo dos fenômenos sociais se faz necessário sempre que as ações humanas ul- trapassarem as explicações individuais. Para ele, as instituições e as formas sociais têm uma realidade pró- pria, ou seja, a sociedade é mais que simplesmente um somatório de ações e interesses individuais. Vamos tomar emprestado do professor Gabriel Cohn uma analogia que vai nos ajudar a compreen- der melhor essa resposta. Segundo o professor, para Durkheim a vida é como um aquário: os peixes seriam os indivíduos e o aquário, a sociedade, ou seja, em um aquário tudo já está colocado em seu devido lugar, todas as plantas, as pedras. O aquário, assim como a sociedade cerca os indivíduos por todos os lados. O que restaria para os peixes fazerem é simplesmente viver, pois tudo já foi pré-estabelecido. Durante toda a vida, os indivíduos encontram uma série de predeterminações já estabelecidas e impostas pela sociedade, pois eles nascem e passam pela vida com as circunstâncias já constituídas. Isso explica porque Durkheim concentrou seus esforços no estudo dos aspectos da vida social que moldam nossas ações como indivíduos, por exemplo, a economia ou a religião. Durkheim chamou estes as- pectos de fatos sociais que, segundo ele, são modos adotar o lema “ordem e progresso”. Várias das medidas governamentais dos primeiros anos da República tive- ram inspiração positivista, como a reforma educativa de 1891 e, no mesmo ano, a separação oficial entre Igreja e Estado. O positivismo ficou de tal forma conhecido no Brasil que o prenome de Comte foi aportuguesado para Augusto e a corrente filosófica tornou-se tema de um samba de Noel Rosa e Orestes Barbosa. A canção, in- titulada Positivismo e lançada em 1933, termina com os versos: “O amor vem por princípio, a ordem por base/O progresso é que deve vir por fim/ Desprezaste esta lei de Augusto Comte/ E foste ser feliz longe de mim”. ( http://revistaescola.abril.com.br/formacao/auguste-com- te-423321.shtml?page=all, acesso em dezembro de 2015) O projeto sociopolítico de Comte pressupunha uma evo- lução ordeira da sociedade, incompatível com revoluções e mudanças bruscas. Curiosa- mente, no Brasil os ideais posi- tivistas serviram para alavancar uma troca de regime, com a pro- clamação da República. O apa- rente paradoxo se explica, em parte, pelo fato de a influência positivista ter resultado em pensamentos muito diversos no Brasil, conforme se combinou com outras correntes ideológicas. Nenhum setor teve maior presença da ide- ologia comtiana do que as Forças Armadas, de onde saiu o vitorioso movimento republicano e a ideia de PARA SABER MAIS Proclamação da República teve influência positivista Imagem: http://www.controversia.com.br/blog/12992 Data do acesso: 25/01/2016 Figura 5: Émile Durkheim. 2.2 ÉMILE DURKHEIM (1858 – 1917) 24 Existe um modo de vestir que é comum e específico a cada situação do dia-a-dia. Isso não é estabelecido pelo indivíduo. Quando ele entrou no grupo social, já existia tal norma e, quando ele sair, a norma provavel- mente permanecerá. Quer a pessoa goste ou não, ver- -se-á obrigada a seguir o costume geral. Se não seguir, sofrerá uma punição que pode ir, conforme o caso, da ridicularizarão e do isolamento a uma sanção penal. Émile Durkheim afirmaria que “não existe moralidade fora do contexto social e a moralidade é a grande força coesiva da sociedade. A função básica da sociedade é justamente transmitir valores morais.” de agir, pensar ou sentir externos aos indivíduos e têm sua própria realidade à margem das percepções de pessoas individuais. Os fatos sociais exercem um po- der coercitivo sobre os indivíduos, porém, estes não costumam reconhecer seu caráter condicionante. Isso ocorre porque as pessoas geralmente obedecem livre- mente os fatos sociais, acreditando que estão agindo por escolha própria. Um exemplo simples pode nos ajudar a entender esse conceito. Se uma aluna chegasse à universidade vestida com trajes de praia, certamente ficaria em uma situação desconfortável, para não dizer constrangedo- ra: os