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III SEMINÁRIO DE DIREITO DO ESTADO “Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania” 05 a 08 de outubro de 2015 Campus de Franca 2020 Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Reitor Prof. Dr. Sandro Roberto Valentini Vice-Reitor Prof. Dr. Sergio Roberto Nobre Pró-Reitor de Pesquisa Prof. Dr. Carlos Frederico de Oliveira Graeff Pró-Reitora de Extensão Universitária Profa. Dra. Cleopatra da Silva Planeta FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS Diretor Prof. Dr. Murilo Gaspardo Vice-Diretora Profa. Dra. Nanci Soares Comissão Editorial UNESP - Câmpus de Franca Presidente Prof. Dr. Murilo Gaspardo Membros Prof. Dr. Agnaldo de Sousa Barbosa Prof. Dr. Alexandre Marques Mendes Profa. Dra. Analúcia Bueno Reis Giometti Profa. Dra. Cirlene Aparecida. Hilário da Silva Oliveira Profa. Dra. Elisabete Maniglia Prof. Dr. Genaro Alvarenga Fonseca Profa. Dra. Helen Barbosa Raiz. Engler Profa. Dra. Hilda Maria Gonçalves da Silva Prof. Dr. Jean Marcel Carvalho França Prof. Dr. José Duarte Neto Profa. Dra. Josiani Julião Alves de Oliveira Prof. Dr. Luis Alexandre Fuccille Profa. Dra. Paula Regina de Jesus Pinsetta Pavarina Prof. Dr. Paulo César Corrêa Borges Prof. Dr. Ricardo Alexandre Ferreira Profa. Dra. Rita de Cássia Aparecida. Biason Profa. Dra. Valéria dos Santos Guimarães Profa. Dra. Vânia de Fátima Martino José Carlos de Oliveira José Duarte Neto Murilo Gaspardo (Organizadores) III SEMINÁRIO DE DIREITO DO ESTADO “Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania” Anais do Evento Câmpus de Franca 2020 © 2020 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA – UNESP Faculdade de Ciências Humanas e Sociais – Franca - Contato Av. Eufrásia Monteiro Petráglia, 900, CEP 14409-160, Jd. Petráglia / Franca – SP publica.franca@unesp.br Diagramação e Revisão Laura Odette Dorta Jardim (DTBD) Sandra Aparecida Cintra Ferreira (STAEPE) Carlos Alberto Bernardes (STAEPE) Adolfo Raphael Silva Mariano de Oliveira Márcio Augusto Garcia - ASS. ADM Lucas Laprano Dana Rocha Silveira Comissão Organizadora Adolfo Raphael Silva Mariano de Oliveira Artur Marchioni Cauê Ramos Andrade Marina Ribeiro da Silva Otávio Augusto Mantovani Silva Frederico Henrique Ramos Cardozo Bonfim Ana Luiza Cruz Ana Luiza de Abreu Paiva Ficha catalográfica elaborada pela Bibliotecária Andreia Beatriz Pereira - CRB8/8773 Organização dos Anais Prof. Dr. Murilo Gaspardo Adolfo Rafael Silva Mariano de Oliveira Coordenação Científica Prof. Dr. Murilo Gaspardo Prof. Dr. José Duarte Neto Prof. Dr. José Carlos de Oliveira Ingrid Juliane dos Santos Ferreira Letícia Rezenda Maria Luisa Rocha Paulo Henrique Reis de Oliveira Rafael Leal Eduardo Salomão Renan Urban Thiago Carvalho Anais do III Seminário de Direito do Estado “Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania” / José Carlos de Oliveira, José Duarte Neto e Murilo Gaspardo (organizadores). – Franca : UNESP – FCHS, 2020. 293 p. ISSN: 2526-0391 1. Direito constitucional. 2. Democracia. 3. Politicas públicas. I. Título. II. Oliveira, José Carlos de. III. Neto, José Duarte. III. Gaspardo, Murilo. CDD – 340 mailto:publica.franca@unesp.br Índices para catálogo sistemático: 1. Estado democrático de direito ............................ 341.201 2. Direito internacional público .............................. 341.1 3. Globalização ....................................................... 338.9 4. Democracia ......................................................... 341.234 PROGRAMAÇÃO DO EVENTO (05 A 08 DE OUTUBRO DE 2015): 05/10 (terça-feira) Local: Anfi teatro I. 19h30 – Abertura 20h –Conferência: “Políticas Públicas Regulatórias Setoriais e os Acordos de Leniência no Processo Administrativo Brasileiro”. Conferencista: Professor Doutor Thiago Marrara - Professor de Direito Administrativo da Universidade de São Paulo (USP-FDRP). Livre-docente (USP). Doutor (Universidade de Munique - LMU). Mediador: Professor Doutor José Carlos de Oliveira (FCHS/UNESP) 06/10 (terça-feira) 9h – Recepção Local: Anfi teatro I. 9h30 –1ª Sessão de Debates com Professores do Departamento de Direito Público da FCHS/UNESP: “Teorias da Constituição e a Cidadania na Dimensão Internacional”. Debatedores: Professor Doutor Murilo Gaspardo (FCHS/UNESP), Professora Regina Laisner (FCHS/UNESP). 11h – Intervalo. 11h30 – 2ª Sessão de Debates com Professores do Departamento de Direito Público da FCHS/UNESP: “Teorias da Constituição e a Cidadania Participativa nas Políticas Públicas” Debatedores: Professora Doutora Elisabete Maniglia (FCHS/UNESP), Professor Doutor José Carlos de Oliveira (FCHS/UNESP), Professor Doutor José Duarte Neto (FCHS/UNESP). 13h – Intervalo 15h/18h – Reuniões de Grupos de Pesquisa Liderados por Professores do Departamento de Direito Público da FCHS/UNESP. 19h – Recepção. Local: Anfi teatro I. 19h30 – Mesa Redonda: “O Ensino de Direito Público na UNESP/Campus de Franca”. Debatedores: Professor Doutor José Carlos de Oliveira (FCHS/UNESP – Coordenador do Conselho de Curso de Graduação em Direito), Professor Doutor José Duarte Neto (FCHS/UNESP – Chefe do Departamento de Direito Público), Professor Doutor Antônio Alberto Machado (FCHS/ UNESP), Discente Eduardo Ferreira Lopes (Representante Discente Titular junto ao Conselho de Curso de Direito), Discente Juliana Simões Casagrande (Membro do CADir e do NEDA – Núcleo de Estudo de Direito Alternativo); Discente Leonardo Morais (Representante Discente Suplente junto ao Departamento de Direito Público). 07/10 (quarta-feira) 8h30 – Recepção Local: Anfi teatro I. 9h/11h –3ª Sessão de Debates com Professores do Departamento de Direito Público da FCHS/UNESP: “Teorias da Constituição e a Tutela e Efetividade dos Direitos da Cidadania”. Debatedores: Professora Doutora Ana Gabriela Mendes Braga (FCHS/ UNESP) e Doutor Fernando Fernandes (FCHS/UNESP). 19h – Recepção. Local: Anfi teatro I. 19h30 – Conferência: “Cidadania e Ensino Religioso na Dimensão Internacional e na Brasileira: as Questões Levantadas pela ADIn 4439/2010 frente ao princípio constitucional da laicidade do Estado”. Conferencista: Professora Doutora Nina Beatriz Stocco Ranieri (Professora de Teoria do Estado da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Doutora e Livre-docente em Direito do Estado (FD/USP). Mediador: Professor Doutor Murilo Gaspardo (FCHS/UNESP). 08/10 (quinta-feira) 13h/17h: Sessões de Apresentação de Trabalhos de Pós-graduação e Iniciação Científi ca. Local: Anfi teatro I, Anfi teatro da Biblioteca, Sala do 1º Ano do Curso de História, Salas de Reuniões dos Departamentos. 19h30 – Recepção. Local: Anfi teatro I. 20h – Conferência: “Teoria Constitucional e Cidadania”. Conferencista: Professor Doutor Roger Stiefelmann Leal (Professor de Direito Constitucional da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Doutor em Direito (FD/USP). Procurador da Fazenda Nacional. Mediador: Professor Doutor José Duarte Neto (FCHS/UNESP) APRESENTAÇÃO Em 2013, o Departamento de Direito Público da FCHS/UNESP organizou seu "I Seminário de Direito do Estado", o qual consistiu em duas mesas de debates com professores convidados de outras instituições e do próprio departamento sobre “Reforma Política nos 25 anos da Constituição Federal de 1988”. Em 2014, nosso segundo Seminário abordou o tema “Novas Perspectivas para a Democracia Brasileira” e, além das conferências e debates, passou a compreender sessões de apresentações de trabalhos de pós-graduação e graduação. Nesta terceira edição do Seminário, o tema escolhido foi “Teorias da Constituição e Novas Concepções de Cidadania”, o qual articula a área de concentração e as linhas de pesquisa do Programa de Pós-graduaçãoem Direito da FCHS/UNESP com questões contemporâneas de grande relevância nos campos do Direito Constitucional, do Direito Administrativo, da Teoria do Estado e da Ciência Política. Assim como na edição anterior, o Seminário abordou a temática de maneira interdisciplinar, reunindo docentes, pesquisadores e estudantes. Em termos metodológicos, procurou-se promover, simultaneamente, o debate sobre a produção científi ca dos professores da própria FCHS/ UNESP, especialmente do Departamento de Direito Público (DDPB) – mas também em interação com outros Departamentos, e o intercâmbio de conhecimentos com outras instituições de ensino e pesquisa, por meio de conferências com professores convidados e apresentação de trabalhos de pesquisa de discentes. Uma inovação desta edição foi a inclusão de um debate sobre o ensino de Direito Público, com a participação de representantes do corpo discente. Ocorreram três conferências com professores convidados: a primeira, proferida pelo Professor Doutor Thiago Marrara (USP-FDRP), abordou o tema "Políticas Públicas Regulatórias Setoriais e os Acordos de Leniência