colegas ririam, debochariam e até insultariam. “O fato social é o objeto da Sociologia, refere-se a toda maneira de agir, fixa ou não, capaz de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior, ou ainda, que é geral no conjunto de uma dada sociedade tendo, ao mesmo tempo, uma existência própria, independente de suas manifestações individuais.” Os fatos sociais podem, assim, ser definidos por três princípios básicos: - a coercitividade, ou força que exercem sobre os indivíduos, obrigando-os, através do constrangimento, a se conformar com as regras, normas e valores sociais vigentes; - a exterioridade, ou fato de serem padrões exteriores aos indivíduos e independentes de sua consciência; -a generalidade, ou fato de serem coletivos e permearem toda a sociedade sobre a qual atuam. Então: São fatos sociais, por exemplo, as regras jurídicas e morais de uma sociedade, seus dogmas religiosos, seu sistema financeiro e até mesmo seus costumes. O FATO SOCIAL É: 1- GERAL 2- EXTERIOR 3- COERCITIVO Durkheim estava preocupado com as mudanças que em sua época estavam transformando a socie- dade. Ele se interessava particularmente pela soli- dariedade social e moral, ou seja, aquilo que une os indivíduos à sociedade e a impede de cair no caos. A solidariedade é mantida quando os indivíduos con- seguem se integrar aos grupos sociais e são regulados por um conjunto de valores e costumes compartilha- dos. (GIDDENS, 2012, p.25). Solidariedade social = - Responsável pela coesão entre os homens; - Solidariedade significa solidez, coesão. 25 Em sua obra “A divisão do trabalho social” Durkheim apresenta a distinção entre as formas mecâ- nica e orgânica de solidariedade e as relaciona à divi- são do trabalho. Segundo Durkheim, as culturas tradicionais com uma baixa divisão do trabalho (muitas vezes dividido apenas com base no caráter sexual) se caracterizam pela solidariedade mecânica. Como a maioria das pessoas na sociedade tem ocupações semelhantes, elas são unidas pela experiência comum e crenças compartilhadas. A especialização de tarefas e a cres- cente diferenciação social nas sociedades avançadas levariam a uma nova ordem, caracterizando a solida- riedade orgânica. As sociedades caracterizadas por esse tipo de solidariedade se mantêm pela interdepen- dência econômica das pessoas e por seu reconheci- mento da importância da contribuição dos outros. (GI- DDENS, 2012, p.25). Contudo a solidariedade não é capaz de impedir o surgimento das dificuldades e dos problemas sociais, como as revoluções, as greves, as lutas de classes. Durkheim considerava que essas manifestações eram sintomas de uma espécie de “doença”da sociedade, que chamou de anomia. Em seu entender, a anomia seria caracterizada pela perda de regras ou de normas corretas de conduta social. Na base desse fenômeno haveria, portanto, um desregramento das relações en- tre o indivíduo e a sociedade. Resumindo: Sociedades tribais e clânicas = So- lidariedade Mecânica = Divisão sexual do trabalho = baixa diferenciação social = consciência individual é quase inexisten- te = não ocorre o processo de individua- ção. Sociedades complexas = Solidarie- dade Orgânica = Divisão social do traba- lho = diferenciação social = processo de individuação = os indivíduos são autôno- mos nas suas ações. pensar que andamos dentro de um ônibus (ambiente fechado) cheio de pessoas desconhecidas e sendo diri- gido igualmente por um estranho? Por que não ficamos apavorados com essa situação? A resposta está na consciência coletiva: todos ali, normalmente, respeitam uns aos outros, assim como o motorista presa pela sua vida e dos demais. Tarefa difícil é identificar se uma dada consciência é realmente pessoal e não fruto da consciência coleti- va. Muitas vezes achamos que se trata de uma vontade pessoal, ou consciência particular, quando na verdade é parte da consciência coletiva que já está coercitiva- mente “entranhado” em nossas consciências. Para Durkheim, a consciência coletiva independe do indivíduo. Ela existe antes do individuo