no Processo Administrativo Brasileiro”; a segunda, ministrada pela Professora Doutora Nina Beatriz Stocco Ranieri (FD/USP), trouxe uma abordagem sobre "Cidadania e Ensino Religioso na Dimensão Internacional e na Brasileira: as Questões Levantadas pela ADIn 4439/2010 frente ao princípio constitucional da laicidade do Estado"; e a terceira, proferida pelo Professor Doutor Roger Stiefelmann Leal(FD/USP) teve como tema “Teoria Constitucional e Cidadania”. Todas elas foram seguidas de debates com o público presente, mediados por professores da FCHS/UNESP. As três sessões de debates com professores da FCHS/UNESP abordaram os seguintes temas: “Teorias da Constituição e a Cidadania na Dimensão Internacional” (Professores Doutores Murilo Gaspardo e Professora Regina Laisner); “Teorias da Constituição e a Cidadania Participativa nas Políticas Públicas” (Professores Doutores Elisabete Maniglia, José Carlos de Oliveira e José Duarte Neto); e “Teorias da Constituição e a Tutela e Efetividade dos Direitos da Cidadania” (Professores Doutores Ana Gabriela Mendes Braga e Fernando Fernandes). O seminário também compreendeu sessões de comunicações orais nas quais foram apresentados onze trabalhos de pós-graduação e sete trabalhos de iniciação científi ca, os quais compõem estes Anais, divididos em três eixos temáticos: Teorias da Constituição e a Cidadania na Dimensão Internacional; Teorias da Constituição e a Cidadania Participativa nas Políticas Públicas; e Teorias da Constituição e a Tutela e Efetividade dos Direitos da Cidadania – também articuladas com as linhas de pesquisa do Programa de Pós-graduação em Direito da FCHS/UNESP. Registramos, por fi m, nossos agradecimentos a todos os que colaboraram com a organização do Seminário, especialmente a: Direção da FCHS/UNESP e membros do Conselho de Departamento, que viabilizaram os recursos necessários para custear a vinda dos conferencistas externos à FCHS; todos os servidores técnico-administrativos da FCHS/UNESP, especialmente o assessor do DDPB, Márcio Augusto Garcia; e aos discentes membros da Comissão Organizadora, sobretudo àqueles que se dedicaram à publicação destes anais. Esperamos que a leitura desses Anais seja útil para o aprofundamento do debate acadêmico sobre “Teorias da Constituição e Novas Concepções de Cidadania”. Professor Doutor Murilo Gaspardo Departamento de Direito Público FCHS/UNESP – Campus de Franca – SP SUMÁRIO TRABALHOS DE PÓS-GRADUAÇÃO EIXO 1: TEORIAS DA CONSTITUIÇÃO E A CIDADANIA NA DIMENSÃO INTERNACIONAL APARATOS NORMATIVO E INSTITUCIONAL DA UNASUL E A (IN)VIABILIDADE DE UMA INTEGRAÇÃO DEMOCRÁTICA Alfredo Minuci Lugato ............................................................................19 CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS: ACESSO À SUA FUNÇÃO JURISDICIONAL E IMPLEMENTAÇÃO DA CIDADANIA EM ÂMBITO INTERNACIONAL Guilherme Pinho Ribeiro Marina Ribeiro da Silva ...........................................................................29 PRESIDÊNCIA DEMOCRÁTICA – GOVERNANÇA; DESENVOLVIMENTO HUMANO NA AMÉRICA LATINA Suelen Otrenti ..........................................................................................43 EIXO 2: TEORIAS DA CONSTITUIÇÃO E A CIDADANIA PARTICIPATIVA NAS POLÍTICAS PÚBLICAS A PARTICIPAÇÃO POPULAR NO COMBATE À CORRUPÇÃO Augusto Martinez Perez Filho .................................................................55 A PARTICIPAÇÃO CIDADÃ NOS SERVIÇOS PÚBLICOS DE SANEAMENTO BÁSICO Christopher Abreu Ravagnani José Carlos de Oliveira ............................................................................65 DEMOCRACIA E CONSTITUCIONALISMO, POLÍTICAS PÚBLICAS E DIREITOS SOCIAIS: A CONTRIBUIÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO PARA A PROMOÇÃO DE UMA JUSTIÇA DISTRIBUTIVA Renan Lucas Dutra Urban ........................................................................77 EIXO 3: TEORIAS DA CONSTITUIÇÃO E A TUTELA E EFETIVIDADE DOS DIREITOS DA CIDADANIA DIREITOS HUMANOS, CIDADANIA E ESTADO CAPITALISTA: AS CONTRADIÇÕES E LIMITES DA LINGUAGEM DOS DIREITOS SOCIAIS COMO ESTRATÉGIA DE LUTA PARA A EMANCIPAÇÃO HUMANA Cauê Ramos de Andrade Stéfanie dos Santos Spezamiglio .............................................................97 CONSTITUIÇÃO FEDERAL E AUTONOMIA DO DIREITO: A PRESERVAÇÃO DA INTEGRIDADE DO DIREITO EM CONTEXTOS DE INSTABILIDADE POLÍTICO-ECONÔMICA Guilherme Bollini Polycarpo Felipe Rodrigues Xavier Lucas Jonas Fernandes ...........................................................................113 PRESTAÇÃO JURISDICIONAL E CIDADANIA: O CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA E A ACCOUNTABILITY HORIZONTAL Marina Ribeiro da Silva Guilherme Pinho Ribeiro .......................................................................129 O PAPEL DO DIREITO NA CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA: SOBRE COMO A TEORIA CONSTITUCIONAL SUBSTANCIALISTA AUXILIA NA REALIZAÇÃO DOS DIREITOS DE CIDADANIA NA PERSPECTIVA DOS EXCLUÍDOS DO PROCESSO POLÍTICO TRADICIONAL Henrique Duz Hass ................................................................................141 O MUNICÍPIO COMPETENTE PARA A COBRANÇA DO IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS (ISS) NO CASO DO ARRENDAMENTO MERCANTIL EA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DIANTE O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Luciana Campanelli Romeu ...................................................................157 TRABALHOS DE GRADUAÇÃO EIXO 1: TEORIAS DA CONSTITUIÇÃO E A CIDADANIA NA DIMENSÃO INTERNACIONAL A CIDADANIA PARTICIPATIVA NA DIMENSÃO INTERNACIONAL: O PAPEL DA AMÉRICA LATINA ENQUANTO AGENTE POLÍTICO NA GOVERNANÇA GLOBAL Jackeline Ferreira da Costa ....................................................................175 A EXIGÊNCIA DO EXERCÍCIO DA CIDADANIA NO CONTEXTO DA GLOBALIZAÇÃO E A DETERIORAÇÃO DESSE EXERCÍCIO PELOS CIDADÃOS DA UNIÃO EUROPEIA FRENTE À CRISE ECONÔMICA Laura Rizzo Renan Fernandes Duarte ........................................................................185 O CONSTITUCIONALISMO GARANTISTA E A EMERGÊNCIA DE UM NOVO PARADIGMA: DIÁLOGO ENTRE O PENSAMENTO DE BOAVENTURA DE SOUZA SANTOS E LUIGI FERRAJOLI PARA O ALCANCE DE UMA CIDADANIA INTERNACIONAL 195 Raquel Gutierrez de Azevedo Victor Siqueira Serra ..............................................................................199 EIXO 2: TEORIAS DA CONSTITUIÇÃO E A CIDADANIA PARTICIPATIVA NAS POLÍTICAS PÚBLICAS A JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E O CONTROLE JUDICIAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS: CONTRIBUTOS DO MODELO DE SOCIEDADE ABERTA DOS INTÉRPRETES DA CONSTITUIÇÃO Ana Cristina Alves de Paula Edilberto Marassi Basílio Silveira Júnior ..............................................213 EIXO 3: TEORIAS DA CONSTITUIÇÃO E A TUTELA E EFETIVIDADE DOS DIREITOS DA CIDADANIA A CRISE DO ESTADO DEMOCRÁTICO E A EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS DO CIDADÃO Adolfo Raphael Silva Mariano de Oliveira Dana Rocha Silveira ..............................................................................235LIBERDADE DE EXPRESSÃO RELIGIOSA E DISCURSO DO ÓDIO HOMOFÓBICO Jéssica Costa ..........................................................................................253 DESDOBRAMENTOS DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E PROTEÇÃO DEFICIENTE DO ESTADO Renata Canevaroli de Souza ..................................................................267 AS “CLÁUSULAS PÉTREAS” APLICADAS AOS DIREITOS SOCIAIS FUNDAMENTAIS: UMA DEFESA DA CIDADANIA NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO Tiago Fernando Guedes de Carvalho .....................................................283 TRABALHOS DE PÓS-GRADUAÇÃO EIXO 1: TEORIAS DA CONSTITUIÇÃO E A CIDADANIA NA DIMENSÃO INTERNACIONAL Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 19 APARATOS NORMATIVO E INSTITUCIONAL DA UNASUL E A (IN)VIABILIDADE DE UMA INTEGRAÇÃO DEMOCRÁTICA Alfredo Minuci Lugato*1 INTRODUÇÃO O presente trabalho justifi ca-se pela importância de uma iniciativa que emerge da vontade de todos os países de um subcontinente, que poderá construir, sob o prisma da cooperação e da integração, novos mecanismos para seu desenvolvimento, e pela análise crítica da institucionalidade e dos procedimentos que providenciarão ou impedirão a consecução de tão auspiciosos objetivos. O objetivo principal é a investigação dos motivos que (in) viabilizam uma integração democrática a partir dos aparatos normativo e institucional da UNASUL. Para tanto, busca analisar como a democracia se desenvolve diante das diferentes esferas decisórias que transcendem a soberania do Estado. Estuda, também, os objetivos da UNASUL na busca de uma integração que corrobore em desenvolvimento socioeconômico e na construção de uma cidadania sul-americana. Fundada por seu Tratado Constitutivo em 2008, a União de Nações Sul-Americanas (UNASUL) é mais uma iniciativa de integração regional no seio da América do Sul. Sua gama de objetivos que transcendem fi ns comerciais e sua composição por todos os países do subcontinente, entretanto, distinguem-na dos outros blocos. Todavia, sua confi guração institucional precária gera desconfi ança sobre seu sucesso em concretizar suas aspirações. (BARALDI, VENTURA, 2008, p. 14). Diante disso, questiona-se: os aparatos normativo e institucional da UNASUL viabilizam uma integração democrática? Para desenvolver a problemática, inicialmente serão abordadas as limitações da soberania dos Estados no mundo contemporâneo, assim como a convivência destes com atores transnacionais, para então discutir o ideário democrático frente as novas esferas decisórias e como a UNASUL pretende gerar desenvolvimento nos países-membros através da integração. Bacharel em Direito pela Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”. Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 20 A abordagem será multidisciplinar, pois a Teoria do Estado e a Ciência Política fornecerão conceitos e premissas basilares para o desenvolvimento do presente trabalho. Será adotado o método dialético para compreender a institucionalidade e os procedimentos da UNASUL perante as ideias bases de democracia, forjadas para o Estado-Nação. Por fi m, buscar-se-á nas experiências da União Europeia, do MERCOSUL e da CAN, elementos empíricos para comparações com as instituições e procedimentos da UNASUL. 1 O MUNDO GLOBALIZADO CONTEMPORÂNEO, AS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS E A DEMOCRACIA A primeira noção de soberania estatal pertence ao francês Jean Bodin que, em 1576 (GUIMARÃES, 2013), em um contexto de consolidação dos Estados Nacionais na Europa sob a forma de absolutismo monárquico, atribui a ideia de “poder absoluto e perpétuo”. Para o autor francês, a soberania consiste no direito de: 1. Dar leis a todos e a cada um em particular; 2. Declarar a guerra e negociar a paz; 3. Nomear os principais magistrados e funcionários; 4. Decidir em última instância e de conceder a graça aos condenados; 5. Cunhar moedas e de estabelecer pesos e medidas; e 6. Gravar os súditos com impostos e contribuições. (LEWANDOWSKI, 1997, p. 235). Após o Tratado de Paz de Vestefália, datado de 1648, que encerra a Guerra dos 30 anos, redefi ne as fronteiras e visa estabelecer a paz entre os Estados europeus, passa-se a compreender a soberania como um poder de duas vertentes: a soberania interna, no sentido de supremacia, e a soberania externa, sinônimo de independência (LEWANDOWSKI, 1997, p. 235). Tal concepção, que prevalece nos séculos seguintes e demonstra uma comunidade internacional incipiente, perpassa pela Santa Aliança e pelo Concerto Europeu, “culmina na Sociedade das Nações e esgota-se na Segunda Guerra Mundial”. (GUIMARÃES, 2013, p. 103). Pois, no cenário pós-guerra, constata-se uma Europa horrorizada e abarrotada por prejuízos humanos e materiais de proporções até então desconhecidas (JEDLICK, 2011, p. 42), e o mundo perplexo com o potencial destrutivo das armas nucleares empregadas. Tal panorama cristaliza a necessidade de dar efetividade ao direito internacional público, por meio de instituições capazes de prover em escala mundial a paz e Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 21 os direitos humanos. (GUIMARÃES, 2013, p. 105). Nessa perspectiva, surge, em 1945, a Organização das Nações Unidas (ONU). Da mesma forma, países europeus ocidentais, atentos ao que ocorria do outro lado da “Cortina de ferro”, buscaram na integração o alicerce para a reconstrução. Em 1948, foi criada a Organização Europeia de Cooperação Econômica. No ano seguinte, foram fundados o Conselho da Europa e o Tratado do Atlântico Norte (com participação estadunidense). Em 1951, foi criada, pelo Tratado de Paris, a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA), “a primeira instituição europeia com um objetivo de integração”1, que foi concebida com traços de supranacionalidade: isto é, uma Alta Autoridade independente dos governos nacionais e uma Corte de Justiça que, nos anos posteriores, consagrava o princípio da primazia do direito europeu sobre os ordenamentos nacionais (JEDLICK, 2011, p. 42-43). Após o maior confl ito bélico da história, os Estados Unidos da América emergem como a maior potência econômica e política do globo. Sob sua liderança e com o apoio do Reino Unido, passou-se a discutir a reestruturação “do sistema internacional de controle das relações monetárias e comerciais internacionais”. (PINHEIRO, 2009, p. 34). Nessa toada, os EUA convocaram 44 países para uma conferência internacional na cidade de Bretton Woods, que culminou em negociações que resultaram na constituição do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial. (PINHEIRO, 2009, p. 35-36). Tais instituições, cuja governança foi estruturada para garantir uma liberalização do mercado, atendendo aos anseios dos EUA, em detrimento de uma dinâmica democrática, foram fundamentais na coordenação da globalização fi nanceira neoliberal das décadas de 70 e 80, caracterizada pela “integração sistêmica da economia em nível supranacional” e pela “ampliação das redes empresariais, comerciais e fi nanceiras em escala mundial”, que ao transcenderem as fronteiras, impossibilitaram controle político efetivo pelos Estados. (FARIA, 2002, p. 52). Dessa maneira, os Estados nacionais passam a não ter mais pleno controle sobre questões da esfera econômica, como sua política monetária e fi scal. Além de ter que buscar junto à comunidade internacional soluções para enfrentar problemas como epidemias globais, tráfi co de armamentos, crises migratórias e o aquecimento global. Nesse sentido, o Estado moderno está cada vez mais inserido em redes de interligações regionais e globais, permeadas por forças intergovernamentais e transnacionais quase 1 No original: “la primera institución europea con un objetivo de integracion”.(Tradução livre). Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 22 supranacionais, e impossibilitado de decidir seu próprio destino. (HELD, MCGREW, 2005, p. 35-36). Portanto, o “Estado não detém a exclusividade da tomada e concretização das decisões que afetam a coletividade”. (GASPARDO, 2015, p. 102). Assim, Clève (2006, p. 321), argumenta que o Estado se vê diante de um “paradoxo”, “já que a defesa da soberania não se faz apenas desde dentro; faz-se, agora, também, a partir de medidas tomadas no contexto da comunidade internacional”. Evidencia-se, então, uma limitação da ideia de Estado soberano. Com o fenômeno da globalização, as estruturas institucionais, organizacionais, políticas e jurídicas forjadas desde os séculos XVII e XVIII tendem a perder tanto sua centralidade quanto sua exclusividade. (...) Com isso, as intervenções regulatórias, os mecanismos de controle e direção socioeconômicos e as concepções de ‘segurança nacional’ que instrumentalizaram as estratégias de planejamento entre o pós-guerra e os anos 70 perdem vigor e efetividade. (FARIA, 2002, p. 32). Por outro lado, salienta-se que o Estado sempre conviveu com questões que transcendiam suas competências, como as ecológicas e nucleares. Porém, nota-se o crescimento dessas questões com o aumento da circulação de capitais, bens e pessoas em nível global, propiciados pelas revoluções tecnológicas. Nesse panorama, as organizações internacionais são instrumentos que possibilitam que os Estados canalizem suas demandas para uma esfera decisória que tenha efi cácia, seja em nível de governança interestatal, regional ou global. Sendo que, “em muitos casos o nível regional pode emergir como o mais apropriado nível de governança”.2 (ARCHIBUGI, 2004, p. 449). Nesse ponto, exsurge uma questão fundamental: como podem essas organizações internacionais conduzir assuntos que afetam diretamente o Estado e seus cidadãos de modo legítimo? O problema é corolário da ideia de democracia, que foi concebida como regime a ser exercido pelo Estado-Nação. (GASPARDO, 2015, p. 107). Reconhecidamente cético em relação a sistemas democráticos nas organizações internacionais, Dahl (1999, p. 20) assevera que qualquer tipo de governo dessas fi cará aquém do sistema de controle popular sobre as políticas e decisões governamentais próprio da democracia estatal. Em outro extremo, Moravcsick (2005, p. 225) defende a legitimidade das instituições e mecanismos da União Europeia. 2 No original: “In many cases the regional level might emerge as the most appropriate level of governance”. (Tradução livre). Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 23 Keohane e Nye Jr (2001, p. 236) argumentam que a base da legitimidade das democracias estatais está na boa articulação dos inputs políticos, e que estes são muito enfraquecidos no cenário internacional. As ideias de inputs, accountability e controle popular, assim como a de segurança jurídica, serão fundamentais na análise da legitimidade da estrutura institucional e dos procedimentos da UNASUL. 2 UNIÃO DE NAÇÕES SUL-AMERICANAS (UNASUL): UMA NOVA CONCEPÇÃO DE INTEGRAÇÃO NA AMÉRICA DO SUL A UNASUL não é o primeiro bloco regional do subcontinente. O Mercado Comum do Sul (MERCOSUL) e a Comunidade Andina de Nações (CAN) são organizações que visam a integração de fi ns econômicos entre seus países e que passam por difi culdades, muitas delas frutos de suas institucionalidades. O primeiro, que visava a constituição de um Mercado Comum, consiste numa união imperfeita; a segunda, que buscava a consolidação de uma união aduaneira, se estabeleceu como uma zona de livre comércio. (SARAIVA, 2011, p. 9). “Apoiadas na história compartilhada e solidária” de suas nações (UNASUL, 2008), a UNASUL sonha com “a consolidação de uma identidade e a criação de uma cidadania sul-americana”. (BARALDI, VENTURA, 2008, p. 15). De fato, a integração do subcontinente, dominado pelo imperialismo econômico e cultural estadunidense, deve almejar voos altos. Para tanto, destaca-se, aqui, a exclusão de outros países latinos da América, infl uenciados ainda mais pelos Estados Unidos, como o México, embora estes possam ser integrados posteriormente ao bloco. (UNASUL, 2008). Nesse sentido, a UNASUL destaca-se por suas aspirações em concretizar direitos humanos diversos e viabilizar uma infraestrutura que propicie desenvolvimento socioeconômico. Objetiva erradicar a pobreza e o analfabetismo e garantir a seguridade social universal, assim como uma “integração energética” e “cooperação em matéria de migração”, entre outros muitos anseios, além de uma “integração fi nanceira”. (UNASUL, 2008). A pauta diversifi cada “que rompe a tradição comercial dos acordos subcontinentais” (BARALDI, VENTURA, 2008, p. 14) é audaciosa para países semiperiféricos, e fruto de governos identifi cados com a esquerda. Além do mais, são nítidas questões que necessitam de cooperação regional: Bacia do Prata, Aquífero Guarani, Floresta Amazônica, políticas de defesa Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 24 e segurança, controle de doenças como a aftosa e gargalos na infraestrutura que atrapalham as exportações são alguns exemplos que podem ser citados. A variedade de metas poderá permitir que algumas delas sejam mais fáceis de serem negociadas: por exemplo, garantir direitos básicos de saúde e acesso universal à educação a seus habitantes é desejo de todos. Em contrapartida, temas como “integração fi nanceira, industrial e produtiva” (UNASUL, 2008) exigirão um esforço maior e instituições aptas para sua implementação, através de procedimentos normativos legítimos e efi cazes. 3 ESTRUTURAS NORMATIVAS E INSTITUCIONAL DA UNASUL: UM INTEGRACIONISMO DEMOCRÁTICO? A UNASUL adotou um modelo intergovernamental de integração; isto é, seu órgão máximo, que decidirá os rumos do bloco, é o Conselho de Chefas e Chefes de Estado e de Governo. (UNASUL, 2008). Tal opção pode ser compreendida se contextualizada pela forte tradição presidencialista presente no subcontinente e pelo temor em delegar competências a órgãos supranacionais, que seriam compostos por países de assimetrias econômicas enormes. Entretanto, a ausência de instituições supranacionais implica que a efi cácia das decisões dependerá de cada um dos Estados-membros. Assim, a necessidade de cada país incorporar ao seu ordenamento jurídico as deliberações do bloco cria grande insegurança jurídica e pode engessar a integração. Além do mais, a primazia dos governos nacionais na condução do bloco, em detrimento de instituições autônomas, leva a outra questão, que é apontada por Archibugi (2004, p. 441): “Estados democráticos não necessariamente aplicam em sua política externa os mesmos princípios e valores em que seus sistemas internos são construídos”.3 Outro problema de se ter como instância máxima o conjunto de chefes dos executivos é que esse órgão não terá representação das diversas forças políticas de cada país, contrariando o ideal democrático “do confl ito de interesses e da disputa equilibrada entre as partes, em termos de poder, e na possibilidade de controle e contestações de decisões tomadas.” (MARIANO, 2013, p. 95). Também contraria a segurança jurídica da integração a possibilidade de os Estados se eximirem “de aplicar total ou parcialmente uma política adotada” pelo bloco. (UNASUL, 2008). 3 No original: “democratic states do not necessarily aplly to their foreign policy those same principles and values upon which their internal system is built”. (Tradução livre). Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 25 Salienta-se, ainda, que o caráter não permanente de trabalho dos principais órgãos é incompatível com o rol de aspirações.Ao analisar a dinâmica institucional da UNASUL, Baraldi e Ventura (2008, p. 15) alertam que “os governos sul-americanos seguem desprezando a variedade da tecnologia jurídica forjada pelas organizações internacionais quando realmente desejam funcionar”. Visualiza-se também problemas na adoção da regra do consenso para “toda a normativa da UNASUL”. (UNASUL, 2008). Obviamente, e como já mencionado, uma integração fundada no modelo intergovernamental depende que cada país internalize as deliberações do bloco, sendo, portanto, a efi cácia das medidas em todos os membros intrínseca a ideia de consenso. Porém, numa possível curva em direção à supranacionalidade, por exemplo, com a institucionalização do previsto Parlamento Sul-Americano (UNASUL, 2008), a regra do consenso constituirá, por si só, um empecilho ao aprofundamento da integração. A adoção da “regra da maioria”, basilar nos regimes democráticos estatais e no processo legislativo da União Europeia, entretanto, demandará uma complexa engenharia para conciliar maioria de países, habitantes e representantes. O défi cit de representatividade pode ser amenizado pela constituição do Parlamento. Porém, Mariano (2013, p. 94) cita o exemplo do MERCOSUL para alertar que “a mera existência de uma instituição representativa não é sufi ciente para garantir a democratização do processo”. Da mesma forma, o Parlamento Europeu, embora tenha conquistado maiores poderes desde sua gênese, não eliminou o poder dos tecnocratas na gestão da União Europeia. Além do mais, nota-se uma crise geral de representatividade dentro dos Estados. Ainda, a ausência de um sistema de soluções de controvérsias efi caz põe em cheque a capacidade de interpretação imparcial das normas e, consequentemente, o princípio da legalidade. Divergindo os países sobre o sentido das normas, eles terão a “negociação direta” como mecanismo de solução. Caso infrutífera, caberá aos órgãos da UNASUL a tentativa de solução (UNASUL, 2008), sem, no entanto, terem meios para vinculá-los. Por fi m, a UNASUL aspira na participação popular uma fonte de legitimidade que deve “permear todo o funcionamento das instâncias do bloco”, pois ela é colocada “como objetivo específi co do bloco”. (BARALDI, VENTURA, 2008, p. 15). Sem dúvida, a participação da sociedade, tanto na eleição de representantes como no controle sobre as decisões políticas, que devem ser públicas, é fundamental. Entretanto, Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 26 a normativa da UNASUL não especifi ca como será a participação dos cidadãos na construção da integração. CONSIDERAÇÕES FINAIS A UNASUL foi concebida em um contexto em que os países da América do Sul, após a redemocratização e a predominância da infl uência neoliberal do Norte no fi nal do século XX, viram ascender ao poder governos identifi cados com a esquerda. Objetivando uma integração para além do comércio, os governos não cederam em coordenar o bloco, contando, para isso, com apoio de órgãos burocráticos. O conteúdo progressista e o apreço pela democracia materializado no Protocolo Adicional ao Tratado Constitutivo da UNASUL (UNASUL, 2010) consubstanciam um promissor pano de fundo em um subcontinente negligente com os direitos sociais e em constante fl erte com autoritarismos. Entre o ideário e a concretização de seus objetivos, entretanto, há um longo caminho. Nesse sentido, os aparatos normativo e institucional da UNASUL devem prever mecanismos aptos e legítimos ao desenvolvimento da integração. Porém, a predominância dos Executivos nacionais na direção do bloco e a não instauração do previsto Parlamento demonstram falta de representatividade e de pluralidade no bloco. A UNASUL prevê a consolidação de uma “cidadania sul-americana”, mas elitiza seus procedimentos ao ignorar até agora a participação popular como fonte de legitimidade. Para uma integração democrática é necessária a atuação de um Parlamento plural e com efetivos poderes, de um sistema de soluções de controvérsias imparcial e efi caz e de meios dos cidadãos exercerem controle social sobre as políticas adotadas, que devem ser transparentes. REFERÊNCIAS ARCHIBUGI, Daniele. Cosmopolitan Democracy and its Critics: a Review. European Journal of International Relations, v. 10, n. 3, p. 437-473, set. 2004. Disponível em: http://www. danielearchibugi.org/downloads/papers/CD_and_critics_A_review.pdf. Acesso em: 03 ago. 2015. BARALDI, Camila, VENTURA, Deisy. A UNASUL e a Nova Gramática da Integração Sul-Americana. Boletim Pontes ICTSD-FGV, v. 4, p. 14- 16, 01 jul. 2008, São Paulo. Disponível em: http://www.ictsd.org/sites/ default/fi les/review/pontes/pontes4-3.pdf. Acesso em: 04 ago. 2015. http://www. http://www.ictsd.org/sites/ Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 27 CLÈVE, Clèmerson Merlin. 