e influencia esse em sua formação de consciência. Para esse sociólogo, a conformidade das consciências particulares à consci- ência coletiva que possibilita a vida em sociedade. Ima- gine se a consciência coletiva não estivesse bem posta dentro do ônibus? Nesse caso: Motorista, vou descer agora! Por Cristiano Bodart http://www.cafecomsociologia.com/2013/01/o-que-e-cons- ciencia-coletiva-e.html, acesso em dezembro de 2015. A partir das colaborações dadas por Émile Durkheim aos estudos em torno da sociedade, as ciências humanas passaram a se preocupar em compreender como é possível os homens vi- verem em sociedade. Durkheim buscando responder tal questão desenvolveu os conceitos de “consciência coletiva” e “consci- ência particular”. O conceito de consciência particular estaria ligado as crenças e aos sentimentos pessoais, que nos tor- nam indivíduos únicos; nos possibilitando termos perso- nalidade própria. Já o conceito de consciência coletiva seria o conjunto de crenças e sentimentos comuns aos membros de uma sociedade. Tal consciência, adquiri- mos por meio do processo de socialização. Eu, por exemplo, posso não gostar da cor amarela ou de música Funk; essa seria minha consciência par- ticular. Acreditar que eu devo obedecer às regras da escola já é fruto de minha consciência coletiva. A cons- ciência coletiva é marcada pela conformidade de maior parte dos membros da sociedade, a qual a defende como verdadeira, correta, e/ou bela, etc. Já parou para PARA SABER MAIS O que é Consciência Coletiva e Consciência Particular? 26 Filósofo social e economista alemão contribuiu muito para o desenvolvimento da Sociologia. Marx teve como objetivo analisar o funcionamento do capi- talismo e prever sua evolução. Enquanto o positivismo se preocupa com a manutenção da ordem capitalista, o marxismo elabora uma crítica radical ao capitalismo, evidenciando seus antagonismos e suas contradições. Segundo Marx, para viverem, os seres humanos precisam transformar a natureza: comer, construir abri- gos, produzir utensílios. Por essa razão o estudo de qualquer sociedade deveria partir das relações que se estabelecem para utilizar os meios de produção e transformar a natureza. Esse tipo de relação Marx chamou de relações sociais de produção (escravidão, servidão, trabalho assalariado), que constituem a base de toda a estrutura social. O ponto de vista de Marx baseia-se naquilo que chamamos de concepção materialista da história. Segundo essa visão, não são as ideias ou os valores que os seres humanos detêm que são as principais fontes de mudanças sociais; ao invés disso, as mudan- ças sociais são primordialmente induzidas por influên- cias econômicas. Marx compara a sociedade a um edifício em que a base é a produção econômica, assim, ele a divide em infraestrutura e superestrutura. A infraestrutura é a estrutura econômica, formada das relações de produ- ção e forças produtivas (incluem o próprio homem, na qualidade de produtor, e os meios materiais e intelec- tuais de que necessita para produzir). A superestrutura divide-se em dois níveis: o primeiro, a estrutura jurídi- co-política, é formado pelas normas e leis que corres- pondem à sistematização das relações já existentes; o segundo, a estrutura ideológica (filosofia, arte, religião etc), justificativa do real, é formada por um conjunto de ideias de determinada classe social que, através de sua ideologia, defende seus interesses. (LAKATOS, 1990, p. 45). Assim, nenhuma ideia brotaria do nada, da sim- ples imaginação fértil de alguns homens. Segundo Marx, “os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem e sim sob àquelas condições materiais com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado”. Para ele, a sociedade é produto da ação recíproca dos homens, que não po- dem eleger uma forma social. É o nível do desenvolvi- mento das forças produtivas que determina as formas de comércio e consumo; e dessas formas de comércio e consumo deriva uma determinada forma de organi- zação social. Nesse sentido, Marx argumenta que os homens não escolhem suas forças produtivas, estas são criadas pela atividade anterior, e os homens as en- contram já estabelecidas. Todas as ideias e ideais que surgiram ao longo da história se explicam pelo tipo de sociedade que as produziu. Marx proclama a inexistência da igualdade natu- ral. Para ele, as desigualdades sociais são provocadas pelas relações de produção do sistema capitalista, as quais dividem os homens em dois grupos: Proprietá- rios e não proprietários dos meios de produção. As desigualdades são à base da formação das classes sociais. Há uma relação de exploração entre os proprietários (burguesia) e os trabalhadores (proletariado) que gera o conflito entre essas duas classes sociais. O conflito dá-se pela oposição e an- tagonismo entre os interesses inconciliáveis das clas- ses sociais. O capitalista deseja manter seu direito à propriedade dos meios de produção, à comercializa- ção dos produtos e à exploração do trabalho operário. Pode reduzir salários e ampliar a jornada de trabalho. De outro lado, o trabalhador procura diminuir os efeitos da exploração ao lutar por menores jornadas de traba- lho, melhores salários e participação nos lucros. A história da humanidade é, para Marx, a história da luta de classes, uma luta constante entre interesses opostos, embora nem sempre se manifeste socialmen- te sob forma de guerra declarada, há as divergências, oposições e antagonismos de classes que estão sub- jacentes a toda relação social, desde o surgimento da propriedade privada. Figura 6: Karl Marx. 2.3 KARL MARX (1818 – 1883) Fonte: Pixabay imagens livres. 27 Economicamente, o capitalismo alienou, isto é, separou o trabalhador dos seus meios de produção (as ferramentas, as matérias-primas, a terra e as má- quinas), que se tornaram propriedade privada do ca- pitalista. Sendo assim o trabalhador perdeu ainda o controle do produto de seu trabalho que também foi apropriado pelo capitalista. Essa é à base da alienação econômica do homem sob o capital. Politicamente, também o homem se alienou, pois o Estado perdeu a imparcialidade de representar toda a sociedade. O Estado representa apenas a classe do- minante e age conformeo interesse desta. Até a filo- sofia foi afetada pela alienação. Diz Marx que a divisão social do trabalho fez com que a filosofia se tornasse a atividade social de um determinado grupo. Portanto ela é parcial e reflete o pensamento de um único grupo. 2.4 MAX WEBER (1864 – 1920) Weber não pode ser simplesmente rotulado como sociólogo, seus interesses e preocupações cobriam muitas áreas como Economia, Direito, Filosofia, Histó- ria, além da Sociologia. Nascido na Alemanha - defen- dia um tipo de abordagem no estudo da sociedade que o distinguia dos demais fundadores da Sociologia, pois argumentava que os fenômenos sociais têm como cau- sa as ações individuais dotadas de sentido. Uma con- duta com sentido é aquela ação que o agente realiza tendo como referência a ação de outro agente social. Segundo Weber a motivação e as ideias humanas eram forças por trás da mudança, ou seja, ideias, va- lores e opiniões tinham o poder de causar transforma- ções. Nesse sentido, os indivíduos têm a capacidade de agir livremente e moldar o futuro. Ao contrário de Durkheim e Marx, que acreditavam que as estruturas existiam fora ou independentemente dos indivíduos, Weber dizia que as estruturas da socie- dade eram formadas por uma complexa inter-relação de ações. Para ele, é trabalho da Sociologia entender Fonte: Pixabay imagens livres. Figura 7: Karl Marx. também um valor a mais, um valor excedente sem con- trapartida, denominado por Marx de mais-valia. Para Marx a mais-valia é dividida entre Absoluta e Relativa. Produção de mais-valia absoluta é um modo de incrementar a produção do excedente a ser apro- priado pelo capitalista. Consiste na intensificação do ritmo de trabalho, através de uma série de controles impostos aos operários, que incluem da mais severa vigilância a todos os seus atos na unidade produtiva até a cronometragem