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Ou seja, com o avento deste processo de globalização dos direitos humanos, há, além das esferas jurídicas internas do Estado, uma esfera internacional de proteção aos Direitos Humanos. (OLIVEIRA; MAEOKA, 2009, p. 230). Veja, o principal objetivo deste aparato multinível de proteção ao indivíduo é, justamente, benefi ciar o indivíduo alvo de violações aos direitos Humanos. Desta maneira, o que defi nirá o aparato de proteção aos direitos humanos a ser utilizado (ou o sistema global ou o regional) será aquele escolhido pelo indivíduo. Obviamente, aquele que oferecer a maior amplitude de proteção. (PIOVENSA, 2010, p. 256). O principal instrumento normativo do Sistema Interamericano é a Convenção Interamericana de Direitos Humanos (também conhecido como Pacto San José da Costa Rica) de 1969, estabelecendo dois órgãos de fi scalização à Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos. (PIOVESAN, 2010, p. 253). Apesar de assinado em 1969, somente em 1978 passou a vigorar, podendo fazer parte apenas Estados membros da Organização dos Estados Americanos. Advogado. Mestrando em Direito pela Faculdade de Ciências Humanas e Sociais de Franca, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCHS/UNESP). Endereço do CV: http://lattes.cnpq.br/9740238115213457. Advogada. Mestranda em Direito pela Faculdade de Ciências Humanas e Sociais de Franca, Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho” (FCHS/UNESP). Endereço do CV: http://lattes.cnpq.br/6423217930649189. http://lattes.cnpq.br/9740238115213457. http://lattes.cnpq.br/ Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 30 Além deste documento instituidor dos órgãos de fi scalização, em 1988 foi instituído o Protocolo Adicional, denominado Tratado de São Salvador, com objetivo de normatizar a proteção dos direitos econômicos, sociais e culturais, passando a vigorar em 1988. (OLIVEIRA; MAEOKA, 2009, p. 232). Até a assinatura deste protocolo adicional, não havia previsão, no Sistema Interamericano, destes direitos econômicos e sociais, apenas a determinação de que os Estados buscariam progressivamente a realização destes direitos com metas legislativas, conforme se verifi ca no art. 26 do Pacto Santo José da Costa Rica, a seguir descrito: Artigo 26 - Desenvolvimento progressivo Os Estados-partes comprometem-se a adotar as providências, tanto no âmbito interno, como mediante cooperação internacional, especialmente econômica e técnica, a fi m de conseguir progressivamente a plena efetividade dos direitos que decorrem das normas econômicas, sociais e sobre educação, ciência e cultura, constantes da Carta da Organização dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires, na medida dos recursos disponíveis, por via legislativa ou por outros meios apropriados. Desta maneira é possível apreender uma dupla posição assumida entre o Estado-parte e a Convenção: uma obrigação de cunho negativo, no sentido de não violar direitos individuais, como, por exemplo, o dever de não torturar um indivíduo. Além deste, o Estado assume uma postura positiva, possibilitando a adoção de medidas afi rmativas necessárias e razoáveis para o exercício de determinados direitos (PIOVESAN, 2010, p. 257-58). Logo, verifi ca-se que a preocupação da Convenção não é apenas no sentido de garantir aqueles direitos tidos liberais, de primeira geração, mas também os direitos sociais de segunda geração, em que se espera uma posição ativa do Estado, não de abstenção, de não fazer. O aparato de monitoramento e implementação dos direitos enunciados pela Convenção são: a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Conforme ensinamento de GALINDO (2014, p. 149): Os órgãos que compõem o Sistema Interamericano são a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH ou Comissão), que por sua vez está a cargo dos diferentes Relatórios do sistema, e a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH ou Corte). O primeiro foi criado com o objetivo de promover a observância e defesa dos direitos Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 31 humanos na região e ser o órgão consultivo da Organização dos Estados Americanos (OEA), em matéria de direitos humanos, enquanto a Corte IDH é o órgão judicial do sistema responsável pela interpretação e aplicação da CADH, de acordo com os casos que sejam apresentados sob a sua jurisdição. Ambos os órgãos têm trabalho complementar dentro do sistema de petições individuais, em que perante a CIDH é esgotada a primeira fase do procedimento e na Corte IDH a fase fi nal do mesmo, se for o caso. 1 COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS A Comissão Interamericana de Direitos Humanos foi criada em 1959, pela Organização dos Estados Americanos, para a promoção dos direitos humanos na região, além de servir como órgão consultivo à OEA, realizando suas funções através de relatórios que advertiam e relacionavam as violações de direitos humanos perpetradas nos países membros da OEA. (GALINDO, 2014, p. 150). Após este primeiro momento houve uma ampliação em seus trabalhos, passando a formular recomendações aos Estados, atender consultas realizadas por Estados-membros e a realização de processamento de petições individuais no sistema, procedimento que será explicado mais adiante (GALINDO, 2014, p. 150). É constituída por 7 membros eleitos pela Assembleia Geral da OEA, de alta integridade moral e reconhecido saber em matéria de direitos humanos. Tem Washington como sede. Sempre que há uma vaga, é apresentada lista contendo até três nomes, apresentada pelos Estados-membros. O mandato é quatrienal e admite-se mais uma reeleição. (JAYME, 2008, p. 87). O objetivo primordial da Comissão Interamericana de Direito Humanos é a de proteção e observância dos direitos humanos na América. (PIOVESAN, 2010, p. 259). Ainda segundo a autora, a atuação desta Comissão se dá através de recomendações aos governos dos Estados-partes, no sentido de tomarem medidas adequadas à proteção desses direitos. De maneira continuada, a função primordial da Comissão Interamericana de Direitos Humanos é de observância e proteção dos direitos humanos na América. Uma das maneiras de seu exercício são as consultas que podem ser realizadas por qualquer Estado membro da OEA à Comissão. Estas consultas consistem em dar aconselhamento no sentido de melhorar o nível de cumprimento dos direitos humanos contidos na Convenção Americana de Direitos Humanos. Como salienta George Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 32 RodrigoBandeira Galindo (2014, p. 152), estas recomendações (através das consultas) tem um caráter preventivo, que tem como objetivo evitar futuros danos aos direitos humanos. Ainda, além desta função consultiva, – apesar do reconhecimento de não possuir poderes jurisdicionais – a Comissão é órgão essencial à ordem jurídica internacional. Isto porque, qualquer processo a ser proposto perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos passa, obrigatoriamente, por um procedimento prévio perante a Comissão. Segundo Fernando Gonzaga Jayme (2008, p. 88), este procedimento é dirigido observando-se o contraditório e, segundo a própria Convenção Americana de Direitos Humanos, é condição de procedibilidade para que a Corte possa conhecer e julgar de um processo, de maneira que se mostra irrenunciável e irrecusável. Compete à Comissão o exame das comunicações enviadas por indivíduo, ou grupo de indivíduos e, ainda entidades não governamentais que denunciem violação a direitos humanos consagrados na Convenção Americana de Direitos Humanos. (PIOVESAN, 2010, p. 261). Tal constatação pode ser feita através da leitura dos arts. 41, alínea “f” e 44, a seguir transcritos: Artigo 41 - A Comissão tem a função principal de promover a observância e a defesa dos direitos humanos e, no exercício de seu mandato, tem as seguintes funções e