e determinação dos movimentos necessários à realização das suas tarefas. O capitalista obriga o trabalhador a trabalhar a um ritmo tal que, sem alterar a duração da jornada, produzem mais mercado- rias e mais valor. Fonte:http://economidiando.blogspot.com.br/2011/06/marx- -mais-valia-absoluta-e-relativa.html Acesso em dezembro de 2015. Mais-Valia é um conceito fundamental da economia po- lítica marxista, que consiste no valor do trabalho não pago ao trabalhador, isto é, na explora- ção exercida pelos capitalistas sobre seus assalariados. Marx, assim como Adam Smith e Da- vid Ricardo, considerava que o valor de toda a mercadoria é determinado pela quantidade de trabalho socialmente necessário para produzi-la. Sendo a força de trabalho uma mercadoria cujo valor é deter- minado pelos meios de vida necessários à subsistência do trabalhador (alimentos, roupas, moradia, transporte, etc.), se este trabalhador trabalhar além de um deter- minado número de horas, estará gerando não apenas valor correspondente ao de sua força de trabalho (que lhe é pago pelo capitalista na forma de salário), mas PARA SABER MAIS O que é Consciência Coletiva e Consciência Particular? 28 os significados por trás dessas ações assim a discipli- na assume um papel interpretativo e não apenas des- critivo. Para Weber não basta descrever as atitudes e relações estabelecidas entre os indivíduos em socie- dade, mas é necessário também interpretar o sentido que as pessoas atribuem às próprias atitudes. Por ação social, Weber entendia uma modalidade de conduta dotada de sentido e voltada para a ação de outras pessoas. Porém, nem toda ação constitui uma ação social. Por exemplo, não pode ser considerada uma ação social o fato de duas pessoas se cruzarem na rua. Para tanto seria necessário que elas se cum- primentassem, conversassem ou entrassem em confli- to, ou seja, atos com significados próprios. Constituem exemplos de ações sociais, um jogo de futebol, uma greve, uma aula, um ato religioso, etc. Um elemento importante na perspectiva socioló- gica de Weber foi a ideia de tipo ideal. Os tipos ideais são modelos conceituais ou analíticos que podem ser usados para se entender o mundo. No mundo real, os tipos ideais raramente, ou nunca, existem, muitas ve- zes, apenas alguns atributos estão presentes. Todavia, essas construções hipotéticas podem ser muito provei- tosas, pois é possível entender qualquer situação do mundo real comparando-a com um tipo ideal. Dessa forma, os tipos ideais servem como um ponto de refe- rência fixo. É importante mostrar que, com o tipo ”ide- al”, Weber não queria dizer que a concepção era um objetivo perfeito ou desejável. Ao invés disso, Weber queria dizer que era uma forma “pura” de um certo fe- nômeno. Weber estabeleceu quatro tipos de ação so- cial: - Ação tradicional: aquela determinada por um costume ou um hábito; - Ação afetiva: aquela determinada por afetos; - Racional com relação a valores: determinada pela crença consciente num valor considerado importante, independentemente do êxito desse valor na realidade; - Racional com relação a fins: determinada pelo cálculo racional que não analisa e organiza os meios necessários. Vejamos, com um exemplo, como essas diferen- tes categorias podem ajudar a compreender melhor as ações sociais. Pensemos agora em um consumi- dor que vai comprar um par de tênis em uma loja. Sua ação é uma ação social, pois o ato de comprar alguma coisa é significativo. O indivíduo escolhe o objeto que irá comprar orientando-se pela ação de outros con- sumidores. O problema é como o consumidor orienta sua ação na compra do tênis. Ele pode comprar o mo- delo de que mais goste, ou seja, aquele que emocio- nalmente é levado a escolher. Neste caso temos uma ação afetiva. Ele pode adquirir um tênis que tradicio- nalmente compra e que todos os membros de sua fa- mília também são acostumados a comprar. Então sua ação será tradicional. Em uma terceira possibilidade, ele pode comprar um tênis pelo valor que ele atribui a uma determinada marca. Aqui, ele toma a marca do tê- nis como o valor, independentemente de especulações acerca da utilidade ou do preço do artigo. Sua ação será, então, racional com relação a valores: a marca é vista como um valor absoluto que orienta sua ação. E, finalmente, poderá comprar o tênis que estiver mais de acordo com o fim proposto. Se vai jogar vôlei, procura- rá o tênis mais adequado para esse esporte. Aqui ele está agindo racionalmente com respeito a fins. Quando a realidade concreta é estudada desta forma, torna-se possível estabelecer relações causais entre seus elementos. Sua obra “A ética protestante e o espírito do capitalismo” permite verificar esta relação. Por espírito, o autor entendia um sistema de máximas de comportamento humano. Estudando as socieda- des capitalistas ocidentais e depois confrontando seus dados com estudos realizados na China e na Índia, Weber chegou à conclusão de que o surgimento do capitalismo não é automaticamente assegurado só por condições econômicas específicas; deve haver pelo menos uma segunda condição. Essa condição deve pertencer ao mundo do interior do homem, isto é, exis- te forçosamente um poder motivador específico, qual seja, a aceitação psicológica de ideias e valores favo- ráveis a essa transformação. (LAKATOS, 1990, p.50). Anotações _________________________________________ _________________________________________ _________________________________________ _________________________________________ _________________________________________ _________________________________________ _________________________________________ _________________________________________ _________________________________________ _________________________________________ 29 VOCÊ APRENDEU QUE: - Apesar de haver outros autores importantes, os clássicos da Sociologia são August Comte, Émile Durkheim,Karl Marx e Max Weber. - A Sociologia de Comte, chamada de Positivismo, afirmava que toda vida humana obe- decia às mesmas fases históricas distintas e ao compreender os fundamentos desse pro- gresso, poderia prescrever os remédios para os problemas de ordem social. - A Sociologia de Durkheim pode ser considerada estruturalista e funcionalista na medida em que para ele a sociedade atua sobre os indivíduos, moldando-os, e esses indivíduos desenvolvem funções profissionais cada vez mais especializadas, intensificando os laços sociais. - Segundo Karl Marx, a sociedade é o resultado da luta entre classes sociais opostas, capazes de transformar, com base nessa luta social, a realidade vivida. - Para Max Weber, a Sociologia tem como base a compreensão da ação individual. Segundo ele a objetividade da Sociologia está na ação individual, que é sempre orientada pelas ações de outros indivíduos. abre possibilidades de aprofundamento para novas in- vestigações, pois a partir do momento que o homem se liberta do mundo encantado, ele acaba sendo influen- ciado também por outros meios que o coloca em uma dimensão diferente com a qual acaba sendo preso no- vamente, agora não pelas forças mágicas, mas pelas próprias formas de prisão que o mundo coloca, como: o avanço da tecnologia, a influência da informática, a aproximação das distâncias e o poder num sentido de autoritarismo que podemos perceber quando o ser humano adentra no desejo de dominação do mundo e dele próprio. Assim, o homem precisa buscar ainda mais desen- volver sua capacidade intelectual, pois a medida que o mundo se transforma o ser humano também é trans- formado e desta forma ele precisa sempre está acom- panhando os avanços que o mundo coloca, para que ele não se encontre outras vezes no mundo cheio de encantos e magias, mesmo que este seja voltado para as criações do homem. FIGUEIREDO, Jadismar de Lima. O desencantamento do mundo em Max Weber. www.fescfafic.edu.br, acesso dezembro de 2015. O desencantamento de mundo sur- giu a partir da racionalização em que foi retirada do homem toda uma cren- dice de aceitar a existência de deuses e demônios como seres vivos no meio social, os quais