atribuições: a) estimular a consciência dos direitos humanos nos povos da América; b) formular recomendações aos governos dos Estados- membros, quando considerar conveniente, no sentido de que adotem medidas progressivas em prol dos direitos humanos no âmbito de suas leis internas e seus preceitos constitucionais, bem como disposições apropriadas para promover o devido respeito a esses direitos; c) preparar estudos ou relatórios que considerar convenientes para o desempenho de suas funções; d) solicitar aos governos dos Estados-membros que lhe proporcionem informações sobre as medidas que adotarem em matéria de direitos humanos; e) atender às consultas que, por meio da Secretaria Geral da Organização dos Estados Americanos, lhe formularem os Estados-membros sobre questões relacionadas com os direitos humanos e, dentro de suas possibilidades, prestar- lhes o assessoramento que lhes solicitarem; Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 33 f) atuar com respeito às petições e outras comunicações, no exercício de sua autoridade, de conformidade com o disposto nos artigos 44 a 51 desta Convenção; e g) apresentar um relatório anual à Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos. Artigo 44 - Qualquer pessoa ou grupo de pessoas, ou entidade não-governamental legalmente reconhecida em um ou mais Estados-membros da Organização, pode apresentar à Comissão petições que contenham denúncias ou queixas de violação desta Convenção por um Estado-parte. Veja, assim como no Sistema Global, a petição deve obedecer determinados requisitos de admissibilidade, sendo um deles o prévio esgotamento dos recursos judiciais internos, excetuando-se aquelas situações em que houver demorar injustifi cado ou mesmo quando o ordenamento interno do país não possibilitar o devido processo legal. (PIOVESAN, 2010, p. 261). Ainda segundo a autora (p. 262), há a necessidade de não existir litispendência ou coisa julgada internacional. Ou seja, não pode o indivíduo ou grupo ou entidade, e. g, ter ingressado com a mesma petição em outro sistema internacional de proteção aos direitos humanos. A primeira função da Comissão, ao receber uma comunicação (em forma de petição) é, justamente, esta análise de admissibilidade para, então, encaminhar o pedido de solicitação de informações ao Estado denunciado. Vide redação do art. 46 da Convenção Americana de Direitos Humanos: Artigo 46 - Para que uma petição ou comunicação apresentada de acordo com os artigos 44 ou 45 seja admitida pela Comissão, será necessário: a) que hajam sido interpostos e esgotados os recursos da jurisdição interna, de acordo com os princípios de Direito Internacional geralmente reconhecidos; b) que seja apresentada dentro do prazo de seis meses, a partir da data em que o presumido prejudicado em seus direitos tenha sido notifi cado da decisão defi nitiva; c) que a matéria da petição ou comunicação não esteja pendente de outro processo de solução internacional; e d) que, no caso do artigo 44, a petição contenha o nome, a nacionalidade, a profi ssão, o domicílio e a assinatura da pessoa ou pessoas ou do representante legal da entidade que submeter a petição. 2. As disposições das alíneas "a" e "b" do inciso 1 deste artigo não se aplicarão quando: Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 34 a) não existir, na legislação interna do Estado de que se tratar, o devido processo legal para a proteção do direito ou direitos que se alegue tenham sido violados; b) não se houver permitido ao presumido prejudicado em seus direitos o acesso aos recursos da jurisdição interna, ou houver sido ele impedido de esgotá-los; e c) houver demora injustifi cada na decisão sobre os mencionados recursos. Superada a fase da admissibilidade (que será tratada de forma mais detalhada na seção específi ca deste trabalho), a Comissão buscará uma solução amistosa entre as partes, uma espécie de conciliação entre o Estado denunciado e o denunciante. (PIOVESAN, 2010, p. 264). Não havendo esta solução amistosa, a Comissão redigirá relatório constando os fatos e conclusões referentes ao caso e, se for cabível, recomendações ao Estado-parte. (PIOVENSA, 2010, p. 264). Prossegue referida autora, no sentido de que este relatório será encaminhado ao Estado- parte para que, no prazo de três meses, dê cumprimento às recomendações feitas. Dentro deste prazo o caso poderá ser encaminhado à apreciação da Corte Interamericana de Direitos Humanos em duas hipóteses: ou a pedido da Comissão ou a pedido do próprio Estado-parte. É o que se extrai da redação do art. 61 da Convenção Americana de Direitos Humanos. 2 CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS A Corte Interamericana de Direitos Humanos é órgãos jurisdicional do Sistema Interamericano de Direitos Humanos. Sua criação se deu em 1969 e seus trabalhos se iniciaram, de fato, em 1978. Sua sede é em San José, na Costa Rica. A Corte é composta por sete juízes eleitos por um período de 6 anos – com possibilidade de recondução pelo mesmo período – em votação secreta e pelo voto da maioria absoluta dos Estados- partes da Convenção. (GUERRA, 2012, p. 343). Eleição esta que ocorre na Assembleia Geral da Organização. Para o regular exercício de suas funções, segundo Fernando Gonzaga Jayme (2008, p. 89), aos juízes da Corte são garantidos o gozo de prerrogativas e imunidades diplomáticas, estabelecendo, ainda, uma remuneração compatível com o exercício das funções aos seus membros. Há, ainda, a possibilidade da atuação de juízes “ad hoc” em se tratando de determinadas matérias – prática relativamente comum no Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 35 âmbito da Corte – como determina o art. 55 da Convenção Americana de Direitos Humanos transcrito a seguir: Artigo 55 - 1. O juiz, que for nacional de algum dos Estados- partes em caso submetido à Corte, conservará o seu direito de conhecer do mesmo. 2. Se um dos juízes chamados a conhecer do caso for de nacionalidade de um dos Estados-partes, outro Estado-parte no caso poderá designar uma pessoa de sua escolha para integrar a Corte, na qualidade de juiz ad hoc. 3. Se, dentre os juízes chamados a conhecer do caso, nenhum for da nacionalidade dos Estados-partes, cada um destes poderá designar um juiz ad hoc. 4. O juiz ad hoc deve reunir os requisitos indicados no artigo 52. 5. Se vários Estados-partes na Convenção tiverem o mesmo interesse no caso, serão considerados como uma só parte,para os fi ns das disposições anteriores. Em caso de dúvida, a Corte decidirá. Sua regulamentação em sede de direito internacional se dá através dos arts. 33, alínea “b” e 52 a 73 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos Galindo (2014, p. 153) verifi ca que as funções da Corte Interamericana de Direitos Humanos se divide em duas funções principais: a) conhecer e apreciar casos individuais ou interestaduais em que se alegue violação de direitos contidos na Convenção Americana de Direitos Humanos e; b) emitir opiniões consultivas a pedido dos Estados-membros. Ou seja, cumula as funções contenciosa e consultiva. Esta posição consultiva se consubstancia na possibilidade que possuem os Estados membros da Organização dos Estados Americanos – e outros órgãos descritos no capítulo X da Carta da Organização dos Estados Americanos, dentre eles a própria Comissão Interamericana de Direitos Humanos – em solicitar a interpretação da Convenção Americana de Direitos Humanos. Além da interpretação da própria Convenção Americana de Direitos Humanos, cabe à Corte a interpretação de outros tratados concernentes à proteção dos Direitos Humanos aplicáveis aos Estados Americanos e o exame de compatibilidade das normas internas dos países em relação a esses tratados. (SERRANO, 2011, p. 237). Já a sua outra função, a contenciosa, se refere à jurisdição que possui no sentido de examinar casos que envolvam denúncias de que um Estado-parte violou direito protegido pela Convenção. (PIOVESAN, 2010, p. 210). Há, no entanto uma ressalva. Somente estará submetido à Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 36 jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos aqueles Estados que expressamente reconheçam sua Jurisdição, conforme expresso no art. 62 da Convenção Americana de Direitos Humanos: Artigo 62 - 1. Todo Estado-parte pode, no momento do depósito do seu instrumento de ratifi cação desta Convenção ou de adesão a ela, ou em qualquer momento posterior, declarar que reconhece como obrigatória, de pleno direito e sem convenção especial, a competência da Corte em todos os casos relativos à interpretação ou aplicação desta Convenção. 2. A declaração pode ser feita incondicionalmente, ou sob condição de reciprocidade, por prazo determinado ou para casos específi cos. Deverá ser apresentada ao Secretário Geral da Organização, que encaminhará cópias da mesma a outros Estados-membros da Organização e ao Secretário da Corte. 