geravam uma diferen- te forma de aceitar as coisas na vida prática do ser humano. Esse processo faz uso cons- tante da Religião, tendo em vista que, esta se tornou um ponto de intermediação entre esses conceitos e as instituições. Para Weber o desencantamento de mundo acontece por uma retirada da vida social das aceitações de deuses e profetas que serviam de guias para as pes- soas. O homem a partir disso torna-se um ser que está designado a viver em um mundo desencantado. O desencantamento se dá na desvalorização de seres abstratos, espirituais e misteriosos para a con- cretude de objetos ou atitudes vividas no presente. É interessante observar que as crianças têm um interesse enorme pelas coisas celestes; a lua, as estrelas e tan- tos outros. Na medida em que ela cresce se desapega desses seres e começa a valorizar mais o que está ao seu redor. O capitalismo, por exemplo, tem influencia- do muito o homem a querer exercer poder e autoridade sobre as mínimas coisas e com isso ele percebe que nessa dominação há algo que origina inúmeros aconte- cimentos, ou seja, ele esquece um pouco os deuses e os astros que os encantava e começava nesse proces- so de desencantamento. O desencantamento do mundo para Max Weber PARA SABER MAIS O mundo desencantado de Weber 30 SUGESTÕES DE LEITURA: SHIPSIDE Steve. O Capital de Karl Marx. Editora SARAIVA,2011. A obra explica conceitos-chave do modo de produção capitalista, como mais valia, capital constante e capital variável, salário e acumulação primitiva, e analisa temas caros a economistas clássicos. Ainda atual, O Capital não é apenas um livro de economia: continua a fornecer um eficiente ins- trumento para dissipar a maneira fetichista com que os atuais teóricos do neoliberalismo e da pós- -modernidade pretendem encobrir as novas e dramáticas contradições do capitalismo globalizado.. DURKHEIM Émile. Da divisão do Trabalho Social. Editora WMF MARTINS FONTES. 2010. O livro ‘Da divisão do trabalho social’ trata do papel que os agrupamentos profissionais estão desti- nados a desempenhar na organização dos povos contemporâneos. Durkheim se esforça nesta obra para tratar os fatos da vida moral a partir do método das ciências positivas sem, no entanto, seguir o método de ciências positivas como a biologia, a psicologia e a sociologia. WEBER Max. Ensaios de Sociologia. Editora LTC. 1982 Esta obra reúne uma seleção dos escritos fundamentais de Max Weber, o maior sociólogo alemão de seu tempo e figura chave para a compreensão do atual pensamento sociológico mundial. A preocupação maior de Weber foi sempre a de desenvolver seus estudos a partir de uma realidade concreta que servisse de base à teoria sociológica. Mostrou a importância dos valores na vida social e o perigo desses valores se infiltrarem na ciência social. Definiu conceitos analíticos de grande utilidade para a ciência social, como, por exemplo, o de tipo-ideal. FILMES: A Beleza Americana. Direção: Sam Mendes. Produção: DreamWorks SKG, 1999. Lester Burham (Kevin Spacey) não aguenta mais o emprego e se sente impotente perante sua vida. Casado com Carolyn (Annette Bening) e pai da “aborrecente” Jane (Tora Birch), o melhor momento de seu dia quando se masturba no chuveiro. Até que conhece Angela Hayes (Mena Suvari), amiga de Jane. Encantado com sua beleza e disposto a dar a volta por cima, Lester pede demissão e começa a reconstruir sua vida, com a ajuda de seu vizinho Ricky (Wes Bentley). A Revolução dos Bichos. Direção: John Stephenson. Produção: Flashstar, 1999. Os animais moradores da Granja do Solar, cansados dos maus tratos rotineiros, se rebelam contra o dono do local, o beberrão Sr. Jones. Após o expulsarem, os bichos se organizam e instauram no- vas regras, formando uma comunidade democrática, livre do domínio dos humanos. Os inteligentes porcos, no entanto, logo tratam de impor suas ideias e um novo reinado do terror ganha forma. 31 ANOTAÇÕES ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________
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