3. A Corte tem competência para conhecer de qualquer caso, relativo à interpretação e aplicação das disposições desta Convenção, que lhe seja submetido, desde que os Estados- partes no caso tenham reconhecido ou reconheçam a referida competência, seja por declaração especial, como preveem os incisos anteriores, seja por convenção especial. Veja, não se pode confundir as duas funções exercidas pela Corte Interamericana. Conforme ressalta Cançado Trindade (2003, p. 1), há clara distinção entre a função consultiva a função jurisdicional contenciosa. O trecho a seguir, de Cançado Trindade (2003, p. 1) faz claramente esta constatação, reforçando, inclusive, o exposto acima: May it preliminarily be recalled that the conventional basis for the exercise of the Court's advisory jurisdiction is distinct from that for the exercise of its contentious jurisdiction. The basis for the exercise of the former is particularly wide, given that, under Article 64 of the American Convention, all OAS member States (whether Parties to the American Convention or not) and all of the main organs mentioned in Chapter X of the OAS Charter can request advisory opinions from the Court on matters regarding 'the interpretation of this Convention or of other treaties concerning the protection of human rights in the American states' or, in the case of member states, 'the compatibility of any of its domestic laws with the aforesaid international instruments’. O Brasil é signatário da Convenção Americana de Direitos Humanos desde 1992, ingressando no ordenamento jurídico pátrio através do Decreto no 678, de 06 de novembro de 1992. Já o reconhecimento da Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 37 competência da Corte Interamericana de Direitos Humanos ocorreu com a edição do Decreto Legislativo no 89, de 03 de dezembro de 1998 e o Decreto no 4.463, de 08 de novembro de 2002, instrumentos jurídicos que introduziram no ordenamento jurídico brasileiro a Declaração de Competência Obrigatória da Corte Interamericana sobre Direitos Humanos. (GUERRA, 2012, p. 352). Ou seja, esta competência contenciosa se refere ao controle concreto que a Corte faz em relação a um caso particular de violação aos Direitos Humanos, submetido a ela via petição individual – submetendo-se ao procedimento preliminar necessário da Comissão Interamericana de Direitos Humanos – ou via representação direta de um Estado, que tem legitimidade de peticionar diretamente à Corte. (SERRANO, 2011, p. 237). Caso a Corte entenda que, de fato, ocorreu violação aos Direitos Humanos, determinará que o Estado condenado tome as medidas necessárias para a reparação do Direito violado. Pode a Corte condenar o Estado ao pagamento de uma indenização à vítima, com força de título executivo. (PIOVESAN, 2010, p. 271-72). 3 CONDIÇÕES PRELIMINARES DE ADMISSIBILIDADE Como já tratado de forma introdutória, para que um caso seja analisado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos há a necessidade de se verifi car o preenchimento de determinados requisitos. O Estado, ao se defender em uma demanda judicial em âmbito internacional que responde perante à Corte Interamericana pode alegar exceções preliminares, que prejudicam o julgamento do processo. Para Serrano (2011, p. 235), as defesas preliminares apresentadas pelo Estado podem se circunscrever em aspectos da competência: tempo, lugar e admissibilidade. Ou seja, é o meio de defesa apresentado pelo Estado para impedir que haja, de fato, a análise da suposta violação aos direitos humanos, impossibilitando que o caso prossiga em seu trâmite regular, como base aspectos meramente formais. (SERRANO, 2011, p. 236). Segundo consta no art. 48 da Convenção Americana de Direitos Humanos, a Comissão processará as petições que atendam aos requisitos. Para tanto, há necessidade de transmitir a denúncia ao Estado que, no prazo de 2 meses, prorrogáveis por mais um irá apresentar resposta, podendo alegar questões referentes à elegibilidade da petição. Pode a Comissão, ainda, convidar as Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 38 partes a tecerem comentários adicionais, seja por escrito ou por meio de uma audiência. (GALINDO, 2014, p. 157). Conforme se verifi ca a seguir: Artigo 48 - 1. A Comissão, ao receber uma petição ou comunicação na qual se alegue a violação de qualquer dos direitos consagrados nesta Convenção, procederá da seguinte maneira: a) se reconhecer a admissibilidade da petição ou comunicação, solicitará informações ao Governo do Estado ao qual pertença a autoridade apontada como responsável pela violação alegada e transcreverá as partes pertinentes da petição ou comunicação. As referidas informações devem ser enviadas dentro de um prazo razoável, fi xado pela Comissão ao considerar as circunstâncias de cada caso; b) recebidas as informações, ou transcorrido o prazo fi xado sem que sejam elas recebidas, verifi cará se existem ou subsistem os motivos da petição ou comunicação. No caso de não existirem ou não subsistirem, mandará arquivar o expediente; c) poderá também declarar a inadmissibilidade ou a improcedência da petição ou comunicação, com base em informação ou prova supervenientes; d) se o expediente não houver sido arquivado, e com o fi m de comprovar os fatos, a Comissão procederá, com conhecimentodas partes, a um exame do assunto exposto na petição ou comunicação. Se for necessário e conveniente, a Comissão procederá a uma investigação para cuja efi caz realização solicitará, e os Estados interessados lhe proporcionarão, todas as facilidades necessárias; e) poderá pedir aos Estados interessados qualquer informação pertinente e receberá, se isso for solicitado, as exposições verbais ou escritas que apresentarem os interessados; e f) pôr-se-á à disposição das partes interessadas, a fi m de chegar a uma solução amistosa do assunto, fundada no respeito aos direitos reconhecidos nesta Convenção. 2. Entretanto, em casos graves e urgentes, pode ser realizada uma investigação, mediante prévio consentimento do Estado em cujo território se alegue houver sido cometida a violação, tão somente com a apresentação de uma petição ou comunicação que reúna todos os requisitos formais de admissibilidade. É exatamente neste momento que podem surgir as questões referentes às exceções preliminares: seja referente à jurisdição da Comissão, seja referente à elegibilidade do caso ou mesmo regras processuais Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 39 da Convenção Americana de Direitos Humanos ou do Regulamento da própria Comissão. Importante destacar que o silêncio do Estado dentro do prazo disposto (dois meses, possível uma prorrogação de mais um mês) acarreta uma presunção de veracidade dos fatos alegados na petição, conforme art. 38 do Regulamento da Comissão Interamericana de Direitos Humanos: Art. 38: Presumir-se-ão verdadeiros os fatos relatados na petição, cujas partes pertinentes hajam sido transmitidas ao Estado de que se trate, se este, no prazo máximo fi xado pela Comissão de conformidade com o artigo 37 do presente Regulamento, não proporcionar a informação respectiva, desde que, de outros elementos de convicção, não resulte CONSIDERAÇÕES FINAIS diversa. O primeiro requisito a ser avaliado diz respeito ao esgotamento prévio dos recursos judiciais internos do país para que o indivíduo possa ter seu caso analisado pela Corte Interamericana (obviamente após análise previa da Comissão Interamericana). É o chamado “princípio da complementariedade”. (GALINDO, 2014, p. 156). Há, ainda, a análise de ausência de coisa julgada internacional ou litispendência internacional. Isto porque, para que a Corte Interamericana esteja autorizada a julgar um caso contra um Estado-membro, não pode a matéria ter sido objeto de análise – ou ainda estar em análise – em outro órgão jurisdicional internacional. Para que esteja a Corte impedida de julgar é necessário que haja coincidência nas partes, nos fatos e da questão de direito discutida. Caso estes três elementos não estejam presentes, não é possível se falar em identidade de processos, ou seja, a litispendência ou coisa julgada internacional. (SERRANO, 2011, p. 243). No que tange ao sujeito ativo do processo, ou seja, aqueles que podem provocar a jurisdição da Corte Interamericana, somente a Comissão Interamericana ou os Estados-membros estão autorizados. Logo, o indivíduo não está autorizado a ingressar diretamente com a ação no âmbito da Corte, havendo necessidade de passar pela análise da Comissão Interamericana de Direitos Humanos. (GUERRA, 2012, p. 344). Quando se fala no sujeito passivo do processo, os únicos legitimados são aqueles Estados que aceitaram expressamente a jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos. (SERRANO, 2011, p. 238-39). Quando se fala na competência da Corte Interamericana em relação ao tempo, é necessária que a concessão da competência à Corte Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 40 tenha ocorrido anteriormente aos atos de violação aos direitos humanos praticados. Como leciona Serrano (2011, p. 241), um caso paradigmático fi cou conhecido como Caso Heliodoro Portugal, em que não se sabia o paradeiro da vítima desde 14 de maio de 1970. O Estado do Panamá foi responsabilizado pelo “desaparecimento forçado” de Heliodoro Portugal (ocorrido em 1970), sendo os restos mortais da vítima encontrados apenas em 1999. Veja, o Panamá aceitou a jurisdição da Corte Interamericana mais de 10 anos após o desaparecimento da vítima, mas mesmo assim foi condenada perante a Corte. Isto porque, considerou a Corte que estas violações aos direitos humanos envolvendo desaparecimento forcado são crimes continuados, permanentes e pluriofensivos. Desta maneira, a suscitação de incompetência em razão do tempo não foi acolhida. Presentes estes requisitos, a Corte Interamericana de Direitos Humanos está apta a julgar o mérito da questão, ou seja, se o Estado é internacionalmente responsável ou não pelas violações de direitos humanos por ele perpetrado observando, obviamente, o contraditório e a ampla defesa, que também permeiam os procedimentos em sede internacional. Consequentemente, a Corte ordena que o Estado repare o dano causado – caso seja condenado –, ou rejeita as reivindicações dos peticionários, caso seja absolvido. (GALINDO, 2014, p. 164). CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante do exposto, conclui-se que o procedimento de ingresso de ações perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos pressupõe a superação de diversas fases para, enfi m, analisar-se o mérito. Ou seja, além da difi culdade que encontra o indivíduo vítima de violação a Direitos Humanos têm em atingir, de fato, a Corte, ainda há procedimentos complexos para que o mérito possa ser analisado. Uma crítica feita pela doutrina, como principais expositores Cançado Trindade e Flávia Piovesan, diz respeito justamente às petições individuais e a impossibilidade de se peticionar diretamente à Corte. Os legitimados ativos para ingressar com demandas na Corte são apenas os Estados-membros e a própria Comissão Interamericana de Direitos Humanos. É diferente do que ocorre no Sistema Europeu de proteção aos Direitos Humanos, em que há possibilidade de ingresso por parte do indivíduo. O trabalho visou demonstrar os procedimentos de ingresso na Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 41 Corte Interamericana e as questões que podem cominar na extinção do processo sem a análise do mérito. São as chamadas questões prejudiciais. REFERÊNCIAS BREWER, Stephanie Erin; CAVALLARO, James L. Reevaluating Regional Human Rights Litigation in the Twenty-First Century: The Case of the Inter-American Court. The American Journal of International Law, Washington, v. 102, n. 4, p. 768-827, out. 2008. BURGORGUE-LARSEN, Laurence. El Contexto, las Técnicas y las Consecuencias de la Interpretación de la Convención Americana de los Derechos Humanos. Estudios Constitucionales, Talca (Chile), a.12, n. 1, p. 105-161, 2014. CÓRDOVA, Luis Castillo. 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Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 43 PRESIDÊNCIA DEMOCRÁTICA – GOVERNAÇA; DESENVOLVIMENTO HUMANO NA AMERICA LATINA Suelen Otrenti1* INTRODUÇÃO Existe contradições quando o tema é democracia contemporânea, a noção de ser o único regime jurídico legitimo aumenta a incredibilidade da população, observando-se na grande recusa durante as eleições e também nas manifestações, em contra partida, se há um entendimento fi rmado de o Estado Nacional ser incapaz, onde a democracia representativa respondera de forma satisfatória conforme demanda da população através dos direitos de cidadania em uma história de capitalismo e decisões em um só sistema, o que infl uencia decisivamente para a crise de legitimidade, por outo lado a ONU, o FMI e a União Européia, apontam uma defi ciência na democratização e de efetividade ao cumprir suas missões institucionais, o que fi cou mais evidente a partir da crise econômica iniciada em 2008. Para compreender corretamente esse contexto deve-se considerar dois pressupostos, do qual nem todos os problemas enfrentados pela democracia contemporânea são devidos à globalização; e estudando profundamente a crise de legitimidade dessas instituições representativas, do défi cit democrático e dos impactos causados pelos fundamentos da cidadania não pode ser o mesmo em âmbitos tão diferentes (como exemplo, o da União Europeia e o da América Latina). Evidentemente, que alguns fatores como o poder das corporações transnacionais, o pluralismo jurídico, o processo de homogeneização do direito, dentre outros, dão uma certa limitação a competência do Estado agir autonomamente como implantar políticas sociais. Muitas decisões que tem relação direta com o cidadão são tomadas onde as instituições representativas não têm qualquer poder de infl uenciar, comprometendo a legitimidade da democracia. O grande poder do défi cit democrático é a falta de capacidade cada vez maior do sistema político, ancorado no Estado- Nação, ao representar os cidadãos na prática efetiva da governança global. Por vez, existem vícios que acompanham a democracia anteriores a globalização, iniciado século XX, como a deformação da opinião pública Graduanda em Direito. Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 44 pela mídia, infl uência do poder econômico, entre outros. A realidade latino-americana tem características da própria história e cultura que causa uma signifi cativa defi ciência na democracia em nossas instituições representativas, dentre as quais destacamos os bloqueios ao exercício da soberania de origem externa (condição de dependência) e interna, a apropriação do Estado por interesses privados, o populismo, a histórica ausência do Estado perante graves problemas sociais, a desigualdade e a exclusão social, e a baixa integração social. A princípio o objetivo era de manter a paz depois também com o propósito de minorar a defi ciência regulatória da economia global, os Países constituíram organizações internacionais e blocos regionais, sendo fundamentais neste contexto, mas, por outro lado, não apresentam uma boa efi ciência ao cumprir os propósitos apresentando também um signifi cativo défi cit democrático. Esta inefi ciência entende-se, pela limitação no orçamento impedindo desenvolvimento de grandes projetos. Não possuem receitas próprias, inclusive o limitado orçamento depende de transferência de recursos dos Estados nacionais. Não conseguindo fazer frente nem ao mercado global nem aos interesses das grandes potências, se dispondo, a serviço delas. Por conta do não cumprimento de seus objetivos, as organizações não tem capacidade de enfrentar uma crise de impotência da política e de ajudar como deveria compensando o defi cit democrático das instituições representativas nacionais. Observa-se um grande défi cit democrático das organizações internacionais, apresentando uma estrutura desequilibrada de poder, porque são dominadas pelas grandes potências militares e econômicas. E os mecanismos de representatividade, a clareza e a responsabilização são frágeis nas organizações internacionais. Não assegurando a existência de participação dos interessados em situações que lhe afetam, existindo disputa não só pela defi nição da política a ser aderida, mas também pela participação. Os procedimentos decisórios são distantes dos cidadãos, não tem controle direto das pessoas eleitas, e são conduzidos por diplomatas e especialistas de forma não visível e nem se submetendo à crítica prévia da opinião pública, de representantes políticos e de grupos de interesse. A União Européia, AFTA, ASEAN, APEC e MERCOSUL, não estão livres dessa inefi ciência de cumprimento nos seus objetivos e ao défi cit democrático. No início a União Europeia não apresenta “uma soberania única”, sendo difícil de ser controlada e legitimada pelos Anais do III Seminário de Direito do Estado Teorias da Constituição e as novas concepções de cidadania 45 processos políticos e mecanismos democráticos. Depois, ainda, existe um “dualismo expresso por uma instituição representativa, mas sem autonomia decisória (Parlamento Europeu), e por agências burocráticas dotadas dessa autonomia, porém sem representatividade”. Sendo somente o órgão eleito para representar a comunidade e não de decidir. (FARIA, 2002, p. 303–306). Archibugi (2005, p. 75) argumenta da avaliação sobre a União Européia que será bastante diferente se feita por um estudioso da democracia global ou estatal, porque de frente aos Estados